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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES

4.º SUPLEMERTO AO N.º 132

ANO DE 1948 4 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

IV LEGISLATURA

CONTAS GERAIS DO ESTADO DE 1946

Parecer da comissão encarregada de apreciar as contas públicas

(Artigo 91.º de Constituição)

INTRODUÇÃO

l. Depois de publicados os dois volumes que analisaram a nossa vida financeira até fins de 1936, este é o décimo parecer apresentado à Assembleia Nacional sobre as Contas Gerais do Estado.
Procurou-se nesta já longa série de anotações à vida portuguesa dar ao País uma ideia geral do curso dos acontecimentos públicos, de ordem política, económica e financeira, desenrolados nas últimas décadas, e ligá-los com os do passado. O leitor estudioso facilmente poderá extrair das cifras e dos comentários que as acompanham as causas que mais enfraqueceram a vida nacional nas últimas dezenas de anos e as razões profundas dos dois grandes abalos que perturbaram o Pais neste século - a revolução de 5 de Outubro de 1910 e o movimento de 28 de Maio de 1926.
O espírito atento pode perscrutar nas cinzas das grandes agitações e controvérsias dos últimos cem anos os desequilíbrios e as insuficiências económicas e financeiras de maior relevo. Esses desequilíbrios e insuficiências ou derivaram da falta de experiência e de saber, ou de energia necessária para coibir os abusos que se insinuam periodicamente na governação pública, e são na verdade muitas vezes a resultante de falhas na economia nacional que deveriam ter sido remediadas ou supridas, gradualmente, com os anos.
Na história de um povo a pouquidão de recursos financeiros é sempre motivo de mal-estar que se traduz em muitos aspectos. Tem influência, não apenas na administração dos Governos, com suas variadas ramificações, mas também se projecta intensamente na própria .vida de cada um. De onde resulta que comentar a vida financeira de uma nação é indirectamente comentar a sua vida política e até o modo de ser ou de agir das actividades que a compõem, quer elas estejam ligadas aos serviços do Estado, quer exerçam pressão sobre a vida social e económica.
Não pode ser feito um juízo conveniente e sério das Contas Gerais do Estado sem descer à minúcia da vida dos seus serviços, dos gastos e rendimentos em trabalho útil, e não se pode ter noção aproximada da carga tribu-

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tária - das receitas - sem esmiuçar e decompor a matéria tributável sobre que ela recai e que a suporta.
Destas duas proposições tem resultado a necessidade de longos comentários sobre assuntos que parece deverem transcender o âmbito destes relatórios - como a série de apêndices sobre o parcelamento e concentração da propriedade rústica; o problema da energia; a importância dos rios portugueses; os transportes aéreos; os melhoramentos rurais; a organização corporativa; a situação dos municípios; a riqueza e pobreza do Pais; a assistência e saúde pública; a instalação dos órgãos do Estado, e muitos outros problemas discutidos com certo relevo e extensão.
Periòdicamente se escreve aqui que nunca houve nem há intuito de emitir opiniões definitivas sobre as matérias tratadas.
Governar pressupõe tolerância, equidade, contemporização e respeito pela opinião dos outros dentro dos princípios da autoridade e da lei. Os assuntos difíceis que de vez enquando exigem a profunda atenção de quem governa ganham muito com o serem postos à luz do dia; tornam-se mais luminosas as soluções, porque podem ser esclarecidas por factos e provocar a utilização de elementos porventura desconhecidos.
Resolvê-los apenas à luz de um critério unilateral intelectualmente, inadaptado às realidades da vida, tanto no seu aspecto material como moral, conduz muitas vezes a erros que se repercutem angustiosamente nas actividades do País, no presente e no futuro.

A obra dos últimos vinte anos

2. Operaram-se, nos últimos vinte anos profundas modificações na vida portuguesa. Muitos daqueles que viram no movimento de 28 de Maio não apenas revolução igual a tantas outras de dolorosa memória, mas um movimento de regeneração, sabiam bem que um longo passado de política anárquica e turbulenta, embebida de paixões desvairadas quase sempre, não se apagaria em meia dúzia ou mesmo numa dúzia de anos.
As lutas, sem grandeza, nem utilidade, haviam criado vigorosas raízes na decadência nacional. Elas diziam apenas respeito, muitas vezes, à ambição ou vaidades de pessoas ou de grupos e esqueciam quase sempre os profundos anseios de um povo paciente, trabalhador e probo. E não era em poucos anos que a poeira de velhas tradições poderia desaparecer sob o impulso forte de uma reacção, por mais poderosa que se apresentasse.
O exame retrospectivo dos últimos vinte anos de trabalhos apresenta à vista de todos um activo de realizações digno de ser apreciado na sua verdadeira grandeza e sentido. O Pais, indemne e corajosamente, enfrentou ou sofreu a repercussão de terríveis calamidades, catástrofes económicas mundiais, guerras destruidoras, quase apocalípticas, desavenças mortíferas e angustiosas em países amigos, crises morais e materiais por todo o Globo, coisas que por si só arruinaram o labor de muitos séculos. E pôde, apesar de tudo, desenvolver-se internamente, numa série de melhorias, visíveis a todos, e aperfeiçoar actividades que outrora vegetavam ao sabor de acontecimentos dolorosos para a própria dignidade nacional.
Querer negar o progresso realizado é querer ser cego; é fechar os olhos às realidades; é esquecer o que éramos e o que somos, tanto no tablado da vida internacional, em política por exemplo, como na própria vida interna.
Ninguém o pode negar e ninguém o deve negar. Não o negam estes pareceres, que têm como objectivo fundamental alhear-se de todas as tendências e ambições políticas ou pessoais e extrair do amontoado dos factos e dos acontecimentos uma resultante que permita formular juízos sobre a acção governativa e estabelecer regras sobre actuações futuras. As críticas que aqui se documentam têm o sentido alto de louvar e de condenar medidas ou providências que mereçam ser defendidas ou não.
Na obra realizada nos últimos anos há um pouco de tudo - com imparcialidade, tudo ou quase tudo aqui tem sido apontado. E sem que haja, da parte dos que têm tido a seu cargo a ingrata e laboriosa tarefa de apreciar as Contas do Estado, qualquer ressaibo de vaidade ou amor-próprio a louvar ou a condenar, deve dizer-se que, se se tivessem tomado providências ou medidas sugeridas nestes pareceres, poderiam ter-se evitado erros, melhorado apreciavelmente o desenvolvimento económico do País e impedido abusos que geram o desassossego.
Mas governar é arte difícil, talvez a mais difícil de todas as actividades que foi dado ao homem poder exercer.
Ela interfere com a variada gama de interesses e sentimentos humanos e nunca houve nem poderá haver unanimidade sobre os actos de quem governa. Muitas vezes as obras não se realizam com a brevidade necessária, outras vezes toleram-se coisas que circunstâncias ponderosas impedem de evitar, e até se tomam resoluções ou publicam medidas que não se adaptam aos ideais ou até aos princípios de quem as referenda.
Foi assim no passado, em todos os países, e há-de acontecer outro tanto no futuro em todos os regimes. Encontrar uma linha média, que moderadamente procure conciliar as. melhores opiniões que conduzem ao bem comum, ainda que para isso seja necessário amarfanhar tendências intelectuais, tal parece ser norma segura na arte de conduzir os povos.
Não se esquece tudo isto, nem se desconhecem as dificuldades dos tempos, mas também se não podem pôr de parte as suas exigências e imposições.
A engrenagem burocrática já era no passado uma coisa complexa. Com a intervenção do Estado, cada vez mais acentuada na actividade da Nação, a influência das decisões governativas tornou-se mais forte na vida de cada um. Os serviços do Estado, nas suas variadíssimas ramificações, exercem hoje sobre o País uma acção que pode levar à própria ruína ou descrédito de um regime político, se não for cuidadosamente orientada.
A moralização, o rendimento e a competência da máquina do Estado é, por estas razões, uma das primeiras necessidades da vida dos povos nos estados modernos.

Os objectivos do parecer das contas

3, Há quem se surpreenda um pouco com o sentido objectivo, essencialmente económico e financeiro, de grande parte dos comentários destes pareceres e deseje que eles se estendam com maior minúcia a outros aspectos da vida governativa, como, por exemplo, a eficiência e despesas das forças armadas, a orientação geral da política externa, o rendimento dos serviços da justiça, a ordem pública e os seus reflexos na vida do País e ainda outras questões de interesse nacional.
Deve notar-se, porém, que um parecer sobre contas públicas não pode significar fiscalização completa sobre todos os aspectos da vida administrativa. À parte a magnitude e a complexidade que modernamente representa a engrenagem do Estado, não é possível à reduzida comissão de poucas pessoas conhecer em minúcia todos os serviços, e teriam de ser necessariamente incompletos os juízos que porventura houvessem de ser feitos sobre todos eles. Mas quem tiver lido com atenção o que se tem escrito sobre o significado de verbas e serviços há-de certamente ter notado a intenção de assinalar aqui e além reservas

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ou indicações sobre a conveniência de reduzir verbas, de acelerar a resolução de assuntos que porventura se arrastem anormalmente e de apontar deficiências que andam no espírito da opinião pública e que precisam de ser corrigidas de modo a tornar respeitados os serviços, quer eles digam respeito ao interesse superior da justiça, quer se refiram à defesa do País, ou à educação nacional, saúde e assistência ou a qualquer outra modalidade do governo do Estado.
Há, porém, um ponto que precisa de ser periodicamente vincado - e esse é o da ordem pública.
Portugal sofreu longos anos da agitação política, nas ruas e nos espíritos, que encontrava sua exteriorização violenta em motins, desordens e abalos, de gravíssimas consequências na vida financeira e política. Já se computaram noutro lugar, e apenas na vigência das contas públicas da actual situação, as quantias despendidas com as medidas que foi necessário adoptar para vencer desordens revolucionárias há cerca de quinze a dezoito anos.
Embora no orçamento as somas então gastas representem verbas apreciáveis, elas não podem comparar-se com os prejuízos de ordem moral e material que alterações da ordem pública trouxeram e podem trazer ao País.
A obra realizada nas duas últimas décadas em comparação com o que se fez anteriormente só foi possível porque o Pais vive há dezassete ou dezoito anos numa era de paz interna que, em conturbados tempos de agitação universal, constitui exemplo de dignidade cívica para um mundo irrequieto e abalado por bem graves e profundas dissenções políticas.
É absolutamente indispensável que esse período de paz interna se mantenha no futuro.
Nunca será possível realizar eficazmente obra perdurável e definitiva com os recursos próprios, limitados naturalmente pelas disponibilidades nacionais, se de novo reentrarmos nos hábitos de agitação perturbadora que caracterizou a vida portuguesa durante tantos anos.
A obra que este país ainda tem de executar em largos domínios da economia industrial e agrícola é daquelas que fariam recuar gigantes, porque envolvem modificações profundas na própria mentalidade nacional. Não se circunscreve apenas, e nisso reside o engano de muita gente, a equipar melhor as fábricas e a dotar a agricultura com melhores instrumentos de trabalho. Tudo isso é mero corolário do progresso material e científico dos tempos que correm e das suas exigências fundamentais. A revolução a operar no País deve tender a adaptar a mentalidade nacional ao melhor uso desses instrumentos de progresso, tanto no ponto de vista económico, de rendimento material, como no da distribuição dos resultados obtidos.
Largas áreas de terreno inaproveitadas ou mal aproveitadas por falta de capital de exploração dos seus detentores, ou por outras razões, constituem, por exemplo, um anacronismo nesta era de aumento constante da população e de insuficiência de produtos agrícolas. Fábricas ou instrumentos industriais a trabalhar com margem de lucro excessiva ou a produzir com preço de custo elevado, protegidas por pautas ou medidas que permitem esses lucros, não podem merecer à complacência do Estado.
O trabalho a realizar no futuro não é, por isso, apenas de ordem material, embora haja necessidade de vincar constantemente a exigência de modernização económica. É também de ordem moral e deve conduzir gradualmente à aceitação de modificações na vida económica, de modo a acabar com desigualdades flagrantes na repartição do rendimento nacional e a impor a formação de um estado de espírito que permita obter das classes trabalhadoras de todos os graus maior somatório de rendimento útil.
Ora nada disto pode ser obtido sem paz interna, sem sossego nos espíritos e nas ruas. Todos aqueles que com responsabilidades intelectuais dêem origem a perturbações na tranquilidade nacional, ainda que fundamentados em causas que a sua consciência lhes diz serem justas, cometem um erro grave, que vai até de encontro às suas próprias aspirações.
Estes pareceres têm mostrado, nos longos anos em que se publicam, ser possível e até necessário produzir crítica construtiva e serena. Em larga engrenagem administrativa há sempre erros a corrigir, abusos a reprimir, ideias teóricas de idealistas a esclarecer e a dobrar. Os homens actuam muitas vezes pela força de ideias pouco amadurecidas e firmam-se com frequência em dados incertos ou incompletos. Outras vezes é o interesse passional ou até material que os leva a cometer actos contrários ao bem comum e ao interesse da Nação.
É vantajoso vigiar este torvelinho de esforços, muitas vezes divergentes e alguns a tender para interesses que não são os do conjunto do aglomerado nacional. A opinião pública informada, com todas as suas fraquezas e dissonâncias, para quem a souber consultar, é ainda guia seguro para a orientação a seguir na critica dos actos do Poder Executivo.
Mas o que dela ressuma não deve nunca ser imposto por actuações que conduzam a desordens nas ruas e a agitações revolucionárias, antes deve ser posto serenamente à luz do dia, com clareza e fundamentadas razões, a fim de poderem ser modificados os actos e os erros e os abusos que porventura hajam alterado ou perturbado a vida pública.
Tais têm sido as normas orientadoras destes pareceres.

A necessidade de aproveitar a riqueza potencial do País

4. Trataram-se aqui, no passado, questões fundamentais. Umas, sobre a vida económica, dizem respeito ao melhor rendimento agrícola e incluem uma reforma agrária que considere o emparceiramento e o parcelamento da propriedade rústica; outras expuseram os princípios fundamentais do renovamento industrial e os seus limites; e ainda outras se referiram à complexa reorganização de toda a economia nacional, há longos anos devida e agora indispensável em virtude dos projectos de aproveitamento dos rios, dos recursos mineiros, das matérias-primas, do trabalho, dos mercados externos.
Escreveram-se longas páginas sobre o problema da habitação e o descongestionamento dos dois grandes aglomerados urbanos, sobre a melhoria da vida da província, sobre a saúde pública, e a assistência nos seus variados e diversos aspectos. Tocou-se na previdência social, de tão prometedoras possibilidades no futuro, na necessidade de remodelar completamente os nossos métodos de ensino universitário e secundário. Não se têm esquecido as injustiças do sistema fiscal, os inconvenientes e insuficiências da rede de transportes, as vantagens de uma política aérea que valorize as bases imperiais. E largamente se comentou o trabalho de certos serviços públicos, a necessidade do seu melhor rendimento, de alojamento adequado, de maior simplificação e melhor remuneração, e discordou-se da tendência acentuada pelo gosto de obras de natureza sumptuária, em vez de se desviar para fins produtivos o maior somatório possível das verbas orçamentais.
O relator dos pareceres deseja acentuar aqui que tratar de todos estes variados assuntos é tarefa que não cabe apenas nos conhecimentos de uma única entidade. Tem sido sempre intuito e objectivo pôr diante do País a opi-

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1 Ver Portugal Económico e Financeiro.

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nião das melhores e mais imparciais competências sobre os assuntos tratados. Não há a veleidade de conhecer tudo ou de sobre tudo discorrer.
O método adoptado tem sido o de colher a opinião das entidades que mais autorizadamente se têm dedicado aos assuntos que se pretendem discutir, sobretudo a de quem sobre eles tem larga experiência, juntar essas opiniões, debatê-las com os que as emitem, e extrair do conjunto uma ideia objectiva que possa ser posta ao Pais de forma simples e clara.
Assim sucedeu com os estudos sobre a energia e os rios portugueses, publicados em apêndices aos pareceres de 1942 e 1943, nos quais intervieram especialistas de dentro e fora das estações oficiais. Eram vastos os projectos que neles se delineavam e ambiciosa a projecção no futuro de suas consequências.
Dizer a um país a consumir por ano apenas 600 milhões de unidades de energia que era possível obter pelo aproveitamento integral dos rios cerca de 9 biliões e resolver simultaneamente problemas de grande magnitude em qualquer parte do Mundo - como o da navegação do Tejo e do Douro, o da exploração por ano de 1 milhão de toneladas de hematites em Trás-os-Montes, o da rega de vastos tratos de terrenos na Cova da Beira e no Ribatejo, e outros - poderia parecer à primeira vista que se ultrapassavam os limites das possibilidades nacionais, tanto na ordem financeira como na técnica e até política.
Mas os factos e a opinião bem informada em breve reconheceram que o que singelamente então se relatara começava a ter foros de realidade próxima.
O início das barragens de Belver e Pracana, primeira pedra no esquema do aproveitamento do Tejo, o estudo da de Fratel e o reconhecimento do Tejo internacional, além do início recente dos aproveitamentos em Espanha para lá de Alcântara, marcam definitivamente a possibilidade de transformar dentro de uns anos o grande rio numa fonte ubérrima de bens materiais, que compreenderá, como foi previsto, a navigabilidade por barcos de 1:000 toneladas até bem dentro de Espanha, a produção de grandes quantidades de energia a preço compensador, a elevação do caudal no estio, que permitirá fácil rega nos ricos terrenos de jusante, e ainda o domínio de caudais, pelo menos dentro de certos limites.
O caso do Douro está hoje, parece, no primeiro plano das concepções económicas de todos os que se dedicam a estes problemas, e ninguém já duvida da sua exequibilidade e importância, nem da urgência que há em efectuá-lo no mais curto espaço de tempo possível.
O País não pode permitir-se ter lá em cima, nas cabeceiras portuguesas do rio, inactivos, jazigos de ferro que se diz ultrapassarem 150 milhões de toneladas e que só podem ser explorados se houver transportes baratos. Tem ali ao pé, a uns parcos quilómetros, um rio já regularizado, que com meia dúzia de barragens se transforma numa excelente via fluvial e que ainda por cima pode produzir considerável quantidade de energia em condições de ser utilizada na fusão dos minérios.
É um projecto largo e ousado, um esquema completo que produz energia e ferro, domina as águas, valoriza uma região pobre, leva a vida e a seiva a populações atrasadas que vivem há longos anos do esforço ingente da terra.
No nosso acanhado meio, de coisas pequeninas, que uma educação comezinha afastara da visão dos grandes problemas, estes dois esquemas apareceram, quando postos na sua forma integral, como utopias que, se pudessem um dia ser realidades, estavam ainda longe da compreensão da vida portuguesa. Mas em breve se verificou que eles são factíveis, tanto no ponto de vista técnico como financeiro.
A sua magnitude não deve amedrontar o génio de um povo que tantas obras grandes produziu em oito séculos de história - em Portugal e noutros continentes - e que fez e está fazendo a suprema obra que pode caber a uma nação - que é a de fundar, política e economicamente, outras nações.
O País não pode viver apenas de pequenos projectos. Tem de alargar as suas ambições e honestamente visar alto. Precisa de abarcar os problemas num sentido de conjunto, de coordenar as variáveis que os constituem e resolvê-los ousadamente com um objectivo seguro e sereno que é o do máximo proveito para o bem comum.
Todas as tristes polémicas e pequeninas vaidades que a humanidade deixa transparecer quando solevantam questões que vão de encontro a velhos e preguiçosos hábitos mentais de nada valem perante a justeza das coisas, e a realidade das eternas e frutuosas benesses que a Providência, muitas vezes generosamente, põe ao alcance dos homens.

5. Nunca devemos, porém, perder a noção das realidades que envolvem num manto sombrio as actuais condições do Mundo. A geração a que pertencemos encontrou diante de si uma tarefa de tal magnitude que ainda hoje parece milagre não ter soçobrado neste torvelinho de paixões que perturbaram o País e mais tarde a Europa nas primeiras décadas deste século.
O 28 de Maio nasceu de um revolto mar de agitações políticas, e não foi possível, no meio delas, imprimir à economia nacional o desenvolvimento que os recursos internos permitiam.
As disponibilidades financeiras herdadas pela actual situação atingiam o fundo de uma longa e contínua descida para o caos.
Houve necessidade, no longo período que vem até agora, de reconstituir a fazenda de um morgadio arruinado e de pôr ao canto da arca disponibilidades que permitissem o desenvolvimento em larga escala, e na medida apropriada, da potencialidade económica da Nação.
Alguma coisa se conseguiu, pode dizer-se que muito se conseguiu, sem contudo se poder afirmar que o muito significa tudo o que podia conseguir-se.
Mas há quem julgue, e acontecimentos recentes o confirmam, que não tem fundo o tesouro penosamente amealhado, e que é possível arquitectar e construir inúmeros e quantas vezes fantasistas projectos, ou levar um modo de vida superior aos nossos rendimentos e disponibilidades à vista, ou até a prazo.
O caso da industrialização ilustra os factos. Imagina-se em muitos sectores que a industrialização do País o levará ao Eldorado da abundância - que nela reside a suprema ventura.
O relator das contas públicas tem talvez, e parcialmente, responsabilidades neste estado de espírito, porque já há longos anos vem aconselhando, com persistência devotada, a necessidade de desenvolver os recursos industriais susceptíveis de ser desenvolvidos. Mas deseja acentuar aqui, como aliás o tem feito sempre com clareza, que a industrialização do País pode enevoar o futuro, se não vier acompanhada de outras medidas que tendam a aproveitar correctamente os seus frutos.
Em primeiro lugar, a criação de novas indústrias ou o desenvolvimento das existentes pressupõe duas coisas fundamentais: uma é a de que o preço de custo dos produtos manufacturados possa competir, em idênticas circunstâncias, com os de nações concorrentes; outra é a da existência de poder de compra e de capacidade de consumo dentro do Pais que permita às novas indústrias as melhores condições de exploração.
Baixo preço de custo faz supor educação técnica apropriada em todos os sectores, desde a mão-de-obra até ao ensino médio e superior, organização administrativa efi-

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ciente, métodos de comercialização adequados, transportes rápidos e baratos e outras coisas. É preciso para isso coordenar um certo número de órgãos de natureza oficial e particular. Só a resultante do conjunto poderá melhorar o preço de custo.
Não basta instalar uma fábrica ou muitas fábricas. É necessário que ela ou elas sejam localizadas de modo que as matérias-primas, a energia e a mão-de-obra ali se congreguem equilibradamente e que os gastos gerais se circunscrevam a limites razoáveis.
Podemos já dizer que nos primeiros ensaios efectuados se não tiveram em conta todos estes factores. E isso é um mal, porque um erro, por exemplo, de localização, afectará no futuro a vida financeira do órgão mal localizado, e não haverá forças humanas, por mais inteligentes que pareçam, capazes de destruir a realidade dos erros cometidos.
A capacidade de consumo depende, em grande parte, entre nós e por enquanto, do poder de compra. Ela reside em larga escala na população agrícola. É do cultivo dos campos que vive a maior parte do povo português. Melhorar o seu poder de compra é indirectamente possibilitar o desenvolvimento industrial.
Sem consideráveis aperfeiçoamentos na agricultura não pode haver melhoria na produção; e sem ela todas as tentativas que tendam a alargar as indústrias estão condenadas a insucesso. Indústrias a trabalhar com rendimento muito inferior à sua capacidade, encerradas dois ou três dias por semana, ou a laborar por secções, com pagamento de horas de trabalho que se não executa, são indústrias ineficientes, ainda que o equipamento mecânico ou eléctrico seja ultramoderno.
E isso acontece já hoje, e mais acontecerá no futuro se não for mantido em níveis regulares o poder de compra na maioria da população portuguesa - e essa maioria vive ainda da agricultura e da pecuária.
A industrialização não pode obedecer apenas a regras de ordem técnica, nem a tendências de natureza pessoal, passional ou sentimental, nem a fantasias ou imoderadas ambições nacionais - antes tem de se circunscrever e dobrar-se perante realidades de natureza económica e política.
É este o sentido da doutrina que estes pareceres e outros escritos têm desenvolvido em matéria de industrialização.
Aperfeiçoamento do ensino técnico de todos os graus, gradual elevação do poder de compra das populações rurais e, consequentemente, melhoria das condições de vida na agricultura, preço de custo mantido dentro de cifras que permitam a exportação, se necessária, coordenação das economias metropolitana e ultramarina, uso dos melhores especialistas nacionais e estrangeiros no delineamento e construção de projectos, prioridade no
aproveitamento das fontes de energia que possam produzir a força motriz por preços mais baratos, com preferência para a utilização múltipla das obras a executar, cauteloso gasto das reservas financeiras nacionais, que não são inesgotáveis, tanto as que são representadas por escudos como por moeda estrangeira, criação de uma mentalidade utilitária, no aspecto económico, que veja no empreendimento mais do que a sua imponência ou grandeza - tais parecem ser as normas a seguir para alicerçar o que pode ser realizado no aspecto industrial em prol do aumento da riqueza interna.

6. Mas se os pareceres das contas, com a ajuda de tantos que desinteressadamente pretendem auxiliar quem o escreve, procura formar opinião sobre projectos de ordem material para interesse de todos, como os que acabam de ser apontados, eles não descuram nem pretendem descurar as necessidades fundamentais da vida humana - dos anseios e agruras dos que combatem numa longa e activa labuta pelo ganho e sustento espiritual e material.
Pretendem opor-se com firmeza à cega idolatria dos grandes centros urbanos, à desmedida luta por bens e gozos materiais, ao avassalador e mentiroso sentimento de que a felicidade reside apenas na acumulação de riquezas.
Vale mais a mediania honesta e harmoniosa do que essa perturbadora e alucinante luta pela conquista individual de riquezas com o único objectivo de as possuir ou de se servir delas como instrumento de domínio ou de poder.
Nas sugestões que nos pareceres se têm apresentado desde o início para o bem-estar dos povos rurais, que são o grande esteio da vida nacional, há também o desejo de fixar na província o maior número possível dos que lá nasceram. Dar-lhes assistência, melhorar as suas condições de vida, oferecer-lhes trabalho bem remunerado, procurar tornar salubres as casas e os lugares que habitam, desenvolver as comunicações, dotá-los com um mínimo de prazeres que tornem menos abstractas as horas disponíveis, fazer, enfim, o possível para atenuar nos seus espíritos a visão edénica do esplendor das grandes cidades - devem ser as regras a seguir numa política de equilíbrio e bem-estar nacional.
Por isso o parecer das- contas todos os anos, com uma insistência que não amortece, procura chamar a atenção para todas estas questões, no alto desejo de ver resolvidos muitos pequenos problemas que afligem os povos dos centros rurais..

7. Algumas reclamações neles formuladas já têm sido atendidas; para outras confia a Comissão das Contas Públicas que hão-de em breve encontrar-se soluções.

RECEITAS

I. Há lugar para apreensões sobre o nível de receitas no futuro e parece começarem a tomar corpo os receios que, por diversas vezes, têm sido manifestados nos últimos pareceres das contas públicas. Não é que o seu relator seja pessimista sobre o futuro da vida orçamental portuguesa. Mas tem observado que o desenvolvimento da despesa cresce sempre, num ritmo contínuo, e que a pressão dos serviços sobre a. tesouraria aumenta cada vez mais. Até certo ponto essa pressão poderá justificar-se pelas necessidades cada vez maiores que derivam do próprio desenvolvimento dos serviços e das oscilações dos preços. Mas seria necessário provar que ele corresponde a um rendimento do qual resulte maior produção económica e, por consequência, maior capacidade tributária, de onde saiam as receitas que liquidem o suplemento exigido.
Os receios ou apreensões manifestados neste lugar ainda não tiveram a sua expressão material, e porventura muita gente pode dizer: se as receitas estão em constante aumento, qual o motivo que pode fundamentar a opinião, aqui expressa, da possibilidade de virem a surgir no futuro obstáculos ao próprio equilíbrio orçamental imposto pela Constituição?
Na verdade ainda este ano as receitas ordinárias aumentaram bastante, como se verificará depois. Mas quem descer à minúcia das cifras e perscrutar o seu significado

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notará, sem precisão de maiores estudos, que o acréscimo nas receitas deriva de um mal - tanto maior neste caso quanto maior vier a ser esse aumento no futuro, se ele derivar da mesma causa.
Foram os impostos indirectos que cobriram em alta percentagem o desenvolvimento das receitas. Foi a importação de vários géneros e mercadorias que deu parte do suplemento de receita que, no final de contas, resolveu o problema do equilíbrio.
Ora um forte imposto aduaneiro, como o que pode recair sobre a importação de muitos produtos, sobretudo dos alimentares, significa redução do nível de vida. Atinge em elevado grau todas as classes, e a percentagem sobre as menos remediadas, por virtude do seu número, é mais fortemente atingida do que as outras.
Um aumento de receitas que provenha essencialmente desta origem não é, no ponto de vista social, tão justo como o imposto directo. E este diminuiu apesar do forte aumento de alguns dos tributos que o compõem, como, por exemplo, a contribuição industrial.

2. A questão das receitas, pelo facto de ainda não ter causado maiores apreensões neste ano, deve continuar a ser cuidadosamente vigiada. E o relatório da conta provisória do Ministro das Finanças, sentindo a sua importância, procura determinar um nível de receitas nos anos próximos para os diversos capítulos orçamentais.
Pondo de parte o carácter aleatório que previsões desta natureza podem ter, sobretudo num país de fraca circulação económica e dotado ainda de elementos informadores de duvidosa eficiência em muitos casos, como as matrizes prediais e outros, não se pode deixar de louvar o propósito do relatório da conta provisória.
Com efeito, a despesa orçamental firma-se todos os anos na estimativa das receitas e, embora o sistema adoptado nas autorizações constitucionais, expressas pela lei de meios, permita ajustamentos durante o exercício financeiro, quaisquer planos futuros têm de ser sempre baseados em previsões razoáveis.
Tem-se discutido já muitas vezes nestes pareceres a capacidade tributária do País. E por capacidade tributária entende-se aqui o que é possível tributar sem diminuição do nível de vida ou do suplemento necessário à formação de capitais que devam ser invertidos em novos desenvolvimentos de carácter económico e reprodutivo.
À parte o tributo indirecto dos direitos aduaneiros, que, como se viu atrás, representa substancial auxílio no equilíbrio orçamental e se reparte por larga percentagem da população, o que mais interessa na capacidade tributária é o rendimento colectável urbano e rústico e a contribuição industrial. O que paga o comércio, incluído nesta última, recai, no final de contas, e bem vistas as coisas, sobre a indústria e a agricultura, além da importação.
A matéria colectável de natureza industrial ou agrícola é, pois, em última essência, a fonte onde, directa ou indirectamente, o Estado vai cobrar a maior parte das receitas.
Um inquérito sobre as suas possibilidades, independente e consciencioso, talvez revelasse que a actual carga tributária, vista no conjunto, não ultrapassaria ainda os limites de pagamento, tendo em conta as necessidades e as exigências de uma razoável capitalização e outras atrás indicadas.
Não é possível fazer esse inquérito, não só por estarem muito longe de conveniente actualização as matrizes sobre que se firma a contribuição predial, rústica e urbana, e parcialmente os impostos, como a sisa, as sucessões e outros, mas também porque muitos contribuintes não fazem esforços para, com sinceridade, informarem o Estado dos seus rendimentos líquidos, com o que muitos deles provavelmente só teriam a ganhar.
E, assim, enquanto não for modificado este estado de coisas, hão-de ser sempre aleatórias as estimativas da capacidade tributária.

A economia de paz e as receitas

3. Começam agora a aparecer mais fortemente vincadas no horizonte as sombras que motivaram as apreensões expostas nos pareceres das contas.
Com efeito, a actividade industrial perdeu aquele dinamismo, como é uso dizer-se agora, que a caracterizou nos últimos tempos. Surgiram no céu de esperanças as tintas cinzentas que escurecem os brilhantes castelos dourados dos grandes e pequenos negócios - dos negócios que permitem a compra hoje de uma mercadoria que amanhã é vendida com lucro exagerado, sem esforço nem risco. As fábricas em poucos meses tiveram de reduzir a sua laboração, e algumas mantêm-na porque acumulam produtos manufacturados à espera de melhores dias.
E a agricultura desperta agora de uns anos dê secas e baixas produções para contemplar com tristeza a descida rápida de muitos dos produtos que pensava viriam cobrir desgostos passados.
Os especuladores, perseguidos e justamente expostos perante o tribunal da opinião pública, sentem escorregar debaixo dos pés aquela ousadia que os animava no tráfico.
Tudo representa a gradual reentrada numa economia de paz - embora lá por fora paz seja ainda hoje uma palavra sem sentido.
Apenas as condições de paz, até num país que em paz viveu durante o longo conflito, não são tarefa fácil para quem tem em suas mãos a rédea das finanças nacionais - sobretudo quando reina ainda em muitos serviços públicos a ideia de que as suas dotações não devem nunca diminuir, mas antes sempre aumentar.
Por ser tarefa difícil, há-de precisar de muita energia a decisão clara e peremptória de dizer não quando for preciso. A quem tenha por missão distribuir as dotações hão-de ser em breve necessários poderes latos e indiscutíveis que permitam recusar aumentos de despesa não justificados por sólidas razões de ordem reprodutiva.
O dizer não tem de ir a pequenas verbas, porque a soma delas faz as grandes.
Parece que o Ministério das Finanças, como aliás aconteceu em 1928, e como é corrente em tantos outros países, precisa de intervir, no ponto de vista orçamental e com mais assiduidade e energia, no que se passa na organização de outros Ministérios, de modo a poder, em conjunção com os respectivos titulares, reduzir despesas desnecessárias ou adiáveis. Talvez que a relativa liberdade concedida neste aspecto orçamental durante o período da guerra torne agora mais difícil esta interferência. Mas o exemplo do que vai pelo Mundo em matéria financeira é de molde a pôr diante de todos o que representa um desequilíbrio ou, pelo menos, uma aplicação que não seja a mais produtiva.

4. Há-de julgar-se paradoxal este modo de ver - s obre as receitas e despesas num ano em que as- primeiras atingiram o máximo em escudos.
Contudo quem tiver lido com atenção o que se escreveu no passado e auscultar agora as possibilidades da duçproão e esmiuçar a origem das receitas não pode

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classificar de paradoxo a recomendação vigorosa de maior austeridade ein matéria de gastos públicos, a qual, deve acrescentar-se, também precisa de ser acompanhada de maior austeridade nos gastos particulares.
Passada a euforia de um triste fim de guerra, haverá que regressar-se à normalidade de uma paz instável e preparar o Pais para contingências que todos esperamos se não materializem.
A vida portuguesa tem de ser organizada no sentido de reduzir ao mínimo, pelo menos nos anos mais próximos, as despesas sumptuárias, de puro gozo ou prazer, enquanto não forem estabelecidas as condições que permitam um muito maior acréscimo no rendimento nacional. É da economia interna que vivem as receitas do Estado, embora na aparência também gastos sumptuários concorram com certas verbas para as receitas.

AS CONTAS

5. O saldo da gerência de 1946 foi de 61:003 contos, assim obtido:

Contos
Receitas. .......... 4.684:943
Despesas............ 4.623:940
Excesso de receitas sobre despesas 61:003

O saldo de 61:003 contos, apurado no fecho da gerência, não mostra o desafogo de tesouraria que caracterizou o ano.
A discriminação dos totais permite verificar que o saldo provém de um grande excesso das receitas ordinárias sobre idênticas despesas, como se nota no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

O excesso de receitas sobre despesas ordinárias atingiu 805:943 contos, que foram utilizados no pagamento de despesas com carácter extraordinário.

6. O total das receitas públicas em 1946, relacionado com o dos anos anteriores, pode apresentar-se do modo que se indica no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se ter sido este o ano de maiores receitas. Foi, na verdade, o primeiro em que elas ultrapassaram a casa dos 4 milhões e meio de contos. O caminho andado desde 1930-1931 é muito grande (mais do dobro), e em relação a 1938 os números assinalam também sensível aumento.

7. Nas receitas extraordinárias há apenas a considerar as três verbas que quase todos os anos as compõem: os empréstimos, os saldos de anos económicos findos e uma pequena parcela que diz respeito a heranças.
No conjunto, as receitas extraordinárias subiram a 783:782 contos. Esta importância é discriminada pela forma seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

RECEITAS ORDINÁRIAS

8. Escreveu-se já que a característica principal das receitas ordinárias no exercício de 1946 foi ainda o seu aumento. Reparte-se por quase todos os capítulos orçamentais, mas toma relevo especial nos impostos indirectos.

A questão do acréscimo pode pôr-se assim:

Contos
Aumento nos impostos indirectos .... 439:030
Aumento nas outras recitas ...... 133:472
Aumento total 572:502

Os impostos indirectos contribuíram, como se nota, com perto de 77 por cento para o acréscimo total da receita ordinária, o que era simplesmente notável e digno de meritório registo se não fossem as cansas já apontadas.
Os efeitos destas modificações no total das receitas ordinárias, desde o início da reconstrução financeira, podem ler-se nos números que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

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Como se nota, os dois grandes impostos nos dezoito anos e meio que vêm desde 1928 atingem 72,2 por cento do total da receitas ordinárias cobradas. É maior a percentagem se forem levados em linha de conta os significados dos capítulos relativos a reembolsos e reposições e de algumas verbas dó domínio privado e participação nos lucros.
Em 1945 os totais de cada um dos dois impostos acima mencionados haviam-se aproximado, porque enquanto os directos subiam bastante nos últimos anos, desciam em igual período de- tempo os indirectos. Mas em 1946, com os aumentos já indicados, tornaram a distanciar-se. A diferença agora anda por um pouco mais de 1.800:000 contos no conjunto.

9. As relações entre as receitas orçamentadas e as cobradas podem deduzir-se facilmente dos números seguintes :

[Ver Quadro na Imagem]

Nota.- Nos anos do 1938 e 1939 não foram Incluídos (neste mapa) os créditos especiais nas receitas orçamentadas, o que se fez agora.

Vê-se no quadro a grande influência dos negócios da guerra nos anos de 1942 e 1943. Os orçamentos haviam cautelosamente estimado as receitas numa base idêntica à do período anterior, mas a força de certos impostos, como lucros de guerra e direitos de exportação, influiu nos totais e os excessos das receitas cobradas sobre as orçamentadas foram muito grandes. Houve progresso em 1946 sobre 1940, neste aspecto, mas as causas foram agora diferentes porque resultaram de insuficiências internas, e não de excessos de produtos que podiam ser exportados a preços muito mais compensadores.

10. As receitas ordinárias e extraordinárias indicadas necessitam de ser corrigidas no sentido de se verificar o produto líquido que lhes diz respeito.
Deduzidos os juros dos títulos na posse da Fazenda Pública e os empréstimos, elas foram as seguintes, relacionadas com 1930-1931 e 1939, em milhares de contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Comparado com o primeiro ano da guerra, o aumento foi superior a 1.800:000 contos, e relativamente a 1930-1931 o acréscimo atingiu mais de 2.000:000 de contos.
Houve na verdade modificações menos espectaculosas em relação ao inicio da reforma financeira do que a 1939, visto a quebra no poder de compra da moeda se ter acentuado muito de 1939 para cá. A evolução das receitas ordinárias, que são as que mais profundamente interessam ao País, porque na verdade são elas que influem na vida de cada um, é dada discriminadamente, por capítulos, no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

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Observe-se que os impostos directos progrediram sempre até 1940, tendo havido uma quebra, embora pequena, em 1946. Hão-de ver-se adiante as causas. Nos impostos indirectos deu-se a inversa nuns anos, logo no princípio da guerra, mas 1946 foi ano de grandes reforços em virtude das taxas alfandegárias. Estes dois impostos somam, como se disse, mais de 70 por cento do total; por isso as variações nos outros capítulos não o afectam tanto. Mas nota-se que quase todos eles progrediram apreciavelmente, se progresso é o reforço de certas verbas que os constituem.
Para se observar nitidamente a influência dos dois grandes capítulos dos impostos directos e indirectos, no conjunto e discriminados, foram calculadas as percentagens que correspondem a cada um dos diversos anos em relação ao total das receitas ordinárias.

[Ver Quadro na Imagem]

A subida nos impostos indirectos deu como resultado o decréscimo na composição do total das receitas ordinárias dos impostos directos.
As contas seguiam, nos últimos tempos, o caminho que parece ser o mais lógico na vida do imposto: predomínio de impostos directos sobre outras receitas. Mas 1946 não foi ano bom neste aspecto, e parece que outro tanto acontecerá em 1947. Houve excessos de importações para além do que seria de esperar e isso reflectiu-se nas contas.
Do exmame do quadro e das cifras que o compõe ressumam alguns factos dignos de comentário. Assim, por exemplo, enquanto que o somatório dos impostos directos e indirectos duplicou no período com início em 1930-1931 a 1946, o das outras receitas quase que triplicou.

11. As percentagens que acabam de ser indicadas dão as variações dos diversos capítulos em relação ao total das receitas ordinárias. Mas convém também apontar as variações de cada capítulo em relação a anos anteriores.
É o que se faz no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Em 1946 as receitas ordinárias, como se nota no quadro que acaba de ser publicado, são sensivelmente o dobro do que eram em 1930-1931, quando traduzidas em moeda corrente. Num mundo que sofreu tão profundas e sobressaltadas modificações, este facto é, na verdade, digno de registo. É evidente que o valor do escudo, computado na base do índice dos preços, sofreu apreciável quebra durante este longo período, dando-se por demais o facto de ter o ano de 1930-1931 sofrido já os efeitos da crise económica que alastrou dos Estados Unidos para a Europa em fins de 1929 e princípios de 1930, e que teve as graves consequências duma considerável depressão nos preços. Mas é sabido que a baixa nos preços não se reflecte imediatamente no somatório das receitas públicas.
O outro fenómeno de natureza política que neste espaço de tempo perturbou a moeda foi o da guerra mundial, e este, com efeitos mais duradouros, vincou fortemente a sua influência.
Nota-se no quadro que o aumento das receitas ordinárias se acentuou a partir do princípio da guerra, visto que em 1939 ainda elas eram apenas 244:000 contos superiores às de 1930-1931. A progressão durante nove anos foi lenta, talvez lenta demais para as possibilidades tributárias - mas acelerou-se grandemente nos anos que decorrem desde 1940 a 1946. Sem sombra de dúvida que, a partir deste último ano, o progresso não poderá ser sensível, e talvez que não seja possível mante-las no nível actual, a não ser que se dêem acontecimentos imprevistos.

IMPOSTOS DIRECTOS

12. Apesar, de ter havido diminuição no quantitativo dos impostos directos, eles ainda assim somam quase

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o dobro dos de 1938. Para isso concorreram grandes subidas nalgumas das verbas que os constituem, como se torna claro na leitura do quadro seguinte, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Apenas diminuíram os lucros de guerra, que tendem a desaparecer.
A subida, porém, não foi suficiente para neutralizar a diminuição que se deu neste imposto e que ascende, em relação ao ano anterior, a perto de 145:000 contos. Nos impostos directos, tirando os lucros de guerra, houve na verdade o aumento de cerca de 80:000 contos.
No conjunto a baixa foi de 64:000 contos.
A contribuição predial e industrial e o imposto complementar, juntos, somaram 56,5 por cento do total dos impostos directos. Os de transmissão (sisa e sucessões e doações) totalizaram 25 por cento.
As percentagens relativas a 1938 e 1946 podem ler-se no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Contribuição predial

13. A contribuição predial aumentou muito pouco durante o período da guerra. Era de 224:174 contos em 1938 e passou para 260:562 em 1946. Mas, no intervalo, os prédios em Lisboa e outras cidades, construídos ao abrigo de isenções de contribuição durante certo tempo, foram inscritos nas matrizes e começaram a ser colectados. À diferença entre os dois anos devem pois ser abatidas as quantias relativas a esses prédios.

Rendimento colectável Propriedade rústica

14. Não são muito diferentes em 1946 os rendimentos colectáveis da propriedade rústica. A sua evolução tem sido lenta e parece que não será possível elevá-los muito, dada a situação em que a exploração agrícola se mantém.
Os rendimentos colectáveis por hectare continuam a ser baixos nos distritos alentejanos, dos mais baixos do País. São 63, 90 e 87, respectivamente, em Beja, Évora e Portalegre. Setúbal com 61 e Castelo Branco com 56 estão na mesma ordem de grandeza. Braga acusa, com 243$ por hectare, o grande parcelamento da propriedade.
A pequena densidade demográfica no Alentejo faz-se sentir nas capitações dos rendimentos colectáveis pela elevação das cifras.
O quadro seguinte dá, para a população calculada para 1946, os rendimentos colectáveis por distrito, por hectare e por habitante.

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[Ver Quadro na Imagem]

a) Sujeito a correcção de menor importaância

A contribuição predial rústica é, como se sabe, uma percentagem dos rendimentos colectáveis. Foram liquidados em 1946, por verba principal, 148:035 contos, dos quais 139:173 no continente e 8:862 nas ilhas.
Os distritos que pagam mais imposto deste tipo são os de Santarém e Viseu.
A contribuição predial rústica não tem sofrido no conjunto grandes variações, pois que o seu aumento, nos últimos três anos, considerando a verba principal, foi de 1:800 contos, números redondos.
À verba principal devem juntar-se os adicionais constituídos pelas receitas afectas às juntas de província, às câmaras municipais, ao turismo e ao Fundo de Desemprego, além de uma pequena verba destinada a melhoramentos locais e outros. Os adicionais aplicam-se tanto à contribuição predial rústica como à urbana e não se discriminam. Andam no conjunto por cerca de 90:000 contos, o que não parece exagerado.
Deve contudo dizer-se que, além do que se menciona, recaíram sobre a lavoura outros encargos, alguns dos quais se desfiam adiante, quando se tratar da organização corporativa da lavoura.

Propriedade urbana

15. Nos distritos de Lisboa e Porto o rendimento colectável da propriedade urbana atingiu 778:863 contos, comparado com 418:213 nos outros distritos. O quadro que segue mostra também o número de prédios:

[Ver Quadro na Imagem]

Como a contribuição é uma percentagem do rendimento colectável, são os dois distritos de Lisboa e Porto, principalmente o primeiro, que pagam maior contribuição predial urbana. Aliás isso se verifica facilmente do quadro que segue, onde se mostra a capitação e o que cabe a cada distrito.

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Sujeito a correcções feitas recentemente nas matrizes que devem aproximar esta cifra de 1.350:000 coutos.

Comparando os rendimentos colectáveis da propriedade urbana e rústica, nota-se que os primeiros são superiores aos segundos -1.197:076 contos contra 1.033:984. A capitação média em todo o País do rendimento colectável urbano anda à roda de 146. Em Lisboa foi em 1946 de perto de 500$. A contribuição predial urbana liquidada em 1946, sem contar com os adicionais, foi de 127:000 contos, dos quais pertencem 59:355 a Lisboa.

Contribuição industrial

16. Desde 1938 a contribuição industrial aumentou 178:000 contos. Pelos números fornecidos à Assembleia Nacional quando se discutiu a lei de meios de 1948 nota-se que o aumento em 1947 é muito grande, visto ter atingido de Janeiro a Setembro 446:947 contos.
Alguns números relativos a pagamentos deste imposto têm certo interesse. A indústria de algodões liquidou em 1946 mais de 20:000 contos; o comércio de mercearia a retalho 13:800; os armazéns de mercearia 6:600; os armadores de longo curso 12:200; os importadores de óleos 8:000; os seguros 9:800.
Não será possível no futuro manter o acréscimo que este imposto tem tido, sobretudo se se avolumarem os presságios da crise que se desenha no horizonte. Parece, pelos números que acima se transcrevem, que em 1947 a contribuição industrial se avizinhará de meio milhão de contos.
Em 1946 o número de colectas foi maior, relativamente ao ano anterior, como se mostra no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Foi no grupo C que se deu o maior acréscimo, mas os grupos A e B também progrediram apreciavelmente.
Aliás é sobre as actividades que constituem o grupo C que recai quase toda a contribuição industrial liquidada.

17. Distribuída por distritos, a contribuição industrial foi a que segue:

Contribuição industrial, por distritos

[Ver Quadro na Imagem]

Verifica-se neste quadro que os distritos de Lisboa e Porto, por si sós, liquidaram mais de metade das verbas que formam o total deste imposto.
Vêm depois Braga, Setúbal, Aveiro e Coimbra, mas muito distanciados. Outro tanto acontece com a contribuição industrial liquidada por contribuinte.

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Dividindo o que se cobrou pelos grupos que constituem a contribuição industrial, obtêm-se os números que seguem:

Cobrança da contribuição industrial

[Ver Quadro na Imagem]

Dos números dados atrás, uns referem-se à contribuição industrial liquidada, outros à contribuição industrial incluindo os adicionais; e os do quadro acima publicado referem-se ao que realmente se cobrou. Existe diferença sensível entre os números por motivos fáceis de compreender.

18. Há interesse em conhecer quanto pagam certas actividades industriais e por elas avaliar a carga tributária. Os elementos que seguem exprimem a contribuição que incide sobre diversas indústrias.

[Ver Quadro na Imagem]

Imposto complementar

19. O imposto complementar foi remodelado nos últimos anos. Atingia em 1946 a receita de 114:162 contos, mais 77:535 do que em 1930-1931. Os números são os que seguem:

Contos
1930-1931. .......... 36:627
1936 ................ 43:111
1938 ................ 50:254
1940 ................ 57:489
1942 ................ 65:662
1943 ................ 70:093
1944 ................ 79:093
1945 ................ 111:049
1946 ................ 114:162

Em 1947 o salto na cobrança foi muito grande. Nos oito primeiros meses do ano o total alcançava 144:871 contos, mais 48:118 do que em igual período do ano anterior.
Parece que naquela gerência o seu rendimento se aproximará de 200 mil contos.
Há conveniência em fazer o estudo deste imposto e isso se tratará no próximo ano. Julga-se que ele poderá vir a ter no futuro uma influência grande na vida financeira. E, ou pode ser, um interessante imposto sobre os rendimentos e, indubitavelmente, ele é mais justo do que outros actualmente cobrados. Necessita contudo de ser simplificado de modo a torná-lo mais atraente.

Imposto suplementar

20. Continua a aumentar o produto deste imposto, que passou de 3:860 contos em 1941 para 11:435 em 1946.
Desde a data do seu lançamento os quantitativos cobrados foram os seguintes:

ontos
1941 ................ 3:860
1942 ................ 4:586
1943 ................ 5:915
1944 ................ 7:616
1945 ................ 9:764
1946 ................ 11:435

Vão sempre a crescer. Dentro em pouco o seu quantitativo será três vezes maior do que era há seis anos.
Pelos elementos fornecidos, a liquidação e a cobrança, distribuídas pelas classes A e B - vencimentos e remunerações -, foram, como consta do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

É a classe B - a das remunerações - que produz maior receita. A primeira, a A, diz respeito à acumula-

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cão de vencimentos e rendeu apenas 1:739 contos; e a Os vencimentos e remunerações, incluindo os que foram segunda - a das remunerações - atingiu este ano 9:691. isentos de imposto, indicam-se no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que houve ainda aumento de capital, visto ter passado de 123:583 contos em 1945 para 149:254 em 1946.
Adiante se mostram para as classes A e B o número de contribuintes e o total dos vencimentos e remunerações.

[Ver Quadro na Imagem]

O número de contribuintes e o total dos vencimentos ou remunerações sobre que incidiu o imposto aumentaram bastante.
O primeiro foi em 1946 de 1:060 e o total dos vencimentos e remunerações atingiu perto de 150:000 contos.
É uma grande quantia, que dá a remuneração média de mais de 140 contos e que, como se verificou atrás, tem tendência para aumentar.

Classe A

21. A classe A - imposto sobre vencimentos acumulados - tem menor rendimento. A maior parte dos contribuintes vive em Lisboa e Porto. Na província há poucos. O capital sujeito a imposto na primeira cidade do País foi de 27:520 contos e o isento de 23:024. O imposto cobrado atingiu 1:300 contos.
O quadro seguinte mostra a sua repartição por distritos:

[Ver Quadro na Imagem]

O imposto sobre vencimentos acumulados tem sido muito debatido. Ele não tem grande importância, no ponto de vista financeiro, visto as receitas que produz não irem além de 1:739 contos.
O aumento, tanto em número de contribuintes como em matéria tributável, que foi no primeiro caso de cerca de 20 por cento em três anos, deriva em parte da remuneração inadequada de certa classe do funcionalismo público. Contém, neste aspecto, porém, um ressaibo de injustiça, porque a acumulação se não dá em geral nem conforme as necessidades nem talvez as vantagens do Estado. É assunto que merecia ser revisto.

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Classe B

22. Na classe B todos os valores são bastante maiores, como se pode verificar no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

A importância do capital passou de 43:215 contos em 1943 para 83:294 em 1946, quase o dobro em três anos. Não aumentaram na mesma proporção os contribuintes, que se elevaram de 234 para 390.
Examinados os rendimentos globais, verifica-se que o acréscimo de 1945 para 1946 se deu no escalão superior a 400 contos (10:355 contos em 1945 contra 14:109 em 1946); no compreendido entre 200 e 400 contos passou de 22:676 contos para 30:784. Onde se deu menor acréscimo foi nos dois escalões até 150 contos e entre 150 e 200.
Considerando especialmente o imposto suplementar da classe B, que é o mais rendoso para o contribuinte e para o fisco, convém repartir as remunerações por distritos. É o que se faz no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Cerca de 74 por cento do imposto pela classe B são pagos pelo distrito de Lisboa, a que corresponde a remuneração total de mais de 62:000 contos, divididos por 291 indivíduos. A média por cada um é de cerca de 213 contos. Nos outros distritos as médias das remunerações aumentaram sensivelmente. No quadro que segue dá-se a variação do imposto por escalões. Nele se mostra que a média sobe com o volume da importância recebida ou das remunerações, atingindo para os contribuintes que pagam entre 300 e 500 coutos a média de 378 contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Outros impostos directos

23. As contribuições predial e industrial, juntas, renderam em 1946 cerca de 628:200 contos, um pouco menos de metade da soma dos impostos directos.
Vêm a seguir, por sua importância, os impostos de sucessões e doações e sisa, que atingiram cerca de 328:600 contos. Ambos aumentaram em relação a 1945, mas o da sisa mais do que o primeiro.
Este está, possivelmente, em declínio.
Não se dá este ano maior desenvolvimento ao estudo dos impostos de sucessões e doações e sisa em virtude haver conveniência em estudar demoradamente os reflexos que sobre eles pode vir a ter a legislação recentemente decretada.
Os lucros excepcionai» de guerra ainda produziram 93:921 contos, que, juntos aos 932:605 cobrados até 1945, perfazem um total de 1.026:526 contos.
Ainda haverá cobranças atrasadas em 1947, mas já serão de pouca importância.
O imposto sobre a aplicação de capitais andou à roda de 76:000 contos, mais do que em anos anteriores.
Finalmente o imposto profissional, que em 1938 produzia pouco mais de 17:000 contos, alcançou 46:129 em 1946.
São os empregados por conta de outrem que pagam mais de 70 por cento do total liquidado, como pode verificar-se no quadro seguinte, em contos, que também mostra o que foi liquidado em 1938 e 1945.

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[Ver Quadro na Imagem]

A importância sobre que incide o imposto profissional aumentou muito nos últimos anos. Atingiu, nos empregados por conta de outrem, cerca de 1.900:000 contos, bastante mais do que o dobro de 1941. O número de colectas não se alargou nesta proporção. Contudo ele varia muito.
Num total de 87:480 colectas em 1946, pertenciam a Lisboa 46:100 e ao Porto 16:406. Dos outros distritos o maior número pertence a Setúbal, com 2:815, seguido por Leiria, com 2:689. Isto significa que muito mais de metade das colectas se concentra nas duas capitais do País, como aliás era de esperar, dado que é nelas que existe grande parte das actividades industrial e comercial. No caso das profissões liberais o número de contribuintes em 1946 foi de 9:180, dos quais pertenciam ao distrito de Lisboa 3:567 e ao do Porto 1:488. Neste caso a desproporção não é tão grande como no dos empregados por conta de outrem.
É de notar que mais de um terço dos contribuintes das profissões liberais é formado por médicos. Estes e os advogados constituem mais de metade do total, ou seja 4:731.
Nas liquidações feitas em 1946 pertencem aos médicos 3:503 contos e aos advogados 1:879.
O número de contribuintes deste imposto distribuiu-se em 1946 do modo seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

II

IMPOSTOS INDIRECTOS

24. Já se viu atrás que o aumento dos impostos indirectos, em relação a 1945, atingiu 439:030 contos.
Somaram no total quase 1.500:000 contos.
Convém verificar onde se deram as principais alterações, e para isso se publica o quadro seguinte, com o desenvolvimento desde 1930-1931:

[Ver Quadro na Imagem]

O exame dos números mostra algumas importantes alterações nos quantitativos dos diversos impostos indirectos.
Houve sensível diminuição nos direitos de exportação, por virtude de razões conhecidas e já explicadas em outros pareceres. Pouco a pouco o seu total regressa ao nível anterior à guerra. A diferença agora em relação a 1938, um pouco mais de 53:000 contos, já está longe das cifras de há dois e três anos.
O imposto de estampilha e de selo foram muito reforçados, e os aumentos, tanto em relação a 1945 como a .1938, são substanciais. No de estampilha aproxima-se
de 95:000 contos depois do princípio da guerra e no de selo anda por 90:000.
Mas onde na verdade se deu considerável desenvolvimento foi nos direitos sobre vários géneros e mercadorias. O acréscimo foi de 204:000 contos. Se tivessem sido actualizadas as pautas alfandegárias, como se pretende, então teria sido ainda bem maior o rendimento deste imposto.
Dada a desvalorização da moeda relativamente ao poder de compra, a questão das pautas há-de aparecer à superfície, mais cedo ou mais tarde, em virtude de concorrências que já começam a manifestar-se e que se

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não-de acentuar logo que a Europa entre em período de normalização, se é que a normalização é possível nas circunstâncias políticas de hoje. Em todo o caso a posição do escudo, firme nos mercados internacionais, torna-o bastante procurado. E naturalmente há já tentativas de exportação para Portugal, na base do escudo, por preços inferiores ao custo - porque o objectivo não é comercial, mas antes se relaciona com a procura de câmbios.

Importação e exportação

25. Os direitos de importação e exportação, sem contar com o imposto de salvação nacional, atingiram em 1946 a maior cifra registada desde o início da reforma financeira. Foram 930:000 contos e podem comparar-se com os de outros anos no quadro que segue, em contos:

Direitos de importação e exportação

[Ver Quadro na Imagem]

26. Embora o orçamento português tivesse sempre vivido em apreciável grau das pautas aduaneiras, sobretudo das que dizem respeito às importações, o quantitativo deste ano atingiu uma soma grande. Representou perto de 61 por cento, como se pode verificar nos números que seguem, relacionados com 1938.

[Ver Quadro na Imagem]

Em relação a 1938 a percentagem dos impostos aduaneiros sobre o total não se alterou muito.
Onde se deu, na verdade, o maior acréscimo foi nos outros impostos indirectos, que compreendem a sisa e o selo.

27. Em apêndice a este parecer se faz a análise do nosso comércio externo desde 1900, com referência mais minuciosa e especial aos anos de 1938 e 1946 - o anterior e o posterior à guerra.
Hão-de ler-se nesse relato, tão circunstanciadamente quanto era possível no âmbito deste trabalho, as causas do grande aumento na importação, tanto em tonelagem como em peso. Não vale por isso a pena tratar do assunto demoradamente neste lugar.
Contudo, para uniformidade de conteúdo dos pareceres, convém dar aqui umas sucintas ideias sobre o comércio externo e a balança comercial, de modo a poderem claramente ser postas em evidência as causas do grande aumento nos impostos indirectos.
Relacionado com 1929, o comércio especial de importação foi o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

A simples vista de olhos mostra logo o déficit em 1946 de 2.273:000 contos, o maior registado na balança comercial portuguesa.
Tem de notar-se que 1946 foi o primeiro ano em que puderam ser efectivadas transacções internacionais com certa facilidade. Havia precisão de importar substâncias alimentícias e matérias-primas em maior quantidade do que em períodos passados. Mas podiam ter-se evitado ou reduzido certas importações que não representavam exigência imediata.

Balança comercial

28. As exportações mantiveram valores razoáveis, considerados os números de anos anteriores, mas não puderam acompanhar os da importação.
Daí resultou ter-se agravado bastante o déficit do período 1939-1946, que contém três anos de saldos positivos bastante volumosos, superiores a meio milhão de contos em dois deles.
Os números reproduzidos do parecer de 1945, e acrescentados do déficit de 1946, são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Sem querer dar demasiada importância ao significado dos números, deve dizer-se que é imprescindível para a saúde económica do País realizar uma tentativa séria para reduzir o déficit. No exame feito adiante em apên-

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dice que, repete-se, não pôde ter a profundeza que seria de vantagem dar-lhe, nota-se que os dois grandes capítulos das importações são os das matérias primas e substâncias alimentícias. Os dois, juntos, contaram por 4.660:000 contos sobre um total de 6.859:000 contos, ou cerca de 70 por cento. Em 1947 agravou-se a situação por virtude do grande aumento na classe estatística que inclui veículos.
Deu-se também grande importação de automóveis em 1947.
De tudo ressuma haver necessidade de disciplinar as importações, dentro de normas utilitárias, numa hierarquia de prioridades. A situação financeira e cambial não pode permitir o consumo de coisas de luxo ou escusadas, porque o equipamento económico, tanto mecânico como eléctrico, como de transportes marítimos e ferroviários, ultrapassará em breve as possibilidades à vista dos recursos cambiais.
O relator das contas públicas já chamou a atenção para este assunto, que tem grande interesse nacional, em pareceres anteriores.

Importação de cereais

29. A importação de trigo em grão fez-se em larga escala em 1946. Entraram para consumo 106:000 toneladas. Mas já há uns anos que se agravou a situação do consumo de milho, e em 1940 houve necessidade de importar 131:322 toneladas de milho em grão.
Estas cifras não contam toda a história dos farináceos consumidos no País e importados sobretudo dos Estados Unidos da América, porque há também a considerar o que veio na forma de massas para sopas (98:749 contos), farinha de trigo (61:462 contos) e outros produtos semelhantes. Isto significa que se tornou mais difícil o problema dos cereais e, de um modo geral, dos alimentos farináceos.
Os números que seguem dão as importações de trigo nos últimos tempos:

[Ver Quadro na Imagem]

Em 1946 a importação de cereais em grão pesou na balança comercial com 573:000 contos, sobre um total de 952:400 de farináceos. É uma soma importante, que varia muito com os anos e que pode ser consideràvelmente reduzida se for intensificada a produção interna, sobretudo do milho. Parece não haver dúvidas sobre essa possibilidade no caso de melhor selecção de sementes e emprego de híbridos.
O milho importado em 1946 custou ao País 182:500 contos e o trigo 390:400.
O que se importou de cereais em grão representa cerca de 9 por cento do total das importações.

III

INDÚSTRIAS EM REGIME ESPECIAL

30. O aumento da receita deste capítulo, em relação a 1945, deu-se em quase todas as verbas que o compõem, mas ainda mais acentuadamente na indústria de pesca, no fabrico e venda de tabacos e no imposto ferroviário. A diminuição digna de registo é a do imposto de minas, que desceu 4:009 contos. O ano passado já havia decrescido perto de 9:000.
Os números são os que seguem, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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O exame minucioso das cifras e do que elas significam na ordem económica e até social dá-nos algumas indicações interessantes.
A protecção ao consumo dos vinhos, que se exerce pela elevação do imposto de fabrico de cerveja, produz hoje cerca de 7:600 contos. Não atingia 2:000 em 1938. A exportação de cerveja aumentou bastante durante o período de guerra, tanto para territórios estrangeiros como para os domínios de além-mar, e parece que o consumo interno também se desenvolveu.
A exportação em 1938 foi de 423:000 litros, dos quais 418:700 foram para o ultramar português. Em 1946 a exportação subiu para 783:000 litros, cabendo às províncias ultramarinas 724:000.
Os principais países importadores foram: Gibraltar, Marrocos e o Brasil.
O vício do fumo contribui com elevadas quantias para o erário público. Aparecem em diversos capítulos e não é fácil fazer o cômputo da receita total que dele deriva, porque haveria que considerar também actividades acessórias, como a dos fósforos e outras.
Um apanhado bastante aproximado dá as seguintes receitas:

[Ver Apanhado na Imagem]

Como se nota, o aumento no período da guerra foi muito grande e teve motivo fundamental no aumento de consumo.
Não é este o lugar para estudar os efeitos deste acréscimo no consumo de tabaco, que se reflecte apreciavelmente na vida financeira do Estado, assim como na balança comercial, visto grande parte do tabaco importado provir do estrangeiro. Talvez fosse de vantagem estudar as possibilidades, neste aspecto, dos domínios de além-mar.
O imposto de minas desceu, como se esperava. Passou a euforia dos grandes negócios mineiros e o imposto regressa gradualmente à normalidade, e esta limita-se à cobrança de uns 2 a 3 mil contos por ano.
A pesca contribui para o erário com somas que estão a subir sempre. É com certeza ocasião para analisar, com certo cuidado, o exercício desta indústria, altamente valiosa para o País. O imposto vem de dois tipos de pesca inteiramente distintos: o que se aplica à matéria-prima (peixe) exportada sob a forma de conservas e ao pescado consumido dentro do País e que tão grande auxílio deu à alimentação interna no período de escassez. É difícil fazer a destrinça entre os dois e parece que se contabilizam e cobram em conjunto. Só um exame mais completo do assunto poderá dar indicações que possam fundamentar medidas no sentido de avaliar o que é utilizado no consumo interno.
O imposto ferroviário não deve ser confundido com as receitas do Fundo Especial de Caminhos de Ferro, adiante indicado, embora ambos signifiquem parte de uma percentagem cobrada sobre as receitas das empresas ferroviárias. Subiu este ano a 16:232 contos, bastante mais do que em 1938, o que é devido ao grande desenvolvimento do tráfego, como se verificará adiante quando se discutirem as despesas da Direcção Geral de Caminhos de Ferro.
O imposto sobre espectáculos também subiu, assim como o do jogo. Mas neste último a subida não é grande, embora duplicasse no período compreendido entre 1938 e 1946.
Os diversos incluem apenas um novo imposto criado sobre o fabrico de câmaras de ar e protectores, que compensa indirectamente a perda nos direitos de importação.
No conjunto este capítulo sofreu mudança para mais no total do seu rendimento, que atingiu perto de 148:000 contos em relação a 1938 e cerca de 26:700 contos em confronto com o ano de 1945.

IV

TAXAS

31. Também se deu grande aumento no produto das taxas, que se cifra em perto de 124:000 contos quando se compara com 1938 e cerca de 35:000 relativamente a 1945. Os números são os que seguem, em contos:

[Ver Tabela na Imagem]

Foi nos serviços administrativo» que se deu a grande subida. Passaram as suas receitas de 37:441 contos em 1938 para 78:365 em 1946. Talvez que o exame das principais verbas possa dar indicações sobre o seu significado
financeiro e até administrativo e lançar luz sobre a origem e a projecção de algumas.
Elas são constituídas por uma infinidade de quantias, umas pequenas, outras maiores. Pondo de parte as multas,

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que no quadro se inscreveram em separado, a mais importante refere-se às taxas adicionais sobre as licenças das câmaras municipais, que totalizaram mais de 12:000 contos em 1946. Não deve isso confundir-se com as percentagens sobre as cobranças dos corpos administrativos, que se aproximam de 7:000 contos.
As receitas nos termos do Código da Estrada têm aumentado, assim como as que se referem ao uso de acendedores e isqueiros. Alguns dos aumentos não são mais do que a actualização da taxa, que é necessária por virtude da elevação de preços. Outros representam de facto a necessidade de maiores cobranças. Deve contudo dizer-se que o abuso de taxas tem inconvenientes grandes, de ordem administrativa, que seria vantajoso eliminar. Nos números que adiante se mencionam tomam-se em conta apenas as receitas mais importantes inscritas neste capítulo, aquelas que formam a maior parte do conjunto. São as seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

Nota-se serem as taxas de adicionais a corpos administrativos as mais valiosas, além do que é cobrado em conta de organismos corporativos nas alfândegas.

32. Nos serviços alfandegários houve aumento importante, como era de prever, dado o desenvolvimento em valor do comércio externo.
Neste caso há três tipos de emolumentos que formam quase toda a receita: os das alfândegas (37:240 contos), os da guarda fiscal (354 contos) e os dos processos do contencioso (2 contos). O resto é constituído por taxas do tráfego (5:699 contos) e venda de impressos (1:339 contos). No conjunto de 44:935 contos são os emolumentos que somam a maior parte.

33. Nos serviços de fomento as maiores valias foram de 13:749 contos e 6:747 em relação a 1938 e 1945. As verbas mais importantes dizem respeito à conta de
particulares, nos serviços hidráulicos e industriais, que têm contrapartida e às taxas que derivam da Inspecção Geral das Indústrias e Comércio Agrícolas. As taxas das bolsas de mercadorias renderam 1:405 contos.
Também fazem parte dos serviços de fomento, embora se mencionem à parte no quadro acima transcrito, as taxas dos serviços da marinha mercante, que se mantiveram no nível de 1938.

34. Nos serviços da instrução a receita subiu de 12:046 contos em 1938 ou 15:984 em 1945 para 16:172. E isso foi devido a razões já apontadas em pareceres anteriores.
O caso dos serviços judiciais e de registo é importante, porque teve apreciável subida.
As receitas mais valiosas foram, para os três anos mencionados, as seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

Vê-se ter havido aumento sensível nos impostos de justiça cível e crime. Foi essencialmente nestes dois impostos, no Arquivo de Identificação e no registo policial, que se deu o desenvolvimento das receitas.

35. Nos serviços sanitários as verbas são pequenas e dizem respeito a emolumentos (182 contos), a taxas sobre estabelecimentos insalubres (194 contos) e pouco mais.

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A baixa nos serviços multares proveio de menores quantias entregues pelos serviços produtores do Ministério, que passaram de 7:314 contos em 1945 para 5:489 em 1946.
As multas desceram 2:000 contos e os emolumentos consulares aumentaram 9:700.
Este resumo do capitulo sobre taxas não nos mostra toda a história que as contas narram, porque muitas outras se aplicam e não podem ser discriminadas agora, por não terem grande importância.
O uso imoderado de taxas de diversa natureza causa incómodos muitas vezes, e com frequência se nota, e as contas o dizem, não valer a pena essa cobrança. Pode até acontecer que seja benéfico sacrificar algumas receitas e poupar os inconvenientes que advêem da sua cobrança.
Sobre este aspecto há queixumes que conviria ouvir e dar remédio quando possível. Talvez fosse de boa política.

V

DOMÍNIO PRIVADO E PARTICIPAÇÃO DE LUCROS

36. A receita do domínio privado e participação nos lucros também aumentou muito em 1946, e isso deve-se a razões que abaixo se explicarão.
O total do acréscimo em relação a 1938 e 1945 foi, respectivamente, de 119:744 e 81:940 contos.
Os números são os que a seguir se mencionam:

[Ver Tabela na Imagem]

Alguns dos serviços que contribuem com receitas para este capítulo serão estudados adiante, quando se tratar das suas despesas, mas convém neste lugar fazer uma leve resenha da origem das receitas e do que representam na Conta Geral do Estado.
Em receitas diversas incluem-se variadas verbas. A mais importante de todas diz respeito a censos, foros, pensões, juros, laudémios e rendas, que em 1946 produziram 2:340 contos. As outras referem-se a fazendas abandonadas e fianças-crimes quebradas e a depósitos de contratos não cumpridos, a heranças jacentes, a produto de vendas de navios, a revistas agrícolas e outras pequenas verbas. Tudo se elevou em 1946 a 3:309 contos.
Este ano, em comparação com o anterior, a participação em lucros aumentou muito, como pode verificar-se nos números seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

Nota-se ter havido um acréscimo de 67:378 contos na participação de lucros.
Veio quase, em sua totalidade, da participação do Estado nas lotarias e da entrega de 50:000 contos feita pelo Instituto Português de Combustíveis.
No primeiro caso, a participação do Estado corresponde a uma percentagem sobre o total da receita das lotarias, que subiu muito em 1946. Disso resultou mais 17:715 contos para essa participação.
O caso do Instituto de Combustíveis provém da liquidação do serviço de racionamento. O Instituto, com o fim da guerra, regressou à sua posição anterior. O apuramento de contas trouxe para o Estado 50:000 contos.
Não é possível fazer neste lugar o estudo da interferência do Instituto na importação de óleos durante o conflito e do destino que tiveram as verbas que por esse motivo foram acumuladas e que serviram para diversos fins, alguns já apontados em pareceres anteriores.
As comparticipações do Estado no Banco de Portugal mantiveram-se.
Quanto aos serviços públicos, os factos dignos de registo são os aumentos nos serviços florestais (8:428

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contos) e nos portos de Lisboa e Douro-Leixões (4:972 contos). Mas num e noutro caso pouca influência têm na vida financeira da Nação, visto os próprios serviços consumirem grandes verbas.

37. As explorações do Estado, a que usualmente se faz referência nestes pareceres, tiveram o movimento seguinte em 1946:

[Ver Tabela na Imagem]

O saldo positivo dos serviços florestais, em contrário do que tem acontecido no passado, é de interesse. Na verdade, a exploração racional da massa florestal do Estado deve produzir lucros apreciáveis.
Os deficits da Casa da Moeda e da Imprensa Nacional já foram explicados em pareceres relativos a outros anos.
Resta mencionar a comparticipação do Estado nas operações da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, que sobe, como é conhecido, a 80 por cento dos seus lucros. Essa comparticipação arredondou-se em 1946 para 15:380 contos.
Diversas razões concorreram para a sua diminuição nos últimos anos, mas entre elas tem importância fundamental o grande decréscimo que houve no capital mutuado por virtude da guerra. Outras, embora de menor influência, derivaram da baixa na taxa de juros, como se verificará adiante, do aumento de depósitos imobilizados, sem emprego, da necessidade de promover maiores reservas para edifícios a fim de alargar as instalações do estabelecimento e ainda por motivo de serviços gratuitos prestados ao Estado.

VI

RENDIMENTO DE CAPITAIS

38. Mantiveram-se dentro da ordem de grandeza dos anos anteriores as receitas deste capitulo.
A ligeira subida de 8:896 contos em 1940 para 8:971 em 1946 derivou de maiores dividendos de acções de bancos e companhias na posse do Estado.
Os números são os que constam do quadro seguinte, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Apesar dos aumentos nas comparticipações de capital em diversas empresas, as cifras dos seus rendimentos não variam muito, como se nota no quadro que segue:

Contos

1930-1931.......................................... 6:781
1931-1932.......................................... 11:008
1932-1933.......................................... 10:732
1938............................................... 8:348
1943............................................... 6:941
1944............................................... 9:282
1945............................................... 8:896
1946............................................... 8:971

É até certo ponto de extranhar o pequeno rendimento deste capítulo, considerada sobretudo a importância do capital nominal dos títulos, acções e obrigações, que constituem a carteira.

VII

REEMBOLSOS E REPOSIÇÕES

39. É através deste capítulo que o Estado recebe as verbas abonadas periodicamente para diversos fins e as quantias gastas por alguns dos seus organismos em trabalhos executados por conta deles. Além disso nele cabem também importâncias recebidas indevidamente e reembolsadas depois. Os números para 1946 e sua comparação com os de anos anteriores são os do quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

No exame de certo número de gerências há, por vezes, encontro de muitas das contas inscritas neste capitulo, como, por exemplo, verbas anteriormente distribuídas para obras, melhorias ou encargos de empréstimos. De modo que, em geral, o que aqui se contém é parte do que anteriormente saiu do Tesouro.
Os vários empréstimos que estão a ser reembolsados são os seguintes: apetrechamento do porto do Lobito, obras do porto de Lisboa, casas económicas, correios, telégrafos e telefones, porto de Vila Real de Santo António, porto de Setúbal e Fundo Especial de Caminhos de Ferro.

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As garantias de juros dizem respeito às linhas da Beira Baixa (627 contos), ao porto de Mormugão, inscrita em despesa, e em menores quantias às linhas de Mirandela a Bragança, Foz Tua a Mirandela, Santa Comba a Viseu e Vale do Vouga.
Nos diversos incluem-se variadas quantias, mas as que interessam em cerca de 50 por cento do total referem-se a construções executadas pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações para os diversos organismos do Estado.
Quando se tratar adiante dos edifícios públicos hão-de fazer-se maiores referências à sua actividade.
Publica-se a seguir nota das verbas despendidas em 1946, relacionadas com as de anos anteriores:

[Ver Quadro na Imagem]

VIII

CONSIGNAÇÕES DE RECEITAS

40. O aumento de 82:650 contos neste capítulo, em relação a 1938, deu-se sobretudo no Fundo Especial de Caminhos de Ferro e em outros de fomento, no de assistência e nos portos. Os números relativos a esta receita, apresentados em comparação com os anos anteriores, são os do quadro que a seguir se indica :

[Ver Quadro na Imagem]

Como se sabe os juros de títulos na posse da Fazenda variam apreciavelmente de ano para ano, conforme o movimento dos titulos. Contabilizaram-se em 1946 menos 19:110 contos do que em 1945.
Esta rubrica não tem qualquer influência nas Contas, e todos os anos se deduz das receitas.

41. O Fundo Especial de Caminhos de Ferro aumentou em relação ao ano passado cerca de 14:200 contos. Não foi isso devido a correspondente acréscimo no tráfego, mas à cobrança de liquidações atrasadas. Nos outros fundos de fomento também se deram melhorias apreciáveis. As mais importantes são:

[Ver Quadro na Imagem]

42. As receitas dos portos ainda aumentaram em 1946, atingindo 17:804 contos. A de um deles diminuiu e ainda há-de diminuir mais. O seu movimento durante o conflito permitiu aumento apreciável nas receitas. Foi o de Angra do Heroísmo.
Os números para 1939, 1945 e 1946 são os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

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Não pode fazer-se agora o estudo das causas do aumento da receita, muito grande desde 1939. A maior valia atingiu 9:374 contos, mais do que a receita total antes da guerra. Onde houve maior desenvolvimento da receita foi em Angra do Heroísmo (perto de 2:000 contos), nos portos da Madeira (cerca de 1:140 contos), no de Aveiro (mais de 1:200 contos) e no de Setúbal (cerca de 1:500 contos). Os aumentos foram menores nos outros, notando-se contudo sensível alargamento da receita nos portos do Algarve, sobretudo nos que pertencem à Junta Autónoma dos Portos de Sotavento: Faro, Olhão, Tavira e Vila Real de Santo António.

