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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 157

ANO DE 1948 1 DE MAIO

IV LEGISLATURA

SESSÃO N.º 157 DA ASSEMBLEIA NACIONAL

EM 30 DE ABRIL.

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Exmos. Srs.
Manuel José Ribeiro Ferreira
Manuel Marques Teixeira

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia. - Os Srs. Deputados Antunes Guimarães, Albano de Magalhães e José Nosolini ocuparam-se de problemas vinícolas.
O Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu anunciou um aviso prévio sobre a elaboração dos planos de urbanização ao abrigo do decreto-lei de 5 de Setembro de 1944.
O Sr. Deputado João Ameal aplaudiu a iniciativa de um concurso literário promovido pela Junta Central das Casas do Povo.
O Sr. Deputado Manuel Múrias falou sobre o 3.º centenário da reconquista de Angola aos holandeses.
O Sr. Deputado Querubim Guimarães requereu vários elementos sobre casas de espectáculos existentes no País.

Ordem do dia. - Concluiu-se a votação da proposta de lei sobre questões conexas com o problema da habitação e do projecto de lei do Sr. Deputado Sá Carneiro referente ao inquilinato e foi aprovado o texto da Comissão de Legislação e Redacção relativo ao projecto de lei sobre feriados.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 30 minutos. Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Enrico Ribeiro Cazaes.
Albano Camilo de Almeida Pereira Dias de Magalhães.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
Alexandre Ferreira Pinto Basto.
Manuel José Ribeiro Ferreira Manuel Marques Teixeira.
Álvaro Eugênio Neves da Fontoura.
Álvaro Henriques Perestrelo de Favila Vieira.
António Augusto Esteves Mendes Correia.
António Cortês Lobão.
António Júdice Bustorff da Silva.
António Maria do Couto Zagalo Júnior.
António de Sousa Madeira Pinto.
Artur Augusto Figueiroa Rego.
Artur Rodrigues Marques de Carvalho.
Belchior Cardoso da Costa.
Carlos de Azevedo Mendes.
Ernesto Amaro Lopes Subtil.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco Higino Craveiro Lopes.
Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique Carlos Malta Galvão.
Henrique Linhares de Lima.
Herculano Amorim Ferreira.
Indalêncio Froilano de Melo.
João Ameal.
João Antunes Guimarães.
João Cerveira Pinto.
João Garcia Nunes Mexia.
João Luís Augusto das Neves.
João Xavier Camarate de Campos.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim dos Santos Quelhas Lima.
José Alçada Guimarães.
José Esquível.

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José Gualberto de Sá Carneiro.
José Luís da Silva Dias.
José Maria Braga da Cruz.
José Maria de Sacadura Botte.
José Martins de Mira Galvão.
José Nosolini Pinto Osório da Silva Leão.
José Nunes de Figueiredo.
José Penalva Franco Frazão.
José Soares da Fonseca.
Luís António de Carvalho Viegas.
Luís Cincinato Cabral da Gosta.
Luís da Cunha Gonçalves.
Luís Maria Lopes da Fonseca.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Luís Mendes de Matos.
Manuel da Cunha e Costa Marques Mano.
Manuel França Vigon.
Manuel Hermenegildo Lourinho.
Manuel José Ribeiro Ferreira.
Manuel Marques Teixeira.
Mário Borges.
Mário de Figueiredo.
Paulo Cancela de Abreu.
Ricardo Spratley.
Salvador Nunes Teixeira.
Teotónio Machado Pires.
Ulisses Cruz de Aguiar Cortês.
D. Virgínia Faria Gersão.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 64 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidentes - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Antunes Guimarães.

O Sr. Antunes Guimarães: - Sr. Presidente: a aglomeração de serviço e, sobretudo, a conveniência de se corresponder ao justo e bem evidente anseio nacional pela discussão dos diplomas relativos ao inquilinato e problemas conexos não permitiram que V. Ex.ª tivesse incluído na ordem do dia desta sessão legislativa a apreciação do decreto sobre a elevação do contingente de defesa dos vinhos de pasto durienses de 30 para 40 por cento e sua generalização aos concelhos limítrofes do Porto.
Mas a situação grave em que se encontravam os produtores de vinho continua, e o que se passa justifica que eu tenha pedido a V. Ex.ª a honra de fazer algumas, embora muito rápidas, considerações sobre tão premente assunto.
Sr. Presidente: é, de facto, notoriamente estranho que o problema dos vinhos tropece amiúde no seu desenvolvimento com incógnitas geradoras de sérias dificuldades, que umas vezes (quase sempre) se resolvem por si, outras mercê de intervenções dos governantes, mas das quais, sistematicamente, vêm resultando preocupações e graves prejuízos para os que se consagram à importantíssima e transcendente cultura vitivinícola, ou ao seu tradicional e volumoso comércio, não só no País, mas, sobretudo, além fronteiras, em que lhe tem cabido, desde séculos, lugar do maior destaque no fundamental capítulo das exportações.
É notoriamente estranho, venho de dizer, que se verifiquem tantas dificuldades e prejuízos, por se tratar de um valor a que as nossas condições excepcionais de ordem climática e a adequada natureza do solo (metropolitano e de algumas ilhas adjacentes) criam o habitat, por excelência, e ainda merco da competência, afirmada de geração para geração, dos trabalhadores portugueses para toda a gama de operações que a vitivinicultura exige tanto nas vinhas como nas adegas e, por fim, nos armazéns para a produção da grande variedade dos nossos vinhos preciosos.
É grande a série de dificuldades que perturbam apoquentadoramente todo o vasto sector vitivinícola; umas, as principais, registam-se, além fronteiras, não só pelo desequilíbrio económico que ali ferira seriamente o poder de compra, mas também como resultado da concorrência da produção de novas zonas sem as condições precisas às boas massas vínicas, mas que se vão aproveitando da baixa capacidade de aquisição de muitos consumidores para irem dando vazão a produtos de baixa categoria, e também devido às fraudes que vão resistindo a todos os esforços da fiscalização para as reprimir.
Outras têm-se verificado aquém fronteiras, mas não resultam de baixa do poder de compra, nem de sobreprodução ou de subconsumo.
Confiemos que, no respeitante aos mercados estrangeiros, o Governo não só continuará, mas esforçar-se-á por intensificar a indispensável defesa e propaganda dos nossos vinhos, não sómente assegurando-lhes seus antigos e tradicionais mercados, mas conquistando-lhes nova clientela que nunca se arrependerá da preferência com que nos distinguir.
Para isso lá estão os nossos representantes diplomáticos e consulares, com seus agentes comerciais, as Casas de Portugal, a cuja acção se juntam os esforços do Instituto do Vinho do Porto, do Grémio dos Exportadores, da Junta Nacional do Vinho, da Comissão dos Vinhos Verdes e de outros organismos similares, não devendo esquecer-se, pela sua grande projecção nos mercados estrangeiros, as firmas interessadas na colocação dos nossos vinhos em diversos países onde se trava rija luta e onde a carência de altas qualidades dos produtos oferecidos é suprida em parte por fartura de recursos, sem os quais a propaganda não resulta eficaz.
Por isso repito o que em tempos tive ensejo de sugerir nesta Assembleia, e vem a ser que se garantam os fundos indispensáveis àquela propaganda e correspondente defesa dos nossos vinhos.
Ouvi que nas legações do país vizinho, ao lado de agentes comerciais, trabalham agrónomos especializados em enologia, com assinaladas vantagens.
Em resumo: carecemos não só de manter, mas de melhorar, a nossa posição nos diferentes mercados do vinho, atribuindo a esses serviços fundos suficientes.
Sr. Presidente: mas a crise vinícola revela-se também aquém fronteiras, e, como venho de afirmar, não se trata de sobreprodução nem de subconsumo; e o poder de compra da vastíssima clientela daquela bebida não se revela afectado, duma maneira geral, pelas dificuldades que pesam sobre um ou outro sector social e, muito particularmente, no da classe média.
Na reunião realizada no Porto, em 19 de Março último, de numerosos representantes da lavoura dos vinhos verdes o ilustre Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria, Sr. Dr. Correia de Barros, afirmou que, ao contrário do que muitos julgam e propalam, as estatísticas demonstram que, do uma maneira geral, a produção de vinho da última colheita não aumentou, tendo sido em algumas regiões aproximadamente igual à do ano anterior.
Assim é, de facto. E se na região dos vinhos verdes se registou algum vinho a mais que na colheita de 1946 (a qual fora das mais baixas), o certo é ter ficado abaixo em cerca de 150:000 pipas da de 1944, ano de excepcional fartura, em que todo aquele vinho fora absorvido pela respectiva clientela.

