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REPUBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

SUPLEMENTO AO N.º 126

ANO DE 1942 18 DE FEVEREIRO

II LEGISLATURA

CÂMARA CORPORATIVA

Aditamento ao parecer sabre o projecto de lei n.º 170, que revoga o § 2.º do artigo 5.º do decreto n.º 28:003, de 31 de Agosto de 1937, considerando-se em pleno vigor a doutrina do artigo único do decreto-lei n.º 23:514, de 22 de Janeiro de 1934

l. No parecer desta Câmara acerca do projecto de lei n.º 170, da autoria do ilustre Deputado Dr. João Mendes da Costa Amaral, publicado em suplemento ao Diário das Sessões n.º 122, escreveu-se, por equívoco, que a primeira legislatura da Assemblea Nacional se iniciou em 10 de Janeiro de 1934, quando a verdade é ter-se ela iniciado em 10 de Janeiro de 1935.

Daí o invocar-se, para afastar a aplicação do artigo 141.º da Constituição Política, o facto -e só o facto- de o decreto-lei n.º 23:514, de 22 de Janeiro de 1934, ter sido publicado «já depois de reunida a Assemblea Nacional».

Vem, por isso, a Câmara Corporativa rectificar, nesta parte, aquele parecer; não, deve notar-se desde já, quanto às conclusões, mas apenas quanto aos fundamentos.

E, assim, preguntará de novo: o artigo 5.º, § 2.º, do decreto n.º 28:003, de 3 de Agosto de .1937, dever-se-á ou não considerar abrangido pelo disposto no artigo 141.º da Constituição?

A resposta continua a ser negativa.

Nos termos deste artigo

... as leis e decretos-leis referidos nó artigo anterior (as leis e decretos com força de lei publicados até à primeira reunião da Assemblea Nacional) podem . . ser revogados por decretos regulamentares em tudo que

Quere dizer, para que o artigo 5.º, § 2.º, do decreto n.º 28:003 pudesse revogar o decreto-lei n.º 23:514 seria necessário que se referisse exclusivamente à organização interna dos serviços da Academia Nacional de Belas Artes e sem de qualquer forma alterar a situação jurídica dos particulares.

Ora a modificação introduzida no regime do decreto-lei n.º 23:514 pelo decreto n.º 28:003 altera, sem dúvida, a situação jurídica dos particulares.

Com efeito, enquanto pelo regime do decreto-lei os artistas, eruditos , críticos de arte residentes em Lisboa podiam ser eleitos sócios da Academia, pelo regime do decreto regulamentar só o poderão ser os artistas, eruditos e críticos de arte residentes fora de Lisboa.

E, sendo assim, não viram aqueles alterada para menos a sua situação jurídica, porque restringida em matéria de ilegibilidade. Não tocará na situação jurídica de um particular o preceito que o torna inapto para ocupar determinado cargo, que o torna inelegível para dadas funções?

Não se trata, por certo, de extinção de situações jurídicas individuais, de situações já concretizadas, de direitos subjectivos perfeitos, a que correspondam obrigações de conteúdo correlativo; mas parece-nos claro que a situação jurídica dos particulares residentes em Lisboa foi alterada pelo decreto n.º 28:003 qualquer que seja o seu valor, o seu renome artístico, deixaram de poder ser eleitos sócios- correspondentes da Academia Nacional de Belas Artes.

Quando no artigo 141.º da Constituição se fala em alterar a situação jurídica dos particulares visa-se toda e qualquer alteração, toque ela em direitos stricto sensu ou em simples expectativas ou possibilidades.

A expressão usada pelo legislador constituinte deve atribuir-se o seu mais amplo significado, e não um signi-

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ficado restrito que a confunda, por exemplo, com esta outra: «e não ofenda direitos dos particulares».

O que se pretendeu foi conceder poder revogatório apenas aos preceitos que, tocando na organização interna dos serviços, em cousa alguma alterem a situação que das leis ou decretos-leis revogados resulte, quer para os particulares, quer, quanto ao respectivo estatuto, para os funcionários.