DESPESAS

1. Em 1946 as despesas cresceram, e muito. Não subiram apenas as ordinárias, mas também as extraordinárias. Ao todo, o aumento, em relação a 1945, foi de 698:172 contos, dos quais 408:628 pertencem às extraordinárias. E se do conjunto for deduzido o que se pagou por estas, como amortização de dívida (185:152 contos), o acréscimo arredonda-se para 513:020 contos.
Ver-se-á adiante, com grande minúcia, onde se deram os aumentos. E então serão feitos alguns comentários sobre as causas que os originaram.
Era fatal, e não podem ser postas objecções fundamentadas a um desenvolvimento da despesa em relação ao período anterior à guerra, e as razões são bem conhecidas.
Os acréscimos tiveram lugar em quase todas as rubricas do orçamento: no pessoal, no material e nos diversos encargos. Não vale a pena escrever agora mais do que se disse em outros pareceres para justificar um aumento.
Há todavia que opor sérias reservas ao que se gasta com certas obras e serviços. Duas razões concorrem para isso:
Uma é a que deriva naturalmente das estimativas das receitas no futuro próximo. Apesar de ainda este ano elas acusarem um acréscimo sensível, e talvez que ele ainda seja maior em 1947, sabe-se qual a sua origem.
Já atrás tudo se explicou, e no apêndice a este parecer o assunto será estudado com maior minúcia. Dessas causas se deduz facilmente que um dos objectivos do Estado deve ser neutralizar a feição que está assumindo o comércio externo, e isso naturalmente só poderá ser realizado pelo desenvolvimento da produção interna, decréscimo nas importações e, portanto, nos direitos aduaneiros e receitas.
Se tudo não for acompanhado de atento exame das despesas ordinárias, cair-se-á no risco de sérias dificuldades de equilíbrio nas contas.
A impressão geral que deixa o estudo das cifras que traduzem as despesas é a da absoluta necessidade de reduzi-las na parte relativa à existência de serviços redundantes - e o exame de cada Ministério permite assegurar que tal é possível.
Enquanto não for melhorado muito o rendimento nacional, e por consequência as receitas do Estado, pois elas são dele uma fracção, não é aconselhável permitir o estabelecimento de novos serviços ou o alargamento dos existentes, quando adiáveis ou dispensáveis.
A questão tem de ser posta com viveza, porque requer estudo imediato. Não o pode ser apenas no Ministério das Finanças, que organiza o orçamento e as contas. Tem de ser examinada em cada um dos departamentos do Estado. E o método a adoptar aproximar-se-á do que foi seguido em 1928, quando se procedeu em todos os Ministérios a um cuidadoso exume da despesa, do qual, sem prejuízo para os serviços e antes com manifesta vantagem, se obtiveram grandes economias.
A guerra, com suas influências nefastas, deixou no orçamento excrescências que convém podar o mais breve que se possa. No espirito de muita gente ainda perdura a ideia do Estado rico, ou das possibilidades de obter grandes receitas por meios puramente fiscais.
Já começa a sentir-se a falência destas suposições e andam no ar queixumes de imposições tributárias exageradas. Convém, a tempo e horas, verificar as razões destes queixumes e deferir o requerimento daqueles que dizem ser exagerados os gastos em muitos sectores da coisa pública.

2. As economias a fazer são de diversa natureza e de importância variável. Podem ser pequenas muitas delas; outras podem ser maiores.
Umas dizem respeito a pessoal; outras relacionam-se com material ou diversos encargos. O que, porém, sobressai de tudo é a absoluta necessidade de as fazer. Não é que, no conjunto, o total da despesa economizada possa ser grande ou pequeno. E, possivelmente, não poderá ser grande, atentas as necessidades ainda não satisfeitas de muitos serviços.
No ritmo em que tem seguido o orçamento da despesa há-de ser muito difícil delinear e executar algumas das reformas de que tanto carecem certos serviços do Estado, algumas das quais todos os anos são mencionadas nestes pareceres, como, por exemplo, a criação e uso, porque não basta criá-los, de laboratórios convenientes no ensino e nos organismos que habitualmente os utilizam ou deviam utilizar.
As reformas a operar, como aliás se fez no passado, têm de basear-se em mais perfeita e coordenada concentração de serviços com instalações próprias, a começar pelas mais úteis. Os casos aqui citados relativos a laboratórios podem estender-se a muitos outros aspectos da actividade do Estado.

A dispersão de serviços públicos

3. Este é um assunto que tem sido alvo de discussões, com reflexos nestes pareceres. A tendência acentuada há muito tempo na vida burocrática e administrativa do País é a da dispersão dos serviços. Dessa dispersão resultam em geral duas consequências, ambas graves. Uma é a ineficiência, por falta de recursos e por falta de pessoal especializado. Organizar diversos serviços com objectivo idêntico requer, evidentemente, mais pessoal, e, como grande número de funções do Estado tem hoje carácter altamente especializado, torna-se quase sempre difícil recrutá-lo num meio de cultura reduzida e acanhada, neste aspecto.
A outra consequência da dispersão materializa-se em maior despesa, no custo mais elevado de serviços. Num país que necessita de concentrar os seus recursos financeiros e extrair deles o maior rendimento possível, por serem poucos e por serem grandes as necessidades, dispersar serviços afins, encarecer o seu custo é, sem sombra de dúvida, erro administrativo que fere directamente o interesse do Estado e do contribuinte.

A ineficiência

4. A ineficiência pode resultar de variadas causas. Umas estão directamente relacionadas com a qualidade

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do trabalho produzido - e por consequência com o pessoal -, outras com a da falta de verbas ou dotações.
Ainda se não julgou próprio estabelecer entre nós métodos especiais de recrutamento do pessoal do Estado. Durante algum tempo, logo a seguir ao início da reorganização financeira, o método seguido foi o do concurso, com um mínimo de habilitações literárias, ou científicas, para o pessoal dos quadros. As deficiências do ensino secundário e do superior reflectiram-se nos serviços.
Eram apenas atenuadas em alguns casos pela exigência, nos concursos, de certos conhecimentos especializados. A adaptação do funcionário fazia-se depois do concurso, na repartição em que trabalhava, e as suas naturais aptidões desenvolviam-se ali.
Com o tempo, porém, e sobretudo depois da guerra, o princípio do concurso deixou de ter a importância e os efeitos dos anos anteriores. Transitou de grupos de pessoal eventual ou contratado para quadros fixos grande número de funcionários e acentuou-se a teoria de nomeação directa, sem concurso e por escolha, de chefes e outro pessoal superior. Não se pode dizer que esta prática tivesse levado ao melhor rendimento. Ela deu lugar a abusos e até certo ponto fere interesses do pessoal dos quadros, que, por seu zelo, dedicação e inteligência, tem direito à promoção.
Ora a eficácia dos serviços reflecte-se directamente, e em cheio, nas despesas públicas. À parte a necessidade de mais pessoal para executar determinada tarefa, há ainda que ter em conta o descontentamento dos que, vendo desvanecidas as esperanças de melhor dia de amanhã, perdem o incentivo, que é mãi de maior e mais perfeita actividade.
É sabido, e foi sempre um grande mal na vida pública portuguesa, a falta de organização, que se traduz em operações escusadas, na repetição inútil de tarefas, na sobreposição de funções - dois organismos a executarem trabalho idêntico, - na exigência escusada de papéis, em duplicado, ou triplicado, distribuídos por diversas repartições, que na maior parte dos casos não têm utilidade, e nem mesmo são verificados.
Este mal agravou-se consideràvelmente com a guerra. Parecia que a vasta organização corporativa deveria ter aliviado grandemente o Estado em matérias relacionadas com as operações resultantes do movimento económico - como a agricultura, o comércio e a indústria. Mas o exame de certos serviços, como, por exemplo, os das alfândegas, mostra que sobre os organismos do Estado caiu, quase de repente, um somatório de trabalho que a sua própria estrutura dificilmente comportava - e daí demoras, discussões, atrasos e até erros.
O actual estado de coisas não depende só de reformas, que são periódicas e frequentes. Legisla-se repetidas vezes sobre determinado assunto e tomam-se medidas que vão aumentar o trabalho de outros organismos, sem seu conhecimento, e até sem estrutura administrativa susceptível de corresponder ao maior esforço que lhes é exigido por determinações tomadas sem seu parecer. Daí derivam desequilíbrios que, em última análise, se repercutem na actividade do Estado, considerado no conjunto, e trazem prejuízos ao público, que por lei é obrigado a utilizar os serviços.
Todos estes assuntos são por demais conhecidos e muitas vezes têm sido discutidos, por uma ou outra forma. Dão lugar a protestos, a amargas recriminações e, em geral, trazem maiores despesas públicas. Não conduzem quase nunca a melhor eficiência nos serviços.

A concentração de serviços

5. Diversas vezes se aludiu nestes pareceres à concentração dos serviços - à possibilidade de juntar, num mesmo organismo especializado e responsável, tarefas idênticas. Mencionaram-se os serviços topográficos, os laboratórios universitários, os serviços meteorológicos, as comissões de obras, os serviços agrícolas, os de natureza hidráulica e outros.
À lista poderia acrescentar-se casos que se discutirão nos respectivos capítulos, tão evidentes que não deveriam sequer mencionar-se neste lugar. Um deles é, por exemplo, a actividade estatística, que se desenvolveu nos últimos anos em muitos organismos e que não pode ter nem a utilidade, nem a repercussão, nem a oportunidade que teria se, na verdade, estivesse concentrada, como por lei foi determinado, no organismo especializado que o Estado criou para tal fim, e que possui os elementos necessários para orientar e executar tudo o que diz respeito à colheita e distribuição da estatística nacional.
Mas, como estes, há ainda outros de interesse. Os exemplos mais relevantes, no campo da investigação económico-científica, são os dos serviços geológicos, da carta dos solos, da prospecção mineira, em relação com os serviços geográficos e cadastrais - os quais deveriam ter bem mais íntimas ligações com os trabalhos executados pelo Ministério da Guerra em matéria cartográfica.
Há necessidade de operar uma grande reforma nos serviços públicos, como aliás já no após guerra tem sido feito em muitos países, no sentido de os tornar mais práticos e simples e de obter deles maior rendimento, tendo sempre em conta uma melhor remuneração dos que servem o Estado. Só deste modo é possível recrutar os melhores valores.

AS CONTAS

6. As receitas e despesas públicas nos anos de 1938 a 1946 são comparadas no quadro que se publica a seguir e cujas verbas são indicadas em contos.
Assim, podemos verificar:

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento da despesa ordinária em relação ao ano anterior à guerra foi de 1.120:000 contos, números redondos. O maior aumento deu-se de 1940 para 1946.
As receitas ordinárias, como se mostra na primeira e segunda colonas, ainda tiveram maiores acréscimos. E deveu-se a isso ter sido possível liquidar muitas despesas de natureza extraordinária por força dos excessos de receitas.

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7. No quadro que segue mostram-se os excessos de receitas sobre despesas ordinárias.

Contos

1938.................................................. 333:700
1939.................................................. 249:400
1940.................................................. 301:100
1941.................................................. 491:800
1942.................................................. 936:000
1943.................................................. 1.001:000
1944.................................................. 823:500
1945.................................................. 573:000
1946.................................................. 856:000

Nele se verifica que elas foram sempre substanciais, sobretudo em 1942, 1943, 1944 e 1946.
Enquanto se mantiverem os ordenados públicos no actual nível e houver preocupações com as receitas, há-de perdurar o estado de coisas que permite o emprego de excessos de receitas ordinárias em gastos extraordinários de grande importância.
Tudo indica, porém, que a forca das circunstâncias influirá no sentido de desviar menos quantitativo das receitas ordinárias para pagamento de despesas extraordinárias. O ritmo das obras liquidadas por este processo há-de diminuir consideràvelmente. Por isso uma vez mais se aconselha que seja preferido o financiamento de obras de reprodutividade imediata, em vez de outras de menor interesse económico.

DESPESAS ORDINÁRIAS

8. O total das despesas públicas em 1946 atingiu 4.623:940 contos, mais cerca de 700:000 do que em 1945, e mais 2.326:000 do que em 1938.
Os números são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Estas despesas foram liquidadas pelas receitas seguintes, discriminadas por origem:

[Ver Quadro na Imagem]

Despesas orçamentadas e pagas

9. A diferença entre o que foi orçamentado como despesa ordinária e o que se pagou é muito pequena este ano. Não atinge 7 por cento. A cifra está bem dentro dos limites em previsões desta natureza. O quadro que segue indica onde se deram os desvios:

[Ver Quadro na Imagem]

A evolução das despesas pagas, relacionada com o ano anterior à guerra, consta do quadro que segue, em contos. Nele se mostra, num largo período de anos, o crescimento dos gastos públicos.

[Ver Quadro na Imagem]

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Para dar melhor ideia da divisão das despesas por serviços próprios e encargos, repete-se o quadro que habitualmente se publica nestes pareceres e em que se comparam as despesas desde 1930-1931.

[Ver Quadro na Imagem]

10. Os aumentos ou diminuições da despesa relativamente a 1939 e 1940 constam dos números que seguem, em contos. Nesta tabela nota-se claramente onde se deram as maiores valias.

[Ver Tabela na Imagem]

ENCARGOS GERAIS DA NAÇÃO

II. Os números inscritos no quadro da página seguinte exprimem para diversos anos os encargos gerais da Nação.
Os aumentos de despesa, quer em relação a 1939, quer a 1945, deram-se em todas as rubricas, mas especialmente nas pensões e reformas e na Presidência do Conselho, neste último caso por motivos que adiante serão explicados. Quanto a pensões e reformas as razões são conhecidas. Neste último caso as cifras que lhes dizem respeito não exprimem a realidade. De facto, a dotação da Caixa Geral de Aposentações não é suficiente para permitir o regular andamento dos processos de aposentação. Dai resulta que se encontram em atraso muitos deles.
Os respectivos titulares recebem pelo serviço a que pertenciam.
Inscrevem-se, por estas razões, no orçamento das despesas ordinárias, apreciáveis verbas que não correspondem a serviços e servem para liquidar os ordenados de funcionários aguardando aposentação.
Na verba da representação nacional (Assembleia Nacional e Câmara Corporativa) as maiores valias na despesa derivaram do seu funcionamento por períodos mais longos. Os números são os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

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PRESIDÊNCIA DO CONSELHO

12. As despesas da Presidência do Conselho subiram para 34:188 contos, mais 7:619 e 20:071 do que, respectivamente, em 1945 e 1938. As cifras, discriminadas, são as que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Instituto de Seguros Sociais.

Há este ano a contar com os novos serviços de meteorologia e dos Aeroportos de Lisboa e Pedras Rubras, que adicionaram 6:912 contos à despesa normal, quer em relação a 1938, quer em relação a 1945. Daqui deriva que o aumento em relação a este último ano foi apenas de 706 contos. Na verdade o Secretariado da Aeronáutica Civil e o Subsecretariado das Corporações tiveram maiores despesas. Os dois juntos gastaram mais 1:313 contos do que em 1945, além do que pelo orçamento das receitas extraordinárias foi atribuído ao primeiro.
No que diz respeito a 1938, o acréscimo em 1946 foi superior em 20:603 contos. Isso derivou de maiores consumos no Subsecretariado das Corporações (3:328 contos), no Secretariado da Propaganda (7:600 contos) e nos novos serviços de meteorologia, aeronáutica e outros já mencionados atrás.
O exame das contas da Presidência do Conselho mostra o seguinte:

Serviços novos

13. No Serviço Meteorológico Nacional as despesas repartem-se do modo que segue:

Contos

Pessoal.................................................... 329
Material................................................... 3:738
Encargos................................................... 461

Total...................................................... 4:528

A verba deste ano é elevada porque se inscreveu em material a quantia de 2:700 contos utilizados na compra de um edifício. Tirando esta verba, a despesa propriamente do serviço de meteorologia foi de 1:827 contos, dos quais 1:600 em Lisboa e na Madeira e 227 nos Açores.
O Secretariado da Aeronáutica Civil custou 3:721 contos. A verba mais importante é a de 1:039 contos e diz respeito às despesas com os centros de aviação sem motor.
Por despesas extraordinárias este Secretariado recebeu 58:000 contos destinados a compra de material.
A verba do Aeroporto de Lisboa tem compensação em receita inscrita no capitulo «Domínio privado». A receita inscrita neste capítulo foi de 2:300.743$.
O Secretariado da Propaganda diminuiu a sua despesa de 12:243 contos em 1945 para 11:525 em 1946. A diminuição deu-se nos encargos administrativos, na verba inscrita para satisfação de despesas resultantes da execução dos decretos n.ºs 34:133 e 34:134. Passou de 5:620 para 3:800 em 1946. A maior valia na despesa, em relação a 1938, foi de 7:597 contos, a que deverá subtrair-se o custo do turismo, que nesse ano se encontrava no Ministério do Interior, e parte do pessoal que transitou em 1944 para o Secretariado de outros serviços. Os números para os três anos são os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

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Como se nota, foi longo o caminho andado desde 1938. Deu-se o aumento de 7:600 contos, números redondos. No pessoal acham-se incluídas verbas que não faziam parte do orçamento de 1938, como os serviços de censura.
Em relação a 1945, os acréscimos deram-se em todas as rubricas, com excepção da verba gasta ao abrigo dos decretos n.08 34:133 e 34:134, que diminuiu 1:820 contos. A aparente diminuição foi devida a isso.
O Subsecretariado das Corporações também continua a aumentar bastante a despesa. A maior valia em 1946 foi de 003 contos em relação a 1945. Relativamente a 1938, o acréscimo andou à roda de 3:300 contos. Deve ter-se em vista o seu desenvolvimento nos últimos anos.

Emissora Nacional

14. Como pedido, foram submetidos ao relator das contas públicas os elementos necessários para apreciação da actividade deste organismo do Estado, tanto relativamente a 1945 como a 1946.
Dar-se-á neste parecer uma rápida súmula desses elementos. For eles se poderá avaliar do desenvolvimento dos serviços e do destino das suas receitas.

Receitas ordinárias

15. A Emissora Nacional vive essencialmente das receitas da radiodifusão, que atingiram 14:945 contos em 1946 e 14:137 em 1945, assim discriminadas:

[Ver Quadro na Imagem]

Despesas ordinárias

16. As despesas ordinárias foram as seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui abono de família.

Além destas receitas e despesas há outras que. por sua natureza, se não consideram agora, embora tenham interesse.
As receitas tom vindo a subir, sobretudo desde o começo da guerra. Eram 9:240 contos em 1941 e atingiram 14:945 em 1946, ou 5:705 a mais. O maior aumento está compreendido entre 1944 e 1946 e foi proveniente do acréscimo nas taxas de radiodifusão, além do maior número de aparelhos sujeitos ao pagamento de taxas de ouvintes.
O progresso das despesas ordinárias não foi tão sensível. Passaram de 7:279 contos em 1941 para 12:535 em 1946. O aumento foi de 5:256.

Discriminação das despesas

17. Nos números da despesa, acima publicados, que incluem o abono de família e suplemento de vencimento, não estão compreendidas as remunerações a cerca de cento e cinquenta colaboradores e cento e vinte instrumentistas.
Contabilizaram-se em "Pagamentos de serviços e diversos encargos" e daí eles representarem quase 56 por cento da despesa.
A verba de "Pessoal" pode discriminar-se assim, em contos:

Contos

Pessoal da produção..................................... 787
Pessoal técnico......................................... 1:659
Pessoal administrativo.................................. 1:063
Pessoal auxiliar........................................ 437
Total................................................... 3:946
3:946

O suplemento a vencimentos e abono de família, incluídos no total, somam 1:142 contos.
A despesa de "Material", em 1946 totalizou 1:600 contos, assim distribuídos:

Contos

Serviços de produção.................................... 143
Serviços técnicos....................................... 858
Encargos gerais......................................... 599
Total................................................... 1:600

As verbas mais salientes são: compra de material artístico - 137 contos; compra e conservação de material radiotécnico - 500 contos; viaturas e sua conservação - 288 contos; impressos - 129 contos, e artigos de expediente - 215 contos.

Diversos encargos

18. Em pagamentos de serviços e diversos encargos está a maior despesa da produção. Vale a pena discriminar este capítulo, que apresenta a seguinte forma:

Contos

Produção............................................... 4:044
Serviços técnicos...................................... 1:418
Serviços administrativos............................... 585
Despesas gerais........................................ 942
Total.................................................. 6:989

Despesas da produção. - Os números mais importantes para as despesas da produção são os seguintes:

Contos

Orquestras.............................................. 2:285
Colaboração em programas................................ 1:383
Encargos com novas obras musicais....................... 118
Direitos de autor....................................... 144
Diversas................................................ 114
Total da produção....................................... 4:044

Não parece exagerada a despesa das orquestras nem a da colaboração em programas, comparadas com despesas de organismos similares, tanto mais que a orquestra sinfónica da Emissora constitui hoje um agrupamento que honra o País.

Despesas dos serviços técnicos. - Os serviços técnicos despenderam 1:418 contos, assim divididos:

Contos

Linhas de transmissão..................................... 103
Força motriz.............................................. 945
Encargos de empréstimos................................... 310
Diversas.................................................. 60
Total..................................................... 1:418

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Os encargos de empréstimos dizem respeito ao programa de radiodifusão nacional.
As receitas todos os anos vão diminuindo esses encargos, mas o programa não está ainda completo, e uma instituição como esta está, ou deve estar, em constante desenvolvimento.

Despesas dos serviços administrativos. - Nos serviços administrativos o que mais avulta são as despesas de cobranças, que somaram 439 contos, e as de fiscalização, que subiram a 96. O total foi de 585 contos.

Despesas gerais

19. As despesas gerais atingiram 942 contos e nelas se inscreveram 429 contos para higiene, saúde e conforto, 312 contos para comunicações, 98 para rendas, 49 para missões ao estrangeiro e várias outras, tudo no total de 942 contos.

Distribuição das despesas

20. Com estes números é possível ter ideia geral, individualizada em termos correntes, do custo das actividades da Emissora em 1946:

Percentagens

Serviços de produção........................... 45
Serviços técnicos.............................. 35
Serviços administrativos....................... 20
Total.......................................... 100

Receitas e despesas extraordinárias

21. O programa de radiodifusão (P. R. N.) desde 1940 teve 10:356 contos de encargos, divididos do modo que segue:

Contos

Emissores nacionais................................. 5:495
Emissores regionais................................. 244
Emissores insulares................................. 1:101
Edifícios e terrenos................................ 1:066
Aparelhagem......................................... 1:082
Estudos e outras despesas........................... 1:292
Transmissão......................................... 76
Total............................................... 10:356

Saldos de gerência e sua aplicação

22. A Emissora Nacional, desde a sua organização como serviço autónomo, em Setembro de 1940, produziu 9:247 contos de saldos de exploração - diferença entre as receitas e despesas consideradas normais. Os dois maiores saldos tiveram lugar em 1945 e 1946 e somaram, juntos, 4:792 contos. Parte destes saldos foram gastos e o que resta, ou 5:097 contos, constitui o fundo de reserva a utilizar em melhorias.

Empréstimos

23. A Emissora Nacional contraiu na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência um empréstimo de 12:000 contos em conta corrente, destinado à execução do programa de radiodifusão nacional. Em 31 de Dezembro de 1946 tinha ainda à sua ordem a importância de 2:457 contos. Em 31 de Dezembro de 1947 o saldo do empréstimo era idêntico, por não ter sido levantada qualquer quantia neste ano.
Em breve a Emissora terá de iniciar a sua amortização, que deverá ser feita em dez anos, em prestações iguais.
O pagamento dos encargos absorverá parte dos saldos de gerência a que atrás se aludiu. As receitas, tendo em consideração este facto, não parecem ser demasiadas, tanto mais que melhorias na produção tendem naturalmente a consumir maiores despesas.

Conclusões

24. A Emissora Nacional pode ter na vida portuguesa uma influência muito grande, sobretudo no sentido cultural. O relator das contas públicas, em projecto de lei apresentado à Assembleia Nacional em Fevereiro de 1935, indicou, em termos gerais, um dos serviços importantes que ela podia prestar relacionados com a cultura popular e que outras emissoras, em diversas partes do Mundo, estão hoje prestando.
As suas funções poderiam estender-se ao próprio desenvolvimento da economia interna, por meio de palestras de carácter prático que promovessem o melhor aproveitamento dos recursos nacionais.
A questão era sucintamente explicada no relatório do projecto de lei do modo seguinte 1:

Não basta apenas ensinar a ler e escrever... torna-se indispensável, porém, explicar àqueles que vivem da terra, e nos campos passarão a sua vida, os melhores processos de tirar deles mais produtos e consequentemente aumentar o rendimento familiar... - e mais adiante acrescentava-se - os métodos engendrados, por exemplo, para ensinar a ler e escrever, ou reduzir apreciavelmente o número de analfabetos, sem, de qualquer modo atender à sua futura actuação na vida pública ou mesmo à actuação daqueles que sabem ler e escrever..., não representam tudo; e se se abandonarem as populações apenas com esses elementos, o progresso será menor do que se imagina.

A educação popular era objectivo desse projecto de lei. Formava-se uma junta de cultura popular, tendente a desenvolver por todos os meios possíveis o interesse pela aplicação da rádio à educação das classes populares.

Muitas objecções - acrescentava-se no relatório - se hão-de opor ao plano geral que acaba de ser esboçado e artigos sem fim hão-de ser escritos como comentário ou crítica aos meios e fins analisados e propostos no projecto de lei que segue ...

O projecto não pôde ser aprovado e a ideia caiu no olvido.
Já depois disso diversos países intensificaram, por intermédio das suas emissoras, o que se preconizava em Portugal em 1935 e em alguns, como a Turquia, a Hungria e os próprios Estados Unidos, em casos especiais, serviram-se das emissoras para ensinar a ler e escrever.
O assunto continua a ter actualidade. Porventura terão de ser modificadas algumas das disposições estudadas em 1935 - mas a Emissora pode ser um grande instrumento de educação popular e exercer influência benéfica no bem-estar da gente dos campos.

1 Ver Diário das Sessões de 8 de Fevereiro de 1935.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(37)

A radiodifusão representa hoje na vida dos povos um papel de primeira grandeza. Muitos têm visto nela apenas um instrumento de propaganda política e dessa possibilidade abusaram em extremo. Onde, porém, os seus efeitos se poderão sentir mais é na elevação do nível de cultura.
Seria preciso para esse fim definir claramente o que se entende por nível de cultura e o papel que ela desempenha na melhoria das condições da vida humana, nos aspectos material e espiritual.
Na ordem estética tem havido críticas à organização dos programas da Emissora, e não é este o lugar para emitir juízos ou opiniões sobre um assunto que é, por sua natureza, delicado e depende bastante de gostos e anseios de ordem pessoal.
Nunca poderá haver opiniões unânimes sobre esta matéria, como aliás as não há em quase todos os outros países.
Talvez que o único ponto sobre o qual aqui se poderá dizer alguma coisa, visto a Emissora constituir uma instituição do Estado e por isso cair dentro da alçada da apreciação do labor de um serviço público, seja o seguinte:
A grande massa dos ouvintes não é constituída por pessoas de grande ilustração. As emissões devem pois adaptar-se o mais possível a essa realidade e constituir, no fundo, o veículo de uma melhoria, tanto no aspecto artístico, como no social e económico.

MINISTÉRIO DAS FINANÇAS

25. As despesas do Ministério das Finanças em 1946 somaram 246:745 contos.
Encontram-se divididas pelas suas respectivas rubricas no quadro que a seguir se publica:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui a Intendência Geral do Orçamento.

As maiores valias relativas a 1938 não foram grandes e foram absorvidas, na sua totalidade, pelos subsídios de abono de família e suplemento aos vencimentos.
A diminuição efectuada nas alfândegas teve contrapartida nos aumentos das contribuições e impostos, Casa da Moeda e outras.
Em relação a 1945, o acréscimo deu-se principalmente no suplemento de vencimentos, nas contribuições e impostos e na Fazenda Pública. Hão-de ver-se adiante as suas causas.
Nos outros organismos que fazem parte deste Ministério houve uma acentuada diminuição na despesa do Instituto Nacional de Estatística, que passou de 5:220 contos em 1940 para 4:189 em 1946. Este departamento do Estado, se vierem a materializar-se as ideias de concentrar nele todos os serviços estatísticos, há-de necessitar do reforço da sua dotação. Haverá, relativamente, grande economia por esse facto, em virtude de desaparecerem avultadas verbas em outros organismos, tanto oficiais como corporativos ou pré-corporativos.

Fazenda Pública

26. O alargamento da despesa desta Direcção Geral teve lugar nos serviços centrais, nos Palácios Nacionais e outros bens. Em 1946 inscreveram-se e gastaram-se 2:909 contos para compra de 64:645 acções da Com-

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panhia do Fomento Colonial, e isso, com a compra de semoventes (automóveis), no valor de 2:104 contos, dá logo grande parte do aumento da despesa, em relação ao ano anterior. Pode pôr-se a questão assim:

[Ver Quadro na Imagem]

A verba mais importante na administração dos bens próprios da Fazenda Pública (Palácios Nacionais e outros bens) é a que se utilizou na compra do Palácio de Seteais, em Sintra. Inscreveram-se e gastaram-se em aquisição de imóveis 2:767 contos. Nestes fins se despenderam a mais cerca de 8:000 contos.
Como a diferença entre os dois anos foi de 5:600 contos, números redondos, conclui-se que menores valias realizadas em outras actividades desta Direcção Geral também ajudaram a cobrir os aumentos nos Palácios Nacionais, na compra de acções e na aquisição desemoventes.

Contribuições e impostos

27. A cobrança de receitas pelo Ministério das Finanças, sem levar em linha de conta a inspecção, custou em 1946 o que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Uma das verbas de mais relevo diz respeito à Direcção Geral das Contribuições e Impostos. O seu custo foi assim distribuído em 1946:

Contos

Serviços centrais.................................. 28:139
Direcções de finanças e secções concelhias......... 34:720
2.ª instância do contencioso....................... 181
Tribunais das execuções fiscais.................... 611
Total.............................................. 63:651

Nem tudo representa, porém, despesa dos serviços. Há verbas que variam muito de ano para ano e por isso convém examiná-las cuidadosamente, a fim de determinar o que representam. São as que seguem:

Contos

Restituições........................................ 6:054
Anulações........................................... 16:000
Pagamentos às Juntas Gerais dos Açores e Funchal.... 4:414
26:468

À verba que pertence aos serviços centrais reduz-se. 1:671
Total............................................... 28:139

Nas direcções de finanças e secções concelhias há pagamentos feitos por avaliações, no total de 1:571 contos, e importâncias que sobem a 3:466 contos, com contrapartida, em parte, na receita. Tem de se tomar em conta que estas verbas não pertencem propriamente à despesa do serviço da Direcção Geral.

Casa da Moeda

28. A despesa da Casa da Moeda foi de 13:621 contos em 1945 e 16:564 em 1946. A diferença deu-se na compra de matérias-primas ou produtos acabados ou meio acabados para usos industriais e laboratórios. Foram 9:483 contos em 1945, contra 12:734 em 1946. Estas cifras justificam o aumento. As receitas de amoedação que se inscrevem periodicamente em receitas extraordinárias cobrem em larga escala as despesas deste organismo, que manipula e inscreve no seu orçamento privativo os materiais indispensáveis.
No capítulo do domínio privado e participação de lucros se inscrevem também todos os anos as receitas, e acima se verificou o débito aparente na Conta Geral do Estado.

Instituto Nacional de Estatística

29. Não é possível administração pública conveniente sem um serviço de estatística apurado, rendoso e oportuno. O desenvolvimento que os serviços de estatística têm tomado nas últimas dezenas de anos em todos os países mostra a sua importância. É na base dos elementos colhidos que hoje se planeia a maior parte das medidas de ordem política o económica, que constituem os fundamentos da administração pública.
Os serviços da estatística nacional durante largos anos quase para nada serviam - não por falta de elementos directivos e até de pessoal especializado, mas. quase sempre por virtude do atraso com que eram publicados os resultados colhidos.
A lei n.º 1:911, de Maio de 1935, criou o Instituto Nacional de Estatística e consignou o princípio de centralização das estatísticas portuguesas de interesse nacional. Era, e é, um princípio salutar e vantajoso para o orçamento e para a economia nacional.
Instalado convenientemente o Instituto em edifício próprio e dotado de equipamento moderno, em breve começaram a sentir-se os efeitos dum princípio racional, em matéria de alta especialização, e com tão grandes repercussões na vida económica portuguesa, que decorria um pouco a baloiçar sobre dados incertos e atrasados.
O Instituto Nacional de Estatística tem aperfeiçoado todos os anos os seus serviços e a sua utilidade e deve louvar-se, neste lugar, a sua actuação.

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Organiza-se e publica-se a tempo e horas a maior parte dos elementos essenciais e merece aplauso tudo o que se faça no sentido de desenvolver as suas iniciativas.
Acontece porém, que há muitos organismos a compilar e a exigir o preenchimento de complicados modelos que se repetem muitas vezes. Este facto causa, além de aumento de despesas, inconvenientes, até de ordem política, por virtude dos numerosos pedidos de dados estatísticos que normalmente chegam ao produtor e a outras entidades.
Conviria por isto que o Governo tomasse medidas no sentido de evitar as duplicações e encarregasse definitivamente o Instituto de centralizar tudo.

Despesas totais

30. As despesas totais inscritas no orçamento deste Ministério, incluindo as extraordinárias, foram as seguintes:

Contos

Despesas ordinárias................................. 246:745
Despesas extraordinárias:
Subsídio ao Secretariado da Aeronáutica Civil....... 58:000
Transporte.......................................... 304:745

Abono ao Instituto Geográfico e Cadastral........... 6:000
Casas do Povo....................................... 5
Reembolso do empréstimo do 34/2 por cento de 1936... 185:152
Participação do Estado em empresas hidroeléctricas.. 12:000
U. N. R. R. A....................................... 2:014
Total............................................... 509:910

A verba de 12:000 contos utilizada na participação em empresas hidroeléctricas refere-se ao Cávado e Rabagão (7:500 contos) e à Sociedade Hidroeléctrica do Revué (4:500 contos).

Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência

31. Ainda aumentaram em 1946 os depósitos na Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, que somaram, em 31 de Dezembro daquele ano, 7.418:521 contos, assim divididos:

[Ver Quadro na Imagem]

É sobretudo notável o aumento nos depósitos da Caixa Económica, que, partindo de 1.738:141 em 1938, atingiram 5.315:099 contos em 31 de Dezembro de 1946. E, apesar das circunstâncias em que decorreu o ano de 1947, ainda houve aumento neste ano até 31 de Dezembro.
A evolução deste tipo de depósitos da Caixa Económica desde 1891 é a seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Depósitos

O fenómeno trouxe inconvenientes de diversa natureza, já apontados em relatórios anteriores, e por isso não vale a pena voltar de novo ao assunto. Aliás tudo indica que os depósitos tendem a estacionar e o mercado em breve reabsorverá em fins úteis parte do que tem depositado.

Emprego de fundos

32. Diminuíram os saldos dos empréstimos dos organismos corporativos e dos empréstimos do Estado e das colónias em 31 de Dezembro de 1946, mas todos os outros empregos de capital aumentaram, sobretudo os empréstimos a câmaras municipais e o crédito hipotecário. O acréscimo acentuou-se muito em 1947.
Os números são os que seguem, em contos, para as principais rubricas na tabela da página seguinte.

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Credora.

As receitas reflectiram um pouco a importância do capital mutuado e foram as que se transcrevem adiante.
Representam melhoria apreciável sobre o ano anterior, que se há-de acentuar nos anos próximos.

[Ver Quadro na Imagem]

Despesas

33. O aumento de desposas derivou essencialmente do aumento de depósitos. Nos depósitos à vista, que constituem o maior volume, os encargos do juros passaram de 42:726 contos em 1945 para 47:801 em 1946, mais 5:120 contos. As despesas de material, pessoal e outros encargos também tiveram as repercussões inevitáveis, mas mantiveram-se dentro de limites. Têm tendência para aumento. Os números, para os encargos de toda a espécie de depósitos, são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Apesar deste acréscimo na despesa os lucros brutos aumentaram. A conta pode estabelecer-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

Fundos de reserva

34. Nos fundos de reserva a cifra mais importante diz respeito ao fundo de flutuação de títulos, que atingiu 209:812 contos em 1946. Como o nome indica, o seu quantitativo depende da flutuação do valor dos títulos em carteira.

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Os outros fundos do importância, além do de provisão, fundos de reserva em 31 de Dezembro de 1046 fórum os referem-se a material e a propriedades. No conjunto, os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Caixa Nacional de Crédito Activo

35. Continuou crescendo a procura de crédito. O capital mutuado em fins de 1946 atingia 550:549 contos, não chegando contudo a alcançar o dos anos anteriores ao conflito.
A distribuição de empréstimos pelas diversas modalidades de crédito mutuado por esta instituição fez-se pelo modo que se indica no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

O crédito industrial foi o que progrediu mais. Mas deve atender-se a que pelo crédito hipotecário, nos serviços privativos, também se mobilizam grandes quantias destinadas à lavoura.
Veio a seguir o crédito agrícola mútuo. Nos oito primeiros meses de 1947 o desenvolvimento do crédito foi bastante maior.

Passivo

36. Como é conhecido, a Caixa Nacional de Crédito vive em grande parte dos fundos emprestados pela Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, mantendo uma conta corrente que atingia 402:824 contos em fins de 1946.
O passivo da Caixa Nacional de Crédito consta do quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Taxas de juro e crédito

37. Por virtude da sua carteira de depósitos e largas ramificações no País, a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência desempenha na economia interna um papel de primeira grandeza.
Contando com as suas disponibilidades, tem sido possível baixar gradualmente as taxas de juro até nível que as coloca hoje em paridade com países tradicionalmente conhecidos pela baixa remuneração de capitais.
Não é possível dar ideia de todas as variações das taxas de juros, mas pode obter-se a média das taxas que prevaleceram durante certo período de anos.
É sabido que no início da reconstrução financeira os juros andavam à roda de 11 por cento. Foram sucessivamente baixando, até atingir 5,4 por cento em 1937.
De então para cá as taxas médias de juro, no último mês de cada ano, nos serviços privativos da Caixa Gerai de Depósitos, Crédito e Previdência foram as que se seguem:

Taxas médias nos serviços privativos da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, referidas ao mês de Dezembro nos anos de 1937-1947.

[Ver Quadro na Imagem]

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Taxas médias nos serviços privativos da Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, referidas ao mês de Dezembro nos anos de 1937-1947.

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Referente ao mês de Novembro.

As modalidades de crédito incluídas compreendem os empréstimos concedidos ao Estado, governos coloniais, organismos corporativos, a particulares, quer sob a forma de hipoteca, quer sob títulos e outros, e tanto a longo como a curto prazo.
Na Caixa Nacional de Crédito as taxas médias que hoje vigoram são as seguintes:

Percentagens

Crédito agrícola individual.................. 3,266
Crédito industrial........................... 3,817

O crédito agrícola compreende a Campanha do Trigo, que mobiliza anualmente elevadas quantias ao juro de 3 por cento. A taxa média acima mencionada é reduzida por esta razão.
No crédito industrial quase todo o capital empregado se pode considerar como mutuado a longo prazo, porque aquele que se concede a seis meses é quase sempre renovado por períodos que atingem, no conjunto, vários anos. A taxa média pode assim considerar-se muito favorável, até em comparação com a de países de tradicional baixa nas taxas de juro.
No crédito agrícola mútuo as taxas são bastante mais reduzidas. O juro médio que se lhes aplicava era de 3,01 por cento em 1946, e nos primeiros nove meses de 1947 foi de 2,54 por cento.
Esta taxa média é a que se aplica às caixas de crédito agrícola mútuo, espalhadas pelo País, que têm vida independente. Representa na verdade um prejuízo para a Caixa Nacional de Crédito, que, como é sabido, obtém os seus capitais de uma conta corrente que mantém com a Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência. Esses prejuízos são compensados um pouco pelos fundos de reserva acumulados durante os anos da sua existência ou para ela transferidos na data da sua criação.

MINISTÉRIO DO INTERIOR

38. Houve grande desenvolvimento de despesa neste Ministério, tanto em relação a 1945 como a 1938. No quadro que segue mostra-se por dependências onde se deu o aumento:

[Ver Quadro na Imagem]

0(a) Subsidio atribuído a partir de 1 de Março de 1845.

O aumento teve lugar em quase todos os organismos, mas deu-se especialmente nas verbas do Gabinete do Ministro, na segurança pública e sobretudo nos serviços de assistência. Neste último o acréscimo na despesa atingiu perto de 93:000 contos em relação a 1938 e cerca de 20:000 relativamente a 1945. Também houve apreciável aumento nos serviços de saúde, que dobraram, quando comparados com o ano anterior à guerra. Adiante se estudarão com minúcia as verbas de cada uma das dependências do Ministério.

Administração política e civil

39. Os gastos podem dividir-se assim:

Contos

Direcção Geral...................................... 357
Governos civis...................................... 2:515
Imprensa Nacional................................... 11:061
Total............................................... 13:933

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Imprensa Nacional de Lisboa

40. A verba mais importante refere-se à Imprensa Nacional. A sua despesa subiu de 10:102 contos em 1940 para 11:061 em 1946. A diferença para mais encontra-se na compra de produtos e matérias-primas, que passou de 3:600 para 4:300 contos em cada um daqueles anos. O resto teve lugar em diversas rubricas.
Aludiu-se em relatório anterior à situação da Imprensa Nacional e sugeriu-se então a conveniência de estudar, num plano de conjunto, a actuação deste organismo.
Ele desempenha no meio gráfico um papel importante e devia por consequência ser dotado dos elementos indispensáveis ao bom desempenho da sua função. Vive em circunstâncias especiais, inerentes à sua própria natureza, visto que muitas vezes tem de compor e imprimir volumosa matéria dentro de espaços de tempo restritos. Tal acontece com o Diário do Governo, Diário das Sessões, o orçamento, os relatórios e pareceres das Contas Gerais do Estado e outros importantes diplomas oficiais provenientes de diversos Ministérios.
Contudo, o seu equipamento não corresponde a estas imposições. E daí resultam atrasos e protestos das entidades interessadas. A questão agravou-se com a guerra, porque os quadros ou são insuficientes para as necessidades dos serviços ou não estão inteiramente preenchidos.
Há obras com atrasos de dez anos, como a da Legislação Portuguesa, com material imobilizado. Quando aparecem é tarde, sem a actualização necessária. E de tudo derivam prejuízos importantes para o Estado.
Conviria pois estudar o assunto e dar-lhe solução. Esta só poderá derivar dum mais completo e moderno equipamento, sobretudo na composição e impressão. São absolutamente essenciais agora pelo menos meia dúzia de máquinas de compor e respectivo pessoal.
Terão de ser gastos alguns milhares de contos, mas o carácter reprodutivo do capital empregado assegura a sua amortização. Alguns organismos importantes, como, por exemplo, a estatística e outros, são obrigados a mandar executar as suas obras fora da Imprensa. E isto, além de aleatório, tem inconvenientes de outra natureza.
É por isso de esperar que o Governo tome as providências indispensáveis ao bom andamento dos serviços da Imprensa Nacional.

Segurança pública

41. Em relação a 1945 houve o aumento de despesa de 6:351 contos nas policias e guarda nacional republicana. O quadro que a seguir se menciona indica nas duas rubricas o quantitativo da despesa e dá a diferença em relação ao ano de 1938:

[Ver Quadro na Imagem]

Nas polícias deu-se o acréscimo de 2:203 contos, relativamente ao último ano, apesar da grande diminuição notada na Polícia Internacional e de Defesa do Estado.
Os aumentos tiveram lugar nas polícias de Lisboa e Porto e na das províncias, como pode ler-se nos números que seguem:

Contos

Comando Geral.................................. 4:607
Polícia de Lisboa e Porto...................... 33:727
Policia dos distritos.......................... 13:568
Polícia Internacional e de Defesa do Estado.... 8:726
Fiscalização de géneros alimentícios........... 336
Total.......................................... 60:964

Socorro social

42. Além das verbas destinadas à saúde e assistência pública, adiante enumeradas, também em 1946 tiveram idêntico fim as receitas do socorro social.
Estas receitas já foram substanciais no primeiro ano em que se cobraram, e tendem a aumentar, dada a origem.
A sua discriminação naquele ano é a que consta dos números que seguem:

Receita do ano de 1946

I. De natureza obrigatória: Escudos

Espectáculos.................................... 8.675:699
Operárias....................................... 3.717:213
Bares, dancing, etc............................. 3.265:993
Fósforos........................................ 12.263:520
Tabaco estrangeiro.............................. 1.368:638 29.291:063

II. De natureza voluntária:

Subscrição e espectáculos....................... 26:193
Donativos....................................... 3.515:574 3.541:767

III. Outras receitas:

Mercadorias apreendidas......................... 366:547
Juros de fundos capitalizados................... 516
Outros rendimentos ou auxílios.................. 469:225
Saldo do socorro do inverno..................... 2.344:897 3.181:185
Total........................................... 36.014:015

Saúde pública

43. Parece ter sido atendido, pelo menos em parte, o requerimento, tantas vezes formulado nestes pareceres, sobre a necessidade de reforçar corajosamente as verbas dos serviços de saúde e de assistência publica. Com eleito, as dotações aumentaram em 1946 e devem ter subido bastante também em 1947. Adicionando o que se gasta através do Subsecretariado das Corporações e Previdência Social, o que provém do Fundo de Desemprego e do socorro social, o que se obtém por intermédio dos cortejos de oferendas e dos recursos das Misericórdias que, como a de Lisboa, vivem de fundos próprios muito importantes, obtêm-se quantias que já se elevam a algumas centenas de milhares de contos.
Com estas somas e outras que seja possível adicionar, e com a ajuda do pessoal das secretarias e outros serviços do Estado e da devoção benevolente e voluntária de particulares, bem valiosa em muitos casos, poderá construir-se edifício sólido que possa abrigar uma organização assistencial eficaz, tanto no ponto de vista de higiene e de saúde como de outros.
O que há parece necessitar ainda de sofrer grandes e profundas modificações.

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A esta conclusão chegam todos aqueles que, desinteressadamente e com bons desejos de melhorar os serviços, os estudam e os auxiliam e recomendam ou reclamam, directa ou indirectamente, maiores dotações para eles.
Existe, em primeiro lugar, grande dispersão de esforços. Isto foi acentuado já no parecer das contas do ano passado.
Há muita gente a tratar do mesmo assunto, às vezes na mesma localidade - com o consequente desperdício de tempo e de dinheiro. Há casos, como o de equipamento médico, de raios X por exemplo, em que seria possível e fácil fazer economias pela concentração numa única instalação, em lugar próprio, das verificações que seria preciso fazer. Mas parece que todos desejam ter a sua instalação própria, e daí resulta que ou esta funciona mal, com intermitências prejudiciais, ou não possui pessoal convenientemente treinado e não produz com o rendimento preciso. O que se diz de raios X e outras instalações eléctricas pode estender-se a diversos instrumentos analíticos.
A organização, em matéria de pessoal, também não parece corresponder ao que se previu.
Nos serviços de saúde, e nesta designação se incluem os da assistência pública e hospitais, há pessoal muito bom, devotado, humanitário e sério, com profunda dedicação pelos serviços e grandes desejos de os melhorar; e há outro que não cumpre ou, quando pretende cumprir, é quase sempre sem devoção.
A orgânica, de um modo geral, não é de molde a poder mostrar a responsabilidade de faltas e, em certos casos, o lugar público é acessório da vida privada, que é o que interessa mais.
Muitas vezes a cama no hospital não tem o rendimento que poderia ter; ou o doente espera demasiadamente para ser operado ou não é atendido com a brevidade requerida nos serviços de urgência. Isso pode ser devido a diversas razões, como a falta de elementos de observação: a análise clínica que demora, a fotografia que não vem a tempo, ou a qualquer outro motivo. Mas o facto deu-se - o doente esperou mais tempo do que devia, a cama teve menor rendimento, houve prejuízos de ordem moral, material e até física. Mas não é possível apurar, e não se apura, a responsabilidade.
Outras vezes o doente entra em convalescença. Escusa de ocupar a cama, mas a sua vida de pobre, ou o, seu desleixo, ou o da família, se a tem, não lhe permite seguir em casa os tratamentos precisos para completa cura. E então fica no hospital, a ocupar a cama que é precisa para os que esperam.
Os serviços laboratoriais e de análises são variados e dispersos, uns com autonomia, outros sem ela.
O seu funcionamento não é ideal e está longe de o ser.
Parece que numa cidade como Lisboa ou Porto se poderiam concentrar em institutos especializados, eficientes, pró vidos de pessoal competente, bem treinado e bem remunerado muitos serviços de análises, de pesquisas e outros, agora dispersos por tantos lados e sujeitos a muitas contingências.
Com os meios de comunicação de que se dispõe - o telefone - e às vezes a proximidade dos serviços, que razões há para a dispersão?
Tudo isto se deduz do inquérito feito pelo relator das contas públicas, por sondagens directas, por investigações junto das pessoas que se dedicam a estes assuntos e neles têm interferência directa e pelo exame dos números e da documentação requerida na Assembleia, sujeita depois a cuidadosa discussão por diversos Deputados.
A conclusão geral é a da necessidade de reforma completa do que, directa ou indirectamente, diz respeito à saúde e assistência, e essa reforma deverá ter como finalidade a sua concentração e a inclusão nela de tudo o que está hoje disperso por vários serviços do Estado, e também os dos Subsecretariados da Assistência Social e das Corporações.
O órgão superior terá de ser um Ministério - o Ministério da Saúde, como já anteriormente foi sugerido.

44. As verbas aumentaram e o Tesouro Público está, parece, na disposição de alargar as dotações até onde possível.
Mas de nada ou de pouco isso valerá se os serviços as não aproveitarem com bom rendimento.
A Assembleia Nacional tem insistentemente, por intermédio da sua Comissão de Contas Públicas, requerido a melhoria de verbas para os serviços de saúde e da assistência - e as dotações vão aumentando gradualmente. O povo português, como se mostra pelos cortejos de oferendas, acorre a dar o seu auxilio e contribui com avultadas somas para a resolução de um grande problema nacional.
É preciso que a organização do Estado corresponda a esta vontade firme de melhorar a saúde e a assistência.
Já foi explicado o ano passado, na longa análise que então se fez do assunto, que a solução do problema não depende apenas da organização dos serviços de saúde, embora a sua influência tenha grande valor.
Deu-se nessa resenha uma ideia da responsabilidade que cabe a outras entidades.
É o caso da adopção dos meios de impedir a doença. E citaram-se então variados exemplos, como os das fontes públicas, os das estrumeiras, a promiscuidade na habitação, a falta de medidas profilácticas e muitos outros.
Como que a querer confirmar o que então se escreveu, veio já, em 1947, uma epidemia de varíola que poderia ser evitada, como acontece noutros países, exactamente por não ser obrigatória a vacina ou, se o é, por não se cumprirem os regulamentos que a impõem.
O caso das febres tifóides é consequência dos abastecimentos de águas. Conhecem-se nestes dois casos - da varíola e da febre tifóide - as causas, que poderiam ser destruídas com relativamente pequeno esforço.
Ainda se compreende, e talvez para eles possa haver justificação, uma epidemia ou uns casos de varíola, ou até de febre tifóide, ou outras doenças infecciosas ou parasitárias, em longínquas aldeias, que ainda as há sem assistência médica, com populações atrasadas e descrentes ou ignorantes das vantagens da vacina ou da higiene.
Mas parece ser inadmissível que na própria capital do País apareçam periodicamente epidemias de doenças quase inexistentes hoje em regiões do Ocidente europeu. E sabe-se que nos distritos de Lisboa e Porto, como no parecer do ano passado ficou arquivado, exercem clínica 53 por cento do total dos médicos existentes no País, dos quais 35 por cento correspondem ao de Lisboa.
A saúde num país é uma coisa séria, tanto no ponto de vista moral como económico. Não pode estar à mercê de contingências ou do acaso. Há possibilidades de com os recursos ao dispor dos organismos oficiais produzir resultados bastante mais valiosos do que os actuais, e o Governo deve fazer todo o possível no sentido de extrair das verbas despendidas maior rendimento do que o que agora delas se extrai.
A questão está posta há muitos anos e necessita de ser resolvida. Não vale a pena reclamar mais dotações se elas não forem convenientemente aproveitadas. Fornecer mais camas aos hospitais sem melhorar o seu rendimento, alargar as dotações de outros serviços e correspondentes melhorias é aumentar a despesa pública com pouco proveito para o Estado e para a comunidade se elas não forem convenientemente aproveitadas.
O sentido da responsabilidade tem de ser estabelecido definitivamente nos serviços de saúde, tanto nos hospitais como nos outros institutos e estabelecimentos que deles dependem.

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As contas

45. Os gastos nos serviços da saúde pública foram os seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

Os gastos da saúde pública entre 1938 e 1946 mais do que dobraram. O aumento deu-se sobretudo entre 1945 e 1946 e teve lugar no conjunto de despesas que dizem respeito a subsídios de diversa natureza e no que foi destinado a material sanitário, vacinas e soros. Infelizmente, como já se acentuou em outros pareceres, não é possível discriminar as verbas pelo exame das contas.
Podia determinar-se noutro tempo o que gastava cada uma das principais dependências desta Direcção Geral, mas gradualmente se foram englobando as verbas. E assim só por inquérito directo se poderá conhecer o seu custo. Tentar-se-á fazer isso: no próximo parecer e reatar a tradição neles mantida de discriminar as verbas tanto quanto possível.

Assistência pública

46. O aumento das despesas nos serviços de assistência pública foi muito grande desde 1938. Mais do que dobrou, visto ter passado de 75:997 contos para 168:856, conforme se pode verificar nos números que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Não foi fácil fazer a reunião de cifras para comparação das verbas de 1938 com as de 1946, por virtude de diversas reformas que alteraram o modo de as contabilizar e é natural que no quadro e na coluna de 1938 se tivesse inscrito numa determinada aplicação verbas que pertenciam a outras. O erro, se o houver, é pequeno o não afecta o total.
Os grandes aumentos deram-se nos estabelecimentos hospitalares, na luta contra a tuberculose e na protecção aos alienados.
Mas em quase todas as outras formas de assistência houve melhorias apreciáveis.
Aplicam-se a estes serviços o que adiante se escreve acerca da Misericórdia de Lisboa.

Misericórdia de Lisboa

47. Não foi possível no Parecer das Contas Gerais do Estado de 1946, quando se tratou circunstanciadamente da «Saúde e assistência», dar grandes pormenores sobre a obra da Misericórdia de Lisboa, velha instituição, que vem do século XV e já prestou grandes serviços à capital do País em matéria de assistência.
Os elementos que seguem permitem dar ideia do seu funcionamento.

Receitas

48. Convém, embora sucintamente, deixar assinalados aqui os recursos de que dispõe e a sua origem.
Parecia à primeira vista que as receitas de bens próprios deveriam ser grandes, tão longa é a vida desta instituição. Mas as contingências dos tempos e algumas medidas de ordem política reduziram muitos os seus rendimentos.
A Misericórdia vive hoje do lucro das lotarias. Dois terços dos seus rendimentos têm esta proveniência.

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Nos três últimos anos as receitas foram as seguintes, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

Em t Outras receitas V estão incluídas variadas verbas, como «Rendimentos de bens próprios», «Venda de sopas e refeições», «Subsídios diversos», e muitas outras. Elas variam conforme o movimento das vendas de carácter assistencial.

Lotarias

49. Como se disse, cerca de dois terços das receitas provêm dos lucros das lotarias. Estes lucros têm subido bastante nos últimos anos, como se nota no quadro que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A última coluna mostra o lucro anual das lotarias.
Desse lucro, 64,5 por cento pertencem ao Estado e são inscritos todos os anos no capítulo das receitas relativo ao «Domínio privado e comparticipação nos lucros», e os restantes 35,5 por cento constituem receita da Misericórdia. É essencialmente deles que ela vive.

Despesas

50. Numa instituição desta natureza não é fácil distribuir pelas diversas dependências as centenas de verbas que derivam de requisições de variadíssimos artigos. A contabilidade está louvavelmente a tentar adaptar-se a esse objectivo. Os principais encargos da Misericórdia podem agrupar-se do modo que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A diminuição verificada nos gastos gerais em 1946 provém de terem sido transferidas diversas verbas normalmente contabilizadas nesta rubrica para o seu lugar próprio, como papel e matérias-primas para as lotarias, e outras.
Gradualmente se debitam os artigos comprados na conta dos respectivos serviços.
A obra realizada pela Misericórdia é vasta, e a maior parte dos seus recursos deriva das lotarias. O Tesouro recebe, porém, grande parte dos lucros e é esta comparticipação que auxilia o pagamento das despesas dos Hospitais Civis. O maior lucro das lotarias concorre assim para o reforço das verbas da assistência em Lisboa.
Haveria talvez motivo para reconsiderar esta questão no sentido de ser atribuída à Misericórdia maior participação nos lucros das lotarias, que ela administra. Este é um assunto que depende bastante do nível das receitas do Estado. Mas, em face das necessidades da assistência e do papel desempenhado por esta instituição, parece de grande vantagem reforçar as suas receitas.

51. Os problemas da assistência são por natureza complicados. Todos os problemas que afectam directamente a vida humana o são e muitas vezes não há possibilidade de estabelecer regras rígidas para os resolver. Não se lhes podem aplicar regulamentos burocráticos, enquadrá-los em fórmulas definitivas, porque muitos só podem ser solucionados por inspirações que vêm da bondade, da devoção, do desejo de minorar sofrimentos alheios.
Isto significa que uma das mais difíceis questões na resolução dos problemas da assistência é a do pessoal. E pode acontecer que a sua escolha ou os métodos que nela se aplicam devam ser diferentes dos utilizados em outras actividades humanas.
Há ainda um grande caminho a percorrer no aperfeiçoamento da saúde e assistência em Portugal, e, embora os recursos financeiros possam desempenhar nisso uma valiosa função, o critério na escolha do pessoal de todos os graus deve ter uma importância basilar.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA

52. Continuou a aumentar muito a despesa deste Ministério. Mais do que duplicou desde 1938, visto ter passado de 44:000 contos para cerca de 91:300. O quadro que segue dá, em súmula, a despesa do Ministério da Justiça para os anos de 1930-1931, 1938 e 1946 e as respectivas variações.

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Compreende a 4.ª Repartição de Contabilidade.
(b) Compreende a Colónia Penitenciária de Alcoentre.

As alterações foram grandes e não derivaram apenas do abono de família e do suplemento de vencimentos. Vieram também do próprio desenvolvimento de alguns dos organismos do Ministério, e adiante se verificarão, com certa minúcia, os motivos desse desenvolvimento.
Mas pode desde já dizer-se que continuam a ser os serviços prisionais e os jurisdicionais de menores que consomem maiores verbas.
Dos 32:990 contos que representam, desde 1938, o aumento de despesa, 30:149 pertencem às duas citadas Direcções Gerais, sem contar com a quota-parte que lhes diz respeito no abono de família e suplemento de vencimentos. Quase todos os anos se tem sentido o acréscimo, mas ele acentuou-se bastante na gerência de 1946, por virtude de causas que mais adiante se mencionarão. As restantes alterações na despesa não foram muito sensíveis.

Receitas do Ministério da Justiça

53. Antes de prosseguir no estudo das despesas deste Ministério convém fixar as receitas que para o erário público advêm das suas actividades. Elas fazem parte dos dois capítulos "Taxas" e "Consignações de receitas", e melhoraram relativamente nos últimos anos, devido a modificações que não resultaram de aumento de serviço.
Podem resumir-se nos números que seguem:

Taxas:
Contos

Imposto de justiça cível....................... 17:259
Imposto de justiça cível e multas.............. 9:302
Arquivo de Identificação....................... 2:020
Outras......................................... 3:498 32:079

Receitas consignadas:

Conselho Superior Judiciário................... 90
Serviços médico-legais......................... 42
Serviços jurisdicionais de menores............. 4:745
Serviços prisionais............................ 3:129
Investigação criminal.......................... - 8:006

Total.......................................... 40:085

Serviços de justiça

54. A reforma que criou a Direcção Geral dos Serviços de Registo e do Notariado transferiu para este organismo algumas das despesas que anteriormente se incluíam nos serviços de justiça. Eis a razão por que, na aparência, os gastos são menores em 1946. As transferências de verbas dizem respeito principalmente ao que se incluía no Conselho Superior e Inspecção. Os números são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

Serviços prisionais

55. Continuou a aumentar muito a despesa desta Direcção Geral. Era de 16:555 contos em 1938 e atingiu 41:644 em 1946.
Deve ser, proporcionalmente, o serviço que mais alargou a sua despesa.
As razões de tão grande acréscimo filiam-se no custo da alimentação e vestuário e na despesa das novas instalações, como a Prisão-Escola de Leiria, a Colónia Penal de Cabo Verde, a Cadeia do Forte de Peniche e a Colónia de Alcoentre.
O quadro publicado na página a seguir indica-nos o movimento da despesa.

Página 48

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui em 1946 o corpo de guardas.

Serviços jurisdicionais de menores

56. Também se nota aumento de despesa nesta Direcção Geral, que foi de cerca de 600 contos em relação a 1945 e de um pouco mais de 5:000 relativamente a 1938. Os números são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

MINISTÉRIO DA GUERRA

57. Pela primeira vez depois de 1942 as despesas deste Ministério foram inferiores a 1 milhão de contos. O máximo atingido deu-se em 1943, em que os seus gastos ultrapassaram 1.500:000 contos. Desde o início da guerra as despesas ordinárias e extraordinárias alcançaram mais de 7.770:000 contos, como pode verificar-se no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

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Como se nota dos números, os maiores consumos foram liquidados pelo capítulo das despesas extraordinárias. Referem-se ao rearmamento do exército, que teve de ser executado intensivamente em plena guerra por virtude de circunstâncias internacionais, e a despesas excepcionais originadas principalmente pela deslocação de elevados contingentes de tropas para as províncias ultramarinas e ilhas adjacentes.
No capítulo das receitas e despesas extraordinárias se verificará adiante o custo total da guerra. As verbas despendidas inscreveram-se também em diversos outros Ministérios, como o dos Negócios Estrangeiros, Colónias e mais.
Parece estar já em declínio este elevado consumo de dinheiro, que indirectamente afectou bastante os programas de desenvolvimento económico interno, e que foi exigido por condições de grande perigo e delicadeza que o País atravessou.
A economia de despesa que seja possível realizar neste Ministério e no da Marinha deveria integralmente aplicar-se aos programas de fomento económico, ato no próprio interesse da eficiência das forças armadas.
Em 1946 o conjunto das despesas do Ministério da Guerra, em comparação com 1938. pode exprimir-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

É evidente que os abastecimentos, como alimentação e materiais de diversa natureza, encareceram muito em relação a 1938, e por isso não parece ser desproporcionada a despesa ordinária comparada com o ano anterior ao conflito.
A verba inscrita para despesas excepcionais de guerra deve caminhar para o desaparecimento - e ela é ainda muito volumosa.

Despesas ordinárias

58. Não são comparáveis isoladamente as verbas relativas a algumas despesas de 1938, 1940 e 1946, em virtude de terem sido transferidas, no intervalo, certas dotações, como, por exemplo, parte da que se refere a classes inactivas, que foi transferida para a Caixa Geral de Aposentações. As despesas ordinárias foram as seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inscreveram-se 65:100 contos na Caixa Geral de Aposentações para o funcionalismo militar.
(b) Compreende: serviço de trem, quadro doa serviços auxiliaras do exército, subchefes e músicos de bandas de musica, quadro dos amanuenses do exército e praças dos serviços especiais do exército.

MINISTÉRIO DA MARINHA

59. O Ministério da Marinha aumentou muito os seus gastos, não só em relação ao último ano de paz como até ao período da guerra. Passou, no conjunto das despesas ordinárias e extraordinárias, de 178:177 contos em 1938 para 350:478 em 1946 - sensivelmente o dobro.
Este desenvolvimento da despesa pode ler-se nos números, e é explicado por diversas razões.
O aumento em relação a 1940 foi de 65:489 contos.
As variações notadas nos últimos oito anos constam do quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que os acréscimos se deram tanto nas despesas ordinárias como nas extraordinárias; mais nas últimas do que nas primeiras.
Nas últimas - nas despesas extraordinárias - o destino das verbas foi o que segue:

Contos

Rearmamento da marinha............................. 48:595
Plano da aviação naval............................. 17:586
Despesas excepcionais de guerra.................... 32:908
Modernização da frota de torpedeiros............... 2:736
Total.............................................. 101:825

As despesas ordinárias passaram de 170:711 em 1938 para 248:654 em 1946 - mais 77:943 contos.
O abono de família (3:573 contos) e o suplemento de vencimentos (28:264 contos) concorreram para o acréscimo com mais de 40 por cento.
As outras maiores valias repartem-se por diversos serviços e destinos. As mais importantes dizem respeito à Superintendência dos Serviços da Armada, que acusa o aumento de 31:417 contos, por se incluírem verbas que ali não tinham cabimento em 1938, e às praças da armada, por virtude de maiores custos de alimentação e outros motivos.
O quadro seguinte indica as despesas:

[Ver Quadro na Imagem

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Compreende o gabinete do major general da armada e o estado maior naval.
(b) Inclui a Inspecção das Construções Navais.
(c) Inclui a 6.ª Repartição de Contabilidade, a Administração Naval e a Administração Central de Marinha.
(d) Inclui a Intendência de Marinha do Alfeite.

Não foi possível fazer ainda este ano o estudo económico do programa de renovação da marinha mercante, que está a ser levado a efeito. A sua importância tem dois aspectos na vida financeira do Estado dignos de serem discutidos com mais pormenores. Um diz respeito aos encargos que o programa a executar pode vir a ter, de futuro, nas contas, visto ser financiado em parte pelo Estado, através de empréstimos por ele contraídos. O outro é o que se refere à economia metropolitana, nas suas relações com as províncias ultramarinas e outros países de além-mar.
Navios novos de grande eficiência termomecânica produzem, quando bem dirigidos, grandes economias nas viagens. Ó somatório dessas economias influencia consideràvelmente as despesas de amortização e diminui os encargos. Tudo se deve traduzir em fretes mais baratos.
Num pais em que quase toda a tonelagem embarcada e desembarcada usa como meio de comunicações o mar, a existência de uma frota mercante moderna, progressiva e eficiente representa uma necessidade fundamental.
Mas não basta ter navios novos. L indispensável utilizá-los em condições idênticas às dos países rivais ou concorrentes, tanto no que diz respeito à técnica como à economia. Só assim se poderá tirar deles o máximo proveito. O assunto tem grande interesse, no ponto de vista nacional, e espera-se que sejam tomadas medidas nesse sentido, de modo que a nova frota possa trazer para o País os benefícios esperados.

MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS

60. Ainda este ano houve acréscimo na despesa deste Ministério. Não foi grande, mas o que se deu em relação a 1938 anda por 25:000 contos.
Adiante se verificarão as causas do desenvolvimento da despesa.
Os números, em conjunto, são os que seguem:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui 1:247 contos de quota para a Sociedade das Nações do ano de 1943.

Negócios políticos e da administração interna

61. Os serviços centrais da Secretaria Geral despenderam 727 contos - um pouco mais do que em 1945.
Os da Direcção Geral dos Negócios Políticos e da Administração Interna continuam a aumentar a sua despesa.

Convém dar em súmula as causas que originaram esse acréscimo, e por isso se discriminam a seguir as

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verbas para os serviços internos e externos. Repartidos pelas rubricas orçamentais, os gastos foram os que seguem:

Serviços internou: Contos

Pessoal........................................... 898
Material.......................................... 347
Encargos diversos................................. 1:468
Correios e telégrafos............................. 1:174
Subsídios e quotas................................ 4:146 8:033

Serviços externos:

Pessoal........................................... 13:151
Material.......................................... 8:533
Encargos diversos................................. 2:914
Correios e telégrafos............................. 971
Rendas de casa.................................... 1:793 27:362
Total............................................. 35:395

Cerca de 7:550 contos foram utilizados nas Embaixadas e Legações do Rio de Janeiro e Washington, Paris, Roma e Pretória. A despesa feita em cada uma delas foi a seguinte :

Contos

Compra de terreno para a Embaixada de Washington... 500
Compra de edifício em Roma......................... 5:860
Embaixada do Rio de Janeiro........................ 318
Embaixada de Madrid................................ 120
Legação de Paris................................... 693
Legação de Pretória................................ 58
Total.............................................. 7:549

Além destas obras, que elevaram o total das receitas, há que considerar um aumento na verba destinada a subsídios e cofres de organismos metropolitanos e estrangeiros, que passaram de 1:446 contos em 1945 para 4:146 em 1946.

Negócios económicos e consulares

62. Também nesta Direcção Geral o aumento de 1:387 contos em relação a 1945 teve lugar essencialmente nos serviços externos, na verba de pessoal. Passou de 9:615 contos para 10:987.

As principais quantias, discriminadas, são as que seguem:

Serviços internos: Contos

Pessoal............................................ 379
Encargos........................................... 111 490

Serviços externos:

Pessoal............................................ 10:987
Material........................................... 1:095
Casas de Portugal em Paris, Londres e Nova Iorque.. 1:470
Rendas de casa..................................... 870
Outros encargos.................................... 1:565 15:987
Total.............................................. 16:477

Na rubrica "Outros encargos" incluem-se variadas somas, como missões extraordinárias de serviço público (400 contos), subsídios diversos e mais.

Despesas totais

63 A acrescer aos gastos, sucintamente enumerados acima, há a somar as despesas extraordinárias. Em conjunção com as ordinárias, a despesa total foi a que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

A diferença para menos deu-se principalmente, como se mostra, nas despesas excepcionais de guerra.

MINISTÉRIO DAS COLÓNIAS

64. Somaram 28:874 contos as despesas ordinárias neste Ministério, ou mais 4:827 contos do que no ano anterior. Repartiram-se pelos diversos departamentos que o compõem do modo seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Pelo decreto n.º 26:180, de 7 de Janeiro de 1936, passou a Repartição Militar das Colónias; porém, só na conta de 1939 aparece com esta designação.

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No Gabinete do Ministro o que mais avoluma o total são as comunicações, nas quais se despenderam 539 coutos em 1946, quantia inferior à dos anos de guerra.

Fomento colonial

65. O orçamento desta Direcção Geral sofreu modificações neste ano. A verba destinada à Junta das Missões Geográficas e de Investigações Coloniais passou a fazer parte da secção que descreve os conselhos e outros órgãos. Em exames de despesa que porventura se pretendam fazer haverá que considerar o seguinte: ou juntar à verba da Direcção Geral o que se gasta nas missões geográficas, ou extrair dela o que este organismo despendeu em anos anteriores, e se contabiliza agora em outro lugar.
As verbas para 1946 podem esquematizar-se do modo que segue:

Contos

Pessoal............................................. 553
Material............................................ 29
Encargos............................................ 6:820
Junta das Missões Geográficas e de Investigações
Coloniais........................................... 3:906
Total............................................... 11:308

É esta a soma que deverá comparar-se com as dos anos anteriores.
Nota-se haver um aumento de, aproximadamente, 1:731 contos em relação a 1945, que foi em parte devido ao desenvolvimento das missões geográficas e de investigações coloniais (1:202 contos).
Este acréscimo de despesa corresponde a uma obra muito útil.
Nestes pareceres quase todos os anos se aconselha o Governo a dotar bem a obra da ocupação científica e investigação económica das províncias ultramarinas, e o trabalho realizado tem sido profícuo, sobretudo o que se refere ao lado topográfico. Há necessidade de continuar os estudos que mostrem as possibilidades do ultramar, tanto no aspecto agrícola como no industrial, principalmente no que se refere a matérias-primas de origem vegetal e mineral, e haverá conveniência em despender ainda pelos orçamentos da metrópole e das províncias ultramarinas maiores somas.
As outras despesas mais importantes do fomento colonial dizem respeito às garantias de juros dos Caminhos de Ferro do Amboim e Mormugão.

66. A verba da Direcção Geral de Fazenda das Colónias não se modificou sensivelmente e a da Direcção Geral do Ensino aumentou de 5:160 contos para 6:148. O aumento foi devido quase exclusivamente ao reforço de subsídios para as missões religiosas. O acréscimo foi de 988 contos, como se nota no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

A verba de maior vulto neste quadro é a de 5:915 contos, da qual grande parte constitui subsídio às missões religiosas. Esta é uma das dotações orçamentais que produz frutos de grande interesse nacional, pela influência que as missões exercem sobre as populações indígenas e pelo sentimento patriótico que lhes inoculam. Os domínios de além-mar, especialmente Angola e Moçambique, devera-lhes muitos serviços, sobretudo no campo educativo.

Despesas totais

67. As despesas totais deste Ministério somaram 111:240 contos, assim divididas:

Contos

Despesas ordinárias................................ 28:874

Despesas extraordinárias:

Despesa excepcional de guerra...................... 80:366
Centenário da Guiné................................ 2:000
Total.............................................. 111:240

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO NACIONAL

68. Uma das chaves da nossa reconstrução económica está depositada no Ministério da Educação Nacional. Este princípio tem sido vincado nos pareceres das contas públicas desde o início da sua publicação, sobretudo nos capítulos dedicados todos os anos à apreciação das contas do ensino superior, nas suas relações com os institutos técnicos, e ainda na secção que se refere às actividades do ensino médio.
Mas a influência que este Ministério pode vir a ter na economia não se circunscreve apenas àquelas modalidades do ensino. Em combinação com o Ministério da Economia, como o ano passado se acentuou, especialmente no campo agrícola, poderia ele desempenhar uma função primacial na melhoria dos processos de cultura que prevalecem ainda em grande número de zonas do País.
Quase não existem escolas agrícolas elementares nem de outro modo intensivamente se tem procurado difundir a instrução agrícola num país que dizem ser essencialmente agrícola. De ensino médio agrícola há três institutos, que pouca influência exercem praticamente na actividade agrícola, visto os seus diplomados serem, em geral, absorvidos pelos serviços oficiais, muitas vezes em misteres que só de longe se ligam à agricultura. E no que se refere ao ensino superior as verbas despendidas no ensino prático, todos os anos aqui apontadas, mostram por si sós as insuficiências deste ensino.
Nas escolas industriais, tanto elementares como médias e superiores, são patentes as deficiências em matéria de despesas de material e de pessoal. E o estudo sobre o destino de diplomados de algumas delas depois do terminados os cursos, que já foi feito e se reproduziu no Diário das Sessões, revela que grande número deles se desvia para variadas actividades alheias à indústria.
Todo o nosso ensino - superior, médio e elementar - continua a ter o carácter teórico e livresco na maior parte dos casos. O uso de laboratórios é muito parcimonioso e só é corrente aqui ou além. A prática e o treino, o contacto directo ou indirecto com os processos industriais ou agrícolas, continuam a ser excepção para a grande maioria dos diplomados ou alunos.
Esta verdade parece ser reconhecida por todos, até por entidades oficiais, e tem efeitos perniciosos, que se projectam malèficamente na vida nacional. Somos um País de grande ineficiência no rendimento da produção, de atraso nos processos de cultura agrícola e técnica industrial. A balança de pagamentos equilibra-se dificilmente por meios a que, em parte, é alheio o trabalho interno. Nas explorações agrícolas raras vezes intervém

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directamente o agrónomo, e o proprietário ou o agricultor dificilmente progride - por ignorância em muitos casos, por cepticismo noutros.

