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8 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

O Orador: - Emfim, a hora já vai adiantada e eu não quero de modo algum prejudicar os trabalhos que urge sejam votados.

Vozes: - Fale, fale.

O Orador: - No emtanto eu mio terminarei sem me referir ao que se está passando em vários pontos do país com as autoridades administrativas. Tenho aqui várias representações e cartas de velhos republicanos da província, onde se contam os factos mais extraordinários de cumplicidade entre as autoridades e os inimigos da Pátria.

Gomo não está presente o Sr. Ministro do Interior, eu peço a V. Exa., Sr. Ministro da Justiça, que lhe manifeste o descontentamento que vai pelas províncias, em vista da fraqueza e cumplicidade dos seus subordinados - os governadores civis e administradores de concelho. (Apoiados).

Se êle estivesse eu perguntar-lhe hia:

1.° Que uso se tem feito da lei contra os que, tendenciosamente, espalham boatos que perturbam a ordem pública, pretendendo assim atentar contra a vida e independência da República? (Apoiados).

2.° São de confiança do Govêrno todas as autoridades administrativas? Estão elas cumprindo as leis do seu país, na fidelidade que devem à República? (Apoiados).

Peço a V. Exa., no emtanto, que seja o meu intérprete junto do Sr. Ministro do Interior, para que êle proceda desde já contra aqueles que ao nosso perdão e á nossa "tolerância respondem com a insídia e a calúnia, procurando envolver os humildes numa luta que só os pode desgraçar ainda mais do que êles estão, pelo contacto dêsse clericalismo absorvente e destruidor, inimigo do Bem e da Verdade.

É necessário que todos os portugueses, desde o chefe do Estado até o mais humilde dos nossos correligionários, se convençam que é necessário defendermos o povo contra o jesuíta, a Pátria portuguesa contra Roma, as liberdades públicas contra a ignorância dogmatizada. (Apoiados).

Precisamos demonstrar que em Portugal, quem hoje manda não é o Papa, mas sim unicamente a Constituição que aqui votámos e as leis do Govêrno Provisório, que nesta sala foram tambêm sancioná-las. (Apoiados).

Por outro lado urge que todos nós façamos compreender aos indecisos portugueses que n ao se pode servir a dois senhores

Não se pode defender a República e defender ao mesmo tempo o inimigo dela.

Ah! pois quem não vê que dum lado está uma sociedade nova, que na luta se enobrece, e do outro lado uma casta que se agarra ao passado, na agonia duma queda sem exemplo e que será inevitável!

Quem não vê que nós combatemos na aurora contra um bando que procura vencer nas trevas duma noute sem termo!

No sacrifício e na dor, preparámos esta bela construção, que se inicia e prossegue triunfantemente. Não consintamos, pois, que a desmoronem os pedregulhos dêsse velho casarão que há mais dum século está em ruína e espalhando por toda a terra os seus destroços.

Mudaram os tempos e com êles mudaram tambêm as sociedades. Já não estamos nessa idade remota em que o famoso rei Teodorico rubricava os decretos com os cinco dedos molhados em sangue, por não saber ler nem escrever. (Apoiados).

Rojo a consciência colectiva tem uma aspiração muito diversa. Não a encantam já o fumo das fogueiras, onde se estorsam corpos humanos. E se algum braseiro acende ainda, não é o que faz rugir as carnes mas o que ferve a água de que sai o vapor que dá movimento às fábricas e faz silvar os locomoveis através dos continentes e os grandes transatlânticos que vão de pelo a pelo, aproximando os povos, na ânsia de maior harmonia, na esperança duma ventura mais completa, duma vida mais livre e mais perfeita.

Vou terminar, Sr. Presidente e Sr. Ministro da Justiça. Mas antes, eu quero aqui declarar bem alto o meu protesto contra aqueles que acompanham ou favorecem os desejos perversos dos que cá dentro e lá fora trabalham para destruir esta República tão ansiada e com uma vida já tam bela Eu sou ainda o que fui sempre: um defensor apaixonado da Verdade, um implacável inimigo dos que, á instrução e à liberdade para o povo, preferem a ignorância e a tirania, a fim de o conservarem na sujeição e na miséria.

Por isso eu não irei para onde se transija com o clericalismo. Ah! isso é que não! Jamais!

E porque? Porque entre nós, como na Franca de 1870, o maior inimigo da democracia, o mais implacável destruidor das garantias populares é aquele que, nos seus reptos tribunícios, Gambeta denunciava às multidões, nesta fórmula que adoptou e que há-de ficar na História:

- O clericahsmo, eis o inimigo.

Ao terminar o sen discurso, o orador foi calorosamente aplaudido e abraçado por quási todos os Srs. Deputados da Câmara.

O Sr. Ministro da Justiça (António Macieira): - Peço a palavra.

O Sr. Presidente: --Não sabia do que se tratava, quando o Sr. Deputado pediu a palavra, para se dirigir ao Sr. Ministro da Justiça. Mas consulto a Câmara.

Vozes: - Fale, fale.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (António Macieira): - Sr. Presidente: o Sr. Deputado Tomás da Fonseca acaba de chamar a atenção do Ministro da Justiça para factos verdadeiramente extraordinários, e que eu inteiramente desconhecia.

Trazendo à Câmara essas elucidações, prestou grande serviço á República porque, pela sua voz, o país ficou sabendo mais uma vez que há alguns padres, verdadeiramente miseráveis que, desconhecendo inteiramente a missão a que os obriga o seu sacerdócio, descem ao mais vil procedimento E é armados cora essa grande bagagem que vem contra a República despedir os ódios e as suas animadversões, como se porventura pudessem ter moralidade para atacar a República aqueles que procedem por êsse modo despresível!

O Sr. Deputado pôs nas suas afirmações toda aquela solicitude que deu ao belo e patriótico folheto Cartilha do Povo, que foi distribuído aos milhares por todo o país, fazendo a defesa da obra republicana.

E creio bem que contra êsse mesmo folheto é que foi distribuído êsse outro, a que S. Exa. se referiu, porque de facto êle é a tentativa de contra-mina contra a patriótica acção que S. Exa. no seu desenvolveu.

Os factos que S. Exa. veio trazer à Câmara, as informações que deu ao Ministro da Justiça, demonstram mais uma vez a necessidade de defender a obra comum da Re pública pela forma mais tenaz e mais patriótica.

Demonstram que de facto, apesar de diferentes agrupamentos políticos estarem constituídos, há uma obra que é comum de todos os partidos, que é a obra da pátria portuguesa, a qual é inteiramente indispensável defender com unhas e dentes.