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Isto quer dizer que o vinho verde tem seu consumo garantido, mesmo nos anos de maiores colheitas, não havendo portanto indicação para restrições do plantio nem razões que justifiquem o preço baixíssimo pago aos produtores pelos intermediários, preço que se distancia muito do que por eles é depois cobrado aos consumidores.
Sr. Presidente: tem sido, e continua a ser, aflitiva a situação da lavoura de uma maneira geral, e muito especialmente da região nortenha, porque a baixa que alarmadamente afecta a generalidade dos géneros transformou-se, no respeitante ao vinho verde, em autêntica derrocada.
Para que a Assembleia forme um juízo aproximado da preocupação que domina o nosso mais importante sector de trabalho permita V. Ex.ª, Sr. Presidente, que eu relate uma troca de impressões que ontem, pelo telefone, realizei com um muito considerado lavrador minhoto:

Sobre vinhos. A derrocada continua?
Não, parece ter parado.
Mercê das providências anunciadas na reunião dos viticultores no Porto pelo Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria?
Estou convencido que não. Toda a gente atribui a paragem da derrocada às chuvas e ao frio que nas últimas semanas parece terem prejudicado a nascença das uvas.
A lavoura deve estar desolada!
Engana-se. Até parece ter estimado o cataclismo, por dele poderem vir a resultar preços, nunca compensadores, mas menos aviltantes, para o vinho que ainda armazena nas adegas, o que lhe permitiria atenuar a trágica, situação financeira em que vive.
Sr. Presidente: em vez dos clamores com que tais contratempos eram invariavelmente recebidos pela lavoura, os prenúncios de má colheita são agora ou recebidos com indiferença, ou até com manifestações de júbilo, pela esperança de que a derrocada suspenda a sua marcha de ruína e os preços se firmem.
Tristes sinais dos tempos difíceis que a lavoura atravessa!
Na referida reunião dos viticultores nortenhos o Sr. Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria, que é um simpático portuense, conhecedor dos problemas vitivinicolas, ao aludir ao pânico que se produzira na lavoura, no que respeita ao vinho, filiou-o, segundo referiu a imprensa, na especulação.
Sim, a especulação não deve ter sido alheia àquele pânico e correspondente aviltamento dos preços.
Mas trata-se, sobretudo, duma parcela do pânico geral que afectara principalmente a lavoura e sem poupar a quase totalidade das suas produções agrícolas ou zootécnicas.
Na realidade, repito, não houve sobreprodução, e o vinho, pelo menos o verde, mal chega para as exigências normais do seu mercado de consumo.
O vinho verde continua a beber-se, mas é ridiculamente pago, atirando os produtores para a ruína.
E, repito também, os consumidores, na sua maior parte da classe operária, bem podiam pagá-lo por um preço remunerador, uma vez que os respectivos salários, e portanto seu poder de compra, longe de estarem diminuídos, mostram-se reforçados, merco do embaratecimento da vida, notoriamente no que respeita a géneros agrícolas.
Sr. Presidente: para valer à lavoura dos vinhos verdes o Governo autorizou a sua queima até 30:000 pipas e à razão de $15 o grau-litro.
Este preço, se é aceitável para vinho doente, nunca poderia contribuir para manter cotações razoáveis ao vinho verde são e de categoria, geralmente de pequena graduação alcoólica, as quais resultam sobretudo de outras qualidades características e muito apreciáveis daquelas excelentes e inconfundíveis massas vínicas.
Uma vez que a chamada psicose da baixa envolveu também aquele género agrícola, que constituía talvez a melhor defesa da lavoura minhota, a única maneira eficaz de lhe garantir, agora preço razoável seria o Governo habilitar a Comissão dos Vinhos Verdes, ou outro organismo, a adquiri-lo numa média de 1.000$ por pipa, desde que possua as qualidades de um bom vinho verde típico.
Isso bastaria para que a respectiva cotação se elevasse desde logo acima daquele preço, porque os armazenistas teriam de comprá-lo para fornecimento dos respectivos clientes.
É convencido estou de que o organismo oficial encarregado daquela operação reguladora poucas pipas conseguiria comprar, porque, repito, o vinho verde da última colheita mal chega para abastecer os seus consumidores habituais.
Sr. Presidente: no relato, publicado pela imprensa, daquela importante reunião de produtores de vinho verde pude então ler que o distinto Subsecretário de Estado do Comércio e Indústria afirmara que o Governo, por necessidade de defesa da lavoura, ia comprando algum vinho (claro está que se referia a vinhos de pasto maduros), mas que não conseguia depois vendê-lo, sobretudo porque os mercados externos não o absorvem, em consequência das dificuldades com que lutam.
Infelizmente tem-se verificado retraimento daqueles mercados, mas tão difícil situação acabará por modificar-se (a história repete-se), e os bons vinhos portugueses voltarão a exportar-se.
Caso é que os financiamentos do Estado se concentrem num produto que não sòmente se não deteriore, mas que vá melhorando com os anos e possa desta forma esperar a restauração do poder de compra dos aludidos mercados estrangeiros.
É o que se verifica com as autênticas massas vínicas da região duriense, uma vez convertidas em magnífico vinho do Porto.
Isso consegue-se, além de outras operações de certa transcendência, com o adicionamento de apreciável percentagem de aguardente vínica.
O ilustre membro do Governo referiu-se aos inconvenientes de se recorrer para isso à destilação de vinho do Douro, porque resultaria cara, havendo toda a vantagem em se aproveitar a aguardente vínica do Sul, destinando-se os vinhos de pasto do Douro ao mercado portuense e aos concelhos limítrofes.
Trata-se da fórmula clássica para atenuação das crises vinícolas:
O vinho excelente dos socalcos durienses, e só esse, seria totalmente beneficiado com aguardente do Sul, e aguardaria assim e sem receio de desvalorização, pois suas qualidades generosas ir-se-iam afinando com a idade, oportunidade de colocação vantajosa.
Os excessos de aguardente do Sul também poderiam aguardar, sem prejuízo de maior, oportunidade de venda.
Os vinhos de certas regiões, como os do Dão, de Colares e, sobretudo, os verdes, esses terão sempre consumo garantido, desde que intervenções inoportunas e especulações inadmissíveis, umas e outras fáceis de evitar, lhes não dificultem a livre circulação e venda compensadora nos seus mercados tradicionais, nem perturbem a formação natural dos respectivos preços.
Aludiu o Sr. Subsecretário de Estado ao plantio de videiras, citando os numerosos pedidos que de muitos pontos chegam ao Terreiro do Paço para alargamento daquela cultura e afirmando que só a custo o Governo vai deferindo tais pretensões.