69. De há muitos anos que o Ministério da Educação Nacional tem grandes responsabilidades neste estado de coisas. E por Ministério da Educação Nacional quer significar-se o organismo, com suas variadas peças e ramificações, e abstrair-se das pessoas que desempenham ou desempenharam funções duma ou outra natureza. A mentalidade que reinou e reina na superintendência e execução do nosso ensino ainda não atingiu o grau de utilidade prática que o progresso da vida social e económica exige. O aluno vive muito de abstracções, vê poucas vezes a realidade dos fenómenos, utiliza em excesso a memória, é obrigado a decorar em demasia. Não está em contacto, ou está pouco em contacto com a vida, na sua crua realidade. O estudo da lei química ou física, do problema matemático ou mecânico, da língua viva ou morta, faz-se ainda muito pelos livros, sem o exercício ou demonstração práticos. E perdem-se por este modo longas horas em coisas inúteis, ou pouco úteis, que poderiam ser gastas em trabalhos profícuos e rendosos.
Ainda não parece terem sido levados em linha de conta os imensos progressos realizados pela evolução da ciência nos domínios da vida económica do Mundo. Esses progressos exigem profundas alterações nos processos de exploração, tanto agrícola como industrial, e nos métodos de distribuição dos produtos. A cultura intelectual desempenha cada vez maior influência na actividade económica, e se não se formarem técnicos, convenientemente treinados, há-de ser difícil, senão impossível, a qualquer país acompanhar o ritmo do progresso, que, no aspecto económico, atinge graves problemas que directamente se ligam à sua vida política.
Temos de criar mentalidades utilitárias no domínio da educação técnica. E quando se diz mentalidades utilitárias quer significar-se a imperiosa necessidade de evitar desperdícios, redundâncias, insuficiências em todos os domínios da actividade económica, pela formação, nas escolas de todos os graus, de homens aptos a poderem ganhar a sua vida pela aplicação dos modernos métodos de exploração agrícola ou industrial.
Vivemos muito sob o peso de abstracções e enquanto não forem adoptados, nas escolas nacionais de todos os graus e modalidades, métodos que despertem nos alunos a curiosidade intelectual, que é mãe do progresso científico, não haverá possibilidade de formar homens indispensáveis à evolução económica do País.
Qualquer reforma que se não inspire nestes princípios está de antemão condenada ao insucesso, e longas colunas do Diário do Governo desde há muitas dezenas de anos têm demonstrado à evidência esta verdade, que todos conhecem.
Uma reforma completa do ensino superior e de todo o nosso ensino médio não pode consistir apenas em estruturas jurídicas ou limitar-se à construção de edifícios mais ou menos vastos ou luxuosos. Não é apenas do invólucro material onde se ministra o ensino, nem da fórmula jurídica que o encadeia, que ressuma a sua eficiência.
O espírito animador e estimulante de fórmulas jurídicas abstractas está em quem as executa, no treino que sofreu, na mentalidade que o avigora.
E se o professor, embora eivado desse espírito ou dessa mentalidade, não tiver assegurado o tempo necessário para ensinar praticamente a sua disciplina, ou lhe faltarem os elementos para esse efeito, estão de antemão criadas as condições de fracasso para a missão que tem de desempenhar e para a reforma que tem de aplicar.
Tudo isto mostra que nunca pode haver ensino eficiente sem a existência de professores cuidadosamente treinados. E na palavra «treinado» se inclui também a consciência da directriz que orientará na vida pedagógica as actividades dos jovens diplomados.
Ora uma das mais importantes missões do ensino superior é criar mentalidades que possam convenientemente dirigir a formação profissional das novas gerações.
O ensino nos liceus e nas escolas médias - agrícolas e industriais - de carácter técnico há-de ser o que a mentalidade dos professores, considerados no conjunto, quiser que seja. Desde que se lhes ofereçam elementos de natureza experimental e horários adaptados à utilização desses elementos, o ensino pode melhorar consideràvelmente.
São as escolas superiores que criam os professores - os licenciados, os engenheiros, os médicos, os agrónomos, os comercialistas, os veterinários e outros - que amanhã irão formar homens úteis para a vida social, nos seus variados aspectos.
Cuidar do treino dos que hão-de desempenhar tão valiosa tarefa, deve constituir um dos profundos objectivos do Ministério da Educação Nacional.
Parece, dados os índices da vida portuguesa, sobretudo nos seus aspectos económicos e até no aspecto pedagógico, haver conveniência em dar às escolas superiores carácter mais prático.
O desenvolvimento do ensino laboratorial tem sido muitas vezes discutido e aconselhado nestes pareceres - e com a existência de melhores e bem dotados laboratórios poderia aumentar o gosto pela investigação científica da parte do pessoal docente das escolas superiores e até, nalguns aspectos, do das escolas secundárias ou médias. Mas a nossa vida laboratorial é ainda hoje muito reduzida, por incompreensão oficial ou outros motivos, porque se assim não fosse já teriam sido tomadas pelas entidades orientadoras do ensino enérgicas medidas no sentido de dar remédio ao que tem sido apontado como causa de graves deficiências.

69. O Estado, pela instituição de bolsas de estudo no estrangeiro, em relativamente larga escala, procurou obviar a alguns dos males acima apontados. Mas não parece serem grandes os benefícios, em outros aspectos da vida económica, dos métodos adoptados.
Noutro lugar deste parecer se assinalam, com os devidos comentários, as despesas e as actividades do Instituto para a Alta Cultura. Pode agora perguntar-se: que efeitos práticos para o desenvolvimento cultural e económico do País tem a actividade dos bolseiros? Em que circunstâncias e sob que aspectos vieram ou vêm exercer a sua acção em Portugal os indivíduos que estudaram ou praticaram em escolas, Universidades e laboratórios estrangeiros? Como foram aproveitadas pelo interesse nacional as verbas despendidas através do Instituto para a Alta Cultura? Melhorou apreciavelmente o ensino elementar, o dos liceus e outras escolas médias e o superior? Espalharam-se pela indústria ou agricultura os beneficiários das bolsas concedidas?
Quanto à vida económica, e em frente dos índices que os especialistas têm apontado ao público, pode dizer-se não ter havido sensível influência, não por culpa deles, quase sempre, mas porque se não criaram condições laboratoriais ou de experimentação nas escolas médias e superiores onde razoavelmente pudessem exercer a sua função e demonstrar as aptidões adquiridas no estágio em institutos de desenvolvida actividade nas ciências aplicadas.
Nos outros campos de actividade cultural, no da pura especulação científica ou literária, na cultura clássica, os sintomas de êxito não parecem ser muito mais salientes, mas sobre isso não apresentará o relator das contas públicas uma opinião. Deseja apenas emitir o juízo, sujeito a correcções, se for demonstrada a sua necessidade, de que o capital despendido por intermédio do Instituto para a Alta Cultura, no que se refere à formação de

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pessoal docente para as escolas e aperfeiçoamento de técnicos, não teve o rendimento que poderia e deveria ter tido. Com excepção de um ou outro caso, este juízo tem para o relator das contas públicas o carácter de generalidade.
E os motivos residem no facto de a organização interna não se ter amoldado em sentido que permitisse uma actividade profissional ou pedagógica em harmonia com as aptidões ou conhecimentos adquiridos pelos bolseiros nos institutos frequentados nos diversos países em que fizeram os seus estágios.
O Ministério da Educação necessita, por tudo o que acaba de se escrever, de profundas reformas. Há necessidade de criar uma nova mentalidade no ensino, sobretudo no ensino superior, porque é através desse ensino que poderá ser exercida profunda acção na vida social e económica do País. No ensino universitário, sobretudo nos cursos profissionais e científicos, haverá que dar muito maior espaço de tempo e muito maiores verbas às actividades experimentais,, à semelhança do que em parte se fez já com a medicina. A orgânica do próprio Ministério terá de sofrer as alterações que a adaptem a esta finalidade e a transformem num órgão impulsionador e produtivo.

A evolução da frequência do ensino de vários graus

70. Foram recentemente publicados elementos estatísticos sobre todos os graus do ensino e alguns dos números são muito interessantes e elucidativos.
Os que se referem à frequência escolar revelam algumas anomalias dignas de serem cuidadosamente ponderadas.
Não é possível, no estrito espaço dum relatório desta natureza, debater minuciosamente este assunto, que pode ter grandes repercussões na vida do futuro, mas convém fixar os números e relacioná-los com o esforço financeiro do Estado nesta matéria.
O quadro seguinte mostra a evolução nos cinco anos que decorreram desde 1940-1941 da frequência das escolas de quase todos os graus de ensino:

Evolução na frequência do ensino de vários graus

[Ver Quadro na imagem]

Há necessidade de alguns comentários para melhor esclarecer o assunto.
A frequência no ensino primário diminuiu. E isso é de estranhar. A diminuição relativa a 1940-1941 foi de 4,3 por cento em 1943-1944,4,1 por cento em 1944-1945 e 2,5 por cento em 1945-1946. Embora pequena, ela revela alheamento das escolas. A diminuição foi maior no ensino oficial, diurno e nocturno, do que no particular, apesar de ser muito pequena a diferença.
Pelo contrário, houve grande aumento no ensino liceal - quase 20 por cento nos cinco anos, correspondente a perto de 7:200 alunos.
No ensino técnico de todos os graus houve grandes acréscimos na frequência, mas não em todas as modalidades.
Nas escolas industriais e comerciais o aumento do número de alunos foi de cerca de 5:500, todo, porém, no ensino comercial, porque o industrial diminuiu de 1:100 alunos, o que, na verdade, é paradoxal num país que deseja alargar as indústrias.
O ensino prático agrícola quase não conta na vida portuguesa, pois é frequentado apenas por 228 alunos. Eram 209 em 1940-1941.
Nas escolas médias industriais também houve acentuada diminuição (518 alunos, ou 28,7 por cento) dentro do período. Nas escolas médias comerciais deu-se, porém, o aumento de perto de 16 por cento.

1 Ver Estatística da Educação, ano lectivo de 1945-1946.

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Estes números continuam a revelar desinteresse pelo ensino industrial, tal como se notou no ensino elementar e complementar.
No ensino médio agrícola (escolas de regentes agrícolas) teve lugar um pequeno acréscimo na frequência (9,1 por cento), que representa mais 74 alunos. Aliás a frequência total é pequena - apenas 611 alunos em 1945-1946.
As Universidades, sobretudo as de Coimbra e Técnica, alargaram bastante a frequência - 61,3 por cento na primeira e 45,4 por cento na segunda. Na do Porto o acréscimo representou 34,2 por cento do número dos alunos.
A de Lisboa, que é a mais concorrida, foi a que em percentagem aumentou em menor grau a frequência.

71. Postos os números de outro modo, verifica-se que as maiores percentagens de aumento no ensino se deram nas Faculdades de Ciências, com 34,3 por cento, na de Engenharia do Porto, com 78,1 por cento, no Instituto Superior de Agronomia, com 72,2 por cento, e no Instituto Superior Técnico, com 44,5 por cento. Os outros estabelecimentos de ensino superior aumentaram o número de alunos em menores proporções, que em todo o caso desceu de 44,4 por cento no Instituto de Ciências Económicas e Financeiras para 8,2 por cento nas Faculdades de Medicina. A Escola Superior Colonial viu o número de alunos reduzido a menos de metade - 257 em 1940-1941, contra 124 em 1945-1946.
Os números que se publicam no quadro a seguir esclarecem devidamente este assunto:

Aumentos ou diminuições no número de alunos no ensino superior

[Ver Quadro na Imagem]

Breves comentários aos elementos estatísticos levam à conclusão de que no conjunto diminuiu a frequência nas escolas elementares, complementares e médias e aumentou bastante nas escolas superiores e no ensino liceal.
O ensino industrial é muito atingido, tanto nos graus elementar e complementar como no médio. Mas as escolas de engenheiros tiveram aumento sensível, sobretudo a do Porto.
O ensino elementar agrícola tem muito pouca importância - apenas 228 alunos em 1945-1946. O agrícola médio, com é 11 em três escolas, não parece ter progredido grandemente em frequência.
O Instituto Superior de Agronomia, pelo contrário, aumentou-a em 72,2 por cento, ou 325 alunos.

72. Em matéria de ensino profissional, industrial e agrícola, os números indicam que há grande tendência para se formarem engenheiros e agrónomos. Pelo contrário, no ensino industrial há retrocesso acentuado na frequência, e no ensino agrícola os progressos são muito pequenos, apesar do reduzido número de alunos - ao todo 839.
Parece que as coisas se deveriam passar de modo exactamente oposto: a formação em grande escala de operários, capatazes, mestres, práticos agrícolas, feitores, chefes de oficina, e muito menor número de técnicos de curso superior, pelo menos enquanto não pudessem ser absorvidos pela indústria particular e pela agricultura.
A maior parte dos diplomados por escolas superiores de carácter profissional, incluindo Medicina e Direito, mas especialmente Agronomia e Engenharia, tenta ingressar nos quadros do Estado.
Outra questão que os números mostram, em sua crua realidade, é a da acomodação.
Não se vê bem como é que escolas superiores delineadas, se acaso o foram, para determinada frequência tenham de acomodar, de um ano para outro, bastante
maior número de alunos. O caso dos laboratórios e salas de ensaio é insolúvel. Já eram pequenos, ou mal equipados, para a frequência existente. Não poderão certamente satisfazer as necessidades do ensino experimental, indispensável à formação de profissões.
Mas ainda se levanta outro ponto de interesse social, que conviria analisar detidamente e que tantos inconvenientes tem tido no passado. Diz respeito à absorção dos diplomados, e isto refere-se tanto às carreiras profissionais - engenheiros, médicos, advogados e agrónomos - como às outras.
Não é que a frequência seja exagerada relativamente à população e área do País e províncias ultramarinas, e certamente, desde que se desenvolvam os seus recursos, há-de tornar-se necessário alargar a esfera de influência de profissionais dirigentes. Mas podia provar-se que por enquanto a tendência é para o lugar do Estado e que nos seus serviços há campo para maior número de diplomados por escolas médias do que por superiores - e em certos casos acontece exactamente o contrário.
Chama-se a atenção do Governo para os factos que acabam de ser sucintamente expostos.
Nesta questão do ensino a formação de profissionais tem grande importância, não só em Portugal como no resto do Mundo, e em muitos países se tomaram já medidas no sentido de aproveitar melhor, no interesse nacional, as aptidões dos diplomados por Universidades e escolas superiores. É evidente que a evolução do Mundo caminha no sentido de melhor aproveitamento de todos os recursos possíveis, de natureza física ou intelectual. Nisso reside já hoje, em grande parte, o bem-estar de vastas populações. Aqueles países que não souberem tirar das aptidões intelectuais de seus filhos o maior somatório possível de trabalho e rendimento nunca poderão caminhar a par dos outros em matéria económica e até social.
A experiência deste século indica em toda a parte o desenvolvimento cada vez mais intenso da vida intelectual

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e os grandes cuidados e despesas feitas no sentido de valorizar as Universidades e outros institutos superiores.

73. O aumento da despesa deste Ministério tem sido bastante, sobretudo desde o início da guerra. Os gastos
totais dobraram em relação a 1930-1931 e cresceram mais de 100 mil contos desde 1939.
A discriminação da despesa pelos diversos departamentos que compõem o Ministério consta do quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Tirando aos 312:332 contos do total os 69:200 que representam o abono de família e o suplemento de vencimentos dos funcionários, o acréscimo ainda é sensível.
O desenvolvimento da despesa, à parte os suplementos de guerra, deu-se em todas as dependências, mas mais acentuadamente nas Direcções Gerais do Ensino Superior e Primário. Há que fazer, porém, uma correcção à verba que corresponde à Direcção Geral do Ensino Superior quando se pretender compará-la com idêntica verba de 1930-1931. Em 1945 e 1946 estão nela compreendidas as dotações da Universidade Técnica, que anteriormente se inscreviam na Direcção Geral do Ensino Técnico.
O assunto será esclarecido melhor adiante.

Secretaria Geral

74. O que mais avoluma a despesa desta dependência do Ministério da Educação Nacional são os subsídios e pagamentos de diversos serviços. Os mais importantes referem-se a gratificações, ajudas de custo e transportes relativos a exames (1:136 contos), despesas com recepções (85 contos), ajudas de custo (32 contos), bolsas escolares (38 contos) e os subsídios a associações das escolas móveis (117 contos), a cantinas escolares (504 contos) e à Câmara Municipal do Porto, para manter o Conservatório de Música (175 contos).
A Mocidade Portuguesa (secção masculina) teve o subsídio de 6:200 contos e à Obra das Mães foi concedido o de 2:600 contos. A Escola de Paiã continuou a receber 485 contos. A verba que pode merecer reparos, por deficiente, é a das bolsas escolares e prémios nacionais.
Orçamentaram-se 50 contos e gastaram-se 38.
Das outras a mais importante diz respeito à Mocidade Portuguesa (secção masculina) e à Obra das Mães, que é a sua secção feminina; juntas receberam o subsidio de 8:800 contos, que não parece demasiado para a larga obra que pretendem realizar.
A verba de cantinas escolares não é grande e conviria estudar este assunto no sentido de alargar os grandes benefícios que as cantinas trazem aos alunos pobres. Não é possível, porque o não permite o erário, seguir o caminho de outros países, mas talvez haja vantagem em fazer um sacrifício neste sentido.

Instituto para a Alta Cultura

75. Este Instituto despendeu 4:203 contos em 1946, dos quais 4:080, números redondos, nas diversas funções que desempenha e o resto em despesas privativas de pessoal, material e encargos. O quadro que segue dá a aplicação das quantias gastas durante os anos de 1938, 1945 e 1946.

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Já o ano passado se aludiu às funções do Instituto e às verbas gastas, e então se comentou a sua actividade no movimento geral da cultura portuguesa.
Publica-se a seguir a discriminação do emprego das verbas respeitantes a bolsas de estudo, dentro e fora do País, nos totais de 500 e 900 contos.

Bolsas de estado

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O simples exame destes números mostra logo a tendência para a concessão de bolsas a ciências e a letras. Dentro do Pais bem mais de metade lhes dizem respeito. Às ciências aplicadas - agronomia e engenharia - concederam-se apenas 10 bolsas, e nada parece ter sido desviado para investigação económica, a não ser as duas bolsas para a estatística e talvez um pouco do que se gastou em centros de estudos.
O caso das bolsas no estrangeiro ainda levanta maiores reparos. Há apenas 1 bolseiro de agronomia e a de engenharia - o primeiro no Canadá e Estados Unidos da América e os dois últimos em Espanha e Estados Unidos da América.
Num país de desenvolvimento económico tão atrasado, que pretende dar largo passo no sentido de aplicar os recursos industriais e agrícolas que possui, enviam-se para fora, num total de 49 bolseiros, apenas 3 para se aperfeiçoarem na técnica agrícola e industrial.
Isto é, na verdade, uma visão dos interesses do Pais que não se adapta às cruas e duras realidades da vida de hoje.
Quanto aos investigadores dentro do País, outro tanto se poderá dizer.
A investigação económica está na infância, entre nós. Desconhecem-se, por falta de elementos, as bases para a resolução de grandes problemas nacionais.
E, contudo, tanto na engenharia como na agronomia e economia, apenas há, dentro e fora do País, subsidiados pelo Instituto para a Alta Cultura, sobre um total de 122 bolseiros, 15 que se dedicam ao estudo de questões verdadeiramente de utilidade económica, que são, no momento que passa, aquelas que podem ter maior projecção na vida nacional.
Não se pode recomendar o aumento de dotações a este Instituto, e antes se aconselha o Governo a reduzir as actuais e a rever completamente as condições em que ele vive, tanto no que diz respeito a bolsas de estudo, como noutros aspectos.
Quanto às restantes verbas, elas parecem exageradas, relativamente às possibilidades orçamentais.
Ainda sobre este assunto conviria investigar o que se passa noutros Ministérios. Hoje diversos departamentos públicos enviam funcionários a especializar-se ou a aperfeiçoar-se no estrangeiro, ou concedem subsídios de estudos dentro do País.
Assim procedem os Ministérios do Interior, Guerra, Obras Públicas, Economia e outros. Continua ainda a dispersão de esforços. Haveria vantagens em fazer um inquérito que elucidasse claramente quanto se gasta neste sector da vida nacional, como se gasta e qual a utilidade que desse dispêndio tira o Estado ou a comunidade. Parece que o que se está a fazer nesta matéria precisa de ser revisto à luz das possibilidades financeiras e da utilidade pública.

Ensino superior e artístico

76. Já atrás se mencionaram as dotações deste grau de ensino, que atingiram 62:383 contos, assim repartidos:

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Compreende o castelo de Guimarães.

No conjunto o aumento de despesa foi de 6:695 contos em relação a 1945 e de 22:386 relativamente a 1938. Deverá, contudo, salientar-se que parte importante do acréscimo desde o ano anterior à guerra foi devido ao Hospital Escolar (+ 5:405 contos), o que, considerando os preços dos materiais, não é muito grande.
Do mesmo modo o Instituto de Oncologia alargou a sua esfera de acção, de que resultaram maiores gastos (cerca de 1:500 contos a mais). O resto distribuiu-se por grande número de estabelecimentos de ensino ou institutos culturais ou artísticos. Mas os mais importantes de todos tiveram lugar nos Teatros de S. Carlos e D. Maria II.
O Teatro de S. Carlos, que gastou 22 contos em 1938 e 952 em 1945, passou para 4:198 contos em 1946. A sua exploração parece ter sido muito deficitária.
Inscreveram-se e gastaram-se 3:177 contos em subsídios a cofres ou organizações metropolitanas, coloniais ou estrangeiras e despenderam-se 776 contos em pagamento de serviços e encargos não especificados.
A cifra é elevada para um orçamento fraco de receitas e que tem de atender a muitas necessidades de ordem cultural, no ensino superior e de outros graus. E por isso conviria estudar qualquer modo de reduzir este subsídio.

Universidades

77. O custo das Universidades, não contando com os hospitais que servem as Faculdades de Medicina e os Institutos Bacteriológico e Oftalmológico, pode descrever-se para os últimos anos, comparados com 1938, do modo que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento de 8:700 contos no período de guerra foi essencialmente devido às melhorias do pessoal docente. Já se aludiu em relatório anterior ao efeito dessas melhorias, aliás devidas, no orçamento das Universidades, assim como também se descreveu a sua situação no ponto de vista da constituição do pessoal docente, com referência a estabelecimentos de ensino superior noutros países.
Não se insistirá, por isso, este ano nas recomendações então feitas, mas deseja-se reforçar ainda o que já foi dito sobre a necessidade de dotar melhor os laboratórios e outras instituições de ensino experimental tanto nas Universidades clássicas como na Universidade Técnica.

78. Um exemplo interessante permite mostrar que ainda se não realizou o que poderia ter sido feito neste aspecto.
No quadro a seguir publicam-se os gastos de pessoal, material e encargos nas Faculdades de Ciências de Lisboa e Coimbra:

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Como se verifica, o aumento deu-se essencialmente nas dotações de pessoal. Em material, na Faculdade de Ciências de Lisboa houve um reforço de cerca de 300 contos nas verbas e na de Coimbra um pouco mais de 60 contos apenas. No primeiro caso grande parte do reforço foi devido a obras no Museu de História Natural, que esteve encerrado muitos anos.
No que diz respeito aos Institutos Superiores Técnico e de Agronomia, os números são os do quadro a seguir mencionado:

[Ver Quadro na Imagem]

Não incluindo o Laboratório de Patologia Vegetal, que custou 138 contos, dos quais 55 em pessoal, 30 em material e 53 em encargos, os Institutos Técnico e de Agronomia gastaram (5:858 contos. Em material de consumo corrente, que compreende matérias-primas e produtos acabados ou meio acabados para um dos laboratórios e oficinas, as verbas são bastante pequenas.
No Instituto Superior Técnico 400 contos gastos em material incluem 126 contos para compra de móveis e 82 para conservações de móveis e imóveis.
As matérias-primas e produtos importaram em 82 contos e os impressos, artigos de expediente e outros e diverso material não especificado custaram cerca de 110 contos.
Por diversos encargos despenderam-se 100 contos de força motriz e 99 contos em estudos e ensaios para organismos oficiais e particulares.
No Instituto de Agronomia as verbas são menores. Em matérias-primas e produtos despenderam-se pela dotação inscrita apenas 4.500$ e em artigos de expediente e diverso material 81 contos. O aparente acréscimo de 265 para 629 contos em material proveio de conservação de imóveis, em que se gastaram em 1946 cerca de 280 contos. Nos encargos o que mais pesou foram as despesas de luz, aquecimento, água, lavagem e limpeza, com 75 contos, e 121 contos de subsídios a cofres ou organizações metropolitanas, coloniais ou estrangeiras.
As verbas não se ajustam à importância que deveria ter o ensino ministrado nestes dois Institutos, pelas razões já apresentadas em pareceres anteriores.
O que acaba de se referir quanto a verbas de material permite reforçar as considerações feitas em anos passados quanto à possibilidade de num plano de conjunto se organizar o ensino experimental. Não vale a pena ter muitos laboratórios ou institutos insuficientemente dotados. Melhor seria concentrar as verbas, como já por diversas vezes aqui se sugeriu.

Ensino técnico

79. A reforma do ensino técnico industrial e agrícola, aprovada na Assembleia Nacional, há-de modificar sensivelmente o aspecto das contas. Logo que seja regulamentada e posta em vigor, é natural que aumentem as despesas. As dotações gastas em 1946 importaram em 28:607 contos, assim repartidos:

[Ver Quadro na Imagem]

Exclui-se, para efeitos de comparação, na despesa de 1938 a Escola de Queluz, que foi extinta.
Em 1946 despenderam-se mais cerca de 8:000 contos no ensino técnico médio e elementar.
Há que ter em conta a compra de um edifício para o Instituto Industrial de Lisboa. Na verba «Aquisições de imóveis» inscreveram-se 1:121 contos.
Já se viu atrás a frequência em 1946 dos institutos médios e notou-se que ela diminuiu no ensino industrial. A verba de material e encargos destinada a laboratórios e oficinas não aumentou sensivelmente.

80. No conjunto as despesas dos diversos graus de ensino técnico podem apresentar-se assim:

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento total no ensino técnico deu-se por cerca de um terço no ensino superior.
Se for excluída a compra do prédio para o Instituto Industrial de Lisboa, decresce a maior valia no ensino

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médio industrial para cerca de 320 contos. Nas despesas com diversas escolas houve o aumento de 3:830 contos.
É paradoxal o lacto da diminuição das verbas do ensino agrícola elementar, que gasta apenas 685 contos nas Escolas de Alcobaça e Santo Tirso. Só há duas escolas agrícolas elementares no País.
A questão já foi debatida mais de uma vez nestes pareceres e na verdade merecia que tivesse maior repercussão o facto. Num país que se supõe ser essencialmente agrícola há apenas duas escolas elementares de agricultura.
Parece ser necessário rever completamente a questão da instrução agrícola.
Existem órgãos no Ministério da Economia que poderiam, se convenientemente orientados e em combinação com o que se realizasse pelo Ministério da Educação Nacional, constituir uma rede coordenada, de estabelecimentos valiosos de educação agrícola.
São postos, estações e outras dependências que, tal como funcionam, pouca influência podem exercer na vida agrícola.
Os nossos métodos culturais estão atrasados. É facto reconhecido por todos. E agora, que se procura intensificar a rega e a produção, parece ser de vantagem estudar praticamente um assunto que está na base de todo o progresso agrícola nacional.
Os projectos em curso e o uso de águas subterrâneas em maior escala do que actualmente nunca produzirão os efeitos esperados se não forem modificados profundamente os métodos de cultura.
Ao todo a instrução agrícola custou em 1946 o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

As três escolas de regentes agrícolas -de Coimbra, Santarém e Évora- consomem cerca de metade das dotações, o Instituto de Agronomia 42,1 por cento e os restantes 9 por cento vão para as duas escolas práticas de Alcobaça e Santo Tirso.
Há ainda a Escola de Paiã, com o subsídio do Ministério da Educação Nacional (485 contos), inscrito na Secretaria Geral, a que se aludiu atrás.
Estes números, sem mais comentários, revelam a necessidade de uma completa remodelação do ensino agrícola, usando para esse efeito o que pode ser utilizado dos Ministérios da Educação e da Economia.

Ensino liceal

81. Em fins do ano lectivo de 1946-1947 foi reorganizado o ensino liceal, que tantas reformas tem sofrido.
Não é possível por enquanto ajuizar dos efeitos da nova reforma, que parece trazer um aumento de despesa vizinho de meia dúzia de milhares de contos. Se esse aumento se repercutir ria melhoria dos métodos de ensino e se dele resultar maior prática laboratorial, o que parece não ser o caso, nada haverá que dizer sobre o aumento de despesa. Temos sido infelizes com as reformas do passado. O Estado, com a construção de novos liceus, bem dispendiosos alguns deles, procura melhorar as instalações e oferecer meios de ensino profícuo. Mas de nada valerá o esforço financeiro despendido se a qualidade do ensino não se aperfeiçoar. Este é um dos grandes problemas nacionais que há tantos anos esperam resolução.
A despesa em 1946 foi de 21:243 contos, mais cerca de 1:730 contos do que em 1938, sem incluir o suplemento de vencimentos nem o abono de família. O aumento foi pequeno e deu-se quase todo no pessoal, como mostram os números seguintes:

[Ver Quadro na Imagem]

As verbas de material mantiveram-se em relação a 1945. Mais 241 contos em material e 256 contos em diversos encargos relativamente a 1938 é bem pouco se for considerado que no período de nove anos se abriram diversos liceus novos e naquelas verbas se incluem também as despesas de conservação, além do que é preciso para o ensino experimental.

82. Viu-se o ano passado que o custo dos novos liceus até 31 de Dezembro de 1946 havia sido de 57:705 contos e que as ampliações e arranjos de outros haviam importado em 7:093. Tudo perfaz 64:798 contos e tudo foi pago por empréstimos.
De então para cá não foi inaugurado nenhum novo edifício, motivo por que se mantêm os números dados o ano passado.

Ensino primário

83. Com o ensino primário gastaram-se em 1946 perto de 108:117 contos. Deram-se acréscimos em quase todas as rubricas, mas só numa tiveram relativa importância, como se mostra no seguinte quadro:

[Ver Quadro na Imagem]

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O aumento em relação a 1938 foi de 10:300 contos, teve lagar essencialmente nos serviços do ensino primário e, em menor grau, nas escolas do magistério primário. As últimas continuam a alargar a despesa.

84. Já se verificou atrás que a frequência das escolas primárias diminuiu nos últimos cinco anos, entre 1940-1941 e 1945-1946. O número médio de crianças com 7 anos de idade em 1940 era de 177,9 e 200,6 por cada 100 quilómetros quadrados e 10:000 habitantes. E o número de alunos em idade escolar, matriculados pela primeira vez na 1.ª classe, foi de 157,8 e 177,9, respectivamente.
Isto significa haver muitos alunos que se não matriculam. O fenómeno dá-se em todos os distritos, mas é proeminente no de Beja e noutros.
O seguinte quadro permite ter uma ideia das condições do ensino primário no País:

Alunos inscritos e crianças recenseadas

[Ver Quadro na Imagem]

Onde parece ser maior o desinteresse pela matrícula na escola primária é no distrito de Beja, seguido pelos do Funchal, Setúbal e Leiria. Em Beja apenas se inscreveram pela primeira vez 73,7 por cento das crianças recenseadas. Os concelhos de Ourique e Almodôvar, com menos de 50 por cento, são os mais afectados. Os de Moura, Alvito e Beja ocupam as melhores posições.
Parece estar a fazer-se um grande esforço no sentido de melhorar a frequência no ensino primário em Bragança, que ocupa posição honrosa. Tirando Alfândega da Fé (82,14), Vimioso (84,12) e Mogadouro (87,2), todas as percentagens são superiores a 90.
O que destoa na Beira Baixa é o concelho de Penamacor (62 por cento) e o do Fundão (76,3 por cento). Os outros têm percentagem de frequência superior a 80 e um tem mais de 90 (Vila Velha de Ródão).
Em Coimbra os concelhos mais desfavorecidos são Pampilhosa da Serra e Condeixa-a-Nova, Gois e Soure, com menos de 80 por cento; e, no de Faro, Alcoutim (52,2), Castro Morim (52,7) e Monchique (57,6) baixam muito a média do distrito. Celorico da Beira é o único concelho com percentagem inferior a 80 por cento na Guarda; mas em Leiria há Pombal, Peniche, Óbidos, Figueiró dos Vinhos e Alvaiázere, alguns até com pouco mais de 60 por cento.
Em Portalegre os concelhos de Fronteira (55,3), o de Ponte de Sor (55,2) e o de Arronches (44,4) são os mais destoantes.
A posição de Santarém poderia ser melhor se não fosse Salvaterra de Magos (36 por cento), a Barquinha (52) e Coruche (53 por cento). O caso de Setúbal sofre da pequena inscrição em Alcácer do Sal (59 por cento), em Grândola (58,6 por cento), em Palmeia (58,2 por cento) e em Santiago do Cacem (47,7).
Viana do Castelo, Vila Real e Viseu parecem ocupar boas posições na escala, sem grandes desvios nos diversos concelhos.
As ilhas ocupam lugar de destaque, sobretudo o distrito da Horta, com 103,5 por cento. Neste distrito matricularam-se mais alunos do que os recenseados. Se não fora a ilha do Corvo (38,5 por cento), ainda seria melhor a percentagem. Nesta ilha havia 13 crianças recenseadas e inscreveram-se 5 varões de 7 que foram recenseados.
Não se inscreveu nenhum indivíduo do sexo feminino dos recenseados.

85. Os números mostram que está a fazer-se um esforço sério no sentido de acabar com o analfabetismo. Mas ainda há zonas que necessitam de ser cuidadosamente vigiadas. Não se compreende que possa haver concelhos onde se não matriculam metade das crianças recenseadas. Têm de tomar-se providências no sentido de fazer cumprir a lei e sabe-se em pormenor onde se dá a falta de cumprimento. Os números acima indicados mostram os concelhos e distritos onde isso acontece.

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86. Em 1946 havia autorizados no País 11:083 estabelecimentos do ensino primário elementar, dos quais funcionavam 92,2 por cento. Eram 8:136 escolas e 2:947 postos, com 13:779 cursos. O número de salas de aula subia a 12:924 e o dos edifícios a 9:256, pertencendo a particulares 5:013.
O número de estabelecimentos no ensino primário oficial em exercício era de 10:219, sendo 8:038 escolas e 2:181 postos.
O pessoal docente no ensino primário elementar totalizava 13:880 professores e regentes, dos quais apenas 2:890 eram do sexo masculino e 10:990 do feminino.
O número de professores do quadro e agregados somava 10 605, sendo 2:582 homens; e o de regentes era de 3:275, dos quais 308 do sexo masculino.
Nota-se uma baixa percentagem no número de professores e regentes do sexo masculino, que anda à roda de 20 por cento.
No distrito de Beja há 347 professores e regentes e apenas 47 são homens; no de Bragança há 499, dos quais apenas 57 são homens. No de Faro há 528 professores e regentes e são homens 53. Castelo Branco, Lisboa, Coimbra e Porto tom percentagens um pouco melhores, mas raras vezes sobem acima de um terço de homens para dois terços de mulheres.
A questão está a tomar certa acuidade. O caso de Faro - cerca de 10 por cento de homens e 90 por cento de mulheres como professores e regentes - não pode ser considerado como excepção. Se forem examinadas as frequências das escolas do magistério primário, nota-se logo a supremacia de indivíduos do sexo feminino: 19 homens sobre 237 alunos inscritos na de Lisboa, 23 sobre 219 na do Porto, e assim por diante. Parece haver necessidade de tomar medidas que resolvam este problema.

Escolas do magistério primário

87. Havia 12 escolas do magistério primário no País, com 1:240 alunos inscritos no ano lectivo de 1945-1946.
Não se compreende bem o critério que presidiu à escolha dos locais em que se criaram as escolas. Há distritos com grandes tradições nesta matéria que não possuem a sua escola; há outras que as têm em duplicado e com baixa frequência.
Os requerentes aos exames de admissão em 1946, nalgumas delas, são muito poucos.
Tirando o Porto, com 137 (17 homens), Coimbra 95 (15 homens) e Braga 94 (9 homens), o número de alunos que compareceram às provas dos exames de admissão é muito baixo. Numa das escolas apenas compareceram 33, dos quais 2 eram do sexo masculino, noutra 45 (9 homens). Em Lisboa, dos alunos que compareceram a provas foram aprovados 69, dos quais 10 homens.
O número de alunos inscritos é muito baixo nalgumas das escolas. Numa delas era de 92 em 1945-1946, dos quais apenas 17 homens, noutra não passava de 31 (7 homens) e esta tinha 10 professores.
Em 1946 concluíram os cursos 505 alunos, dos quais 45 homens e 460 mulheres. Foram 99 em Lisboa, 99 no Porto, 65 em Braga, 7 em Bragança, 79 em Coimbra, 57 em Évora, 13 na Guarda, 56 em Viseu, 2 na Horta, 14 em Ponta Delgada e 14 no Funchal.
Finalmente, resta dizer que existem 117 professores para um total de 1:240 alunos inscritos, dos quais 183 homens. Dos professores, 92 são homens e 25 mulheres. A cada professor correspondem 10,5 alunos.
É de notar que algumas escolas abriram recentemente. Num caso havia 31 alunos inscritos e 10 professores, noutro 33 alunos e 10 professores.
Estes elementos são elucidativos por muitos aspectos e indicam logo a necessidade de rever este assunto.
Em geral nota-se baixa frequência até nas escolas de Lisboa, Porto e Braga, que, juntas, contêm mais de metade do total dos alunos inscritos: 625, contra 1:240. A baixa frequência é, evidentemente, derivada da baixa remuneração do professor primário. Poucos indivíduos do sexo masculino as frequentam - 183 ao todo - e muitos deles parece não exercerem o magistério depois de concluído o curso.
A existência de algumas das escolas do magistério primário, tendo em conta o número de alunos que as frequentam, não se justifica. A sua distribuição geográfica não corresponde às tradições nesta matéria. Há províncias que não têm escola de magistério primário, e contudo tiveram sempre grandes frequências quando as possuíam.
É preciso, além disso, tomar medidas no sentido de aumentar a frequência de indivíduos do sexo masculino. As percentagens actuais são perigosamente baixas.
Em conclusão, parece de tudo deduzir-se que é excessiva a existência de 12 escolas do magistério primário para 1:240 alunos. Embora possa aumentar a frequência de algumas recentemente criadas, quando em pleno funcionamento, ainda será excessivo o seu número. O quantitativo de pessoal docente é elevado - 117 para 12 escolas.
E há regiões com grande passado nesta matéria que não têm escola de magistério primário. Convém por isso rever o assunto com a possível urgência.
Os gastos do ensino nas escolas do magistério primário em 1946 foi o que segue:

Contos

Pessoal............................................. 1:315
Material............................................ 273
Encargos............................................ 419
Total............................................... 2:007

As verbas que mais pesaram em material foram a da aquisição de móveis (128 contos) e a de conservação de móveis e imóveis (79 contos). Na de encargos as rendas de casa absorveram 72 contos, os subsídios diversos 87 e o pagamento de serviços e encargos não especificados 173.

88. Não foi possível alargar mais este ano o comentário das contas sobre os serviços do ensino primário.
Deram-se contudo os elementos fundamentais respeitantes à frequência nas escolas primárias, ao número de alunos, professores, regentes e escolas. Aludiu-se ligeiramente ao sexo do pessoal docente, para indicar os inconvenientes da situação actual, e mostrou-se que há concelhos no País onde nem metade das crianças recenseadas se matriculou. São, felizmente, poucos esses concelhos, mas existem e é preciso que desapareçam.
A despesa com o ensino primário tem aumentado, ainda quando se não considera o abono de família e o suplemento de vencimentos. Mas é muito baixa a remuneração do professor primário, até quando se compara com a de muitos operários e, em certas regiões, de trabalhadores agrícolas.
O professor primário desempenha na aldeia uma função importante e vive mal. Os que exercem a sua missão na cidade trabalham longas horas fora do serviço, para manter uma posição de equilíbrio na manutenção de suas famílias. A vida de muitos é angustiosa.
Há necessidade de estudar convenientemente este assunto, que já foi apontado como sério em pareceres anteriores.
A consequência verificada, dia a dia, ano após ano, é a indiferença de indivíduos do sexo masculino pelo magistério primário - e a qualidade do ensino ressen-

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te-se deste facto e das dificuldades com que lutam os professores.
Existem 10:605 professores, sem contar com os regentes (2:582). Supondo a melhoria, em média, de 3 contos anuais, o aumento de despesa seria de cerca de 32:000 contos por ano só para professores.
Talvez houvesse possibilidade de distinguir entre os professores do sexo masculino e do feminino, concedendo provisoriamente, até definitivo estudo, um suplemento aos primeiros, ainda pela razão de que a professora primária só pode hoje casar-se com indivíduo de meios idênticos aos seus.
Conviria estudar o assunto com consciência e fazer um sacrifício financeiro, se isso for necessário. Talvez seja possível reduzir outras dotações para aumentar a que diz respeito ao professorado primário.

MINISTÉRIO DA ECONOMIA

89. Este Ministério, na sua organização actual, foi criado há sete anos, pela fusão dos antigos Ministérios do Comércio e Indústria e da Agricultura. A sua formação fora já sugerida em 1935, quando na Assembleia Nacional se discutiu a proposta de lei sobre reconstituição económica.
Notava-se já nessa data que os assuntos relacionados com a economia nacional se encontravam dispersos por vários departamentos do Estado e que muitas vezes a sua actuação não obedecia a princípios uniformes.
O contraprojecto então apresentado previa um órgão central -a Junta Central de Economia, a destinado a centralizar a elaboração de planos em que seriam gastas as receitas disponíveis nos próximos quinze anos».
Justificava-se a ideia, em sucinto relatório, do modo seguinte:

É sabido, e já atrás se aludiu a isso, que um dos grandes males da administração pública portuguesa reside na dispersão de funções por diversos serviços do Estado. A sobreposição de competências, aliada à defesa de cada serviço pelos componentes, a falta de colaboração e ligação que se nota nas soluções de muitas coisas que dizem respeito a dois ou três departamentos públicos, toda uma série de pequenos nadas que causam demoras, atrasos e discussões na resolução de assuntos urgentes e essenciais, concorrem para a confusão que se nota no bom andamento da coisa pública.

E por isso se previa a constituição de uma Junta Central de Economia.
Os seus fundamentos eram então explicados assim:

Com efeito, não se trata apenas de planos parciais - construir uma estrada ou um caminho de ferro, aplicar um esquema de irrigação ou regularizar caudais de um rio. É mais complexo o problema, porque visa desenvolver recursos económicos, simultaneamente, que dizem respeito a actividades de diversos Ministérios e bem podem influenciar grandemente a vida económica da Nação e do Império. Há necessidade de encarar a questão no todo, e não em parte ou partes, e coordenar as soluções nos seus diversos aspectos, de modo a que não venha a haver amanhã largo desenvolvimento numa forma de actividade em detrimento de outra, ou, o que seria ainda mais grave, não venha a verificar-se depois que se despendeu inutilmente dinheiro em qualquer melhoramento que não é requerido pelas necessidades imediatas ou próximas da economia nacional, ou em avanço de outras.
Um plano de soluções engloba, além disso, aspectos diversos: o financeiro, o económico, o técnico, o industrial ou agrícola ou comercial, ou mesmo o progresso das ciências aplicadas.

Escritas há já treze anos, estas palavras continuam a ter actualidade. E a guerra veio obrigar quase todos os países da Europa a reconhecer a necessidade de estreita coordenação entre todas as actividades do Estado que orientam ou pretendem orientar a economia pública e particular.
O problema é hoje mais grave porque durante o longo intervalo de mais de uma década se insinuou na vida dos povos uma nova e complexa questão que não existia, ou só existia em estado latente, por voltas de 1935, quando pelo actual relator das contas públicas foram sugeridas na Assembleia Nacional a formação de uma junta destinada a elaborar planos e a coordená-los e a criação de um Ministério da Economia Nacional.
O problema grave de hoje, que acresce aos de 1935, é o da moeda nos seus diversos aspectos. Ele está Intimamente ligado aos problemas da economia nacional:

90. Cinco anos depois de ter sido sugerida na Assembleia a criação do Ministério da Economia, foi este formado pela junção dos departamentos do Comércio e Indústria e da Agricultura.
Era um passo andado no bom caminho, se fosse completado com a indispensável reorganização dos serviços; mas cada um continuou a funcionar mais ou menos nos moldes anteriores. Apenas, em vez de dois Ministros havia um, com um Subsecretário por cada antigo Ministério. Ficou de fora a orientação dó Ministério das Obras Públicas e Comunicações, onde existiam alguns dos principais instrumentos de fomento do País: o estudo dos rios como . fonte de energia, transportes e água para rega; os planos dos portos; os caminhos de ferro, que são o nervo da economia, pela influência que o nível das tarifas pode exercer sobre ela; a irrigação, que é hoje na agricultura de importância fundamental; os planos de estradas e de caminhos vicinais, que, por si sós, podem operar o renovamento de regiões atrasadas.
Todas as deliberações tomadas sobre cada um destes aspectos da vida nacional são de natureza económica e, se não forem delineadas no sentido de serem cerzidas ao plano geral de desenvolvimento económico, nunca poderão desempenhar a função utilitária que lhes cabe.
Não há hoje qualquer espécie de ligação entre os vários programas de natureza económica além da que é feita através dos Conselhos de Ministros. E pode dizer-se que essa é precária, de natureza meramente política, porque muitos dos planos em execução, como, por exemplo, o rodoviário e outros, não são informados no sentido económico. O financiamento destas obras de fomento cabe, na essência, ao Ministério das Finanças, que pode directa ou indirectamente, se assim o desejar, exercer, além disso, acção profunda no crédito.
Ora, tanto o financiamento destes e de outros trabalhos, destas obras e de outras pelo Estado como o crédito são poderosos elementos na vida económica do País. Afectam também profundamente a vida social. Grande parte dos recursos anualmente gastos, quer em materiais, quer em salários, corre através dos cofres do Ministério das Finanças. Aliando esta forte posição à sua influência no crédito, ver-se-á logo a impossibilidade de construir duradouramente qualquer arquitectura económica sem a intervenção do Ministério das Finanças.

Ver Diário das Sessões n.º 11, de 8 de Fevereiro de 1935,
p. 201; (projecto de lei apresentado pelo Deputado Araújo Correia).
2 Diário das Sessões n.º 11, de 8 de Fevereiro de 1935, p. 20L.

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Ele devia ser o árbitro superior da utilização dos recursos financeiros nacionais e tomar providências no sentido de que fossem encaminhados para os fins mais produtivos, tanto em aspectos materiais como sociais e até culturais, sempre em acordo com outros departamentos. Os efeitos de gastos de largas somas reflectem-se no poder de compra, nos preços, na moeda, na vida colectiva, enfim.

91. A ideia de 1935 não vingou. Vínhamos de longo período de desorganização administrativa, e a nossa tendência individualista, que era herança do passado, não podia subordinar-se à noção comezinha da cooperação económica, que, de qualquer modo, implica abdicar em certos casos de desejos ou opiniões pessoais. A ideia não foi compreendida nem aceite.
Mas passados treze anos podem ver-se os inconvenientes que daí resultaram, e quem se der ao trabalho de lançar um golpe de vista ao que vai pelo Mundo e observar as modificações sofridas pela orgânica do Estado, vê-la-á em vigor em quase toda a parte, nesta ou naquela forma, sob esta ou aquela designação, mais ou menos completa aqui, quase definitiva além, como, por exemplo, em Inglaterra, apesar do espirito individualista que sempre caracterizou a vida política naquele pais.

92. Já se disse nestes pareceres que o Ministério da Economia, depois de 1940, precisava de reorganização urgente, de modo a acabar, até dentro do Ministério na sua forma actual, com sobreposições e redundâncias.
Não é tarefa fácil, que está ainda a complicar-se pela formação de novos órgãos recentemente criados, sem mudanças em outros que existiam e existem.
Precisa-se, sobretudo, de um instrumento de política económica dentro deste ou doutro Ministro que vigie, com elementos colhidos na observação estatística e visual, o estado económico do País: o aumento ou diminuição na produção; a estrutura e importância do comércio externo, incluindo a origem e quantitativo das importações e o destino e quantitativo das exportações; o estado da balança comercial; o grau do progresso das indústrias; a sua produção, se regular ou irregular, tanto em qualidade como em quantidade; o nível dos preços e o dos custos, que é consequência também da regularidade de funcionamento dos estabelecimentos industriais; o rendimento da mão-de-obra e o treino e capacidade técnica de quem dirige; a importância das colheitas; a sua qualidade e maneira de a distribuir, de modo a não haver desperdícios ou estragos, que ainda hoje, em época de crise, pesam na vida do agricultor; e muitos outros factores de interesse.
Grande número de decisões de ordem económica precisa de ser coordenado pelo Ministério da Economia, de maneira a que os reflexos na ordem política sejam bem fundados.
Só uma economia sã e produtiva em alto grau pode assegurar uma organização social como a que está em vias de desenvolvimento entre nós. O social repousa sobre o económico, e o desconhecimento deste axioma pode levar a graves desilusões e sérias consequências no futuro.
Sem melhor rendimento económico e aumento de riqueza colectiva não pode haver maior distribuição de quotas sociais. De modo que o primeiro dever do Governo, é elevar até ao possível, o aumento da produção, em termos eficientes. Só deste modo será possível enfrentar os maiores gastos da organização social.
Nas épocas modernas toda a orgânica económica que não assente nas bases que acabam de ser sucintamente anunciadas, e que são consequência de longa investigação e experiência, tantas vezes impostas por necessidades inadiáveis, está condenada a falir ou, o que é quase o mesmo, a manter o Pais em baixo nível de vida. A aplicação de principios económicos e financeiros correctos, que provaram em toda a parte a sua eficácia, está na base da reorganização económica nacional.

As contas

93. As despesas do Ministério da Economia têm aumentado bastante. Partindo de 51:611 contos, que é a soma dos dois Ministérios que o vieram a formar, atingiram 117:420 contos em 1946. Seguem as despesas:

[ver tabela na imagem

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Os grandes aumentos deram-se sobretudo nos serviços agrícolas e pecuários. Os dois alargaram a sua despesa de cerca de 25:000 contos desde 1938. As novas verbas, directa consequência da guerra, são a Intendência Geral dos Abastecimentos, além do suplemento de vencimentos e abono de família.

Serviços agrícolas

94. O desenvolvimento da despesa destes serviços continuou. Em 1945 foi de 5:000 contos em relação ao ano anterior e em 1946 de 3:500. Desde 1938, sem contar com o suplemento de vencimentos e abono de família, o acréscimo da despesa atinge mais de 15:000 contos.
O relator das contas públicas tem dificuldades no exame das verbas desta Direcção Geral, com dependências - como postos agrícolas, estações agrárias e outras - dispersas pelo País. É muito difícil saber o seu custo, porque o pessoal é processado pelos serviços centrais e as dependências não têm quadros privativos. Assim, torna-se difícil saber, em face da despesa feita e dos resultados colhidos, se vale a pena manter ou não este ou aquele posto agrícola ou estação agrária. É opinião de muita gente, e inquéritos feitos parecem confirmá-lo, que o trabalho das dependências desta Direcção pode melhorar muito, e possivelmente com menos despesa.
Na verdade, os processos de cultivo são muito atrasados em regiões variadas do País, e há necessidade de espalhar por elas a noção prática de melhores métodos de cultura: ensinar os agricultores a produzir melhor.
Não parece que a acção do Estado se faça sentir apreciàvelmente nesta matéria, embora se tenham feito esforços, pelo menos no ponto de vista orçamental, para difundir o interesse pelos métodos progressivos de exploração agrícola. Este assunto precisa de ser visto com cuidado. A produção agrícola não pode desenvolver-se sem melhores processos de cultura.
A Direcção Geral da Contabilidade Pública deveria tomar medidas no sentido de no futuro, se discriminarem convenientemente os gastos das dependências desta Direcção Geral, ainda que para isso seja necessária qualquer disposição de lei.

95. A verba da despesa reparte-se do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Pessoal

96. A verba de pessoal continuou a aumentar. Atingiu este ano 11:089 contos, já bastante mais do que toda a despesa da Direcção Geral em 1936 (7:860 contos) e um pouco menos do que a de 1938 (13:736 contos).
O que aconteceu ultimamente nesta matéria foi a transferência para o quadro do que era contratado e a ele não pertencia, como se nota nos números que seguem, que dão o custo do pessoal:

[Ver Tabela na Imagem]

Nas três rubricas pessoal dos quadros, contratado e assalariado a despesa em 1945 foi de 7:846 contos e em 1946, nas duas (dos quadros e assalariado), foi de 10:111. Donde se verifica ter sido ainda muito grande o aumento. Isso se deve, certamente, em parte, à remodelação do quadro dos regentes agrícolas.

Material

97. Em material a verba mais importante, em todos os anos, diz respeito à conservação de imóveis - obras feitas pelo Ministério das Obras Públicas em diversas dependências da Direcção Geral. Gastaram-se este ano 1:900 contos. O resto consta da tabela a seguir.

Contos

Aquisição de móveis ............. 549
Conservação de imóveis .......... 1:900
Conservação de móveis ........... 168
Conservação de semoventes ....... 497
Matérias-primas ................. 95
Material de laboratórios e produtos químicos ............... 241
Diversos ........................ 484
Total .................. 3:934

Encargos

98. Nos encargos incluem-se variadas quantias, sendo as mais importantes as despendidas com a cultura do arroz, a fiscalização do plantio da vinha e as participações em receitas das explorações. Outras de interesse são as que seguem:

[Ver Tabela na Imagem]

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Serviços florestais

99. A obra destes serviços é de grande utilidade e devia ser alargada na medida do possível. Parece não ter tido execução normal o plano aprovado, por virtude de diversas dificuldades. As suas receitas e as despesas ordinárias e extrordinárias são:

[Ver Tabela na Imagem]

A despesa, desdobra-se do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Deu-se o aumento no pessoal de um pouco mais de 700 contos. No resto manteve-se a despesa, depois de considerados os inevitáveis agravamentos em material.
Com efeito, na verba de material inclui-se uma parte importante do que se gasta com o ordenamento das matas, além dos edifícios que estão a ser construídos. Neste último aspecto poder-se-iam talvez fazer economias sem afectar a solidez e conforto essenciais em construções desta natureza. Noutro lugar se verificará o gasto em 1946.

Serviços pecuários

100. Também continua a aumentar a despesa destes serviços. Desde 1938 o acréscimo foi de 9:444 contos e de cerca de 700 contos em relação a 1945, como pode verificar-se no quadro seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

Custo doa serviços

101. Quase todas as dependências desta Direcção Geral tiveram maior despesa, mas as verbas mais acentuadas são sempre as dos serviços centrais. Os números que seguem dão o custo de cada um deles:

[Ver Tabela na Imagem]

Nos serviços centrais as verbas dividem-se do modo seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

102. Nos estabelecimentos zootécnicos as dotações são as que seguem:

[Ver Tabela na Imagem]

Nas delegações, intendências e Laboratório Central de Patologia Veterinária as verbas não se alteraram muito. São sensivelmente idênticas às do ano passado.
O contínuo alargamento de dotações indica o bom desejo de fazer progredir estes serviços, que têm a seu cargo a orientação e superintendência de uma das mais importantes actividades nacionais. Não se pode dizer que tivesse havido progresso sensível, e porventura isso não é da responsabilidade da Direcção Geral. O comércio externo acusa em 1946, e principalmente em 1947, um grande aumento na importação de carnes e lacticínios, e por outras rubricas se notam também fraquezas da economia nacional nesta matéria.

Minas e serviços geológicos

103. Começa a regressar um pouco à actividade de períodos normais o labor deste departamento do Estado,

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que teve de arcar com muito serviço durante a guerra, por virtude da intensificação da indústria mineira.
As suas despesas, incluindo o que se gastou no levantamento da carta geológica, foram em 1946 de 3:086 contos, menos 14 do que no ano anterior.
Podem decompor-se do modo que segue:

Contos

Serviços centrais ............... 2:505
Circunscrição Mineira do Norte .. 296
Serviços geológicos ............. 285
Total ....... 3:086

Em relação a 1938 o aumento foi bastante grande, e deu-se principalmente em "Diversos encargos", por virtude de razões que adiante se indicarão.

Os três anos de 1938, 1945 e 1946, comparados, mostram as verbas seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

A diferença que existe para mais nos encargos refere-se à conta de verbas cobradas de particulares para pagamento de serviços por eles reclamados e de serviços oficiais. Esta verba não era contabilizada em 1938, e por efeito de disposição solicitada pela Direcção Geral passou a ser incluída em receita com contrapartida na despesa.
O aumento mostrado pelas contas não tem, por estes motivos, importância maior, contrastando até, apesar do esforço exigido pela febre mineira do período da guerra, com outras dependências deste Ministério.
Os serviços geológicos gastaram 285 contos e seria vantajoso reforçar a dotação, porque se torna muito importante executar a carta geológica com maior minúcia. Já foram publicadas algumas folhas, mas com a dotação actual os trabalhos prosseguem muito devagar.

Outros serviços

104. A Direcção Geral dos Serviços Eléctricos é um organismo novo neste Ministério. Resultou da transferência para ele das atribuições da Junta de Electrificação Nacional, que funcionava no Ministério das Obras Públicas.
Parece que ainda, não foi definitivamente resolvida esta matéria, que tem hoje profunda influência na vida económica.
A reorganização dos serviços do Ministério, a que se alude atrás e já foi tratada em outros pareceres, há-de levar a isso.
A Direcção Geral dos Serviços Eléctricos gastou 2:150 contos em 1946, dos quais 1:213 em pessoal, 598 em material e 339 em encargos.
O Instituto Português de Combustíveis, por virtude de terem cessado as atribuições que lhe haviam sido distribuídas no período de guerra, diminuiu apreciavelmente a sua despesa.
A Direcção Geral da Indústria, que há muito necessita de ser remodelada, gastou 7:701 contos em 1946, mais 3:116 contos do que em 1938. As dotações decompõem-se assim:

[Ver Tabela na Imagem]

Também aqui se deu grande aumento na verba para pagamento de serviços requeridos por particulares e pagos por eles. Esta verba totalizava 1:637 contos em 1938 e passou para 3:863 contos em 1946, mais 2:226 contos. Como foi de 3:116 contos o acréscimo total entre os dois anos, o desenvolvimento de despesa entre eles limitou-se a menos de 900 contos. A deficiência dos serviços, por motivo de organização e falta de verbas, requer uma reforma completa de todos os organismos relacionados com as indústrias, sobretudo na parte relativa a um inquérito cuidadosamente formulado e executado.

Despesas totais

105. O Ministério da Economia, além das verbas consignadas no orçamento das receitas ordinárias, despende dotações que lhe são adstritas no orçamento das despesas extraordinárias. No conjunto, o total despendido foi:

Contos

Despesas ordinárias .................... 117:421

Despesas extraordinárias:

Povoamento florestal ........... 23:794
Colonização interna ............ 2:277
Fomento de combustíveis ........ 2:652
Fomento mineiro ................ 7:514 36:237
Total ................. 153:658

ou mais 3:719 contos do que em 1945, embora fossem bastante menores as despesas extraordinárias.

MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS E COMUNICAÇÕES

106. Ultrapassou um milhão de contos em 1946 a soma das despesas ordinárias e extraordinárias deste Ministério. Os aumentos deram-se numas e noutras e têm sido graduais. As despesas ordinárias são quase o dobro das de 1938, sem contar com o abono de família e o suplemento de vencimentos, e as extraordinárias são já mais do que o dobro. Os números constam do quadro que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Ver-se-á adiante a origem de tão grandes aumentos e o destino que teve o consumo das elevadas somas que representam um acréscimo de quase 640:000 contos em meia dúzia de anos.
Pode dizer-se que a elevação dos preços de materiais e o nível dos salários concorreram bastante para isso.

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A obra executada custa talvez duas vezes mais do que custava no primeiro ano.
Não transparece das contas se o ritmo do trabalho aumentou, embora haja indícios de que assim seja.
Parece ser possível fazer economias nas despesas administrativas e nos custos das próprias obras, e isso há-de tornar-se necessário em breve por virtude de dificuldades de ordem financeira, como se acentuou noutro passo deste parecer.
Não vale a pena reproduzir agora considerações já feitas sobre a influência do gasto de tão grandes somas de dinheiro na vida financeira do Estado, até na própria vida da moeda. Também se não repetirão as observações anotadas anteriormente sobre a capacidade técnica para a execução de trabalhos, quer no que diz respeito a quantidade de mão-de-obra e pessoal dirigente, quer até no que se refere à existência de materiais e equipamento mecânico. Os meios ao nosso dispor são limitados e é evidente que excessos de construções ou de trabalhos num sector hão-de naturalmente ferir a actividade em outros: ou tornando-os mais caros ou de mais morosa realização. A actividade deste Ministério precisa de ser coordenada e bem ligada a estes dois grandes aspectos da vida portuguesa, que têm reflexos até nos preços e nos salários. Não o tem sido até agora. Quanto à utilidade de muitas obras realizadas - dando à palavra utilidade o sentido económico - falar-se-á com certa largueza ao discutir-se ò destino das verbas. Aliás já em pareceres anteriores o assunto foi largamente debatido.

Despesas ordinárias

107. O quadro que segue mostra as despesas do Ministério das Obras Públicas e Comunicações em 1946, comparadas com o ano anterior e 1938:

[Ver Tabela na Imagem]

Em relação a 1938 o aumento foi de 200:000 contos, números redondos. Tão grande desenvolvimento deu-se sobretudo em edifícios e monumentos. Aqui o acréscimo é de mais de 71:000 contos relativamente a 1938. Aumentos dignos de menção especial tiveram lugar no porto de Lisboa e no Fundo Especial de Caminhos de Ferro, mas nenhuma destas despesas afecta as contas, porquanto têm compensação na receita.
Há a notar que certas dependências, como, por exemplo, a Junta de Electrificação Nacional, foram extintas. As verbas transitaram para outros Ministérios. No caso citado, no da Economia criou-se a Direcção Geral dos Serviços Eléctricos.
Parte dos organismos mencionados no quadro vivem quase exclusivamente de despesas extraordinárias, como a Junta Autónoma de Hidráulica Agrícola; em elevada percentagem isso sucede também aos edifícios e monumentos nacionais e à Junta Autónoma de Estradas.
A constante elevação das despesas deste Ministério justifica-se em parte pelo aumento do custo das obras em materiais. Conviria talvez reduzir a intensidade das construções e ir executando as estritamente necessárias.

Junta Autónoma de Estradas

108. O plano de grande reparação e construção de estradas, por força das receitas de 1 milhão de contos criadas especialmente para esse fim, começou a ter execução em 1946. Foram contabilizados e recebidos pela Junta os primeiros 100:000 contos, e destes gastaram-se 47:000, juntamente com outras verbas, tanto ordinárias como extraordinárias. O conjunto das quantias recebidas pela Junta em 1946 pode discriminar-se assim:

Contos

Despesas ordinárias ....................... 100:000

Despesas extraordinárias:

Estradas da Madeira ................. 2:250
Estradas dos Açores ................. 7:640
Auto-estrada e estrada marginal ..... 1:500
Construção e grande reparação de estradas e pontes ................... 20:000
Construção de estradas e pontes .... 100:000 131:390
Total ........... 231:390

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Não se gastou, porém, tudo o que se recebeu. Conforme o sistema de contabilidade adoptado por este organismo, as dotações recebidas em cada ano são esgotadas na medida da execução dos trabalhos - e assim há ainda em 1946 verbas de dotações de anos anteriores e as recebidas neste ano transitam em parte ou totalmente para os anos seguintes. Em 1946 foram pagos por força de verbas recebidas 71:701 contos, além das despesas ordinárias, pelas quais se pagou mais do que o inscrito.
As verbas pagas foram as que seguem:

Contos

Despesas ordinárias ........... 108:755
Despesas extraordinárias ...... 71:701
Total ............ 180:456

Além de quantias vindas de anos atrasados, a Junta recebeu 231:390 contos em 1946 e pagou 180:456. O saldo, em depósito, constitui o fundo pelo qual se liquidarão no futuro as obras em execução, ou à espera de o serem, referentes aos programas aprovados.
O quadro que segue dá a origem das receitas extraordinárias e dos pagamentos efectuados.

[Ver Tabela na Imagem]

Das dotações para estradas na Madeira e Açores foram entregues 2:100 contos à Junta Autónoma de Ponta Delgada e ficaram consignados à Junta Autónoma de Estradas 5:540 contos. A verba de 2:250 contos foi entregue à Junta do Funchal.

Despesas ordinárias

109. Os pagamentos feitos nesta conta, no total de 108:755 contos, tiveram o seguinte destino:

Contos

Pessoal ................. 29:003
Material ................ 33:310
Construção de estradas .. 573
Construção de pontes .... 60
Reparação de estradas ... 44:807
Reparação de pontes ..... 407
Encargos ................ 595
Total ......... 108:755

Antigamente as contas discriminavam as duas grandes divisões da Junta: a construção e grande reparação e a conservação.
Este método de contabilizar as despesas desapareceu, o que é seguramente um mal.

Despesas extraordinárias

110. No último quadro deram-se os números relativos às verbas recebidas pela Junta em conta de despesas extraordinárias que não correspondem às despesas realmente efectivadas, visto dizerem respeito a obras que só são totalmente liquidadas depois de concluídas. A Junta levantou a verba orçamental de 131:390 contos e pagou apenas 71:701. Logo que se dê a intensificação dos trabalhos do plano de um milhão de contos, serão absorvidos os saldos dos anos anteriores.
A obra das estradas foi durante muito tempo financiada por excessos de receitas ordinárias, como se verificará adiante, mas já houve necessidade de recorrer a empréstimos nos últimos tempos.
Nos números atrás mencionados incluem-se 9:890 contos para estradas na Madeira e Açores recebidos e 1:495 pagos.
Há várias dotações especiais, como a auto-estrada, a estrada marginal, os percursos de turismo, a verba de 20:000 contos (decreto n.º 34:693), as que se referem à estiagem de 1945 e ainda outras. Talvez houvesse vantagem em diminuir o número destas dotações especiais. Aliás, algumas delas devem estar quase extintas.

111. Uma das questões interessantes a tratar na Junta Autónoma de Estradas seria o custo das obras. De algumas se tem dado uma resenha todos os anos, como a auto-estrada e viaduto e a estrada marginal. Em conjunto, gastaram-se nelas, até Dezembro de 1946, 116:209 contos, não incluindo algumas verbas despendidas pelo Fundo de Desemprego. Mas há outras obras importantes, agora em execução, já terminadas, ou ainda em projecto. Procurar-se-á fazer a sua discriminação em próximos pareceres, como tem sido feito na Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais.

Serviços de urbanização

Melhoramentos rurais

112. Era tão angustiosa a situação do País em matéria de comunicações rurais em 1928, quando foram distribuídas as primeiras grandes verbas para estradas e publicado o seu plano geral, mandado elaborar quinze anos antes, que ainda hoje, vinte anos depois, há dezenas de aldeias sem caminhos que permitam o uso de automóvel de carga ou de passageiros, apesar do grande esforço realizado.
A iniciativa de 1931 criando o Fundo de melhoramentos rurais foi um poderoso auxílio à vida do campo, tanto no que se refere a comunicações como a pequenos melhoramentos locais. O decreto há-de ficar na legislação portuguesa como uma medida de grande alcance no desenvolvimento regionalista, não apenas pelos seus fins de interesse material, mas ainda por ter despertado no espírito de populações dormentes uma poderosa reacção de progresso, que transformou pequenas colectividades apáticas, retrógradas e desiludidas em vibrantes centros de cultura e actividade económica dignos de ser apontados e engrandecidos.
Mas, infelizmente, a lei dos melhoramentos rurais não teve o êxito que poderia ter tido. Não foi dotado o seu Fundo com as quantias necessárias. Durante anos e anos destinaram-se-lhe 10:000 contos, e, como toda a gente sabia, esses parcos 10:000 contos eram insuficientes para as profundas e imensas necessidades requeridas pelo País. Tão modesta quantia distribuiu-se por muitos fins: fontes, cemitérios, igrejas, caminhos e outros usos. Cabia uma gota de água no largo mar de necessidades a cada um dos objectivos em vista, e ainda se não compreende bem a causa por que durante uma época tão propícia a obras regionais, por haver abundância de mão-de-obra e outras razões, se não tivesse reforçado convenientemente este Fundo.

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Destinaram-se a idêntico fim verbas do Fundo de Desemprego, mas criaram-se novas aplicações, como a pavimentação de ruas e obras de urbanização nas cidades.
Desde o seu início que estes pareceres clamaram, com muita energia, contra esta diminuta verba de 10:000 contos. E longas páginas se escreveram mostrando as necessidades locais, numa tentativa séria para provar que muitas vezes da construção do pequeno e modesto caminho resultam mais benefícios para a comunidade do que do melhoramento citadino ostentoso, grande consumidor de verbas e adiável sem prejuízos para ninguém a maior parte das vezes.
Houve a esperança de que as queixas e as exigências formuladas nestes pareceres tivessem finalmente sido atendidas quando se elevou a verba de 10:000 contos para 20:000 durante três anos. Mas foi pura e passageira ilusão, porque logo se voltou à verba antiga, aos parcos 10:000 contos dos anos anteriores, e nesta quantia se mantiveram os gastos até ao ano de 1946, agora sujeito a exame e apreciação.
Quem, como o relator destes pareceres, há tantos anos ausculta as contas públicas e desce, com devoção, e aturado esforço, até ao exame das mais variadas verbas orçamentais não compreende esta estranha atitude perante um problema que é dos mais urgentes, dos mais produtivos, dos mais humanos da vida nacional: o da valorização do povo português e sua fixação, tanto quanto possível, em terras provincianas susceptíveis de desenvolvimento económico e social.
O maior valor da terra portuguesa é o seu povo, e é ao trabalho do povo, que vive na província, que a Nação vai buscar grande percentagem dos meios económicos que a sustentam e a tornam entidade viril que construiu novos países e se mantém livre há mais de oito séculos de história. Tudo o que seja valorizar esse povo, dando-lhe cultura e instrumentos que aperfeiçoem e tornem mais suave o seu trabalho e lhe facultem maior rendimento económico, constitui um muito valioso serviço prestado à colectividade, em conjunto.
Muita gente esquece, ou não se quer lembrar, que bastante mais de metade da população portuguesa vive nos pequenos povoados, que o sustento dos oito milhões de habitantes vem de lá e que a maior parte da exportação portuguesa é produzida pelo seu esforço: as cortiças, as resinas, os vinhos e tantos outros produtos enviados para fora do País e depois trocados por cambiais, que poderosamente auxiliam a nossa balança de pagamentos. E ainda é de lá que partem os que no Brasil ou em África formam novos mundos lusitanos e também os que em Lisboa muitas vezes esquecem as suas necessidades, as suas modestas ambições - o pequeno caminho que ligará a aldeia à estrada mais próxima, a fonte imunizada de torrentes, que evitará a contaminação das águas, o rudimentar esgoto, que impedirá os miasmas que sorrateiramente causam as doenças, as dores, as angústias, as perdas de dias e dias de trabalho.
A verba de melhoramentos rurais foi, enfim, reforçada para 30:000 contos em 1946. Mas 30:000 contos em 1946 pouco mais é do que 10:000 contos em 1937. E o mesmo problema subsiste, porventura agravado, porque em dez anos a população aumentou bastante mais do que meio milhão de habitantes.

113. Há freguesias onde ainda não chegou a acção reparadora do Estado Novo e outras onde ela chegou de maneira inconsistente, mais por culpa de falta de coordenação de medidas do que por outro motivo, nalguns casos.
Torna-se por isso necessário que o Ministério das Obras Públicas olhe estes assuntos de maneira prática e construtiva e isso parece estar a ser feito agora.
Reclamou-se aqui por diversas vezes um plano de caminhos e estradas municipais. Devia ser esse plano a base do trabalho dos melhoramentos rurais e o plano rodoviário deveria ter sido, quando publicado, correlacionado com ele.
Poder-se-iam fazer, deste modo, grandes economias, evitar redundância de traçados, e poder-se-ia, também, com o conhecimento exacto das necessidades, estabelecer planos anuais de construção.
Muitas estradas, ou até caminhos vicinais, se deveriam construir em primeiro lugar, por serem mais económicas, com características que permitissem a sua transformação, quando necessário, em estradas nacionais.
Evitar-se-ia esta gravíssima anomalia de não construir agora um caminho vicinal urgente, embora estudado e pronto em parte do seu percurso, porque um dia, e ninguém sabe quando, virá ali a passar uma estrada incluída no plano rodoviário. E como o plano rodoviário está incompleto e mal delineado em muitas regiões, poderá acontecer que na sua indispensável revisão se reconheça ser redundante ou desnecessária a estrada agora classificada, a qual, por esse motivo, virá a desaparecer do plano geral.
Um plano de estradas e caminhos vicinais é, por consequência, necessidade urgente. Já o era há dez anos e cada vez mais o vai sendo. E não se compreendem os motivos que impedem, apesar das instâncias aqui feitas, a execução desse plano. Mas deseja-se ainda, neste aspecto dum problema fundamental, chamar a atenção para o modo de organizar esse plano.
Ele deve ser baseado essencialmente nas necessidades locais, e, por conseguinte, nas informações da gente imparcial que conhece essas necessidades. Os erros cometidos quando se procedeu, à elaboração do plano rodoviário, que deu já lugar a duas publicações no Diário do Governo e possìvelmente dará lugar ainda a. uma terceira, têm de ser evitados neste caso, que é complexo em demasia para ser visto apenas através de vagos elementos ou informações colhidas apressadamente ou de origem incerta.
Todos aqueles que tiverem interesses ligados às vias de comunicação local podem e devem ser ouvidos, por meio de um inquérito, no qual possam depor as juntas provinciais, os municípios e até as próprias juntas de freguesia. São estas entidades, em conjunção com agremiados corporativos da produção - como os grémios da lavoura -, que melhor idoneidade têm para expor as vantagens ou inconvenientes desta ou daquela via.
Todas as informações colhidas, constantes de pequenos relatórios ou até de grosseiros esboços da topografia local, centralizadas numa comissão especialmente nomeada para esse fim, podem ser joeiradas, de modo a obter um plano de caminhos e estradas municipais coordenado com o rodoviário refundido e que seja o seu próprio complemento. Muitas das vias desse plano transformar-se-iam em estradas nacionais, por modificações nos perfis ou alargamentos, quando as necessidades o impusessem.
Esta é uma exigência essencial, e aqui novamente se deixa a sugestão ao Governo, para a pôr em prática com a urgência requerida pelo interesse nacional.
Mas as coisas levam tempo. São morosas, arrastam-se muitas vezes. O plano de estradas municipais anda no ar há largos anos; parece que o dos caminhos vicinais ainda se não iniciou sequer. E a experiência mostra que muitas sugestões aqui feitas só tarde são levadas em linha de conta.
Por isso conviria reforçar grandemente o Fundo de melhoramentos rurais. O parecer das contas do ano passado sugeriu a cifra de 1 milhão de contos em dez anos - 100 mil contos por ano. Se bem aplicada, esta verba, em conjunção, como acima se escreve, com as da

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Junta Autónoma de Estradas, em pouco tempo revolucionaria a vida local. Permitiria, não apenas o desaparecimento em grande número de freguesias das tradicionais fontes de mergulho, que tantos males têm trazido às populações rurais, mas, pode talvez dizer-se com afoiteza, seria também suficiente para ligar a estradas todas as cabeças de freguesia. Auxiliaria profundamente a movimentação económica da actividade local, e muitos produtos que hoje se não aproveitam, por não valer a pena ir vendê-los à cidade ou à vila, ou até à aldeia, escoar-se-iam com maior facilidade.
Há concelhos no País que sofreram grandes transformações pelo simples facto de ter sido construído o caminho vicinal, e quem atentar na vida económica de muitas aldeias de há vinte anos para cá, e se der ao trabalho de compará-la com a de hoje sente, necessàriamente, sem maiores indagações, a influência e a importância do melhoramento que, no intervalo, foi introduzido. É a escura casa agora rebocada e branca, coberta de vermelha telha onde anteriormente havia colmo apenas, a alegrar o verde dos pinhais, com a ferida sangrenta a escorrer a resina valiosa, que outrora se perdia como valor económico. É a rua de novo calcetada, antigamente coberta de mato ou a formar regueiras e barrancos que as enxurradas e as rodas dos carros cavavam cada vez mais fundos. São os produtos locais, os frutos, as castanhas, as madeiras, as nozes, os figos, que secavam, bolorentos, nas arcas ou eram consumidos em estado de putrefacção, muitas vezes pelos poucos animais domésticos. São os instrumentos de lavoura mais aperfeiçoados, o lagar com a prensa hidráulica, onde antigamente existia a pesada e ineficiente vara de sobreiro ou azinheiro. É a maior valia da cortiça, porque paga menor frete, e do carvão vegetal, que pode ser transportado em automóveis de carga. São outras pequenas coisas melhor aproveitadas, que outrora formavam desperdícios valiosos, perdidos na ignorância ou insuficiência de uma actividade estagnada, sem incentivos, a usar os mesmos processos de trabalho, os mesmos costumes, rotineira, atrasada de séculos.

114. As verbas utilizadas pelos serviços provêm do Fundo de Desemprego e de dotações inscritas no Orçamento Geral do Estado, nos dois capítulos das receitas ordinárias e extraordinárias.
Dividem-se por melhoramentos urbanos e melhoramentos rurais. As quantias concedidas para os primeiros tom sido bem maiores que para os segundos, um pouco por esta tendência local de embelezar as cidades e porque na verdade eram bem atrasadas as condições em que viviam muitas delas em matéria de arruamentos, higiene e abastecimento de águas.
As verbas gastas em 1946 foram as seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

O trabalho que esta Direcção Geral está a levar a efeito, se continuar no ritmo previsto para os próximos anos há-de naturalmente produzir os seus resultados. Mas já noutro lugar deste e de outros pareceres se acentuou que ele precisa de ser completado por medidas tendentes a defender as obras que se executam, como nos casos das fontes. Os serviços de saúde têm por isso de aproveitar o esforço realizado e publicar disposições com essa finalidade porque de contrário é em pura perda o dinheiro gasto.
A verba de 83:461 contos foi distribuída por todo o País do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

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A verba dos melhoramentos rurais

115. Nota-se que a verba orçamental do Fundo de melhoramentos rurais ainda é muito baixa. Apenas 19:108 contos, num total gasto de 83:461.
Quando se considera o facto de que esta dotação tem de financiar os caminhos vicinais e estradas municipais, as fontes dos pequenos povoados, incluindo as cabeças de freguesia, os pavimentos dos aglomerados rurais e outras pequenas coisas de interesse local, vê-se logo que ela necessita de ser muito reforçada para poder ser atingido o fim em vista. Ela foi acrescida com 45:010 contos, provenientes do Fundo de Desemprego, mas uma grande parto desta verba destina-se a melhoramentos urbanos.
Já se acentuou atrás a necessidade de intensificar os trabalhos tendentes a acelerar ràpidamente as vias de comunicação rústicas, e por isso espera-se que para eles sejam desviados maiores quantitativos nos próximos anos.

116. A fim de dar melhor ideia da distribuição das verbas, indicam-se a seguir as comparticipações de obras autorizadas em 1940 e 1946, com a identificação dos fins a que se destinam.

Comparticipações concedidas segando os fins a que se destinam

(Contos)

[Ver Tabela na Imagem]

Sumário

[Ver Tabela na Imagem]

O reparo que ocorre logo ao examinar as cifras é a grande desproporção entre o que se destina a melhoramentos urbanos e rurais. Enquanto que nos primeiros as comparticipações em 1946 se elevaram a 77:864 contos, não incluindo as verbas de abastecimento de águas e saneamento, as dos melhoramentos rurais não chegaram a 28:000.
Não se desconhecem as necessidades dos centros urbanos. No entanto continua a manter-se o ponto de vista, confirmado aliás pela experiência e pelos índices económicos, de que fixar a população nos campos é uma das exigências dó momento actual.
E um dos factores que para isso concorrem é a execução de certo número de melhoramentos que tornem menos dura e mais remuneradora a vida dos que por lá habitam.
O aumento para 75 por cento na percentagem destinada a caminhos vicinais e estradas municipais e o abandono da concessão de subsídios por conta-gotas trouxeram certo incremento na execução das obras, e outro tanto acontecerá no abastecimento de águas, que, por medida recente, como preconizado no parecer de 1944, vai usufruir de idêntica percentagem. Torna-se necessário que os 75 por cento se apliquem também a calçadas, exgotos e outras obras de saneamento.
De outro modo não será possível realizar essas obras porque os recursos dos pequenos concelhos rurais são muito limitados.
A conservação das obras, tais como caminhos vicinais e estradas municipais, é outro ponto importante e já foi apontado em pareceres anteriores. As autarquias locais descuram-no por falta de verbas. Por virtude das recentes estiagens foram distribuídos subsídios a diversas entidades, utilizados na conservação de caminhos. Nalguns locais, embora em quantia diminuta, melhoraram muito as obras anteriormente comparticipadas. Poderiam ser distribuídos sem necessidade de projectos, apenas sob a fiscalização dos representantes da Direcção Geral no distrito.

