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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 185

Sr. presidente, disse ultimamente o sr. conde do Casal Ribeiro, o estado da balança commercial é grave.

Effectivamente assim é.

Este estado não affecta unicamente o nosso paiz, mas todos os outros, como se lê no Diario do governo de 26 de dezembro do anno passado, em um officio do nosso cônsul geral em Londres.

Este officio mostra o estado desgraçado do commercio em Inglaterra; mas se este estado é perigoso em qualquer paiz, muito mais perigoso é ainda em um paiz pequeno, como o nosso.

Nós não devemos descurar a nossa exportação nacional, que orca por 20.000:000$000 réis e é representada metade pelos nossos vinhos, sendo quasi 8.000:000$000 réis só de vinho do Porto: portanto é necessario olhar seriamente para isto, e muito bem fez o sr. conde do Casal Ribeiro, pedindo ao governo, n’uma das sessões passadas, que não esquecesse a phyloxera.

Em um jornal ministerial encontram-se os seguintes periodos, que perfeitamente corroboram a opinião de s. exa.

Vou lel-os á camara:

«Temos, pois, diante de nós mais um anno, que será perdido por nós e ganho pela phyloxera.

«E, pois, indispensavel é inadiavel, entrar resolutamente no periodo de acção, pondo em pratica uma serie de .acertadas providencias, tendentes a ensaiar no paiz do Douro os remedios melhor aconselhados, procurando salvar as vinhas, que já estão ou de futuro forem affectadas.»

N’esta parte insisto muito com o governo para que tome todas as providencias, pois que, sendo, como disse, metade da nossa exportação representada pelo vinho, se a phyloxera invadir as regiões vinicolas, nós havemos de encontrar-nos nas mais crueis difficuldades.

Sr. presidente, eu peço licença para fazer mais algumas leituras, e não hesito em fazel-as, porque tendo aqui sido feitas outras leituras com relação á minha de Sabbá e a outras cousas bonitas, que não interessavam muito a camara, o que vou ler tem ao menos a vantagem de interessar vivamente o paiz.

Ainda hontem deparei com o seguinte em uma publicação feita em França, e chamo a attenção do sr. conde do Casal Ribeiro.

Eu podia repetir o resumo d’este escripto; porém a leitura do documento é mais eloquente do que o poderiam ser as minhas palavras.

«Já dissemos que os Estados Unidos tinham passado nos ultimos annos da grande importação para a enorme exportação.

«As estatisticas francezas provam...»

O sr. Conde do Casal Ribeiro: — Se v. exa. permitte direi duas palavras, visto v. ex.4 chamar a minha attenção sobre o que está lendo.

Se eu tivesse trazido commigo o ultimo numero do Moniteur vinicole, podia offerecel-o a v. exa. para tambem o ler á camara; e ali se veria como os que seriamente se interessam pela propriedade vinicola da França, já ali se preoccupam do extraordinario augmento que tem tido a importação dos vinhos hespanhoes n’aquelle paiz, e pedem providencias para habilitar a producção franceza a concorrer com a estrangeira.

Isto vem a respeito de um assumpto analogo, em confirmação do que v. exa. está dizendo.

O Orador: — Eu agradeço infinitamente ao digno par a sua informação.

Sr. presidente, continuando, invoco para este ponto a attenção especial de todos:

«As estatisticas francezas provam que em França as remessas para a grande republica americana diminuem annualmente, emquanto os nossos mercados se acham cada vez mais innundados pelas mercadorias vindas d’aquelle vasto continente.

«A escola do livre cambio affirma que só augmentarmos nas importações os direitos, não dizemos já com tarifas protectoras mas compensadoras, as represálias não se farão esperar; porém os Estados Unidos, não se contentando só de equilibrar as tarifas nacionaes pelas necessidades do trabalho, tornaram-se francamente protectoras, impondo pesados direitos sobre as mercadorias chegadas do velho continente, e o resultado foi esse enorme desenvolvimento industrial, que hoje lhes chega e muito sobejamente.

«Assim, emquanto a França pelos seus tratados de livre cambio, em 1878, importou mais do que exportou 1 milhar e 91 milhões de francos; os proteccionistas Estados Unidos exportaram mais do que importaram 304.542:571 dollars (l milhar e 500 milhões de francos).

«O telegramma de Washington de 30 de janeiro, constata este colossal resultado, que deve fazer meditar as opiniões de certos theoricos.»

Sr. presidente, depois d’esta leitura, colloco uma serie de pontos de interrogação, e pergunto ao paiz, se valerá, ou não, bem a pena estudar esta materia? (Apoiados.)

Sr. presidente, deleitamo-nos com o augmento dos rendimentos das nossas alfandegas; mas a isto já n’estes ultimos dias respondeu o sr. conde do Casal Ribeiro, e eu peço licença para insistir.

A exportação excessiva do nosso numerario é uma cousa grave; nós exportamos o numerario não só pelas importações que fazemos, mas para satisfazer aos encargos da nossa divida externa, e não temos, como outros paizes, uma compensação para este facto, nos fundos estrangeiros existentes nas mãos dos nossos capitalistas, que apenas têem uma parte diminutissima.

(Pausa.)

Sr. presidente, tambem desejo dizer o que penso ácerca da grave questão da importação dos trigos no nosso paiz. Desejo fazei-o, porque sou proprietario e tenho sido lavrador, e depois para justificar a lembrança de v. exa., sr. presidente, que tão benevolamente me propoz para a commissão de agricultura d’esta camara, salvando-me assim e ao digno par o sr. Vaz Preto do naufragio que tivemos na procella dos papelinhos. (Riso.)

O trigo que nós importamos eleva-se á importante somma de 4.000:000$000 reis!

E triste que este facto se de, porque elle mostra bem que não produzimos os cereaes necessarios para o nosso consumo, e ainda mais triste, porque com essa importação não ha vantagens para o consumidor, ha gravissimos inconvenientes para os lavradores, e apenas extraordinarios lucros para o monopolio.

Antigamente dizia-se: trigo a 800 réis pão a 40 réis, e este era o pão de arratel.

Sabe a camara o que acontece hoje? Eu direi, a respeito do que vou narrar, que sou o echo de homens praticos, que me repetiram aquillo que eu já sabia, mas que eu não quiz deixar de ouvir primeiro, para ter a consciencia de ser exacto na minha referencia.

Acontece que cada alqueire de trigo americano posto em Lisboa importa em 460 réis, e dando cada alqueire d’este trigo palhinha dezoito pães de meio kilo, sendo estes vendidos a 45 réis cada um, dão o producto bruto de 810 réis em alqueire, fôra as semeas e rolão, que pagam sufficientemente a lenha do padeiro, dividindo-se portanto a differença que vae dos 810 réis para os 460 réis, preço do trigo americano, pelos diversos industriaes interessados, não sendo o lucro do monopolio o menos insignificante, e antes pelo contrario. Ha pão vendido tambem a 40 réis, mas esse é de 450 grammas.

Logo, sr. presidente, o pão não está mais barato por ter baixado muito o preço dos trigos.

A camara ve perfeitamente se é gravissimo este problema, e o que acabo de dizer, mostra bem a necessidade de se nomear uma commissão de inquerito para estudar esta questão, que produz uma grande crise .para muitas regiões cerealiferas do nosso paiz.