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Afigura-se-me que, relativamente a regiões cujos vinhos têm mercado assegurado, não deve isso constituir motivo de preocupação, antes merece ser considerado como garantia da conservação e desenvolvimento de culturas que, ocupando regularmente, e por todo o ano, numerosos braços, constituem base essencial de colonização e contribuem também com lucros importantes e regulares para as receitas da Nação e do Estado.
Deve, sim, constituir motivo de preocupação (também neste capítulo a história se repete) o alargamento imoderado de vinhedos em certas zonas cuja elevadíssima produção, não tendo mercado assegurado, destrói o nosso equilíbrio económico.
Em tais circunstâncias, as restrições de plantio de vinhas admitem-se, mas sob a condição de simultaneamente se proporcionarem à lavoura respectiva os elementos indispensáveis à prática de outras culturas ou explorações zootécnicas suficientemente remuneradoras.
Reconheceu o referido membro do Governo que, embora se explique certa quebra nos preços do vinho verde em relação às cotações do ano passado (cuja colheita fora um tanto inferior), não poderá admitir-se que tal quebra vá além do razoável e envolva prejuízo de maior para a lavoura.
Desgraçadamente o ilustre Subsecretário de Estado poderia ter dito, sem exagerar, a completa ruína daquela actividade basilar.
Sr. Presidente: o pânico a que S. Ex.ª aludiu foi, infelizmente, de certa gravidade.
Mas tornou-se gravíssimo com a elevação de 30 para 40 por cento do contingente de defesa dos vinhos de pasto durienses e seu alargamento aos concelhos vizinhos do Porto.
E para isso concorreu a circunstância de não se terem promulgado simultaneamente providências que defendessem da derrocada ameaçadora os preços dos outros vinhos.
Afirmou aquele titular do comércio e indústria que o alargamento da alçada do referido contingente apenas abrangia a parte urbana dos concelhos limítrofes do Porto e não toda a sua área, como erradamente estava sendo interpretado.
E, prometendo acautelar os interesses da região dos vinhos verdes, anunciou que os respectivos produtores não tardariam a conhecer resoluções demonstrativas de que o Governo os não abandonava e que seriam asseguradas providências sobre a conveniente aplicação dos contingentes fixados para os vinhos de pasto da região duriense.
Que eu saiba, foi autorizada, como já tive ocasião de dizer, a destilação até 30:000 pipas de vinho verde, que seria pago à razão de $15 o grau-litro.
Esta medida apenas interessa a algum vinho doente.
Repito: informações de lavradores categorizados garantem que, se a derrocada de preços parece ter parado, isso se deve à chuva e ao frio, que tornaram precários os resultados da próxima colheita.
Sobre a interpretação a dar aos preceitos que regulam o referido contingente de favor para os vinhos de pasto do Douro permita V. Ex.ª que eu leia algumas considerações, que devo à gentileza de um dos mais categorizados especialistas de tão preocupante matéria.

Ao ser criada a comissão do abastecimento de vinhos, por força do decreto-lei n.º 24:349, de 11 de Agosto de 1934, determinou-se, pelo seu artigo 4.º, o seguinte:

Em face do consumo anual de vinhos de pasto na cidade do Porto e das existências em poder da Casa do Douro, a comissão fixará as quantidades de vinho não proveniente da região demarcada dos vinhos generosos do Douro que poderão entrar as barreiras da mesma cidade.

Por sua vez, o artigo 11.º do mesmo decreto estabeleceu o seguinte:

A entrada na cidade do Porto dos vinhos engarrafados e dos provenientes da região demarcada dos vinhos verdes não fica sujeita a qualquer restrição...

Porém, em 4 de Julho de 1935, pelo decreto-lei n.º 25:590, estabeleceu-se que:

A partir da data deste diploma a comissão do abastecimento de vinho à cidade do Porto passará a fixar, nos termos do artigo 4.º do decreto-lei n.º 24:349, de 11 de Agosto de 1934, as quantidades de vinhos provenientes da região demarcada dos vinhos verdes que, em face do consumo anual de vinhos de pasto na cidade do Porto, nela deverão entrar, ficando assim alterada a disposição dó artigo 11.º do mesmo diploma.

Há que analisar estas disposições legais sobre dois aspectos diferentes:
a) Qual o limite em que os vinhos verdes podem entrar no consumo da área de interferência da comissão do abastecimento;
b) Sobre que vinhos é que se calcula a percentagem do Douro.
Quanto ao primeiro, é de notar que a lei considerou sempre os vinhos verdes em regime especial, começando por não pôr qualquer restrição ao seu consumo (artigo 11.º do decreto-lei n.º 24:349) e por limitar depois o mesmo consumo (artigo 1.º do decreto-lei n.º 25:590), sendo da competência da comissão do abastecimento de vinhos a fixação de tal limite.
É esta a disposição que ainda hoje se encontra, por forma indiscutível, em pleno vigor e que não foi cumprida pela comissão do abastecimento de vinhos na sua reunião de 6 de Fevereiro próximo passado, quando foi preciso dar execução ao disposto no decreto-lei n.º 36:742, de 2 do mesmo mês.
Quanto ao segundo aspecto considerado, verifica-se que, nos termos legais, a percentagem de vinho não proveniente da região demarcada dos vinhos generosos do Douro deve ser calculada «em face do consumo anual de vinhos de pasto» na zona de influência da delegação do grémio (ver artigo 16.º, § 3.º, do decreto-lei n.º 27:002, de 12 de Setembro de 1936, e citado decreto-lei n.º 36:742).
Sendo assim, como de facto é, ocorre saber o que eram legalmente «vinhos de pasto» ao tempo da publicação dos mencionados decretos-leis n.ºs 24:349 e 25:590.
Não eram, evidentemente, vinhos verdes, como clara e taxativamente se conclui do disposto no artigo 2.º do decreto n.º 19:253, de 17 de Dezembro de 1930, que instituiu as «bases do fomento vitivinícola», devendo, por isso, ter-se como definitivo que o legislador apenas determinou a incidência da percentagem dos vinhos do Douro sobre os vinhos maduros, tintos e brancos, consumidos ao tempo apenas na cidade do Porto, a qual deve ser hoje calculada sobre o consumo de vinhos do mesmo tipo em toda a área de influência da delegação do grémio,

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Para finalizar, Sr. Presidente, algumas palavras sobre abusos para que chamaram a minha atenção, que muito têm prejudicado produtores e o comércio retalhista, mas que me informam estarem a ser reprimidos por uma brigada especial de fiscalização.
Quero referir-me ao que se tem passado com o negócio das guias que, em consequência do contingente reservado na cidade do Porto e concelhos limítrofes aos vinhos de pasto da região duriense, são indispensáveis para a entrada naquela grande zona de consumo de vinhos de outras regiões, os quais têm sido vendidos, segundo dizem, a preços que oscilam entre 200$ e 300$, o que vem constituindo um dos factores mais responsáveis na derrocada de preços que assoberba, sobretudo, os vinhos verdes.
I - A percentagem do Douro aplicada aos vinhos verdes origina a chamada «cedência de litragem».
Esta cedência consiste na venda pelos armazenistas de vinhos aos retalhistas instalados na área dos vinhos verdes, igualmente afecta ao Grémio dos Vinhos, de uma litragem nominal de vinho do Douro em troca de uns tostões por cada litro.
Não há venda efectiva de vinho do Douro a estes retalhistas dos concelhos da região dos vinhos verdes, mas sim a venda puramente teórica de certo volume, necessário a cobrir a percentagem do Douro.
Ora isso tem-se prestado a negociatas vergonhosas.
II - Para fugirem à litragem do Douro, cujo vinho atingiu preços elevados em relação aos das outras regiões, sobretudo os verdes, certos comerciantes, segundo corre, procuravam não passar as guias do Grémio que são obrigados a passar e que acompanham a mercadoria. Pelos litros constantes dessas guias é que se calcula a percentagem do Douro, compreendendo-se assim a vantagem da infracção.
Os vinhos de pasto do Douro, segundo afirmam, cotam-se actualmente por mais $50 a $70 cada litro, e mesmo $80, do que os do Centro e Sul.
Muito havia a dizer sobre este assunto, mas não cabe nas restrições horárias do período de antes da ordem do dia.
Pena foi que outras exigências de trabalho urgente não tivessem permitido a V. Ex.ª marcar a apreciação do decreto referido, pois seria o momento de desenvolver tão importante tema como ele merece.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Albano de Magalhães: - Sr. Presidente: pedi a palavra para, na minha qualidade de Deputado que requereu também a ratificação do decreto-lei n.º 36:742, dizer, em esboço, as razões que a isso me determinaram.
Merece indiscutivelmente a região do Douro, pelo valor da sua economia, uma protecção especial. O seu vinho, que não encontra igual em qualquer parte do Mundo, tem espírito - é das melhores credenciais - e tem matéria - é das melhores notas de crédito.
Não se discute, pois, a necessidade de o valorizar. Entendeu o Governo que, em face da crise de exportação que se atravessa, era indispensável consumir em Portugal uma percentagem maior.
E resolveu com simplicidade. Quem o deve consumir é o Porto; e, como a cidade propriamente dita do Porto não basta, mandou alargar a obrigatoriedade do seu consumo aos concelhos limítrofes, que são produtores de vinho verde.
A injustiça é flagrante.
Em primeiro lugar devemos verificar se a protecção que as leis concedem à região do Douro deve ser igualmente considerada para os vinhos beneficiados e para os
vinhos de pasto; se o plantio de pés na região do Douro tem sido igualmente autorizado nas zonas em que é permitido o beneficio e nas zonas em que não é permitido; se tem sido em grande escala aumentada a produção nos terrenos de aluvião, nos terrenos graníticos e nos terrenos de altitudes superiores a 500 metros.
Em segundo lugar devemos ponderar se a percentagem imposta de consumo de vinho de pasto do Douro deve afectar uma região vinícola e um centro consumidor ou deve tanto quanto possível distribuir-se num racionamento equitativo para a produção e consumo de todo o País; se não deve ser levado em conta o consumo, para o efeito do benefício do vinho do Douro, de aguardente de vinhos maduros de outras zonas agrícolas, que desta maneira já vêem escoada parte da sua produção.
E assim podemos, quando fizermos uma análise do problema com os elementos que esboço, concluir:
1.º Que não é justo que uma protecção tão larga à região do Douro vá afectar grandemente e desigualmente a economia pouco próspera de outras regiões agrícolas;