117. Neste aspecto dos melhoramentos rurais ainda há uma obra interessante a completar, que terá de levar seu tempo, mas é prometedora de grandes dividendos.
O atraso do País era bastante grande e em matéria de salubridade e abastecimento de águas o que existia nas aldeias e pequenos povoados era muito pouco. Já vão desaparecendo os casos mais graves, mas o que resta fazer é ainda muito.
Repete-se este ano a sugestão do ano passado de reforço de verbas para melhoramentos rurais, destinadas ùnicamente a fontes, salubridade, caminhos vicinais e melhorias na habitação rural.
Haverá que delinear para isso um plano geral. A possibilidade de considerar freguesias ou regiões de uma só vez tem a vantagem da economia. É dispendioso, por exemplo, o envio de um técnico para estudar o abastecimento de água de uma fonte num lugar de poucos habitantes - mas se forem considerados numa freguesia os povoados que a compõem, que podem ser 10, 12, 15 ou mais, o mesmo técnico pode tratar de todos de uma só vez. Neste assunto há ainda que cuidar das zonas de

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protecção às fontes, e já o ano passado, quando se discutiu a despesa da saúde pública, este problema foi levantado.
As zonas de protecção são indispensáveis na maior parte dos casos. Sem elas as obras efectuadas perdem muito do seu valor.

Serviços de viação

118. Subiu para 8:841 contos em 1946 a despesa dos serviços de viação. Eram 4:155 contos em 1938, mas o desenvolvimento do trânsito obrigou a grande reforço das verbas. Os números para os dois anos são os que seguem:

[Ver Tabela na Imagem]

Nos serviços de viação o aumento deu-se sobretudo nas despesas de pessoal, na parte relativa à fiscalização. Os aumentos no material resultam das verbas destinadas ao pagamento de gasolina, óleos, acessórios, sobresselentes e outras desposas dos veículos usados na fiscalização. Foram mais de 3:500 contos para estes fins. As verbas desta Direcção Geral, apesar do aumento assinalado e tendo em conta o preço dos materiais e combustíveis e o reforço da fiscalização, parecem mostrar-se dentro dos limites normais.

Caminhos de ferro

119. As receitas do Fundo Especial de Caminhos de Ferro subiram muito durante a guerra. Atingiram 69:321 contos em 1946, contra 27:325 em 1938. A razão deste grande acréscimo proveio exclusivamente do aumento considerável do tráfego, porque elas são constituídas pelo produto de uma taxa aplicada sobre as receitas das diversas empresas ferroviárias.
Houve ainda um aumento, em comparação com 1945, de 14:245 contos, o que é muito importante.
A receita de 1946 é idêntica à de 1944, embora as cifras que a compõem divirjam em significado, como é fácil de ver nos números que seguem, em contos:

[Ver Tabela na Imagem]

O exame mais minucioso das verbas mostra que o aumentou de receita em 1946 não derivou de grandes melhorias no tráfego, nem, consequentemente, das receitas das empresas. Deve buscar-se a razão nos atrasos de liquidações, às vezes inevitáveis. Comparando as liquidações com as cobranças nos dois últimos anos, nota-se que no caso de uma companhia ferroviária o atraso na cobrança em 1945 foi de mais de 11:000 contos, enquanto que em referência à mesma entidade a cobrança excedeu a liquidação por quantia superior a 1:850 contos em 1946. Isto quer dizer que neste ano não se cobrou o liquidado com parte do que faltara receber no ano anterior.
Os números relativos a liquidação e cobrança em 1946 são os que seguem:

[Ver Tabela na Imagem]

120. O movimento de passageiros em toda a rede ferroviária atingiu 49.749:996 em 1946, que produziram a receita de 271.824:900 contos. As mercadorias que circularam, em grande e pequena velocidades, subiram a 5.692:800 toneladas, com a receita de 476:750 contos.
Convém aproximar o rendimento do Fundo Especial de Caminhos de Ferro em 1946 do de anos anteriores, para verificar a sua evolução. Há-de notar-se que faltam menos de umas dezenas dê milhares de contos para ser três vezes maior. Isto significa ter o tráfego aumentado muito.

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A evolução do imposto ferroviário é dada no quadro que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

O problema dos caminhos de ferro é, em grande parte, um problema de tráfego. Os números atrás transcritos são parcialmente proporcionais ao tráfego.

Despesas

121. Além de pagar os encargos da Direcção Geral de Caminhos de Ferro, o Fundo Especial financia aperfeiçoamentos e reparações nas linhas do Estado e ajuda a construção de novas vias. Em 1946, comparado com o ano anterior, gastaram-se as verbas que seguem:

[Ver Tabela na Imagem]

Nota-se ter aumentado muito a despesa relativa, a material, que é a que mais interessa no ponto de vista económico.

Material

122. Para ter ideia do modo como se gastaram as verbas de material, publica-se a seguir um mapa que as discrimina:

Contos

Estudos ....................... 72
Construções ................... 698
Material circulante ........... 1:076
Material em depósito .......... 24
Oficinas do Barreiro .......... 114
Obras complementares ..........16:038
Estradas de acesso ............ 109
Obras na linha do Norte ....... 2
Obras na linha de Cascais ..... 442
Obras na Beira Alta ........... 100
19:175
Pagamento de material
circulante ....................33:995
53:170
Outras despesas de material ... 1:150
Total ..............54:320

As duas quantias mais importantes dizem respeito a obras complementares e a compra de material circulante.
As obras complementares, em que se despenderam este ano 16:038 contos e no de 1945 16:118, compreendem grande número de trabalhos. Os mais importantes tiveram lugar na linha do Douro (5:939 contos), na do Minho (1:336 contos), na do Sul (5:406 contos) e na de Évora (856 contos). O resto distribui-se por diversas verbas em várias linhas.
Não tem sido possível fazer a obra de renovação de carris, muito necessitada, em parte porque há dificuldades na aquisição de material.
A outra verba importante é a de 33:995 contos e utilizou-se na compra de material circulante. Pode discriminar-se do modo seguinte:

Contos

Compra de 18 automotoras .................... 20:094
Compra de 580 vagões e 40 vagões-cisternas .. 13:445
Diversas despesas ........................... 456
Total ..................... 33:995

Se as receitas se mantiverem parece ser possível ir dotando, por intermédio deste Fundo, os Caminhos de Ferro do Estado de meios de reduzir o preço de custo do frete e assim influenciar a exploração. Já há bastante tempo que se aludiu- nestes pareceres à necessidade de utilizar automotoras e tractores. Espera-se que dentro em pouco as restantes entidades ferroviárias consigam melhorar os seus coeficientes de exploração. Já foi adquirido material para esse fim, que deverá estar em circulação em breve.

Empréstimos e garantias de juros

123. A situação financeira do Fundo Especial de Caminhos de Ferro progrediu bastante no período da guerra, por virtude do aumento das suas receitas. Os encargos reduzem-se hoje a 11:956 contos e neles pesam as linhas da Senhora da Hora e da Boavista à Trindade, com 2:851 contos. O resto diz respeito ao débito ao Estado, que está a ser amortizado. O quadro seguinte exprime, em resumo, os encargos que sobrecarregam o Fundo Especial de Caminhos de Ferro por empréstimos e garantias de juro:

[Ver Tabela na Imagem]

A situação relativamente desafogada em que se encontra o Fundo Especial de Caminhos de Ferro é devida em

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grande parte ao aumento do tráfego, que se acentuou em 1946, mas tende a diminuir. O ano de 1947 deve já possìvelmente acusar uma diminuição.
Os caminhos de ferro hão-de necessitar do consumo de elevadas quantias nos anos mais próximos, tanto para compra de material circulante como fixo, e já no presente momento, conforme as possibilidades, se estão gastando verbas importantes com esse objectivo.

Edifícios e monumentos nacionais

124. Não é fácil, como já se disse noutro lugar, fazer uma estimativa do conjunto da despesa do Estado em matéria de edifícios e monumentos, porque alguns deles têm verbas inscritas em diversos capítulos orçamentais. Excluindo obras que no ano passado faziam parte do quadro que pretendia determinar o total da despesa, pode esta apresentar-se para os dois últimos anos do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

A diferença para mais notada nas despesas ordinárias provém em grande parte de maior dispêndio em casas económicas, que é reembolsável pelo menos em parte.
Nas despesas extraordinárias deu-se grande incremento ao plano das escolas primárias, nos hospitais escolares e em outras obras de onde também derivou aumento na despesa.
É evidente que não se oporiam objecções ao acréscimo no ritmo da construção de edifícios se não fossem as circunstâncias do actual momento, à parte o que já em outros pareceres se escreveu sobre a necessidade de reforçar, na medida do possível, as verbas destinadas a fins reprodutivos. Parece à primeira vista também que, neste capítulo, o Estado deve preocupar-se especialmente com a instalação dos serviços e sua concentração, como está a ser feito com o caso do edifício para o Ministério das Finanças, que deveria tornar-se extensivo a outros já apontados. Sabe-se existir uma perniciosa e cara dispersão de repartições na capital do País e em outras cidades. O sistema de alugar prédios para instalar organismos públicos, com as sucessivas adaptações que é mister fazer-lhes, não deve continuar. Além de nunca poder ser obtida instalação conveniente, rouba muito espaço habitável, numa cidade onde o problema da habitação se põe com agudeza. Os inconvenientes para os serviços e para o público são tão patentes e claros que é desnecessário acentuá-los.
A impressão que fica do exame das contas leva a aconselhar que se afrouxe o ritmo de algumas das obras e o delineamento de um plano cuidadoso que atenda à grande dispersão que hoje se nota. O assunto foi já estudado noutros pareceres.

Despesas ordinárias

125. As despesas ordinárias em 1946 totalizaram 100:049 contos, assim repartidos:

[Ver Tabela na Imagem]

Há que fazer certas observações, sobretudo quando se pretender comparar as verbas dos dois anos mencionados.
A verba de pessoal manteve-se. A do material subiu bastante, por virtude das importâncias gastas em construções, reparações e conservação. É nestas rubricas que se deu o grande aumento.
Em casas económicas também houve grande diferença para mais, mas, como se disse atrás, a quase totalidade das quantias investidas é reembolsável.
Estudam-se a seguir as diversas despesas.

Estudos e projectos

126. Há duas verbas de estudos e projectos. Uma diz respeito a novas construções, outra refere-se a estudos de projectos de grandes reparações de edifícios. Pela primeira gastaram-se 190 contos e 200 por força da segunda.
Vejamos o caso da primeira. Nela as verbas distribuíram-se como segue:

Contos

Ampliação da Estação Agronómica Nacional ....... 30
Novos edifícios para a reitoria e Faculdades
de Letras e de Direito de Lisboa ............... 50
Plano de melhoramentos do Hospital de S. José .. 37
Estação de rádio da ilha das Flores ............ 39
Edifício do Instituto Industrial de Lisboa ..... l5
Outros estudos ................................. 19
Total .......................... 190

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É de notar que a Estação Agronómica Nacional se acabou de construir há poucos anos, e já se iniciaram estudos para sua ampliação, que importaram no conjunto em 63 contos. Quando se constrói um edifício deve prever-se o seu futuro. É sempre mais caro e menos eficaz ampliá-los.

127. No segundo caso - estudos de grandes reparações de edifícios - a verba gasta foi de 200 contos, assim dividida:

Contos

Edifício do Torel ........... 23
Estação Agronómica Nacional . 33
Sanatório de Carcavelos ..... 12
Obras complementares da Casa da Moeda .................... 75
Diversos .................... 57
Total ............. 200

Além destas verbas para estudos, ainda pelas diversas comissões de obras se aplicam outras com a mesma finalidade. O assunto precisa de ser visto em conjunto, de modo a reduzir na medida do possível o custo das obras.

Novas construções

128. A Conta Geral do Estado indica que pelo capitulo 3.º, artigo 62.º, n.º 2), se gastaram 11:862 contos. A discriminação desta importância, pode exprimir-se do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Nos edifícios da guarda fiscal incluem-se trabalhos em Elvas (244 contos); S. Gregório (161 contos); Bruço (68 contos); Ribamar (40 contos), e em muitos outros pontos fronteiriços, tudo no total de 725 contos, e que compreendem 93 para estudos, administração e fiscalização. Esta última cifra parece ser exagerada.
Nos edifícios da guarda nacional republicana e da policia de segurança pública a despesa foi de 625 contos, utilizados no Porto (45 contos); Ajuda (59 contos); Castanheira do Ribatejo (nesta última é um posto de sete praças) (451 contos), e estudos, administração e fiscalização (70 contos). Também esta verba parece exagerada.
Na construção do Sanatório D. Manuel II gastaram-se neste ano 3:593 contos. Haviam-se despendido o ano passado 2:222.
Continuaram os trabalhos da Estação de Lacticínios de Paços de Ferreira, do Laboratório Químico Central, da Estação de Fomento Pecuário de Lisboa, da Estação Zootécnica Nacional e de postos fixos de fiscalização de trânsito nas estradas.
Conviria acelerar os trabalhos das obras que levam anos a acabar.
Nos edifícios das alfândegas a despesa foi de 697 contos. As mais importantes tiveram lugar em S. Roque de Pinho (280 contos); Vila Verde da Raia (105 contos); S. Gregório (78 contos). As despesas de fiscalização, administração e estudos subiram a 103 contos.
Ainda se despenderam este ano mais 100 contos no Ministério da Educação Nacional.
Uma das verbas mais importantes diz respeito às obras do Ministério da Marinha, nas quais se gastaram 2:085 contos. As de mais vulto referem-se aos quartéis do Alfeite (152 contos); de Vila Franca de Xira (842 contos); de S. Jacinto (168 contos); ao farol de Esteiro (129 contos); ao farol da parte norte da ilha do Pico (425 contos). As outras são de menor importância.
Nos Hospitais Civis de Lisboa gastaram-se 1:286 contos, dos quais 34 em Santa Harta, 1:219 em S. José e 33 em Santo António dos Capuchos. Em várias outras construções no País utilizaram-se 880 contos, dentro dos quais se inclui a Coudelaria de Alter, com 220 contos, o Observatório Astronómico do Porto, com 216, o Meteorológico do Funchal, com 91 contos, o Posto Agrário de Sotavento, com 37, o Sanatório de Carcavelos, com 39, e o Tribunal da Boa-Hora, com 272.

129. As diversas comissões que trabalham nas obras dos organismos em novas construções despenderam as importâncias seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

Subiram a 30:940 contos as verbas que se incluem no quadro. Convém dar um resumo do labor de cada uma das comissões.

Correios, telégrafos e telefones

130. A verba de 13:394 contos diz respeito a grande número de obras discriminadas no capítulo relativo aos serviços e enviados por eles próprios na parte referente à execução da lei n.º 1:959, no total de 8:243 contos. Mas por outras verbas se financiaram também edifícios para correios, telégrafos e telefones. De conta de receitas destes organismos despenderam-se mais 4:960 contos.
Há casos em que o mesmo edifício é financiado por dois lados. Assim, no de Macedo de Cavaleiros, no ano de 1946, gastaram-se 124 contos por força da lei n.º 1:959 e 11 contos por outras receitas. No de Mogadouro deu-se coisa idêntica: 150 contos e 18 contos, respectivamente.
As verbas mais importantes despendidas por força das receitas gerais dos correios, telégrafos e telefones foram: Castro Verde, 394 contos; central telefónica de Lisboa, 330 contos; Ferreira do Alentejo, 296 contos ; Horta, 363 contos; Leiria, 153 contos; Moncorvo, 379 contos; Oliveira do Hospital, 289 contos; Pombal, 366 contos; Restauradores, 668 contos; Santa Comba Dão, 128 contos; Silves, 473 contos; Tortosendo, 343 contos, e Vila Real, 107 contos. As demais verbas são menores.

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Conviria que a Administração Geral preparasse os elementos que permitissem determinar com exactidão o custo dos edifícios até, por exemplo, 31 de Dezembro de 1947, incluindo todas as despesas, por força da lei n.º 1:959, e as receitas de outra origem, como estudos, fiscalização e administração, para serem publicados no próximo parecer.

Porto de Lisboa

131. O total do custo das obras para este organismo, em 1946, elevou-se a 4:699 contos e vem discriminado no quadro seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência

132. Não tem tido grande actividade a comissão que trata dos edifícios deste organismo. Em 1946 gastou 4:368 contos na rubrica de obras novas, dos quais 589 em despesas de administração e fiscalização.
Os trabalhos principais tiveram lugar em Arcos de Valdevez (100 contos); Amarante (384 contos); Figueira da Foz (450 contos); Horta (177 contos); Leiria (541 contos); Peso da Régua (186 contos); Porto (735 contos); Santarém (215 contos): Santa Comba Dão (168 contos); Tondela (213 contos) e Viana do Castelo (307 contos). Também houve trabalhos em Águeda, Anadia, Aveiro, Bragança, Coimbra, Chaves, Covilhã, Faro, Lamego, Loulé, Ponte de Lima, Setúbal, Valença, Torres Novas, Vila Franca de Xira e outros. Algumas verbas são muito pequenas.
Igualmente se procurará dar, em próximo relatório, o custo final das obras a cargo da comissão encarregada das construções para este estabelecimento do Estado.

Serviços florestais

133. Para os serviços florestais executaram-se obras nas Administrações da Lousa (19 contos) e Bragança (428 contos), no total de 447 contos.

Ministério da Marinha

134. Ainda por este artigo orçamental se construíram edifícios na Escola da Aviação Naval (S. Jacinto) (612 contos), na do Alfeite (228 contos), na Estação Radio-goniométrica de Apúlia (1:406 contos), no Corpo de Marinheiros do Alfeite (945 contos), na Escola de Mecânicos de Vila Franca de Xira (4:051 contos). Estas últimas consistiram num posto hospitalar e nos arranjos da cozinha, padaria e depósitos. Diversas obras no Ministério da Marinha importaram em 152 contos. Ao todo, despenderam-se nestes trabalhos 7:394 contos.

Despesas de conservação

135. A despesa total gasta por esta rubrica anda à roda de 28:500 contos, excluindo 200 contos para estudos. As verbas, agrupadas, podem dispor-se do modo que segue:

Contos

Monumentos nacionais .................... 1:500
Edifícios e instalações do Ministério
da Guerra ............................... 3:222
Edifícios e instalações do Ministério
da Marinha .............................. 2:241
Edifícios da guarda fiscal .............. 460
Edifícios da guarda nacional republicana 1:024
Edifícios das alfândegas ................ 548
Construções prisionais .................. 271
Hospitais Civis ......................... 201
Paços do Duque de Bragança .............. 500
Universidade de Coimbra ................. 100
Palácios nacionais ...................... 1:000
Liceus .................................. 997
Palácio Foz ............................. 3:543
Sanatório de Outão ...................... 500
Instituto de Regeneração de Menores ..... 154
Diversos edifícios ...................... 8:174
Bairro operário do Alfeite .............. 302
Convento de S. Marcos, Coimbra .......... 185
Conservação de edifícios dos correios,
telégrafos e telefones .................. 2:226
Conservação de edifícios da Caixa Geral
de Depósitos, Crédito e Previdência ..... 655
Conservação de edifícios do porto
de Lisboa ............................... 637
Total ...................... 28:440

A despesa de conservação de diversos edifícios inclui muitas obras, algumas já dotadas em gerências anteriores. Nelas se englobam escolas de vários graus, Faculdades, museus, tutorias, recolhimentos, tribunais, entre eles o da Boa-Hora, com 334 contos.
A obra mais importante nos correios, telégrafos e telefones, por esta rubrica, teve lugar nas encomendas postais do Porto (933 contos). Os gastos de maior relevo nos edifícios da Caixa Geral foram em Vila Nova de Gaia e Setúbal. E no porto de Lisboa os serviços de engenharia sofreram arranjos, no total de 500 contos.

Despesas extraordinárias

136. Noutro lugar se dão maiores explicações acerca das despesas extraordinárias em matéria de edifícios. Apenas se mencionarão aqui as mais importantes.
Em novos edifícios para escolas primárias (Plano dos Centenários) gastaram-se 36:815 contos.
A ala oriental da Praça do Comércio continua a consumir importantes verbas. Este ano subiram a 9:144 contos e no Manicómio de Lisboa e Colónia para Alienados de Coimbra despenderam-se 461 contos. O mobiliário, roupas e utensílios para equipamento do Manicómio (995 contos), Colónia para Alienados (1:397 contos), Ministério da Educação Nacional (250 contos), outros edifícios (1:749 contos) e sanatórios do Porto e Viseu (2:080 contos) custaram, em 1946, cerca de 6:471 contos.

Construções prisionais

137. Em 1946 as obras do plano das construções prisionais, financiadas por despesas extraordinárias, importaram em 20:159 contos, assim aplicados:

Contos

Administração ............. 1:499
Mobiliário ................ 1:105
A transportar ............. 2:604

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[Ver Tabela na Imagem]

Custo das obras

138. Deve atender-se que parte das obras executadas por este organismo, ou pelas diversas comissões que nele ou em contacto com ele vivem, foram iniciadas em períodos anteriores à guerra, ou no seu começo, e que por consequência têm significado diferente as importâncias despendidas em cada ano. À medida que terminam as obras mais importantes fecham-se as contas e dá-se o seu custo total. Das obras de maior vulto em curso, o total gasto até agora consta do quadro que segue, em contos:

[Ver Tabela na Imagem]

Nos hospitais escolares já se haviam despendido, até 31 de Dezembro de 1946, cerca de 113:000 contos. No Palácio Foz as obras, até à mesma data, importaram em 12:268 contos, o que, na verdade, dá lugar a reparos, por ser exagerada a verba. Noutras, como o Estádio Nacional, a Base Naval de Lisboa e a Cidade Universitária de Coimbra, a que se alude noutro lugar, ainda será preciso despender verbas, bastante volumosas para as acabar.
Conviria restringir, pelo menos nos tempos mais próximos, o início de novos edifícios ou obras que por sua natureza não sejam de imediata necessidade.

Outros serviços

139. Todos os anos se costuma fazer referências especiais com certa minúcia aos serviços hidráulicos, que englobam órgãos importantes, como os portos, e cuidam dos rios.
Não foi possível mencioná-los com o pormenor preciso, por não terem chegado a tempo os elementos necessários.
A Administração do Porto de Leixões teve a despesa de 12:162 contos, compensada na receita. A verba mais elevada foi a de material, onde se gastaram 7:581 contos. À de pessoal corresponderam 2:517 contos.
Nos levantamentos topográficos de cidades, vilas e outras localidades gastaram-se 2:216 contos. Esta despesa tem contrapartida em receitas e entregas ao Estado pelas respectivas câmaras municipais e é contabilizada em reembolsos e reposições. Cornaria rever a matéria legal sobre este assunto, dadas as dificuldades que algumas câmaras têm em liquidar o que lhes cabe.
O Gabinete do Plano de Urbanização da Costa do Sol gastou 485 contos em 1946, dos quais 395 se referem a pessoal e o restante à execução de obras e melhoramentos diversos.
A Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola foi dotada com a verba de 901 contos, dos quais se pagaram 734. Mas este organismo tem a sua principal fonte de receitas no capítulo das extraordinárias.
Ainda não pode fazer-se este ano o estudo minucioso das suas actividades.
O Gabinete Técnico dos Aeródromos Civis, recentemente criado, despendeu 858 contos em 1946, dos quais 562 em pessoal, 189 em material e 108 em encargos.
Como nota final deve dizer-se que muitas dotações aparecem em quantias globais na Conta Geral do Estado, e o modo como se apresentam nada ou pouco significa para quem quiser entender os custos. Todos os anos os pareceres tentam esmiuçar as contas e o País, através deles, sabe como se gastam as verbas, em que obras se utilizam e quanto custa cada uma. Só deste modo é possível ajuizar da utilidade do seu emprego. Embora não seja ainda perfeita a fiscalização que por este modo se

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pode exercer sobre a actividade do Estado, ele representa um passo no bom caminho.
Uma remodelação dos serviços do Ministério das Obras Públicas há-de naturalmente estabelecer a fiscalização técnica das obras executadas por todos os seus sectores. Essa fiscalização exerceu-se noutros tempos por intermédio do Conselho Superior de Obras Públicas, mas desapareceu, e pode dizer-se que hoje a acção das variadas entidades oficiais não é convenientemente fiscalizada.
A enorme actividade desenvolvida por este Ministério, que se traduz no dispêndio de somas imensas, em relação aos meios financeiros de que dispõe o País, requer cuidadoso estudo dos projectos de obras e da sua execução, não apenas no ponto de vista técnico, mas também nas repercussões económicas e sociais que possam vir a ter. Até hoje não existe a coordenação necessária nem a fiscalização indispensável dos organismos que têm a seu cargo esses trabalhos.
Seria vantajoso estudar cuidadosamente este assunto de modo a obter para ele uma solução satisfatória.
Este princípio não se aplica apenas ao Ministério das Obras Públicas, como se deduz de considerações feitas em outros pontos deste parecer. Mas ele resulta mais claramente da obra que por eles e realiza, que é das mais importantes na vida económica do País.

Porto de Lisboa

140. Já em dois anos se fizeram largas referências a este departamento do Estado, que desempenha na vida económica uma alta função. Através do porto de Lisboa passa uma grande percentagem do comércio externo português, e a maior parte das comunicações nacionais com o estrangeiro e domínios de além-mar faz-se ainda hoje, não obstante o desenvolvimento da aviação, pelos cais de Lisboa.
Tem sido preconizado há muito tempo, como condição fundamental para a eficiência dos serviços do porto de Lisboa, o seu equipamento mecânico, tão completo quanto possível. E idênticas recomendações foram feitas pela Câmara Corporativa quando foi consultada sobre uma proposta de lei apresentada à Assembleia Nacional e mais tarde convertida em decreto, sem que por este alto corpo legislativo houvesse sido aprovada, como seria vantajoso.
Possìvelmente essa proposta haveria de sofrer as alterações de que necessitava e que reduziriam o programa nela estabelecido no que diz respeito a obras a executar, algumas das quais não são de urgência nem de utilidade imediata. E talvez se viesse a impedir o erro da iniciativa de construir uma doca de pesca no Bom Sucesso, adiando deste modo a construção de um bom porto de pesca em lugar conveniente, o qual, apesar dos grandes capitais consumidos em obras no porto, continuará a ser uma vaga aspiração nos anos mais próximos.
O assunto já foi debatido com largueza em pareceres anteriores 1 e num longo relatório da Câmara Corporativa 2 se discutiu também. Mas nem o que neles se escreveu nem o que se discutiu na Câmara Corporativa teve eco na opinião do Governo. Parece que irá consumar-se o facto. O porto de pesca, tão necessário, será ainda adiado e em sua substituição serão despendidas bastantes dezenas de milhares de contos em sítio impróprio e que não ajudarão a resolver o problema do porto de pesca, antes irão afectar desfavoràvelmente um local que é a entrada da zona de turismo mais conhecida.
Ao menos não se poderá dizer no futuro que o problema e o erro da solução que se adopta não tenham sido vistos pela Assembleia Nacional e pela Câmara Corporativa.

141. É preciso continuar a afirmar-se nestes relatórios que a questão das receitas é muito importante. Os serviços autónomos ou semiautónomos que vivem de receitas próprias e contraem responsabilidades por elevados empréstimos no Tesouro não podem e não devem esquecer que é necessário despender essas somas nas obras de maior reprodutividade. Os programas de melhoramentos têm de adaptar-se a esta ideia fundamental, porque as receitas, sobretudo no momento presente, não são elásticas. E, embora na aparência elas cresçam, é indispensável determinar, para lá do acréscimo, as consequências que advêm para a economia do País.
É fácil aumentar as receitas pelo lançamento de novos impostos ou taxas, mas as consequências que dai resultam podem ser graves e ir de encontro aos fundamentos da economia e até do próprio nível de vida. Mas as receitas que provêm de economias nos serviços, sobretudo no seu rendimento, não trazem, como as primeiras, esses inconvenientes. O complemento da 1.ª secção, as obras necessárias ao aproveitamento comercial de aterros já concluídos para lá de Santa Apolónia e o porto de pesca são obras essenciais. O equipamento mecânico, bem conduzido, é de tudo o mais urgente no porto.
Era por aí que se devia começar, e deixar para melhor oportunidade as docas desportivas e as obras de aeroportos marítimos, que, por agora, têm pouco interesse.

Receitas

142. As receitas do porto de Lisboa provêm de muitas origens. O seu aumento ou diminuição pode derivar de vários factores, entre os quais avultam o uso em maior ou menor grau das instalações do porto e o custo dos serviços prestados. Em 1946 as receitas ordinárias atingiram 74:098 contos, bastante mais do dobro das recebidas em 1938. As extraordinárias, constituídas em grande parte por empréstimos, cifraram-se em 15:890 contos. O quadro seguinte mostra a origem das receitas:

[Ver Quadro na Imagem]

1 Parecer das Contas Gerais do Estado, 1945, p. 151 (separata). Idem, 1939, p. 120 (separata).
2 Vide suplemento ao n.º 54 do Diário das Sessões de 22 de Março de 1946 (Parecer da Câmara Corporativa sobre a proposta de lei n.º 69, pp. 938-(13) e 938-(14).

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[Ver Quadro na Imagem]

A rubrica que ainda não alcançou a receita de 1938 é a que se refere ao estacionamento de navios, que rendeu menos 129 contos. Mas já houve melhoria apreciável nesta verba quando se compara com 1945.
No resto, o aumento de receita foi muito grande. Atingiu mais de 42:800 contos nas ordinárias em relação ao último ano de guerra, e, se forem consideradas as extraordinárias, com exclusão de empréstimos, ainda elas subiram bastante.
O rendimento dos entrepostos tem-se desenvolvido gradualmente, e, por si só, quase se avizinha do total das receitas ordinárias de 1938.
Mas as verbas cobradas na utilização dos cais, na acostagem, na renda das oficinas e noutras operações ou fontes de receitas também foram apreciàvelmente maiores, até em referência a 1945.
Desta maneira a Administração tem conseguido enfrentar o inevitável aumento de despesas, proveniente de mão-de-obra e de materiais e combustíveis, bem mais caros.
Em grande parte o acréscimo de receitas provém do aumento de taxas e outras imposições - e este assunto necessita de ser cuidadosamente considerado.

143. As receitas extraordinárias, ou contabilizadas como extraordinárias, são as que seguem:

Contos

Plano de melhoramentos ........ 5:671
Fundo de melhoramentos ........ 3:500
Fundo de seguros .............. 531
Aeroporto de Lisboa ........... 6:134
Diversas ...................... 53
Total ............... 15:889

Destas receitas, parte vem de empréstimos. Em 1946 contabilizaram-se 11:805 contos. Pode dizer-se que o resto tem carácter de receita ordinária. Os empréstimos gastaram-se em obras adiante mencionadas.

Despesas

144. As despesas atingiram 77:333 contos, mais o que se gastou nas obras marítimas e terrestres, no apetrechamento portuário e no Aeroporto Marítimo de Lisboa.
Podem discriminar-se do modo seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

A verba total é mais do que o dobro da de 1938 e é cerca de 1:000 contos maior do que a de 1945. Mas quanto a este último ano a diferença está toda na verba de material, e ver-se-á adiante que isso derivou de se não terem contabilizado nos números do ano passado as somas relativas ao Aeroporto Marítimo de Lisboa. Se assim não fora a verba seria maior.
Juntando às despesas acima mencionadas as que se efectuaram ao abrigo do plano de melhoramentos, obtém-se o total da despesa, que é inferior ao da receita:

Contos

Despesas ordinárias ............ 77:333
Plano de melhoramentos:

Obras marítimas e terrestres ... 5:053
Apetrechamento portuário ....... 118
Aeroporto Marítimo de Lisboa ... 6:134
Total ....... 89:138

Material

145. Os 22:430 contos despendidos em material tiveram a utilização que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

Em equipamento, por despesas extraordinárias despenderam-se 118 contos. A verba de material para máquinas e instrumentos continua a ser pequena. Deve porventura aumentar bastante nos anos próximos.
A tendência, notada em quase todos os serviços do Estado, para construções civis também caracteriza o porto.

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Têm-se dispendido elevadas verbas nas estações marítimas, e só ùltimamente se iniciou o plano de armazéns e abrigos que eram absolutamente necessários.
Em 1946 gastaram-se 4:840 contos, distribuídos do modo seguinte:

Contos

Estações marítimas .......... 1:906
Armazéns .................... 2:334
Abrigos de mercadorias ...... 407
Reparações .................. 193
Total ............ 4:840

Juntando ao que foi gasto em obras semelhantes, obtêm-se os números seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

A verba de 10:212 contos, que em 1940 se contabilizou em material, relativa aos trabalhos em execução sob a rubrica "Aeroporto Marítimo de Lisboa", foi excluída este ano do quadro transcrito acima. As obras são realizadas por financiamentos especiais, por empréstimos concedidos pelo Tesouro ao porto, e liquidáveis a prazos longos.
Nesse efeito gastou-se em 1946 a quantia adiante mencionada.
As outras verbas de material variam bastante de ano para ano. O consumo de combustíveis mais do que triplicou em relação a 1938, e as de conservação de imóveis e de máquinas também se desenvolveram bastante.

Pagamento de serviços e diversos encargos

146. A despesa total desta rubrica atingiu 34:346 contos em 1946, assim discriminada:

[Ver Tabela na Imagem]

Foram reforçadas a verba de melhoramentos e a que corresponde ao tráfego e diminuídas a dos seguros e a dos encargos de empréstimos. Nestes últimos a diminuição foi substancial e resultou das disposições contidas no decreto-lei sobre o plano do porto, a que já se aludiu atrás.
Nos 4:304 contos de diversos incluem-se despesas de comunicações, higiene, abono de família, restituições e indemnizações, aluguer de material, tracção nas vias férreas, cargas e descargas e outras de menor importância.

Empréstimos

147. Uma disposição legal recentemente publicada fez desaparecer da dívida do porto parte do que se refere à construção de obras na 3.ª secção. A dívida total diminuiu muito.
Tem o aspecto seguinte em 31 de Dezembro de 1946 e compara-se no quadro com o que era em 1938 e 1945:

[Ver Tabela na Imagem]

A situação ficou, com este sacrifício do Tesouro, bastante saneada. Mas as obras que vão ser construídas no próximo futuro em breve farão elevar a dívida para cifras superiores às de 1945.
Por esta razão e dada a crise que se avizinha no comércio externo, do qual o porto depende muito, há vantagem em despender as verbas adquiridas por empréstimo em obras reprodutivas.
De contrário o porto achar-se-á no futuro com uma crise de ordem financeira séria, que em última análise recairá sobre o Tesouro.

Correios, telégrafos e telefones

148. Continuam em aumento as receitas da Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones. Dentro de poucos anos, se continuar a progressão dos últimos tempos, as receitas serão três vezes maiores do que eram em 1933-1934, visto já se aproximarem de 250:000 contos e terem tido em 1946 o acréscimo de mais de 34:000 contos.
As despesas também se desenvolveram muito, pois atingiram quantia idêntica à das receitas no último ano. Mas as razões do aumento, à parte o inevitável acréscimo em pessoal e material, foi devido ao desvio para fundos e à liquidação de empréstimos contraídos para obras ou instalações de 1.º estabelecimento.

Receitas

149. Os números da tabela da página seguinte definem em súmula, no que toca a receitas e despesas, a vida orçamental dos correios, telégrafos e telefones no ano de 1946, em comparação com os anos anteriores.

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[Ver Tabela na Imagem]

Nota-se que o aumento foi muito grande.
No princípio da guerra as receitas e despesas mal passavam de uma centena de milhar de contos.
Havia sido penosa a ascensão na última década, porque não se tinham atingido ainda os 100 mil contos antes de 1936.
Mas o progresso foi extraordinário a partir de 1940, e em 1942 já se dobravam as receitas de 1940.
A ascensão continuou, embora menos acentuadamente.
O resultado de 1946, em que se deu o acréscimo de 34:025 contos em relação ao ano anterior, foi muito razoável e surpreende, até certo ponto.
As receitas progrediram em todos os serviços: nos postais, telegráficos e telefónicos. Nos primeiros o progresso acentuou-se em 1946. porque as receitas haviam diminuído em 1940 em relação a 1944.
O vagaroso acréscimo das receitas dos serviços telegráficos continuou, mas ainda assim deu-se o aumento de 1:198 contos em relação a 1945. Os telefones, com o alargamento da rede e o gosto de falar, muito nacional, continuaram a dar grandes receitas, que atingiram 63:922 contos em 1946. Não chegavam a 20:000 no ano anterior à guerra.
Os números, com os respectivos aumentos, são os seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

É talvez estranho que os serviços postais ainda continuassem a aumentar. Das contas não se deduzem bem as razões, que podem provir do pagamento de cobranças
atrasadas. As percentagens de receitas que cabem a cada uma das explorações dos correios, telégrafos e telefones foram calculadas no quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se nas cifras o progresso acentuado das explorações telefónica e telegráfica. Juntas, já ultrapassaram por cerca de 4:000 contos as receitas dos serviços postais. Mais de 50 por cento das receitas dos correios, telégrafos e telefones provêm delas. Em 1938 pouco passavam de 37 por cento.

Despesas

150. As despesas desenvolveram-se muito em todas as rubricas orçamentais. Mas os grandes aumentos em relação a 1938 deram-se no pessoal e nos diversos encargos, como se verifica no quadro da página seguinte.

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[Ver Quadro na Imagem]

Era de prever o alargamento do quadro do pessoal, exigido pela melhoria das receitas, consequência do desenvolvimento dos serviços, e pelos suplementos que a guerra exigiu.
Também se explica o acréscimo das despesas de material. Adiante se farão algumas considerações sobre o pagamento de serviços.

Encargos

151. Esta rubrica compreende o que antigamente se designava por pagamento de serviço e diversos encargos, e nela estão as verbas desviadas anualmente para o fundo de reserva e amortização, que este ano atingiram 50:000 contos.
É através desta rubrica quê se liquidam na verdade as obras e instalações construídas nos últimos tempos pelos correios, telégrafos e telefones. Quando as receitas o permitem inscrevem-se em «Diversos encargos» somas que, contabilizadas depois no fundo de reserva, o avolumam ou permitem, por intermédio dele, o financiamento das novas instalações.
Isto significa que esta Administração Geral vai amortizando todos os anos na medida do possível, e por quantias volumosas, as verbas que no inicio do plano de reorganização se presumia virem a ser financiadas por empréstimos. Já o ano passado se descreveu com certo pormenor o mecanismo desse financiamento, que além do empréstimo do Estado utiliza, quando necessário, os fundos de reserva.
Os diversos encargos somaram 108:898 contos em 1946, a maior verba que até agora tem sido inscrita.
A sua discriminação consta do quadro que segue, em contos:

Pagamento de serviços e diversos encargos

[Ver Tabela na Imagem]

Página 85

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Apesar da grande diminuição nas despesas de comunicações (12:765 contos), ainda houve o aumento de 12:208 contos em relação a 1945. Ele foi devido aos 40:000 contos integrados no fundo de reserva - mais 21:443 do que no ano anterior.
Há uma importância que parece exagerada, que é a de 1:033 contos de missões no estrangeiro.
Como 1946 foi o primeiro ano a seguir ao fim da guerra, pode acontecer ter havido necessidade de frequentes deslocações para fora do País por motivo de congressos, conferências internacionais e até de exame de material comprado.
Os outros aumentos foram pequenos e tiveram reduzida influência no total.

Exploração

152. Viu-se atrás que o saldo - a diferença entre receitas e despesas contabilizadas - foi de 565 contos. Este pequeno saldo foi devido a terem sido desviadas grandes importâncias para o fundo de reserva (40:000 contos), muito maiores ainda que em anos anteriores.
Os resultados da exploração, discriminados por serviços, foram os seguintes:

Resultados da exploração

[Ver Tabela na Imagem]

Melhorou apreciàvelmente o coeficiente de exploração dos serviços postais, que acusam o déficit de 15:847 contos em 1946, contra 28:941 em 1945; diminuiu um pouco o dos telégrafos e telefones, os quais, contudo, ainda bastaram para neutralizar o daqueles serviços.

Fundo de reserva

153. O fundo de reserva aumentou bastante, pela integração da verba de 40:000 contos, atingindo 213:633 contos. Acha-se representado em grande parte por títulos de crédito e material em armazém, como se verifica no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Empréstimos

154. Desde 1937 - primeiro ano da reconstituição das instalações, ao abrigo da lei, gastaram-se 213:295 contos na conta de empréstimos. Esta quantia achasse consideràvelmente amortizada e podê-lo-ia ter sido na sua totalidade por força dos excessos de receitas, o que é notável. A citada importância de 213:295 contos foi gasta, discriminadamente, por utilizações e por anos, do seguinte modo:

[Ver Tabela na Imagem]

Foi possível despender maiores quantias em 1946 do que nos exercícios anteriores, naturalmente por ter cessado a guerra e por terem aumentado os preços. A intensificação nos trabalhos deu-se sobretudo nas instalações telegráficas e telefónicas e deve prosseguir aceleradamente em 1947.
A própria natureza dos serviços exige o seu constante desenvolvimento, e, apesar do esforço realizado nos últimos vinte anos, ainda há necessidade de os alargar e melhorar.
No caso dos telefones, o serviço nas pontas ainda deixa bastante a desejar, por insuficiência de circuitos na maior parte dos casos. Espera-se remediar alguns dos males actuais logo que estejam concluídos os trabalhos em curso.
Mas há-de haver necessidade de constante inspecção e fiscalização, quanto mais não seja pela delicadeza dos serviços confiados a esta Administração Geral e ainda pelas características de um público irrequieto e muitas vezes impaciente.

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Instalações

155. O quadro que habitualmente se publica relativo ao custo dos edifícios tem este ano a forma seguinte, em contos:

Importâncias dispendidas pela Comissão dos Novos Edifícios para os CTT, em execução da lei n.º 1:959

(Em escudos)

[Ver Quadro na Imagem]

RECEITAS E DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS

l. A partir de 1940 as despesas extraordinárias começaram a subir ràpidamente. De 500:310 contos naquele ano, passaram para 1.078:722 em 1946. Os números são os seguintes:

Contos

1938 ............... 372:558
1939 ............... 469:387
1940 ............... 500:310
1941 ............... 865:456
1942 ............... 922:703
1943 ............... 1.716:948
1944 ............... 1.163:807
1945 ............... 1.170:094
1946 ............... 1.578:722

Página 87

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Grande parte destas despesas foi absorvida pelo Ministério da Guerra e em menor escala pelo da Marinha e Obras Públicas, mas também em outros sectores da vida do Estado houve aumento de gastos.
O ano de 1946, depois de 1943, foi o de mais avultadas despesas extraordinárias, e nesta gerência o Ministério das Obras Públicas foi aquele em que se deu o seu maior desenvolvimento.
Para liquidar tão elevado gasto nestes anos houve o recurso ao empréstimo em larga escala e o que faltou pagou-se por força de excessos de receitas ordinárias, de saldos de anos económicos findos e de rendimentos de pequena importância de outras origens. Mas, por larga margem, foram os empréstimos e os excessos de receitas ordinárias que liquidaram as grandes despesas extraordinárias.
Já se aduziram atrás algumas das razões que permitem prever as insuficiências no futuro de receitas para liquidar tão alto nível de gastos extraordinários. E disso deriva a necessidade, que aliás não é de agora, de comprimir, na medida do possível, o consumo de receitas desta proveniência.
Há-de ver-se adiante, quando se estudar cada uma das obras realizadas, a sua importância e utilidade, e então se verificará onde é possível reduzir os programas de trabalhos e das despesas.
Uma das características dos serviços encarregados de construir este ou aquele melhoramento ou obra é o que se pode chamar a sua longevidade. Uma vez formado, ou uma vez iniciada a obra ou incluída a verba no orçamento, ela como que marca lugar definitivo nas coutas. Persiste ano após ano. É o caso do Estádio Nacional, das obras da base naval, da Cidade Universitária de Coimbra, que parece estar longe do seu termo, e de tantas outras que todos os anos se acrescentam às listas normalmente publicadas nestes pareceres.
Existem, sem sombra de dúvida, grandes necessidades no País, em muitos aspectos da sua vida. Mas não se deve ignorar este simples facto: financeiramente, a Nação não é rica. Enquanto não forem desenvolvidos muitos dos recursos potenciais latentes, activada a produção e melhorado o seu rendimento, não pode aumentar muito a capacidade tributária. Este é um facto que parece não poder sofrer controvérsias, e já rios de tinta se escreveram sobre ele.
Ora, em última análise, é da carga tributária que saem as receitas para pagar tanto as despesas ordinárias como as extraordinárias.
Os encargos dos empréstimos são liquidados por força das receitas ordinárias - agora ou depois - e os saldos não são mais do que excessos de receitas ordinárias do passado.
Enquanto, como no período da guerra, o frenesim dos negócios e a alta dos preços de exportação permitiam grandes lucros, o Estado podia sem grandes inconvenientes aumentar as receitas, e aqui, com vigor, se recomendou forte tributação. Mas esse tempo passou. Já lá vai. E reentramos agora num período difícil.
Não convém torná-lo mais difícil ainda por desmedido alargamento de despesas extraordinárias. Não convém nem à economia interna nem à própria vida financeira do Estado.
O recurso ao crédito deve limitar-se, cada vez mais, às quantias necessárias para custeio de obras reprodutivas, e para este fim se devem canalizar tanto quanto possível os excessos de receitas ordinárias, se os houver.

2. As palavras que acabam de ser escritas não se escrevem por mero desejo de lançar tintas escuras sobre uma situação que, por enquanto, parece desanuviada. Escrevem-se com a intenção de tentar neutralizar o que já aparece sombriamente no horizonte.
O nível dos ordenados nos serviços públicos é baixo, ato em comparação com o nível de salários da actividade particular. E o fenómeno, bem conhecido de todos os que tom a seu cargo dirigir. organismos do Estado, é, em súmula, este: os funcionários mais competentes, se têm oportunidade, trocam os seus lugares por outros que lhes dêem melhor remuneração. E até está a dar-se em certos sectores da vida pública outro fenómeno, que a ser permitido, ainda mais perniciosos efeitos trará à engrenagem burocrática: o do ingresso nos quadros de pessoas que em outras circunstâncias possìvelmente neles não entrariam.
Todos estes factos são conhecidos e já começam a surtir efeitos. Explicam, até certo ponto, alguns paradoxos, que necessitam de deixar de o ser.

3. Parece ter-se chegado ao estágio de uma completa e conscienciosa revisão da vida financeira do Estado e, como consequência, de toda a sua vida burocrática. Os grandes abalos deixam sempre um rasto poeirento, que se traduz em confusões e abusos, contrários muitas vezes às regras estabelecidas. A guerra espalhou destes vestígios por toda a Europa ou, melhor será dizer, por todo o Mundo. A sua nefasta influência também se fez sentir entre nós, não apenas nos inevitáveis efeitos sobre a economia interna, mas também sobre o ordenamento racional da própria vida do Estado: na facilidade com que se encetam obras escusadas, na simplicidade com que se gasta dinheiro que poderia ser poupado, no uso imoderado e contrário aos regulamentos de meios de trabalho que devem ser usados só quando necessário, como por exemplo automóveis, na publicação de medidas que, sob a forma de verbas totais ou de autorizações de ordem geral, permitem o gasto de verbas que poderiam ser evitadas, na tendência para não considerar as receitas do Estado no significado que elas realmente têm - uma percentagem sobre os rendimentos da actividade agrícola e industrial do País, numa palavra, sobre o trabalho nacional.
O exame das despesas ordinárias já revelou, e então se debateu o assunto, certo número de questões que indicam a necessidade de uma interferência severa do Ministério das Finanças nos problemas da organização dos serviços.
O exame das despesas extraordinárias confirma essa necessidade, que tem de estender-se ao grau de utilidade de cada uma das dotações concedidas e ao rendimento dessas dotações.
Nunca se criou a Intendência Geral do Orçamento, como havia sido proposto em 1928, e perdeu-se assim uma excelente ocasião de vigiar os gastos públicos através de um órgão independente. Parece ter chegado o momento em que não poderá ser adiada por mais tempo a fiscalização superior dos serviços, ou por intermédio de um Subsecretariado, no Ministério das Finanças ou na Presidência do Conselho, ou de qualquer outro modo.

Receitas e despesas desde 1928-29 a 1946

4. O total das receitas desde o início da reorganização financeira foi o seguinte:

Contos

Receitas ordinárias ........ 44.976:389
Receitas extraordinárias ... 6.693:863
Total ........... 51.670:252

No mesmo período de tempo as despesas ordinárias e extraordinárias somaram:

Contos

Despesas ordinárias ........ 37.443:426
Despesas extraordinárias ... 11.002:221
Total ........... 48.445:647

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288-(88) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132

Todos os anos se costuma discriminar a origem das receitas extraordinárias e o seu destino. As primeiras são constituídas por empréstimos, saldos de anos económicos findos e outras verbas de muito menos importância. Os excessos de receitas supriram o que faltou para liquidar as despesas extraordinárias. Interessa por isso saber a diferença entre as receitas e despesas ordinárias. No período considerado foi a seguinte:

Contos

Receitas ordinárias ........ 44.976:389
Despesas ordinárias ........ 37.443:426
Saldo ............. 7.532:963

No longo período de dezoito anos e meio houve 7.533:000 contos de excessos de receitas sobre despesas ordinárias, o que corresponde a cerca de 407:000 contos por ano. Na sua simplicidade estas cifras constituem um grande tributo de louvor ao País, que, vindo de um período em que as receitas ordinárias não conseguiam cobrir as despesas, em muito pouco tempo não só as nivelou, mas ainda contribuiu com o suficiente para o excesso de mais de 400 mil contos de receitas sobre despesas ordinárias.

Receitas extraordinárias orçamentadas e cobradas

5. Das receitas extraordinárias de 1946 fazem parte empréstimos, saldos de anos económicos findos e outras. Mas o que corresponde às últimas limita-se à herança de Rovisco Pais, e nada se cobrou por amoedação. Os números que seguem mostram a diferença entre o que se orçamentou e cobrou:

Receitas extraordinárias

[Ver Tabela na Imagem]

Nem tudo o que se cobrou foi consumido. Uma parte - 185:152 contos - serviu para amortizar dívidas. O que realmente teve saída para pagamento de despesas extraordinárias elevou-se a 598:630 contos.
Os 9:890 contos acima mencionados e outros empréstimos referem-se a quantias destinadas a fins especiais, como estradas nos arquipélagos da Madeira e Açores e construção de casas desmontáveis, de edifícios hospitalares e de cadeias civis.
Foram orçamentados para esse efeito 1.455:465 contos, mas, como se nota, não houve necessidade de recorrer a tal verba. Os números que acima se transcrevem podem resumir-se no seguinte quadro, que dá melhor ideia do movimento das receitas extraordinárias:

[Ver Quadro na Imagem]

A diferença entre o que se orçamenta e se cobra é já uma tradição das Contas.
Essa diferença é em geral muito grande; quase sempre neste capítulo a cifra do orçamentado ultrapassa o dobro.
O caso não tem financeiramente qualquer espécie de significado, porque, na verdade, todas ou quase todas as receitas que aparecem como cobradas existem já no Tesouro. O que acontece é a sua contabilização no orçamento, como no caso dos empréstimos e dos saldos de anos económicos findos.

Despesas orçamentadas e cobradas

6. As despesas extraordinárias atingiram em 1946 a cifra de 1.578:722 contos, mais do que em qualquer outro ano, com excepção de 1943. Dividiram-se do modo que segue pelos diversos Ministérios no quadro da página seguinte.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(89)

[Ver Tabela na Imagem]

Os dois Ministérios maiores consumidores de verbas foram o da Guerra e o das Obras Públicas e Comunicações, como aliás aconteceu no ano anterior. Houve uma ligeira diminuição no primeiro e um grande aumento no segundo. Adiante se verificará a causa destas variações.
As despesas foram liquidadas, como se disse atrás, por empréstimos, por saldos de anos económicos findos e por força de excessos de receitas ordinárias na sua quase totalidade.
Os números para os dois últimos anos são os que constam do quadro seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

O grande excesso de receitas ordinárias sobre despesas deste tipo permitiu menor recurso ao crédito e menos emprego de quantias tiradas do fundo de saldos de anos económicos findos. Viram-se atrás as razões que para tal concorreram quando se discutiram as contas das receitas ordinárias.
Estes excessos de receitas ordinárias, que já se viu noutro lugar serem de facto um grande das despesas extraordinárias, hão-de porventura escassear no futuro, porque as despesas ordinárias tendem a subir, como aliás se provou no último ano, e não diminuirão fàcilmente, até na hipótese de serem atendidas recomendações aqui formuladas, por virtude da exigência de reforço de dotações em alguns serviços.

DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS

7. A discriminação das despesas extraordinárias, pelas diversas aplicações e por Ministérios, consta do quadro Obra que segue, em contos:

[Ver Quadro na Imagem]

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Aumentaram bastante as despesas em quase todos os Ministérios, quando se comparam com as do ano anterior. Mas há que fazer algumas correcções. No Ministério das Finanças as verbas inscritas para amortizações da dívida foram, respectivamente, em 1945 e 1946 de 29:216 e 185:152 contos. Os totais comparáveis neste Ministério são, por consequência, quase idênticos: 82:019 e 81:532 contos.
Nos outros departamentos os aumentos foram, porém, reais, com excepção do Ministério da Guerra, onde houve baixa, a qual teve lugar nas despesas excepcionais de guerra, porque na verba do rearmamento houve grande acréscimo. Os gastos do Ministério da Marinha aumentaram muito. Foram quase o dobro. No das Obras Públicas as despesas extraordinárias passaram de 351:400 contos para cerca de 600:000. As verbas que mostram maiores valias são as das estradas e da compra de material sobrante do aeródromo de Santa Maria. Esta última deve ser reembolsável, pelo menos em parte, visto ser gradualmente entregue aos empréstimos das obras do Estado, mediante pagamentos escalonados.
Continuam a fazer-se este ano as prevenções do ano passado quanto à importância deste capítulo e ao significado das verbas no movimento geral da vida portuguesa.

Distribuição das despesas extraordinárias

8. Convém agrupar as despesas, para ter ideia da sua finalidade. Habitualmente resumem-se por identidade de fins, sem que isso, porém, signifique que as verbas que compõem cada uma das aplicações gerais que se mencionam sejam aquelas que melhor correspondem ao interesse geral. Seria, evidentemente, mais lógico e de melhor interesse alargar, por exemplo, o gasto das verbas usadas em fins reprodutivos, do que, por exemplo, nas obras de Coimbra, no alindamento de estradas ou em outros fins que não têm repercussão no acréscimo de riqueza.
Deve dizer-se que os agrupamentos indicados representam o critério do relator das contas públicas, que procurou, pela finalidade ou destino dos gastos, estabelecer uma rubrica geral para as suas aplicações.
São verbas com empregos afins, isto é, que por sua natureza se assemelham não funcionalmente apenas, mas até no ponto de vista do modo de realizar a obra. Admite-se contudo a existência de critérios diferentes, porventura melhores, do que o que aqui se adopta.
O quadro que indica, de um modo geral, o destino das despesas extraordinárias, discriminado por Ministérios, e obras ou utilizações, é o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Este quadro, reduzido a uma expressão mais simples, pode tomar a forma que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

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Vê-se que ainda este ano a maior verba das despesas extraordinárias se refere à defesa nacional e é expressa pelo rearmamento do exército e da marinha, pela base naval de Lisboa e por despesas excepcionais de guerra, nos Ministérios da Guerra, Marinha, Colónias e Estrangeiros.
Espera-se que esta última soma, de tão grande influencia nas contas, se reduza definitivamente no próximo ano.
Outras despesas de importância são as que liquidaram as obras de comunicações - portos, estradas, aeródromos, aviação civil, telégrafos e telefones e mais.
Começa este ano a pesar o plano de 1 milhão de contos para a grande reparação e construção de novas estradas.

O fomento rural continua a ser muito pobre de verbas, e é para admirar, tão grandes são quase sempre os efeitos económicos do que se gasta nesta finalidade.
É bem certo que a obra da hidráulica agrícola ainda não correspondeu à expectativa, mas a dos melhoramentos rurais - a mais pobre de todas as dotações - tem produzido grandes benefícios.

No fomento industrial já se incluíram as comparticipações do Estado em empresas hidroeléctricas e os gastos nos estudos, que tão morosos têm sido. O resto diz respeito a fomento mineiro.

A obra dos edifícios continua a ser grande consumidora de verbas e em "Diversos" estão algumas aplicações, como a do abastecimento de água às sedes dos concelhos, que talvez devessem incluir-se em fomento rural.

Análise das despesas extraordinárias

9. Desde 1928-1929 gastaram-se em despesas extraordinárias 11.002:221 contos. Para um país que durante tantos anos passou vida financeira atribulada, esta soma é, na verdade, muito grande.
Os 11 milhões de contos de despesas extraordinárias repartiram-se por variadíssimas aplicações e foram liquidados pelo excesso de receitas ordinárias, por empréstimos e por saldos de anos económicos findos.
Vale a pena fazer a discriminação da sua origem e depois dar um rápido golpe de vista sobre o seu destino.
As receitas que serviram para pagar as despesas extraordinárias, não incluindo os excessos das ordinárias, tiveram a origem indicada no quadro que a seguir se publica:

Contos

Empréstimos ..................... 565:852
Venda de títulos ................ 3.390:040
Saldos de anos económicos findos 2.088:144
Diversas ........................ 820:956
Total ............. (a) 6.864:992

Estes números significam que do total das receitas extraordinárias cobradas desde 1928-1929 a maior parte pertence a empréstimos. Em percentagens as receitas extraordinárias dividiram-se assim:

Empréstimos ...................... 57,6
Saldos de anos económicos findos . 30,4
Diversas ......................... 11,9
Total ................... 99,9

Embora se não discriminem neste parecer, como nos anteriores, as aplicações do total dos empréstimos emitidos, pode notar-se que, tirando a amortização de empréstimos, as maiores verbas dizem respeito às estradas, à hidráulica agrícola, aos correios, telégrafos e telefones, aos edifícios públicos e, em menor quantitativo, ao povoamento florestal. O terem sido inscritos na conta de empréstimos pagamentos das obras mencionadas não significa que por outras rubricas não hajam sido gastas verbas para efeito idêntico. Já se explicou que a mesma obra pode ter sido financiada por verbas de diversas procedências ou origens.
Pode dizer-se que só as "Diversas" tom carácter diferente. Estas apenas pesaram com cerca de 12 por cento no total. Os saldos, que representam, de facto, receitas ordinárias, contam com 30,4 por cento e o resto são empréstimos. Há-de ver-se adiante que, no final de contas e neste longo período, foram as receitas ordinárias que pagaram a maior parte das despesas extraordinárias.

Empréstimos

10. O recurso ao crédito decompõe-se em empréstimos contraídos para fins específicos, como liceus, construções prisionais e outros, e venda de títulos.
Os empréstimos contraídos elevam-se, desde 1928-1929 a 1946, a 565:852 contos.
Venderam-se neste período 7.553:351 contos de títulos e achavam-se depositados em conta de operações de tesouraria 3.848:190 contos.
Em 1946 aplicaram-se 669:627 contos obtidos por venda de títulos e 29:513 por conta de empréstimos.
O quadro seguinte dá o seu destino:

[Ver Quadro na Imagem]

Despesas extraordinárias pagas por conta de receitas ordinárias

11. Foram bastante elevados no período que decorre desde 1928-1929 os excessos de receitas ordinárias. Serviram para pagar despesas extraordinárias.
De 1928 a 1937 o total liquidado com excessos de receitas ordinárias elevou-se a 648:192 contos, dos quais 243:125 se desviaram para estradas e 336:196 para o

(a) Incluíram-se os saldos gastos anteriormente a 1936, embora só depois começassem a figurar como receita e despesa extraordinária por força do decreto n.º 27:223.

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rearmamento da marinha. O resto diz respeito a, despesas de revoluções, fomento de Angola, portos e exposições.
De 1937 a 1946 os excessos de receitas ordinárias foram muito maiores. Serviram para pagar a elevada soma de 4.533:992 contos.
No conjunto, as verbas podem decompor-se assim:

[Ver Tabela na Imagem]

Origem das receitas que liquidaram as despesas extraordinárias

12. Viu-se atrás, em verbas de conjunto, a origem das receitas utilizadas no pagamento de despesas. Isso não nos diz, porém, o consumo total de receitas em cada uma das aplicações e há interesse em discriminar esse custo tanto quanto possível. Só assim se pode aquilatar da magnitude do esforço produzido e dos resultados que porventura hajam sido alcançados ato agora. Conviria, para completo esclarecimento deste assunto, que tem grande interesse, fazer logo a seguir às quantias gastas a enumeração dos trabalhos executados. Mas isso é quase impossível, a não ser em casos como os da hidráulica agrícola, dos portos e outros, em que os resultados estão à vista e se torna fácil medir os seus rendimentos.

13. Já, se emitiu juízo sobre o critério na escolha das obras. Declarou-se então ser mais vantajoso para o País gastar o máximo possível de disponibilidades financeiras em obras reprodutivas, de interesse imediato. Infelizmente nem sempre isso tem acontecido o ainda estamos muito longe do que é preciso realizar, e podíamos estar mais perto.
De um modo geral as obras de fomento tem prosseguido com grande morosidade. Os estudos prolongam-se muito e consomem muito dinheiro, e era possível activá-los.
E as obras, uma vez iniciadas, não tiveram em muitos casos a celeridade precisa e possível.
É sabido, e já isso se notou atrás, que a percentagem das despesas extraordinárias que coube à defesa nacional, principalmente ao rearmamento do exército e da marinha e despesas excepcionais de guerra, foi elevada. O resto foi empregado em várias obras.

Rearmamento do exército

14. As quantias gastas no rearmamento do exército podem assumir a forma seguinte:

Contos

Em conta de excessos de receitas
ordinárias e de amoedação ................. 1.081:724
Em conta de saldos de anos económicos
findos .................................... 1.109:608
Em conta de empréstimos ................... 481:139
Total ............. 2.672:471

É uma soma volumosa, que exclui ainda outras verbas gastas pela rubrica de despesas excepcionais de guerra. Parece ser possível reduzir no futuro as dotações anuais, e de resto isso será necessário por virtude da baixa de receitas e por não convir recorrer ao empréstimo para verbas desta natureza.
Apenas se pediram ao crédito para este efeito 481:139 contos, o que não é exagerado. O resto caiu em cheio sobre as receitas ordinárias, o que não é justo.

Rearmamento da marinha

15. O rearmamento da marinha, sem contar com algumas verbas incluídas no começo da reorganização financeira em receitas ordinárias, foi executado por força de excesso de receitas e saldos. A pequena quantia que no ano passado se inscreveu como rearmamento da marinha proveniente de empréstimos, ou 27 contos, dizia respeito ao Arsenal do Alfeite. Passou a contabilizar-se este ano em diversos, onde tem melhor cabimento.
A conta do rearmamento da marinha pode descrever-se assim:

Navios de guerra

16. Gastaram-se 552:969 contos em navios de guerra, incluindo a modernização recente em alguns navios antigos. À parte o que diz respeito a despesas ordinárias, o financiamento daquela soma fez-se do modo que segue:

Contos

Em conta de excessos de receitas ordinárias 483:109
Em conta de saldos de anos económicos
findos. ................................... 69:860
Em conta de empréstimos ................... -
Total ............. 552:969

Aviação naval

17. As verbas que cabem nesta rubrica são:

Contos

Em conta de excessos de receitas ordinárias 67:283
Em conta de saldos de anos económicos
findos ..................................... 19:383
Em conta do empréstimos .................... -
Total .............. 86:666

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Rearmamento do exército e da marinha

18. Juntando as três verbas relativas às forças armadas, incluindo a aviação naval, a Base Naval e Escola do Alfeite, obtém-se o total seguinte:

Contos

Em conta de excessos de receitas
ordinárias ........................ 1.711:705
Por força de saldos ............... 1.199:301
Por força de empréstimos .......... 489:308
Total ............ 3.400:314

Despesas excepcionais de guerra

19. Esta despesa atingiu uma soma bastante grande e foi liquidada do modo que segue:

1945
Contos

Por conta de excessos de receitas
ordinárias ........................ 2.329:377
Por conta de saldos de anos económicos
findos ............................ -
Por conta de empréstimos .......... 113:130
Total ............ 2.442:507

O que se relaciona com as forças armadas e guerra importou no seguinte:

Contos
Por força de excessos de receitas
ordinárias ........................ 4.041:082
Por força de saldos ............... 1.199:301
Por força de empréstimos .......... 602:438
Total .................. 5.842:821

Viu-se que o total das despesas extraordinárias andou à roda de 11 milhões de contos. Nelas se incluem reembolsos de empréstimos, como o de 4 1/2 por cento de 1912, ouro, o de 4 por cento de 1886 e o resgate do 6 3/4 por cento (Portos). Deduzidas as verbas que dizem respeito a estes empréstimos ou a amortizações extraordinárias da dívida, obtém-se o que se gastou, líquido, em despesas extraordinárias. Bastante mais de metade se refere às forças armadas e às despesas excepcionais de guerra. A importância de perto de 6 milhões de contos representa, na verdade, um notável esforço, que foi possível realizar em grande parte através das receitas ordinárias. Mas não será possível no futuro continuar a desviar elevadas somas para este efeito. Todas as verbas disponíveis devem agora ser invertidas no fomento económico.

Outras aplicações das despesas extraordinárias

20. Não é fácil enumerar nem estudar todas as aplicações das despesas extraordinárias, tão numerosas elas são. É por isso que apenas se mencionam as mais importantes, com uns ligeiros comentários e a indicação da origem das receitas que as liquidaram.
A ordem da enumeração não significa qualquer tendência para mostrar que esta é mais importante do que aquela. De um modo geral segue-se o quantitativo já gasto em cada uma por despesas extraordinárias.

Portos

21. Já se despenderam cerca de 500:000 contos na obra dos portos, incluindo o de Leixões.
No lugar próprio deste e outros pareceres se estudam os quantitativos utilizados em cada um deles e se apreciam os resultados das obras com a opinião fundamentada sobre a necessidade imediata ou adiamento da sua construção.
As verbas que liquidaram as obras dos portos tiveram a origem seguinte:

Contos
Em conta de excessos de receitas
Ordinárias .......................... 185:580
Em conta de saldos de anos económicos
findos .............................. 5:974
Em conta de empréstimos ............. 307:083
Total .............. 498:637

As verbas incluem 1:100 contos gastos no porto da Figueira da Foz em 1928-1929 e 1:023 no de Leixões, em conta de receitas ordinárias, além de 4:674 contos utilizados no desmantelamento do Orania.

Estradas

22. É sabido que nos primeiros anos da reorganização financeira parte do plano das grandes reparações que as estradas sofreram foi custeado por verbas inscritas no orçamento das despesas ordinárias e já isso foi explicado noutro lugar.
Em 1946 foi preciso fazer intervir o recurso ao crédito no financiamento das estradas. Contudo, tem sido norma reduzir ao mínimo o uso de empréstimos para este fim.
Os números que dão ideia das quantias gastas em estradas por força das despesas extraordinárias são os que seguem, com a discriminação da origem das receitas que as liquidaram:

Contos

Em conta de excessos de receitas
ordinárias ........................... 255:375
Em conta de saldos de anos económicos
findos ............................... 75:250
Em conta de empréstimos .............. 174:140
Total ................. 504:765

Não se inclui o equipamento mecânico comprado, no valor de 46:687 contos, mas apenas as verbas da Junta, as estradas da Madeira e dos Açores, os percursos de turismo e outros, discriminados, que dizem respeito a estradas. O total já compreende os 100:000 contos destinados ao plano rodoviário e os 20:000 contos de subsídio, além dos 1:500 para a estrada marginal e 9:890 do que se gastou nas ilhas.
A utilização de mais de 151:390 contos, em 1946, além da verba de urbanização (5:000 contos) e de perto de 47:000 contos na compra de material, é um grande esforço no sentido de melhorar as estradas. Infelizmente ele está a ser feito, na quase totalidade, por força de empréstimos.

Hidráulica agrícola

23. Na hidráulica agrícola por despesas extraordinárias gastaram-se até fins de 1946 cerca de 379:800 contos, assim distribuídos:

Contos

Em conta de excessos de receitas
ordinárias ........................... 101:603
Em conta de saldos de anos económicos
Findos ............................... -
Em conta de empréstimos .............. 278:206
Total .................. 379:809

Foi possível nos anos de 1937 a 1941 liquidar os encargos da hidráulica agrícola por força de excessos de receitas ordinárias. Desde 1942, porém, as obras têm

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sido pagas por empréstimos. Os custos ultrapassaram muito as estimativas e parece ainda ser necessário o dispêndio de mais 215:000 contos para terminar o Pego do Altar (65:000 contos), Vale do Gaio (5:000 contos), Idanha (65:000 contos), Chaves (5:000 contos), Campilhas (40:000 contos) e Silves (40:000 contos).
Se assim for, a obra do que está leito e em construção importará em 594:809, ou, números redondos, 600:000 contos, dos quais cerca de 500 mil representarão empréstimos, visto supor-se que o que falta será custeado pelo recurso ao crédito.
Estão por isso a atingir grandes somas os encargos futuros da hidráulica agrícola, até quando se põem de lado as despesas ordinárias e aquelas que foram custeadas por força do excesso das receitas ordinárias.
Conviria refazer o estudo geral deste problema, que tem grande importância na vida agrícola do País e, como acaba de se verificar, também se reflecte altamente na vida económica e financeira. Os encargos de 500:000 contos, supondo o juro de 3 por cento, são de 15:000 contos por ano. Terão os empreendimentos capacidade para arcar com a amortização e juro dos empréstimos contraídos?

Melhoramentos rurais

24. Ainda não se fez o que era possível nesta obra, e em lugar devido se comenta o assunto. Em 1946 pagaram-se 19:108 contos pelo orçamento de despesas extraordinárias em conta de saldos de anos económicos findos. Com este aditamento o gasto total foi:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ......................... 30:000
Por conta de saldos de anos económicos findos ......................... 171:359
Total ..................... 201:359

Hospitais escolares

25. Em 1946 foram utilizados por este capitulo das contas 45:006 contos, os quais, com as verbas do passado, perfazem 118:142 contos, assim discriminados:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ......................... 71:335
Por conta de saldos de anos económicos Findos......................... 46:807
Por conta de empréstimos ........... -
Total ................... 118:142

Não será ainda em 1948 que acabará o Hospital Escolar de Lisboa. Para o orçamento daquele ano foram pedidos 60:000 contos, quantia idêntica à que havia sido requerida para 1947.
Espera-se, contudo, que esteja pronto em 1949, e deviam fazer-se todos os esforços nesse sentido.

Edifícios públicos

26. Não é muito fácil determinar o que se gasta em edifícios públicos.
Cingindo-nos às rubricas oficiais, quer dizer, considerando apenas os edifícios nelas incluídos, pode determinar-se a soma total do modo que segue:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ........................... 92:803
Por conta de saldos de anos económicos findos .......................24:976
Por conta de empréstimos ............. 72:820
Total ................. 190:599

Há muitos outros edifícios públicos financiados à parte. Alguns serão discriminados adiante.
As verbas pedidas para os orçamentos de 1947 e 1948 foram, respectivamente, de 35:000 e 40:000 contos, além das que se inscrevem no orçamento das despesas ordinárias.
O Estado tem sido um grande construtor. Modificaram-se edifícios existentes e construíram-se outros novos em quase todos os sectores. Deveria abrandar a febre da construção pelo Estado.
Agora estão planeados centros anticancerosos em Coimbra, Porto e Portimão, um laboratório de engenharia civil, a adaptação do palácio de Seteais a hotel, a remodelação do Ministério da Justiça, a adaptação do convento das Trinas a arquivo geral das Secretarias de Estado, e esta obra deve ser concluída o mais ràpidamente possível. Prevê-se ainda a compra de mobiliários e equipamentos para diversos edifícios já concluídos ou em vias de conclusão.

Urbanização

27. São aplicáveis as considerações do ano passado sobre a urbanização. Em 1946 gastaram-se 5:000 contos. O resultado final é o seguinte:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ........................... 27:213
Por conta de saldos de anos económicos findos ........................ 84:680
Por conta de empréstimos ............. 60
Total .................. 111:953

Uma grande parte desta verba diz respeito a comunicações nos arredores de Lisboa, e ùltimamente no Porto, como seja a auto-estrada e as estradas marginais das duas cidades. Conta-se na verba pedida com subsídios para arranjos urbanísticos em diversas localidades, nomeadamente Viana do Castelo (Santa Luzia).
A demora que houve em executar os planos de urbanização e o critério seguido no seu delineamento têm causado atrasos e prejuízos que conviria evitar. Um plano de urbanização interessa a diversos aspectos da vida económica e social; não se cinge apenas à estética, bem ou mal compreendida. Não pode ser e não deve ser apenas obra do arquitecto, ou paisagista, como se diz agora.
Este assunto necessitava de ser revisto de modo a evitar erros no futuro, que são bem difíceis de emendar.

Cidade Universitária de Coimbra

28. A verba gasta em 1946 foi de 7:494 contos, elevando o total despendido para 36:545 contos, assim distribuídos:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias .......................... 29:494
Por conta de saldos de anos económicos findos ......................... 7:051
Por conta de empréstimos ............ -
Total ................... 36:545

Pediu-se a verba de 15:000 contos para 1947, que não deve ter sido toda gasta, e solicita-se a de 15:000 contos para 1948.
Têm sido grandes os protestos levantados por virtude desta obra e não se justificava a sua construção nas condições em que foi planeada.
Parece haver necessidade de refundir os planos, adiar o que for possível e terminar as obras no mais curto espaço de tempo.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(95)

Edifícios escolares primários

29. O Ministério das Obras Públicas propôs o ano passado para escolas primárias e técnicas 77:000 contos e para o orçamento de 1948 pede 82:000. Gastaram-se em 1946 as verbas seguintes:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ......................... 28:985
Por conta de saldos de anos económicos findos ...........................3
Por conta de empréstimos ........... 56:500
Total .................. 85:488

Esta é uma obra muito interessante e é pena ter sido preterida por outras de bem menor importância.
O Plano dos Centenários prevê 7:200 edifícios, com 12:500 salas. Actualmente estão executados, ou em curso, 1:200 edifícios, com 2:500 salas, e faltam ainda 6:000 edifícios, com 10:000 salas. É um vasto plano de reequipamento das instalações do ensino primário, que vem preencher uma grave lacuna na vida portuguesa.
Torna-se necessário agora remediar o problema do pessoal, que é bem mais importante que o dos edifícios.

Liceus

30. O plano de construção de liceus continua, e o estado da conta em 1946 era o seguinte:

Contos

Por conta de excessos de receitas Ordinárias ......................... -
Por conta de saldos de anos económicos findos ............................. -
Por conta de empréstimos ........... 65:340
Total ................. 65:340

Estádio Nacional

31. As obras no Estádio prosseguem. Não incluindo o que para elas foi desviado do Fundo de Desemprego, os gastos até fins de 1946 atingiam a cifra de 53:397 contos, assim distribuída:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ....................... 17:250
Por conta de saldos de anos económicos findos ........................... 36:147
Por conta de empréstimos ......... -
Total ................... 53:397

Ainda há mais obras planeadas, como o acabamento do hipódromo, a construção de um instituto de educação física e, possìvelmente, outras instalações que se reputam necessárias para a vida do organismo, como piscina, alojamentos e outras. Parece ser vantajoso adiá-las dada a falta de recursos financeiros dos próximos anos.
Já se não põe agora a opinião, expressa em outro parecer, da condenação desta obra no local em que foi executada, por ser longe de Lisboa, mas a necessidade de comprimir despesas.

Construções prisionais

32. Gastaram-se até fins de 1946 nesta obra 59:125 contos, financiados do modo que segue:

Contos

Por conta de excessos de receitas
ordinárias ....................... -
Por conta de saldos de anos económicos
findos ........................... -
Por conta de empréstimos ......... 59:125
Total ................. 59:125

Aeroportos e aeródromos

33. O equipamento para as comunicações aéreas tem consumido nos últimos anos grandes verbas.
Considerando os Aeroportos de Lisboa e de S. Jacinto e outros que aparecem sob a designação de novos aeródromos e aeroportos, as quantias gastas por despesas extraordinárias são:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias .......................... 17:470
Por conta de saldos de anos económicos findos ........................ 250
Por conta de empréstimos ............ 62:284
Total .................. 80:004

Fomento mineiro

34. Em pesquisas e reconhecimento de jazigos mineiros metalíferos e carboníferos têm-se dispendido ùltimamente diversas verbas. As primeiras foram inscritas em 1936, e desde então todos os anos, por conta de excessos de receitas ordinárias e por empréstimos, se utilizaram somas diversas, atingindo o total, em fins de 1946, 49:825 contos, assim discriminados:

Contos

Por conta de excessos de receitas ordinárias ...........................21:785
Por conta de saldos de anos económicos findos ............................. -
Por conta de empréstimos ............. 28:040
Total ................. 49:825

O Serviço de Fomento Mineiro tem executado, por intermédio do Instituto Geográfico e Cadastral, trabalhos topográficos em diversos jazigos, como os de Guadramil, Quintanilha, Vinhais, Bragança, Orada, Montemor-o-Novo, Odivelas, Vila Cova, Alvito, Agua dos Peixe, Odemira e Cercal e na zona carbonífera do Pejão, no total de 958 contos, assim como levantamentos geomagnéticos em diversos jazigos de ferro, no total de 673 contos. Subsidiou a Companhia Mineira do Valongo com 1:250 contos, em parte reembolsados já, e subsidiou também as Caldas de Monchique.
Nas obras em execução em jazigos de ferro gastou 334 contos em Guadramil, 346 em Montemor-o-Novo e 151 no Alvito e Agua dos Peixe; em jazigos de ferro-manganésio de Odemira e Cercal 742 contos; na zona de cromites de Bragança-Vinhais 137 contos; nos jazigos de chumbo de Quintanilha 249 contos; nas bacias carboníferas de Midões e Pejão 159 contos; na projecção geoeléctrica do Alentejo 2:833 contos; nos jazigos de ferro e cobre de Moura 95 contos; na zona manganífera de Castro Verde, Aljustrel e Mértola 68 contos; na zona piritosa de Grândola 10 contos, e adquiriu material no valor de 13:484 contos, além de ter gasto 66 contos com análises diversas.
O programa futuro ainda é largo, mas conviria activá-lo, sobretudo o que se refere a ferro, maganés e chumbo.
O serviço prevê para 1948 o gasto de 12:000 contos, sendo 2:415 para pessoal e 9:585 para diversos trabalhos.

