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308 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 37

E preciso encarar o problema com decisão e também com sensibilidade política. Um escol de carácter local pode representar factor poderoso no equilíbrio político e social do nosso país, além de constitua grande reserva de elementos, escol insubstituível, onde se poderiam vir a recrutar muitos dos grandes servidores da Nação.

2. Vai o Estado injectando de obras a província, num esforço a que é preciso fazer justiça, esforço enorme, tenaz, persistente. Mas a vida local agoniza, à míngua de escóis estáveis, e as autarquias continuam quase indigentes, face às tarefas que delas se reclamam e que devem cumpra. No Parecer sobre as Contas Gerais do Estado de 1968, no volume respeitante à metrópole (Lisboa, Imprensa Nacional, 1960), a Assembleia Nacional fez uma incisava referência às «Pressões regionais» (pp VI e VII), como factor «perceptível há muitos anos» que «transparece, porém, mais intenso e clamoroso nos últimos tempos e adquiriu até vigor que surpreende em certos casos». Acrescenta o parecer.

Recentes medidas legislativas e financeiras procuram enfrentar problemas instantes, como os relativos ao abastecimento de água e salubridade, caminhos e estradas regionais, electrificação e outros. E embora se considere viável, com recursos financeiros visíveis, executar um plano de melhorias locais, a grandeza do problema ainda não é de molde a poder considerá-lo resolvido num próximo futuro - sobretudo quando se verifica que muitas autarquias locais não dispõem de receitas adequadas a realização de projectos indispensáveis ao bem-estar e progresso nas condições de vida dos povos que administram.
Têm, pois, os recursos do Estado de suprir as deficiências locais de modo a evitar que o País se transforme num retalho de zonas ricas e de zonas pobres, de regiões dotadas com o indispensável à vida e ao progresso e de zonas em que, por deficiência de meios financeiros, se perpetuam rudimentares condições higiénicas e outras.
Todas estas circunstâncias podem transformar-se, com o tempo, num factor político que enfraqueça a unidade nacional e leve a reclamações e queixumes, aliás já audíveis naquelas áreas aonde ainda não foi possível levar o sopro renovador que caracteriza a política nacional.

Não cabe no âmbito da iniciativa parlamentar acudir às dificuldades regionais atrás referidas, mas apontam-se, neste relatório sucinto, para acentuar as incidências que porventura manifestem na decadência da vida local tal como havia sido notado, já em 1957, nas conclusões de exaustivo ciclo de trabalhos do Centro de Estudos Político-Sociais.

Como células vivas do corpo da Nação, impõe-se combater tudo aquilo que possa tender ao enfraquecimento das nossas autarquias, designadamente através de uma planificação económica com base regional. E, se foram a concentração da indústria e a procura de lugares mais bem remunerados ou de uma vida mais confortável e atraente que arrastaram as populações para os grandes centros, há que promover a desconcentração industrial, realizar maior descentralização dos serviços públicos, dotar as localidades com um mínimo de atractivos e de conforto, valorizar, o mais possível, a posição política dos municípios (Problemas de Administração Local, edição do Centro de Estudos Político-Sociais, Lisboa, 1957, pp 557 e 558).

3. No presente projecto de lei alinham-se princípios gerais, em que poderá assentar uma regulamentação cuidada é criteriosa do Governo. E preciso romper, abrir caminho. Nada mais se pretendeu do que elaborar algumas bases gerais, segundo as quais se poderá porventura processar, após indispensável regulamentação, certo revigoramento da vida local, bem como a dignificação das autarquias, que urge transformar em elementos válidos e dinâmicos da política nacional. E por sabermos corresponderem a um anseio do País se enunciam sob a forma de projecto de lei.
Quer queiramos ou não, grande realidade política está ali, nas autarquias, naqueles pedaços de tema, onde vivem e sofrem almas simples, cujos horizontes reduzidos lhes ampliam, na diversificação de perspectivas, os problemas e as ansiedades.
Nos grandes meios vivem-se, em geral, as abstracções porque todos, no fim de contas, mais ou menos deixamos enlear-nos. Pode gritai-se por uma doutrina, agitar-se uma bandeira política, pode, enfim, criar-se grande barafunda à volta desta ou daquela personalidade. Na terra, não! Os problemas agigantam-se à medida que o horizonte diminui, as perspectivas transformam-se inteiramente, e quase tudo gira ao redor de problemas concretos, comezinhos, imediatos.
Há uma lei de cartografia segundo a qual a nitidez da carta está na razão inversa da grandeza da escala. Quanto maior for a escala, menor haverá de ser a nitidez do mapa. Esta lei é também exactíssima para se compreender a verdadeira grandeza dos problemas locais à medida que diminui a escala, assumem proporções maiores os assuntos e os conflitos. E se, no grande mundo, ou no mapa de grande escala, pormenores diversos se diluem ou se apagam, nos pequenos mundos eles emergem, avolumam-se, tomam proporções notórias.
Aspecto significativo todos os exércitos actuam à base de cartas de pequena escala, pois só assim podem conhecer e reconhecer o terreno que pisam, os acidentes que os espetam, as cotas traiçoeiras que porventura se ocultem aqui ou além.
Na vida social há-de ser o mesmo, se quisermos trabalhar com segurança e com eficácia. Temos de ser realistas, e o real está ali, onde os homens no geral entendem que mais vale uma boa água de rega e lima do que toda uma filosofia política, e que mais vale um fontanário a tempo e horas, ou um caminho de carro ao pé da porta, do que dez discursos dos melhores discursadores.
Mas, assim como através de uma pequena fresta, ou de uma nesga de janela, se pode contemplar e abarcar a imensidade do céu, também numa pequena teria se têm a percepção e a consciência nítidas de toda a grandeza do Mundo e dos graves problemas da Pátria. A vida local é na verdade, o espelho do Mundo. A nossa gente diz «quem vê o seu povo vê o Mundo todo».

4. Indeclinável dever do Estado é fixar o homem à terra ligá-lo a ela por vínculos sólidos e duradouros. O sentido de pátria pequena constitui o cerne do melhor patriotismo. O homem preso à sua terra por vínculos morais familiares sociais e patrimoniais é elemento são e factor de ordem. O mesmo não acontecerá com o nómada, o desgarrado, o desenraizado, desprendido dos limites que na sua terra o envolveriam. Por outro lado, o localismo, o amor da terra, o bairrismo, são forças actuantes e muito poderosas. É dever do Estado aproveitá-las em toda a sua plenitude.