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - 2.º Que não é justo sobrecarregar só determinado comércio e determinados consumidores com os preços mais elevados deste vinho maduro;
3.º Que não é justo, nem me parece conforme com o espírito e letra da lei, impor ao consumidor de vinhos verdes, especialmente na própria zona de produção de vinho verde, o consumo de vinho maduro;
4.º Que não é justo deixar de ter em consideração o desfalque que a economia duma região vinícola como a que corresponde à área dos vinhos verdes teve no ano corrente com a brusca descida dos preços do gado, do feijão, das batatas, do vinho e de outros produtos, para se atender sòmente à necessidade de se manter o preço do vinho de pasto do Douro a uma distância incompreensível dos preços de outros vinhos comuns;

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - 5.º Que é de considerar a quantidade de aguardente proveniente de vinho maduro que a região do Douro consome em beneficio dos seus vinhos para não agravar situações de outras regiões que nada contribuíram para este escoamento.
Desenvolverei estes pontos e outros mais na próxima sessão legislativa.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. José Nosolini: - Sr. Presidente: eu tinha pedido a palavra para produzir algumas considerações sobre o problema acerca do qual acabam de falar os Srs. Deputados Antunes Guimarães e Albano de Magalhães.
Por esse motivo, dando inteiro aplauso as considerações dos ilustres oradores que me precederam, desisto da palavra.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Como o assunto sobre que usei da palavra esta manhã é de alta importância e não me foi possível apreciá-lo detalhadamente, envio para Mesa o seguinte

Aviso prévio

Desejo ocupar-me, em aviso prévio, da elaboração dos planos de urbanização ao abrigo do decreto-lei de 5 de Setembro de 1944.

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O Sr. João Ameal: - Sr. Presidente: já tive ocasião de manifestar aqui, na última sessão legislativa, o meu aplauso à Junta Central das Casas do Povo quando esse organismo resolveu instituir uma série de prémios destinados aos nossos escritores que, através de romances, novelas ou contos, procurem dar uma verídica imagem da vida portuguesa - especialmente da vida dos trabalhadores portugueses, das oficinas ou dos campos. Sublinhei nessa altura que se trata de um dever moral e nacional reagir contra a dissolvente e suspeitíssima literatura de ficção que nos últimos anos se multiplica entre nós, claramente dominada por intuitos subversivos, claramente subordinada a um comando único, e na qual se deforma a real fisionomia do nosso povo, se lhe atribuem falsos sentimentos de ódio, de vingança, de luta de classes, se lhe dirigem flagrantes convites à revolta, dentro de uma receita de puro sentido marxista.
Depois de ter aqui falado a tal respeito, chamaram-me a atenção para um romance desse tipo em que se chega a incitar directamente ao assassínio: certa personagem aconselha um trabalhador rústico, pretensa vítima de opressões e abusos desumanos,, a suprimir o seu patrão na primeira oportunidade... É o conselho infame não fica por aí; generaliza-se logo, até fixar como programa a liquidação completa da classe: é necessário - clama a referida personagem - matar, em toda a parte, todos os patrões... Eis onde vai ter a escola literária que a si própria conferiu a designação eufemística de neo-realismo e que não passa de alinhamento de um grupo do autores desnacionalizados com os seus camaradas da chamada «literatura de choque» soviética...
Por isso louvei a Junta Central das Casas do Povo, na medida em que a instituição dos seus prémios assegura estimulante recompensa aos romancistas e novelistas da autentica vida portuguesa, do autêntico povo português.
Esta iniciativa é, porém, apenas um dos aspectos de uma actividade que apresenta muitos outros e merece, portanto, outros elogios.
Repare-se, por exemplo, no interesse com que a Junta Central promoveu a constituição de museus e bibliotecas nas Casas do Povo; com que organizou sessões de leitura; com que tem diligenciado restaurar o gosto pelas artes e indústrias regionais, graças à fundação de cursos de artesanato.
Repare-se no nível e na variedade dos numerosos estudos inseridos na sua revista Mensário das Casas do Povo - assinados, com frequência, por nomes de especialistas da nossa historiografia, da nossa etnografia, da nossa literatura de folclore.
Repare-se, enfim, nos três concursos que abriu: o primeiro, em Dezembro de 1946, a que já aludi; o segundo, em Junho do ano passado, para elaboração de uma história do trabalho rural em Portugal; o terceiro, recentemente, para a elaboração de um trabalho de investigação histórica e de crítica literária.
É a este último que desejava referir-me especialmente hoje, pela importância do seu toma e da tarefa a que convida.
Trata-se de promover a execução de um estudo que incidirá sobre a forma por que a vida, o trabalho e a arte populares têm servido de assunto entre nós para o conto, a novela e o romance, nas suas relações com a história política do País, desde os princípios do século XIX até aos dias de hoje.
Quer dizer: procura-se levar os nossos escritores verdadeiramente conscientes da sua missão social e nacional ao exame sério das influências que durante os últimos cento e cinquenta anos se marcaram nas obras de ficção consagradas a cenas da vida do povo português.
Questão puramente literária? Não a traria para aqui se apenas o fosse. Mas quem duvida de que, atrás e para além do literário, está, nestes domínios, o espiritual, o moral, o político? E, porque somos uma assembleia política e devemos estar atentos à defesa dos valores espirituais e morais da Nação...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ...julgo perfeitamente indicado chamar a atenção de VV. Ex.ªs para este problema.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Lembrou Pierre Lasserre, na magnífica e justiceira análise que dedicou ao romantismo francês, e que tinha por subtítulo «Ensaio sobre a revolução nos sentimentos e nas ideias durante o século XIX», haver certas causas que fazem crescer e prosperar as nações, outras que as fazem declinar e sucumbir; haver certas causas que mantêm a coesão dos grupos sociais e das famílias, outras que neles semeiam a discórdia; haver certas causas que fortalecem o homem no cumprimento dos deveres, lhe firmam a unidade e a personalidade, e outras que lhe dissolvem a vontade, lhe pervertem o carácter e pulverizam, num tumulto de incoerências e de transigências, a linha recta da sua marcha e do seu esforço. E Lasserre acusava o romantismo de ser, pela apologia da liberdade sem freios, pela exaltação sistemática das paixões e dos apetites, pela desagregação do conceito de comunidade, a favor do embate anárquico dos indivíduos autónomos - um dos grandes corruptores do seu país, um dos grandes veículos de fratricídio e decadência. Por meio de quê? Das obras de ficção -poemas, romances, novelas -, em que se instaurava o culto absurdo do homem livre (livre de regras orientadoras, de disciplinas éticas, de limitações de qualquer ordem) e se estimulava esse homem livre a sacudir cadeias e a abater muralhas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O romantismo vulgarizou a revolução, insinuou-a, em doses mínimas ou em doses maciças, nas inteligências mal resguardadas e nas sensibilidades desprevenidas.
Se se pode ver em Rousseau o patriarca da insurreição fatal consumada nos fins do século XVIII e nos inícios do seguinte, perguntaremos quais os seus livros mais espalhados e mais venenosos: o Discours ser l'inégalité parmi les hommes, o Contraí Social ou o Emile, as Confessions, a Nouvelle Heloise? A essência era a mesma. O mesmo apelo soava no tratado de mitologia política e na larga novela passional, cheia de lirismo empolgante e declamatório.
Mas a obra de ficção tornava muito mais fácil - através de personagens imaginadas e de situações artificiosas - dar corpo e ardor a teses francamente revolucionárias.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Literatura apenas? Política! E política da mais perigosa, porque muitos a não descortinam e se não defendem a tempo.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Convidar os nossos historiadores e críticos a examinar e a desmontar, de dentro para fora, essa alquimia perversa que faz da vida, dos enredos e das personagens fictícias os melhores instrumentos de intoxicação colectiva, é denunciar com inteligência e oportunidade uma das armas favoritas dos inimigos da Ordem e da Pátria.