Povoamento florestal

35. Nos povoamentos e estradas florestais gastaram-se até fins de 1946 para cima de 139:000 contos, assim distribuídos:

Contos

Em conta de excessos de receitas ordinárias .......................... 23:801
Em conta de saldos de anos económicos findos............................ -
Em conta de empréstimos ............. 115:245
Total ................. 139:046

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Colonização interna

36. Os trabalhos da Junta de Colonização Interna por despesas extraordinárias consumiram 11:789 contos, assim distribuídos:

Contos

Em conta de excessos de receitas
ordinárias .......................... 4:026
Em conta de saldos de anos económicos
findos .............................. -
Em conta de empréstimos ............. 7:763
Total ................... 11:789

No plano elaborado por esta Junta, e submetido superiormente, prevê-se até 1951 a formação de 1:561 casais, correspondentes a 24:884 glebas. O total a despender seria de 168:080 contos, assim distribuídos:

Contos

Plano geral ...................... 76:722
Pegões e Gafanha ................. 41:977
Fomento hidroagrícola ............ 49:882
Total ................... 168:581

ou, sem a aquisição de terras, a verba necessária baixaria para 139:510 contos.
O número de casais beneficiados não é grande. Eleva-se, como se disse, a 1:561. Tomando a despesa total de 168:581 contos, corresponderia o custo de instalação de cada casal a cerca de 108 contos, o que parece alto. Se se considerar o gasto de 139:510 contos sem a compra da terra, o custo por casal elevar-se-ia a perto de 90 contos.
Este assunto tem muito interesse e seria de vantagem que a Junta procurasse reduzir ao mínimo os custos.
Talvez fosse possível diminuir as despesas das instalações, e com o tempo, à medida do desenvolvimento das colónias agrícolas, poder-se-ia acabar o que falta.
Logo que seja possível se tratará este problema com maior largueza, porque a obra da colonização, sobretudo no Alentejo, tem uma importância muito grande.

37. Por este ano são estas as principais anotações que foi possível fazer às despesas extraordinárias, que assumem em todas as gerências uma importância de grande relevo na vida financeira.
Estamos a chegar ao momento em que é indispensável rever completamente a política seguida até agora, porque há necessidade de fazer economias, e até sob o ponto de vista de crédito se antolha indispensável reduzir a emissão de empréstimos. As economias terão de ser feitas principalmente nas obras não reprodutivas, e haverá que disciplinar os gastos de certos serviços, que planeiam com riqueza que contrasta com a modéstia da nossa vida. Pretendem-se instalações modestas, embora confortáveis, sem luxos escusados, sólidas e simples. E esta política não tem sido seguida. É preciso criar mais obras úteis e despender menos em coisas inúteis ou dispensáveis. Obras de ostentação têm de ser postas de lado, quanto mais não seja porque a situação financeira o não permite e há necessidade de executar muitas coisas absolutamente essenciais que esperam a sua vez.

SALDOS DE CONTAS

I. Viu-se já que o saldo do ano de 1946 foi de 61:003 contos e examinaram-se circunstanciadamente quase todas as despesas extraordinárias, de modo a poder verificar se se, na verdade, os empréstimos se empregaram nos termos constitucionais, isto é, se foram "contraídos para aplicações extraordinárias em fomento económico, amortização de outros empréstimos, aumento indispensável do património nacional ou necessidades imperiosas de defesa e salvação publica" (artigo 67.º da Constituição).
E notou-se que efectivamente os empréstimos contraídos cabem em qualquer dos fins previstos no artigo constitucional.
O saldo das contas é, por isso, legítimo.
Desde o início da reconstrução financeira o movimento de saldos foi o seguinte:

[Ver Quadro na Imagem]

Nota. - Este quadro não inclui uma reposição de 1:200 contos feita em 1938 na conta dos saldos.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(97)

A demonstração do saldo de 1946 já se fez atrás, quando se discutiram as receitas e despesas ordinárias.
Pode, porém, apresentar se mais simplesmente do modo que segue:

Contos

Receitas ordinárias ........ 3.901:161
Receitas extraordinárias ... 783:782 4 684:943
Despesas ordinárias ........ 3.045:218
Despesas extraordinárias ... 1.578:722 4.623:940
Saldo ....................... 61:003

Destes números se conclui que o saldo poderia ter sido maior, visto haver grande excesso de receitas sobre despesas ordinárias e ser possível, dentro dos preceitos constitucionais, liquidar muitas das aplicações por força de empréstimos.
Mas parece ser preferível, no momento presente e no próximo futuro, não recorrer ao crédito e até reduzir as despesas extraordinárias, para evitar esse recurso.

Emprego dos saldos de anos económicos findos

2. Todos os anos se estabelece o cômputo do que poderá designar-se por saldos disponíveis. Para isso torna-se necessário estudar como se aplicaram os saldos de anos findos e o que resta para gastar. O quadro a seguir discrimina todas as aplicações e indica o que resta disponível.

[Ver Quadro na Imagem]

CONCLUSÕES

A Comissão de Contas Públicas ponderou as condições financeiras e económicas do País, largamente expostas no parecer relativo às contas gerais do Estado de 1946, e, reconhecendo:

1) Que a actual conjuntura se reflecte perniciosamente na economia interna, porque torna muito difícil o comércio internacional;
2) Que a curva da descida das exportações tende a acentuar-se com o agravamento das dificuldades externas;
3) Que, em consequência, a actividade dentro do País pode ser afectada pelas dificuldades económicas que o Mundo atravessa;
4) Que é indispensável e muito urgente promover até ao máximo o aproveitamento dos recursos

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agrícolas e industriais na metrópole e nas províncias de além-mar, e em especial daqueles que tendam à produção de bens de consumo;
5) Que há necessidade, na medida do possível, de acelerar a execução de obras com carácter reprodutivo, para as quais se devem desviar grande parte dos recursos financeiros e mão-de-obra disponíveis;
6) Que é vantajoso estabelecer ainda mais intima cooperação entre as actividades económicas da metrópole e as dos domínios ultramarinos;
7) Que, dadas as dificuldades do momento actual, a mais estreita coordenação do trabalho dos diversos departamentos do Estado constitui uma das condições fundamentais de defesa da economia nacional;
8) Que em 1946 as receitas públicas totais atingiram 4.684:943 contos, mais 701:125 do que no ano anterior e 2.145:710 do que em 1938;
9) Que foram cobrados 3.901:161 contos de receitas ordinárias e 783:782 de extraordinárias, e nestas últimas 699:141 foram obtidos pelo recurso ao crédito;
10) Que as despesas totais pagas somaram 4.623:940 contos, dos quais 3.040:218 contos representam os gastos ordinários do Estado e 1.578:722 contos os extrordinários;
11) Que os empréstimos serviram, quanto a 185:152 contos, para amortizar dívidas e, quanto a 1.393:570, para pagamento de despesas extraordinárias, nos termos da Constituição;
12) Que, à semelhança de anos anteriores, grande parte das despesas extraordinárias foi liquidada por excessos de receitas ordinárias, e que sem isso teria havido necessidade de recorrer em maior escala a empréstimos ou ao fundo de saldos de anos económicos findos;
13) Que as despesas excepcionais de guerra pelos Ministérios da Guerra, Marinha, Negócios Estrangeiros e Colónias desceram para 400:350 contos;
14) Que do fundo de saldos de anos económicos findos se gastaram 77:108 contos;
15) Que o saldo de gerência se elevou a 61:003 contos, e teria sido maior se não fossem utilizados em tão larga escala os excessos de receitas ordinárias no pagamento de despesas extraordinárias:

Tem a honra de submeter à apreciação da Assembleia Nacional as seguintes bases de resolução:

a) A cobrança das receitas públicas durante a gerência entre 1 de Janeiro e 31 de Dezembro de 1946 foi feita de harmonia com os termos votados na Assembleia Nacional;
b) As despesas públicas, tanto ordinárias como extraordinárias, foram feitas de conformidade com o disposto na lei;
c) O produto de empréstimos contraídos teve a aplicação estatuída nos preceitos constitucionais;
d) Foi mantido durante o ano económico o equilíbrio orçamental, como dispõe a Constituição, e é legítimo e verdadeiro o saldo de 61:003.009$80 apresentado nas contas respeitantes a 1946.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 9 de Fevereiro de 1947.

Henrique Linhares de Lima.
Artur Águedo de Oliveira.
João Luís Augusto das Neves.
José Esquível.
José Dias de Araújo Correia, relator.

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APÊNDICE I

O COMÉRCIO EXTERNO

(1900-1946)

Considerações gerais

1. Não tem sido possível até agora, como era desejo do relator dos pareceres das contas públicas, fazer a análise minuciosa do comércio externo português, de tão grande influência na vida económica nacional.
No período anterior à guerra o exame só poderia realizar-se em superfície, e dele não adviriam conclusões que não fossem de ordem geral, porque os valores alfandegários não correspondiam inteiramente à realidade em grande parte das mercadorias exportadas, sobretudo daquelas que exprimiam os maiores quantitativos.
Nos trabalhos de 1938 para determinar a balança de pagamentos, publicados no Portugal Económico e Financeiro 1, encontraram-se valores muito diferentes para grande parte das mercadorias exportadas. E foi preciso ajustar os números pela aplicação de um coeficiente empírico, que se elevava em certos casos a mais de 60 por cento e fora obtido depois de inquérito cuidadoso aos valores alfandegários, conforme as declarações na origem e no destino.
Explicaram-se nessa ocasião as razões das anomalias e os motivos que impediam tomar os números da balança comercial da estatística como representativos da realidade.
Não vale a pena entrar agora na análise dos argumentos então apresentados, tendentes a provar que os deficits da balança comercial até princípios da segunda Grande Guerra eram inferiores, de facto, aos que os números oficiais indicavam. A balança de pagamentos era, por esse motivo, mais favorável do que na verdade parecia.
A partir de 1938 o Instituto Nacional de Estatística, em conjugação com outras entidades oficiais, tentou corrigir os erros das declarações aduaneiras, tanto da importação como da exportação.
Os resultados da balança comercial começaram a corresponder, com muito menores desvios, à realidade das coisas, e podemos hoje afirmar que a estatística comercial é a representação, para os efeitos práticos, das vicissitudes do nosso comércio externo. Esta foi uma das razões que levaram a transferir para melhor oportunidade o exame das importações e exportações.
Outra razão derivou do estado de guerra, iniciado em 1939.
A vida internacional sofreu graves desacertos, e adiante se verificará qual a sua influência nas relações de Portugal com outros países. Houve tais obstáculos à livre troca de produtos e os consumos adaptaram-se em tão elevado grau às necessidades imediatas e prementes do conflito que os estudos a fazer em relação a qualquer dos anos em que exerceram sua nefasta acção haveriam necessàriamente de ser falseados pelas circunstâncias que então prevaleciam.
Mas a guerra passou. Já lá vão dois anos que o Mundo voltou à paz - se acaso «paz» é palavra para classificar a situação perturbada e perturbadora que os povos atravessam.
Cessaram, por isso, em grande parte os consumos de guerra, embora não tivessem cessado totalmente os fabricos de guerra.
Os preços sofrem anula, e hão-de sofrer por muitos anos, os reflexos do cataclismo que assolou o Mundo, mas, pouco a pouco, pelo que diz respeito ao comércio externo, todos os países tentam activar as trocas, no seu próprio interesse.
Convém, por estas razões, fazer agora o estudo do comportamento da balança comercial portuguesa no período que vem de 1938 para cá, e principalmente da sua posição no ano de 1946 e nos meses de 1947 em que seja possível fixar números aproximados ou que dêem, pelo menos, uma ideia geral.
As conclusões a que chegarmos não poderão ser definitivas; contudo, elas mostrarão claramente que os receios formulados com prudência e firmeza nos pareceres das contas se justificaram em larga escala no ano de 1946 e que por não terem sido adoptadas as medidas que então se sugeriram, relativamente à prioridade ou hierarquia nas importações, derivaram consequências sérias, que é mister encarar com vigor.

O significado do comércio externo

2. Do cuidadoso exame das cifras que exprimem o movimento do comércio externo podem tirar-se seguros indícios sobre a vida económica de um país. Elas indicam em crua realidade as insuficiências nacionais e explicam as tendências psicológicas das populações.
Marcam nìtidamente períodos de crise ou de fartura, tendências colectivas ou isoladas, e até traduzem o modo de ser e a educação dos povos.
Há-de haver bem poucos índices económicos tão importantes para o estudo de um povo ou de uma política como a estrutura do comércio externo. Quando os números adquirem forma real e verdadeira, como os da estatística portuguesa nos últimos anos, e se apresentam em tão louvável minúcia, quase que é possível ver neles as causas profundas do atraso da vida nacional em muitos dos seus aspectos.
Ponto é olhá-los pelo seu significado humano - pelo que eles representam de dores, de alegrias ou de angústias humanas.

1 Ver Portugal Económico e Financeiro, Araújo Correia, vol. I, pp. 398 e seguintes.

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Bem poucas representações gráficas de fenómenos sociais, pungentes ou radiosos, são tão elucidativas como as que aponta o comércio externo, embora se apresentem hirtas e solenes nas cerradas colunas de livros de centenas de páginas.
Quando é possível aproximar o seu significado pelo relativamente largo período que vai de 1900 a 1946, através de temerosos e arrepiantes conflitos políticos, a interpretação correcta desse significado atinge o carácter da história escrita - uma interpretação certa dos factos reais que caracterizaram a vida material, política e social durante um longo período.
Circunscritas a determinado país nas suas relações com o exterior, as cifras do comércio externo dão-nos logo as falhas da vida económica desse país e também nos podem oferecer, em contraste, os motivos da sua resistência.
Para nações, como Portugal, de insuficiente actividade industrial ou agrícola é ao comércio externo que o Estado vai procurar grande parte das suas receitas.
O produto dos direitos aduaneiros representa percentagem importante dos impostos indirectos.
Pode dizer-se que eles têm subido a cerca de um terço do total das receitas ordinárias. Só diminuíram, apesar do conflito, quando este acabou.
A vida do comércio externo tem, assim, importância fundamental, tanto de ordem financeira como social e política; e agora, que tanto se fala em projectos de união aduaneira nos países europeus, o seu estudo adquire relevo considerável porque o caminho directo que leva à federação política, ou até à unificação política, passa sempre pela união ou nivelamento dos direitos aduaneiros.

3. Mas há outros grandes ensinamentos que com facilidade se extraem do estudo do comércio externo. E um deles liga-se ìntimamente às fraquezas da produção nacional.
No presente estado da ciência económica um dos mais fascinantes e incompreendidos capítulos é, certamente, o que respeita ao significado do preço do custo. E diz-se dos mais incompreendidos, não porque ele tenha dificuldades especiais em ser compreendido, mas porque o cérebro humano se adapta difìcilmente a regras rígidas ou a noções que imponham métodos rigorosos de estudo e actuação colectiva ou multilateral.
Ora um preço de custo é quase sempre a resultante de esforços de entidades independentes. Não deriva apenas, como parece supor-se às vezes, da eficiência de determinado organismo industrial ou agrícola, porque na composição do preço do custo entram outros produtos, ou serviços, que escapam à acção do empresário, considerado isoladamente.
Um preço de custo é, assim, resultante, à parte condições de ordem especial inerentes às circunstâncias naturais da produção, de forças independentes - da eficiência geral dos organismos produtores e também em grande parte de orientações de órgãos oficiais.
O ajustamento de todas estas influências pode tornar um país próspero ou não, produzir preços de custo baixos ou altos, pode, enfim, permitir, limitar ou impedir a possibilidade de concorrência em mercados externos. Ele é o mais seguro e eficiente meio de melhorar as exportações e de reduzir o déficit da balança comercial, e, consequentemente, da balança de pagamentos.
É sabido que elevado volume de trocas comerciais entre países e o desequilíbrio mínimo na balança de pagamentos têm quase sempre como consequência directa elevado nível de vida nacional. Nenhum país pode viver com grande desequilíbrio na sua balança comercial, a não ser que as remessas de cambiais, de outra origem, sejam de molde a cobrir integralmente o déficit. Mas essas só podem provir, à parte as da emigração, de serviços prestados de variadas maneiras e formas, incluindo os rendimentos de capitais, que indirectamente se ligam à eficiência usada em prestá-los em relação a outros - ou o que equivale a dizer ao seu custo. Há-de ver-se adiante que um dos mais sérios ensinamentos que nos proporciona a análise do nosso comércio externo é o elevado preço de custo do produto nacional.

A balança comercial

4. A balança comercial portuguesa é, tradicionalmente, deficitária. Não é. possível talvez extrair dos números que constam do quadro I conclusões exactas ou definitivas, porque haveria quê considerar diversos factores que não podem ser longamente discutidos agora. Mas dão uma ideia, no largo espaço de tempo de quarenta e seis anos, das tendências gerais do comércio externo português.

QUADRO I

Importações e exportações

(1.000 escudos-ouro)

[Ver Quadro na Imagem]

No período de 1900 a 1910 o déficit comercial passou de menos de 20:000 contos-ouro para 31:000. A primeira Grande Guerra influiu já nas importações de 1915, e os anos de 1920 e 1925 foram de efeitos catastróficos, reduzidos em 1930, embora não tanto quanto era preciso.
É natural que, perante a carência de cambiais e as medidas tomadas para evitar a sua fuga e, depois, pela inércia que sempre deriva de hábitos adquiridos, as exportações relativas à terceira e quarta décadas se inscrevam na estatística por cifras menores do que a realidade. Noutro lugar se corrigiram já as prováveis anomalias, e os gráficos publicados no Portugal Económico e Financeiro dão essas correcções, mas o sentido das cifras mostra, naquele período, grandes anormalidades.
No quadro indicam-se os anos de 1941, 1942 e 1943, que tiveram saldos positivos, como é conhecido. Foi alívio passageiro, que não derivou de qualquer esforço económico especial. Os resultados de 1944 já justificam as apreensões do período anterior, e 1946 representa, com perto de 50:000 contos-ouro de déficit, ou mais de 2.200:000 contos-papel, uma situação que é muito

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grave. O ano de 1947 há-de acentuar muito este estado de coisas.
Os desvios dos preços, em relação ao ouro, neste longo período de quarenta e seis anos podem tornai- complicadas ou confusas as ilações que porventura hajam de ser extraídas das cifras das importações e exportações, mas não destroem o sentido geral do seu significado.

5. Três grandes acontecimentos marcaram nesta conturbada época a sua indelével impressão, que há-de perdurar durante todo este século, tanto por seus efeitos políticos como económicos.
Esses acontecimentos foram duas grandes guerras - das maiores que o Mundo tem suportado - e a crise de 1929-1931, que se repercutiu em todos os países.
É por isso vantajoso completar a lição das cifras em contos-ouro com a dos quantitativos em peso das importações e exportações. Talvez que do exame do conjunto melhor se aquilatem as necessidades do País, o seu poder de consumo e a sua capacidade de produção.
O quadro II exprime sucintamente o comércio externo, em toneladas de mercadorias importadas e exportadas, desde 1900.

QUADRO II

Importações e exportações

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

Pelo que diz respeito às importações, verifica-se que em 1946, apesar da queda grande nos combustíveis, ainda é o ano de maior tonelagem importada, a qual, contudo, se aproxima bastante da de 1930, no início, em Portugal, da grande crise económica. Desde 1900 só os anos de 1913 e 1937 ultrapassaram em tonelagem as importações de 1946, e em ambos os casos isso foi devido às matérias-primas e, dentro destas, aos combustíveis sólidos. Outra interessante verificação que os números mostram com clareza é a enorme diferença entre o peso das importações e exportações. Poucas vezes desce a menos de 500:000 toneladas.

IMPORTAÇÕES

A estrutura do comércio de importação

6. Houve sempre desde o princípio do século considerável diferença entre os pesos das importações e exportações.
Em volume, a composição das importações mostra a enorme influência que nelas têm as matérias-primas.
O quadro III, que a seguir se publica, é muito elucidativo neste aspecto.
Nele se indicam, por capítulos estatísticos e em toneladas, os números relativos à importação no largo espaço de tempo de quarenta e seis anos, desde 1900. Incluem-se também os dois anos de importação de maior tonelagem, que foram os de 1913 e 1937.

QUADRO III

As importações

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

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Apesar da sensível baixa nas importações de cereais em 1937, o aumento no total foi muito grande e resultou da importação substancial de combustíveis, que é o que avoluma mais o peso das importações. Em 1913, pelo contrário, foi a forte importação de cereais (392:282 toneladas) em relação a anos anteriores e posteriores a causa fundamental do incremento notado no total das importações.
O quadro IV mostra os valores em milhares de escudos-ouro das importações, por capítulos, desde 1900.

QUADRO IV

As importações

(1.000 escudoos-ouro)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Ver, por comparação, o quadro III.

7. Os quadros III e IV não pretendem oferecer o panorama definitivo do comércio importador português durante tão longo período. Referem-se a números escalonados por cinco anos, e pode acontecer que o total das importações nos anos escolhidos tenha sido influenciado por importações de anos anteriores. Mas dão bem uma ideia geral do sentido da vida económica portuguesa, sobretudo no que se refere à importância das matérias-primas e substâncias alimentícias na balança comercial. Tanto em peso como em valor estas constituem o factor saliente do equilíbrio ou desequilíbrio.
Um e outro quadro exprimem, além disso, progresso sensível na produção industrial, especialmente no capítulo relacionado com a manufactura de fios e tecidos. Apesar do grande aumento da população no longo espaço de tempo - cerca de 2.500:000 almas - e da exportação cada vez maior de tecidos de algodão e outros para as províncias ultramarinas, foi possível manter dentro dos limites de 1900 as importações dos anos seguintes, e talvez se pudessem ter reduzido ainda algumas delas, sobretudo as de tecidos e fios de seda, linho e juta.
Há em 1946 dois grandes saltos nos capítulos relativos a «Máquinas e aparelhos» e «Manufacturas diversas». O primeiro derivou em grande parte do aumento na importação de máquinas e veículos.
A diferença em relação a 1938, em contos, é superior a 150:000. Mas a maior influência proveio da importação de veículos, e por isso não actuou directamente no apetrechamento de indústrias transformadoras ou extractivas, que grandemente interessam à economia do País. Nas manufacturas diversas há uma infinidade de artigos que contribuíram para a maior valia. Tudo isto será analisado com maior atenção mais adiante.

I

Matérias-primas

8. O exame circunstanciado da lista das importações e sua correlação com as possibilidades da produção interna mostram graves obstáculos ao desenvolvimento da economia nacional.
Em peso e em numerário as matérias-primas representam, no total, quase sempre mais de metade do comércio externo de importação. Em matérias-primas incluem-se os combustíveis - os carvões e os óleos minerais. Em volume eles representam percentagens muito grandes no total das importações. Em tempos normais ultrapassavam 1.000:000 de toneladas por ano.
Os combustíveis, as fibras, as oleaginosas, o ferro, o aço e outros metais, como o cobre, os produtos químicos, especialmente os adubos, constituem o núcleo principal das matérias-primas importadas. A sua influência faz-se sentir no comércio externo, tanto na tonelagem como no valor, porque entram neles produtos considerados pobres e muitos outros de valor unitário elevado ou médio como os metais e certas oleaginosas.
Em peso e valor podem agrupar-se para 1938 e 1946 do modo que segue:

QUADRO V

Principais matérias-primas importadas

[Ver Quadro na Imagem]

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Estes números claramente exprimem a importância dos combustíveis, das duas principais fibras - o algodão e a lã - e do ferro e aço na importação de matérias-primas.

9. Ver-se-á mais adiante a influência que a falta de matérias-primas tem na economia nacional e, dentro delas, os combustíveis.
Essa influência não diz apenas respeito à necessidade de liquidar o seu valor com o produto da exportação ou de outro modo, mas afecta sensìvelmente os transportes. A maior parte dos combustíveis importados para consumo interno, incluindo os óleos minerais, têm sido transportados, até agora, em barcos estrangeiros. E os últimos provêm, em geral, de regiões que não podem consumir produtos nacionais, como Curaçau.
Os carvões e óleos minerais constituem uma pesada carga sobre a economia do País. E é grave saber que uma parte importante não tem como contrapartida rendimento económico, nem interesse geral.
Nas importações bastante mais de metade do peso é tomado pelas matérias-primas, e nestas uma alta percentagem é ocupada pelos combustíveis sólidos ou líquidos. A única excepção digna de registo e assinalável é a das fosforites, que atingiram 251:500 toneladas em 1946, contra 126:500 em 1938 - mais ou menos o dobro em peso e quase dez vezes mais em valor.
As fibras, acima mencionadas, têm um custo unitário muito alto, e por isso a tonelagem é muito menor, apesar do valor total nas importações.
O ferro e aço são a outra matéria pouco sensível em tonelagem e muito importante em valor, como se nota no quadro.
10. Convém fixar numa tabela os quantitativos das matérias-primas importadas e relacioná-los com os das de origem mineral. E é isto que se mostra no quadro VI.

QUADRO VI

Importações de matérias-primas

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

Os números exprimem bem a importância das matérias-primas, em peso, nas importações e, de entre elas, a influência que têm os combustíveis, tanto sólidos como líquidos, mas sobretudo os primeiros.
Contudo, para mais claramente as fazer sobressair, calcularam-se as percentagens que correspondem no total das importações às matérias-primas e combustíveis, e isso se mostra no quadro VII.

QUADRO VII

Percentagem das matérias-primas nas importações

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

A primeira conclusão de relevo que se extrai dos números é a de que as matérias-primas ocupam percentagens que variam entre menos de 70 e mais de 80 por cento do total das importações.
No princípio do século actual a percentagem era de cerca de 77 por cento; em 1910 passou para cima de 80 por cento. Variou em seguida, conforme as circunstâncias.
Em 1946 era anula superior a 70 por cento (72,7 por cento).

Combustíveis

11. Em volume, os combustíveis sólidos e líquidos - os carvões e óleos minerais - ocupam por sua vez um lugar muito importante no total das matérias-primas importadas e até no conjunto das importações.
Pode dizer-se que o seu volume total se reduziria para cerca de metade em quase todo o período examinado, com excepção dos últimos anos, se o País se bastasse em combustíveis.

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Até ao período da guerra pesavam grandemente nas importações os combustíveis sólidos. Cerca de metade destes, em tonelagem, no ano de 1938 é representada por carvões, especialmente bulhas e antracites.
O combustível nacional - carvões e lenhas - supriu as dificuldades de importação e gradualmente se foram adaptando as instalações de força motriz existentes, incluindo as de caminhos de ferro, ao uso de combustíveis líquidos. Em 1946 a tonelagem destes já é bastante mais de metade da dos carvões.
A posição de 1900, relativamente a combustíveis, pode explicar-se por menor actividade industrial.
A alta nos preços e as dificuldades da guerra são razões suficientes para os casos de menor importação de carvões em 1944 e 1945.
Aliás, conviria verificar o que corresponde em ouro, em cada um dos anos citados, a combustíveis. E assim se faz no quadro VIII, que completa os dois anteriores.

QUADRO VIII

Importação de combustíveis

(1.000 escudos-ouro)

[Ver Quadro na Imagem]

As cifras dão ideia da evolução do consumo de carvões e, de um modo geral, dos combustíveis, relativamente à sua influência na balança de pagamentos e nas relações entre os sólidos e líquidos.
A partir de 1938 diminuíram, em peso, as importações de combustíveis sólidos, cada vez mais acentuadamente. Em 1946 cerca de 56 por cento do valor da importação de combustíveis referiam-se a óleos minerais, posição inversa da de 1938.
Poderá talvez atribuir-se este fenómeno às dificuldades do mercado externo de hulha s e antracites, mas não pode haver dúvidas de que em grande parte o fenómeno se deve à adaptação das instalações de força motriz e locomotivas ao uso de óleos minerais.
Num total de 69:819 contos-ouro de matérias-primas, correspondiam 16:575 a combustíveis sólidos e líquidos em 1946. Em 1988 os números eram, respectivamente, 26:528 contos para o total de 6:789 para os combustíveis, com preponderância, neste último ano, dos carvões.

O problema dos combustíveis

12. Os números que acabam de ser sucintamente apontados levantam um grave problema da vida nacional, que, aliás, tem sido assinalado bastas vezes nos pareceres das contas e em outros escritos.
O consumo de combustíveis tende a aumentar, porque aumenta o uso de força motriz. Até agora os carvões eram importados em grande escala de Inglaterra e ùltimamente dos Estados Unidos e os óleos minerais, que já suplantam em valor os carvões, provêm da América do Norte ou do Sul, sobretudo de Curaçau, Venezuela e Colômbia.
O que falta para satisfazer as necessidades do País nesta matéria é obtido das matas e outros recursos nacionais, sob a forma de carvão vegetal e lenhas, e das minas portuguesas, sobretudo das de antracite na região do Norte.
A riqueza florestal sofre consideráveis perdas por virtude da falta de combustíveis em períodos de crise e ainda doutros, e sabe-se, pelo exame feito adiante, que das florestas derivam alguns dos mais valiosos produtos da exportação: as madeiras, as resinas, as cortiças e outros.
É muito mais rendoso, no aspecto económico, explorar as florestas para este fim do que submetê-las a perigosos derrubes, muitas vezes sem critério silvícola, conforme as necessidades.
Por outro lado, as aptidões dos nossos solos e clima permitem muito maior intensificação da exploração florestal, não apenas com o objectivo da exportação e consumo interno, mas também com o fim de opor obstáculo sólido à erosão, que cada vez mais arrasta solos férteis para os rios, e de modificar, como for possível, o próprio clima.
A questão dos combustíveis sempre teve, por todos estes motivos, grande acuidade e influiu desde o princípio do século na vida económica nacional.
Seria vantajoso conhecer quais as necessidades de energia, traduzidas em, por exemplo, calorias, porque é para efeitos de força motriz que se consome grande parte do combustível importado, se se puserem de parte por enquanto as exigências domésticas, que também são muito grandes. Mas estas na província e até na capital são quase sempre satisfeitas pelos produtos florestais, que não afectam o ordenamento e a exploração racional das florestas.
A única maneira que no horizonte mais próximo se divisa de atenuar a importação dos combustíveis é produzir internamente maiores quantidades de energia hidroeléctrica.
O Douro e o Tejo, tanto nos troços nacionais como internacionais, serão no futuro dois grandes instrumentos de progresso, como já largamente se explicou noutro lugar 1, e compensarão em escala muito apreciável as dificuldades que o futuro próximo há-de opor às possibilidades de importação de combustíveis.
A energia hidroeléctrica não poderá suprir totalmente a importação de carvões, que terá de continuar a ser feita para usos que não podem ser substituídos por energia eléctrica. Mas indubitàvelmente a sua influência será grande, sobretudo nos maiores aglomerados urbanos, em matéria de luz, transportes, indústria e até aquecimento, como já hoje começa a notar-se nalgumas cidades.
Aliás, as dificuldades mundiais e a utilização de carvões como matéria-prima de muitas e variadas indústrias obrigarão a reflectir os países que os não possuírem sobre as futuras possibilidades industriais. A natureza e as condições de exploração dos jazigos carboníferos em Inglaterra, no Rhur e nos Estados Unidos, sujeitos a intensiva safra há muitos anos, torna mais

1 Ver «Rios portugueses», pp. 173 e seguintes do Parecer das Contas Gerais do Estado de 1943.

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oneroso o custo do combustível, além de diminuir o seu poder calorífico.
0 carvão tende a ser utilizado intensiva e extensivamente como matéria-prima valiosa. De combustível abundante e barato durante um século, está a transformar-se um produto caro, com muitas aplicações.

13. O outro caso de certa gravidade na balança comercial portuguesa no capítulo de matérias-primas é o dos combustíveis líquidos. Antigamente tinham importância quase só a gasolina e o petróleo - a primeira para força motriz nos transportes e o segundo para a iluminação.
O aperfeiçoamento dos motores de combustão interna e as dificuldades na safra do carvão tornaram extensivo à indústria em muito maior escala o uso de óleos minerais. A rápida comparação entre o que se importem em 1938 e 1946 mostra as profundas diferenças havidas nesta matéria.

QUADRO IX

Importação de combustíveis líquidos (a)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui lubrificantes.

A modificação operada nos consumos de óleos minerais durante o período da guerra é saliente neste quadro.
Em primeiro lugar há que considerar o seu considerável acréscimo. Não obstante a produção interna, que consumiu o ano passado mais de 100:000 toneladas de ramas, alguns dos outros produtos aumentaram. As importações de óleos combustíveis em 1946 atingiram mais do dobro das de 1938.
Nota-se aqui a grande diferença que derivou da adaptação de caldeiras ao consumo de combustíveis líquidos e do uso cada vez maior de motores de combustão interna.
Não é caso agora para tentar discutir o futuro da produção petrolífera e das possibilidades do alargamento da sua importação para substituir os combustíveis sólidos de difícil aquisição e maior preço. Basta dizer que não parece ser muito prometedor o que se desenha no horizonte político a este respeito. As recentes pesquisas na Arábia, perto do Golfo Pérsico, e o que resultar dos trabalhos em execução na América do Sul e em outras partes do Mundo deixam adivinhar a existência de lençóis petrolíferos de grande importância. Mas, por outro lado, a utilização de energia tende a alargar-se muito, e o exame das curvas do uso de electricidade, além dos projectos acalentados por vastas regiões do Globo, deixam prever, em futuro próximo, considerável acréscimo no consumo de produtos petrolíferos.
O consumo mundial já tem aumentado consideràvelmente nos últimos anos. As estimativas para 1947, computadas em 3:079 milhões de barris - mais 242 milhões do que em 1946 -, mostram a estranha e rápida corrida para a utilização de produtos oleosos. Os Estados Unidos gastam GO por cento do total; já são hoje importadores e crê-se que as suas reservas diminuam gradualmente, a ponto de estarem quase exaustas dentro de unias dezenas de anos - pelo menos no que diz respeito a produtos fáceis de explorar.
As produções da Venezuela (55 milhões de toneladas) e Médio Oriente (33,4 milhões de toneladas) são hoje a mais abundante origem de petróleos para exportação. E se não fora o facto, já conhecido, das grandes reservas no Médio Oriente, calculadas oficialmente em 1943 em mais de 27 biliões de barris, seriam muito fracas as possibilidades de exportação no futuro, visto os 20 biliões de reservas norte-americanas e os 22,5 da União Soviética deverem ser, em sua quase totalidade, consumidos nos respectivos países 1.
A acrescentar a estas perspectivas há as dificuldades nas pesquisas, cada vez mais difíceis e caras, e as vicissitudes políticas na ordem internacional, que tornam precária a posição dos importadores.
Não é brilhante, pelas razões que sucintamente acabam de ser expostas, o futuro do problema da importação dos combustíveis - e foi baseado em tão sombrias perspectivas que o relator das contas públicas, em apêndices aos pareceres de 1942 e 1943 e em discursos na Assembleia Nacional, tratou largamente das possibilidades dos rios portugueses, sobretudo do Douro e do Tejo, que são indubitàvelmente dois dos nossos maiores valores, neste e em outros aspectos.

A origem dos combustíveis

14. Quase todo o carvão consumido em Portugal em 1938, com excepção do obtido de jazigos nacionais, vinha da Inglaterra e Alemanha. Em 1946 era importado em grande escala da América do Norte.
O valor unitário em 1938 andava à roda de 151$ por tonelada e passou para 542$ naquele último ano.
A origem dos combustíveis sólidos foi a seguinte:

QUADRO X

Origem dos combustíveis sólidos

(Carvões)

[Ver Quadro na Imagem]

O deslocamento do comércio de carvão para a América teve grandes inconvenientes, além de o tornar mais caro. A maior parte das instalações térmicas nacionais foram projectadas para a queima de combustíveis eu-

1 Economist de 20 de Setembro de 1947.

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ropeus, sobretudo britânicos. Por outro lado, os fretes para a América são bastante mais elevados.
Estes inconvenientes e outros de natureza política influenciaram muito o abastecimento interno durante o período da guerra e levaram à intensificação da exploração dos jazigos nacionais, que desempenharam um papel importante neste período.
Embora de qualidade inferior, por excesso de cinzas, sobretudo as antracites do Norte, eles podem exercer no futuro maior influência ainda, sobretudo se for convenientemente estudada a coordenação dos jazigos de lignites e de antracites.

15. A origem dos óleos minerais durante o período de guerra não se alterou tão sensìvelmente. Os fornecedores principais nos dois anos foram. Curaçau, que dobrou a sua exportação para Portugal, e os Estadas Unidos, e em 1946 as ramas para destilação vieram de Venezuela, Colômbia, Curaçau e México. Os dois primeiros países e o último só forneceram ramas.
No conjunto a origem dos óleos minerais em 1938 e 1946 foi a que segue:

QUADRO XI

Origem dos combustíveis líquidos (a)

(Óleos minerais)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui lubrificantes.

Dos 422:924 contos importados em 1946 apenas 134:514 dizem respeito a ramas. O restante refere-se à compra de gasolina e outros produtos. Já se explicou atrás a causa do grande aumento no consumo de óleos minerais.
A verba relativa a gasolina, não contando com a que foi destilada, ultrapassou a de 1938 em mais de 70:000 contos, embora em peso fosse inferior em cerca de 12:000 toneladas.

O problema da energia

16. O problema da energia é, por virtude de todas as razões que acabam de ser apontadas, um dos mais importantes da vida nacional. Tem pairado diàfanamente no espírito do público há mais de trinta anos como áurea possibilidade económica.
Escreveram-se longos relatórios de especialistas de categoria internacional sobre o assunto e estão agora em vias de realização alguns aproveitamentos hidráulicos de certa importância.
Deve contudo dizer-se que o problema é de conjunto, abarca complexas e variadas formas da vida económica portuguesa 1. Está ìntimamente relacionado com a balança comercial, como se viu atrás.
Exige de começo um inventário dos nossos recursos hidráulicos, que já poderia e deveria estar feito l, e uma planificação racional no aproveitamento desses recursos, tendo em conta, não exclusivamente a energia, mas, como repetidas vezes tem sido explicado, as diversas utilizações dos rios susceptíveis de rendimento económico, como a navegação, a rega e outras 2.
Evitar-se-iam assim periódicas estimativas das disponibilidades energéticas do País, feitas por entidades responsáveis, que vão desde 4 biliões de unidades até 9 biliões.
Todo o problema económico português está profundamente ligado ao dos rios nacionais por diversas razões. Enquanto não for do domínio prático a aplicação industrial da energia atómica, a electricidade dos rios nacionais é a única tábua de salvação da vida económica portuguesa.
Daí a insistência com que o autor vem pugnando há cerca de vinte anos pelo seu aproveitamento e a necessidade urgente e inadiável de submeter os rios portugueses e suas bacias hidrográficas a um estudo cuidadoso e competente, feito por técnicos e economistas, que claramente ponha em evidência o valor económico de cada uma delas.

As fibras

17. Em valor, a importação das duas principais fibras - a lã e o algodão - atingiu 650:280 contos em 1946, contra 177:391 em 1938. A diferença em tonelagem é também muito grande. O aumento deu-se tanto na lã como no algodão e pode ler-se nos números seguintes, que também incluem outras fibras de menor importância:

QUADRO XII

Importações de fibras

[Ver Quadro na Imagem]

1 Diário das Sessões n.º 109, de 12 de Dezembro de 1941.
1 Diário das Sessões n.º 92, de 11 de Novembro de 1944.

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A indústria algodoeira e a dos lanifícios trabalharam intensivamente durante o período da guerra, e nem sempre foi fácil o abastecimento de matéria-prima.

As lãs

18. São conhecidos os inconvenientes que provieram da falta desta fibra nalguns anos de guerra e não vale a pena agora entrar na análise das possibilidades nacionais no que diz respeito à produção de lãs dentro do País.
Mais do que triplicou em peso o seu comércio importador em 1946 relativamente a 1938 e o valor foi quase sete vezes maior. As compras desta fibra no 1.º semestre de 1947 continuaram em muito larga escala.
As razões que explicam ou tentam explicar esta volumosa importação filiam-se no considerável decréscimo nos stocks, motivado pela guerra. A indústria de lanifícios parece necessitar de ter, em conjunto com os armazenistas de tecidos e os retalhistas, cerca do equivalente à produção de um ano, sob a forma de matérias-primas e de produtos manufacturados.
Em todo o caso a importação em 1946, de mais três vezes o quantitativo de 1938, além do que já veio em 1947, foi certamente exagerada e é também devido a isso que há dificuldades na indústria.
O caso da produção interna de lãs tem sido muito discutido e não chegaram ainda a acordo os interessados e especialistas sobre este importante assunto.
Haverá possibilidade, com melhor apetrechamento fabril e mais cuidadosa escolha de fibra, de valorizar a lã nacional e utilizá-la em maior escala? Poderão os criadores de gado modificar os seus métodos, de modo a obter melhor fibra?
A questão necessita de ser definitivamente resolvida, porque parece acentuar-se nos últimos tempos certo progresso no apetrechamento da indústria, há muitos anos necessário, e possuir o País zonas muito próprias para o fabrico de tecidos, como as abas do maciço da Estrela.
Mais de 7:000 toneladas de importação, com valor vizinho de 200:000 contos, só em lãs, é excessivo para as possibilidades cambiais do País nos anos próximos, a não ser que haja contrapartida na exportação dos artigos manufacturados, como houve, embora em pequena escala, nalguns anos de guerra.
A lã consumida em Portugal importa-se na sua maior parte em rama, suja ou lavada, e a penteada vem em mecha ou em preparação. A origem é quase sempre a mesma. As importações foram em 1938 e 1946 dos países indicadas no quadro XIII.

QUADRO XIII

Origem das lãs

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que em 1946, ao contrário de 1938, foram feitas as compras em muito maior escala directamente nos mercados produtores - na Austrália e África do Sul, que juntos somaram 172:269 contos, num total de 221:425. A França, que havia, sido o principal fornecedor em 1938, perdeu a sua posição, em parte devido ao facto de ser a fibra tratada em Portugal, que substitui já hoje aquele país na penteação e lavagem.

Os algodões

19. Os algodões também aumentaram muito a sua importação em 1946. De 28:365 toneladas em 1938 passaram para 39:510 naquele ano. Em valor os números são sensìvelmente o triplo.
Esta fibra vem hoje quase toda das províncias ultramarinas, sobretudo de Moçambique.
Foi devido ao esforço do ultramar nesta matéria que a indústria conseguiu trabalhar em muito larga escala no período da guerra - e obter lucros que ultrapassaram, como é conhecido, os limites do razoável.
Desde 1938 até fins de 1946 a metrópole consumiu, segundo a estatística oficial, 227:920 toneladas de algodão.
Vieram das províncias ultramarinas 161:600 toneladas, ou cerca de 71 por cento.
O resto foi importado dos Estados Unidos, do Brasil, e, em menor escala, do Egipto. A indústria do algodão depende hoje, em grande parte, das províncias ultramarinas, tanto como mercados importadores como exportadores. É para lá que a metrópole envia grande parte do seu fabrico. Este facto tem uma notável importância nas relações com os domínios portugueses de além-mar porque o comércio algodoeiro representa hoje um valor considerável nas trocas e permutas com as populações indígenas. Os números que seguem dão, em contos, a permuta de matérias-primas, fios e tecidos de algodão, incluindo vestuário, entre Portugal metropolitano e ultramarino nos dois anos de 1938 e 1946.

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QUADRO XIV

Origem das importações de algodão

(Contos)

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Não inclui remessas postais para os territórios do Cabo Verde, Guiné, S. Tomé e Príncipe, índia, Macau o Timor, no valor de 254 contos.

A importação em 1946 foi constituída quase toda por algodão em rama ou caroço, matéria-prima para as indústrias nacionais.
Os fios e tecidos são em muito pequena quantidade.
Do algodão em rama de origem estrangeira há o que proveio do Egipto (32:714 contos), do Brasil (3:606 contos) e da Índia Britânica (1:027 contos). E mais nada.
Nos fios e tecidos avultam o fio (9:930 contos), os tecidos abertos com rendas (4:954 contos), e outros, que poderiam ser facilmente evitados, como chailes e lenços de diversos tipos, tecidos crus, brancos e tintos, e mais.
Quanto às exportações, vai quase tudo para o ultramar, como se verificou no quadro anterior. Tirando algumas remessas enviadas para Marrocos, o resto teve pouco interesse neste ano. Dos 28:487 contos atrás mencionados pertencem mais de 90 por cento a este pais.
A indústria algodoeira, como mostram os números, desempenha função importante na economia nacional. Não se poderá dizer, pelo simples exame das cifras, quanto da matéria-prima importada se reteve para r consumo interno. A importância da indústria ressalta, contudo, do facto de por exemplo, no ano de 1946 a exportação ter sido maior do que a importação. Se fossem conhecidas as reservas de matérias-primas e produtos no princípio de cada ano, poder-se-ia chegar a resultados sobre quanto foi usado no consumo nacional. O facto de haver exportação, apesar disso, numa indústria em que toda a matéria-prima é importada mostra o alto valor dessa indústria.
Não se compreende bem a sua pequena exportação para países estrangeiros. Tem largo mercado garantido, ou quase garantido, em domínios nacionais, que em 1946 atingiu cerca de meio milhão de contos e em 1938 andava à roda de 90:000; importa matéria-prima de territórios portugueses a preços de concorrência com a de outras origens. E, em muitos aspectos, os produtos nacionais podem ser idênticos aos de outros países.
Através dos entrepostos portugueses espalhados pelo Mundo poder-se-ia ter estabelecido exportação, que, até sem ser coisa por aí além, valorizaria a balança comercial.
Os mercados ultramarinos vão desaparecer, ou ficar bastante reduzidos, logo que se inicie em larga escala a manufactura de tecidos em Angola e Moçambique. Aparece assim no horizonte próximo uma ameaça ao trabalho interno, porque se não divisam por enquanto, ou não se fazem esforços no sentido de procurar, mercados que os possam substituir. A questão merece ser considerada com muita atenção, porque esta indústria emprega hoje muitos operários e movimenta outras actividades, sobretudo numa região em que a densidade demográfica é muito elevada.
Além dos produtos algodoeiros exportados, já descritos, há a acrescentar os que são empregados nos bordados dos Açores e Madeira, expedidos principalmente para os Estados Unidos, Brasil, Canadá e outros países americanos.
Representaram uma cifra muito alta, na qual estão incluídos o fio, o tecido e o trabalho. Não se poderá estabelecer a parte que corresponde ao último, mas deve ser de relevo no total.
O assunto será analisado mais adiante, porque só em bordados da Madeira e Açores, juntando as remessas por via postal, se exportaram em 1946, cerca de 256:000 contos. Esta soma é valiosa na economia das ilhas e pesa também sensivelmente como fonte de cambiais.

Ferro e aço

20. A terceira matéria-prima de grande relevância normalmente importada, por quantias e volume avultados, é o ferro e aço, que atingiu 154:162 toneladas em 1946, contra 108:747 em 1938.
Pesou na balança comercial do último ano com 431:000 contos. Compreende ferro fundido em gusa e aço em metralha, granalha ou limalha, além de sucata, barras, fio simples ou com preparo, folha de Flandres e outras mercadorias não especificadas.
É possível reduzir apreciàvelmente parte destas importações, como, por exemplo, a de folha de Flandres e de fio simples, mas a matéria-prima que serve para estes produtos, de possível manufactura em Portugal, há-de vir do estrangeiro enquanto mão for estabelecida a indústria siderúrgica no País.
Não é fácil elaborar uma estimativa completa do consumo de ferro e aço que compreenda, além das matérias-primas, as máquinas, aparelhos e produtos em obra;

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no caso de ser instalada a indústria siderúrgica, poderia ser evitada forte importação de máquinas, aparelhos, ferramentas e outros instrumentos em que predomina o ferro ou o aço.
A indústria siderúrgica é daquelas que maiores benefícios traria ao País, se fosse possível ou viável, como parece, desenvolvê-la em bases económicas. Ela daria lugar a numerosas actividades acessórias, e já foi alvitrada 1 a possibilidade de fundir meio milhão de hematites de Trás-os-Montes dentro do País, que produziriam cerca de duas centenas de milhares de produtos metalúrgicos de grande interesse.
Se forem apenas consideradas as importações de ferro e aço na forma de matéria-prima e de manufacturas diversas nos anos de 1938 e 1946, obtêm-se os números que seguem, de grande importância na balança comercial de um e outro ano:

QUADRO XV

Importações de ferro e aço

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Incluído em «Coberto de outros metais».

Em peso o total foi de 108:747 toneladas em 1938 e 154:162 toneladas em 1946.
Em obra o peso vai além de 10:000 toneladas, tanto num como noutro ano, e atinge em 1938 cerca de 31:580 contos e mais de 77:500 em 1946.
O exame das importações do obras de ferro e aço permite visionar a possibilidade de fazer desaparecer algumas delas. A indústria de tubagem pode atingir certo grau de importância entre nós. As províncias ultramarinas têm tendência, acentuada para grandes desenvolvimentos materiais já nos anos mais próximos e hão-de necessitar de muitos produtos siderúrgicos.
Se se acrescentarem os instrumentos, alfaias agrícolas, máquinas industriais de variados tipos e ferramentas, ter-se-á ideia da possibilidade do desenvolvimento das indústrias relacionadas com a siderurgia.
Adiante se verá, no que diz respeito a este capítulo das importações, como é que os aparelhos, instrumentos, máquinas e utensílios, embarcações e veículos pesaram na balança comercial.
E uma parte importante da manufactura desses artigos poderia ser feita em Portugal, no caso de haver produção de ferro e aço em condições económicas razoáveis.

21. Também no abastecimento de ferro e aço durante o período das hostilidades houve grandes alterações, que se mantiveram em 1946.
Os grandes fornecedores antes da guerra eram países europeus. A Bélgica e a Alemanha ocupavam os primeiros lugares, mas havia outros, como a França e a Inglaterra, que os enviavam em apreciáveis quantidades.
Os Estados Unidos em 1946 passaram a ocupar o primeiro lugar. As diferenças em tonelagem e em valor foram grandes, e apesar disso a América do Norte fàcilmente marcou uma posição de relevo.
Certos países com quem mantínhamos relações neste aspecto do comércio externo quase desapareceram, como a Polónia, a Itália, a Hungria, além da Alemanha, que em 1938 nos fornecera mais de 19:000 toneladas, e apareceram outras, como a Suécia e a Espanha, que nesta matéria tinham connosco diminutas relações.
Para 1938 e 1946 os números que definem o abastecimento do País em ferio e aço são os do quadro XVI.

QUADRO XVI

Origem do ferro e aço

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se logo o enorme aumento das importações dos Estados Unidos, à custa de países europeus, sobretudo da Alemanha e até certo ponto da Bélgica.
O grande acréscimo de cerca de 45:000 toneladas veio quase todo daquele país norte-americano.
O problema da produção interna do ferro e aço é discutido com bastante minúcia no estudo sobre rios portugueses, no parecer de 1943. Por ele se verificará a possibilidade de completa independência nesta matéria.
Se o assunto for devidamente encarado, não é impossível prever a exportação, dentro de dez anos, de importante tonelagem de produtos de ferro e aço.

Outras matérias-primas

De origem animal

22. Além da lã, que, conforme se viu atrás, pesou em 1946 na balança comercial com 231:000 contos, ou 7,238 toneladas, o que significa considerável aumento em relação a 1938, há outras matérias-primas de origem

1 Parecer das Contas Gerais do Estado de 1945, p. 216 (apêndice).

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animal que influem também apreciàvelmente nas importações. São as seguintes:

QUADRO XVII

Diversas matérias-primas de origem animal

[Ver Quadro na Imagem]

As peles representam uma soma bastante elevada.
As destinadas a calçado ou correame, estão nas que se importaram em bruto. Para adorno incluem-se, não apenas as que têm essa designação, mas outras compreendidas na rubrica das não especificadas e em cabelo. Foram ao todo perto de 80:000 contos, que vieram em grande parte das províncias ultramarinas.
A maioria do que se pode designar por artigos de luxo é originária dos Estados Unidos, da Suécia, da Inglaterra e do Canadá.
Tirando as peles, as outras matérias-primas de origem animal não têm grande valor, mas algumas delas poderiam ser substituídas por despojos de animais abatidos para consumo interno. Neste aspecto há ainda lugar para consideráveis progressos na técnica dos matadouros.

De origem vegetal

23. Do algodão já se falou com certa largueza.
As restantes matérias-primas de origem vegetal ainda somaram em 1946 mais de 492:000 contos e haviam sido em 1938 cerca de 46:000 toneladas, num total de 174:000 contos.
Nas fibras há mercadorias, importantes, como o cairo, que é extensivamente usado na indústria de seiras para lagares e vem da Índia e algum também de Moçambique; a juta, que é a base da manufactura de sacos, é originária em sua quase totalidade da Índia Britânica, e o sisal e outras agaves, têm certa influência nas exportações de Angola e Moçambique, onde é susceptível de bem maior desenvolvimento.
Fizeram-se tentativas durante a guerra para a produção do cânhamo e alargamento da do linho e parece ser possível, com melhores culturas, aumentar essas produções dentro do País.
Além das acabadas de mencionar, constituem importações de influência na balança comercial as seguintes matérias-primas de origem vegetal, que somavam, em conjunto, mais de 400:000 contos em 1946.

QUADRO XVIII

Diversas matérias-primas de origem vegetal

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Discriminadas no quadro XII, p. 16.

A borracha e similares vieram em 1946, em grande parte, dos domínios ultramarinos (17:237 contos) e o restante dos Estados Unidos, Malásia Britânica, Inglaterra e outros países. A Guiné foi o principal fornecedor, com 10:000 contos. A aduela em bruto, com contrapartida na exportação de vasilhame para vinhos, foi importada de Itália e, em muito menor quantidade, dos Estados Unidos.
A cevada germinada e malte para o fabrico de cerveja proveio, quase que em partes iguais, dos Estados Unidos e da Dinamarca.
A indústria da cerveja depende, como se sabe, da cevada germinada, malte e lúpulo, que totalizaram cerca de 20:000 contos.

Madeira

24. Não é muito grande o valor das madeiras nas importações - uns 30:168 contos, ou 17:658 toneladas, em 1946, comparadas com 34:150 toneladas em 1938. São madeiras exóticas, que provêm em parte da Guiné, Angola e Moçambique, mas sobretudo de Angola e do Brasil. Os Estados Unidos fornecem o carvalho americano para tanoaria.
A madeira em bruto predomina na importação e a casquinha, que vem da Suécia, segue-se em valor às madeiras exóticas. Parece ser possível alargar muito as indústrias derivadas da madeira, como a de contraplacados e outras, porque tanto Angola como Moçambique e também a Guiné possuem matéria-prima de excelente qualidade. A organização dos transportes e da exploração no local, com o conveniente ordenamento das matas, é condição preliminar para o desenvolvimento de uma forma de actividade já com rendosos frutos.

Sementes e frutos oleaginosos

25. As grandes importações de oleaginosas para consumo no País são de amendoim, coconote, copra, rícino, purgueira, mafurra e outras de menor importância.

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A produção de oleaginosas no ultramar está longe de atingir o nível que é possível. Angola e Moçambique têm excelentes condições para a produção de amendoim e diversas oleaginosas, que poderiam ser mais largamente aproveitadas.
Em 1938 e 1946 importaram-se as sementes e frutos oleaginosos que constam do quadro XIX.

QUADRO XIX

Importações de sementes e frutos oleaginosos

[Ver Quadro na Imagem]

O amendoim veio da Guiné e de Moçambique e uma pequena parte de Angola e o coconote da Guiné e de Angola, assim como o gergelim. Quase toda a purgueira se importou de Cabo Verde e o rícino de Angola. A copra foi mandada de Moçambique e S. Tomé.
Todos os domínios de África contribuíram para o abastecimento da metrópole, além de exportarem grande quantidade de oleaginosas para outros países.
Conviria estudar, em conjunto, esta natural aptidão agrícola do ultramar para a produção de oleaginosas, a qual, se convenientemente organizada, poderia dar lugar a um mais intenso comércio de exportação.

Tabaco

26. O tabaco é outra matéria-prima que custa ao País cerca de 100:000 contos por ano. Vieram em 1946 cerca de 88:000 contos dos Estados Unidos. Parece não ser possível maior importação do ultramar, principalmente devido à qualidade da folha. Dizem os entendidos não haver razões especiais que impeçam maior quota-parte do Império Colonial no consumo da metrópole. Seria para isso necessário modificar certos sistemas de cultura e tratamento, assim como as qualidades plantadas.

27. Finalmente, outra importação de relevo é a da pasta de papel ou celulose, que não parece ser de fácil produção na metrópole, não obstante as boas vontades manifestadas, até pràticamente.
Está-se procedendo a estudos com certas plantas, tanto de Moçambique como de Angola, e julga-se provável a obtenção de pastas de boa qualidade usando matéria-prima que existe em grandes quantidades naquelas províncias.

Matérias-primas de origem mineral

28. As matérias-primas de origem mineral e os metais custaram em 1946 mais de 1.500:000 contos. Em 1938 a tonelagem importada fora maior, mas o custo não atingiu 500:000 contos. Estes números em sua simplicidade mostram por si sós a grande importância que elas revestem. O quadro XX mostra, de um modo geral, as principais alterações nos dois anos.

QUADRO XX

Matérias-primas de origem mineral

[Ver Quadro na Imagem]

Já se estudaram os carvões, os óleos minerais, o ferro e aço, e então se apontaram algumas soluções para atenuar a sua influência na balança comercial.
As outras substâncias de origem mineral e os metais, juntos, em 1946, obrigaram ao dispêndio de 334:740 contos para a importação de 337:910 toneladas.
As principais mercadorias vêm discriminadas no quadro XXI.

QUADRO XXI

[Ver Quadro na Imagem]

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As fosforites e apatites, que chegam em grande quantidade do Norte de África, são, com o ácido sulfúrico, a base da indústria dos superfosfatos. A importação em 1946 foi bastante mais elevada do que antes da guerra.
Neste ano exportaram-se adubos para Inglaterra no valor de 26:756 contos. O resto foi utilizado na agricultura, que poderia ainda consumir maiores quantidades para obter melhores produções.
O amianto, que vem da África Meridional Britânica, do Canadá e de Chipre, é utilizado na fabricação de produtos de fibrocimento, que tende a desenvolver-se. Parece haver indícios da exploração do amianto em Moçambique e já de lá vieram umas toneladas.
As gemas importadas, principalmente da Suíça, têm contrapartida nos 23:000 contos exportados para diversos países americanos.
O asfalto, o breu e o alcatrão suo essenciais em muitos misteres, sobretudo nas estradas e como aglutinantes. Importam-se agora principalmente dos Estados Unidos, Inglaterra, Holanda e Curaçau.
Tudo indica que Angola dentro de poucos anos bastará para o consumo interno. Os jazigos de libolites e de grés betuminosos parecem mostrar indícios que permitem encarar o estabelecimento de uma indústria interessante.
A importação de cimento da Jugoslávia foi esporádica. A indústria nacional, se bem apetrechada, pode satisfazer todas as necessidades internas e ainda exportar para o mercado ultramarino. O alargamento da actual capacidade e a instalação da indústria de cimento branco hão-de certamente conseguir isso dentro de alguns anos.
O País será sempre deficitário em certos metais que não existem no subsolo português, e, se existissem, o consumo e outras condições internas não permitiriam o estabelecimento da sua metalurgia. Tal acontece com o níquel, o mercúrio, talvez o cobre e suas ligas e o alumínio. Mas existem jazigos de chumbo, e não se compreende já, sobretudo considerando o preço actual, uma importação tão elevada deste metal, sem aparente contrapartida na exportação.
Os minérios portugueses de chumbo contem, em geral, prata e ouro, e parece serem de teor e em quantidade suficiente para .permitir indústria remuneradora.
Diversos metais de possível produção em Portugal precisam de ser cuidadosamente estudados, e entre eles convém mencionar o antimónio, que existe em pequenos jazigos espalhados pelo País; o crómio, já objecto de exploração; o manganês, sujeito a estudos actualmente, e outros de menos importância, mas susceptíveis de em conjunto, exercer influência na balança comercial, como o tungsténio. Parece, além disso, haver campo para a exploração de produtos do bário, de feldspatos e de várias substâncias minerais de interesse.

Produtos químicos

29. Outra verba importante que todos os anos sai do País é a que se destina à compra de produtos químicos como matéria-prima das indústrias nacionais. Saíram 271:180 contos em 1946 para seu pagamento e haviam saído 115:633 contos em 1938. O peso em cada um destes anos elevou-se, respectivamente, a 96:997 e 109:377 toneladas.
As cifras são muito baixas se considerarmos que em produtos químicos se encontram adubos de alta importância para a lavoura, como o sulfato de amónio, o cloreto de potássio e os nitratos, que não puderam ser importados em quantidades suficientes em 1946. Também há na longa lista das importações produtos que são a base de muitas indústrias essenciais, como a soda cáustica, diversos ácidos, sais, óleos e óxidos de diversa natureza.
Não é possível dar uma perfeita ideia do que representa esta rubrica das importações na economia nacional. A fim de esclarecer o assunto, publica-se a seguir, no quadro XXII, uma lista dos produtos que em 1946 se cifraram em mais de 1:000 contos. A sua natureza e variedade mostram as possibilidades internas.

QUADRO XXII

Importação de produtos químicos

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Tabela na Imagem]

A larga lista que acaba de se transcrever não diz ainda a importância que pode vir a ter uma indústria química convenientemente organizada.
Na rubrica «Outros produtos» inclui-se grande número de artigos de interesse na vida económica e obtidos como subprodutos de indústrias já existentes ou derivados de matérias-primas nacionais. Mas a organização de uma indústria desta natureza não é coisa fácil e necessita de conhecimentos técnicos bastante especializados, que ainda se não adquirem entre nós. Para neutralizar a importação de produtos químicos que não podem ser fabricados dentro do País, em virtude do seu fraco consumo e alta especialização, há vantagem em explorar as probabilidades de êxito de certas indústrias.
A energia sobrante dos aproveitamentos hidroeléctricos em curso e de outros que venham a explorar-se deve ser utilizada na electroquímica. Portugal pode seu um país exportador de alguns dos produtos incluídos na actual lista das importações, além de se abastecer a si próprio, e o caso da soda cáustica é típico.
A pequena utilização de adubos azotados foi sempre uma das grandes deficiências da agricultura nacional e concorre para o seu fraco rendimento em muitos aspectos. Não há motivos que se oponham ao consumo de 100:000 toneladas ou mais de adubos azotados.
Está em construção uma fábrica de sulfato de amónio e em projecto uma outra de grande capacidade. É natural que dentro de alguns anos o problema dos adubos azotados esteja resolvido no que diz respeito às necessidades quantitativas da agricultura - mas nunca deve ser esquecido que a resolução do problema implica baixa do preço do adubo e que erros cometidos que tendam a elevar esse preço de custo se reflectem gravemente na produção agrícola. As mesmas considerações se podem fazer para outros adubos azotados, como a cianamida cálcica e os nitratos.
Há casos, no capítulo dos produtos químicos, que mereciam ser vistos com maior largueza, proibida pela índole deste estudo. Aqueles que dizem respeito à exportação de matérias que, uma vez transformadas no estrangeiro, voltam à origem na sua forma de utilização, como os sarros do vinho e os tartaratos, mereciam ser considerados à luz da possibilidade da introdução da indústria transformadora dentro do País.
Antigamente, em 1938, o principal fornecedor de produtos químicos era a Alemanha, que conseguia manter em todo o Mundo a hegemonia em indústrias desta natureza. Hoje a Inglaterra e os Estados Unidos enviam quase 80 por cento do consumo nacional, seguidos logo pela Bélgica e Suíça, e em menor escala pela Noruega e Suécia, no caso da cianamida cálcica e nitrato de amónio. O potássio vem de Espanha e os óleos essenciais para perfumarias são importados da França, além de outros pontos.
O sulfato de amónio em 1946 veio todo da Bélgica. Os principais fornecedores antes da guerra eram a Alemanha e a Inglaterra.
Os produtos químicos e substâncias medicinais importaram em cerca de 38:000 contos, nos quais se encontram incluídos um pouco mais de 2:300 para sulfamidas e perto de 2:000 de vitaminas.
Nos produtos químicos para as indústrias há 2:708 contos para curtimento de peles e 6:121 para estampagem, tinturaria e acabamento de tecidos, além de outros de vária natureza. Quase tudo veio dos Estados Unidos, Inglaterra e Suíça.

Diversas matérias-primas

30. No último capítulo das matérias-primas, que a estatística designa por «Diversas», incluem-se alguns produtos importantes, como a cera em bruto, os extractos tintórios e tanantes, pastas, plásticos (que começam a ter grande relevo na indústria) e mercadorias de vária proveniência usadas em navios nacionais, importadas em regime especial, que incluem carvão, óleos combustíveis e outros, no total de 51:336 toneladas, ou 37:365 coutos, em 1946.

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As principais mercadorias que se inscrevem neste capítulo são:

QUADRO XXIII

Importação de diversas matérias-primas

[Ver Quadro na Imagem]

Dentre as mercadorias mencionadas ocupam lugar de relevo as tintas, que consistem especialmente em anilinas. Não há-de ser fácil fabricar certos produtos desta categoria dentro do País, mas parece ser possível alargar a produção interna em outros. A influência da guerra pode ver-se pelos valores unitários: sendo metade o peso das mercadorias, é contudo o dobro o seu valor total.

II

Produtos têxteis

31. O vestuário e os artigos correlacionados com o emprego de fibras consumidos no País são hoje fabricados em grande parte pela indústria nacional.
No começo deste século, em 1900, a parte que lhes competia na importação era superior a 10 por cento. É em percentagens superiores se mantiveram as importações até cerca do fim da sua terceira década. Mas as coisas melhoraram muito a partir de 1930 e a percentagem foi sucessivamente baixando, até atingir já menos de 5 por cento.
Para ter ideia do progresso realizado neste aspecto, publicam-se a seguir números de interesse no quadro XXIV:

QUADRO XXIV

Importação de fios, tecidos, etc.

(Contos-ouro)

[Ver Quadro na Imagem]

As indústrias têxteis, como assinalam os números, parece terem feito progressos importantes em matéria de abastecimento do País. Isto não quer significar que hajam porventura progredido técnica ou econòmicamente, porque bem pode acontecer que a protecção pautal seja de molde a impedir toda a espécie de concorrência. Mas isso na verdade também aconteceu, sobretudo nos últimos tempos.
Da importação total no começo do século XX competiam perto de 10 por cento aos fios, tecidos, feltros e outros artigos têxteis, e ainda em 1925 era de 11,5 por cento essa percentagem. Mas no começo da guerra a indústria abastecia quase totalmente o País e já exportava em grande escala para os domínios de além-mar. Apenas se importaram em 1938 menos de 5 por cento do total, bastante menos em valor absoluto do que em 1900. E em 1946 a percentagem não atingiu 4 por cento.
Considere-se que neste longo espaço de tempo a população teve o acréscimo de mais de 2.500:000 pessoas, que o seu nível de vida melhorou consideràvelmente e que as exportações para as províncias ultramarinas aumentaram muito, como se verificará adiante no respectiva capítulo. Isto significa, na verdade, não só o alargamento da capacidade produtora, como também progresso apreciável na qualidade dos produtos.
É impossível, infelizmente, dar ideia da evolução do quantitativo da produção nacional de produtos têxteis. Não é fácil obter números aproximados nem determinar sequer a qualidade dos artigos e da maquinaria instalada.
Só bastante recentemente se obtêm números para a produção e para o tipo de maquinaria utilizada e já hoje, com relativa aproximação, se pode fazer ideia das instalações, principalmente para as duas indústrias mais importantes, que continuam a ser a cios algodões e a dos lanifícios.
Neste aspecto são precisos certos comentários.
Ainda há máquinas do tipo manual, sobretudo teares, que precisam de ser substituídas, e certas operações em algumas fábricas praticam-se em condições rudimentares.

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Conviria agora que se procurasse, por intermédio dos organismos associativos, reorganizar a indústria, atendendo à necessidade impreterível de aproveitar melhor a mão-de-obra que é precisa para outros misteres e outras indústrias, e adoptar processos que assegurem melhoria importante na qualidade dos produtos. Só a racionalização em termos e regras práticas o pode conseguir.

32. No começo do século eram os artigos de algodão que pesavam mais fortemente na balança comercial, na parte relativa a produtos têxteis. Ainda em 1925 se importaram 5:886 contos-ouro de artigos de algodão, num total de 13:152 contos de produtos têxteis, ou bastante mais de 40 por cento. Vinham a seguir os lanifícios, os artigos de seda e os de linho.
Mas as coisas modificaram-se bem depressa. As sedas começaram a suplantar os lanifícios nas importações quase desde o começo do século. A partir de 1930 aproximaram-se dos produtos de algodão e ultrapassaram-nos a partir de 1940. Hoje as sedas têm já um lugar muito importante na importação de produtos têxteis. Isto deve ter sido devido em parte ao enorme desenvolvimento tomado, de 1930 para cá, pelo gosto das sedas artificiais, mais baratas do que as naturais e que concorrem fàcilmente em certos casos com o próprio algodão. A indústria nacional não se encontrava apetrechada convenientemente para este novo tipo de produção.
A influência da seda começa a pesar bastante na balança comercial e há vantagem por isso de estudar o assunto, porque não é impossível suprimir a sua influência ou, pelo menos, reduzi-la muito.
A indústria em 1946 fez esforços no sentido de melhorar o fabrico, e entraram em laboração, já no ano de 1947, fábricas que hão-de certamente influir na redução das importações.
Por diversos produtos têxteis, mencionados com 1:461 contos-touro na importação de 1946 e 523 na de 1938, entende-se uma grande variedade de artigos. Mas os que na verdade pesam por bastante mais de metade são os sacos e fardos acondicionando mercadorias. De um total de 65:708 contos de diversos em 1946, competiam àquela rubrica 42:527, e destes quase metade vinha dos domínios ultramarinos sob a forma de sacaria.

33. A industrial têxtil é, sobretudo, deficiente na fiação. As maiores importações dizem respeito a fio. A importância desta verba varia: é maior nas sedas e menor nas lãs e linho.
Contudo, valeria a pena tomar medidas no sentido de resolver o problema do fio de seda. Se se subtrair do total das importações dos produtos têxteis o que se inclui em diversos, que, como se viu atrás, representa em grande parte o acondicionamento de mercadorias que entram no País, como açúcar e outras, verifica-se que os fios andam por quase metade da importação em 1938 e 1946.

[Ver Tabela na Imagem]

A Percentagem de 45 aplica-se a todos os fios: aos de lã, seda, algodão e linho. Mas, por muito, são os de seda que ocupam o primeiro lugar - bem mais de metade em 1946 (68:436 contos, num total de 92:665) e sensìvelmente metade em 1938 (20:819, num total de 39:007).
Vê-se, pois, haver necessidade de cuidar da produção de fio de seda dentro do País. Em geral é se atraído pela indústria mais rendosa e de menor responsabilidade técnica ou de organização mais fácil. E a indústria do fio de seda não é simples. Mas, como actualmente se encontram as coisas, o País depende de possíveis cartéis estrangeiros. Seria por isso vantajoso cuidar de um assunto que tem grande importância na indústria têxtil e parece notar-se indícios, e até orientações práticas, no sentido de solucionar mais este problema.
De uma resolução conveniente derivaria economia sensível na importação.
Outra questão relacionada com esta indústria é a da seda natural, da produção do fio entre nós. O cultivo de amoreiras e a criação do bicho da seda foi no passado uma lide caseira no nordeste do País. Porém, morreu ou quase que morreu. Constituiu-se uma escola, ou posto agrícola, com o objectivo de a amparar, mas nada produziu de útil na matéria que fora a base da sua instituição. Hoje pouco ou nada se faz no sentido de produzir internamente o bicho de seda indispensável para a indústria da seda natural. E é pena, porque o assunto tem grande interesse económico e social e nunca se devem perder tradições deste género, porque é sempre possível obter delas, sem grande esforço, um auxílio precioso para magros orçamentos caseiros.
Os produtos têxteis foram durante muitos anos uma preocupação dominante na política internacional do País. Em parte, as nossas relações com certos povos europeus, até em épocas recuadas da História, assentavam na exportação para Portugal de produtos têxteis em troca de géneros portugueses, como o vinho e outros. Assim se criaram permutas de interesse, como as que tiveram lugar com o Reino Unido e a Flandres. A importação destes produtos decaiu com o desenvolvimento da indústria nacional; contudo ficaram certas exportações que ainda hoje amparam em grau apreciável a balança comercial portuguesa.

34. Não se deram grandes modificações na relatividade dos países exportadores de produtos têxteis para Portugal no período de 1938-1946. A Inglaterra perdeu, porém, o primeiro lugar a favor da Suíça, que em 1946 foi o principal fornecedor de sedas, com 53:907 contos, num total de 105:359. Os Estados Unidos, que mandaram para Portugal apenas 1:675 contos de produtos têxteis em 1938, elevaram a sua comparticipação para 23:133 em 1946.
Pode esquematizar-se o abastecimento de fios, tecidos e outros produtos têxteis, por países, para os dois anos do modo que segue:

[Ver Tabela na Imagem]

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III

Produtos alimentares

35. Os produtos agrupados sob a designação de substâncias alimentícias constituem, logo a seguir às matérias-primas, a classe mais valiosa das importações. A sua influência na balança comercial não é de agora. Já em 1900 se fazia sentir, pois constituíram nesse ano um quarto, em valor, do total das importações. Em 1946, no total importado de 150:000 contos (ouro), cerca de 21 por cento era formado por substâncias alimentícias. As principais, em tonelagem, são os cereais - trigo e milho - e o açúcar, e em valor os cereais, o açúcar e o bacalhau somam, quase sempre, bem mais de metade do total das importações.
O quadro seguinte, expresso em toneladas, dá ideia da importação destes produtos desde 1900:

QUADRO XXV

Importação de substancias alimentícias

[Ver Quadro na Imagem]

No exame dos números relativos a importações não deve dar-se excessiva importância aos que correspondem a um só ano. As médias de séries de anos consecutivos exprimem mais claramente o fenómeno económico.
Isto aplica-se de um modo geral a todos os tipos de importação, mas no caso de substâncias alimentícias tem muito maior relevo.
O que pesa mais fortemente na balança comercial, em volume, é o trigo, e nos últimos tempos o milho adquiriu posição que a afecta sensìvelmente.
Ora as importações de trigo e também as de quase todos os farináceos de trigo dependem muito da produção interna, como é natural, e aliás se prova com os anos de 1932, 1934 e 1935 e outros de grande produção.
Deveriam, pois, tomar-se séries de anos (quatro ou cinco), e comparar médias, para mostrar com bastante maior realidade o fenómeno. Mas não há números para a produção desde o começo do século até próximo de 1930, e é principal objectivo apenas neste apanhado do comércio externo dar ideia geral do sentido das necessidades internas no conjunto - de modo a determinar nos últimos cinquenta anos a origem do desequilíbrio da balança comercial.

Os farináceos

36. Em tonelagem os anos de menor importação de substâncias alimentícias foram os de 1902, com 135:646 toneladas, das quais corresponderam cerca de 70:000 a farináceos, incluindo cereais, no valor-ouro de 2:261 contos para o total de 8:303 no ano e o de 1918 com 112:576 toneladas, das quais 61:700 eram farináceos.
Os anos de 1935, 1936 e 1937 marcam baixos níveis de importação de farináceos, com, respectivamente, 92:000, 57:800 e 53:300 toneladas, os mais baixos neste longo período de quarenta e seis anos. Os valores que lhe corresponderam foram de 1:535, 1:042 e 926 contos. Em 1936 foi até levada a efeito, talvez pela primeira vez na história económica dos últimos cem anos, uma exportação de 110:000 toneladas de trigo.
Houve períodos, como o de 1928, em que as importações de farináceos atingiram 553:000 toneladas, no valor de 29:440 contos-ouro para um total de 37:162. Em 1928, cerca de 80 por cento do valor da importação de substâncias alimentícias são representados por farináceos.

Consumo do trigo

37. A verba mais importante que quase todos os anos pesa nos farináceos é a do trigo. As quantidades importadas variam muito de ano para ano, tendo descido em 1937 a cerca de 2:300 toneladas e atingido em 1944 mais de 367:000.
Não é fácil determinar o consumo de trigo no País, e já diversas, tentativas se fizeram com esse objectivo. Talvez que a melhor solução para o problema esteja no uso dos manifestos feitos na Federação Nacional dos Produtores de Trigo ou dos números do Instituto Nacional de Estatística, acrescidos de uma percentagem que corrija as faltas de pequenos agricultores ou de cultivadores que não declararam o trigo que produziram, tudo relacionado com a importação. O assunto foi cuidadosamente ponderado e parece que o acréscimo da percentagem de 5 por cento no período compreendido entre 1934 e 1939, antes da guerra, e 10 por cento nos anos de guerra, aproxima mais da verdade as declarações feitas àquele organismo. Foi baseado nos números da Federação, acrescidos de 5 e 10 por cento, que se organizou o quadro XXVI.