2. Acrescentaremos ainda que a Assemblea Nacional, na vigência do texto primitivo do artigo 123.º, se pronunciou no sentido de o § 1.º abranger a ilegalidade dos decretos regulamentares, como se vê do seguinte aviso, publicado no Diário do Governo, 1.ª série, de 10 de Fevereiro de 1936:

Faço saber que a Assemblea Nacional, em sessão de 8 de Janeiro, usando do poder que lhe confere o § 1.º do artigo 123.º da Constituição, resolveu declarar que é inconstitucional a disposição do artigo 8.º do decreto n.º 26:148, de 14 de Dezembro de 1935, na parte em que incluiu no Conselho Superior da Armada o director geral da marinha.

Palácio da Assemblea Nacional, 1 de Fevereiro de 1936. - O Presidente da Assemblea Nacional, José Alberto dos Reis.

Procedeu-se de modo análogo ao estabelecido na segunda parte do § 3.º do artigo 109.º da «Constituição, segundo o qual

... se a Assemblea Nacional não ratificar o decreto-lei, deixará este de vigorar desde o dia em que sair no Diário do Governo o respectivo aviso, expedido pelo Presidente da Assemblea Nacional.

1 Assim, se é exacto ter sido a Assemblea Nacional chamada, polo projecto de lei n.º 170, a usar pela primeira vez da competência atribuída polo § único do artigo 123.º da Constituição, já o não seria só quiséssemos significar que, pela primeira voz, na vigência da Constituição de 1033, era a mesma Assemblea chamada a pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade de preceitos regulamentares ilegais, competência esta conferida, até à entrada em vigor da lei n.º 1:908, de 18 de Dezembro de 1937, pelos preceitos, aliás diversos, contidos nos §§ 1.º e 2.º do artigo 123.º

2 Para a discussão na Assemblea Nacional, veja-se Diário das Sessões de 18 de Dezembro de 1935 e 8 e 9 de Janeiro de 1936.

Não julga a Câmara Corporativa que em 1936 tenha seguido o melhor caminho, e antes se inclina dissemo-lo já - para o projecto de lei.

É que, como se frisou no parecer de 7 de Fevereiro, compete à Assemblea Nacional determinar os efeitos da inconstitucionalidade, e, por isso, de certo modo lhe cabe legislar, uma vez reconhecida a inconstitucionalidade orgânica ou formal de qualquer diploma promulgado pelo Presidente da República.

Na verdade, não se trata sómente de declarar inconstitucional este ou aquele diploma, este ou aquele preceito, retirando-lhe vigor apenas para o futuro, como sucede com a não ratificação dos decretos-leis, ou anulando-o ab initio; mas ainda, repetimos, de determinar livremente os efeitos da inconstitucionalidade, respeitados que sejam os casos julgados.

Será, portanto, legítimo generalizar à. declaração de inconstitucionalidade o regime especialíssimo da não ratificação dos decretos-leis? E não se transformam estes em propostas de lei quando a ratificação seja concedida com emendas?

A Assemblea Nacional, em 1936, votou uma moção, que serviu de base ao aviso acima, transcrito.

Supõe a Câmara Corporativa, de harmonia, aliás, com a opinião defendida pelo então ilustre Deputado Prof. Dr. Mário de Figueiredo que o meio constitucional de que o Governo e os Deputados devem usar, ao tomarem a iniciativa do reconhecimento da inconstitucionalidade orgânica ou formal dos diplomas promulgados pelo Presidente da República, é, respectivamente, a proposta ou projecto de lei, como, parece, o entenderam agora a Presidência da Assemblea Nacional e a comissão a que se refere o § único do artigo 97.º da Constituição.

Palácio da Assemblea Nacional e Sala das Sessões da Secção de Belas Artes da Câmara Corporativa, 18 de Fevereiro de 1942.

Domingos Fezas Vital (relator).
Afonso de Melo Pinto Veloso.
Reinaldo dos Santos.
Samuel Diniz.
Ivo Cruz.
Porfírio Pardal Monteiro.

1 Diário das Sessões de 9 de Janeiro de 1936.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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