Vozes: - Muito bem!

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O Orador: - O concurso da Junta Central das Casas do Povo indica o período a observar: do século XIX até os nossos dias.
Efectivamente, no decurso do século XIX - como Lasserre sublinhou para o seu país, do qual, aliás, muita coisa aqui foi largamente decalcada - grande parte dos mais virulentos micróbios contra as tradições portuguesas, contra as bases da família, contra a saúde moral, contra os velhos costumes do um povo crente, contra a estabilidade e disciplina sociais, foram insinuados através do obras literárias.
Quantos poetas e romancistas se puseram ao serviço das chamadas «ideias novas» - que eram, apenas, os diversos meios de penetração e de expansão da Revolução em marcha!
Caricaturaram-se os melhores valores nacionais; copiaram-se os figurinos da decadência e da imoralidade estrangeiras; abastardou-se a língua.
Procurou-se - e conseguiu-se - estabelecer um ambiente de derrotismo, de cinismo, de sarcasmo dissolvente, de irreverência ímpia.
Não é necessário enumerar nomes e livros; mas, por exemplo, virá a propósito lembrar o panfleto negador e deformador que foi a História de Portugal de Oliveira Martins (resgatado pelo acto de contrição do Portugal Contemporâneo e pelos belos painéis da Vida de Nuno Álvares e de Os Filhos de D. João I) e as diatribes inflamadas do Junqueiro do Finis Patrioe a atear, na esteira de Vítor Hugo, com versos sonoros, o incêndio que subia.
Quanto aos narradores de cenas populares, raros se eximiam ao modelo de Rousseau - e se privavam de nos dar falsas imagens da nossa gente, em quem apenas se diria interessá-los os apetites brutais, as misérias torvas, os amargos ressentimentos e os ímpetos de revolta...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Isto no século XIX. Hoje não é preciso sublinhar outra vez como o processo se aperfeiçoou e agravou através dos tais neo-realistas, de pura cepa marxista, e como, por esse meio, se perturba e desorienta a juventude e nas suas fileiras se tom semeado com abundância os germes de uma doutrina anticatólica, antipatriótica e anti-humana. Há que desmascarar a conjura funesta e persistente se queremos garantir o futuro e dar ao nosso impulso de ressurgimento uma continuidade sem falhas!
Problema literário? Não! Problema religioso, ético, social, político. Problema nacional!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quero deixar aqui a homenagem merecida à Junta Central das Casas do Povo por o haver compreendido, pelo desassombro com que trava o combate no terreno em que ele deve ser travado. E visto considerar um acto de justiça denunciar e censurar os incertos e os cépticos, os dúbios e os comodistas, os que nada fazem e nada deixam fazer, e enchem de obstáculos e travões os nossos caminhos de luta...

Vozes : - Muito bem!

O Orador: - ...creio também dever de simples justiça pôr em relevo o nome do presidente da Junta Central das Casas do Povo, Dr. António Júlio de Castro Fernandes, Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social, em cuja forte personalidade de animador pensamento e acção se aliam num espírito de ofensiva cheio de energia e de fé.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Igual fé e igual energia precisamos de mostrar todos, nesta batalha do que depende, porventura, a salvação das gerações novas - e, portanto, de que depende a projecção histórica da empresa que prosseguimos. Note-se bem: tudo quanto se fez, se faz e se fará será posto em risco se os portugueses que sobem agora para a vida não mantiverem o já adquirido e não levarem por diante - mas à luz das mesmas grandes certezas - os nossos esforços de reconstrução, de progresso e de engrandecimento.
Neste campo, como em todos, a batalha pela juventude terá de ser ganha - se não queremos que tudo se perca. O mesmo é afirmar que essa batalha há-de ser ganha - no presente, para o futuro!
Disse.

ozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Manuel Múrias: - Sr. Presidente: eu não costumo falar muito nem muitas vezes.
Se pedi hoje a palavra foi porque me parece conveniente que se não encerre esta sessão legislativa sem se ponderar num acontecimento de transcendência imperial que há-de celebrar-se enquanto estiver encerrada a Assembleia Nacional.
Sr. Presidente: no dia 15 de Agosto decorre o 3.º centenário da reconquista de Luanda aos holandeses. Esse acontecimento garantiu a Portugal a posse definitiva de Angola e a sua incorporação nos destinos da Pátria comum. Parece que o 3.º centenário da reconquista de Luanda não poderá deixar de ser aproximado de todas as campanhas que se fizeram nessa época para a libertar de invasores estranhos, pelas raízes, pela língua e pela religião, dos descobridores e ocupadores iniciais e, finalmente, definitivos de Angola e do Brasil.
Não é indiferente para quem medita, não só nesse tempo, mas no nosso tempo, um acontecimento dessa grandeza, porque ao mesmo tempo que se libertou Angola libertou-se a Guiné e permitiu-se a integridade das ilhas atlânticas que constituem a coluna vertebral da defesa do Atlântico e porventura uma dessas grandes partes que se podem jogar no Mundo em defesa dos interesses superiores de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Como a Camará estará encerrada no dia 15, pareceu-me conveniente que se dissesse aqui do interesse que a Assembleia Nacional não pode deixar de ter por este acontecimento, visto que ela nunca pode ser estranha aos interesses do nosso Império.
Parecia-me, Sr. Presidente, que seria da maior utilidade nesse dia, e por essa altura, irem a Angola aqueles que, na verdade, representando posições de importância, podem intervir no desenrolar da política portuguesa. E parece-me também, Sr. Presidente, que deveria ir a Angola uma longa missão, escolhida entre aqueles que não conhecem ou não estudaram Angola, e de tal maneira fizessem uma viagem de estudo, cujas observações poderiam resultar da maior importância para que começassem a conhecer Angola e melhor o nosso Portugal. Dessa missão, que deveria ser de escol, não deveria deixar de fazer parte um grupo de Deputados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Deputados, Sr. Presidente, dos que menos conhecessem o nosso Império, embora se tenham preocupado com os seus superiores interesses. Vou ter-

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minar para dizer que é uma sugestão que poderia ter interesse e o Governo, que está sempre atento aos interesses superiores do Império Português, certamente não deixará de tomar na devida conta.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Querubim Guimarães: - Pedi a palavra para enviar para a Mesa o seguinte:

Requerimento

«Requeiro que, pela repartição ou repartições competentes, me seja fornecida até à reabertura da Assembleia, para a futura sessão, uma nota informativa do número de casas de espectáculos existentes no País, como cinemas e como cineteatros, indicando-se as localidades onde se acham instaladas, e bem assim a data ou datas do respectivo alvará ou licença».