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QUADRO XXVI

Consumo do trigo

(Toneladas)

Números da Federação Nacional dos Produtores de Trigo acrescidos de 5 por cento e 10 por cento respectivamente nos quinquénios de 1934-1938 e 1939-1943

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Manifestos da Federação Nacional dos Produtores de Trigo acrescidos de 5 por cento.
(b) Manifestos da Federação Nacional dos Produtores de Trigo acrescidos de 10 por conto.

Parece ter havido muito maior consumo de trigo depois do começo das hostilidades, o que tal vez se justifique por maior poder de compra da população, pela transferência para trigo de muitos consumidores de milho e centeio e ainda por virtude de maior população flutuante no período da guerra. A tendência para o aumento do consumo continua a manifestar-se nos anos de 1945 e 1946, e neste último há que contar com a importação em larga escala dos Estados Unidos de farinhas para caldos e para pão e de massas para sopas. Se tivessem sido considerados nos números as produções e importações de outros cereais talvez se encontrassem as razões das anomalias notadas, mas isso não é fácil por falta de elementos seguros.
Em 1940 a estatística agrícola apresentou os dados seguintes para consumo de trigo:

Períodos: Toneladas

1916-1925 ............. 359:970
1926-1935 ............. 489:223
1935-1943 ............. 390:426

Se estão certos os números da Federação e os das importações, parece não estarem de acordo as estimativas atrás mencionadas.

38. Os distritos produtores de trigo são os do Alentejo e em muito menor escala os de Lisboa, Santarém, Setúbal, Faro, Castelo Branco e Bragança.
As produções unitárias são das mais baixas da Europa. Segundo uma estimativa da Sociedade das Nações, apenas as da Grécia eram inferiores às de Portugal na produção por hectare, que se computa em 700 quilogramas.
Este baixo rendimento parece ser devido a três causas fundamentais: deficiência dos solos, condições climáticas desfavoráveis e cultura extensiva. «A intensificação da cultura tem de ser vista não só como meio de resolver os nossos deficits em trigo, mas como maneira segura de estabilizar as produções através dos anos», escreveu um especialista em 1936 1.
Mas muito pouco se tem feito neste sentido. E o rendimento por unidade de superfície continua a ser baixo.
Segundo os dados da estatística agrícola, só nos anos de 1934, 1935 e 1939, desde 1929, a produção foi superior a 1:000 quilogramas por hectare. Em quatro anos, nos quinze assinalados, a produção mostra-se inferior a 700 quilogramas, chegando a atingir a casa dos 500 em três desses anos.
Se fosse possível obter a produção anual média de 1:000 quilogramas, que é inferior à da grande maioria dos países europeus, os 500:000 a 600:000 hectares anualmente semeados seriam talvez suficientes para atender ao consumo interno. Ora apenas a Grécia, a Roménia, a Bulgária e a Espanha (960 quilogramas) têm, na Europa, produções médias inferiores a 1:000 quilogramas por hectare. Nalguns países, como a Bélgica, a Holanda, a Inglaterra, a Suécia, a Suíça, o rendimento médio é até superior a 2:000 quilogramas.
Apesar de as circunstâncias serem consideradas adversas em certos aspectos, parece urgente fazer esforços no sentido da intensificação da cultura, de modo a poder elevar o rendimento.
A fraca produtividade do trigo afecta profundamente a vasta região do Alentejo, que é o principal produtor daquele cereal. E as crises naquela província têm repercussões sérias na economia geral.
O problema do Alentejo, ou, antes, o problema do aumento da produtividade dos solos alentejanos, aparece assim como uma das mais sérias questões da economia agrícola - porque os três distritos de Portalegre, Évora e Beja, com alguns concelhos do de Setúbal e de Santarém, ocupam uma área importante e são escassamente povoados em muitas zonas. Continuar a cultura extensiva do trigo nas condições actuais é certamente

1 «Ensaios de intensificação cultural do trigo», Revista Agronómica, XXIV - Lisboa, 1936, p. 369.

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um erro. E se for provado ser impossível a sua cultura intensiva por melhoria dos métodos usados agora, ou, ainda neste caso, se não for viável obter maiores produções por unidade de superfície, então parece ser essencial adoptar outros tipos de exploração da terra que assegurem maior rendimento económico.
Já noutro lugar se apontaram as possibilidades de maiores culturas de regadio 1. Mas elas serão certamente impossíveis, com a densidade actual da população e com o regime de grande propriedade que existem nos três distritos alentejanos.
A questão da produtividade dos terrenos do sul do Tejo parece estar ligada à cultura intensiva, à parte outros aspectos que dizem respeito ao progresso agronómico, ao parcelamento e à rega e, consequentemente, ao acréscimo substancial na sua população. Esse acréscimo parece ser essencial para o progresso futuro do País.

39. Para se ter melhor ideia da distribuição geográfica do trigo nos distritos do continente publicam-se a seguir as produções para as diversas regiões do País, conforme os manifestos oficiais:

QUADRO XXVII

Produção de trigo

(Milhares da toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

O distrito maior produtor de trigo é o de Beja, seguido pelos de Évora e Portalegre. Os três juntos representaram sempre, pelo menos desde 1934, mais de metade da produção total do País. Os distritos de Lisboa, Santarém, Setúbal e Faro, vizinhos do Alentejo, são os que vêm a seguir na produção, mas afastam-se muito, isoladamente, de qualquer dos alentejanos.
Portalegre produz sensivelmente o mesmo que Faro, Castelo Branco e Bragança, reunidos, e as produções de Santarém, Lisboa e Setúbal, juntas, assemelham-se à de Évora. As colheitas de Beja são sempre bastante maiores do que as de cada um dos grupos acima apontados - e são mais ou menos, em quase iodos os anos, um terço da colheita total do País. Os restantes distritos pouco produzem - quase sempre menos de 5 por cento.
A fim de tornar clara a posição do Alentejo na cultura trigueira, dão-se a seguir as percentagens da sua produção anual e as do resto do País.

QUADRO XXVIII

Percentagens da colheita de trigo

[Ver Quadro na Imagem]

1 Parecer das Contas Gerais do Estado de 1945, pp. 213 e seguintes (separata).

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É notável a semelhança das (percentagens da produção de triga no Alentejo em relação ao resto do País. Anda, nos treze anos examinados, à roda de 60 por cento. Só em 1945 desceu a 56,8 por cento.
No ano da máxima percentagem do Alentejo - o de 1942 - ela não vai além de 64,5 por cento, que é, contudo, vizinha de dois terços da produção total.
Nos anos que se seguiram a 1934 o distrito com maiores colheitas depois dos do Alentejo foi Santarém, mas nos últimos anos, a partir de 1940, Lisboa suplanta-o quase sempre.
Os distritos de Setúbal e Faro têm produções da mesma ordem de grandeza em quase todos os anos a partir de 1936 - antes disso as de Setúbal eram sensìvelmente maiores.
Bragança produz mais do que Castelo Branco, mas um e outro só foram uma ou duas vezes além de 20:000 toneladas por colheita e a não ser nos anos maus, como os de 1936, 1937 e 1940, os produções oscilam entre 12:000 e 15:000 em cada um dos distritos.
O resto do País quase não conta.
A questão do trigo é essencialmente uma questão alentejana e está ligada à economia daquela vasta província.
Tem grandes reflexos na vida demográfica de todo o País, porque a cultura extensiva impede a intensificação populacional.
Os distritos alentejanos são os de menor densidade demográfica. Por isso ela é de fundamental importância para o País e urge estudá-la cuidadosamente.

Outros produtos farináceos

40. Mas, além do trago, as importações acusam elevada tonelagem de outros produtos farináceos. Entre eles merecem relevo especial os diversos tipos de farinhas e o milho em grão.
O quadro XXIX dá ideia, da importância dos farináceos na balança comercial em 1938 e 1946.

QUADRO XXIX

Importação de farináceos

[Ver Quadro na Imagem]

41. Os números apontados acima, indicativos da importação de substâncias alimentícias, exprimem, melancòlicamente, factos desoladores da nossa ineficiência agrícola.
Importaram-se 74:000 contos de batatas, mais cerca de 68:000 contos do que em 1938. Qual a razão?
É evidente que há dentro do País possibilidades vastas para a produção de batatas para consumo interno. Melhores culturas, mais aperfeiçoados meios de conservar o tubérculo e incentivos à produção são a base do desenvolvimento desta indústria agrícola - que aliás se pratica em quase todo o nosso território.
Contudo, o que se passou em 1947 indica não estar organizado o seu consumo.
A impressão que o exame das importações deixa é a de confusão. Não houve nina directriz que orientasse os importadores. E daí resultou considerável desequilíbrio comercial, em parte devido à compra de coisas que se poderiam dispensar ou adquirir em melhores condições.
Um dos casos mais salientes é o da importação de massas para sopas. Vieram em 1946 do estrangeiro 98:500 contos, ou 15:600 toneladas. Em 1938 a importação fora apenas de 77 toneladas, no valor de menos de 300 contos. E o exame do tipo de massas para sopas importadas mostra logo serem artigos de luxo. O caso da farinha para caldos é idêntico. De 172 toneladas em 1938, no valor de 651 contos, a importação em 1946 passou para 11:710 toneladas, no valor de 44:064 contos.

42. A importação de farináceos atingiu 412:730 toneladas, no valor de 952:409 contos, soma bastante alta para um país considerado essencialmente agrícola. Havia sido cerca de 45 por cento em tonelagem e 17 por cento apenas em valor em 1938.
Fomos tributários da América do Norte e do Sul de grande parte desta elevada soma, principalmente dos Estados Unidos, Argentina e Canadá. Da Europa vieram as batatas e da África algum milho, o feijão, e outros produtos de menor valia.
A origem dos farináceos é a seguinte: Angola manda-nos géneros pobres, milho, feijão e um pouco de arroz. Além do trigo, as mercadorias caras, como as massas para sopas, a farinha para caldos e a farinha de trigo, vêm principalmente dos Estados Unidos e, em menor quantidade, da Argentina, Canadá e Brasil. Com os produtos do trigo gastaram-se em 1946 as seguintes importâncias:

Contos

Farinha de trigo ............. 61:462
Farinha para caldos .......... 44:064
Massas para sopas ............ 98:748
Trigo em grão ................ 390:376
Total .......... 594:650

De produtos de trigo importaram-se neste ano 204:751 toneladas, das quais 156:050 eram trigo em grão, contra

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116:078 em 1938, sendo 113:915 deste cereal, também em grão. A diferença está nos vários tipos de farinha, que incluem, para ser estritamente exacto, alguns de origem diversa do trigo.
Os outros produtos farináceos vieram: da Dinamarca, Noruega e Holanda as batatas, de Angola o milho, o arroz e o feijão e do Brasil alguns tipos de farinha.
Mas em 1938 a Austrália, a África do Sul e a África Meridional Britânica e a Roménia exportaram para Portugal quantidades apreciáveis de cereais: trigo da Austrália (33:148 toneladas) e Roménia (1:858 toneladas), e milho da África do Sul (26:227 toneladas).
O salto na importação de farináceos entre os dois anos é enorme, tanto em tonelagem como em valor.
As diferenças entre as importações de trigo e milho não são suficientes para explicar tão brusco salto.
A diferença em contos é de 788:000 e em tonelagem de 228:000.
A simples leitura dos números mostra claramente a necessidade de fazer um esforço sério, há tantos anos preconizado, no sentido de elevar consideràvelmente a produção de substâncias alimentícias dentro do País.

QUADRO XXX

Origem das importações de farináceos

[Ver Quadro na Imagem]

As possibilidades da rega

43. Parece que a situação piorou muito durante o período da guerra ou, pelo menos, nos últimos anos.
Uma das razões deste grande desnivelamento na produção interna de substâncias alimentícias é atribuída às secas nos últimos anos, e na verdade isso também deve ter concorrido para a calamidade.
Mas por si só a explicação não é suficiente.
Parece estar sobejamente provada a necessidade de utilizar até ao máximo os nossos recursos aquíferos para rega e os programas de irrigação actualmente em curso têm sofrido grandes atrasos.
Aliás, se forem consideradas as exigências do País, em matéria de produção agrícola, e as suas possibilidades no que diz respeito à existência de águas, torna-se logo evidente que nos anos mais próximos não serão os planos de rega actualmente em execução que podem exercer influência decisiva, ou até sensível, no abastecimento do País.
Já se aduziram em apêndice aos pareceres das contas públicas as razões que levam a esta conclusão - e então se explicou, de um modo geral, que é indispensável cuidar sèriamente num plano de conjunto do aproveitamento, não apenas das águas dos rios ou ribeiros, em largos ou pequenos projectos de rega, mas também dá captação de águas subterrâneas, que, parece estar provado, podem servir de base à exploração intensiva de largas áreas, sobretudo a sul do Tejo.
Mas existem, embora não incluídas em programas oficiais, zonas importantes susceptíveis de ser regadas com proveito. E citou-se já noutro lugar o caso da Cova da Beira 1, numa área que do concelho de Belmonte se poderá prolongar até ao do Fundão. E se no plano de conjunto for incluída a ribeira da Meimoa, há indicações de que a área total será superior a 10:000 néctares de terrenos bons, a maior parte deles aluvionários, situados numa região povoada de gente que há longos anos pratica a rega.
Este projecto aproveitaria as águas do Zêzere e do Mondego nos cumes da serra da Estrela. A alta queda, que no conjunto se eleva a 900 metros em três escalões, poderia produzir, com 85.000:000 de metros cúbicos de água, cerca de 100.000:000 de unidades de energia estival, e a água logo a seguir seria aproveitada na rega da zona que acima se indica, depois de uma pequena retenção para a reserva diária ou até para energia se fosse considerada económica nova barragem no Zêzere.
Atacado com saber, este projecto poderia ser concluído ràpidamente e ajudaria a resolver dois importantes problemas: o da energia estival, que é essencial DOS novos planos de electrificação, e o da rega de uma zona rica que vive hoje à mercê de contingências de chuvas e que poderia fàcilmente aumentar muito o seu rendimento em substâncias alimentícias, como milho, gados, hortaliças, forragens e frutos.
Esta ideia foi já posta nos pareceres das contas. Está agora em estudo, com licença concedida muito recentemente, o projecto de ligação Zêzere-Mondego, no alto da serra. Mas parece não ter sido ainda considerada a possibilidade de aproveitar a água na rega da Cova da Beira depois de lançada no verão do alto da serra.
Haverá projectos semelhantes em que se combinem harmoniosamente as possibilidades hidroeléctricas e da rega? Será possível resolver definitivamente esta questão, tantas vezes tratada nestes pareceres, de fazer um estudo circunstanciado das possíveis combinações de projectos de rega e energia que em muitos casos levam, ou podem levar, ao barateamento da electricidade e da água para irrigação, visto os custos se distribuírem por duas utilizações económicas?

Pescarias

44. Das outras substâncias alimentícia destacam-se as pescarias, que consistem em grande parte no bacalhau. A importação total de pescarias em 1946 andou à roda de 19:747 toneladas, no valor de 185:642 contos, dos quais pertencem ao bacalhau 172:229.
O resto é preenchido por peixe que veio principalmente de Angola, no total de 4:394 contos, e por outro não especificado que importou em 9:019 contos.
A questão do abastecimento de bacalhau tem sido atacada de frente de há uma dezena de anos para cá; e os números do comércio externo relativos a 1946 representam apreciável economia sobre os anos anteriores à guerra.

O bacalhau

45. Houve grande decréscimo na importação de pescarias desde 1900, pelo menos em tonelagem. De 25:110 toneladas passou para 19:747, depois de ter atingido um mínimo, por efeito da guerra, que foi de 10:661. Mas ainda no ano anterior ao conflito, em 1938, a importação de pescarias havia sido de 43:881 toneladas,

1 Ver Parecer das Contas Gerais do Estado de 1945, p. 229.

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das quais pertenciam ao bacalhau 43:048, número parecido com o de 1926, que foi de 43:803 toneladas.
A diminuição no consumo de bacalhau que os números assinalam não é certamente devida apenas à guerra. Deve também derivar da elevação gradual do preço, que o torna cada vez menos acessível às classes mais pobres. E isso será um bem se este alimento for substituído por outro de mais valor nutritivo e higiénico, como peixe fresco, obtido tia pesca costeira. Mas os números de 1947 hão-de trazer nova subida.
Tem havido sensível progresso no quantitativo de bacalhau pescado por navios nacionais. A indústria desenvolveu-se bastante nos últimos tempos e a frota nacional aumentou muito.
Os navios portugueses pescaram 9:569 toneladas em 1938, quase o dobro de 1934. Neste ano a pesca havia sido de 4:528. Houve aumento na pesca a partir de 1938. Os números em toneladas reduzidos a bacalhau seco, para a importação, pesca nacional e consumo provável, são os seguintes l:

QUADRO XXXI

Consumo provável de bacalhau

[Ver Quadro na Imagem]

Assinalam-se no quadro duas coisas muito importantes e ambas benéficas. A primeira é o constante aumento da pesca nacional.
A média pescada no quinquénio 1939-1943 foi quase o dobro da do quinquénio anterior: 14:753 toneladas, contra 7:517. E, apesar das dificuldades, o progresso aumentou.
A segunda é a baixa contínua na importação, que do número máximo de 49:106 toneladas, em 1936, desceu para 16:333, em 1946. A média da importação passou de 39:244 toneladas para 16:341.
Estas modificações tiveram sensíveis reflexos no consumo e na exportação.
Se os números dizem a verdade, o consumo deve ter diminuído para cerca de 33:000 toneladas no quinquénio 1940-1944. E não parece ter aumentado depois da guerra, dada a baixa importação.
Esta baixa no consumo, se, como acima se disse, for acompanhada pela substituição do bacalhau seco por peixe fresco, parece dever ser um bem, no dizer dos higienistas. Em todo o caso, o preço deve já hoje limitar o consumo deste alimento, que não pode ser extensivamente utilizado por todas as classes.

Diversas substâncias alimentícias

46. Além dos farináceos e das pescarias, importam-se variados alimentos, de origem ultramarina ou de outras, que pesam sensìvelmente na balança comercial. Os mais importantes são o açúcar, os óleos alimentares, as especiarias, o chá e o café, o cacau e, ùltimamente, a carne e a manteiga.
O quadro XXXII exprime a importância destes produtos nos anos de 1938 e 1946.

QUADRO XXXII

Importação de diversos produtos alimentares

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que o açúcar é de todos o mais importante, embora seja ainda muito baixo o seu consumo em Portugal. Vinha todo, pràticamente, dos domínios ultramarinos. Mas em 1947 houve importações de outras proveniências, o que é, seguramente, um mal.
A média da importação de açúcar em 1930-1939 foi de 68:841 toneladas, no valor de 80:267 contos, e no quinquénio 1940-1944 subiu para 73:608 toneladas, no valor de 106:318 contos. A importação de 194o desceu para 72:536 toneladas, mais baixa que a média do quinquénio anterior. A subida de 1946 não representa progresso sensível, nem em relação ao ano anterior nem ao de 1938.
O País deve estar preparado para muito maiores importações de açúcar, que é alimento de alto valor calorífico, porque o consumo actual ainda é muito pequeno.
A importação de perto de 1:000 toneladas de azeite em 1946 teve contrapartida na exportação para o Brasil.
O País, depois de abastecido, tem possibilidades de exportar logo que entrem em produção as grandes plantações feitas nos últimos tempos.
Há ainda duas mercadorias incluídas na lista acima transcrita com tendência pira grande aumento, que são as carnes e as forragens, uma e outra ìntimamente relacionadas.
A questão das carnes tem sido muito discutida ùltimamente, e a sua importação acentuou-se em 1947. Se não for convenientemente estudada e resolvida, ameaça

1 Revista do Centro de Estudos Económicos n.º 2, p. 166

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ser dentro em pouco um grande peso na balança comercial. Quase não se sentia no período anterior à guerra - e tudo indica haver possibilidades para alagamento da criação de gados de modo a que o País se baste a si próprio.
Se as indústrias derivadas das oleaginosas se desenvolverem dentro do País, como é vantajoso, a produção de carnes pode alargar-se simultâneamente em escala apreciável.
As forragens vieram quase todas do ultramar português e representam géneros impróprios para alimentação humana.

IV

Equipamento mecânico e eléctrico e transportes

47. Dentro desta classe cabem muitas mercadorias que têm reflexos importantes no apetrechamento económico do País. Incluem-se nela ferramentas, máquinas, utensílios, instrumentos e o que se relaciona com os transportes terrestres, aéreos e marítimos.
Apesar da vasta importância e das necessidades da economia nacional neste aspecto, as importações não revestiram em 1946 carácter digno de relevo, a não ser nos veículos. No total elas elevaram-se a 91:258 toneladas, no valor de 1.223:348 contos. Em 1938 haviam totalizado 27:846 toneladas, no valor de 381:112 contos.
Os números parecem mostrar progresso considerável na aparelhagem mecânica, mas a sua decomposição revela que esse progresso é bem menor. Com efeito, repartindo o total por diversas mercadorias de natureza mecânica e transportes, obtêm-se para os dois anos os números indicados no quadro XXXIII.

QUADRO XXXIII

Importação de maquinas e ferramentas para a indústria e transportes

[Ver Quadro na Imagem]

A comparação pormenorizada dos dois anos revela que os gastos no apetrechamento mecânico do País foram proporcionalmente maiores em 1938 do que em 1946.
Neste último ano as embarcações e veículos totalizam perto de 60 por cento do total, enquanto que no primeiro pouco passaram de 40 por cento.
Há-de ver-se mais adiante, com certa minúcia, que esta grande diferença foi devida sobretudo à importação de automóveis de carga e de passageiros, e quando, em apêndice, for dada ideia geral do comércio externo de 1947, notar-se-á que neste ano a importação de veículos para passageiros excedeu ainda por muito o que se presenciou em 1946.
O sintoma não é bom. Indica um gosto desmedido pelo uso de coisas que não interessam directamente à economia do País e que deveriam ser banidas no momento grave que atravessamos.
Para dar ideia do que se contém no capítulo relativo à mecanização e electrificação do País, publicam-se os números para 1938 e 1946.

QUADRO XXXIV

Importação de máquinas, aparelhos e utensílios para a indústria

[Ver Quadro na Imagem]

48. O exame do quadro revela que não avançou muito o País em matéria de equipamento industrial no primeiro ano que se seguiu à guerra.
As importações que mais poderiam concorrer para isso estão incluídas nos «Aparelhos e máquinas agrícolas e industriais», ou cerca de 240:000 contos, na de «Geradores, motores, e transformadores eléctricos e geradores de vapor», com pouco mais de 36:000, e talvez nus «Peças metálicas, separadas, para maquinismos», no total de cerca de 43:000 contos.
Ainda podem ter tido certa influência os instrumentos e ferramentas (23:600).
Houve, é certo, dificuldades na compra de máquinas industriais. As casas fornecedoras, cheias de encomendas, só a prazos largos podem fornecer instalações de

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carácter industrial. Mas o exame em minúcia revela que muito maior poderia ter sido a importação.
Nos 236:246 contos relativos a máquinas industriais as verbas mais salientes dizem respeito a 1:041 teares para a indústria têxtil, que também importou 48 bobinadeiras, 33 caneleiras e outros acessórios, e 313 contos a máquinas de fazer malha. Também tem interesse, embora restrito, consideradas as necessidades do País, os motores a óleos e gasolina, as máquinas, ferramentas, os transformadores e, em menor escala, as turbinas.
O País tem diante de si um pesado fardo em matéria de saídas de cambiais para fins de equipamento agrícola e industrial. Deve subir, o que é preciso, a milhões de contos, e, tendo em conta os deficits de 1946 e 1947, não se vê bem como há-de ser satisfeita essa exigência se persistirem os métodos de importação que têm prevalecido até agora. Duas ou três centenas de milhares de contos para apetrechamento agrícola e industrial em 6.800:000 contos parece mostrar indecisão ou falta de estudos ou de orientação prática em matéria de elevado alcance nacional. E como a sorte do País está ligada, em alto grau, ao rendimento dos seus instrumentos económicos, a persistirem nos anos próximos as condições de 1946, não se augura bem do futuro.
A comparação entre os dois anos de 1938 e 1946 mostra que houve apenas no conjunto uma diferença de 1:200 toneladas, embora seja mais do que o dobro a diferença no quantitativo em contos.
Houve casos, alguns importantes, como o de peças metálicas para maquinismos, o de tractores e locomoveis, em que, em tonelagem, foram menores as importações em 1946. E tanto num como noutro destes dois anos há motivo para tirar melancólicas conclusões.
Mas o que na verdade é para admirar é a indiferença em matéria de equipamento de laboratórios. Importaram-se para esse efeito em 1946 apenas 614 contos, perto de 7 toneladas, não incluindo obras de vidro.
Bastas vezes se acentuou nos pareceres das contas públicas a triste carência dos laboratórios nacionais, tanto nos que servem ou deviam servir para instrução dos alunos dos cursos superiores e secundários como nos particulares.
Acentuou-se diversas vezes, com calor e fortes razões, que a experiência confirma em todo o Mundo a imperiosa necessidade de modificar profundamente o ensino laboratorial e de criar condições de trabalho eficientes aos bolseiros que todos os anos o Estado manda, ou devia mandar, para os centros mais avançados de estudo.
Parecia que tanto o Ministério na Educação Nacional como outros departamentos públicos deveriam já hoje possuir os elementos necessários para o equipamento dos laboratórios e que depois da guerra haveriam de ser encomendados os aparelhos e instrumentos essenciais.
Os números mostram nada disso ter acontecido.
Ora é preciso dizer mais uma vez o seguinte: não pode haver indústria eficiente, nem ensino racional nem técnico, nem até pessoal docente no ensino secundário e superior, sem trabalho laboratorial. Indústrias que podia a ser importantes não prosperam e há exemplos de que a simples introdução de um pequeno laboratório em certas fábricas imediatamente modificou as suas condições de fabrico. O caso do vidro neutro, que já hoje se exporta, é a prova singela da utilidade do controle dos processos de fabrico.
Geradores de vapor e alternadores, motores eléctricos e de combustão interna, turbinas e transformadores entraram na importação com pequena percentagem no conjunto. É verdade que já em 1946 se encomendaram máquinas de grande interesse para aproveitamentos hidráulicos em vias de realização, pagas em grande parte nalguns casos, ou com créditos abertos noutros, e que só à sua chegada se relacionarão na estatística.
Mas, apesar disso, as verbas que as importações de 1946 mostram são bem diminutas, sobretudo em matéria de motores e geradores.

Embarcações e veículos

49. Dos 724:000 contos, números redondos, importados em 1946 por esta rubrica, 312:443 pertencem a automóveis de passageiros, de carga e diversos, 123:500 foram gastos na compra de câmaras de ar, protectores e outros acessórios e 173:000 representam barcos de mais de 200 toneladas.
Os números que seguem indicam, sucintamente, as principais mercadorias importadas em 1946 e sua comparação com 1938:

QUADRO XXXV

Importações de embarcações e veículos

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Refere-se só às aeronaves.
(b) Não inclui as embarcações para uso desportivo.

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O exame, ainda que superficial, mostra ter havido em 1946 grandes importações de automóveis e vários de seus acessórios, como peças, câmaras de ar e protectores. O aumento em 1946 em relação a 1938, e em unidades, foi de 4:754, num total de 8:749. Nos automóveis destinados a pessoas incluem-se vários tipos.
A estatística destrinça-os pelo seu peso, conforme se verifica no quadro XXXVI, que segue:

QUADRO XXXVI

Automóveis importados, por categorias

[Ver Quadro na Imagem]

O acréscimo deu-se em elevado grau nos automóveis de carga, corça de 3:131, sendo o restante nos de passageiros, que também absorvem a pequena diminuição nas ambulâncias e carros de incêndio.
Dadas as dificuldades de importação durante o período de guerra e o desgaste sofrido pelos veículos nos anos em que ela durou, as importações de automóveis em 1946 não parecem exageradas, embora no total os números mostrem o grande aumento, que vai de 64:849 contos para 312:442.
O preço por unidade importada passou de 16 para mais de 35 contos.

50. Mas no ano de 1947 a importação continuou em muito larga escala e vieram para Portugal mais do dobro de automóveis de passageiros do que em todo o ano de 1946.
Esta tendência para a compra de automóveis, se se mantiver na escala dos últimos tempos, será extremamente ruinosa para a economia do País. Em nada ajuda a sua vida, já bem difícil. Vem, em contrário, causar danos em muitos de seus aspectos.
Não vale talvez a pena pôr em relevo os inconvenientes do excesso de consumo em automóveis - a gasolina e os óleos, os pneumáticos e as câmaras de ar, os acessórios e peças de diverso tipo e os materiais de vária natureza. Grande parte destes consumos dissipam-se - representam apenas a satisfação de desejos pessoais sem retribuição económica, traduzida em auxílio ao desenvolvimento material do País.
Não haveria muito a opor a essa, satisfação se as circunstâncias nacionais fossem prósperas, tanto em matéria de alimentação como de outras necessidades inadiáveis. Mas ninguém desconhece as condições actuais, tanto interna como externamente. Com uma balança comercial de elevado débito ao estrangeiro e dificuldades que crescem em cada dia, no que respeita a possibilidades de exportar, as importações de automóveis, sobretudo as que foram permitidas em 1947, e a sua intensa circulação, representam, em grande parte, um erro, que deveria ter sido evitado.
As medidas tomadas no princípio do 4.º trimestre deste ano vieram muito tarde e em pouco podem contribuir para resolver uma questão de grande importância e bem mais profunda. Em 1946 e até fins de 1947 o País importou automóveis assim repartidos:

QUADRO XXXVII

[Ver Quadro na Imagem]

Outra rubrica de importância em 1946 foi a dos navios, com perto de 180:000 contos. Começou neste ano a reconstrução da frota mercante.
Nos vinte e cinco navios com mais de 200 toneladas já se incluem unidades do programa de renovação da frota comercial, que ajudará sem dúvida o fomento das províncias ultramarinas e as relações entre elas e a metrópole.

Devem ter sido pagas neste ano grandes quantias em conta de outros barcos, que influirão na balança de pagamentos em grau mais elevado do que na balança comercial. É de lamentar, porém, que a verba adstrita a material circulante para caminhos de ferro se limitasse apenas a cerca de 50:000 contos, dadas as insuficiências bem conhecidas de todos. Ela inclui a compra de vagões, num total de 37:960 contos, quase todos nos Estados Unidos da América.

V

Manufacturas diversas

51. Nesta designação inclui-se grande número de mercadorias. Não seria difícil conseguir fabricar grande parte delas dentro do País para consumo interno e das províncias ultramarinas, além de possíveis exportações para o estrangeiro. Convém, para tornar mais clara a exposição de um assunto que é por natureza bastante

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complicado e até pode levar a confusões, discriminar, por capítulos, a origem tias mercadorias importadas, tendo em conta os materiais que as formam. Tomaram-
se em consideração os dois anos de 1938 e 1946, conforme se pode verificar no quadro XXXVIII, que segue, em contos e toneladas:

QUADRO XXXVIII

Importação de manufacturas diversas

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Armas do guerra não incluídas em 1946.

Para comparar os totais de 1938 e 1946 devem excluir-se do primeiro destes anos as cifras relativas a armas de guerra, que se não contém no de 1946. Na rubrica total estão as cifras comparáveis dos dois anos.
Um simples exame mostra que em 1938, em peso, se importou mais de manufacturas do que em 1946. A diferença principal deu-se na rubrica «Diversas» e nas obras de matérias vegetais. Adiante se discriminam as mercadorias.
É talvez de surpreender que não seja maior o peso das mercadorias manufacturadas vindas de fora, sobretudo se for levada em linha de conta a variedade dos artigos que se incluem nesta classe. Isto até certo ponto mostra que existe já dentro do País uma variedade de indústrias interessantes.
Sabe-se que muitas delas vivem à sombra de forte protecção pautal, que é consequência imediata do seu rudimentarismo em muitos casos.
Tá se disse noutro lugar que o atraso em certas actividades fabris e sua protecção leva a dois graves inconvenientes. Um, que é de natureza económica, torna caro o produto - porque dentro de uma indústria o preço de venda adapta-se sempre à protecção pautal -, e, se esta é excessiva por haver indústrias rotineiras, é alto o preço em comparação com outros no exterior. E não se fala agora na qualidade.
O outro inconveniente é de natureza social e significa baixo nível de vida por ser de custo elevado o produto e, portanto, não poder ser usado nas proporções em que o deveria ser, e ao mesmo tempo permite lucros excessivos nas indústrias melhor apetrechadas, visto a protecção pautal ser originada por indústrias rudimentares, de preços de custo elevados.
Todo o problema da manufactura de mercadorias que cabem neste capítulo necessita estudo minucioso.
Há que ter em conta nesse estudo as realidades dos progressos externos nos últimos anos, as possibilidades das matérias-primas produzidas dentro do País e nas províncias ultramarinas, a qualidade da mão-de-obra, a extensão dos mercados e até as probabilidades de exportação que nalguns casos, como se verificará adiante, parecem existir.

Obras de matérias animais, vegetais e minerais

52. Nas obras de matérias animais as que têm maior importância são as peles, tanto em cabelo como em obra. Os números não são por aí além.
Em 1946 importaram-se 4:931 contos de peles em obra, acabada ou não. A importação havia sido em 1938 de 684 contos apenas.
Nas obras de matérias vegetais os números, embora relativamente baixos, já atingem valias que convém observar.
A borracha em obra atingiu 5:027 e 26:429 contos num e noutro ano e respectivamente 282 e 718 toneladas.
Aparece sob variadas formas - em folhas, em fio, em tecidos, em tubos e obra não especificada. Já hoje se manufacturam em fábricas portuguesas, com êxito, muitos artigos de borracha e a indústria parece estar em desenvolvimento progressivo.
Viu-se atrás que esta matéria-prima é originária em parte das províncias ultramarinas portuguesas. Vieram de lá em 1946 mais de 16:838 contos, num consumo total de 36:557, de borracha e similares. Além da Guiné e Angola, foram fornecedores importantes em 1946 os Estados Unidos da América e a Inglaterra.
A posição dos domínios nacionais tem importância, porque era quase nula a sua exportação antes da guerra, mas os processos de preparação que ainda hoje prevalecem hão-de anular está interessante possibilidade ultramarina.
As obras de madeira importadas não têm grande valor: 1:150 toneladas em 1938 e apenas 36 em 1946, ou, respectivamente, 4:092 e 4:128 contos.
Finalmente, nas obras de matérias minerais incluem-se variadas mercadorias, mas as relacionadas com o vidro ocupam uma posição dominante.
Os totais foram nos dois anos agora sujeitos a apreciação, respectivamente, 3:696 toneladas e 12:868 contos em 1938 e 2:110 toneladas e 19:467 contos em 1946. Se for levada em conta a diferença de preços, houve apreciável decréscimo na importação, e isso foi devido essencialmente à indústria do vidro.

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As importações de obras de vidro podem sumariar-se assim:

QUADRO XXXIX

Importações de vidros

[Ver Quadro na Imagem]

A diminuição no peso foi considerável, embora houvesse aumento bastante no vidro em chapa, sobretudo nos espelhados com mais de 3 milímetros de espessura.
Nas outras obras de vidro o maior acréscimo deu-se nos tubos, talvez para fazer ampolas. Espera-se a redução apreciável neste produto nos anos próximos.
A indústria do vidro é daquelas que mais vinculada está às tradições industriais portuguesas. Já hoje se exporta em, relativamente, larga escala, mas é necessário haver melhor organização.
Não há motivos que se oponham ao seu progresso, tanto comercial como artístico, e poderia constituir no futuro uma melhor actividade compensadora, longe das crises periódicas que actualmente a perturbam.
Em matéria artística e em vidro neutro o progresso foi grande nos últimos tempos e quase todo derivado de maiores cuidados laboratoriais, que nesta indústria tem grande importância, como aliás na maior parte das outras.

Obras de metais e suas ligas

53. É neste capítulo que há vasto campo para melhorias, tanto em quantitativo de produtos fabricados internamente, como na sua qualidade.
Cerca de 13:372 toneladas importadas em 1938, e um pouco menos de 14:300 em 1946, com valores que andaram, num e outro ano, à roda de 57:730 e 332:260, não são incomportáveis pela economia nacional, e tudo indica que seria mister ultrapassá-los em muito, e assim deverá acontecer nos próximos anos.
É grande a variedade de artigos que constituem esta rubrica, anãs entre todos avultam, pela sua influência especial na actividade interna, as obras de ferro, aço, cobre, alumínio e outros metais.
É conveniente fazer a destrinça das mercadorias nos dois anos de 1938 e 1946, de modo a determinar o tipo da importação.

QUADRO XL

Importação de metais em obra

[Ver Quadro na Imagem]

O que mais sobressai nas obras de cobre são os tubos e a pregadura; nas de ferro e aço, os tubos e os tambores, e em diversas obras, as esmaltadas, pintadas ou cobertas de pastas ou outros metais.
É natural que, tanto em matéria de tubos de ferro fundido e aço, como na de tambores, seja possível reduzir apreciàvelmente a importação por efeito da manufactura interna, e espera-se que os trabalhos em curso levem à instalação de uma fábrica de tubos de relativamente larga capacidade.

Papel, desenhos e obras de tipografia e pintura

54. As importações de artigos englobados nesta classe podem dividir-se em diversos grupos: cartão e papelão; livros e folhetos; papel para impressão, e papel de fumar em bobinas e em mortalhas.
Os números para os dois anos considerados são os seguintes:

QUADRO XLI

Importação da artigos gráficos

[Ver Quadro na Imagem]

A verba mais importante é a do papel para impressão, e nele o que, em bobinas, é destinado a jornais e que custou 25:639 contos em 1946 e 8:944 em 1938. A tonelagem é sensìvelmente idêntica. Anda à roda de um pouco mais de 7:000 toneladas.
A importação de livros cresceu bastante, tanto em peso como em valor. Em língua portuguesa, não encadernados, importaram-se em 1946 cerca de 200 toneladas, no valor de 4:574 contos. E em língua estrangeira os livros encadernados andaram à roda de 4:012 contos, provenientes principalmente: de Espanha (1:431 contos); Estados Unidos da América (1:090 contos), e 582 contos de Inglaterra. De França vieram cerca de 252 contos.
É de notar que o principal exportador de livros em língua portuguesa foi os Estados Unidos da América, com perto de 2:000 contos nos não encadernados, seguido do Brasil, com 1 :554 contos. A supremacia dos Estados Unidos da América provém de folhetos ou revistas brochadas. Os números de 1938 são bastante menores. Era a França que conseguia exportar mais livros em língua estrangeira, e o Brasil em língua portuguesa.
O papel de fumar ocupa posição dominante na importação de papéis. Saíram para fora do País em 1946 mais de 23:000 contos para pagamento de mortalhas para cigarros. Convém estudar a introdução desta indústria em Portugal. Ela não é difícil nem complicada, e o que se importa constitui já base para uma unidade de razoáveis dimensões e capacidade.

Diversas

55. Englobadas na designação de «Diversas» incluem-se bastantes manufacturas, que somaram 326:462 contos

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em 1946 e 139:656 em 1938. Os pesos nos dois anos foram, respectivamente, de 8:962 e 11:133 toneladas.
Não é possível estudar, com a minúcia que conviria, tudo o que se encontra nesta rubrica da estatística pautal. Há, nas mercadorias que a formam, campo vasto para progressos. A actividade interna poderia suprir a necessidade de importação em muitas delas e, convenientemente organizada, auxiliar até a exportação, depois de satisfazer as exigências do consumo.
Compreende grande variedade de objectos, desde brinquedos, jogos e botões, até escovas, espelhos, fitas cinematográficas, perfumarias, relógios, canetas de tinta permanente, chapéus e outras coisas.
Procurar-se-á, neste rápido estudo, fixar alguns dos artigos mais importantes, a fim de mostrar a sua influência nas importações e até certo ponto deduzir regras que possam explicar as possibilidades de produção interna.

QUADRO XLII

Manufacturas diversas. Alguns artigos de interesse

[Ver Quadro na Imagem]

(a) N.º 203:192.
(b) N.º 389:637.

56. Bem mais de metade das importações de diversas manufacturas recai sobre cabos e fios isoladores, nos relógios, lâmpadas eléctricas e medicamentos. A conta dos últimos continua elevada e parece ser possível reduzi-la muito. Há sinais de progresso sensível nos laboratórios de produtos farmacêuticos e crê-se que em breve a indústria nacional, neste aspecto, diminua o dreno de todos os anos para pagamento de artigos medicinais.
O desenvolvimento da electrificação produzirá grande consumo de cabos isoladores e muitos deles terão de ser importados. O País deve estar preparado para pagar, nos próximos anos, grandes encomendas de cabos, mas a indústria existente pode desenvolver-se muito, sobretudo nos fios isoladores de pequeno diâmetro.
O problema dos relógios parece não ter solução. É uma indústria especializada com grandes tradições na Suíça. Internamente poderão ser fabricadas qualidades inferiores, mas os de precisão hão-de vir sempre daquele país. Parece que parte dos que actualmente vêm paru Portugal é depois reexportada para outros países, e na verdade se verificará isso mais adiante.
Quanto a outros artigos inscritos na lista, há lugar para consideráveis melhorias na produção interna.
O caso de fitas cinematográficas, que aparecem em 1946 com a verba de 10:000 contos, não diz o que na realidade pesa na balança de pagamentos, porque os produtores cobram sobre a exibição das fitas percentagens variáveis que vão muito além dos valores declarados nas alfândegas. Afecta isso a balança de pagamentos.
A indústria nacional neste aspecto está a entrar no caminho seguro de produção popular e já há a certeza de que pode substituir fitas estrangeiras com muito êxito. Isso significará, evidentemente, grandes melhorias no actual dreno de cambiais para pagamento de direitos cinematográficos.
Há casos que surpreendem no exame da importação de diversas manufacturas, como, por exemplo, a dos pentes, a de canetas de tinta permanente, a de lâmpadas eléctricas, a de máquinas de barbear, de escovas para dentes e ainda outras. São muitos milhares de contos que poderiam, parcialmente, ser poupados, porque em grande número de casos é possível produzir dentro do País coisas semelhantes e de categoria idêntica.
Não se compreende bem se é a qualidade do artigo, se a tendência para comprar o produto estrangeiro, que avoluma este tipo de importação.

EXPORTAÇÕES

57. A debilidade do nosso comércio externo deriva em grande parte das incertezas e insuficiências da exportação. Não é que o País seja pobre de recursos naturais relativamente a outros de área e população semelhantes. Mas o rendimento económico no conjunto nunca foi, e ainda não é, de molde a permitir exportação de maior volume de mercadorias em circunstâncias satisfatórias.
O consumo interno está ligado às importações e, por consequência, à possibilidade de exportar muito mais, e o exame dos números da balança comercial no longo período que vem desde 1900, depois de expurgadas influências momentâneas ou ciclícas, não acusa neste aspecto progresso tão sensível como seria de desejar e é imposto pelas circunstâncias actuais. Hão-de estudar-se adiante os factores que porventura possam ter influído neste estado de coisas.
O País conseguiu, na verdade, suprir, pelo trabalho interno, muitas das necessidades que emergiram do aumento de cerca de 2 milhões e meio de almas em quarenta e sete anos. Mas em matéria de exportações manteve cifras que não correspondem a este desenvolvimento demográfico.
Em 1900 exportaram-se 1.008:000 toneladas, no valor de 23:200 contos-ouro, e foram enviados para fora do País em 1938 cerca de 1.540:500, no valor de 28:000 contas, que, corrigidos, se aproximariam talvez de 40:000. Mas o índice simples da tonelagem, para 1900-1905 = 100, foi, respectivamente, de 85,6 e 99,8 em 1900 e 1946. Idênticos índices para 1904 e 1988 foram 97,9 e 130,7 nos pesos e de 108,1 e 117,9 em moeda-ouro.

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58. Os valores da exportação de 1941 a 1946 constituem um caso à parte e tiveram origem em razões conhecidas: a venda anormal ou por preços anormais deste ou daquele minério, deste ou daquele produto de origem vegetal, como a cortiça ou os resinosos, ou ainda o consumo puramente acidental de conservas ou vinhos. O sentido geral da baixa exportação manteve-se durante o largo período de trinta e oito anos até ao começo da guerra.
Houve três, 1936, 1937 e 1938 - em 1935 o índice ainda era de 94,3 -, que, na verdade, saíram fora dos limites normais da tonelagem exportada nesse período - à roda de 1.100:000 toneladas por ano, com baixas graves nas épocas de crise internacional. Mas esses três anos constituíram o vestíbulo, no tempo, do começo da guerra. As grandes diferenças para mais na tonelagem da exportação incidiram quase sempre nas matérias-primas de origem mineral, principalmente nas pirites, que passaram de 356:000 toneladas em 1936 para 554:000 em 1938.
Mas as pirites são minérios pobres, e por isso o grande aumento notado no peso das matérias-primas de origem mineral em pouco influiu no significado dos números, vistos no seu conjunto. Continuámos a mandar para fora em certos anos, como os de 1931 a 1936, se considerarmos agora os valores, coisa parecida ou de idêntica ordem de grandeza como o que mandávamos nas décadas anteriores. Esta fraqueza na exportação condiciona em grande parte o nível de vida do povo português. Sem maiores vendas para o estrangeiro não pode haver maiores compras. E já em diversas épocas sofreu muito o consumo interno por falta de cambiais para aquisição de mercadorias indispensáveis à vida nacional.

As principais exportações

59. Não é possível dar neste estudo uma resenha completa, no período sujeito a exame, da importância real de todas as exportações. Mas convém esclarecer o assunto de um modo geral de maneira a ter uma ideia da actividade do País nesta matéria. O quadro seguinte mostra as principais exportações:

QUADRO XLIII

Principais exportações

(Toneladas - Contos-ouro)

[Ver Quadro na Imagem]

A balança comercial, na parte relativa a exportações, tem sido amparada pelas matérias-primas de origem vegetal e em certas épocas também pelas de origem mineral, pelas substâncias alimentícias, que se podem limitar para todos os efeitos práticos às bebidas e pescarias e, nestas últimas, às conservas e um pouco ùltimamente às manufacturas de matérias vegetais, que compreendem a cortiça e a madeira em obra. A indústria dos algodões, no período da última guerra, concorreu também com somas importantes para o total da exportação. Mas esta encaminhou-se, como no passado, essencialmente para as províncias ultramarinas. De qualquer modo são os produtos de origem florestal, os de natureza vinícola e a pesca que nos últimos quarenta e seis anos, de forma contínua, mais concorreram para a exportação.
Os de natureza mineral - o volfrâmio, o estanho- e outros - vieram influenciar bastante a balança comercial no período que decorreu entre 1940 e 1944.
Os números que seguem, em toneladas e contos-ouro, dão ideia da influência das mercadorias citadas nos anos de 1900, 1926, 1938 e 1946.

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QUADRO XLIV

Principais exportações

[Ver Quadro na Imagem]

A importância da agricultura nas exportações

60. Um leve exame deste quadro mostra logo a realidade dolorosa da balança comercial portuguesa. A exportação concentra-se nos vinhos, nas pescarias (conservas), nas cortiças e ùltimamente, em menor escala, nos produtos resinosos. Isto significa que grande parte da exportação é de origem vinícola, florestal ou piscatória.
Para os três anos de 1926, 1938 e 1946 os números, em toneladas, das principais exportações alinham-se do modo seguinte:

QUADRO XLV

Exportações de cortiça, vinhos, conservas e resinosos

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

São estes os principais produtos da exportação que, em conjunto com os produtos têxteis e madeiras para esteios de minas e em obra, em 1938 concorreram com 68 por cento e em 1946 atingiram 70,2 por cento, ou mais de dois terços do valor total, como se lê no quadro XLVI. Tirando a cortiça, verifica-se que a tonelagem das mercadorias indicadas é bastante pequena. Foi no conjunto de 289:938 toneladas em 1926 e de 402:614 em 1946, para um total de respectivamente, 939:538 e 1.176:132 em cada ano, ou 30 por cento no primeiro caso e 34 no segundo.

QUADRO XLVI

Valor de diversas exportações, em contos

[Ver Quadro na Imagem]

Os números, em última análise, mostram que a nossa exportação está dependente de três ou quatro produtos - as cortiças, os vinhos, as conservas de peixe - e que em 1946 os produtos da indústria algodoeira a auxiliaram eficazmente. Mas deve notar-se que tanto as conservas de peixe como a indústria algodoeira necessitam de matérias-primas totalmente importadas: a folha de Flandres e o algodão. Não são, portanto, exportações tão rendosas como os vinhos, as cortiças, as resinas e as madeiras.
Outros aspectos de interesse mostram os números relativos a 1946, e vale a pena meditar sobre o seu significado. É na agricultura, representada pelos produtos vinícolas, e nas florestas, bem vincadas pelas madeiras, cortiça e produtos resinosos, que está o fundamento da exportação portuguesa, pelo menos neste ano.

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O último quadro ainda não diz tudo, porque muitos outros produtos de origem vegetal se não discriminam.
O que a seguir se transcreve mostra o problema na sua crua realidade:

QUADRO XLVII

Exportações de produtos de origem vegetal

[Ver Quadro na Imagem]

Nas exportações totais de 1938 coube mais de metade ao esforço da agricultura; e se tivermos também em consideração certos produtos de menor importância que não foram incluídos no quadro, como louro, mercadorias de origem animal e outras, a percentagem de produtos agrícolas e florestais em 1946 é ainda maior.

61. A delicadeza dos factos que sobressaem das cifras sugere reflexões melancólicas; e a mais importante que acode logo ao espírito de quem medita sobre a projecção dos números no mundo real dos sofrimentos e angústias humanos é que a nossa vida económica está presa aos mercados internacionais de três ou quatro produtos: as cortiças, os resinosos e as madeixas - três produtos florestais - as bebidas, principalmente os vinhos, e, em menor escala, as pescarias (conservas de peixe).
Não será descabido realçar aqui, neste momento, o que o País, considerado em seu conjunto, deve ao labor agrícola.
É dele, do amanho das terras e, em última análise, das populações dos campos que vem o suplemento de cambiais essencial à vida colectiva.
Além de satisfazerem em grande parte as exigências alimentares de uma população sempre crescente, e que aumentou nos últimos quarenta e seis anos cerca de 2,5 milhões de habitantes, a agricultura ainda auxilia com mais de metade das exportações totais a balança comercial portuguesa.
Isto realiza-se em país onde ainda existem vastas regiões sujeitas a cultura extensiva, em que se pratica o cultivo de trigo, um cereal que parece não se adaptar, nem no ponto de vista agrológico nem climático, a certos solos e regiões em que é cultivado.
A análise do comércio externo nas últimas dezenas de anos indica a necessidade de cuidar com mais carinho da produção agrícola e de fazer o possível no sentido de tornar mais rendoso o cultivo da terra.

62. Os números, postos de outro modo, ainda se tornam mais significativos:

QUADRO XLVIII

Percentagem das exportações de origem vegetal

(Em contos)

[Ver Quadro na Imagem]

63. As névoas que velam o comércio externo escurecem muito quando se examina o destino das principais exportações. Há-de ver-se adiante que a iniciativa ou actividade do comércio exportador nacional se concentrou sobre dois ou três países. O mal não é de agora - do após guerra. Vem de há muitos anos.
Quando, por virtude de condições internas ou internacionais, as nações que nos compram os vinhos, as cortiças e as conservas sofrem dificuldades, ou, se as não sofrem, se modifica a sua política económica interna, os reflexos no nosso comércio externo atingem gravidade social, que as lições do passado amplamente demonstram. As crises não atingiram ainda eleitos mais ruinosos porque a amparar a balança de pagamentos existem sustentáculos humanos que derivam do labor de portugueses no estrangeiro e que, longe da Mai-Pátria, lhe enviam em todos os momentos uma parcela do produto do seu trabalho. É nesses momentos que as remessas dos emigrantes tornam mais saliente a ideia nacional e mais concorrem para auxiliar a vida interna.
À medida, porém, que os anos passam e as circunstâncias impõem melhoria de nível de vida social, aparece mais angustiosa a possibilidade de crises na exportação e mais imperiosa é a conveniência de remodelar profundamente a estrutura de todo o nosso comércio externo.
Essa estrutura está evidentemente ligada a muitas outras questões de natureza política. A maior parte delas envolve a resolução de problemas de organização, jurídica e educativa, como o regime de propriedade na parte relativa ao parcelamento excessivo e concentração exagerada, à estrutura do ensino agrícola e industrial de todos os graus, à melhoria do rendimento das indústrias, no que toca a qualidade e preços de custo, e a outras

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muitas matérias que se reflectem nas fraquezas do comércio externo, e sobretudo mas exportações.
A crise não é de hoje, vem de longe. Mas a evolução das coisas no Mundo, tal qual já transparece dos acontecimentos do após guerra, deixa perceber sombras muito escuras no futuro da nossa vida se não forem rìgidamente modificadas as condições actuais. E os números que acabam de ser comentados, tendo em conta o que se passou em 1947, mostram já terríveis presságios na vida económica dos anos mais próximos.

A evolução das exportações

64. Como sempre se tem dito neste estudo, os números não podem ser tomados com um rigor absoluto. Eles provêm da estatística oficial, de resumos retrospectivos publicados todos os anos e de uma ou outra informação de documentos oficiais. Para facilitar comparações, os valores reduziram-se a ouro, nas bases de médias anuais do ágio do ouro fornecidas pelo banco emissor.
O que figura na estatística foi, até fins da quarta década deste século, o indicado em geral pelos exportadores, e pode acontecer, e na verdade isso sucede principalmente nos vinte anos que decorreram entre 1920 e 1940, que o valor das exportações tenha de ser aumentado apreciàvelmente por serem demasiado baixos os valores declarados nas alfândegas.
A este assunto já se aludiu atrás. Ele foi estudado 1 com certa minúcia pelo autor quando procurou determinar para 1936 a balança de pagamentos.
Era necessário para esse fim computar, com suficiente aproximação, o déficit da balança comercial, e procedeu-se então à determinação de um coeficiente que corrigisse as exportações.
Na obra citada calcularam-se e representaram-se gràficamente, em libras-papel e libras-ouro, as importações e corrigiram-se, também em ouro, as exportações. O trabalho então realizado veio mostrar uma fisionomia do nosso comércio externo bem diferente daquela que a estatística nos indicava, porque ao observar as curvas da importação e exportação, depois de 1930, claramente se explicam as razões do desafogo cambial que caracterizou o período compreendido entre aquele ano e 1940, acentuado por motivos sobejamente conhecidos no tempo da guerra.
Quando se examinam, pois, os números para tirar deles conclusões, deve ter-se em conta a depreciação que incide sobre as exportações, e vale a pena consultar os gráficos da obra citada e com eles esclarecer uma questão que sem isso não pode satisfatòriamente ser aclarada.
Por voltas de 1936 a diferença entre as importações e exportações ouro, corrigidas as últimas pelo factor de 60 por cento, não atingia 2 milhões de libras-ouro.
A partir de 1940, e talvez um pouco antes, os números já aparecem próximos da realidade. As declarações alfandegárias sofreram correcções tendentes a aproximá-las da verdade. E de resto já haviam desaparecido as razões que levavam os declarantes a reduzir os valores apresentados, que eram, em súmula, a obrigação, em tempos passados, de entregar percentagem importante de cambiais no banco emissor.
Estes factos explicam a importância que neste estudo se dá à tonelagem, porque ela, melhor que os valores, põe em evidência a constância da exportação quando se consideram bem entendidas as parcelas que constituem o seu conjunto. De outro modo cometer-se-ia um grave erro. Neste aspecto as cifras de 1946, em toneladas, são inferiores às de 1901, e apenas ligeiramente superiores às de 1900.

I

Matérias-primas

De origem mineral

65. Como era de prever, o predomínio no peso das exportações recai por muito sobre as matérias-primas, e, nestas, as de origem mineral ocupam sempre lugar superior a metade do total.
Isto deriva da exportação de pirites de cobre de duas minas importantes. As pirites são, porém, como se disse, minérios pobres, e com o tempo e a safra de jazigos cada vez menos ricos as pirites diminuem bastante no teor, e portanto no valor.
Foram preparados pelos serviços oficiais elementos que permitem dar ideia do total de pirites exportadas no período compreendido entre 1910 e 1936. E verificou-se que em vinte e seis anos se mandaram para fora cerca de 6.796:000 toneladas 1. A percentagem de cobre era inferior a 1,5 por cento e os minérios continham entre 40 e 50 por cento de enxofre.
Durante anos influiu ainda apreciàvelmente na balança comercial o cobre exportado, quer sob a forma de precipitado, quer sob a forma de calcopirite. Mas a sua importância diminuiu, tanto mais que parte passou a ser consumida internamente na produção de sulfato de cobre.
A tonelagem das pirites, que também se utilizam já dentro do País na produção de enxofre, manteve-se sempre alta. Oscilou durante muitos anos em cifras compreendidas entre 200:000 e 400:000 toneladas, mas em 1936 já foi muito além destas quantidades, atingindo o máximo em 1938.

De origem vegetal

66. Na exportação, em peso, a cortiça em bruto vem logo a seguir à das pirites - embora por muito as ultrapasse em valor. O grande mercado das cortiças foi sempre os Estados Unidos da América, onde existe uma poderosa indústria transformadora. As crises periódicas no mercado das cortiças provêm quase sempre de causas directa ou indirectamente influenciadas, pelas contingências daquele país.
A indústria interna desenvolveu-se muito durante o período da guerra e o peso da cortiça em obra exportada passou de 10:711 toneladas em 1938 para 24:688 em 1946. Os valores aumentaram em proporção considerável para 375:096 contos, comparáveis a 49:840 em 1938.
A um aumento de menos duas vezes e meia no peso correspondeu um acréscimo de cerca de oito vezes no valor.
A exportação de cortiça em prancha representou sempre um forte esteio na economia do comércio externo. Não aumentou, porém, espectaculosamente, porque nos vinte anos que decorrem entre 1926 e 1946 o acréscimo na exportação de cortiças, como matéria-prima, não passou de 29:000 toneladas, que é a diferença entre cerca, de 136:000 exportadas em 1926 e 165:000 em 1946.
As florestas dão ainda para exportação uma matéria-prima valiosa pouco aproveitada há vinte anos ou, quando aproveitada, era-o em circunstâncias tão rudimentares que se não tirava o proveito comercial possível.

1 Portugal Económico e Financeiro, Araújo Correia, vol. I, pp. 385 e seguintes, e vol. II, p. 115 e gráficos CXXXIV e CXXXV.
1 Portugal Económico e Financeiro, Araújo Correia, vol. II, p. 121.

Página 132

288-(132) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132

As resinas são um precioso subproduto dos pinheiros. A sua exploração valorizou zonas atrasadas e pobres, que, à míngua de outros recursos, viviam em circunstâncias muito precárias. Todas as regiões montanhosas do centro e norte do País, para só falar nas mais pobres, têm hoje na exploração resineira um forte apoio da sua economia, quer mo que diz respeito a mão-de-obra quer ao próprio rendimento.
Depois da reorganização da indústria, por volta de 1930, foi possível produzir internamente, em circunstâncias que rivalizam com os maiores produtores desta matéria - a França e «s Estados Unidos e em menor escala a Espanha.
As resinas portuguesas de todos os graus têm hoje mercado garantido e vendem-se bem.
A exportação de resinosos aumentou multo em peso: passou de 10:000 toneladas de produtos baixos em 1926 para perto de 36:000 em 1946, com valores que se aproximam de 140:000 contos, e em 1942 atingiu cifra bastante mais elevada.
O consumo interno de produtos resinosos ainda é muito pequeno. Não passou de 2:846 toneladas para o pez e 2:470 para aguarrás em 1946. Houve, é certo, um ligeiro aumento em relação a 1938, mas foi bem pequeno, e neste caso é um mal, porque os resinosos são a base de certo número de indústrias de fácil adaptação em Portugal, como vernizes, dissolventes para pintura, tintas, perfumes e outras. Na base desta matéria-prima se poderão desenvolver certas fontes de exportação mais rendosas.
O que acaba de se dizer explica a importância dos pinhais na economia nacional e é suficiente para justificar uma política enérgica no sentido de aumentar as sementeiras desta planta, sobretudo nas regiões montanhosas mais pobres e mais sujeitas à erosão. O pinhal é nestas zonas a cultura mais valiosa e mais útil no ponto de vista económico.
O revestimento florestal das encostas por intermédio do pinheiro ou de outras essências tem além disso grande influência no regime dos rios.
São conhecidos os tremendos efeitos da erosão. As matérias terrosas que anualmente a chuva arrasta das serras e declives montanhosos vêm assorear vastas e ricas regiões. São bem conhecidos os casos do Ribatejo e outros. As sementeiras nas cabeceiras dos rios têm a propriedade de atenuar a influência das grandes precipitações pluviométricas e regularizar apreciàvelmente os caudais dos cursos de água.
Estas razões tornam claros os motivos por que sempre se pugnou pelo aproveitamento integral dos rios, que compreende a totalidade das suas bacias hidrográficas.
As madeiras produzidas nos pinhais, as resinas que anualmente se exportam, a influência das florestas no débito dos caudais, o declínio na erosão que pode resultar do revestimento florestal, concorrem, em alto grau, para dar relevo à importância que o pinhal pode ter na vida económica da Nação.

Outras matérias-primas

67. As cortiças e os resinosos são as duas matérias-primas mais valiosas, como acaba de se verificar. Mas há muitas outras que auxiliam bastante a balança comercial. O quadro que se publica na página a seguir exprime, em contos e em toneladas, a exportação de matérias-primas para 1938 e 1946.

QUADEO XLIX

Exportação de matérias-primas

[Ver Quadro na Imagem]

Página 133

4 DE MARÇO DE 1948 288-(133)

[Ver Quadro na Imagem]

São de vária natureza e diversa importância as mercadorias que se inscrevem neste quadro, e talvez que a sua dispersão atenue o valor dos grandes grupos que o formam. Por isso se agrupam no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

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Uma rápida análise permite averiguar alguns progressos importantes desde 1938. O primeiro é nas matérias-primas de origem animal, onde se notam os óleos de baleia e de sardinha, com cifras superiores a 40:000 contos.
Nas matérias-primas de origem vegetal, além das cortiças e resinosos, aparecem também, quase pela primeira vez, mercadorias de certo interesse, como plantas de diversa natureza para perfumaria e usos medicinais. Outras exportações acentuaram a sua importância, como a cravagem de centeio (15:531 contos). Embora a cortiça e resinosos representem 577:000 contos num total de 655:000, há indícios da possibilidade de alargar a exportação a outras matérias-primas de origem vegetal.
Nas de origem mineral os combustíveis referem-se ao abastecimento da navegação em portos portugueses; e nos materiais para construção está o cimento que se exportou para, a África, o mármore e a lousa em placas das pedreiras do norte, com somas que se avizinham de 5:000 contos.
O estanho continua a ser o mais valioso dos metais explorados - não só abastece o consumo interno como permite exportações substanciais - e o volfrâmio volta pouco e pouco às vendas normais de períodos de paz.
Há possibilidades de grandes desenvolvimentos na indústria química em Portugal, sobretudo pela utilização da energia temporária dos aproveitamentos hidráulicos do Tejo e do Douro quando eles se realizarem, e conviria desde já estudar este assunto, que pode ter vasto interesse no futuro. A electroquímica está hoje em grau de avançado progresso e permite a utilização máxima da energia sobrante.
Existem em Portugal matérias-primas, como o sal e os calcários, próprias para esta indústria, e não há razões especiais que se oponham ao seu desenvolvimento.

II

Produtos têxteis

68. As exportações de produtos têxteis em 1938 e 1946, expressas em contos, podem apresentar-se do modo seguinte:

QUADRO L

Exportação de produtos

[Ver Quadro na Imagem]

Em remessas por via postal incluem-se, além das que se mencionam acima, mercadorias de todas as fibras, mas em 1946 as que predominam são os bordados da Madeira, com 30:615 contos; os tecidos, fio e vestuário de algodão, com 28:697; os tecidos e fio de lã, com 7:091; os tecidos e fios de seda, com 6:315, e outros não especificados, no total de 6:347 contos.

69. Durante muitos anos o mercado externo para produtos têxteis quase se limitou às províncias ultramarinas, e até esse era bastante resumido. Os produtos nacionais sofriam em África a concorrência de diversos países, sobretudo do Japão e Alemanha.
Em 1938 as saídas de produtos têxteis andavam à roda de 6:094 toneladas, no valor de 118:979 contos, mas em 1946 os números já atingiam 878:646 contos, representando cerca de 9:300 toneladas.

Algodão

70. Tão grande aumento - perto de 3:000 toneladas, ou 50 por cento da exportação de 1938 - deu-se sobretudo nos produtos algodoeiros, que, em peso, tiveram a exportação máxima em 1941.
Em 1940 o seu valor não passara de 82:262 contos, inferior ao de 1937, que havia sido de 103:104. Mas em 1941 o peso de produtos exportados de algodão subiu para 9:433 toneladas, comparável apenas a 3:480 no ano anterior.
Os números para a produção e exportação de 1938 a 1946 foram os seguintes:

QUADRO LI

Exportação produção de artigos de algodão

[Ver Quadro na Imagem]

Na produção, além do fio, tecidos e malhas, nos quais se compreendem cobertores, colchas e outros artigos, como malhas em peça, em interiores e exteriores, ainda haveria que incluir meias e peúgas, que em 1946 se elevaram a 1:150 milhares de dúzias.
Da comparação entre o que se produziu e se mandou para fora do País resulta que em certos anos, como o de 1941, se exportou um pouco menos de metade da produção de tecidos. Nos outros anos a exportação foi menor. Assim, em 1946 a produção de tecidos e malhas foi de 23:645 toneladas e a exportação não passou de 7:611, cerca de um terço, incluindo 295 toneladas de fio. O resto deve ter sido consumido dentro do País.
A matéria-prima utilizada pela indústria algodoeira em 1938 vinha em grande parte do estrangeiro. Neste ano importaram-se das províncias ultramarinas portuguesas 10:505 toneladas e o resto foi comprado nos Estados Unidos, no Brasil e no Egipto. Em 1946 quase tudo foi produzido em território português. Num total de 39:407 toneladas importadas apenas 1:725 vieram do Brasil e do Egipto.
Estes números mostram o enorme progresso realizado em matérias algodoeiras pelos domínios de além-mar.
As cifras, em toneladas, da importação de algodão em rama e caroço para os anos de 1938 a 1946, foram as que vão mencionadas no quadro da página seguinte.

Página 135

4 DE MARÇO DE 1948 288-(135)

QUADRO LII

Importação de algodão

(Toneladas)

[Ver Quadro na Imagem]

Os números, em contos, para a produção e exportação de produtos algodoeiros desde 1938 mostram um considerável desenvolvimento da indústria, tanto no fio como na tecelagem.
O exame do quadro anterior mostra que, tirando os anos de 1941 e 1946, em que a exportação de produtos de algodão subiu muito em peso, a dos outros anos mantém-se na ordem de grandeza de 1938.
Foi, no entanto, inferior em tonelagem em 1939, 1940, 1942, 1943 e 1944, embora os valores aumentassem bastante. Apesar de em 1944 a exportação de artigos de algodão ser apenas de cerca de 60 por cento da de 1938, o seu valor atingiu uma cifra três vezes maior. E este valor da exportação ainda não deve dizer tudo, porque se conhece o prémio pago em certas épocas para o fornecimento das encomendas.
A produção de tecidos e malhas aumentou muito nos anos de 1941, 1945 e 1946, atingindo neste último ano o acréscimo de mais de 40 por cento em relação a 1938.
Parece que o mercado interno se alargou consideràvelmente, além da exportação.
Estas cifras explicam a grande prosperidade da indústria no período que decorreu entre 1938 e 1946 e que parece continuar. Para atingir a produção indicada pela estatística foram utilizados teares antiquados. A eficiência deve ter diminuído por essa razão.
É de surpreender, até certo ponto, o rápido acréscimo da produção de matérias-primas no ultramar. Angola e Moçambique exportaram para a metrópole em 1938 cerca de 10:000 toneladas e em 1940 não atingiam sequer 9:000.
O acréscimo na produção a partir de 1941 foi espectaculoso. Alcançou em 1946 um pouco mais de 53:000 toneladas, contra apenas 37:700 em 1938. A esse aumento correspondeu mais larga cultura de fibra no ultramar.
Não é este o lugar para desenvolver o interessante problema da produção de matérias-primas nas províncias ultramarinas nem as medidas tomadas no sentido de intensificar a cultura do algodão.
Há opiniões divergentes sobre a eficácia, ou até vantagens, dos métodos adoptados, sobretudo em Moçambique, no que diz respeito ao bom aproveitamento da mão-de-obra indígena.
O assunto parece necessitar de estudo cuidadoso. Seja como for, ressalta claramente das cifras a possibilidade de em pouco tempo aumentar muito em território português a produção de uma matéria-prima de grande importância económica e que era quase totalmente importada ainda há poucos anos.

Lanifícios

71. Nunca fomos país exportador de lanifícios e o consumo interno é, na sua quase totalidade, abastecido pela indústria nacional.
De 1940 a 1946 a exportação de produtos da indústria da lã foi a seguinte:

QUADRO LIII

Exportação de lanifícios

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento em 1940 deu-se, sobretudo, nos cobertores. Fabricaram-se nesse amo 704:000.
Em 1946J tirando cerca de 18:000 mantas, que se enviaram para França, grande parte do resto escoou-se para o ultramar.

Outros produtos têxteis

72. A indústria do linho e da seda, no ponto de vista da exportação, não tem o grande interesse que poderia ter, dadas as condições internas.
Somos um país importador de produtos de seda, e neste aspecto o desequilíbrio da nossa balança é apreciável.
Até 1930 a importação destes produtos andava à roda de 35:000 contos. Depois, até 1940, os valores desceram para uma média de 25:000 contos, mais por virtude da baixa nos preços da seda do que por virtude de menores importações, que, de um modo geral, aumentaram.

Página 136

288-(l36) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132

Durante a guerra a importação continuou a crescer; foi de 55:000 contos em 1943, 73:000 em 1944 e 105:000 em 1946.
A saída de artigos de seda foi sempre muito baixa e atingiu o máximo de 14:000 contos em 1946, incluindo as remessas postais.
A grande importação de seda deu-se no fio (68:436 contos) e nos tecidos (24:512 contos), e atrás se mencionou já a necessidade de resolver o problema da fiação.
A Suíça, no fio e tecidos, e a Espanha, em fios, foram os dois principais fornecedores. Quase toda a pequena exportação de seda se faz para as províncias ultramarinas.
Dos outros produtos têxteis exportaram-se em 1946 perto de 239:000 contos, o que representa, na verdade, um grande aumento. Quase tudo se deu, porém, nos bordados da Madeira e Açores.
Esta verba pode decompor-se assim, em contos:

QUADRO LIV

Exportação de diversos produtos têxteis

[Ver Quadro na Imagem]

73. A saída de produtos têxteis faz-se também, em relativamente larga escala, por via postal. Por esta via, e não incluídos os números atrás citados, exportaram-se mais os seguintes produtos em 1938 e 1946:

QUADRO LV

(Contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Vê-se que em 1946 os bordados da Madeira pesaram, em cambiais, na balança de pagamentos cerca de 236:000 contos, que se comparam muito favoràvelmente com outros produtos.
Depois dos vinhos, cortiças, conservas e madeiras, os bordados ocupam um lugar proeminente. Mas esta indústria regional tem intermitências que conviria estudar e corrigir, em virtude da sua importância.

III

Produtos alimentares

74. Este é um dos capítulos de maior influência na balança comercial. Os números que definem a importação e exportação de substâncias alimentícias são os que seguem, em toneladas e contos-ouro:

QUADRO LVI

Exportação de produtos alimentares

[Ver Quadro na Imagem]

O comércio internacional das substâncias alimentícias tem para o País uma grande importância.
Até ao princípio da guerra raras vezes o valor das exportações de produtos alimentares desceu abaixo de metade da exportação total.
Mas durante o conflito tornou-se anormal o valor de certos minérios, e então, no conjunto, a proporção das substâncias alimentícias desceu. Logo, porém, que começaram a desaparecer as causas acentuou-se a sua importância.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(137)

Em 1946, num total de 4.586:543 contos de exportações, a parte correspondente a substâncias alimentícias elevou-se a 1.657:251, ou cerca de 36 por cento.

A característica das substâncias alimentícias

75. Os produtos alimentares exportados têm características que os tornam extremamente vulneráveis em ocasiões de crise económica nos países importadores. São, como é sabido, constituídos por vinhos e conservas na sua grande parte - e nenhum destes produtos é de primeira necessidade.
Nos dois anos anteriores à guerra, em 1937 e 1938, os valores correspondentes a bebidas e pescarias representavam mais de 80 por cento do total das exportações de substâncias alimentícias, como pode ler-se adiante:

QUADRO LVII

Exportação de bebidas e pescarias

(Em contos)

[Ver Quadro na Imagem]

No mesmo período, antes de 1940, as bebidas e as pescarias equilibravam-se, com valor idêntico, nas exportações. Mas a partir de 1941 deu-se grande aumento nos valores das pescarias, que se concentrou nas conservas, e os números passaram a mostrar a sua importância.
O máximo atingido pelas pescarias foi, em 1943, de mais de 900:000 contos, representando 55:082 toneladas. Mas em 1946 as bebidas alcançaram 852:831 contos, muito superior já às pescarias.
Em 1947 as quebras numa e noutra hão-de ser muito grandes, o que também deve contribuir para o déficit que se espera na balança comercial.
Fora estas, as outras exportações de substâncias alimentícias têm muito menor valor. Incluem grande número de produtos, como azeite de oliveira, pimentão doce, frutas, azeitonas de conservas e outros.

Bebidas

76. Vale a pena, dada a sua importância na economia do País, tanto no que diz respeito ao consumo interno como externo, fazer leve resumo da importância dos principais tipos de produtos que se englobam na exportação de bebidas.
Para 1938 e 1946 os números são os do quadro que segue:

QUADRO LVIII

Decomposição da exportação de bebidas

[Ver Quadro na Imagem]

Página 138

288-(138) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132

O simples exame das cifras mostra logo a importância dos vinhos comuns e do vinho do Porto, sobretudo deste último. O ano de 1946 foi excepcionalmente bom paira a saída de vinhos comuns.
A exportação vinícola, tanto em litragem como em escudos, atingiu o maior volume até agora, com 1.303:442 hectolitros, na qual o vinho do Porto entrou com 284:092, inferior, contudo, à dos anos anteriores à guerra.
O progresso mais acentuado foi nos vinhos comuns e de outras qualidades, que em 1936 apenas contaram na exportação com 343:698 hectolitros, enquanto que em 1946 passaram além de 876:000.
Estes números reflectem o carácter aleatório e errático da exportação vinícola. Apenas a do vinho do Porto apresenta constância dentro de largos limites. Tem no entanto variações semelhantes à apontada acima, e daí crises graves.
As saídas de vinho do Porto em 1941, 1942 e 1945 não atingiram os 100:000 hectolitros. Em um dos anos, o de 1942, pouco passaram de 70:000.
Com a exportação de vinhos comuns ou semelhantes ainda é pior a situação. Um relancear de olhos sobre a vida deste produto, nos últimos onze anos, dá impressão de desequilíbrio. Em 1936 a exportação foi de 343:000 hectolitros e em 1940 mantinha cifra idêntica (345:000), depois de ter passado por 496:000 em 1939. Atingiu 876:000 hectolitros em 1946, com o valor de 294:000 contos.
Apesar de tudo, a produção vinícola continua a ser um poderoso esteio na fragilidade da nossa balança comercial, e talvez pudesse ainda ser maior a sua importância se houvesse a preocupação de produzir maiores quantidades de vinhos de qualidade. Mas, como já se disse atrás, o amparo é tanto maior quanto mais estáveis e prósperas forem as economias dos países importadores. A crise que a Europa atravessa no momento actual reflecte-se na exportação vinícola, porque todos os países pretendem reduzir ao mínimo as importações de coisas dispensáveis à vida do dia a dia - e o vinho e seus derivados são um produto dispensável.
O único país que, de qualquer modo, poderia suprir as falhas de outros - os Estados Unidos - protege em elevado grau os seus próprios produtores californianos.
É notável a pequena exportação vinícola para este país. O total em hectolitros em 1946 pouco passou de 28:000, quase tudo constituído por vinhos do Porto
(25:185 hectolitros). O total das bebidas e seus derivados exportados em 1946 para os Estados Unidos foi de apenas 55:653 contos, incluindo 38:500 de vinhos do Porto e 15:500 de aguardente.
A juntar ao valor das bebidas há o acondicionamento, que é formado por cascos e barris de madeira, garrafões e garrafas fabricados em Portugal. É uma exportação acessória das bebidas, cujo produto fica quase todo dentro do País. As únicas importações são as de certas madeiras. Mas hoje grande parte das matérias-primas para o vasilhame é obtida em Portugal.
Em 1946 a exportação para acondicionamento de bebidas alcoólicas, incluindo cerveja, atingiu cerca de 165:000 contos. Destes, perto de 93:000 são formados pelo vasilhame de vinhos do Porto comuns e outros e 72:000 por garrafões e garrafas de fabricação nacional.
O número de garrafas de vinho do Porto atingiu 7.429:985, no valor total de 19:175 contos, o que tem certa influência na indústria vidreira.

