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EXTRACTO DA SESSÃO DE 4 DE JULHO.

Presidencia do Em.mo Sr. Cardeal Patriarcha

Secretarios – os Srs.

Conde de Mello.

Conde da Louza (D. João). (Assistia o Sr. Ministro do Reino.)

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado á presença de 36 dignos Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a sessão. Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Secretario Conde de Mello deu conta da seguinte correspondencia:

Um officio do digno Par Duarte Leitão, participando que o estado de sua saude lhe não permitte assistir por agora ás sessões.

Para a secretaria.

- do Ministerio do Reino, acompanhando o authographo, já sanccionado, do Decreto de Côrtes Geraes (n.° 168). Para o archivo.

- do Ministerio da Guerra, satisfazendo a

Parte dos quisitos, de que pedira esclarecimentos o digno Par Conde de Thomar em requerimento de 8 de Junho proximo passado. Para a secretaria.

- do Ministerio das Obras Publicas, acompanhando 75 exemplares do Boletim n.° 4 do mesmo Ministerio.

Distribuiram-se.

- da Camara dos Srs. Deputados, acompanhando uma proposição de lei, que concede um predio nacional á Junta de Parochia de Algodres.

À commissão de fazenda.

- da mesma Camara, acompanhando outra proposição de lei, que confere á Camara de Pinhel um predio nacional.

À commissão de fazenda.

— da mesma Camara, acompanhando outra proposição de lei, concedendo, ao Barão da Saude a reforma correspondente á sua graduação.

A commissão de guerra.

— da mesma Camara, acompanhando outra proposição de lei, que fixa a dotação movel, e immovel do Rei, no presente reinado.

À commissão de fazenda.

- da mesma Camara, acompanhando uma proposição de lei, auctorisando o Governo a contrair o emprestimo de 400:000$000 réis sobre o imposto das estradas para a construcção da de Coimbra ao Porto, e outras

Às commissões de fazenda, e de administração.

— do Ministerio da Marinha, enviando, já sanccionado, o authographo do Decreto de Côrtes Geraes (n.° 169).

Para o archivo.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira — Chamo a attenção particular do Sr. Ministro do Reino sobre um artigo, publicado hoje em um periodico desta capital, em que transcreve do Diario do Pará a noticia de que alli havia chegado a galera portugueza Defensora, saída do Porto com 290 emigrados, dos quaes durante uma viagem de 27 dias haviam morrido 35, resultado de fome, sede e espancamentos.

Chamo pois a attenção especial do Sr. Ministro sobre este objecto.

Por muitas vezes se tem nesta Camara fallado nas atrocidades praticadas abordo dos navios que transportam emigrados: e no numero excessivo que conduzem. Esta ultima circumstancia deve, na minha opinião, ser attribuida em parte ao desleixo das authoridades, que não fazem a sua obrigação, evitando que as leis e regulamentos sobre este objecto sejam infringidos. O remedio que julgo necessario para que ellas cumpram com os seus deveres 6, que todas as vezes que houver repetição dos mesmos abusos, as authoridades que os consentirem, sejam immediatamente demittidas dos seus logares; procedendo-se depois como convier. Este é o primeiro expediente. Depois, é tambem preciso que as Côrtes votem uma medida legislativa, que, sem atacar o direito de cada um ir para onde quizer, evite os abusos. Ainda ha pouco tempo fallei nesta Camara sobre este objecto, e o Sr. Ministro da Marinha prometteu nomear uma commissão, a fim de preparar um projecto do lei, e os regulamentos convenientes para que os emigrados sejam bem tractados a bordo, e que os contractos feitos com elles tenham a devida execução. Para norma deste trabalho lembrarei que deve ser estudada a legislação ingleza, que de anno a anuo tem sido reformada para obviar a certas fraudes. Peço pois a attenção especial do Governo, para que, sem demora, haja de nomear essa commissão.

Ha mais de quinze annos que me occupo deste objecto, e nesta Camara apresentei um projecto de lei, que havendo ficado pendente, foi aproveitado pelo Sr. Campello, sendo Ministro da Marinha, publicando-o como regulamento; mas como este não teve a sancção legislativa, quasi que não tem tido execução: e continuam os embarques com os chamados contractos, que são unicamente feitos em proveito de algumas pessoas. Ainda ha dias dizia um jornal do norte, que em uma freguezia proxima de Valença, andavam individuos pelas aldêas affixando editaes, promettendo certas sommas do dinheiro aos camponezes que se alistassem para emigrarem para o Brasil. A prohibição de taes abusos está sempre na alçada das authoridades administrativas, e se ellas não põem obstaculos a isso, é porque são ineptas ou desleixadas, ou conniventes com os traficantes da escravatura branca: e em qualquer destes casos devem ser demittidas.