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - No final da sessão da manhã, quando se ia proceder à votação dos n.ºs 3 e 4 da proposta da comissão eventual sobre o artigo 26.º, levantaram-se dúvidas sobre se o n.º 3 estaria prejudicado e sobre o alcance deste número na hipótese de o não estar, em face da rejeição já votada pela Câmara do n.º 2 da proposta.
A Câmara, rejeitando o n.º 2, rejeita que se conceda aos inquilinos de habitação o direito de preferência que naquele n.º 2 lhes era garantido.
Mas como o n.º 1 dispõe sobre a preferência concedida aos locatários de prédio arrendado para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal nos casos de venda ou dação em pagamento desse prédio, pois diz:

O principal locatário do prédio arrendado para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal tem direito de preferência na venda ou dação em pagamento de prédio, sendo esse direito graduado em último lugar na escala das preferências.
Se o principal arrendatário não quiser usar desse direito, compete o mesmo aos outros, por ordem decrescente das rendas. Não terá direito de preferência o arrendatário que não explore no prédio há mais de um ano comércio, indústria ou profissão liberal.

E como no n.º 3 se prevê a hipótese da preferência na propriedade por andares, pode pôr-se esta dúvida: o alcance da votação do n.º 2 é o de excluir inteiramente o direito de preferência em relação aos inquilinos de habitação, quer se trate de todo o prédio, quer se trate apenas do andar na propriedade horizontal ou sòmente o de excluir esse direito de preferência na hipótese prevista no n.º 1, isto é na venda ou dação em pagamento de todo o prédio? Convenci-me de que a rejeição do n.º 2 envolvia a total rejeição do direito de preferência no inquilinato de habitação.
Mas para que a Comissão de Redacção possa saber qual o pensamento com que se fez essa votação e o alcance a dar àquela que incidir sobre o n.º 3 dessa proposta, pergunto: foi esse o pensamento da Câmara - o de excluir totalmente o direito de preferência no inquilinato de habitação quer em relação a todo o prédio, quer na propriedade horizontal em relação ao andar?
Os Srs. Deputados responderão sim ou não.

Consultada a Câmara sobre se fora seu pensamento resolver aquela preferência na propriedade por andares, respondeu negativamente por maioria dos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Vou submeter à votação da Câmara o n.º 3.

Consultada a Assembleia, foi. aprovado.

O Sr. Presidente: - Submeto agora à votação da Câmara o n.º 4.

Submeto, agora à votação da Consultada a Assembleia, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - A votação desta proposta de substituição da comissão eventual prejudicou a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho sobre o n.º 3 do artigo que estava em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 27.º Sobre este artigo está na Mesa uma proposta de substituição da comissão eventual, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos a substituição do artigo 27.º pelo seguinte:

ARTIGO 27.º

O senhorio pode requerer o despejo imediato pelos fundamentos actualmente previstos na lei, incluídos os dos artigos 7.º e 8.º, e pelos seguintes:
a) Se o arrendatário prestar serviços pessoais no prédio por incumbência do senhorio ou em empresa agrícola, comercial ou industrial que tenha habitações para residência de empregados ou assalariados seus, quando o arrendatário deixe de prestar esses serviços.
b) No caso de hospedagem a mais de três pessoas, salvo sendo das indicadas na base P.

Sala das Sessões, 28 de Abra de 1948. - Os Deputados: Mário de Figueiredo, João das Neves, José Gualberto de Sá Carneiro, Luís Maria Lopes da Fonseca, José Cabral.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja usar da palavra, vai votar-se.

Submetida à votação, foi aprovada a proposta de substituição do artigo 27.º apresentada pela comissão eventual.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 28.º tal como consta do parecer da Câmara Corporativa.
Sobre este artigo não há na Mesa nenhuma proposta de alteração.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 28.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 29.º

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Sobre este artigo há na Mesa várias propostas, que vão ser lidas à Assembleia.

Foram lidas. São as seguintes:

Proponho o seguinte aditamento à alínea a) da base XLIII da proposta de lei n.º 202 ou ao n.º 1 da alínea a) da base XLIII proposta pela Câmara Corporativa:

ou ainda por motivo de tratamento da saúde própria ou da de pessoa que com ele habitualmente viva ou que seja seu parente até ao 3.º grau.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 17 de Abril de 1948. - O Deputado Camilo de Morais Bernardes Pereira.

ARTIGOS 29.º e 31.º

Propomos a substituição dos artigos 29.º e 31.º pela seguinte base:

Pode requerer-se o despejo para o fim do prazo do arrendamento ou da renovação nos casos seguintes, sem prejuízo de outros actualmente previstos na lei:
a) Destinar-se a casa a habitação e, ao tempo da propositura da causa, não ter nela o arrendatário a sua residência permanente, viva ou não noutra casa, arrendada ou própria.
Não tem aplicação este preceito:
1.º No caso de doença ou outro de força maior;
2.º Se o arrendatário se ausentar em cumprimento de deveres militares ou no exercício de outras funções públicas por prazo não superior a dois anos;
3.º Se permanecerem na casa as pessoas que constituam o agregado familiar do arrendatário.
b) Necessitar o senhorio da casa para sua habitação quando se verifiquem, simultaneamente, os seguintes requisitos:
1.º Ser o senhorio o único proprietário, ou usufrutuário, há mais de cinco anos;
2.º Não ter, na área da comarca ou nas limítrofes, casa própria ou arrendada há mais de um ano.
O senhorio que tiver diversas casas dadas de arrendamento só pode exercer o direito estabelecido nesta alínea relativamente à que, satisfazendo às necessidades de habitação própria e da sua família, esteja arrendada há menos tempo.
c) Propor-se o senhorio fazer obras de ampliação do prédio arrendado das quais resulte poder ser aumentado o número de inquilinos, desde que, em face de vistoria da câmara municipal e projecto por ela aprovado, se verifique a impossibilidade de as obras se efectuarem continuando os arrendatários no prédio;
d) Propor-se o senhorio fazer a substituição total do prédio arrendado por construção inteiramente nova, desde que de tais obras, em face de projecto aprovado pela câmara municipal, resulte poder ser aumentado o número de inquilinos;
e) Propor-se o senhorio, em face de projecto aprovado pela câmara municipal, fazer construções para habitação, dentro de zonas urbanizadas, em terrenos onde elas não existam.
O arrendatário despejado nos termos das alíneas c), d) e e) tem direito a uma indemnização correspondente ao quíntuplo da renda anual, actualizada na totalidade, nos termos desta lei, no caso de habitação, e correspondente ao décuplo, no caso de arrendamento comercial ou industrial.
Pode, porém, o arrendatário, num e noutro caso, em vez de receber a indemnização, ocupar a parte do novo prédio que substituir a que anteriormente ocupava, mediante renda fixada pela comissão permanente de avaliação, devendo para esse efeito notificar o senhorio no prazo de quinze dias, a contar da data da licença camarária para ocupação.
No caso de reocupação tem o arrendatário direito a uma indemnização correspondente à renda que pagava anteriormente e ao tempo que a desocupação durou.
Na petição inicial da acção do despejo, que será acompanhada do respectivo projecto, devidamente aprovado, o senhorio tomará o compromisso de iniciar as obras no prazo de três meses e concluí-las no de doze, a contar da efectivação do despejo, salvo caso de força maior.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, José Cabral, João das Neves, José Gualberto de Sá Carneiro, Luís Maria Lopes da Fonseca.