Pescarias

77. O outro grande produto da exportação, no capítulo das substâncias alimentícias, é constituído por pescarias, e, dentro destas, quase tudo se refere a conservas de peixe, principalmente sardinhas.
As conservas não têm, porém, tanto interesse económico como os produtos vinícolas. Uma parte do que se exporta nas conservas - a folha de Flandres - é totalmente importada, enquanto que as embalagens da exportação vinícola, quer as garrafas, quer os cascos ou pipas, são, na sua quase totalidade, de produtos portugueses.
Dos 586:653 contos de pescarias exportadas em 1946 cerca de 582:000 representam conservas. Dos 4:600 restantes a verba mais importante é constituída por peixe conservado pelo frio, a maior parte do qual é consumido na Argentina.
A indústria da pesca é uma das mais valiosas do País. Emprega grande número de pessoas; tem em certos casos o carácter intermitente, que permite a actividade mista do pescador. Nalgumas zonas ele exerce simultaneamente a faina agrícola em conjunção com a da pesca.
A exportação atingiu cifras importantes. Para os anos que decorreram de 1936 a 1946 pode sumariar-se do modo que segue:

QUADRO LIX

Exportação de conservas de sardinhas

[Ver Quadro na Imagem]

Página 139

4 DE MARÇO DE 1948 288-(139)

No período anterior à guerra, entre 1935 e 1939, a média exportada dos produtos da pesca era relativamente elevada.
Esta média subiu muito em peso no princípio da guerra. Entre 1940 e 1944 foi de 55:075 toneladas, e em valor atingiu 581:402 contos.
No ano mais produtivo da pesca - o de 1941 - exportaram-se 61:894 toneladas. Mas o que produziu maiores resultados, por virtude da alta dos preços, foi o de 1943. Apesar de a exportação ser mais reduzida (54:316 toneladas), o seu valor atingiu 904:287 contos.
Os óleos de peixe começam a pesar apreciàvelmente na exportação. É há possibilidade de alargar muito a sua influência. Antes da guerra mandavam-se para fora pequenas quantidades. Em 1938 os óleos exportados não passaram de 3:325 toneladas e 2:728 contos. Em 1946 o peso subiu a 6:617 toneladas e o valor alcançou 44:118 contos, com tendências para subir.
Além das conservas de sardinha, que representam grande parte da exportação, há as de outros peixes que têm grande importância, como o atum, a cavala e similares, o carapau, as anchovas, os filetes de biqueirão e outros. Os que predominam são, porém, o atum, as anchovas e os filetes de biqueirão. Os últimos têm bom mercado nos Estados Unidos.
Como se verifica atrás, a pesca é uma interessante actividade, com grande influência na exportação. Mas o que se exporta representa apenas uma pequena parcela do que se pesca, pois a maior parte é consumida dentro do País.
A totalidade da pesca varia de ano para ano.
De 1938 a 1946 a pesca desembarcada no continente está compreendida entre cerca de 210:000 e 255:000 toneladas, incluindo a que se refere a bacalhau e a óleo.
No quadro dá-se o total da pesca para diversos anos.

QUADRO LX

Pesca desembarcada no continente

[Ver Quadro na Imagem]

Quantidade em toneladas

[Ver Quadro na Imagem]

Valor em contos

[Ver Quadro na Imagem]

Outras substâncias alimentícias

78. As bebidas e as pescarias representaram sempre, desde 1938, mais de 70 por cento do total dos produtos alimentares exportados e em alguns anos as percentagens ultrapassaram 80 por cento.
Durante a guerra também se acentuou o desenvolvimento de outros produtos. Em 1946, por exemplo, em que a percentagem acima mencionada foi um pouco superior a 80, exportaram-se mais de 200:000 contos de diversas substâncias alimentícias.

[Ver Tabela na Imagem]

Parece ter-se dado um interessante movimento nos números da exportação de diversas matérias vegetais, que será analisado mais circunstanciadamente adiante. Pode ser que na parte relativa a substâncias alimentícias, esse movimento derivasse do estado da Europa em matéria de carência de produtos alimentares, que tornou indispensável a importação de coisas que de outro modo não teriam tido fácil saída. Em todo o caso a exportação de mais de 200:000 contos revela certas possibilidades, dignas de serem aproveitadas.
Os 217:767 contos de diversos produtos exportados em 1946 já foram parcialmente apontados atrás.
Embora repartidos por larga variedade de alimentos, podem agrupar-se conforme- o quadro LXI.

QUADRO LXI

Exportação de diversas substâncias alimentícias

[Ver Quadro na Imagem]

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288-(140) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 132

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Inclui 356 toneladas (92 contos) de alfarroba triturada.

Cerca de metade dos valores exportados é formada por amêndoa, em casca e miolo, e castanhas (9:807 contos), incluídas em frutas verdes.
Do resto destaca-se a exportação de azeitonas e tomates de conserva, os figos (frutas secas), o caroço de alfarroba e pouco mais.

79. É até certo ponto paradoxal a baixa exportação de frutas e produtos hortícolas num país extremamente próprio, no dizer dos entendidos, para a sua produção.
Havia mercados antes da guerra que absorviam vastas quantidades destes produtos, como o da Inglaterra. E, apesar das velhas e intensas relações comerciais com este país, nunca conseguimos criar lá condições que pudessem absorver as possibilidades, que realmente existem, da produção hortícola e frutífera nacional.
O motivo não reside certamente na falta de consumo, mas na falta de produção em qualidade própria.
Antes da guerra a Inglaterra importava só em produtos hortícolas e fruta verde cerca de 35 a 40 milhões de libras, distribuídas por maçãs, bananas, pêssegos, grape fruit, limões e limas, laranjas, peras, ameixas, amêndoas e diversos vegetais frescos, incluindo batatas, tomates e outros.
De todos estes produtos o único de origem portuguesa que merece menção são as amêndoas, com 111:212, 89:162 e 187:332 libras, respectivamente em 1935, 1936 e 1937. A Itália e a Espanha suplantavam, neste aspecto, o nosso País.
Na exportação de uvas para a Grã-Bretanha tiveram papel predominante a União Sul-Africana, a Holanda, a Bélgica e a Espanha, com 1.700:000 libras importadas em 1937. No caso de limões e outros citrinos, a Espanha e a Itália eram os principais abastecedores.
As laranjas poderiam ser uma óptima fonte de cambiais. Só em Inglaterra o consumo foi de cerca de 8 milhões de libras (£ 7.955:661) em 1937. Vieram da Palestina (£ 2.550:000), da África do Sul (£ 2.050:000), de outros territórios britânicos (£ 226:000), do Brasil (£ 1.189:000) e de outros países (£ 104:000).
Sabe-se que a cultura dos citrinos em larga escala é recente na Palestina, pois data da outra guerra. No entanto, em vinte anos foi possível organizar a produção e a exportação na grandeza assinalada pelos números acabados de mencionar. A Palestina é, como se viu atrás, um grande importador de caixotaria portuguesa, com que embala as frutas (citrinos) que exporta para Inglaterra e mais países.
Poder-se-iam fazer considerações idênticas a respeito de outros produtos, tais como tomates e cebolas. A Inglaterra importou em 1937 cerca de 1 milhão e meio e libras de cebolas, a maior parte das quais vieram da Holanda (£ 578:000), Espanha (£ 238:000), Egipto (£ 336:000) e de outros países (£ 347:000). De tomates foram por aquele país importados em 1937 perto de 4 milhões e meio de libras esterlinas, de territórios britânicos cerca de metade e o resto da Holanda, Canárias (£ 1.843:000) e outros países (£ 7:000).
Não era difícil que Portugal comparticipasse neste comércio importador inglês, dada a sua balança comercial deficitária com aquele país e as relações políticas e económicas que há tão longos anos existem entre os dois povos. É certo que nos anos mais próximos há-de diminuir muito a importação de frutas e produtos vegetais frescos. Mas a sua crescente importância na alimentação, reconhecida hoje por todos, e o seu consumo cada vez maior hão-de certamente suprir noutros países as falhas que porventura se dêem no consumo inglês.
Ora, Portugal tem condições próprias paia a produção de fruta e vegetais, incluindo citrinos. A Palestina, as Canárias, a Espanha e a Itália, a primeira sobretudo, poderiam servir de exemplo. Não é impossível alargar muito a produção de frutas. Há para isso necessidade de estabelecer um plano de conjunto, convenientemente orientado, com objectivos definidos e adoptado sem transigências de qualquer espécie no que diz respeito a qualidades, a métodos de cultura, a desinfecções, a conservação, a embalagem e outros meios de melhorar o rendimento.
Não há razões especiais que impeçam a exportação anual de umas centenas de milhares de contos em frutas e produtos hortícolas frescos e em conservas.

IV

Equipamento mecânico e eléctrico e transportes

80. Embora tenha havido apreciáveis progressos nas indústrias mecânicas, nunca fomos, nem certamente poderemos ser, um país exportador de equipamento mecânico e eléctrico, pelo menos dentro dos anos mais próximos. O que se produz internamente serve para atender as necessidades da actividade nacional e é já indício seguro de que é possível em certos aspectos alargar muito a produção e evitar por esse modo a vinda de coisas que poderiam ser fabricadas dentro do País. Mas ainda há duas ou três coisas que nos faltam, e talvez que a mais importante seja a técnica. Enquanto não forem atendidas certas circunstâncias, de que se trata largamente noutro lugar, não poderá haver progresso por aí além.
Não tem, pode dizer-se, expressão numérica a exportação desta classe. Em 1946 somou tudo 2:422 toneladas, no valor de 53:800 contos (1:181 contos-ouro). Em 1938 a exportação fora de 10:559 toneladas, mas neste caso a verba mais importante é representada pela venda de um navio de pequeno valor monetário. Anteriormente haviam sido construídos barcos em estaleiros portugueses e em 1934 a exportação atingiu 57:874 con-

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tos. O resumo pode dar-se para 1938 e 1946 no pequeno quadro que a seguir se transcreve:

QUADRO LXII

Exportação da máquinas, ferramentas veículos

[Ver Quadro na Imagem]

A maior parte dos artigos que constituem esta classe é exportada para as províncias ultramarinas. Nas alfaias agrícolas incluem-se enxadas cafreais e outras ferramentas usadas em África; e o que está compreendido nos instrumentos de cálculo ou de cirurgia quase tudo vai para territórios portugueses de além-mar. As limas são de todos os produtos aqueles que encontram maior saída para o estrangeiro, principalmente para a Argentina e Brasil, que, somados, importaram em 1946 cerca de 7:700 contos dos 10:472 exportados.
Parece não ser impossível alargar mais as exportações, sobretudo na rubrica «Embarcações e veículos». A indústria da construção naval podia talvez constituir uma fonte de actividade interessante. A construção de barcos de vela foi durante muitos anos praticada em estaleiros do norte e centro do País e parece que a guerra reavivou uma tradição secular em matéria de construção naval. Pequenos barcos para transportes fluviais e outros de cabotagem para usos mistos poderiam talvez ser exportados, não só para os domínios ultramarinos portugueses, como também para outros países.
Não é fácil em matéria de veículos, nos tempos mais próximos, aumentar a exportação, e no que diz respeito a máquinas e aparelhos industriais os nossos recursos ainda são bastante limitados. Em todo o caso está em andamento o fabrico de máquinas de costura e de pequenos motores para bombas e outros fins. Por este caminho poderiam seguir vários empreendimentos, tanto mais que, além do mercado interno, está em pleno desenvolvimento o do ultramar. Nalguns aspectos há neles campo para mais produtos metropolitanos.

V

Manufacturas diversas

81. A exportação de manufacturas diversas atingiu em 1946 cerca de 1 milhão de contos.
Ver-se-á adiante quais os produtos que constituem a rubrica. Por agora deve dizer-se que o aumento tem sido muito grande. A exportação de manufacturas passou de 95:000 contos em 1938 para 991:000 em 1946. A tonelagem representando essas manufacturas aumentou de 29:016 toneladas para 134:406.
Têm sido sempre as obras de matérias vegetais (de madeira e cortiças) as que constituem maior valor nas manufacturas diversas.
É em artigos que usualmente se incluem neste capítulo que ainda há lugar para consideráveis desenvolvimentos, apesar de ter sido muito grande a exportação no último ano. As indústrias transformadoras que fabricam os produtos exportados, como as de cortiças, vidros, porcelanas e cerâmica e outras, ocupam grandes quantidades de mão-de-obra.
Em certos casos a mão-de-obra é altamente especializada e, por isso, deverá ser convenientemente remunerada. Além disso essas indústrias consomem em grande parte matérias-primas de origem nacional, algumas das quais até há pouco tempo eram exportadas.
Parece que ainda não foi feito o necessário para encontrar melhores e mais largos mercados para os produtos que adiante se mencionarão e conviria por isso fazer um esforço sério nesse sentido, que deverá ter a colaboração das indústrias interessadas, tal como se realiza com êxito em outros países.
Para dar ideia da exportação das manufacturas diversas no longo período de quarenta e seis anos, publicam-se a seguir algumas cifras de interesse:

QUADRO LXIII

Exportação da manufacturas diversas

[Ver Quadro na Imagem]

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Obras de matérias vegetais

82. As obras de matérias animais não têm grande importância, mas as de matérias vegetais aumentaram imenso em relação ao começo do século e ao início da guerra. Parece ter sido a primeira grande guerra que deu origem a certo número de indústrias relacionadas com obras de matérias vegetais, pois que o peso subiu em 1920 para 34:598 toneladas, de 5:200 que era em 1914. Manteve-se em cifras de idêntica ordem de grandeza até 1940. Neste ano atingiu 47:700 toneladas e dobrou para 97:000 em 1946.
As obras de matérias vegetais consistem em cascos ou barris acondicionando bebidas alcoólicas, palitos, madeira serrada e aparelhada para soalho, caixas, madeira em tabuado, fasquiado ou em contraplacado, cortiça em obra, como aglomerados, quadros, discos, rolhas e outras obras, e finalmente em matérias filamentosas como capachos, cordame e outras, incluindo borracha em obra.
É grande, por consequência, a variedade de produtos, mas os que suplantam todos os outros pela sua importância são os de madeira e de cortiça em obra.
A exportação total atingiu 575:803 contos, contra 95:930 em 1938. Houve um aumento no peso de 73:389 toneladas, que se deu sobretudo na madeira e na cortiça.
A indústria de tanoaria está muito dependente da exportação de vinho, e o grande aumento notado em 1946 na madeira em obra é em parte devido à grande exportação de vinhos neste ano.
Também se desenvolveu bastante a exportação de madeira serrada para caixas e barris. Fez-se para a Palestina, Inglaterra e Marrocos.
A fim de esclarecer melhor a importância deste capítulo da exportação, publicam-se a seguir os números para os principais produtos:

QUADRO LXIV

Exportação de manufacturas de origem vegetal

[Ver Quadro na Imagem]

Madeira

83. A exportação de madeira em obra atingiu em 1946 uma grande soma, comparada com as dos anos anteriores.
A média no quinquénio 1935-1939 não passara de 15:762 toneladas, no valor de 6:757 contos, e no de 1940-1944 fora de 24:220 toneladas, na importância de 32:874 contos. Cotejando estes números com os de 1946, nota-se o enorme caminho andado, o qual se não deu apenas no vasilhame para vinhos, mas incidiu sobretudo na madeira para embalagem de citrinos e de outros frutos enviados para Marrocos e Palestina.

Cortiça

84. Na cortiça em obra a exportação em 1946 foi o dobro da média do quinquénio 1940-1944, que andou à roda de 180:000 contos.
O progresso na transformação da cortiça dentro do País tem sido contínuo e benéfico, sem contudo atingir grandes aumentos quando estimado pelo peso dos produtos exportados.
As fábricas portuguesas enviaram em 1935 para fora 10:408 toneladas de produtos, e a média 1935-1939 não chegou a 11:000 toneladas (10:888), que se não afasta muito da média do quinquénio 1940-1944, que se avizinhou de 13:000.
O ano de 1945 representa já um avanço sobre o anterior de cerca de 5:000 toneladas, que é na verdade muito grande e conveniente se puder ser mantido no futuro.
Par dar ideia da importância da transformação da cortiça em bruto em cortiça em obra, basta verificar os valores médios de uma e outra nos dois quinquénios 1935 a 1944.

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QUADRO LXV

Exportação de cortiça

[Ver Quadro na Imagem]

Exportação (valores em contos)

[Ver Quadro na Imagem]

Preço unitário (valores em escudos)

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento do preço da cortiça em bruto, tal qual é assinalado pelos números da exportação, não acompanhou o de algumas outras matérias-primas no período da guerra (1940-1944). Porém, o da cortiça em obra mais do que triplicou.
Em relação a 1946 o acréscimo foi maior, porque alcançou quase o triplo no caso da cortiça em bruto.
Também, relativamente ao mesmo ano, os números mostram a grande diferença entre os preços da cortiça em obra e em bruto. Foi quase sete vezes maior. E no quinquénio anterior à guerra ainda foi cerca de cinco vezes.
Se fosse possível transformar dentro do País uma percentagem grande da cortiça produzida e exportá-la em obra, a economia nacional ganharia muito.

85. O exame do destino da cortiça, tanto em obra como tem bruto, feito no quadro LXVI, sugere algumas considerações.

QUADRO LXVI

Destino da cortiça em 1946

[Ver Quadro na Imagem]

De vinte e dois países com importações de cortiça superiores a 4:000 contos os Estados Unidos da América vão à cabeça, com 238:400 contos, logo seguidos pela Inglaterra, com 204:200, números redondos. Os dois, juntos, importaram em 1946 mais de metade do total da cortiça exportada. A diferença entre as exportações para os dois países é, porém, grande. A Inglaterra comprou-nos um pouco menos de um terço da cortiça em obra mandada para fora, em peso, e os Estados Unidos adquiriram um pouco menos de metade da cortiça em bruto, enquanto que a importação de cortiça em obra foi muito pequena relativamente ao seu consumo. Comprou-nos apenas 37:586 contos, o que na verdade representa ainda progresso sobre os anos anteriores.
A exportação de cortiça, além de ser valioso auxílio da balança comercial portuguesa, goza de uma outra vantagem: expande-se por grande variedade de países - não está sujeita apenas a um ou dois mercados. Será possível, com as relações comerciais que existem, alargar o consumo da cortiça em obra nos países para onde já é exportada?
Poderão os Estados Unidos aumentar a importação da cortiça em obra e reduzir internamente a sua manufactura em proveito dos países exportadores?
A importância da indústria da cortiça é grande porque o valor unitário dos produtos manufacturados atinge, como se viu atrás, valores bastante mais elevados.
A indústria, apesar dos modernos aperfeiçoamentos, é susceptível de emprego de bem maiores quantidades de mão-de-obra se houver mercado para os produtos.
Há indícios de que o que se fabrica satisfaz plenamente as exigências dos compradores - e com um esforço comercial bem orientado será possível alargar a capacidade e a produção da indústria nacional. Com boa matéria-prima, totalmente obtida no País, não seria talvez difícil dobrar a exportação da cortiça manufacturada.

Obras de matérias minerais

86. Neste capítulo das exportações, que produziu em 1946 para cima de 162:000 contos, é a indústria do vidro a que sobressai e o reforça. E nesta o que mais interessa são as garrafas e garrafões que saíram para acondicionar bebidas alcoólicas. A sua importância na balança comercial depende muito da exportação vinícola.
Além dos vidros têm relevo os materiais de construção, sobretudo o fibrocimento e as louças.
Para 1938 e 1946 o quadro LXVII, a seguir mencionado, dá ideia das principais exportações.

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QUADRO LXVII

Exportação de manufacturas de origem mineral

[Ver Quadro na Imagem]

O vidro, com 121:500 contos, preencheu, cerca de 80 por cento da exportação de obras de matérias minerais - e isso foi em grande parte devido à exportação de bebidas alcoólicas.
O vidro em chapa, que ainda não há muitos anos era importado em, relativamente, larga escala, mostra a exportação de 35:000 contos, resultante, sem dúvida, de largas encomendas de países que sofreram muito com a guerra. Para a Holanda foram em 1946 perto de 25:000 contos de chapa de vidro. A exportação de vidro em chapa já hoje se dirige para vários países, como a França, a Grécia, o Egipto, o Brasil, a Síria, além das províncias ultramarinas.
A indústria do vidro, com velhas tradições, entra já hoje na exportação das obras de matérias minerais com muito larga percentagem. Está, porém, em circunstâncias de aumentar bastante.
Até agora a sua importância funda-se no vasilhame para bebidas alcoólicas. Os vidros para uso corrente e os artísticos não ocupam posição de relevo, e isso parece ser possível. Ainda se não criou a indústria dos cristais para exportação, que pode vir a ser, na combalida vida industrial vidreira, um elemento de equilíbrio.
O mais recente desenvolvimento na indústria vidreira é a fabricação de vidro neutro, destinado a tubos e aparelhos de laboratório e a ampolas medicinais.
Parece haver largas esperanças de grandes êxitos nesta fabricação, agora que desapareceu o concorrente mais temível, que era a Alemanha. Também se supõe que o vidro sanitário poderá constituir uma valiosa actividade.
Dadas as grandes inovações, nos últimos anos, em matéria de uso de vidros em variadas aplicações, não há razões que impeçam o desenvolvimento de uma indústria eminentemente portuguesa, que consome matérias-primas e mão-de-obra nacionais.
A fabricação de louças é uma velha actividade portuguesa e até certo ponto surpreende a pequena exportação, principalmente de porcelanas, preenchida por metade de louça de barro e a outra metade de porcelana.
A louça de barro teve destinos muito variados e foi constituída por louça artística, sobretudo os 3:300 contos que se exportaram para os Estados Unidos e também parte dos 1:250 contos que foram para o Brasil.
A porcelana dividiu-se em cerca de 2:000 contos para o Império Colonial e os restantes 6:600 para o Brasil (3:923), os Estados Unidos (1:282) e mais vinte e cinco territórios estatísticos.
Há possibilidade de alargar muito esta exportação.
Quase toda a louça sanitária foi para o ultramar português, e a lousa, tanto em lápis como para fins escola - repartiu-se por grande número de países, o que até certo ponto surpreende muito.

Obras de metais

87. A exportação de obras de metais preciosos e não preciosos atingiu 67:293 contos, contra 9:715 em 1938, e pesos respectivos de 1:898 e 1:205 toneladas. É notável que a exportação deste tipo de mercadoria andou sempre à roda destes pesos desde o início do século. Foi em 1900 de 1:750 toneladas, no valor de 1:328 contos-ouro. Em 1946 o valor-ouro, embora com bem menor peso, foi de 1:477 contos.
Fazem parte desta rubrica produtos do artesanato e uma grande variedade de artigos de uso doméstico, como cutilaria, louça esmaltada e de alumínio, tubos diversos, tambores, latas, ferros de engomar, camas de ferro e ferragens. Cerca de 28:908 contos em 1946 consistiu em metais preciosos em obra, sendo 8:237 de ouro e o resto de prata em filigrana e outras obras e 649 em platina.
Não tem havido grandes progressos na exportação de artigos deste género, e até certo ponto isso é de estranhar, dadas as aptidões do artista português e o desenvolvimento que poderiam ter certas indústrias.
A discriminação dos principais artigos para 1938 e 1946 é a seguinte:

QUADRO LXVIII

Exportação de manufacturas de metal

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

A maior parte da exportação de objectos de metais não preciosos faz-se para as províncias ultramarinas.
Marrocos, nos últimos tempos, tem consumido alguns produtos de cobre e ferro e aço e o Brasil é também um cliente de certa importância.
Mas é evidente que os mercados do ultramar são de todos os mais importantes e aqueles que têm maior possibilidade no futuro.
As obras de ouro foram em 1946 quase todas para o Brasil (cerca de 7:875 contos) e a prata tem mercado em grande número de países, destacando-se em 1946 na obra em filigrana o Brasil (4:209 contos), a Suécia (1:124 contos) e os Estados Unidos (964 contos). A maior parte da obra de prata não especificada também seguiu para o Brasil (9:011 contos).
A exportação deste tipo de obra deve ter sido bastante maior, porque muita dela, adquirida por turistas, não é declarada - é pertença pessoal adquirida na passagem por Lisboa.

Papel, desenhos e obras de tipografia e pintura

88. Do conjunto de 25:954 contos exportados em 1946 couberam 6:555 a livros impressos, dos quais 5:976 para o Brasil e o resto para grande número de países. A quota-parte do ultramar português foi de 278 contos, o que é muito pouco.
Do papel para impressão, de que em 1946 se exportaram 718 toneladas, no valor de 5:561 contos, 4:741 foram para França.

Manufacturas diversas

89. Incluem-se nesta rubrica estatística grande variedade de objectos e artigos. Parece ter havido sensível progresso nas diversas indústrias que a constituem. A exportação aumentou nos últimos tempos apreciàvelmente em valor, mas ainda em peso não atinge a de 1900, como se pode verificar nos números que seguem:

QUADRO LXIX

Exportação de diversas manufacturas

[Ver Quadro na Imagem]

Incluem-se muitos artigos, entre os quais convém citar, por sua importância, chapéus, calçado, pentes, chapéus de chuva, objectos para escritório, fósforos, perfumarias, medicamentos, brinquedos, artigos de ourivesaria e joalharia, relógios, material para iluminação e outra material eléctrico, artigos de fotografia e diversas outras manufacturas, que por sua variedade e importância não vale a pena discriminar.
Não é fácil dar uma súmula das exportações de tantos artigos, mas no quadro que segue faz-se uma tentativa para sistematizar as dos que dizem respeito aos anos de 1938 e 1946, em contos.

QUADRO LXX

Exportação de manufacturas diversas

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

Os artigos para vestuário incluem chapéus, bonés, calçado e outros. Beneficiaram em 1946 de uma larga exportação para a Suécia, que se elevou a mais de 20:000 contos. Os chapéus entraram por esse facto com cerca de 35:000 contos para a balança comercial. Outros países, como a União Sul-Africana e a Suíça, fizeram encomendas de certo interesse, que mostram as possibilidades da indústria chapeleira, se convenientemente organizada. O calçado e os restantes artigos de vestuário têm o seu principal mercado nas províncias ultramarinas.
Também é de notar em 1946 a exportação de mais de 2:000 contos de chapéus de chuva e o envio de algumas partidas de interesse para a Colômbia, a Irlanda e outros países. Há na verdade algumas esperanças na expansão de pequenas indústrias que até agora só viviam do mercado interno.
Os objectos de escritório seguiram quase todos para o ultramar, assim como os fósforos, e, embora a maior parte dos produtos de perfumaria também para lá fosse dirigida, ainda uma parte se encaminhou para o estrangeiro.
Coisa idêntica aconteceu com medicamentas, más a Inglaterra, o Brasil, a França, a Noruega e outros países importaram algumas centenas de milhares de escudos.
Quase todos os vernizes e tintas foram para território português, com excepção do que foi consumido em navios estrangeiros. Dos artigos de ourivesaria e joalharia, além do que foi para a nossa África e Ásia, há importantes saídas para o Brasil e União Sul-Africana, além de outros destinos.
Estamos hoje a exportar brinquedos para diversos países americanos e europeus e esta indústria parece ter tendências e possibilidades de desenvolvimento.
Mais de metade do valor dos artigos de fotografia e cinematografia foi para Espanha. Já constituem parte do intercâmbio cinematográfico que ùltimamente se desenvolveu entre os dois países ibéricos.

As manufacturas diversas, não especificadas, constituídas por muitos artigos, dirigiram-se principalmente para o Império Colonial, mas também seguiram encomendas importantes por via postal para os Estados Unidos e outros países.

A ORIGEM E O DESTINO DO COMÉRCIO EXTERNO PORTUGUÊS

I

O comércio com os principais países

90. A Inglaterra ocupou até há poucos anos o lugar principal no comércio externo português, tanto na importação como na exportação. São conhecidas as causas, que têm sido largamente comentadas através dos tempos. E não vale a pena agora debater um assunto que, filiado em acontecimentos e relações políticas bem conhecidos, tem sido alvo de apreciações de diversa natureza nem sempre serenas e imparciais.
Já na década passada se acentuou uma gradual e lenta deslocação das importações e exportações. A América do Norte, com a sua política de protecção pautal, tem impedido a entrada de produtos manufacturados e vinhos, mas comprava, em relativamente larga escala, a cortiça para a sua indústria transformadora.
Esta matéria-prima e as conservas constituíram por bastante tempo o fundo das nossas exportações para os Estados Unidos da América. Mas a balança comercial com este país foi sempre deficitária.
O Império Colonial, servido por carreiras marítimas portuguesas para as costas Ocidental e Oriental de África, ocupa há muito tempo o primeiro lugar na exportação do labor das indústrias manufactureiras, principalmente nos produtos têxteis, e fornece à metrópole parte de certas matérias-primas de origem vegetal, como as oleaginosas, e ùltimamente o algodão, além de substâncias alimentícias, entre as quais o açúcar.
A influência do Império Colonial na balança de pagamentos não se circunscreve, porém, às relações de permuta de matérias-primas, substâncias alimentícias e produtos manufacturados. Incide também em elevado grau no mercado de cambiais.
Lisboa funcionou sempre como centro de negócios de produtos coloniais: do café, do cacau, das oleaginosas e de muitos outros. Os lucros das transacções ficam na metrópole e deles saem os capitais invertidos depois, no ultramar em empresas e explorações diversas. A balança de pagamentos, sobretudo nos últimos anos, adquire, por esse facto, um reforço de cambiais de grande interesse para a economia nacional.
Em 1946 vieram das províncias ultramarinas 15,1 por cento das nossas importações e mandámos para lá 22,5 por cento das exportações, calculadas pelo valor. Importámos 334:200 toneladas e exportámos cerca de 85:000.
A Inglaterra, os Estados Unidos e o Império Colonial são os três principais vendedores e compradores de mercadorias consumidas internamente ou enviadas para o estrangeiro. Em 1938 e 1946, em percentagens, os números são os seguintes:

QUADRO LXXI

[Ver Quadro na Imagem]

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(147)

Mais de metade do nosso comércio externo, em valores, realizou-se em 1946 com estes três grands territórios estatísticos, que são as unidades políticas com quem no momento actual temos mais intensivas relações comerciais. O aumento desde 1938 foi considerável.
Com todos eles, porém, é deficitária a balança comercial portuguesa, e no que toca aos Estados Unidos da América o déficit atinge proporções consideráveis - cerca de 1.029:300 contos em 1946, um pouco menos do que o total da exportação em 1938, que fora de 1.145:594 contos.
Do déficit de 2.273:000 contos da balança comercial de 1946 cabe aos Estados Unidos da América e Império Britânico um pouco menos de 72 por cento, o que é muito, dado o poder de compra que os Estados Unidos e alguns dos territórios britânicos possuem.
O déficit com o Império Português foi pequeno, um pouco mais de 3:500 contos, que se compara com 94:890 contos em 1938.
Dos outros países ou territórios estatísticos ocuparam em 1946 lugares de relevo: o Brasil, a Bélgica-Luxemburgo, a França, a Suíça, a Holanda e a Suécia: Com excepção dos dois primeiros, tivemos saldos negativos com todos os outros. No caso da Holanda o grande déficit provém das importações de óleos minerais de Curaçau, que tem sido o nosso principal fornecedor. No caso da França as fosforites da Tunísia influem bastante na magnitude do saldo.
As relações comerciais com a Suíça e a Suécia desenvolveram-se muito durante a guerra, sobretudo com a primeira. Nestes países as percentagens em valor nas importações e exportações foram em 1946 as seguintes:

QUADRO LXXII

[Ver Quadro na Imagem]

O exame dos números e a sua comparação com os que atrás se transcrevem, relativamente aos territórios estatísticos dos Estados Unidos, Inglaterra e Império Português, sugerem algumas considerações de interesse. Em valores a percentagem das importações dos Estados Unidos em 1946 foi maior do que a dos seis países atrás mencionados (24,99 contra 24,51), mas nas exportações coube aos Estados Unidos menos de metade (14,94) do que a esses países (31,63). Em 1938 a percentagem dos valores das mercadorias importadas dos Estados Unidos (11,61) não atingira 50 por cento da dos territórios citados.
Este facto mostra a actual posição dominante da República Norte-Americana no comércio externo importador. Enviamos para lá grande parte de cambiais que recebemos de outros territórios.
Hão-de ser analisadas adiante as mercadorias pagas nos Estados Unidos com o que nos sobrou de vendas para outros países e dos recursos internos, e então se estudará se haveria sido possível reduzi-las. Agora apenas se acrescentará ser necessário, sob todos os aspectos, fazer um esforço sério no sentido de aumentar as exportações para o principal fornecedor do consumo nacional.

91. Já se traçaram para 1946 os destinos de 87,56 por cento das exportações, em valor, e sabe-se de onde vieram 85,76 por cento, também em valor, das importações.
O resto, que não chega a 15 por cento, distribui-se por grande número de territórios. De entre eles convém mencionar os que na exportação ou importação têm percentagens superiores a 1 por cento. São os seguintes:

QUADRO LXXIII

[Ver Quadro na Imagem]

É provável que as importações da Argentina cresçam. A política seguida ùltimamente em matéria de abastecimentos necessita da compra de produtos que este país no momento presente está em condições de fornecer. O déficit, que já em 1946 foi superior a 152:000 contos, há-de naturalmente aumentar, porque parece não estar a Argentina na disposição de adquirir muito maiores quantidades de produtos portugueses.
Surpreende bastante o pequeno comércio com a vizinha Espanha - cerca de 270:000 contos no total, com déficit de 95:500. Há certamente condições que permitem consideráveis melhorias, apesar de sermos concorrentes em certas das suas produções, como cortiça, vinhos e outras.
Da Noruega veio o bacalhau, e ele por si só justifica o grande déficit. Importaram-se de lá 9:164 toneladas, no valor de 93:781 contos. O total foi de 141:500 contos.

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A Palestina compra caixas de madeira para embalagem dos seus citrinos, que exporta em largas quantidades. É um cliente relativamente novo, com o saldo positivo para a nossa balança de 53:000 contos. Finalmente a Venezuela vende também óleos minerais e compra pouco.
O saldo negativo mais do que anulou no ano de 1946 o da Palestina. As cifras foram da mesma ordem de grandeza.
Restam os casos da Alemanha e Itália, com as quais mantínhamos largas relações comerciais em 1938 e que desapareceram quase por completo em 1946, por virtude dos acontecimentos conhecidos.
Mas não pode haver dúvidas de que mais cedo ou mais tarde estes dois países virão a reocupar um lugar importante no comércio externo português, tanto no importador como no exportador.
As percentagens para os dois anos são as que seguem:

QUADRO LXXIV

[Ver Quadro na Imagem]

A diminuição na percentagem de importações da Alemanha foi de 16,26 por cento e nas exportações para este país de perto de 13 por cento. Ambas representaram um factor importante no comércio do anteguerra.
Os Estados Unidos foram os principais beneficiários, nas importações, do desaparecimento do mercado alemão, mas não compensaram, em percentagem de valores, o que a Alemanha adquiria.

II

Os saldos da balança comercial

92. O exame em percentagens, que acaba de ser feito, do comércio externo nas suas relações com os principais países necessitaria de ser completado com os números absolutos. Saber quanto em escudos se importou de um e outro dos países atrás citados, de modo a poder determinar-se onde se deram as deslocações mais importantes, para, em seguida, se verificar quais os produtos que a isso deram causa, esclarece mais profundamente a questão.
O quadro que segue tenta dar ideia do conjunto para os diversos países nos anos de 1938 e 1946.
Conjugado com as cifras das percentagens, torna compreensível as principais modificações que resultaram da guerra.

QUADRO LXXV

Importações e exportações

(Valores em contos)

Principais territórios estatísticos

[Ver Quadro na Imagem]

Não houve sensíveis alterações relativamente à natureza de saldos, a não ser no que diz respeito à Espanha e à Bélgica. No primeiro passou a haver déficit em 1946 e no segundo o saldo negativo mudou para positivo.
Já se verificou atrás que as relações da metrópole com as províncias ultramarinas haviam melhorado sensìvelmente. Daí resultou que o déficit da metrópole diminuiu. Com os Estados Unidos e dependências o déficit aumentou cinco vezes e com o Império Britânico o acréscimo foi de duas vezes e meia.
Os números dão ideia do esforço a realizar para diminuir o peso da grande diferença que existe em certos países entre as importações e as exportações.
Embora se possa dizer que estas em 1938 foram talvez um pouco superiores àquilo que os números mostram, em virtude das correcções que haja porventura necessidade de lhes introduzir, como já se explicou acima, os resultados de 1946 exprimem uma muito dolorosa realidade do comércio externo português, como aliás já os de 1938 assinalavam.

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Eles indicam talvez, com bem maior evidência do que os de anos anteriores, os pontos fracos da nossa exportação e os países onde há necessidade de exercer maiores esforços no sentido de reduzir o déficit. Para todos os efeitos práticos já se podem considerar como exprimindo a realidade as cifras de 1946 e estas, pelo que diz respeito aos Estados Unidos, à Argentina, ao Império Britânico, à Suécia, à Suíça e à Noruega, são ainda bastante desoladoras. Não se fala na Holanda, que ainda acusa um déficit elevado, porque ele provém todo das importações de óleos minerais de Curaçau. E há mercado em certas repúblicas sul-americanas para maior consumo de produtos portugueses, assim como mós países escandinavos e na Suíça.

93. A guerra fez desaparecer ou reduziu consideràvelmente as nossas relações comerciais com certo número de países, o que aliás aconteceu com outras nações do Ocidente. Entre eles estão a Polónia, a Checoslováquia e a Roménia. O comércio com a Polónia, embora nunca tivesse atingido cifra por aí além, tendia a aumentar. Totalizara já mais de 37:000 contos em 1937. A importação e exportação com a Roménia dependia bastante das remessas de trigo ou até de óleos minerais, mas haviam sido em 1934 mais de 27:000 contos, quase tanto como com a Rússia e a Suíça, que nesse ano não passara de 29:840 contos. A Checoslováquia exportava bastante, mas o seu comércio com Portugal não passou de 20:700 contos em 1938, com tendência para se desenvolver.
As relações comerciais com o resto da Europa nunca foram grandes. Com a Rússia têm-se limitado quase sempre à exportação de cortiça, e ainda era esta a mercadoria que predominava nas relações com os países vizinhos daquele. A perda desse comércio, que não foi total, não alterou sensìvelmente o sentido do nosso comércio externo.
Em compensação intensificaram-se as permutas com alguns países vizinhos no Atlântico e prometem frutos essas relações, se convenientemente tratadas pelos interessados.
Entre eles convém citar o México, Cuba, a Colômbia, a Venezuela, o Canadá e ainda outros.
Com o México foi positivo o saldo, tanto em 1938 como em 1946. Em 1946 o total do comércio especial já andava à roda de 60:000 contos. Havia sido pouco mais de 7:000 em 1938.
O caso de Cuba também é esperançoso. Ao total de 2:500 contos em 1938 correspondem perto de 25:000 em 1946, dos quais cerca de 22:000 representam exportações.
À Colômbia cabiam pouco mais de 9:500 contos em 1938, que se elevaram para perto de 59:000 em 1946, com o saldo negativo de 18:800. Finalmente, a Venezuela, que manda para Portugal óleos combustíveis, exportou 69:000 contos e importou 13:500 em 1946, contra 19:400 e 2:100 em 1938.
Parece haver noutros países da América do Sul possibilidades de consumo de produtos portugueses, e para alguns, nomeadamente o Chile, com o qual mantemos saldo negativo, que em 1946 atingiu mais de 64:500 contos, não parece ser difícil o envio de mercadorias, como conservas, cortiças e talvez vinhos do Porto. Até agora o Chile tem comprado cortiça em prancha a em obra, algumas bebidas, limas e pouco mais.
Ora só em nitrato de sódio importámos de lá em 1946 para cima de 60:400 contos.

94. Há ainda certas zonas onde pouco chegou a influência do comércio português, embora com elas mantenhamos há bem longos anos relações cordiais de carácter histórico, que remontam ao período das Descobertas.
A Índia Britânica e a China são dois vastos territórios, de grande população, vizinhos da Índia Portuguesa e de Macau. Ambas estas províncias poderiam ser intermediárias activas entre Portugal e o Oriente em matéria comercial. Não se compreendem muito bem as razões que impediram no passado maiores contactos entre as suas economias. Supõe-se que a falta de navegação directa para uma e outra daquelas possessões portuguesas poderá ser a causa do pequeno comércio que existe entre Portugal e o Oriente, que se cifrou para a Índia Britânica, China e Japão, em 1938 e 1946, nos números que seguem, os quais, na verdade, dão uma pobre ideia das suas grandes possibilidades:

QUADRO LXXVI

[Ver Quadro na Imagem]

Da Índia vem o cairo em rama, a juta e sacaria, e isso, com os extractos tanantes, preenche quase toda a importação. As nossas remessas para lá são em grande parte cortiça em obra (16:076 contos em 1946). O resto reparte-se por muitas verbas, entre as quais avulta a dos vinhos, com cerca de 1:650 contos.
Pouco comprámos na China, além de chá e especiarias (1:656 contos em 1946), mas também é bem pouco o que para lá vendemos, fora a cortiça como matéria-prima (4:384 contos em 1946) e em obra (884 contos).
A exportação de vinhos e conservas não atingiu 400 contos em 1946. Em 1938 pouco passou de 150 contos.
É evidente existirem possibilidades de maiores relações comerciais entre Portugal, de um lado, e a Índia e China, do outro. Torna-se necessário para isso aproveitar as posições da Índia Portuguesa e Macau, à semelhança do que foi feito por outros países, com o estabelecimento de entrepostos, como Hong-Kong.
Não se compreende este desinteresse do comércio externo português pelos países do Oriente. Tudo indica ser possível, pelo menos nalguns, maior consumo de géneros ou mercadorias portugueses.
Há vantagem para isso em proceder a um inquérito cuidadoso.

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III

As importações por territórios estatísticos

95. Analisaram-se atrás, de um modo geral, as origens próximas e mais importantes do nosso comércio externo e o papel nele representado por três ou quatro países.
Deram-se durante a guerra modificações sensíveis, que ocasionaram desvios no sentido das importações e exportações. Já em 1938 se desenhava claramente a gradual marcha para oeste das nossas actividades económicas.
Desde o início Portugal tendeu sempre para actividades atlânticas, e foi neste grande mar que se afirmou, através dos séculos, o seu génio.
Durante muitos anos, depois das Descobertas e durante o domínio na Índia e a colonização do Brasil, o comércio fez-se em grande parte pelo Atlântico para os países de além-mar, para sul e sudoeste. Depois a Europa constituiu durante bastante tempo a fonte das nossas importações e o destino das nossas exportações.
Mas as coisas assumiram já um aspecto muito diferente em 1946. A América passou a ser o nosso maior fornecedor, tanto em tonelagem como em valor.
Da América vieram naquele ano 1.270:200 toneladas, que importaram em 2.701:200 contos. Isto representa um pouco menos de metade em peso e cerca de 40 por cento em valor.
Tão tremenda mudança no sentido do comércio de importação resultou principalmente da inabilidade, por virtude de crise interna, do velho fornecedor de combustíveis sólidos. A Inglaterra, por motivos bem conhecidos, não pode manter a exportação de combustível e a Alemanha, que mandara para Portugal em 1938 perto de 400:000 toneladas de produtos, quase não conta em 1946.
Os Estados Unidos da América foram os beneficiários desta fraqueza europeia. Passaram a fornecer o País de combustíveis sólidos, que são os mais volumosos, e de muitos outros produtos que antigamente vinham da Europa Ocidental, principalmente da Inglaterra e da Alemanha.
Vale a pena transcrever os números que mostram a deslocação do comércio importador durante o período da guerra.

QUADRO LXXVII

Importações por continentes

[Ver Tabela na Imagem]

A diferença entre os pesos importados nos dois anos difere apenas em 91:600 toneladas. As diminuições da Europa foram ganhas em perto de 70:000 toneladas pelo Império Português, em cerca de 93:000 pela África e em 1.036:000 pela América, sobretudo a do Norte. E de notar que o nosso comércio importador, em peso, diminuiu apreciavelmente com a Ásia e com a Oceânia.
O quadro acentua muito vincadamente a influência do conflito e a importância do continente americano. Conviria, por isso, elucidar com mais largueza as possibilidades económicas deste continente, sobretudo no que diz respeito ao desenvolvimento das exportações. O acréscimo na importação das duas Américas foi de mais de 2.000:000 de contos (2.262:640), entre 1938 e 1946, ou mais de 1.000:000 de toneladas, e o déficit com elas, apesar do contributo do saldo positivo de alguns países, atingiu cifra também muito elevada. Não valerá a pena fazer um esforço no sentido de intensificar o comércio exportador com países detentoress de saldos positivos em elevado grau?

Império Colonial Português

96. Não são ainda satisfatórias, na medida em que o podiam ser, as relações comerciais entre a metrópole e as províncias ultramarinas. Há necessidade de mais estreita coordenação das economias dos territórios portugueses, que são complementares em muitos aspectos.
A guerra influiu favoravelmente nas relações interimperiais porque aumentou bastante a percentagem, tanto nas exportações como nas importações. Umas e outras atingiram a casa de 1 milhão de contos, e já se viu atrás que esta cifra representa 15 por cento na importação e 22,5 por cento na exportação total do País.
Idênticas percentagens andavam à roda de 10 e 12 por cento e menos nos anos anteriores à guerra. Em 1935, por exemplo, a importação não passara de 8,24 por cento e a exportação para os domínios ultramarinos em 1936 não atingira 10 por cento do total.
As cifras de 1946 representam por isso melhoria sensível, e bem vistas as coisas parecem ser ainda susceptíveis de progressos. Deve contudo dizer-se que a economia metropolitana nunca foi adaptada às necessidades da economia colonial.
As províncias ultramarinas mandam para a metrópole matérias-primas: algodão, peles e oleaginosas; substâncias alimentícias: açúcar, farináceos, cacau, café e outros produtos de menor importância. Recebem da metrópole tecidos, sobretudo de algodão, vinhos e seus derivados, substâncias alimentícias metropolitanas, como carnes, frutos, conservas de peixe e produtos manufacturados de diversa natureza. Mas as duas mercadorias fundamentais são os tecidos de algodão e outros produtos têxteis e as bebidas.
É estranho que a indústria metropolitana não tivesse procurado adaptar melhor a sua estrutura às necessidades dos mercados ultramarinos. Tirando as manufacturas de algodão que absorvem os mercados ultramarinos, há campo vasto para melhor aproveitamento em outras indústrias.
O assunto tem, até certo ponto, carácter de urgência, porquanto se sabe que as duas maiores províncias - Angola e Moçambique - podem vir a bastar-se de artigos algodoeiros, transformando no local a sua própria matéria-prima. Haverá que substituir, na exportação para as províncias ultramarinas, o que agora é preenchido por tecidos, pelo menos em parte, embora haja contrapartida nas importações da matéria-prima representada por algodão. Contudo a contrapartida está longe de ser completa.
Não há tempo nem espaço para fazer neste lugar a análise do comércio externo com todos os domínios ultramarinos e deduzir desse estudo as regras principais que o orientam. Mas vale a pena, embora a longos tra-

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cos, dizer alguma coisa sobre as circunstâncias em que vive o comércio metropolitano em relação às duas grandes províncias de Angola e Moçambique.

Angola

Importações

97. Sem ser país de riqueza por aí além, Angola tem grandes recursos económicos. E um vasto território que se estende em parte para uma zona relativamente temperada, próxima de região tropical susceptível de grande desenvolvimento económico. Quem viaja no vasto território que vai do Zaire ao Cunene e dos confins da Lunda ao litoral sente a grandeza das suas possibilidades. Fica a impressão indelével, como acontece a quem escreve passados mais de vinte anos, de que ali está em formação um novo país, que há-de ser, na costa ocidental de África, o prolongamento feliz da raça portuguesa.
As forças do destino quiseram marcar no Atlântico Sul uma dualidade de países lusitanos. De um lado o Brasil, que está a entrar na pujança de um vasto império; do outro Angola, que laboriosamente se prepara para marcar em frente, na costa de África, um lugar que não desmereça da sua irmã americana e da Mae-Pátria, berço das duas.
Nós somos os criadores destas formosas realidades, que atestam por si sós as aptidões universalistas de um génio político.
Angola ocupa no nosso comércio ultramarino o primeiro lugar, embora se distancie pouco de Moçambique. E as suas importações e exportações para a metrópole progrediram bastante com a guerra. As principais constam do quadro que segue, em contos, para 1938 e 1946:

QUADRO LXXVIII

Principais importações

[Ver Quadro na Imagem]

Vêm de Angola matérias-primas e substâncias alimentícias. Nas primeiras ocupam lugar dominante o algodão e em menor escala as peles secas e as oleaginosas. Estas últimas não progrediram em relação a 1938 tanto como seria para desejar. A intensificação da cultura, das oleaginosas, como fonte de cambiais para a província e abastecedora dos mercados metropolitanos, é sem dúvida um dos mais importantes problemas angolanos. A província tem notáveis aptidões para esse fim e há já sintomas de progresso neste aspecto da sua economia.
O Mundo há-de necessitar, nos anos mais próximos, de vastas quantidades de matérias gordas, e Angola pode ser grande produtora destas matérias, que, além disso, podem fornecer alimentos para gados.
Outro produto que seria susceptível de ter certa importância é a borracha. Há, porém, necessidade de preparar convenientemente o produto na origem. De outro modo não será possível manter o comércio actual.
Mas foi no algodão que se deu em curto espaço de tempo o aumento mais sensível na exportação, que progrediu mais de 5:000 toneladas em peso e 80:000 contos em valor.
Ainda há matérias-primas de origem vegetal que não têm nos mercados da metrópole o lugar que podiam ter, como as madeiras, por exemplo, e o tabaco em folha. A indústria de contraplacados está ainda em começo e parece haver em Angola madeiras extremamente próprias para esse fim.
Por outro lado, o País importa, como se viu atrás, grande quantidade de tabaco em folha - e o quinhão desta província ainda não é o que deveria ser, apesar de ter havido ligeiro acréscimo na importação entre os anos de 1938 e 1946. Supõe-se que uma das razões é a qualidade das folhas, em comparação com as de origem norte-americana e de outros países. Deveria fazer-se um esforço no sentido de as melhorar ou de lá produzir aquelas que se adaptem ao mercado metropolitano.
Mas onde realmente os progressos da exportação angolana podem ser mais espectaculosos é na indústria das carnes. A província tem, na verdade, grandes possibilidades nesta matéria e pode alargá-las, mas são rudimentares os actuais métodos de exploração. Fala-se muito em frigoríficos no litoral e já têm corrido rios de tinta, sobre um assunto que necessitava de ser visto mais à luz de realidades do que de quimeras. Embora a indústria da refrigeração não seja simples - pode dizer-se que ela começa nos estábulos onde nascem os animais e nas pastagens onde vivem para terminar nos barcos com instalações especiais que transportem carne -, embora, repete-se, não seja simples esta indústria, ela pode constituir na província da África Ocidental uma interessante e rendosa actividade.
Nas matérias-primas de origem mineral aparecem em 1946 verbas relativas a asfalto, minério de cobre (625 contos), cobre (metal) e ouro. Soma tudo perto de 2:900 contos.
Os trabalhos em curso nas libolites e grés betuminosos parecem augurar um largo futuro para esta indústria. Se forem tão largas as reservas como se diz, com o teor em óleos que se supõe, presume-se que no futuro as nossas importações de materiais asfálticos e outros produtos oleosos venham totalmente desta província.
No que diz respeito a cobre, já são velhas as notícias da sua existência, sobretudo no norte, e gastaram-se até hoje somas importantes em pesquisas e reconhecimentos. Parece haver na mesma zona outros minérios, associados ou não com o cobre. Se assim for, ainda que em escala mais modesta que nos territórios vizinhos, pode Angola ter na indústria mineira um interessante apoio das suas exportações.

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O que mandou para a metrópole em 1946 vale como indício e abre caminho para futuros desenvolvimentos.

98. A maior exportação de Angola para a metrópole deu-se, porém, nas substâncias alimentícias. Em 1946 mandou 269:706 contos, ou 159:692 toneladas. Os farináceos ocupam por muito o primeiro lugar, com o milho em grão (92:787 toneladas) e o feijão (10:461 toneladas). Os que vieram de Angola em 1946 importaram em 154:510 contos, contra 15:173 em 1938, ou 28:036 toneladas. Foi longo neste aspecto o caminho percorrido, tanto em tonelagem como em valor, o que não é bom sintoma para a agricultura metropolitana.
Mas o que na verdade surpreende é que Angola exporta já para Portugal continental mais pescarias do que dele importa, incluindo conservas. Os números são, respectivamente, 479 toneladas e 2:667 contos para a importação de Angola e 184 toneladas e 1:888 contos para a exportação para Angola. Em valor, os números eram semelhantes em 1938 - 776 contos importados e 616 exportados para lá.
Sabe-se que uma parte importante do açúcar consumido em Portugal é angolano. Da grande província ultramarina vieram 28:400 toneladas em 1938 e um pouco mais de 31:100 em 1946. E há possibilidades de acompanhar, na parte correspondente, o desenvolvimento do consumo metropolitano.
A traços largos, são estas, além do café, as principais importações de Angola. Ainda não são o que poderiam e deveriam ser. A província está no caminho de desenvolvimento, como o atestam as suas cidades do litoral, principalmente Luanda e Lobito. A produção que derivou das necessidades de guerra activou bastante o seu progresso. A província deve dar prioridade à melhoria dos instrumentos produtores e utilizar de preferência as suas reservas monetárias e cambiais na formação de um núcleo de organismos produtivos que possam desafiar em tempos futuros as baixas inevitáveis nos preços e a abundância nos mercados.
Angola tem sofrido crises - algumas inevitáveis, outras que resultaram de incúrias ou erros.
Deve-se evitar a monocultura, aperfeiçoar as indústrias agrícolas, não caminhar demasiadamente longe na industrialização - que é hoje em muitos países uma arma de dois gumes. E sobretudo procurar estreitai-as suas relações comerciais com a metrópole, que ainda é mercado certo, embora modesto, nos tempos de crise.
Há queixumes recíprocos, inevitáveis entre gente da mesma família. Mas o que já há feito em Angola prova a possibilidade de fazer muito mais. A economia de um país novo, com tão variadas características como as de Angola, terá de ser desenvolvida metòdicamente e com base nos recursos da província e nos mercados do Mundo.
É para os mercados externos que Angola terá de mandar no futuro grande parte da sua produção, mas nunca os responsáveis pelo seu desenvolvimento devem esquecer que nos momentos de crise a metrópole é o único e melhor apoio da província.

Exportações

99. Viu-se atrás o que vem de Angola. Convém agora indicar o que para lá mandamos.
Também neste capítulo houve grande progresso. O que se exportou foi além de 23:595 toneladas, no valor de 61:325 contos, em 1938, e atingiu 38:810, no valor de 426:349 contos, em 1946. É muito apreciável este desenvolvimento do comércio com aquela província.
As principais mercadorias, num e noutro daqueles anos, foram:

QUADRO LXXIX

Principais exportações para Angola

[Ver Quadro na Imagem]

Nas matérias-primas pesa o cimento. A exportação deste material foi de 8:243 toneladas em 1938 e 5:735 em 1946. É bem pouco para as possibilidades da metrópole e de Angola.
A ambição de a província vir a construir uma fábrica de cimentos, já planeada, parece ser Justa em vista do desenvolvimento na construção durante os últimos anos e das possibilidades futuras. A metrópole nunca conseguiu, por motivos que conviria indagar, abastecer a província de cimento. Houve sempre importação de outros países. Talvez isso seja devido ao custo de transportes. Impõe-se, contudo, a necessidade do consumo de cimento por preços razoáveis, dadas as obras de utilidade pública que é mister executar, tais como pontes,

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portos, barragens, edifícios e outros grandes consumidores daquele material. Mas a maior exportação para Angola é nos fios e tecidos e outras obras têxteis, e de entre eles destacam-se os produtos de algodão.
De 1:348 toneladas, com o valor de 22:963 contos, em 1938 a exportação passou para 3:147 toneladas, ou 205:909 contos, em 1940. Sem perder de vista os anos de carência que foram os da guerra, este avanço considerável representa um progresso sensível.
O aumento deu-se nos artigos de lã, seda, algodão e linho, e consideràvelmente nas remessas por via postal, que passaram de 62 toneladas para 158 e que constaram em 1946, essencialmente, de tecidos de lã (2:943 contos), tecidos de algodão (5:263 contos), vestuário de malha (2:603 contos), vestuário de algodão (4:498 contos) e outras de menor valia.
Angola, em 1946, vendeu à metrópole 8:678 toneladas de algodão em caroço e em rama e comprou 2:843 toneladas de produtos algodoeiros, sem contar com os que foram enviados como remessas, postais, que sobem a umas dezenas de toneladas.
Os tecidos de algodão, tintos, em peça, ocupam por muito o primeiro lugar, com 1:690 toneladas, no valor de 119:659 contos, em 1946. Em 1938 não passaram de 721 toneladas, ou 11:901 contos.
Parece ter havido considerável melhoria no comércio algodoeiro. As fábricas portuguesas da metrópole têm nas províncias ultramarinas o principal mercado. As suas relações com esses mercados necessitam de ser esclarecidas e estudadas de modo a que o ultramar receba os melhores produtos a preços razoáveis. A questão não é apenas a das relações entre produtores e consumidores. O comércio intermediário desempenha função muito importante e conviria harmonizar os interessados de modo a reduzir ao mínimo os custos e aumentar o consumo. A produção algodoeira chega à província muito cara.
Outra exportação importante para Angola é a que na estatística aparece sob a designação de substâncias alimentícias. Formam-na os vinhos e outras bebidas e diversos produtos, como azeite, manteiga, carne de porco, frutas, azeitonas e diversas, além de pescarias e farináceos.
Há possibilidades de alargar muito este capítulo da nossa exportação.
Em bebidas, os números, para 1946 atingiram cifra alta: 75:232 contos, contra 12:677 em 1938. Em litragem, foi mais do que o dobro. O aumento deu-se sobretudo no vinho. A metrópole exportou em 1938 cerca de 71:384 hectolitros de vinho. Mais do que dobrou a exportação do mesmo produto em 1946 (157:072 hectolitros). E o valor foi de cerca de seis vezes mais.
Onde parece haver campo vasto para progressos nas exportações é nas máquinas, aparelhos, instrumentos, ferramentas, utensílios e manufacturas diversas.
Os números, tanto para 1938 como para 1946, ainda são baixos, como pode fàcilmente verificar-se do quadro atrás inserto.
A exportação de máquinas, aparelhos, ferramentas e outros utensílios não passou de 1:144 toneladas em 1946. Uns parcos 19:768 contos. Incluem-se nelas enxadas, alfaias agrícolas, ferramentas de diversa natureza, máquinas de costura, barcos, veículos e muitos outros artigos de interesse fundamental.
Tirando as enxadas cafreais, as máquinas destinadas à indústria, os diversos aparelhos e utensílios, que atingiram, na exportação, as pequenas cifras de 2:000 ou 3:000 contos, o resto não tem interesse. Em 1938 era ainda bem menor esta exportação, pois que o total não passou de 801 toneladas, ou 3:500 contos. As manufacturas diversas subiram de 12:315 contos em 1938 para 103:929 em 1946, com uma diferença para mais, em peso, de cerca de 7:500 toneladas, o que é razoável. Sabe-se fazerem parte desta rubrica muitos produtos de interesse. O simples exame dos números parece revelar sensível desenvolvimento da actividade da província.
Põe-se de parte o aumento da importação de obras de matérias vegetais, porque grande parte do que lá se contém (18:191 contos) é constituída por barris e cascos que acondicionaram as bebidas alcoólicas, assim como no caso de obras de matérias minerais, que compreendem 5:360 contos de garrafas e garrafões para o mesmo fim.
As maiores valias deram-se sobretudo em materiais de construção (fibrocimento), obras de ferro e aço (12:897 contos), no papel e livros e em outras manufacturas, como medicamentos e cerveja.
Apesar do progresso assinalado, a metrópole pode exportar muito mais manufacturas e ferramentas do que o que tem feito até agora. A província de Angola é tributária em larga escala, neste e em outros aspectos, do estrangeiro - que aliás lhe consome também bastante dos seus produtos. Mas o trabalho metropolitano deve compartilhar em maior grau do comércio da província, sobretudo nas manufacturas.

100. Não foi possível dar mais espaço a um assunto que tem grande projecção na vida económica e política de Portugal. Angola merecia que alguém com objectividade investigasse circunstanciadamente as suas magníficas possibilidades, e a análise do comércio externo exprime de qualquer modo os anseios, os hábitos e o rendimento económico de um povo.
A metrópole e Angola estão ligadas tão indissolùvelmente que se torna essencial estudar com amor as suas relações económicas. Para lá terá de ir uma parte do excesso demográfico que até há pouco tempo se encaminhava para outras regiões, e é bom que assim seja. Hão-de surgir, por esse facto, problemas novos, difíceis como são todos os problemas que envolvem a emigração e o estabelecimento de seres humanos.
Até agora, como no Brasil e em outros povos recém-formados, tem havido a tendência para povoar o litoral, formar nele cidades essencialmente comerciais, e descurar as possibilidades do interior, que são grandes em Angola. Os inconvenientes que derivam desta política, ou, melhor, da falta de uma política, estão hoje patentes em países sul-americanos e já em alguns de África.

Moçambique

101. A balança comercial de Angola tem sido normalmente positiva e a de Moçambique, pelo contrário, normalmente negativa. Não quer isto significar que a sua balança de pagamentos também o seja, porque os serviços prestados pela província da costa oriental aos territórios vizinhos amplamente compensam o déficit da balança comercial. São conhecidas a grande actividade dos portos e caminhos de ferro de Lourenço Marques e Beira e a importância da mão-de-obra moçambicana nas minas do Rand.
Esta diferença fundamental entre as economias dos dois grandes territórios lusitanos em África dá-lhes características diferentes até no conteúdo do seu comércio externo. Pode dizer-se que Moçambique foi, por força, das circunstâncias, aperfeiçoando em elevado grau os seus instrumentos de transporte. Prestou com isso um grande serviço aos territórios vizinhos e ao mesmo tempo auxiliou muito a sua economia interna. As autoridades da província melhoram periòdicamente, tanto quanto possível, as comunicações com o interior e países limítrofes. Com isso Portugal tem mostrado a adaptabilidade dos seus processos de colonização nas mais variadas circunstanciais - até naquelas que exigem a construção e desenvolvimento de grandes portos, do-

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tados de equipamento mecânico necessário, para, com rapidez, resolver problemas de grande tráfego.

Importações

102. Moçambique é na costa oriental de África o exemplo vivo do trabalho progressivo de gente de um pequeno país europeu que marca uma nota de civilização espiritual e mecânica na vizinhança de países dotados com muito maiores recursos financeiros e grandes possibilidades de outra natureza.
As principais importações da metrópole em 1938 e 1946 foram as seguintes:

QUADRO LXXX

Principais importações de Moçambique

[Ver Quadro na Imagem]

O tremendo salto nas nossas importações de Moçambique deu-se em grande número de produtos, mas foram as 22:000 toneladas a mais no algodão e as 13:000 nas oleaginosas que pesaram nas relações comerciais das duas economias. E curioso verificar aqui, como aliás já se notou no caso de Angola, que a pressão das necessidades metropolitanas levaram ao consumo de maior quantidade de produtos dos seus domínios de além-mar. Apesar de em 1946 se ter acentuado a procura sobretudo de algodão, açúcar, oleaginosas e sisal, muitos outros produtos ganharam com a maior intensidade de tráfego com Moçambique e Angola.
A experiência parece demonstrar que as condições de exportação de Moçambique em matéria de substâncias alimentícias, com excepção do açúcar, não se comparam com as de Angola, mas que a província tem condições para aumentar o envio de matérias-primas, tais como fibras e oleaginosas.

Exportação

103. A exportação para Moçambique em 1938 andou à roda de 5 por cento do total. Para o resto dos domínios ultramarinos foi de 12 por cento. Os números foram para 1946, respectivamente, 9,32 por cento e 22,51 por cento.
A maior comparticipação do comércio externo metropolitano em produtos ultramarinos correspondeu a Moçambique cifra sensìvelmente idêntica, em produção, à de 1938.

Principais exportações para Moçambique

104. Seguindo o princípio adoptado para Angola, dão-se a seguir as principais exportações para Moçambique nos anos de 1938 e 1946.

QUADRO LXXXI

Exportações para Moçambique

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

A grande alteração para mais que se deu nas relações entre a metrópole e Moçambique teve lugar na exportação de produtos algodoeiros de lá para cá e de cá para lá. Viu-se atrás que em 1946 importámos 300:000 contos de algodão em caroço e em rama. Vê-se agora que mandámos em troca 232:000 contos de produtos algodoeiros, sem contar com as remessas postais.
A balança comercial quase se equilibrou naquele ano. Houve o saldo positivo a favor da província de um pouco mais de 21:000 contos, que foi sensìvelmente idêntico ao de 1938, ou 18:277 contos.
Também se acentuou em 1946, em relação a 1938, a exportação de certo número de manufacturas diversas especialmente utilizadas em Moçambique, como materiais de construção, entre os quais convém destacar o fibrocimento, a vidraça e outros e obras de ferro e aço.
Também se nota progresso sensível em artigos de papelaria e livros, nos medicamentos e em trabalhos de ourivesaria.

105. Para terminar este curto apanhado das relações comerciais da metrópole com as duas grandes províncias ultramarinas, tão dissemelhantes na sua estrutura económica e tão iguais no amor pátrio, dá-se a seguir um quadro que mostra, em contos, para 1938 e 1946, as características do seu comércio com a metrópole:

QUADRO LXXXII

Comércio com Angola e Moçambique

[Ver Quadro na Imagem]

Nos dois anos mencionados houve sinal negativo na balança comercial da metrópole em relação às duas grandes províncias. Os saldos variaram e representam umas dezenas de milhares de contos que a metrópole para lá manda todos os anos.
Esta diferença é, evidentemente, compensada por encargos de outra natureza que as províncias ultramarinas liquidam por serviços prestados pela metrópole, alguns dos, quais conviria rever no sentido de os tornar menos onerosos, como o caso de fretes marítimos e ainda outros.
É até certo ponto interessante notar o grau de identidade dos quantitativos do que se importa e exporta de Angola e Moçambique. Em 1946 foram da mesma ordem de grandeza, tanto nas importações como nas exportações.
No caso destas últimas houve apenas a diferença de 1:100 contos entre as duas províncias ultramarinas nos dois anos considerados.

IV

A distribuição geográfica do comércio externo português

(1938-1946)

Importação

106. A guerra exerceu, como a irás se disse, forte deslocação nas relações comerciais portuguesas.
Os principais países importadores e exportadores eram a Inglaterra e a Alemanha, que em 1938 recebiam 36,6 por cento das exportações e enviavam 40 por cento das importações.
As dificuldades com que luta a Inglaterra em matéria de produção interna e de cambiais, por um lado, a crise que a Alemanha agora atravessa e a poderosa influência da economia norte-americana no abastecimento europeu, por outro, tiveram como resultado forte desvio do comércio externo português.
A América passou a ser o continente que nele comparticipa em maior grau, seguida pela Europa e África.
A comparação dos valores e a tonelagem relativa aos dois anos que, em especial, têm sido apreciados neste estudo sugerem algumas, reflexões de interesse.
Em 1938 o comércio externo português, tanto da importação como da exportação, fazia-se, em mais de 80 por cento, com a Europa e as províncias ultramarinas. A Europa ocupava, porém, o lugar de principal fornecedor e era neste continente que se consumia a maior parte da exportação.
As coisas modificaram-se profundamente de 1938 para cá. Em 1946 a América mandou cerca de metade da tonelagem importada (51 por cento) e a quota-parte da Europa reduziu-se para menos de um quarto (23,4 por cento). Do mesmo modo as províncias ultramarinas elevaram a sua percentagem, o que é na verdade bastante apreciável, para 13,4 por cento.
As percentagens, relativamente aos valores, não condizem com as do peso, pela razão de se ter deslocado para a América o comércio importante dos carvões, que é bastante volumoso e de valor unitário mais baixo.
Por isso a comparticipação da Europa, em valor, não diminuiu tanto como a do peso. As percentagens são, respectivamente, 39,4 por cento e 38,2 por cento. E o ultramar português aumentou a sua exportação para a metrópole de 10,18 por cento em 1938 para 15,10 por cento em 1946.
As percentagens, em síntese, para a importação dos cinco continentes foram as que vão mencionadas no quadro da página seguinte,

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QUADRO LXXXIII

[Ver Quadro na Imagem]

Este acentuado desvio das importações foi acelerado pela guerra. Já ele se notava no período anterior, embora a progressão fosse lenta, mas os esforços, feitos pela Alemanha para aumentar a sua quota-parte no abastecimento do País obstavam a que o fenómeno se acentuasse. O desaparecimento deste país da concorrência há-de contribuir para manter o actual estado de coisas.
Por outro lado, as dificuldades opostas pelos Estados Unidos à entrada de mercadorias do exterior e, no que diz respeito ao comércio nacional, dos vinhos e cortiça em obra impediam, e ainda impedem, a natural tendência para maiores relações com os países atlânticos no conjunto.
Apesar disso, a partir de 1938 acelerou-se a progressão. Os próprios Estados Unidos passaram a comparticipar em muito maior escala no comércio nacional, incluindo o da exportação. Em percentagem do valor as modificações que &e deram no comércio importador e exportador, reunidos, podem deduzir-se do quadro que segue e que se refere aos principais países:

QUADRO LXXXIV

[Ver Quadro na Imagem]

A guerra operou alteração considerável nas relações comerciais de Portugal. Os territórios que beneficiaram desse desvio foram os Estados Unidos, com um aumento na percentagem de 11,5 por cento, e o Império Colonial Português, com o aumento de 7,2 por cento no total do comércio externo português.
As diminuições sofridas pela Alemanha, Inglaterra e outros países europeus foram beneficiar especialmente aqueles dois territórios e um pouco o Brasil e a Suíça. É notável o incremento do comércio com este último país, apesar das dificuldades de transportes. Contudo, parece não poder manter-se o ganho do passado.

Exportação

107. Vale a pena comparar o caminho seguido pelas exportações desde 1938 e compará-lo com a origem das importações. Verifica-se claramente que u Europa comprou bastante mais do que vendeu, relativamente a outros continentes.
Até certo ponto pode surpreender esto facto, porque a penúria de cambiais no período de após guerra, tão conhecida, limitou muito o seu poder de aquisição. Mas, por outro lado, era, e é, grande a carência de mercadorias neste continente, algumas de imediato consumo. Daí derivaram, em parte, as compras feitas em 1946, apesar de grandes dificuldades financeiras.
A Europa comprou em 1946 bastante mais a Portugal do que a América, não obstante este continente lhe ter vendido muito mais.
As percentagens para as exportações em 1938 e 1946, por continentes, são as que vão mencionadas no quadro seguinte.

QUADRO LXXXV

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se a grande percentagem em peso (60 por cento) das mercadorias enviadas para a Europa em relação ao seu valor (43,1 por cento). Isto deve-se a este continente ter consumido em 1946 a maior parte das matérias-primas pobres exportadas pelo País, como pirites e outras, todas de valor relativamente baixo.
Também se verifica que a América, principal fornecedor de Portugal em 1946, apenas tomou 27,2 por cento das suas exportações, menos 15,9 por cento do que a Europa, apesar do saldo positivo do mercado brasileiro.
A questão merece ser vista com grande cuidado, não apenas pelo que ela significa sob o ponto de vista financeiro - um desvio para o continente americano das economias nacionais -, mas até por possíveis dificuldades no futuro com as nações europeias.

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Na verdade, não tem sentido esta transferência de cambiais de países empobrecidos para país rico. Haverá por isso necessidade de fazer um esforço junto dos Estados Unidos aio sentido de convencer aquele país a consumir mais quantidade de produção nacional. E a sua economia permite-o, e com facilidade.
Aos principais países que adquiriram produtos portugueses exportados nos anos de 1938 a 1946 correspondem as seguintes percentagens de valores:

QUADRO LXXXVI

Percentagens dos valores

[Ver Quadro na Imagem]

Na verdade, não tem sentido esta transferência de cambiais de países empobrecidos para país rico. Haverá por isso necessidade de fazer um esforço junto dos Estados Unidos no sentido de convencer aquele país a consumir mais quantidade de produção nacional. E a sua economia permite-o, e com facilidade.
Aos principais países que adquiriram produtos portugueses exportados nbos anos de 1938 a 1946 correspondente as seguintes percentagens de valores:

QUADRO LXXXVI

Percentagens dos valores

[Ver Quadro na Imagem]

O comércio de exportação com a Alemanha quase desapareceu. Com a Inglaterra a percentagem da exportação diminuiu 6,4 por cento. Progrediram muito as exportações para a Bélgica e, em relação a 1938, acentuaram-se bastante as exportações paxá os Estados Unidos. Apesar de estes se terem tornado os grandes fornecedores de Portugal, só lhe tomam uma percentagem das exportações idêntica à da Inglaterra. O Brasil continuou a adquirir os produtos portugueses em percentagem superior à de antes da guerra.
Mas outros países com saldo positivo, tanto na América como na Europa, continuam a consumir os produtos portugueses em escala reduzida. A Suíça, que fora em 1942 um grande cliente, pois. tomou nesse ano mais de 10 por cento das exportações portuguesas, diminuiu em 1946 a sua percentagem para menos de metade, embora ainda bem superior à de 1938.
Só as relações com o Império Colonial aparecem animadoras, e justo seria que continuassem a progredir, tanto nas importações, como nas exportações. Consumiu 22,5 por cento destas em 1946, mais 10 por cento do que em 1938.

O desequilíbrio da balança comercial

108. O desequilíbrio da balança comercial portuguesa, como atrás já foi acentuado, constitui um dos mais perniciosos elementos da vida económica e financeira do País. Deriva do baixo rendimento da produção e da insuficiente exploração dos recursos internos.
Tem-se acumulado nos longos anos em que prejudicou a vida nacional por diversas maneiras, mas começa a tomar carácter ameaçador quando, como no último ano, atinge cerca de um terço das importações, que foram muito grandes.
As percentagens do deficit da balança comercial, em relação às importações, variaram do modo seguinte desde o começo do século:

Percentagens

1900 .................... 45,9
1905 .................... 51,8
1910 .................... 48,1
1915 .................... 54,3
1920 .................... 67,8
1925 .................... 65,3
1930 .................... 60,7
1935 .................... 60,9
1938 .................... 50,0
1940 .................... 36,5
1941 .................... -
1942 .................... -
1943 .................... -
1944 .................... 19,2
1945 .................... 20,2
1946 .................... 33,1
1947 .................... 44,3

Não deve ser dada importância excessiva aos números que exprimem as percentagens dos deficits, porque, como atrás se explicou já, há importantes correcções a fazer na estatística das exportações no período que vai do fim da primeira grande guerra até quase ao começo da segunda.
Os números, tal como constam do quadro, dizem que para pagar o que se importou foi preciso, no longo período que as cifras cobrem e nos anos mencionados, encontrar um somatório de cambiais idêntico às que se obtinham das exportações. Em muitos anos (1905, 1915, 1920 e seguintes) estas não chegavam para pagar metade das importações nem até 35 por cento em 1925.
Embora se possam corrigir os números relativos às exportações, e isso será necessário, esta situação é bastante séria e explica fàcilmente as dificuldades cambiais durante a década 1920-1930, que se prolongou um pouco para além deste último ano. Em 1940 sentiram-se já os efeitos da guerra nas exportações e os valores destas passaram a ser mais conformes às realidades. E os três anos seguintes foram de saldo positivo, num total de 58:555 contos-ouro, ou 2.658:000 contos-papel. Mas este saldo de três anos foi quase todo consumida em 1946, que teve, como é sabido, o saldo negativo ne 2.272:000 contos, ou um terço do total das importações.
O déficit de 1947 deve ter subido para cerca de 4.900:000 contos ou mais.
Vê-se, assim, que Portugal possui uma fonte importante e invisível de cambiais. Se não fosse esse ubérrimo manancial ainda seria muito mais baixo o nível de vida. O que entra no País através de remessas de emigrantes, serviços prestados a países estrangeiros, visitas de turismo e negócios e outros meios serve para pagar o déficit das importações. O País vive disso, e é bom que se procure viver diferentemente, porque nada há mais aleatório para a vida de um povo do que confiar numa misteriosa providência de bens materiais que pode desaparecer em época de crise dentro ou fora do País, como aliás se provou já no longo período agora analisado.
Qualquer plano de governo traçado no sentido de defender tanto quanto possível a economia interna desse perigo deve tentar, ou ter como objectivo, um melhor equilíbrio entre as importações e as exportações, e isso só pode conseguir-se pela intensificação da produção interna, tanto no campo agrícola como no industrial.

A distribuição geográfica no «déficit» da balança comercial

109. Chegámos, pelo que acaba de expor-se, a elevado déficit da balança comercial. Repete-se todos os

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anos, monòtonamente, nuns mais do que noutros, conforme as contingências das colheitas ou dos preços nos mercados externos. A vida financeira anda assim a balouçar, ao sabor de acontecimentos ou de variações climáticas, numa dolorosa e ansiada perspectiva de realidades mais ou menos favoráveis.
O nosso nível de vida tem de ser necessàriamente baixo, porque para ser mais alto há que importar bastante mais ou produzir internamente o preciso. Para elevar, por consequência, esse nível só duas alternativas aparecem, e as duas, em última análise, reduzem-se a uma: que é produzir bastante mais do que agora. A produção terá de ser feita em bens de consumo ou serviços. Não parece possível acalentar grandes esperanças sobre o aumento dos últimos, a não ser talvez no turismo; há, por consequência, necessidade de cuidar dos primeiros.
O problema português neste aspecto é conhecido e não valeria a pena insistir constantemente sobre uma coisa que já hoje parece ser do domínio público, se não fossem as demoras que se manifestam no sentido de a remediar ou, pelo menos, atenuar os seus maiores males.
E deve dizer-se que não é apenas uma questão de governo. De nada poderão valer as recomendações, ou até as medidas governamentais, se o País não compreender o seu significado e não as cumprir integralmente.
Há necessidade de tomar medidas no sentido de modificar a estrutura económica existente. Elas afectarão profundamente certos hábitos inveterados durante muitas dezenas ou centenas de anos, como o caso do latifúndio no Alentejo e o parcelamento da propriedade no Centro e no Norte, e irão alterar ideias retrógradas em matéria industrial.
Na maior parte dos casos a sua aplicação trará o reforço no rendimento líquido dos detentores dos instrumentos de produção. Contudo, é notória a indolência ou inércia nas tentativas feitas no sentido de modernizar a produção - e sem isso a vida económica do País há-de ser o que tem sido no passado -, agravada agora pelo desenvolvimento demográfico, que dentro de uma década elevará a população para nove milhões de almas, sem contar com a natural tendência para a melhoria do nível de vida.
Assim, a tarefa que se põe diante de nós é gigantesca. Não compreende apenas o mundo material das coisas, tem de ir ao fundo dos nossos próprios hábitos e modos de pensar, modificar a própria mentalidade em quase todas as esferas sociais.

