24 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 4
respectivas soberanias e que se deseja continuem a viver em paz e amizade.
A recentíssima visita que acabo de fazer a Espanha a convite do Generalíssimo Franco, por tão vincada, mal tem de ser aludida as provas de excepcional deferência que de todos os lados me chegaram e o calor das manifestações populares, apenas me confirmaram como os Governos das duas Nações têm bem interpretado o sentir comum e se conservam, fiéis a uma política de fraterna solidariedade que mantém a Península como sólido e exemplar bastião da defesa do Ocidente.
Ao período mais alto das comemorações do 5.º Centenário da Morte do Infante Dom Henrique, que o ano passado celebrámos, não quis também o Brasil deixar de se associar, na pessoa do seu Presidente, o Dr. Kubitschek de Oliveira, no espírito da comunidade existente entre os dois países. O esplendor de que muitas sole-nidades do programa se revestiram, o alto valor das publicações editadas, o entusiasmo e o sentimento do País ao assistir às homenagens prestadas ao Infante e aos descobridores pelas Marinhas, estrangeiras e pelos altos representantes dos seus governos, culminaram nesse soleníssimo acto do encerramento das comemorações no Mosteiro da Batalha. Diante dos túmulos dos Reis de Avis e da "Ínclita Geração", junto do Infante que se diria nos escutava, com o pensamento na obra ingente das descobertas e da evangelização e ao mesmo tempo nas ameaças desencadeadas às Terras Portuguesas de além-mar, uma só palavra parecia ouvir-se no recolhimento que empolgava as almas. Meu Príncipe, nós continuamos.
E assim tem sido- o martírio e trabalhos dos colonos de Angola agarrados à terra e à Mãe-Pátria, e os dos soldados que reintegram a soberania com suas vidas, ao mesmo tempo que protegem e amparam as populações extraviadas, têm de receber aqui, no seio da representação nacional, como voz autêntica do Povo, o testemunho do nosso apreço e do nosso orgulho. A um ou outro, dentre nós, que porventura seja tentado a avaliar sobretudo as dificuldades de tão importante causa, havemos de dar esta resposta, não é tempo de pesar os sacrifícios, mas só de medir a extensão do dever.
A assistência aplaudiu calorosamente e, de pé, aclamou o Sr. Presidente da República e, em seguida, o Sr. Presidente do Conselho.
O Sr. Presidente da Assembleia Nacional: - Em nome do Chefe do Estado, tem a palavra o Sr. Deputado António Augusto Gonçalves Rodrigues para, em nome das duas Câmaras, responder à mensagem presidencial.
O Sr Deputado António Augusto Gonçalves Rodrigues: - Sr. Presidente da República- acaba V. Exa. de abrir solenemente a VIII Legislatura da Assembleia Nacional e da Câmara Corporativa. E fê-lo proferindo palavras reveladoras de tão sereno equilíbrio e visão política e repassadas de tão fundo patriotismo que decerto despertaram no País, que nos ouve, uma vibração comovida de apreço e orgulho.
Regressou V. Exa. há dias de uma visita à nação vizinha, que foi mais um alto serviço que a Nação lhe ficou devendo. Recebido com o carinho e rodeado das atenções que sempre foram timbre da hospitalidade espanhola, esta visita distinguiu-se pelo singular calor do afecto fraternal que há 25 anos une, na solidariedade dos ideais, os dois povos da Península; afecto alicerçado em realidades políticas que confirmam com nitidez cada vez maior o valor inter- nacional desta zona de amistosa concórdia sabiamente criada pelo Pacto Peninsular.
Nunca, na história recente de Portugal, os órgãos de representação nacional se reuniram em condições de tão dramática gravidade para os destinos do País. Uma conjura satânica, aproveitando a debilidade cultural das defesas do Ocidente ou colhendo benefícios de certas e mal avisadas políticas de oportunismo amoral, iludindo com estribilhos ocos multidões que fecham os olhos à evidência e tapam os ouvidos às razões, provocou em Angola acontecimentos que todos conhecemos. A Nação Portuguesa, ajustando rapidamente o seu dispositivo interno às exigências da defesa intransigente que o sentimento popular reclamava, reagiu com natural vigor. O espectáculo de um pequeno povo de recursos limitados que se recusa a seguir o exemplo alheio e, em vez de recuar sob o peso dos golpes iniciais, se refaz, passa ao ataque e leva de vencida os agentes internos da vasta conjura exterior; se escandalizou uns e surpreendeu muitos, deu-nos a certeza consoladora de que as energias morais de que se alimentam as pátrias continuavam felizmente intactas entre nós.
É uso hoje invocar para as renúncias e abdicações mais injustificadas como pretexto ou desculpa uma frase feita de larga e tendenciosa circulação internacional. Um pretenso vento da história, mesmo quando ainda não passava de amena brisa, teria levado certos povos a abandonar a uma ordem política instável, quando não ao caos, territórios sobre os quais exerciam domínio político e aos quais deviam protecção moral, passando-lhes certidões de maturidade que os acontecimentos cada dia estão provando ter sido prematura e arriscada emancipação.
Esse mesmo vento soprou com violência inaudita em Angola, como vaga ululante de primitivismo irracional. Surpreendeu a, muitos, repito, a dura resistência moral e material que imediatamente se lhe opôs. Não nos surpreendeu a nós. É que a submissão a este novo dogma dos nacionalismos afro-asiáticos é contra a natureza do português, que sempre actuou mais como factor determinante do que como determinado. Ele não ignora as fatalidades inamovíveis das situações geográficas, económicas e outras a que os povos se encontram entregues como quem da Providência recebe os poucos ou muitos talentos da parábola evangélica. O nosso povo já traduziu o facto na síntese magistral do provérbio que diz que "o homem põe e Deus dispõe". E sabendo que o peso dos fenómenos materiais por vezes esmaga inelutàvelmente os mais veementes desejos e esforços humanos, sabe também que isso não constitui uma lei cósmica e que o homem constrói na Terra o seu destino à custa da virtude e do suor diário. Ao longo de oito séculos de experiência colectiva sabemos ser da essência da nossa história a negação sistemática e formal deste determinismo a que tantos se submetem na nossa época. O português superou sempre a geografia e historiou largos painéis na evolução das sociedades humanas. Como, de outro modo, se manteria intacto na sua pequena casa lusitana, como a engrandeceria através dos séculos, se algum dia se tivesse detido a considerar os falaciosos argumentos desta falsa filosofia? Trata-se de um aspecto da guerra psicológica que tende apenas a paralisar em cada um de nós as fontes da energia actuante e redentora e que só pode impressionar espíritos débeis ou incultos.
Quantos dos que hoje assim peroram terão beneficiado desta sadia indiferença do português perante o embate das forças naturais! Evocou V. Exa. a um centenário que despertou no mundo culto demonstrações