Alínea nova

d) Vivendo o senhorio em prédio arrendado e necessitando de casa para sua habitação.
O senhorio que usar desta faculdade, o que poderá fazer apenas uma só vez, e dê o prédio de arrendamento nos cinco anos posteriores ao uso da referida faculdade, será multado no equivalente ao rendimento colectável ilíquido correspondente aos três últimos anos, além das penalidades que lhe possam caber por se encontrar incurso no disposto na base XLII, salvo se o arrendamento for feito ao antigo inquilino à data do despejo do prédio.

Assembleia Nacional, 16 de Abril de 1948. - O Deputado Manuel Hermenegildo Lourinho.

Propomos a substituição da alínea c) do artigo 29.º pelo seguinte:

Necessitar o senhorio da casa para sua habitação ou de seus descendentes em 1.º grau, quando se verifiquem simultaneamente os seguintes requisitos:
a) Residir o senhorio ou o seu descendente em casa arrendada;
a) Colocar o senhorio à disposição do inquilino, para por ele poder ser tomada de arrendamento, outra habitação que, pela sua situação, número de divisões e classe, corresponda às suas necessidades e possibilidades;
c) Pagar ao inquilino, a título de indemnização, uma quantia que corresponda às despesas da mudança e à possível diferença, entre a renda que aquele pagava e a da nova casa que vai habitar, calculada com relação a, três anos de arrendamento.
Quando o senhorio pretenda usar deste direito deverá notificar o arrendatário pelo menos noventa, dias antes do fim do prazo de arrendamento, indicando o nome e residência do proprietário da habitação proposta, a situação desta, respectiva renda e número de divisões.
O inquilino, quando deseje que se considere não aceite a proposta, terá de contranotificar

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o senhorio nos cinco dias imediatos à sua notificação.
O diferendo será então resolvido por árbitros, ex aequo et bono, conforme os artigos 1561.º e seguintes do Código de Processo Civil, para o que o senhorio ou o inquilino poderão usar do direito consignado no artigo 1565.º do Código de Processo Civil dentro do prazo de dez dias, contado da data da contranotificação.
Considerar-se-á que constitui objecto do litígio decidir sobre o requisito constante da precedente alínea a) e fixar a quantia correspondente à indemnização pelas despesas da mudança.
Caberá ao terceiro árbitro determinar e promover os termos do processo, de forma a que a decisão seja proferida dentro do prazo máximo e improrrogável de trinta dias.
Nenhum senhorio poderá usar mais de uma vez a faculdade concedida na presente base.

Os Deputados: Manuel de Magalhães Pessoa, Rui de Andrade, Mário de Aguiar, Manuel Colares Pereira, Camarote de Campos, António Júdice Bustorff da Silva.

BASE XLIII

c) Necessitar o senhorio da casa para si próprio, seus ascendentes ou descendentes.
2. No caso da alínea b) do número anterior o arrendatário fica com o direito de optar entre três soluções:
a) Receber indemnização (igual a cento e vinte vezes a renda mensal que pagar) no acto de desocupar provisória ou definitivamente a casa; ou
b) Reocupar uma parte do prédio contratada com o senhorio antes do despejo, por meio de novo arrendamento onde se fixe taxativamente a data de reocupação o a obrigação de o arrendatário restituir a indemnização da alínea a) no acto da reocupação; ou
c) Ocupar nova casa em bairros sociais pertencentes ao Estado ou autarquias locais, com direito de preferência, obtida pelo pagamento à entidade oficial proprietária do bairro, a título de antecipação de rendas, da quantia recebida como indemnização nos termos da alínea a) do n.º 2 da presente base.
3. Salvo acordo do arrendatário, quando este optar pela solução da alínea c) do n.º 2 da presente base, o despejo não poderá efectuar-se enquanto não obtiver nova casa nos termos da mesma alínea.
4. O arrendatário para habitação despejado por efeito de expropriações ou demolições ordenadas oficialmente terá direito à indemnização de oitenta vezes o valor da renda mensal, se esta tiver sido estabelecida anteriormente a 1 de Janeiro de 1940, e, caso o deseje, a ocupar nova casa condigna em bairros sociais do Estado ou autarquias locais, não podendo efectivar-se o despejo sem que lhe tenha sido facultada a substituição da casa. No caso de ocupação de nova casa deve entregar, como antecipação de rendas, a importância da indemnização recebida.
5. O arrendatário despejado por o senhorio necessitar a habitação para si próprio ou para os seus ascendentes ou descendentes fica com o direito de receber indemnização, que será igual a cem vezes a renda mensal que pagar, no caso de o senhorio desejar a casa para si próprio, a cento e vinte vezes a mesma renda se ela se destinar a descendentes ou a ascendentes, e, se o requerer, deverá ocupar nova habitação em bairros sociais pertencentes ao Estado ou autarquias locais, com direito, de preferência obtida pelo pagamento à entidade oficial proprietária do bairro, a título de antecipação de rendas, da quantia recebida como indemnização.
6. O despejo a que se refere o número anterior não poderá efectuar-se enquanto o arrendatário não obtiver nova habitação, se assim o requerer.

Lisboa, 17 de Abril de 1948. - O Deputado Jorge Botelho Moniz.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão também o artigo 31.º e as propostas que acabam de ser lidas.

O Sr. Camilo Bernardes Pereira: - Sr. Presidente: estou convencido de que a alínea a) fica muito melhor tal como propõe a comissão eventual do que como propunha a Câmara Corporativa, ainda que com o meu aditamento.
Nessas condições, pedia a V. Ex.ª o favor de consultar a Câmara sobre se autoriza a retirada da minha proposta.
Consultada a Câmara, foi dada autorização para ser retirada a proposta do Sr. Deputado Camilo Bernardes Pereira.

O Sr. Manuel Lourinho: - Sr. Presidente: pedi a palavra para formular, além do mais, uma pergunta à comissão eventual.
E vem a ser:
Não haverá conveniência em suprimir a restrição que se faz no que respeita ao tempo na alínea a)?
Marca-se ali o espaço de dois anos para caducar o direito ao arrendamento na hipótese do afastamento do arrendatário no caso de deslocação transitória. Lembro, Sr. Presidente, que oficiais do exército e da marinha e até funcionários civis são chamados ao desempenho de comissões fora do continente que os obrigam a ausência por período muito superior aos dois anos ali inscritos como prazo máximo. Parece-me pois conveniente, se a comissão eventual achar interessante a sugestão, que essa restrição no tempo seja aumentada de modo a evitar prejuízos àqueles que sejam chamados a prestar serviços ao País fora da metrópole.
No que respeita, Sr. Presidente, à doutrina contida na minha proposta, julgo-a mais digna da aprovação da Assembleia do que qualquer das outras - salvo o devido respeito e consideração pelos Srs. Deputados que as apresentaram -, porquanto, no que se refere à possibilidade de o senhorio tomar para si a preferência referida, ela não pode ser utilizada mais do que uma vez, enquanto nas outras propostas tal restrição não está registada.
Desejo vincar que o direito outorgado na base em discussão, nova doutrina em inquilinato, deve ser cercado das cautelas necessárias para que em hipótese alguma se transforme em abuso ou maneira fácil de burlar a lei.
Julgo vantajosas as sanções que constam da minha proposta; elas são de ponderar, pois por seu intermédio se avisam os pouco escrupulosos, se protegem e indemnizam os que não têm defesa.
Tenho dito.