110. A balança comercial, já se disse, tem sido sempre fortemente negativa. Com relativamente poucos países temos saldos positivos e quando os temos são quase sempre bastante diminutos. Nalguns casos nota-se neles a influência dos portugueses que emigraram.
Surpreende até certo ponto a análise minuciosa dos saldos, tanto positivos como negativos. Neles vemos onde e como se consomem as economias e os rendimentos de capitais acumulados, as remessas dos que trabalham no estrangeiro, às vezes em circunstâncias bem precárias e difíceis.
Não podemos ter a veleidade de apagar da estatística de um momento para outro saldos negativos, que, no conjunto, em 1946 totalizaram cerca de 2.957:000 contos, e nem isso era até vantajoso para o comércio internacional e para as nossas relações com outros povos. Mas há vantagem e possibilidades de reduzir os saldos negativos apreciàvelmente ou, pelo menos, substituir muitas mercadorias que os compõem por outras de maior interesse e utilidade para o bem comum. O simples exame dos números que seguem sugere logo a ideia de que existe um tumor maligno na vida económica nacional:

QUADRO LXXXVII

Saldos negativos e positivos

[Ver Quadro na Imagem]

(a) 65:066 contos ouro. (b) 15:061 contos ouro. (c) 50:005 contos-ouro.

Saldos negativos

111. Quais são os países que alimentam o déficit da balança comercial portuguesa? Ou, fazendo a pergunta de outro modo: para onde enviamos nós o excesso dos cambiais, necessários para pagar o excesso das importações?
Valeria a pena publicar aqui a longa lista dos saldos negativos da nossa balança comercial, pelo menos para os dois anos de 1938 e 1946. Mas ocuparia grande espaço, embora seja curiosa no seu aspecto geográfico e até político.
Dá-se apenas a nota dos países que nos dois anos citados mostram maiores saldos positivos em relação a Portugal. Verificar-se-á que os países industriais, como os Estados Unidos, a Inglaterra e a Alemanha, são aqueles com quem temos maior déficit. Um, os Estados Unidos, acumula a sua característica de país industrial com a de agrícola, e assim dá-se o paradoxo de ser o país mais rico do Mundo aquele que está a absorver os nossos excessos de cambiais.
Para os dois anos de 1938 e 1946 os deficits repartem-se assim:

QUADRO LXXXVIII

[Ver Quadro na Imagem]

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[Ver Quadro na Imagem]

(a) Positivo.

A simples leitura dos números demonstra logo que com quase todos os países aumentámos o déficit em. escudos. Deve ter-se em conta a diferença de preços entre 1938 e 1946 para tirar qualquer conclusão relativa ao grau de aumento real, e isso só poderia ser feito pelo exame atento das mercadorias importadas e exportadas.
Com os Estados Unidos o aumento foi considerável e só ele absorveu quase metade do déficit total (2.273:000 contos). Em 1938 não atingia 20 por cento do desequilíbrio, que foi de 1.160:278 contos.
A Inglaterra, que era a nossa principal fornecedora e compradora antes da guerra, viu o seu comércio diminuir bastante. O déficit, que era de mm pouco menos de 15 por cento em 1938, passou em 1946 para, sensìvelmente, 13 por cento. Manteve as compras dentro de limites idênticos aos de 1938.
São estes os dois países com os quais mantemos maior déficit.
Em 1946 os deficits com os Estados Unidos e a Inglaterra, considerando-se neles incluído todo o Império Britânico, Curaçau, a Suécia, a Argentina e a Suíça, somam cerca de 2.384:000 contos, mais do que todo o déficit da balança comercial. Foi para estes seis países que se encaminhou grande parte do comércio importador nacional. Em 1938 os mesmos países não atingiam metade do déficit. Houve, por consequência, um desvio de outros países para aqueles, em parte devido ao desaparecimento da Alemanha como grande exportador para Portugal, de que foram herdeiros os Estados Unidos.

Saldos positivos

112. Com poucas nações temos saldos positivos e quando os temos são em geral bastante pequenos. O somatório dos saldos positivos, incluindo os dos fornecimentos à navegação estrangeira, não passou em 1946 de 684:616 contos. Os principais países que tiveram saldos positivos superiores a 3:000 contos nos dois anos de 1938 e 1946 foram os que seguem:

QUADRO LXXXIX

[Ver Quadro na Imagem]

(a) Negativo.

O comentário sugerido por estes números leva à conclusão de que Portugal alargou a sua esfera comercial até zonas com as quais em 1938 tinha limitadas relações, como, por exemplo, a Palestina, e que em geral esses novos contactos foram frutíferos, visto na maior parte serem positivos os saldos das trocas entre elas.
Com os países que principalmente exportam para Portugal, como a França, a Suíça, as nações escandinavas, a Inglaterra, os Estados Unidos e outros, mantiveram-se os saldos negativos. O déficit com alguns deles agravou-se em 1946, mas não foi tão grande o desequilíbrio no conjunto por terem aparecido novos compradores de mercadorias portuguesas em diversas partes do Globo.
Há vantagem em intensificar, tanto quanto possível, estas novas relações comerciais e dar preferência nelas à compra dos produtos de consumo interno. Mas nalgumas há possibilidades de colocação de produtos nacionais, principalmente conservas e cortiça em obra, que conviria explorar.

CONCLUSÕES GERAIS

1. A discussão do comércio externo que acaba de ser feita, rola a vá ao longo período de quarenta e seis anos de uma maneira geral e aos anos de 1938 e 1940 em pormenor mostra-nos os pontos mais débeis da economia nacional.
Publica-se no fim do parecer um rápido addendum relativo ao comércio externo de 1947, o qual, já composto, teve de ser alterado por virtude da vinda de alguns elementos que o completam. Ele confirma as conclusões que seguem.
Não é fácil deduzir dos números, com exactidão, a influência do déficit da balança comercial na balança de pagamentos, por ter havido um longo período em que os valores da exportação se não ajustavam à verdade. Contudo, as correcções introduzidas nos últimos dez anos permitem supor que agora os valores se aproximam da realidade, dentro dos limites que usualmente se aplicam na estatística.
Não é possível, por estas razões, come era desejo de quem escreve, mostrar, em súmula e com exactidão, a influência dos saldos negativos na nossa vida social durante o último meio século. Ela deveria ter sido, porém, muito grande e concorreu, sem sombra de dúvida, para o baixo nível de vida que durante tanto anos prevaleceu e ainda prevalece em muitas zonas do País.
As causas basilares dos deficits da balança comercial filiam-se principalmente na insuficiência da produção

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nacional - nas suas insuficiências qualitativas e quantitativas.
Muitos dos recursos nacionais, que poderiam ter sido explorados com proveito há dezenas de anos, ainda hoje esperam o seu desenvolvimento. E os coeficientes de exploração de outros, tanto na agricultura como na indústria, ainda não atingiram nível razoável. Mantêm-se baixos. Certas actividades económicas só vivem por força do auxílio ou protecção do Estado.
Melhorar a produção nacional, tanto qualitativa como quantitativamente, deve ser a primeira e fundamental preocupação, quer dos organismos orientadores e activos do Estado, quer dos particulares. Esta necessidade tem sido apontada em todos os pareceres das Contas do Estado, e o estudo agora feito sobre o comércio externo confirma-a plenamente.

2. Grande número de países têm saldos negativos na balança comercial e vivem bem. O seu nível de vida é elevado, as suas disponibilidades financeiras são suficientes para enfrentar crises internacionais graves e o seu poder de recuperação económica, em momentos bem difíceis, permite-lhes em poucos anos irradiar perdas consideráveis.
O estudo da vida económica europeia durante o último século mostra que, na maior parte dos casos, os deficits das balanças comerciais se neutralizam pela prestação de serviços. É mais importante do que transparece à primeira vista esta fonte de recursos financeiros. Os rendimentos de capitais cedidos por empréstimo a mercados externos só teve grande importância na economia de dois ou três países europeus, no mesmo lapso de tempo, mas o peso dos rendimentos derivados da prestação de serviços é um auxílio valioso em certas economias, que sem isso viveriam em equilíbrio instável e precário. Não é esse o nosso caso. O que advinha da prestação de serviços, no período anterior à guerra, exercia diminuta influência na balança de pagamentos, e talvez que houvesse saldo negativo. O equilíbrio da balança de pagamentos estabeleceu-se entre nós quase sempre pela remessa de cambiais de emigrantes da América do Norte e do Sul e de África.
Antes da guerra houve anos em que o turismo pesou sensìvelmente na balança de pagamentos, e de há uns tempos para cá a influência das viagens de negócios e de prazer começa a exercer a sua acção na vida económica nacional. Mas no estado em que se encontra a Europa, e que há-de persistir, naturalmente, ainda por certo tempo, não se poderão depositar risonhas esperanças em grandes desenvolvimentos deste manancial de cambiais - que poderá constituir, no futuro, um interessante auxílio, sobretudo o turismo, se forem correctamente interpretadas as suas exigências.

As importações

3. Um dos grandes males da estrutura do comércio externo português é o da natureza das importações.
Há duas grandes rubricas que poderosamente afectam toda a vida nacional: a das matérias-primas e a das substâncias alimentícias. Somadas, por muito ultrapassam metade do total das importações em tonelagem e em valor.
Da primeira fazem parte os combustíveis, que nelas pesam muito. O autor deste trabalho defendeu há muito tempo a possibilidade dê reduzir consideràvelmente a importação de combustíveis sólidos e quase reduzir a nada os que até agora são importados para força motriz.
Isso pode conseguir-se em poucos anos pela combinação das disponibilidades hidroeléctricas nacionais, através de compensações nas bacias hidrográficas dos rios.
A planificação racional e económica dos rios poderia trazer energia a preços idênticos ou inferiores aos que hoje se obtêm pelo consumo de combustíveis sólidos ou líquidos usados em força motriz. Para isso será essencial aproveitar todas as suas possíveis utilizações económicas, considerá-los não apenas como produtores de energia, mas como fontes de água para rega, quando possível, e vias de transportes, quando necessário.
A redução aio consumo de combustível auxiliaria consideràvelmente a balança de pagamentos. Grande parte do que hoje se importa para força motriz, iluminação, usos domésticos variados e, em certos casos, aquecimento seria substituído por energia proveniente dos rios, com carácter permanente e não temporário, porque com este objectivo seria planeado o aproveitamento da energia hidráulica.

4. Não serão possíveis grandes economias noutras matérias-primas, a não ser nas importações de ferro e aço. Neste aspecto da vida nacional há lugar para progressos importantes, porque estão à vista grandes jazigos de ferro e há reconhecimentos em outros que permitem visionar a existência de apreciáveis quantidades de hematites - ou até magnetites.
Tanto pela exportação de minérios como pela siderurgia, o futuro promete resultados satisfatórios aos esforços que hajam de fazer-se no sentido de valorizar os recursos das minas de ferro do Nordeste do País - desde que antecipadamente se assegure fácil e barato escoamento dos produtos explorados através da via fluvial do Douro.
Parece que a nossa mentalidade ainda se não adaptou a esta grande e interessante perspectiva, que requer planificação económica racional e inteligente e que envolve a construção de meia dúzia de barragens no Douro nacional, em condições de produzir energia e facilitar a navegação até perto da fronteira.
O projecto tornar-se-á mais económico se forem consideradas em conjunto todas as obras necessárias. Há nisso economias consideráveis que não podem ser desprezadas em país pobre de recursos financeiros, embora rico de possibilidades económicas.

5. Os combustíveis e o ferro e aço, juntos, entraram com perto de 40 por cento do total das matérias importadas. A sua redução afecta por isso apreciàvelmente, em sentido favorável, a balança comercial. Não parece ser fácil reduzir muito outra matéria-prima, a não ser no caso dos produtos químicos. Mas as insuficiências da indústria e da agricultura provàvelmente consumirão as economias que nelas se possam fazer.

6. Os produtos têxteis têm interesse especial no comércio externo. Se não fora o caso das sedas, que ainda exigem o envio para o estrangeiro de somas apreciáveis, a produção interna de têxteis teria atingido nível que bem se poderia classificar de satisfatório. Há vantagem em estudar cuidadosamente a questão do fio de seda, tanto natural como artificial. Quanto ao primeiro, haveria grande conveniência em despertar o gosto pela criação do bicho da seda, que outrora foi uma actividade caseira em certas povoações do Nordeste do País.
O problema da seda vegetal é mais difícil e talvez menos rendoso do que o fabrico do tecido. Mas o volume da importação deve permitir que se instale uma ou mais unidades com capacidade suficiente para abastecer o País.

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7. Os produtos alimentares pesam muito na balança comercial, e, de entre eles, os farináceos ocupam lugar de grande relevo.
É até certo ponto paradoxal esta influência, que aliás não é de agora, mas vem de longe. Vista à luz das possibilidades internas, depois de exame do pequeno rendimento agrícola de largas áreas a sul do Tejo e das possibilidades de outras a norte, embora em mais reduzida escala, as grandes importações de substâncias alimentícias de 1946 e 1947 estão fora da lógica económica.
Torna-se necessário fazer um grande esforço no sentido de adaptar os terrenos do Alentejo e outras zonas do País à produção intensiva. Só é possível alcançar tal objectivo por meio do aproveitamento máximo das disponibilidades de águas, quer subterrâneas, quer das chuvas. A cultura extensiva, feita nas condições do passado, não consegue suprir ou apagar as deficiências actuais, sobretudo quando se considera que a população está a aumentar na razão de 700 ou 800 mil habitantes por década.
A questão da cultura agrícola é das mais sérias na política nacional, porque, por um lado, a maioria do povo português vive nos campos e, por outro, porque se torna necessário equilibrar os custos com os salários, de modo a permitir preços de venda satisfatórios, tanto para o produtor rural como para o consumidor urbano. Há nela factores de natureza social, e até política, que transcendem razões puramente económicas.
Parece não haver dúvidas de que é necessário produzir muito mais dentro do País. A terra terá de dar colheitas maiores do que até, agora por unidade de superfície, de modo a que o agricultor receba, com preços justos, a compensação do seu esforço, porque, se assim não for, não poderá haver progresso sensível.
O sacrifício de uma parte da população em prol da outra poderá justificar-se por fundas razões, de ordem social num espaço de tempo curto, mas trará efeitos calamitosos de ordem geral se for prolongado.
Impõe-se por tudo isto um cuidadoso estudo das possibilidades agrícolas e a adopção de medidas radicais que tendam a elevar o seu rendimento. Haverá para isso que ir contra ideias arreigadas na índole da população, como sejam: a resistência ao emparceiramento o parcelamento, tradições culturais atrasadas, métodos de conservação e armazenamento de produtos rotineiros, além de instrução agrícola insuficiente ou mal orientada. Mas, a sobrelevar a todas, paira a utilização em limito maior escala das reservas aquíferas nacionais. E neste último aspecto há ainda uma longa estrada a percorrer - que é mister percorrer com rapidez, como manda o interesse da Nação.

8. Em matéria de equipamento industrial, os anos mais próximos hão-de exigir um grande acréscimo de importações. O que veio em 1946 e 1947 é muito pouco, e, embora nestes anos se tivessem já liquidado encomendas que só influirão na balança comercial nos anos próximos, a modernização da indústria e da agricultura necessita de bem maiores gastos.
É lamentável que fosse permitida tão longa importação de automóveis de carga, passageiros e outros, nos dois últimos anos, sobretudo no último. Elevou-se, no total, a perto de 1 milhão de contos, parte dos quais bem poderiam ter sido melhor aproveitados. Deve considerar-se neste aspecto que quase tudo a que constitui a exploração do automóvel é importado: a gasolina, a câmara de ar, o pneumático, os óleos, as tintas. O que o não é requer a importação de matérias-primas valiosas para serem transformadas dentro do País. Uma grande, parte destas importações dissipa-se em puro prazer. Não haveria inconveniente nisso se a situação do País fosse de molde a permiti-lo. Mas como as coisas correm agora no Mundo deveriam ser restringidos os gastos.

9. No que respeita à variada lista de manufacturas que hoje se importam, há possibilidades sérias de progressos internos e, com efeito, estão em andamento, já há anos, fábricas ou oficinas de certo interesse que poderão suprir notórias deficiências nesta matéria. Contudo a gradual elevação do nível de vida que se tem acentuado aios últimos tempos há-de requerer a importação de coisas que hoje ainda se não consomem, ou se gastam em pequenas quantidades.
Tudo indica, que, apesar de desenvolvimentos internos, se acentue o aumento de importação de diversos tipos de manufacturas que não possam ou não devam aqui ser produzidas.

As exportações

10. O caso das exportações é mais delicado e complexo do que o das importações.
Verificou-se no texto deste estudo que o volume das exportações repousa sobre três ou quatro produtos, quase todos de origem agrícola ou florestal. São os vinhos, as cortiças, os resinosos e as conservas.
Nos últimos tempos as indústrias algodoeiras favoreceram muito abalança comercial. Trabalharam principalmente para os domínios de além-mar.
Os produtos que formam a essência das exportações em épocas normais são extremamente vulneráveis em momentos de crise. Tanto os vinhos como as conservas, além de terem concorrentes poderosos e sérios, não podem ser classificados de primeira necessidade - de essenciais, como, por exemplo, os combustíveis, os farináceas, as gorduras e muitos, outros.
Quando uma grave crise económica assalta o país ou países importadoras dos produtos e a própria salvação interna exige economias, é natural supor que elas começarão pelos géneros de substituição mais fácil, como está acontecendo na conjuntura actual. A balança dos países exportadores será por este facto muito atingida.
Conviria por isso orientar a economia interna, no sentido de tornar menos contingente e perigosa a estrutura das exportações.
Parece ser isso possível em vários aspectos e até no agrícola, pela intensificação da actividade florestal e frutícola. O País pode elevar fàcilmente a exploração de produtos hortícolas e de frutas, de madeiras para esteios, caixotaria e outros fins - e parece que os mercados recebem bem e com facilidade estes produtos. Mas ainda neste campo, e logo que seja possível alargar a rega, como preconizado, há lugar para consideráveis progressos, sobretudo em produtos de qualidade. Não representarão talvez uma quantia muito grande na exportação, mas com outros auxiliarão a sua debilidade e tornarão mais sólida a sua estrutura.

11. As matérias-primas exportadas consistem essencialmente em cortiça, produtos resinosos, madeiras para esteios e minérios. Mas, de todas, as cortiças ocupam um lugar de relevo. As matérias-primas de origem, vegetal, dentro das quais a cortiça representa mais de metade, totalizaram cerca de 70 por cento da exportação das matérias-primas.
A indústria transformadora norte-americana é a principal importadora das cortiças portuguesas. E, como este país é um grande consumidor deste produto, os mercados da indústria portuguesa restringem-se a outras partes

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do Mundo, onde concorre fàcilmente com a cortiça em obra de outras proveniências.
Mencionou-se no texto a diferença de preço entre a cortiça-matéria-prima e em obra e viu-se que, se fosse possível alargar a indústria nacional, haveria possibilidade de bem maior apoio para a balança comercial portuguesa. Mas este assunto não depende apenas de nós. Só o lento e gradual aperfeiçoamento da indústria corticeira e o aumento no uso, no resto do Mundo, de produtos de cortiça tornarão possível maior valorização da actividade nacional.
A exportação de matérias-primas pode crescer sensìvelmente se forem intensificados trabalhos na exploração de minérios. Há-os de grande interesse, embora pobres, como o ferro, e já noutro lugar se estudou este assunto, mas talvez seja possível melhorar a safra de outros. Neste aspecto as pirites ocupam, em volume, um lugar importante, e, embora não constituam, em valor, quantia de grande relevância, as minas de pirites, de cobre empregam muita gente.
O estanho metal e possìvelmente o ferro têm probabilidades, no futuro, de constituírem um apreciável suplemento da exportação.

12. Dos produtos algodoeiros fabricados em Portugal uma parte importante segue para os domínios de além-mar, principalmente Angola e Moçambique, que no período da guerra mandaram fibra em troca. O que se exportou em cada um dos anos de 1946 e 1947 foi superior a meio milhão de contos.
As outras indústrias têxteis abastecem em grande parte o País, com excepção da indústria da seda. No caso dos lanifícios parece haver possibilidade de exportação.

13. Um dos males da balança comercial portuguesa, acentuado nos dois últimos anos, é o das importações de substâncias alimentícias, e já acima 86 aludiu ao facto. Muito do que actualmente vem de fora pode ser e deve ser produzido dentro do País.
Há, parcialmente, compensação no que sai, como vinhos e conservas, que andaram por 1 milhão de contos em 1947 e haviam atingido ainda cifras bem maiores em 1946.
A exportação de vinhos e, de um modo geral, de bebidas é muito interessante, porque exige embalagens fabricadas no País, com matérias-primas quase todas portuguesas. Por esta razão é, no ponto de vista económico, mais interessante do que a das conservas de peixe.
Mas já se explicou atrás a sua vulnerabilidade, demonstrada aliás pelo exame do comércio externo durante certo período de anos.
Os esforços feitos no sentido de intensificar a pesca do bacalhau e também a pesca para consumo interno parece constituírem uma necessidade social e económica, porque permitem baixas nas importações e concorrem para melhoria do abastecimento.
As outras substâncias alimentícias exportadas, embora sem o relevo das que acabam de mencionar-se, já formam um conjunto de interesse. Os produtos alimentares susceptíveis de serem produzidos dentro do País para exportação formam uma longa lista que se estudou no texto. Organizar essa exportação desde a origem até aos mercados consumidores parece ser uma exigência de interesse nacional.

14. Não tem grande importância a exportação de máquinas, aparelhos, ferramentas, veículos e embarcações, e poderia ter maior valor, porque os domínios ultramarinos estão em vias de desenvolvimentos materiais. Convivia fazer o estudo dos mais necessários para os suprir onde possível, sobretudo em matéria de ferramentas e certos tipos de aparelhos ou máquinas industriais e agrícolas.

15. As manufacturas diversas concorrem com elevada soma para as exportações, que se resumem, essencialmente na cortiça em obra, em embalagens para vinhos, tanto em madeira como em vidro, e um pouco na obra de metais, nalguns anos.
Presume-se poder haver apreciáveis melhorias em capítulos deste importante sector, e o exame das importações de manufacturas mostra a possibilidade de produzir internamente algumas com margem para exportação. Se a indústria siderúrgica vier a estabelecer-se nas bases indicadas no texto, a existência de produtos de ferro há-de permitir o desenvolvimento de outras indústrias.
Não se vê razão que impeça maiores exportações de porcelana, vidros e outros produtos.

16. Não pretendem ser pessimistas as conclusões anotadas depois de longa análise do comércio externo português. Mas desejam vincar com clareza a necessidade de encarar um aspecto da nossa vida económica que tem sido deixado ao livre arbítrio de cada um. Nesta matéria, como aliás em outras, a liberdade de acção produz resultados que podem arrastar a perigosas situações e repercutir-se na vida nacional.
O que se passou em 1946 e 1947 mostra ser indispensável arrepiar caminho no sentido de resolver enèrgicamente o problema da prioridade ou hierarquia nas importações e da intervenção das nossas autoridades diplomáticas na defesa do comércio nacional. E levanta, com grande nitidez, outro problema sério, que é o da organização económica interna.
Nada pode ocultar o facto incontestável da insuficiente produção nacional: baixa em rendimento e em quantidade.
O saldo necessário para satisfazer a melhoria no nível de vida, que é indiscutível nos últimos anos, e para acudir ao acréscimo da população, atinge cifras bastante sensíveis e só pode obter-se pelo aumento da produção interna. Para o alcançar, nas proporções necessárias, será preciso modificar muito os processos de cultura agrícola e criar condições de natureza industrial que tenham como base rendimentos que assegurem preços de custo razoáveis. A economia terá de ser orientada vigorosamente para tais objectivos, e deverão ser tomadas medidas nesse sentido, mesmo que elas pareçam ir contra opiniões, preconceitos, tendências intelectuais ou modos de ser que fizeram sua época no passado e em parte, pelo menos, são causa de baixos rendimentos e de produção inadequada.
Pode dizer-se que é uma grande tarefa a que se põe agora diante do País.
Mas a Nação tem vencido outras e nada impede que também saia triunfante desta.

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APÊNDICE II

ORGANIZAÇÃO CORPORATIVA

1. A tentativa feita no parecer das contas de 1945 para obter o total das receitas cobradas pelos organismos corporativos não pode ter a perfeição que o seu relator desejava. O objectivo que então se procurava atingir era o de conhecer exactamente qual a carga tributária que incidia sobre o País, de modo a coordená-la tanto quanto possível com o rendimento nacional.

Mas, infelizmente, as contas de muitos organismos não puderam fornecer elementos seguros. E neste aspecto os que se apresentaram com maiores deficiências foram os grémios da lavoura.
A falta de coordenação, tão conhecida, na vida económica nacional já é por si um obstáculo sério ao estudo financeiro da organização considerada no seu conjunto, não apenas porque os métodos de contabilizar diferem ainda hoje bastante, mas ainda porque eles se encontram sujeitos à disciplina de diversos departamentos públicos.
Tornava-se, porém, necessário, no interesse do País, insistir nos propósitos de conhecer, tão aproximadamente quanto possível, as receitas, as despesas e os fundos que anualmente se cobram e gastam, acrescem ou decrescem, na organização corporativa. Foi possível este ano, com a ajuda da inspecção do Conselho Técnico Corporativo, estender mais o inquérito feito então pelo relator da Comissão das Contas Públicas às receitas dos organismos que dependem daquele Conselho.
Mais cedo ou mais tarde, e quanto mais cedo melhor, se hão-de codificar as disposições legais de carácter financeiro que permitam ler nas despesas e receitas dos organismos corporativos tão claramente como hoje se lê nas contas do Estado.
Não se vê razão para que isso ainda não aconteça. As contas do Estado são bem mais complexas do que as da organização corporativa e, contudo, todos os anos, doze meses depois de terminado o ano económico, elas são apresentadas à Assembleia Nacional, que em poucas semanas as comenta e aprecia, após longo relato feito pela Comissão das Contas Públicas. Se tal tivesse acontecido com a organização corporativa, logo que o seu desenvolvimento se acentuou, ter-se-iam evitado os abusos e críticas bem conhecidos. As contas seriam o fiel espelho da sua actividade e responderiam fàcilmente aos reparos, ao mesmo tempo que serviriam para coibir os abusos.

2. As coisas parecem caminhar agora em melhor sentido e é possível apresentar este ano números mais completos para os organismos que dependem do Conselho Técnico Corporativo, incluindo os grémios da lavoura.
Mas é conveniente não ter ilusões. Ainda há necessidade de maiores esforços. Um relatório apresentado ao relator das Contas Públicas por quem bem conhece a organização exprime alguns pontos de vista que merecem ser arquivados:

É necessário que se perca a falsa noção da autonomia demasiada dada aos organismos, que toca as raias do absoluto quando se trata de organismos corporativos.
Quando se obrigarem os organismos a elaborar orçamentos segundo directrizes prèviamente estabelecidas e adoptadas e a mandar as suas contas ao Conselho e que este esteja apto não só a arquivar esses documentos como se fossem papéis de arquivo, mas também a acompanhar todos os organismos (corporativos e de coordenação económica), não só na elaboração dos orçamentos como na execução e análise das contas, então teremos números reais que nos poderão elucidar cabalmente da sua actividade.

AS CONTAS

Receitas

3. As receitas e despesas que vão ler-se adiante dizem respeito aos organismos que dependem do Conselho Técnico Corporativo. Não compreendem os Grémios da Lavoura de Mogadouro, Arganil e Gois, Coimbra e S. Martinho do Bispo, Guarda e Manteigas, Sabugal, Cascais, Ma ia, Alcanena, Lamego e Santa Comba Dão.
Alguns ainda não estavam a funcionar em 1946, outros têm pouca importância. A sua falta não afecta, por consequência, o significado do conjunto dos números.
Nas respostas de muitos deles há confusões que não foi possível desfazer, umas vezes por má interpretação, outras por diversos motivos. Tudo foi ponderado na ideia-base de que o que interessa é fundamentalmente o sentido geral dos números.
No ano de 1946 entraram nos cofres da organização corporativa (organismos dependentes do Conselho Técnico Corporativo) 1.182:125 contos, assim distribuídos:

Taxas: Contos

Comércio ............ 127:382
Indústria ........... 80:431
Agricultura ......... 11:544 224:357

Contribuições fixas:

Comércio ............ 3:347
Indústria ........... 4:488
Agricultura ......... 11:768
Outras .............. 6:219 25:822
Subsídios e donativos ......... 510
A transportar ....... 250:689

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Transporte ........................... 250:689

Vendas:

Valor da mercadoria ........ 824:499
Lucro ...................... 28:985 853:484

Outras receitas:

Prestação de serviços ...... 249
Juros ...................... 2:885
Multas ..................... 499
Reembolsos ................. 4:667
Diversas ................... 66:368 74:668

Consignadas a fins de previdência
e assistência ....................... 3:284
Total ................ 1.182:125

Mas neste total há verbas que não se podem considerar como receita. Excluindo-as, teremos as cifras seguintes:

Contos

Total entrado ...................... 1.182:125
Valor de mercadorias ....... 824:499
Reembolsos ................. 4:667
Previdência e assistência .. 3:284 832:450
Receitas ................. 349:675

Esta quantia proveio de:

[Ver Tabela na Imagem]

Taxas

4. A verba mais importante é a das taxas e já o ano passado se explicou sucintamente em que elas consistem.
Faz-se este ano a tentativa de as desdobrar, assim como outras verbas, pelas actividades a que dizem respeito: o comércio, a indústria e a agricultura.
Não será perfeita esta discriminação. Mas é suficientemente aproximada para todos os efeitos práticos.
Os números são os seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

A primeira conclusão que se tira dos números é a de que os géneros alimentícios - os produtos pecuários (20,8 por cento), o peixe (20,59 por cento), os vinhos (17,16 por cento) e os cereais (14,75 por cento) - são os que estão mais sobrecarregados. Juntos, pagam 73,30 por cento das taxas.
Não se farão agora comentários sobre esta distribuição, que nasceu certamente sem ter em conta os seus reflexos sociais e económicos. Mas tudo indica a urgência em rever um assunto, que é muito importante.
Quanto às actividades, o comércio liquida mais de metade das taxas, seguido pela indústria e pela agricultura.

Contribuições fixas

5. Os números, distribuídos por actividades, são os seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

A agricultura é a que mais paga por esta rubrica. Parte do que se inscreve em "Diversas" pertence-lhe.
As contribuições fixas constam de quotas liquidadas pelos proprietários. Segundo o artigo 8.º do decreto

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n.º 34:345, de 28 de Dezembro de 1944, os limites máximo e mínimo das quotas nas colectas das propriedades rústicas são de 100$ e 50$. Há casos em que um indivíduo, por virtude de deficiências de matriz ou outras razões, tem duas ou três colectas rústicas - e então pode acontecer que ele pague por todas elas, embora a exploração agrícola seja uma única. É o caso da propriedade indivisa entre irmãos, por exemplo, e propriedade pertencente a um dos irmãos. Este assunto necessita de ser revisto cuidadosamente.

Subsídios e donativos

6. Não tem interesse maior esta rubrica, que importa apenas em 510 contos.

Vendas

7. As vendas de mercadorias totalizaram 853:484 contos em 1946, deram o lucro de 29:685 contos e o prejuízo de 700 contos. A diferença constituiu a receita. A sua distribuição foi como segue, em contos:

[Ver Tabela na Imagem]

Os elementos fornecidos pelos "diversos organismos não têm carácter uniforme. E por isso os números não podem assumir forma definitiva.
Tomaria muito espaço e tempo a análise de cada um dos organismos e a exposição do critério que presidiu à determinação dos lucros acima transcritos. E por isso se não faz. Mas, por exemplo, no que diz respeito a metais, o lucro de 2 contos apontado não deve corresponder à realidade, antes deve resultar da série de operações efectuadas também em outros ramos. No caso dos carvões o lucro proveio do baixo preço do carvão do Rur.
O prejuízo de 700 contos na Federação Nacional dos Produtores de Trigo resultou da venda de trigo para semente. E muito difícil avaliar das condições em que trabalham os três organismos reguladores de cereais.
As suas operações, semelhantes muitas vezes, ressentem-se naturalmente desse facto.
A outra interessante revelação do quadro é o grande movimento dos grémios da lavoura, que atingiu 252:149 contos e produziu o lucro de 14:239 contos.
O movimento deu-se nas seguintes mercadorias:

Contos

Adubos .................... 107:054
Máquinas .................. 8:168
Combustíveis .............. 609
Insecticidas .............. 17:371
Sementes .................. 14:548
Outras .................... 104:399
Total .............. 252:149

Outras receitas

8. Outras receitas atingiram 74:669 contos, assim divididas:

Contos

Prestação de serviços ..... 249
Juros ..................... 2:885
Multas .................... 499
Diversas .................. 66:368
Total ............ 70:001
Reembolsos ................ 4:667
Total geral .... 74:668

As maiores receitas que se englobam em "Diversas" foram as seguintes:

Contos

Comissão Reguladora das
Moagens de Ramas .......... 11:744
Federação Nacional dos
Produtores de Trigo ....... 16:702
Grémios da lavoura ........ 9:823
Vinhos .................... 6:427
Metais .................... 4:968
Produtos pecuários ........ 4:739
Produtos químicos ......... 3:007
Total ............ 57:410

Previdência e assistência

9. Do total de 3:285 contos de receitas arrecadadas e consignadas a fins de previdência e assistência destacam-se as contribuições para sezonismo, com 1;595 contos, e assistência aos trabalhadores rurais, com 1:030 contos.

Despesas

10. Não é fácil, no conjunto, estabelecer uma conta de despesas. O quadro a seguir permite, contudo, dar uma ideia dos gastos dos diversos organismos corporativos, que se julga não andarem longe da realidade:

[Ver Tabela na Imagem]

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Pessoal e material

11. Uma das grandes despesas é a que diz respeito a pessoal que somava em 1946 cerca de 121:600 contos. As verbas mais importantes referem-se aos organismos relacionadas com os cereais, farinha e panificação, vinhos, produtos pecuários e lavoura.
A despesa de pessoal distribui-se do modo que segue, em contos, pelas diversas actividades:

[Ver Tabela na Imagem]

Desta quantia correspondem 5,26 por cento a pessoal dirigente, 72,62 por cento ao restante pessoal, 4,48 por cento a ajudas de custo e 17,64 por cento a outras despesas.
O que parece ser de vantagem corrigir, dentro do mais curto espaço de tempo, é o sistema usado no pagamento de pessoal, visto haver grandes divergências. Estas e outras anomalias dizem respeito a quadros e a categorias no funcionalismo.

12. Quanto a material, a maior verba refere-se a imóveis, móveis e veículos. Os 23:615 contos gastos podem dividir-se conforme vai especificado na tabela seguinte.

[Ver Tabela na Imagem]

Dividiram-se as verbas de imóveis, móveis e veículos do modo seguinte:

[Ver Tabela na Imagem]

Nos veículos as duas verbas mais importantes, além das mencionadas, referem-se a produtos pecuários (383 contos) e outros produtos agrícolas (313 contos).

Diversos encargos

13. Não é fácil fazer a destrinça de muitas e variadíssimas verbas que necessitam de ser examinadas. Foram incluídas em diversos encargos e dentro deles alinhadas por vários subtítulos que exprimem à primeira vista a sua utilização. Não é perfeito este método, mas parece ser o que melhor responde ao fim em vista.
Para ter a noção do que recai sobre cada actividade convém discriminar a despesa de cada uma delas, como se faz no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

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Os diversos encargos representam um pouco mais de um quarto do total da despesa e 26,4 por cento deles, são destinados a previdência e assistência. O peixe é onerado com a maior parte. Inclui 15:577 contos do Instituto Português de Conservas de Feixe.
O resto refere-se aos trabalhadores rurais e à comparticipação patronal nas caixas de previdência.
Nas contribuições e impostos avultam os vinhos, que pagaram a multa de 12:403 contos por conta da extinta Federação dos Vinicultores do Centro e Sul de Portugal.
Tirando esta multa, a verba de contribuições e impostos é de 12:781 contos, que não se distribui proporcionalmente à importância da actividade.

14. Não é possível fazer o estudo da verba de juros, visto conhecerem-se apenas os saldos de empréstimos e depósitos no fim da gerência, e não o seu movimento durante o ano.
Em 31 de Dezembro os depósitos subiram a 586:018 contos e os empréstimos a 705:306 contos.
Os juros pagos, líquidos, elevaram-se a 15:278 contos.
Gastaram-se em rendas 5:912 contos, que, a 4 por cento, representam o capital de perto de 150:000 contos. Parece ser possível melhorar as condições da organização nesta matéria.
Em estudos há a notar a verba de 414 contos gastos pelos produtos pecuários, a de 408 contos pelos cereais, farinhas e panificação, a de 534 contos por outras modalidades agrícolas e a de 247 contos pelos vinhos. Conviria vigiar cuidadosamente esta despesa, que alcançou 1:754 cantos em 1946, e parece tender a aumentar. Os resultados dos estudos corresponderão ao dispêndio de tão elevada verba?
Certas actividades parece não 03 terem promovido, pelo menos pagos por verbas especiais. Entre elas destacam-se: algodão, lanifícios, resinas, madeiras, carvões, metais e produtos químicos, todas de natureza industrial.
A questão dos estudos necessita de ser vista, de modo a enquadrá-los num plano de conjunto.

Despesas de fomento e intervenção económica

15. Põe-se de dado a apreciação de duas verbas muito importantes que figuram nas contas dos organismos corporativos - a de despesas de fomento e a de intervenção económica.
Ambas, somam 194:554 contos. Aos vinhos, produtos pecuários, carvões e peixe pertencem 173:419 contos, como comparticipação nesta despesa.
Ela deverá ser considerada cuidadosamente quando se analisarem as despesas no conjunto, porque o que se contabiliza nesta rubrica pode não significar despesa normal, mas antes imobilização de capital em instalações, materiais, produtos e outras.
O significado destas verbas, a grandeza, as suas próprias características imediatamente justificam a necessidade de adoptar normas de contabilização adequadas a organismos que têm fundamentalmente uma função comercial e industrial.
É indispensável que, dentro do mais curto prazo de tempo, se proceda à substituição do decreto de 1938, que não satisfaz as exigências da actividade da organização.
A classificação de receitas e despesas, estatuída pelo decreto-lei n.º 29:049, é vaga e incaracterística, e até nele se exprime, quanto a organismos corporativos, que só fosse cumprido quando possível.
Tudo indica que sejam difíceis os tempos próximos em matéria de exportações, e a economia nacional tem de adaptar-se a esta realidade, que não deriva só de razões de ordem interna, mas das dificuldades atravessadas pelos mercados importadores de mercadorias portuguesas. A organização corporativa, na parte que diz respeito a intervenção económica, terá que desempenhar uma função importante. Já está, aliás, a intervir em algumas das actividades.
Este assunto necessita por isso de ser revisto.
Sem esquecer o que acaba de ser exposto, fez-se uma tentativa, e publica-se a seguir um quadro que mostra, em contos, as despesas de fomento e de intervenção económica:

[Ver Quadro na Imagem]

Fundos

16. Podem dividir-se os fundos em orgânicos, patrimoniais, de compensação e afins, e diversos.

Fundos orgânicos

17. São os que desempenham o papel de capital de uma empresa, tendo quase todos fins consignados na

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lei - fomento da actividade a que pertencem - tal é a sua definição. Pela sua própria essência e natureza estes fundos são os de mais difícil movimentação. Encontram-se investidos em bens imóveis e mercadorias, e ocupam na vida orgânica das actividades, por isso mesmo, um papel muito importante.
A prática seguida em matéria de fundos não tem sido uniforme. Parece haver casos em que compras de imóveis se levam integralmente a uma gerência, sobre a qual, por esse motivo, recai grande e pesado encargo.
Aliás este sistema não afecta apenas este tipo de fundos, mas também os outros. Tendo isto em conta, os fundos orgânicos somavam 249:395 contos em 31 de Dezembro de 1946, assim distribuídos:

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Não foi possível obter este número.

Fundos Patrimoniais

18. As verbas levadas anualmente a amortizações de diversa natureza foram englobadas numa única rubrica que pode denominar-se «Fundos patrimoniais».
Em Dezembro de 1945 e 1946 os totais, por actividades, eram os seguintes:

[Ver Tabela na Imagem]

(a) Não foi possível obter este número.

Fundos de compensação ou afins

19. Os fundos de compensação, como o nome indica, estão ìntimamente ligados a despesas de intervenção económica e de fomento. Sem conhecer exactamente quais as despesas que dizem respeita àqueles dois importantes capítulos não se poderá aquilatar bem a influência dos fundos de compensação que somavam perto de 200:000 contos em 31 de Dezembro de 1946, assim distribuídos:

[Ver Tabela na Imagem]

O aumento em 1946 foi muito grande, apesar da considerável diminuição nos algodões e vinhos.
O movimento destes fundos tem importância, e por isso convém dar uma rápida vista de olhos pelas diferenças que apresentam no curto espaço de um ano.
Nos vinhos o decréscimo provém da estabilização do preço do sulfato de amónio, que absorveu 21:378 contos.
Nas mercadorias, sobre um total arrecadado de 103:236 contos, foram utilizados, em idêntica estabilização, apenas 54:239 contos. O beneficiário foi o açúcar. No caso do bacalhau as verbas foram, respectivamente, de 25:175 e 23:032 contos.
No caso dos carvões, a melhoria derivou da importação de carvão do Rur; e no caso do peixe, do equilíbrio de preços do bacalhau nacional e importado.
Finalmente nos produtos pecuários as taxas sobre lãs importadas permitiram o saldo de 8:516 contos que é bastante apreciável.

20. Os 200:000 contos que cabiam às diversas entidades distribuíam-se por percentagens, em 31 de Dezembro de 1946, do modo que segue:

Por cento

Diversos ............... 30,25
Peixe .................. 28,97
Metais ................. 13,97
Carvões ................ 7,25
Produtos químicos ...... 5,65
Produtos pecuários ..... 4,27
Vinhos ................. 3,84
Óleos .................. 3,68
Algodão e lanifícios ... 1,29
Outros produtos agrícolas 0,83

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Fundos diversos

21. Todos os outros fundos se incluem sob a designação de «Diversos». Como não existe uniformidade na contabilização, pode acontecer que alguns fundos, incluídos nuns organismos em «Diversos», tenham noutros diferente designação.
Feita esta ressalva, convém indicar o seu quantitativo por actividades. É o que se faz no quadro que segue:

[Ver Quadro na Imagem]

Nos produtos pecuários foi o seguro de reses, que absorveu 6:789 contos, a causa principal da utilização da verba, ao passo que nos vinhos se utilizaram as de gerências anteriores, no caso especial dos vinhos do Porto. Os encargos com o veleiro Cidade do Porto pesam nos fundos das actividades algodoeiras. E deviam constituir despesa.
Mas o maior movimento nos fundos diversos deu-se nos cereais. O acréscimo e a diminuição dentro do ano foram, respectivamente, de 353:480 e de 344:140 contos. Houve ainda o saldo líquido positivo de 9:340 contos. É através destes fundos que são pagos os bónus de adubos, os subsídios de cultura e os prejuízos verificados no milho exótico. Os deficits são cobertos pelos fundos corporativos.
O caso dos metais deve ser posto de reserva enquanto não forem mais detidamente analisadas as condições da sua existência.
O que se indica no quadro transcrito na última página não deve corresponder à realidade.

Saldos de gerência

22. Os trabalhos tendentes a determinar com a possível exactidão os saldos de gerência conduziram aos resultados que vão mencionados na tabela seguinte.

[Ver Tabela na Imagem]

O saldo negativo de 4:631 contos resultou dos deficits nos algodões (38:427), nos produtos pecuários, nos cereais, farinhas e panificação e em outros produtos agrícolas. Parece que no caso dos algodões a causa do resultado negativo derivou da aplicação de um fundo, e é, por consequência, apenas um déficit de tesouraria.
A Junta e Grémio Concelhio dos Comerciantes de Carnes de Lisboa teve o déficit inscrito em produtos pecuários derivado da crise das carnes que já se fazia sentir em 1946.
No caso dos cereais, farinhas e panificação o saldo negativo mais importante refere-se à Federação Nacional dos Produtores de Trigo (3:285 contos), que já era deficitária em anos anteriores.
Não vale a pena analisar em pormenor as razões dos saldos positivos e negativos de outros organismos porque alargaria demasiadamente este trabalho.
Os elementos já conhecidos deixam prever a necessidade de um estudo aprofundado, não só sobre a estrutura dos organismos corporativos, mas até do seu próprio funcionamento e responsabilidades.
Os fundos podem esgotar-se. Foram acumulados gradualmente em anos e anos. Alguns estão invertidos em imóveis ou até em mercadorias. Convém vigiar, por isso, as contas de gerência de cada um dos organismos e não os sobrecarregar de despesas inúteis ou adiáveis.
As contas de gerência deverão ser publicadas anualmente e de forma clara.

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ADDENDUM

O COMÉRCIO EXTERNO EM 1947

1. Mencionou-se no texto do estudo sobre o comércio externo português de 1900 a 1946 que seriam escritas mais algumas linhas, no caso de poderem ser obtidas as cifras relativas ao ano de 1947.
A hipótese não era provável, em virtude da data fixa em que têm de publicar-se estes pareceres, mas foi possível ao Instituto Nacional de Estatística compilar os elementos fundamentais, sujeitos a correcções, a tempo de poder ser analisada, nas suas grandes linhas, a estrutura do comércio externo daquele ano.
Terão necessàriamente de revestir carácter resumido e provisório as considerações que vão alinhar-se, enquanto não forem acertadas as cifras finais.
Só o pormenor estatístico poderá definitivamente assegurar-lhes autoridade, e esse só estará concluído dentro de alguns meses.
Mas não parece que as conclusões se modificarão sensìvelmente, porque os números que adiante se publicam se aproximam bastante da realidade.

Balança comercial

2. Piorou muito a balança comercial de 1947 em relação a 1946, como aliás se previu no texto.
O déficit em 1947 determina-se do modo que segue:

Contos

Importações .................... 9.185:452
Exportações .................... 4.244:028
a Déficit" da balança comercial 4.941:424

O déficit em 1946 havia sido, como se mostrou atrás, de 2.272:968 contos. Assim, o saldo negativo aumentou por mais 2.668:456 contos em 1947.
Nos dois anos de 1946 e 1947 o total dos deficits da balança comercial obtém-se assim:

Contos

Déficit de 1946 ............... 2.272:968
Déficit de 1947 ............... 4.941:424
"Déficit" nos dois anos 7.214:392

A enunciação destas cifras indica um estado de coisas que não poderá subsistir por muito tempo. Impõe que se tomem medidas enérgicas no sentido de o remediar.
A gravidade que os números revelam não pode ser atribuída apenas ao índice de preços, que, aliás, influi nos dois termos da equação. Foi demonstrado que os deficits no período anterior à guerra não eram os que os números acusavam, visto haver necessidade de corrigir as exportações.
De 1931 a 1936 os deficits da balança comercial devem andar à roda das cifras seguintes 1:

QUADRO I

[Ver Quadro na Imagem]

Ao câmbio de 110$, o déficit em 1936 pouco passou de 360:000 contos, se está certo o coeficiente de correcção das exportações. Aliás o cálculo da balança de pagamentos para aquele ano parece confirmar a exactidão daquele déficit.
Os deficits em 1937 e 1938 acusados pela estatística foram, respectivamente, de 1.160:266 e 1.160:278 contos. Corrigidos como nos anos anteriores, reduzem-se, respectivamente, para 437:130 e 472:922 contos.
Estão bem longe destas cifras os números para 1946 e 1947. Nestes anos já não é possível introduzir o coeficiente de correcção aplicado ao período anterior à guerra, em virtude das medidas tomadas no sentido de actualizar os valores das declarações do comércio exportador. Assim, os saldos negativos acusados pela estatística em 1946 e 1947 revestem um carácter bem mais sério do que anteriormente, visto tudo indicar que, para todos os efeitos práticos, eles representam a realidade.
Para os tornar comparáveis aos do período anterior à guerra haverá apenas que fazer intervir o factor desvalorização da moeda em relação aos preços. Aplicando-o, o resultado mostra um agravamento considerável da situação, que precisa de ser encarado com energia.
Foi previsto há dois anos que o déficit da balança comercial cresceria muito no período a seguir à guerra e apontaram-se as causas principais, que, no final de contas, eram as que levaram em grande parte à acumulação de depósitos bancários.
Com efeito, não era possível às actividades produtoras constituir as reservas habituais de matérias-primas e combustíveis e substituir os maquinismos, peças e

1 Ver Portugal Económico e Financeiro, vol. I, p. 386.

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4 DE MARÇO DE 1948 288-(171)

produtos de diversa natureza necessários à indústria, comércio e agricultura. Haveria, por isso, necessidade de mobilizar no termo da guerra elevadas quantias para esse fim. O déficit neste caso significava apenas uma troca de moeda por valores e coisas essenciais e não teria importância grande. Seria a substituição dos produtos consumidos num período difícil por outros.
Até certo ponto isto aconteceu em 1946. Aludiu-se atrás ao caso da grande importação que nesse ano se fez de automóveis de carga e passageiros e de certos maquinismos, sobretudo para as indústrias têxteis.
Deu-se já nesse ano um desvio nas importações, que conviria vigiar, para coisas supérfluas ou sumptuárias que não interessavam à economia do País.
Mas o ano de 1947 foi bem mais oneroso neste aspecto. O déficit aumentou para perto de 5 milhões de contos, ou mais do dobro do que fora em 1946, e o exame tão pormenorizado, quanto é possível fazer neste momento com as cifras apuradas, mostra graves anomalias.
Adiante se fará o estudo rápido do comércio externo neste ano.

IMPORTAÇÕES

3. Interessa sobremaneira fazer a destrinça do que se importou, porque é ela que nos dá, de um modo geral, a projecção da natureza dos consumos na economia interna. Para mais fácil compreensão, publica-se a seguir um quadro que mostra os totais das importações, em peso e valor, referentes aos dois anos de 1946 e 1947.

QUADRO II

Importações

[Ver Quadro na Imagem]

Houve, entre os dois anos, o aumento de cerca de 373:000 toneladas na importação, que teve lugar nas matérias-primas, nas substâncias alimentícias e nas manufacutras diversas.
Adiante se verá que, no primeiro caso, por virtude de maiores abastecimentos de combustíveis, sé acentuaram as importações.
O acréscimo no valor total foi grande e aproxima-se de 2.326:000 contos. É de notar que nas rubricas onde houve diminuição de tonelagem se deu apreciável aumento no valor, como no caso de fios, tecidos e feltros e máquinas e aparelhos.
Neste capítulo o acréscimo foi muito grande (cerca de 775:000 contos), apesar da baixa de 17:800 toneladas no peso.
Estudar-se-ão a seguir, e na medida do possível, as causas destas grandes variações, que elevaram o total que se importou para mais de 9 milhões de contos.

I

Matérias-primas

4. O quantitativo da importação em peso aumentou cerca de 295:000 toneladas e muito próximo de meio milhão de contos em valor.
Já ultrapassou a casa dos 3 milhões e meio de contos, bastante mais do que o total das importações de antes da guerra, o custo da importação de matérias-primas. Apesar de ainda não ter sido atingido o volume de combustíveis sólidos do período .anterior, o peso das matérias-primas também aumentou bastante, visto ter alcançado mais 2:100 mil toneladas, quase o total das importações de 1938. Este fenómeno era de esperar até certo ponto e já foi estudado com certa largueza no apêndice I. Apesar da diminuição das matérias-primas de origem vegetal, que são valiosas na sua maior parte, os metais, os produtos químicos e ainda várias outras cresceram bastante em relação a 1946.
O quadro que segue mostra, com alguns pormenores, onde se deram as principais variações:

QUADRO III

Matérias-primas

[Ver Quadro na Imagem]

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A elevação nas matérias-primas de origem animal, que foi muito grande, teve lugar principalmente nas lãs, tanto nas brancas como nas penteadas.
Nas de origem vegetal, além do decréscimo no algodão em caroço e em rama, há a notar maiores valias em muitas outras. De tudo resultou que a importação diminuiu sensìvelmente, tanto em tonelagem como em valor. Deve ser, porém, fenómeno passageiro.
Convém destacar, com substanciais aumentos, a borracha em bruto, o cairo em rama, o linho, as sementes e frutas oleaginosas, estas com a mesma ordem de grandeza nos dois anos. O tabaco manteve posições de idêntica importância nos dois anos. Nas matérias-primas de origem mineral houve o acréscimo de cerca de 52:600 contos em valor, mas o peso aumentou mais de 298:000 toneladas. Isso foi devido à importação de maiores quantidades de carvões, que passaram de 535:600 toneladas nas hulhas em 1946 para a cifra muito maior adiante mencionada.
Nos combustíveis e Lubrificantes, óleos minerais e carvões as importações comportaram-se do modo que segue, com números aproximados:

QUADRO IV

[Ver Quadro na Imagem]

A comparação nos dois anos mostra grande aumento nos combustíveis sólidos, tanto na tonelagem como no valor, devido sobretudo à hulha. Nos óleos minerais continuou a progredir o consumo de óleos pesados. Mas os preços parece terem descido bastante, tanto nas ramas como nos produtos acabados, e no conjunto não se notam grandes diferenças.
Houve sensíveis aumentos na folha de Flandres, mas, de um modo geral, veio muito mais ferro e aço, distribuído pelas diversas qualidades. E, como baixaram os preços relativamente ao cobre e suas ligas e a outros produtos, no conjunto das matérias de origem metalífera houve muito maior valia.
O valor por tonelada importada nos metais aumentou sensìvelmente de 3.420$ para mais de 4.660$.
Surpreendem as pequenas importações de azotato de sódio e cloreto de potássio.
Não pode fazer-se a análise pormenorizada da importação de matérias-primas em 1947. As rápidas indicações acabadas de dar mostram o desenvolvimento do consumo de combustíveis, tanto sólidos como líquidos; nos primeiros a hulha sobreleva todos os outros; nos segundos os óleos combustíveis tapam, com o seu volume e valores, as menores valias de alguns.
A pequena diferença na gasolina e petróleo é aparente, porque a destilação de ramas cresceu, embora não tanto como seria de prever. Se não fora a menor importação nalguns produtos, o aumento das matérias-primas seria bem mais acentuado, apesar de faltas difíceis de compreender em algumas delas.

II

Produtos têxteis

5. Deu-se uma sensível elevação no valor das importações de têxteis, embora com decréscimo no peso, que passou de 6:824 toneladas para 5:878. O aumento no valor teve lugar nas sedas e nos algodões, o que é de estranhar neste último caso. O quadro que se segue exprime as principais alterações:

QUADRO V

Fios, tecidos, feltros e respectivas obras

[Ver Quadro na Imagem]

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III

Produtos alimentares

6. Os produtos alimentares que se importaram em 1947 constituem uma mancha escura na balança comercial, até em comparação com 1946. Custaram mais 712:363 contos do que no ano anterior, apesar da relativa boa colheita em alguns produtos, como assinalam os números indicados atrás.
Há-de verificar-se nas páginas seguintes, tanto quanto é possível nesta data, onde se deram os maiores aumentos na importação. Eles derivaram, em parte, de faltas provenientes de maus anos por virtude de secas, e também da má distribuição do que existia e de deficiente informação sobre as colheitas ou produções em futuro próximo, tanto em géneros de natureza agrícola como pecuária. Surpreendem algumas cifras, como a que diz respeito a bebidas (mais 11:347 contos), a pescarias (mais 117:821 contos) e a outras, como manteigas naturais e artificiais e carnes. O quadro VI, que a seguir se menciona, indica os números obtidos para os anos de 1946 e 1947, em toneladas e contos, com as respectivas diferenças:

QUADRO VI

Substâncias alimentícias

[Ver Quadro na Imagem]

Os farináceos aumentaram em 33:818 toneladas e 225:721 contos. Vieram em maior quantidade arroz, batatas, farinha de trigo e outros produtos de grande interesse na alimentação do País. Fará estes produtos os números são os seguintes:

QUADRO VII

[Ver Quadro na Imagem]

O exame do quadro mostra o grande desenvolvimento na importação de certos números de produtos alimentares de 1.ª necessidade, alguns dos quais poderiam ser obtidos internamente, como já se explicou atrás.
Acentuou-se bastante a importação de arroz, das batatas, da farinha de trigo e do trigo em grão, além de outros. Não seria de estranhar que a vinda de alguns deles pudesse ser eliminada e ]á o foi no período anterior à guerra. Na análise dos números deve levar-se em consideração a necessidade que houve de reduzir preços exagerados por virtude de várias razões de natureza especulativa em certos casos.
No conjunto a subida dos farináceos foi superior a 225:000 contos, e elevou o total para 1.178:000, o que é na verdade uma quantia muito alta.
As pescarias - pode escrever-se o bacalhau - pesaram na balança comercial com mais de 117:000 contos do que em 1946. A importação de bacalhau fora de 17:277 toneladas em 1946, no valor de 172:229 contos, e aumentou muito em 1947.
Ainda há um longo caminho a andar na pesca deste peixe. O seu peso ainda é grande nas importações.
Nos diversos produtos alimentares importados em 1947 houve um grande aumento, que atingiu perto de 357:000 contos. A verba total alcançou quase 700:000 contos.
Podem discriminar-se alguns números para 1946 e 1947, que dão ideia da importância dos géneros ou mercadorias onde se deram as variações:

QUADRO VIII

[Ver Quadro na Imagem]

Desta rubrica e Diversos» fazem parte muitos produtos que não puderam ser convenientemente discriminados, por não estar concluído o apuramento, mas parece ter sido sobretudo nas importações de açúcar, carnes, manteigas e outras substâncias alimentícias onde se deu o grande acréscimo.
Esta questão de produtos alimentares já foi longamente discutida no estudo sobre o comércio externo, que constitui o apêndice I, e então se verificou ser ela bastante delicada e séria. Não é apenas uma questão de natureza económica. Tem reflexos na vida política e até na segurança interna em caso de conflito. Estamos a avizinhar-nos da casa dos 2.200:000 contos, e pouco passávamos de umas centenas de milhares no período anterior à guerra. Embora se considere a depreciação da moeda, a alta dos preços e o aumento da população, esta

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diferença é muito grande. O novo factor que entrou no comércio externo foi a novidade de grandes importações de carnes e gorduras, e parece que, com o tempo e maiores progressos pecuários, haverá possibilidade de produzir quase tudo dentro do País.
Convém, por este motivo, estudar o assunto e fazer um grande esforço no sentido de opor um poderoso obstáculo ao dreno de tão elevadas somas para pagamento de coisas que as actividades nacionais podem produzir.
Vai nisso o interesse de todos, das populações rurais e das urbanas, e sobretudo está nesta importação uma das causas fundamentais do déficit da balança comercial, que tem vindo a crescer nos últimos tempos, em parte devido às substâncias alimentícias importadas.

IV

Equipamento mecânico e eléctrico e transportes

7. O aumento neste capítulo foi muito grande: mais de 775:000 contos. O total das importações atingiu 2.058:645 contos, com o peso de 73:453 toneladas, enquanto que havia sido de 1.283:341 contos para a tonelagem de 91:259. A menor peso correspondeu valor muito maior. O quadro que se publica a seguir mostra para as duas secções do capítulo os números de 1946 e 1947.

QUADRO IX

Aparelhos, instrumentos, máquinas, etc. Navios. Veículos

[Ver Quadro na Imagem]

Nota-se que a maior valia se deu tanto nos aparelhos, instrumentos, máquinas e utensílios como nas embarcações e veículos, e para isso convém analisar algumas das importações.
No caso dos aparelhos e máquinas as principais rubricas são as que seguem:

QUADRO X

[Ver Quadro na Imagem]

Nas máquinas, industriais e nos geradores e outras máquinas eléctricas houve aumento substancial, o que parece ser um bem. Mas o acréscimo também se deu em todas as outras mercadorias citadas, especialmente nos aparelhos radioeléctricos, cujo valor mais do que dobrou, nas máquinas agrícolas, que têm nível baixo, nos frigoríficos, na aparelhagem eléctrica e nos geradores de vapor. Em 1947 saíram já para pagamento de máquinas encomendadas, que hão-de ser relacionadas nesta rubrica nos anos próximos, algumas centenas de milhares de contos. O progresso realizado em 1947 é ainda muito pequeno e necessita de ser muito maior porque vão nisso os interesses do futuro do País.
Quanto a «Embarcações e veículos» que subiram a mais de 1 milhão de contos, o aumento foi de 329:905 contos e teve lugar principalmente nos automóveis, que absorveram a diminuição notada nas câmaras de ar e protectores, etc., por virtude da produção da nova fábrica destes produtos dentro do País.
Os números do quadro acima publicado, comparados com os de 1946, definem a posição do ano de 1947 nesta matéria.
Quanto a automóveis de passageiros, carga e diversos já se publicou 1 noutro lugar o número e o valor do que se importou em 1946 e 1947. O número do último ano precisa de ser grandemente corrigido, infelizmente para bastante mais. Nos dois anos de 1946 e 1947 vieram para Portugal 25:508 automóveis, dos quais 15:607 eram de passageiros, individuais e taxímetros. A importação de 1947 foi de 16:764, no valor total de 692:972 contos.
Nas embarcações houve decréscimo no valor, que foi absorvido pelos automóveis. Na rubrica de material circulante para caminhos de ferro a importação de 1947 foi pequena, menos do que a do ano anterior, o que é seguramente um mal. Conclui-se do exame das importações neste capítulo que o progresso foi razoável, consideradas as circunstâncias externas, nas máquinas industriais, mas que em quase todas as outras rubricas ou foi pequeno no equipamento mecânico ou de transportes, como no caso de material circulante, ou houve excessos contrários ao interesse nacional, na presente conjuntura, como no caso dos automóveis.
No que diz respeito a embarcações, o retrocesso deve-se a não terem sido naquele ano entregues mais unidades do plano de reorganização da marinha mercante.

V

Manufacturas diversas

8. O quadro IX, que se publica na página seguinte exprime em toneladas e em contos o movimento importador de manufacturas diversas nos anos de 1946 e 1947. Indica também as diferenças que houve nos mesmos anos.

1 Ver p. 124.

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QUADRO XI

Manufacturas diversas

[Ver Quadro na Imagem]

O aumento de 273:000 contos- deu-se principalmente nas obras de metais, no papel e obras de tipografia e em diversas. Os 90:156 contos de acréscimo nos metais teve lugar em grande parte nas obras de ferro e aço e um pouco no cobre e outros metais e suas ligas.
Os livros e os artigos de tipografia mantiveram a mesma ordem de grandeza nos dois anos. Porém a importação do papel para impressão cresceu muito, como aliás era de esperar. Outros tipos de papel também foram importados em maior quantidade.
Os 53:834 contos de acréscimo total nesta rubrica pertencem em grande parte a papel e em menor escala a papel de fumo em mortalhas.
Mas onde se deu grande desenvolvimento nas importações de manufacturas diversas foi numa grande variedade de produtos, como lâmpadas eléctricas, material fixo para caminhos de ferro, medicamentos e ainda bastantes outros.
O acréscimo total nesta rubrica andou à roda de 110:600 contos, o que é verdadeiramente excessivo, atendendo à natureza das mercadorias que a constituem, com excepção de algumas, como carris e pertences, que terão de sofrer grande aumento, e isoladores necessários em virtude da electrificação. Não foi possível dar neste momento maior resenha das importações de 1947.
O grande número de mercadorias torna impossível, pouco tempo depois do fim do ano, dar mais largos pormenores. Hás o que se apurou basta para ter uma ideia bastante clara sobre o sentido e a natureza do comércio externo em 1947, na parte relativa a importações.

EXPORTAÇÕES

9. As exportações diminuíram sensivelmente em 1947. Foi o seu decréscimo, com o aumento das importações, que trouxe o elevado saldo negativo deste ano.
O quadro XII, em toneladas e contos, dá a indicação das principais mudanças de 1946 para 1947, com as respectivas diferenças.

QUADRO XII

Exportações

[Ver Quadro na Imagem]

Desceu a tonelagem e o valor das mercadorias exportadas, e, como se mostra no quadro, foi o déficit das exportações das substâncias alimentícias e, em escala mais reduzida, das manufacturas diversas que trouxeram a menor valia total.
Este facto vem confirmar o que no texto se afirmou a respeito da vulnerabilidade do nosso comércio exportador, constituído em grande parte por coisas que podem ser facilmente dispensadas em momentos de crise financeira ou cambial.
O único factor que até certo ponto atenua a impressão desagradável que deixam as cifras é o das matérias-primas, as quais, tendo embora diminuído em tonelagem, mantiveram e até aumentaram os valores de 1946. Ver-se-ão adiante as razões.
Os fios e tecidos não puderam igualar os valores de 1946, sobretudo por falta de exportação de bordados da

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Madeira, e as manufacturas diversas, que haviam atingido o valor de perto de 1 milhão de contos em 1946, recuaram 100:000 contos.
A descida nas exportações é um facto grave porque arrasta atrás de si diminuição no poder de compra de uma larga percentagem da população rural e, embora em menor escala, da urbana. Reflecte-se por isso bastante na actividade interna.

I

Matérias-primas

10. No quadro XIII, que a seguir se menciona, dão-se, em síntese, as alterações na tonelagem e no valor em contos deste capítulo nos dois anos de 1946 e 1947. Nele se indicam também as diferenças.

QUADRO XIII

Matérias-primas

[Ver Quadro na Imagem]

A maior valia de 183:887 contos foi devida essencialmente às matérias-primas de origem vegetal e mineral, além dos pequenos acréscimos nas de origem animal.
Pondo de parte estas ultimas, onde a exportação de óleo de cachalote e de baleia melhorou um pouco mais de 7:000 contos em relação a 1946, o quadro que segue dá alguns valores para as matérias-primas de origem vegetal e mineral:

QUADRO XIV

Algumas matérias-primas de origem vegetal e mineral

[Ver Quadro na Imagem]

Em peso são as pirites que normalmente decidem da maior ou menor tonelagem e este ano a sua exportação foi bem maior do que em 1946 - cerca de 60:000 toneladas, que representam apenas mais 8:300 contos.
A cortiça manteve adequada exportação. Os valores de algumas qualidades ou tipos foram idênticos aos do ano passado, mas exportou-se maior quantidade de aparas, que renderam mais cerca de 26:000 contos. A de refugo também melhorou, pois que quase dobrou em peso, e trouxe para o País mais 26:000 contos. Estas maiores valias equilibraram diminuições em outras qualidades de cortiça exportada.
Os resinosos constituíram o grande esteio das matérias-primas em 1947, principalmente o pez, que teve uma exportação espectaculosa, pois atingiu quase 50:000 toneladas, no valor de 211:564 contos, contra apenas 80:300 em 1946. Mas também a aguarrás, com 68:280 contos, ultrapassou substancialmente o ano anterior.
Os dois subprodutos do pinheiro quase atingiram 300:000 contos.
Finalmente o volfrâmio voltou a marcar posição de relevo na exportação, com o valor de 101:000 contos, mais 61:000 do que em 1946. O estanho-metal também progrediu.
Estas rápidas notas indicam onde se deu a maior valia na exportação de matérias-primas no ano de 1947.

II

Produtos têxteis

11. O quadro XV, que na página seguinte se insere, mostra o movimento da exportação de fios e tecidos nos dois anos de 1946 e 1647 e suas respectivas variações, em toneladas e contos.

Página 177

4 DE MARÇO DE 1948 288-(177)

QUADRO XV

Fios, tecidos, feltros respectivas obras

[Ver Quadro na Imagem]

Não necessitam de grandes comentários os números. Vê-se ter havido progresso nos algodões, mas uma grande baixa nas diversas mercadorias. Foi isso devido ao decréscimo na exportação de bordados da Madeira. Passou de 205:750 contos em 1946, sem contar com as remessas postais, para 98:084 em 1947.
Também os bordados dos Açores diminuíram de cerca de 20:000 contos para 11:754.
A situação dos dois arquipélagos deve ter-se ressentido deste importante decréscimo nas exportações, que vieram substituir durante a guerra as saídas de produtos naturais, como os vinhos e os ananases.

III

Produtos alimentares

12. Neste capítulo, a baixa em 1947 teve aspectos bastante graves. Ela atinge todas as rubricas e o conjunto alcançou a cifra de 370:608 contos. As bebidas e as pescarias, que é o mesmo que dizer os vinhos e as conservas, somam a quase totalidade do decréscimo, como se nota no quadro XVI, que segue:

QUADRO XVI

Substâncias alimentícias

[Ver Quadro na Imagem]

Não se pode ainda neste estágio de apuramento de números dar uma ideia completa do que se passou, nem é possível estabelecer em pormenor as causas da grande diminuição que estão relacionadas com a crise dos principais mercados europeus. No entanto marcam-se adiante alguns aspectos de maior interesse.
Diminuiu bastante a exportação de vinhos de todos os tipos e qualidades. Os comuns tintos, maduros, que haviam alcançado a cifra de 190:558 contos em 1946, não ultrapassaram a de 131:600 em 1947. Outro tanto aconteceu aos brancos, com a diminuição de 35:000 contos, números redondos, e aos verdes, embora nestes últimos a menor valia não atingisse 3:000 contos.
No vinho do Porto o decréscimo alcançou a cifra de 62:000 contos, mas o total ainda foi bem superior a 300:000 contos, o quê, considerada a crise, não parece ser mau.
O caso das conservas necessita de ser visto à luz dos principais mercados consumidores. O decréscimo na exportação assumiu um carácter sério na sardinha em azeite ou molhos.
De 444:000 contos enviados para fora do País em 1946, a exportação passou para 327:770 em 1947, menos cerca de 116:230 contos. Houve diminuições em todos os outros tipos de conservas, mas esta foi a mais importante.
A exportação total de conservas de peixe andou à roda de 580:000 contos em 1946 e não passou de cerca de 446:000 em 1947. A diferença para menos de uns 134:000 contos já deve ter afectado a indústria. Os prenúncios para 1948 não se antolham mais prometedores. No resto dos produtos alimentares houve acentuada baixa. Na amêndoa em miolo foi de mais de 50:000 contos, nas azeitonas de 16:000, e assim por diante.
Depositam-se nos comentários feitos atrás grandes esperanças na exportação de frutos e produtos hortícolas, mas os números de 1947 parecem contrariar o que se escreveu no texto sobre este assunto.

IV

Manufacturas diversas

13. Também neste capítulo se deu sensível baixa na exportação, como se deduz dos números insertos no quadro que a seguir se menciona e que se refere aos anos de 1946 e 1947.

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QUADRO XVII

Manufacturas diversas

[Ver Quadro na Imagem]

Pode dizer-se que o decréscimo foi geral, tanto em tonelagem como em valor, mas acentuou-se muito nas obras de matérias minerais e vegetais e em diversas.
A diminuição de 100:000 contos no que se exportou por este capítulo constitui um sintoma desanimador, sobretudo no momento actual. O quadro XVIII, que se menciona a seguir, indica, em toneladas e contos, algumas cifras que dão a ideia das variações do comércio exportador de diversas mercadorias entre os anos de 1946 e 1947:

QUADRO XVIII

[Ver Quadro na Imagem]

A menor exportação de bebidas trouxe naturalmente quebra no vasilhame de madeira enviado para fora. Nos cascos e barris essa quebra foi substancial.
Na cortiça em obra, que em 1946 atingiu 375:000 contos, a diminuição não foi tão grande como podia julgar-se, .porque andou à roda de apenas 24:000 contos - ou 352:000 no total exportado em 1947. E um bom sintoma e conviria defender esta mercadoria pelas razões já apresentadas no texto.
Houve decréscimos em quase todas as matérias minerais exportadas, no vasilhame de garrafas e garrafões, no fibrocimento e em outras.
A baixa acentuou-se nas obras de metais preciosos e nos livros impressos. Progrediram um pouco as obras de ferro e aço, o papel e os livros e os medicamentos e aparelhos cirúrgicos. Contudo foi ainda a cortiça que sustentou a importância do valor total exportado, e será ela que possìvelmente o sustentará ainda no futuro.

V

NOTA FINAL

Alterações no comércio externo em 1947

14. A análise que ràpidamente acaba de fazer-se mostra em síntese as causas que levaram em 1947 a maior déficit na balança comercial. No entanto, para claramente se ajuizar da importância dos pesos e valores exportados neste ano em relação ao anterior, publica-se um quadro, que à primeira vista oferece a súmula do que se passou. Ele dá-nos as variações nos dois anos agora estudados.

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QUADRO XIX

Importações exportações em 1947

[Ver Quadro na Imagem]

Sumário

[Ver Tabela na Imagem]

A ORIGEM E O DESTINO no COMÉRCIO EXTERNO

(1947)

15. Piorou bastante em 1947 a estrutura geográfica do comércio externo. Viu-se atrás que os saldos negativos com alguns países se mantiveram dentro de cifras razoáveis no ano de 1946 e apenas com dois ou três se acentuou a sua importância e valores absolutos. Também a balança comercial se equilibrou com alguns países e com outros ainda os saldos positivos foram bastante substanciais.
Em 1947, porém, tirando os domínios ultramarinos, o Brasil e a Palestina, houve saldos negativos com todos os outros territórios apurados até agora e que constituem a quase totalidade do comércio exportador.
A balança comercial com os países de onde importámos mais de 100:000 contos pode sumariar-se do modo que segue, por ordem de valores, para os dois anos de 1946 e 1947:

[Ver Tabela na Imagem]

As diferenças entre os dois anos são consideráveis nalguns casos, como o dos Estados Unidos da América.
O déficit de mais de 2,5 milhões de contos na balança comercial com aquele país é na verdade muito grande e incomportável pela economia nacional. Mandámos vir de lá cerca de um terço do total importado e apenas para lá enviámos pequena parcela das exportações.
A situação com outros países também se agravou, principalmente com a Argentina, que apenas importou de Portugal 62:000 contos ou 1,5 por cento do total, enquanto que lhe competiu (percentagem de relevo do que mandámos vir de fora.
Com a Inglaterra os números pioram bastante em relação a 1946, mas foi este país, apesar de suas dificuldades, que consumiu maior percentagem, ou 14,7 por cento, das nossas exportações.
Com os restantes países mencionados na lista o agravamento foi geral. A Bélgica-Luxemburgo, que tivera anteriormente saldo positivo, tomou 9,7 por cento das exportações e ocupou percentagem importante das importações. O saldo positivo converteu-se em negativo. As dificuldades no Brasil também provocaram um saldo negativo em vez do positivo (266:000 contos) em 1946.
Nos outros países as condições não são melhores porque com quase todos eles tivemos saldos negativos apreciáveis. Nalguns, como a Suíça, o agravamento da balança foi demasiado.
A lista seguinte define a maior parte deles.

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[Ver Tabela na Imagem]

Embora os territórios acima mencionados representem uma pequena parte do comércio exportador, os sintomas expressos no quadro não são animadores, visto ter havido maior desequilíbrio na balança comercial com quase todos, até naqueles com que mantínhamos saldo positivo.
Com os restantes territórios não especificados o saldo negativo foi grande. Importámos deles mais do que exportámos, e o agravamento da situação deve ser evitado na medida do possível.
Os saldos positivos em 1947 quase não existem, tão limitados eles são.

Os saldos da balança comercial

16. É simplesmente desolador o estado da nossa balança comercial. Os deficits crescem e o ano de 1947 mostra a necessidade urgente de cuidar dum aspecto da vida portuguesa de grandes reflexos no bem-estar interno.
Foi sugerida pelo autor há uns anos a conveniência de estabelecer uma lista de prioridades dos produtos essenciais à vida do povo português e ao desenvolvimento dos seus recursos. Parece que logo depois de terem terminado as hostilidades se deveriam escalonar as importações conforme as exigências de maior repercussão na vida nacional e preparar assim o rol das prioridades.
Importaram-se em 1946 e 1947 coisas desnecessárias ou que poderiam ser adiadas, e daí, o grande déficit da balança comercial, que em dois anos andou por bem mais de 7 milhões de contos, cifra respeitável em qualquer época, mas que no momento presente assume importância maior por não ser possível a outros países receber mercadorias portuguesas em troca de dinheiro ou até de produtos.
O mal não tem remédio agora, mas parece que o Governo está na disposição de o atalhar com a instituição recente de um conselho especial para o comércio externo.
Há-de ser difícil o trabalho deste organismo, porque ele tem influência em todas as actividades do País, incluindo as do Estado, além de que os recursos são hoje menores. Be resto, a sua actividade necessita de ser coordenada com a de muitos outros sectores da vida económica e social - porque a tarefa não consiste em diminuir pura e simplesmente, aqui ou além, as importações, mas conhecer os reflexos que isso pode ter na própria actividade, tanto agrícola como industrial.

17. Por último, devem ainda escrever-se umas palavras sobre a origem e destino do comércio externo.
Embora o facto assuma aspectos paradoxais, o maior beneficiário dos grandes deficits portugueses foi 5 país mais rico do Mundo. Os Estados Unidos poderiam tomar maior somatório das nossas exportações, e nós estamos em condições de lhe fornecer em bem maiores quantidades conservas de peixe, vinhos de marca, principalmente do Porto, e cortiças. Não se vê bem a razão por que se não exporta para a América mais 1 milhão de contos do que actualmente. Em vários produtos, como na louça artística, bordados da Madeira, produtos regionais e outros, ainda há campo, para mais intensas relações com aquele país. Dependem das autoridades americanas, mais do que das portuguesas, estes desenvolvimentos, e pode dizer-se que também vai nisso o interesse da grande república atlântica.
Quanto aos outros países, ainda a Inglaterra, apesar das suas dificuldades, toma uma parte sensível da produção portuguesa, embora haja déficit contra nós.
Com as outras nações da Europa e da América estamos a chegar ao período em que tem de intervir o Ministério dos Negócios Estrangeiros no sentido de procurar melhor compensação para as grandes importações que deles fazemos, por maior comércio exportador com eles.
Neste aspecto o comércio com os nossos domínios de além-mar foi a única nota animadora para a actividade metropolitana.
A conclusão final indica só um caminho a seguir, no qual, por tantas vezes ter sido repetido, parecerá enfadonho voltar a falar. Esse caminho é o da produção para consumo interno e exportação. Produzir dentro do País tudo o que for possível é hoje um dos maiores deveres das actividades nacionais.

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