O Sr. Ministro do Reino disse que todas quantas providencias o Governo póde tomar para obstar a estes abusos, as tem tomado até agora, e assim tambem elle Sr. Ministro tem sido minuciosamente informado, o documentalmente instruido das medidas, das provisões, das cautelas, em fim, tomadas pelas auctoridades administrativas, tanto pelo que respeita aos individuos que embarcam para o Brasil, como dos mantimentos e capacidades dos navios; as quaes devem dar garantias áquelles que embarcam, de que o fazem sem detrimento da sua saude, e sem a falta das commodidades indispensaveis.

Que apesar, porém, das muitas e mui rigorosas investigações que se tem feito sobre outras queixas, e ainda mesmo sobre expedições que se tem feito, sem haver queixas contra ellas, e apesar de minuciosamente informado sempre do tudo que occorre a tal respeito, não o está com relação ao caso de que falla o digno Par; entretanto não duvida de que tenha acontecido o que o jornal refere, e o digno Par menciona; mas neste caso sabe-se, que a responsabilidade pertence toda aos capitães dos navios, que são elles de ordinario os que commettem esses abusos. (O Sr. Visconde de Sá — Peço a palavra.) Que bem se sabe, que é possivel receber o navio alguma gente, estando fora da localidade donde saiu, mais ou menos longo da costa, n'um ou outro ponto, e até em territorio estrangeiro, pois ainda ha pouco tempo aconteceu, que saindo de Caminha uma embarcação, guardadas as prescripções do regulamento policial, foi com-tudo receber depois um grande numero de pessoas, n'um ponto de estranho territorio, o que mostra que neste caso o responsavel é o capitão; e que tanto o Governo o reconheceu assim, que apenas teve noticia de similhante facto, mandou logo um vapôr a Vigo, para que intervindo convenientemente a auctoridade competente (o consul) se podesse apprehender o dito capitão, uma vez que se verificassem taes abusos; mas o caso é que o dito capitão escapou-se, saindo antes do tempo, sem levar despachos, nem os papeis que lhe eram precisos, deixando mesmo alguns individuos que deviam embarcar! Eis-aqui até que ponto se illudem as providencias e diligencias das auctoridades! Quem nos diz, que não aconteceria agora o mesmo? O Sr. Ministro diz que não póde proceder, como o digno Par quer, rapidamente contra as auctoridades administrativas, sem estar certo de que o abuso procedeu dellas; mas já diz que é muito provavel que não procedesse, porque de todas quantas diligencias tem feito até agora para examinar se ha a este respeito faltas commettidas pelas auctoridades administrativas, ainda não achou, e é por isso obrigado a crêr, sem se tornar agora accusador de individuos, que os capitães effectivamente são os unicos culpados destes abusos, que se estão commettendo, que muito nos envergonham, e que não menos nos commovem (apoiados),

Declarou que na parte que lhe compete procuraria averiguar verdadeiramente onde está o crime, e que o Governo faria da sua parte tudo quanto deve, para que o criminoso seja responsavel.

Que em quanto á nomeação da commissão, far-se-ha o que fôr possivel, no intervallo da sessão, e assim que o tempo o permitta; dizendo o mesmo quanto aos regulamentos, advertindo, porém, que está convencido do que, apesar disso, póde muitas vezes ainda acontecer, que algumas das diligencias das auctoridades sejam illudidas por estes convites particulares de saídas clandestinas. E muito difficil obstar a todos; um ou outro sairá; mas pelo que toca a fiscalisar o estado da embarcação; o dos individuos; se elles estão subjeitos ao recrutamento; se os menores tem licença de seus pais; se no navio ha mantimentos sufficientes e capazes, etc, tudo isso ha-de-se fazer, e -tem-se feito, porque no Porto a esse respeito precede-se com um rigor, o exactidão muito digna de louvor para as auctoridades que alli estão. E este é o motivo porque não lhe parece que se possa, ou deva culpar desde já as auctoridades, pois, por tudo que póde julgar dellas, a culpa não é sua se se deu esse facto.

