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512 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

sam para as camaras municipaes? Eu desejava tambem saber se, em virtude da disposição d’este projecto de lei, que não admitte que as camaras municipaes possam supprimir as escolas existentes, e da disposição que lhes confere a faculdade de crearem novas escolas, as camaras podem crear estas novas escolas, para satisfazer ás necessidades de outro ensino, nas freguezias onde já existem escolas velhas, ou se hão de subsistir dois ensinos, o ensino velho e o ensino novo conjunta e simultaneamente? Esta é a parte que me parece mais obscura da lei. Para ella poder dar resultados proficuos é necessario tornar bem claro quaes são as attribuições das camaras municipaes a este respeito. Não sei se o ensino novo ha de continuar a par do velho, e sendo assim se o ensino velho fica a cargo do governo, e o ensino novo a cargo das camaras municipaes. Desejava ouvir explicações a este respeito, e tambem se nas freguezias onde ha escolas de ensino velho, será preciso crear ensino novo.

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — As escolas novas hão existir a par das velhas, mas estas hão de entrar em linha do conta no numero do escolas que for necessario crear.

O sr. Vaz Preto: — Onde existe a escola velha ha de crear-se na, freguezia uma nova escola?

O sr. Ministro do Reino: — Entendo que não. Nós não queremos uma instrucção superabundante, basta a que for sufficiente. Se podérmos ter o sufficiente já temos feito por isso onde houver as escolas, que esta lei determina que muito; devem haver, não é necessario crear mais. (Apoiados.)

O sr. Conde de Rio Maior: — Devo começar por dar uma explicação sobre um facto, que se passou hontem ao encerrar o debate.

Eu tinha pedido a palavra; mas desisti d’ella, porque faltando apenas alguns minutos para se levantar a sessão, por mais que eu quizesse resumir as minhas observações, era impossivel expendel-as em tão curto espaço de tempo. Contava com a benevolencia da camara, que tantas vezes me tem sido concedida, e esperava que se fizesse o que se tem feito a outros oradores, isto é, que a sessão se levantasse para continuar hoje.

É desagradavel ficar, não digo já em meio de um discurso, mas no principio d’elle; alem disso não tinha a certeza de o poder concluir hoje.

Estava hontem bastante incommodado de saude, e duvidava muito poder ter a honra de levantar agora a minha voz n’esta assembléa, e como era exquisito ficar apenas no prefacio, rasão por que desisti de fallar.

Devo dizer, agradeço profundamente ao meu collega e socio na opposição, o obsequio, que me fez, pedindo a palavra e evitando que o debate se encerrasse, depois de ter sido collocado pelo illustre relator da commissão em altura tão elevada. E desde já declaro, se não fosse o auxilio do sr. Vaz Preto, via-me compellido a usar da palavra para evitar fechar-se o debate sobre a generalidade do projecto; quando quero sei querer, e sei conseguir as cousas que tenho em vista, e eu tinha muito em vista não deixar de responder ao illustre relator da commissão.

Dadas estas explicações, vou entrar na materia.

Sr. presidente, não disse que a instrucção primaria fosse perigosa e sim que a moral do povo nem sempre se nivelava pelo seu progresso intellectual. Foi isto o que eu sustentei.

Não liguei tambem as epochas gloriosas da nossa historia, ás epochas do seu obscurantismo.

É necessario insistir n’estes pontos, para que se não de uma interpretação diversa ás minhas observações.

Sei perfeitamente que os eruditos da escola de Sagres foram os antecessores de Pedro Alvares Cabral, Vasco da Gama, Fernando de Magalhães e Christovão Collombo; assim como Fernão Lopes foi o antecessor de Frei Luiz de Sousa e de Jacinto Freire de Andrade, e Bernardim Ribeiro de Camões!

Sei felizmente tudo isto, sr. presidente, e sei mais! Quando as nossas frotas navegavam por mares nunca d’antes navegados, ao mesmo tempo os portuguezes escreviam com penna de ouro as paginas brilhantes da epopeia dos seus grandes homens, a sublime historia d’esta inclita nação.

O que eu disse foi que n’essa epocha, em que o nivel moral andava tão alto; ainda assim, apesar dos escriptos eruditos publicados rios seculos XIV, XV e XVI, o povo, que e d’elle de quem fallo, tinha elevados pensamentos e amava a independencia e a patria; mas nas letras tinha pouco adiantamento, e a letra redonda conhecia-a menos do que os magnificos feitos das suas immensas glorias! Nesse tempo, sr. presidente, ninguem pensava, disse e repito, na indispensabilidade do ensino obrigatorio!

Eis aqui o que eu affirmei em principio, o que não duvido novamente confirmar, por me parecer a expressão exacta de uma grande verdade.

Entendo util, utilissimo, o progresso intellectual e o desenvolvimento da instrucção, mas não creio que o desenvolvimento moral seja sempre a consequencia do desenvolvimento intellectual. Como ha pouco lembrei, nas epochas a que tive de me reportar os conhecimentos litterarios do povo não estavam muito desenvolvidos; mas a nobreza dos sentimentos acompanhava poderosamente todos os heroes das nossas glorias.

Tambem tivemos outra epocha, sr. presidente, em que abundavam os eruditos e os escriptores; comtudo o nivel moral do paiz tinha baixado muito do que fôra nos reinados soberbos de D. João I, D. João II, e D. Manuel!

Refiro-me ao tempo do cardeal rei, e quem ignora o triste estado dos costumes e dos brios nacionaes durante este infeliz reinado?!

Quando os Filippes cá entraram, tinhamos grandes culpas a expiar, porque o facto da união de Portugal á Hespanha não foi senão o resultado da decadencia moral a que tinha chegado a nação!

O principal fim que os poderes publicos devera ter sempre em vista, não me causarei de o repetir, é o progresso moral do povo pelo desenvolvimento das grandes idéas e dos grandes principios, que podem determinar esse progresso. Não me parece, porém, que se consiga esse fim com as diminutas aspirações do actual governo.

Disse hontem que o ensino obrigatorio era uma tyrannia exercida sobre os sagradas direitos dos pães de familia, contra a qual me rebellava, um ataque á liberdade de consciencia.

Conheço as excepções do § 1.° do artigo 5.°; mas embora. A regra geral, como affirmei, e um vexame.

Disse o sr. marquez de Ficalho — é necessario haver bons professores. É debaixo d’este ponto de vista justamente que bate o ponto principal da questão.

Apesar de não admittir o principio do ensino obrigatorio, entendo, todavia, que elle será menos inconveniente se da parte do estado se derem garantias sufficientes sobre a escolha do professorado.

Um dos homens de mais espirito, e um dos melhores pensadores d’esta assembléa, dizia-me, conversando, uma grande verdade, «o indifierentismo é o que mais receio e temo em Portugal». Effectivamente é assim.

Nós não entrâmos em geral nas grandes lutas intellectuaes que ha lá fôra, e a rasão é esse mesmo indifferentismo, cuja propaganda é notavel neste paiz: temos de lutar, portanto, contra esse inimigo poderoso a que se referia sensatamente o nosso collega!

Devo agora fazer uma declaração.

Não disse na sessão de hontem, nem nunca o direi que o nosso professorado está abaixo da sua missão. O que eu disse é que ha excepções; mas tambem não as marquei.

Sr. presidente, quando se trata de uma lei da importancia desta, é necessario garantir as cousas de modo que essas excepções não possam vir causar damno á sociedade!