O orador assegura ao digno Par, que as suas observações serão tomadas em consideração, posto que o Governo já tem tomado muitas providencias a tal respeito, as quaes não se podem dizer imiteis por isso mesmo que ellas de facto tem obstado a muitos abusos; mas não se obsta a todos, porque infelizmente parece-lhe que a alguns é impossivel; o que não deve obstar a que se redobrem as diligencias, e o Governo cumpra tudo que fôr do seu dever.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira — Não ha dúvida de que os capitães dos navios são os primeiros e os principaes culpados; tambem é certo que póde acontecer, que uma ou outra vez as auctoridades sejam illudidas, mas quando factos taes se repetem frequentes vezes no mesmo districto, então ha mais do que illusão (apoiados), então ha relaxação ou desleixo, ou quer-se fechar os olhos para não ver o que se passa!

O Sr. Ministro referio-se ao que occorreu com um navio que de Caminha foi para Vigo, e julga S. Ex.ª que as auctoridades não commetteram falta alguma em relação a esse acontecimento! Pois eu digo que tenho a convicção contrária, porque varias pessoas muito serias, e de muito credito me informaram, que as auctoridades locaes foram até conniventes! Eu não poderia dar as provas necessarias em justiça, mas tenho a convicção de que a convivencia existio, emquanto que as informações do Governo lhe vieram daquelles, que tinham interesse em occultar tudo, que os podesse comprometter; não tenho pois dúvida alguma em dizer, que ás vezes é necessario proceder promptamente contra certas auctoridades para exemplo das outras, e vou referir um facto que se póde applicar ao caso.

Havia antigamente uma grande rivalidade entre a ilha de S. Miguel e a ilha Terceira. Na de S. Miguel sobravam sempre os fundos publicos, ena Terceira faltavam; o Governo procurou muitas vezes fazer transmittir fundos da de S. Miguel para a Terceira, mas achava sempre a maior repugnancia da parte das auctoridades, chegando a ponto de insinuarem que, se taes transferencias se fizessem, poderiam ellas occasionar algum movimento popular.

Succedeu no anno do 1836 ou 1837 ser nomeado um Contador de fazenda para a ilha de S. Miguel, e no mesmo tempo ser preciso fazer-se a transferencia de oito contos para a Terceira, e como o Governo já tinha noticia da opposição que se fazia á remessa do dinheiro, declarou ao novo Contador, antes de partir de Lisboa, que Immediatamente que chegasse a Ponta Delgada havia de ser feita a transferencia ordenada; e que se na volta do navio o Governo não tivesse a noticia de que a operação estava feita, o Administrador geral, o Commandante militar, e elle Contador de fazenda, seriam demittidos sem a menor demora. Conhecida pelos interessados esta resolução terminante do Governo, a transferencia fez-se, e não houve mais novidade a tal respeito.

O Sr. Visconde de Castro — Sr. Presidente, levanto-me unicamente para defender uma Auctoridade do Porto; porque este facto, que refere o jornal do Pará, é relativo a um navio que dalli saiu.

Pelas datas vejo eu que o facto é recente; isto é já depois que alli se acha o novo Intendente de Marinha, que todos nós conhecemos. Eu tenho obrigação muito particular de levantar a minha voz a este respeito, porque estivo alguns mezes naquella cidade, e vi qual era o serviço que fazia este digno funcionário. Façam as outras auctoridades o que quizessem — é eu estou que as auctoridades do Porto hão de cumprir os seus deveres administrativos— não poderá sair pela barra do Porto navio, com maior numero de emigrados do que aquelle que a Lei lhe concede,

O Decreto a que se refere o digno Par, referendado pelo Sr. Campello, que Deos haja, estabeleceu que por cada cinco toneladas podia um navio levar dous passageiros: este é o regulamento que existe, o é este o regulamento que alli actualmente se executa. Nem póde deixar de executar-se pelos motivos que acabo do expôr. Por consequencia devemos por ora duvidar alguma cousa do que diz o jornal do Pará, menos em quanto á conducta do capitão do navio, que deve investigar-se para ser rigorosamente punido se o merecer.

Ora, é possivel que fosse o numero legal e que apezar disso morressem trinta o tantas pessoas: podia grassar tal molestia a bordo, que morresse ainda maior numero; mas entretanto, em quanto ao outro ponto, estou persuadido que as auctoridades do Porto cumpriram os seus deveres, principalmente estando á testa deste negocio o Intendente da Marinha, por quem me posso responsabilisar, pois vi presencialmente, e sei como elle cumpre a sua obrigação. Eu sei que elle não abandona um navio se não á pancada da barra.

Agora direi que, se alguma cousa ha que se deva alterar na legislação que existe, que é esse Decreto a que me referi, é para se tomarem algumas providencias, a fim do que este numero de passageiros não seja tão cego como é; dous passageiros por cada cinco toneladas póde ser muito, ou muito pouco. Pergunto eu: se o navio fôr abarrotado não poderá ser muito?... Se fôr a meia carga, ou em lastro, não poderá ser pouco?... De certo que sim. O regulamento nesta parte está deficiente, o eu tenho a pedir aos Srs. Ministros que, independentemente das diligencias mais urgentes que o caso pede, mandem rever esta disposição logo que o permittirem as circumstancias,

Em quanto á auctoridade a que me referi, disse aquillo que era do meu dever, e o que era tambem proprio da amisade.

O Sr. Ministro dos Negocios do Reino estima muito que o digno Par que acaba de Miar se explicasse a respeito da auctoridade da marinha no Porto como se explicou, porque na verdade é uma das auctoridades o Funccionarios do Governo que mais desejos tem, o mais diligencia faz, para satisfazer aos seus deveres, e não se poupa mesmo a nenhum sacrificio, nem a risco algum a que um homem se póde expôr (apoiados). Agora, quanto ás informações que, o digno Par o Sr. Visconde de Sá teve de Caminha, não nega que S. Ex.ª ás tivesse; sabe do certo que as que teve foram as que o digno Par disse, mas para satisfazer a S. Ex.ª disse tambem que, como Ministro, não deixou de andar cauteloso, desconfiando das informações locaes, não porque tivesse motivos para desconfiança individual de nenhuma auctoridade, mas porque lhe pareceu, considerando moralmente o negocio, que seria mais facil que se encobrissem umas a outras, do que descobrissem, por isso mandou ao Secretario do Governo civil do districto, que saisse de Vianna a diferentes localidades, a fim de obter informações acerca do facto; e que effectivamente elle foi a mais de uma localidade tirar informações sobre p procedimento que tinha havido a respeito daquelle palhabote que saiu de Caminha, e a que o digno Par acabava de alludir.

O Sr. Ministro tem obrigação de considerar sinceras e verdadeiras as informações que lhe deram; mas tambem não nega que essa mesma auctoridade, que esse mesmo funccionario que mandou investigar sobre o negocio, podesse ser illudido; o que quiz dizer ao digno Par foi, que não se contentou com as informações dadas pelas auctoridades residentes na localidade, mas que mandou um empregado publico de fora, a fim de obter informações. Não conhece outros meios que possa empregar, a fim de certificar-se da veracidade das informações que haja de receber.

Accrescentou que o que tinha dito da auctoridade de marinha, era do seu dever, e um tributo que pagava á verdade, dizer tambem do Governador civil do Porto, e auctoridades administrativas daquella cidade, pois faltaria ao que deve se se callasse sobre os bons serviços de uma auctoridade tão benemerita, se assim se não expressasse (apoiados).

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira — Não era da minha intenção, fazer censura alguma ás auctoridades civis, nem da marinha do Porto. O meu principal objecto consistia em recommendar ao Sr. Ministro a nomeação de uma commissão para preparar um projecto de lei sobre emigração, que possa ser apresentado ao Corpo Legislativo, porque este assumpto carece de provisões que não podem ser postas em pratica pelo Executivo, sem que tenham a sancção da Lei.

Em quanto ao que disse o Sr. Visconde de Castro, a respeito da relação da capacidade do navio, com o numero de emigrados que póde conduzir, não temos senão a adoptar a legislação ingleza, porque emigrando das ilhas britannicas para a America e outras partes do globo, vinte mil pessoas cada anno, e havendo individuos e sociedades que se empregam no negocio de os transportarem, e praticando-se nisto muitas fraudes, tem o Parlamento tractado de as evitar. É necessario, além disso, que os emigrados, quando chegam aos paizes estrangeiros, tenham a protecção dos consules de Portugal, e