O Sr. Sá Carneiro: - Desejo, em primeiro lugar, requerer a V. Ex.ª que este artigo seja posto à votação alínea por alínea. Embora se trate de diversos casos de despejo para o fim do prazo do contrato, a alínea a) tem um sentido, a b) outro e a c), d) e e) outro muito diverso.
Quanto à interrogação do Sr. Dr. Manuel Lourinho, devo dizer que a disposição da alínea a) não é nova, pois está mais ou menos contida no artigo 17.º do projecto, no artigo 29.º do primeiro parecer, na base XLIII

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da proposta do Governo e na base XLIII do segundo parecer.
A fonte do preceito foi o artigo 5.º do decreto n.º 22:661, e procurou-se resolver os pontos acerca dos quais a jurisprudência divergia.
Aquelas bases previam que o funcionário civil ou militar se ausentasse por motivo de funções de carácter transitório...

O Sr. Manuel Lourinho: - Não tinha restrição de tempo.

O Orador: - É certo, mas a restrição estava de essência, porque não abrangia as deslocações a título de permanência.
Foi sobretudo o nosso ilustre colega Sr. coronel Esquivei quem salientou a conveniência de nos referirmos também a essas.
Dai a fixação de um prazo, pois é óbvio que para as funções não transitórias tinha de estabelecer-se limite de tempo.
É insuficiente o prazo de dois anos?
A comissão aceitará quaisquer sugestões que a tal propósito se façam.
Mas sempre lembrarei a VV. Ex.ªs que, pelo artigo 5.º, § 9.º, da lei n.º 1:662, o prazo de encerramento do prédio é de um ano.
E, embora os dois fundamentos de despejo - faltado residência permanente e encerramento do prédio - sejam autónomos, entre eles há certa conexão.

O Sr. Mário de Figueiredo: - O embaraço que a comissão encontrou quanto a estabelecer prazos mais largos, e a que se está a referir o Sr. Dr. Sá Carneiro, foi este:
É legítimo que numa lei com que também se pretende contribuir para a solução do problema da habitação se deixe uma casa fechada por prazos longos, por quatro anos ou mais?
Procuraram-se várias fórmulas. As situações são, porém, por tal forma variáveis que não se achou uma que satisfizesse completamente. O prazo de dois anos...

O Sr. Henrique Galvão: - Mas o prazo de dois anos não resolve o problema satisfatoriamente.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Pois não resolverá. Mas a verdade é que não há prazo que as resolva. A comissão eventual pensou em colocações definitivas e em colocações em comissão. Para aquelas e para os casos de a comissão ser por tempo indeterminado pareceu-lhe não dever estabelecer um prazo superior a dois anos; para as comissões por tempo determinado aceitou a custo que o prazo fosse o da comissão, mesmo quando superior a dois anos.

O Sr. Henrique Galvão: - Para o funcionalismo colonial é corrente a comissão de quatro anos.

O Sr. Mário de Figueiredo: - É por tempo determinado. Está prevista.
Desculpe V. Ex.ª, Sr. Dr. Sá Carneiro, a interrupção.

O Orador: - É preciso notar o. seguinte: na hipótese de permanecerem na casa pessoas que pertençam ao agregado familiar já não se aplica a alínea.
Esta prevê, naturalmente, que o prédio esteja encerrado.
Pela lei vigente apenas justificava o encerramento há mais de um ano o caso de força maior.
Se a alínea for votada, passará a haver outra circunstância justificativa do encerramento.
E esta poderá, nessa hipótese, durar por dois anos.

O Sr. Carlos Borges: - Em todo o caso o alvitre do Sr. Dr. Mário de Figueiredo é de considerar, porque pode ir até quatro anos.

O Orador: - Esse prazo parece-me excessivo, porque, havendo falta de habitações, não deverá permitir-se que um prédio possa estar encerrado por tão longo tempo.
Não sei se o Sr. Deputado Manuel Lourinho deseja mais esclarecimentos a este respeito, mas creio bastarem os que dei.
Disse.

O Sr. Bustorff da Silva: - Sr. Presidente: quero começar por uma homenagem que obedece a um preito prestado à verdade: esta Assembleia teve ontem o prazer de ser esclarecida pelo ilustre relator da comissão eventual em termos de uma tal lealdade...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ...de uma tal clareza...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... que bem demonstram ter a nossa comissão eventual realizado um estudo profundo e completo do problema em debate.
Devo acrescentar que classifico de um momento de inexcedível felicidade aquele que o Sr. Dr. Mário de Figueiredo viveu ontem na tribuna desta sala.
Por isso lhe rendo as minhas mais sinceras e profundas homenagens.
Não há dúvida de que a comissão eventual, no curto espaço que lhe foi conferido, conseguiu acumular um somatório de conhecimentos e esclarecimentos que nos
colocam em condições de podermos votar conscientemente.
Uma outra nota quero tirar: o Sr. Deputado Mário de Figueiredo afirmou que esta Assembleia não era nem contra os senhorios nem contra os inquilinos; procurava apenas encontrar a solução justa.
Apoiados.
Solidarizo-me incondicionalmente com S. Exa., e, por isso mesmo, os que me ouviram defendendo até agora certos pontos de vista favoráveis aos senhorios vão agora encontrar-me quase 100 por cento em prol dos inquilinos.
Sr. Presidente: na proposta da comissão eventual respeitante aos artigos 29.º e 31.º escreve-se: «pode requerer-se o despejo para o fim do prazo do arrendamento ou da renovação nos casos seguintes, sem prejuízo de outros actualmente previstos na lei» - notem VV. Ex.ªs bem: asem prejuízo de outros actualmente previstos na lei»:
a) Destinar-se a casa a habitação e, ao tempo da propositura da causa, não ter nela o arrendatário a sua residência permanente, viva ou não noutra casa, arrendada ou própria. (Seguem-se as excepções em que esta regra não terá aplicação).
Independentemente, por conseguinte, deste fundamento para despejo no fim do prazo do arrendamento, continuam subsistindo todos os outros actualmente previstos na lei.
Interessa, por consequência, recordar, a título de esclarecimento, quais são os actuais fundamentos legais do despejo mais Intimamente relacionados com a matéria da citada alínea a).
Pelo § 9.º do artigo 5.º da lei n.º 1:662 é fundamento para despejo o facto de o inquilino conservar por mais de um ano consecutivamente desabitado o prédio arrendado; pelo artigo 5.º do decreto n.º 22:661 as disposições vigentes que restringem a liberdade contratual..., incluindo as relativas à elevação de rendas e ao despejo,

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só podem ser invocadas pelos inquilinos relativamente à habitação em que tiverem a sua residência permanente.
Há, portanto, previstos na lei, neste capitulo restrito, dois fundamentos que induzem ao despejo: primeiro, o de o inquilino conservar consecutivamente desabitada a casa por mais de um ano; segundo, o de o inquilino não ter na casa a sua residência permanente.
Ora, se atentarmos na leitura do que nos é proposto na alínea a), o primeiro facto não há sombra de dúvida que está previsto; mas, com referência ao segundo, esse subsiste, e vou explicar porquê, trazendo ao conhecimento da Assembleia um caso concreto verificado na minha experiência profissional e que posso publicar sem nenhum melindre, visto que está regulado ou arrumado por acordo entre os interessados, confirmado por uma decisão judicial definitiva.
Mas este «saber de experiência feito» serve para evitar que voltem a repetir-se situações de idêntica gravidade.
O caso era este: um dos nossos mais distintos oficiais da armada foi solicitado pelo Governo da Nação para ir ocupar no Império uma situação proeminente. A comissão prolongar-se-ia por quatro ou cinco anos; a família era constituída por pai, mãe e um filho de 19 para 20 anos; na casa de residência em Lisboa havia bastante mobiliário impossível de fazer transportar ou guardar noutro sítio. Para mais, o filho dó casal cursava em Lisboa uma escola superior, que não podia abandonar sem prejuízo de largos anos de proveitoso estudo. As funções do chefe de família no seu novo cargo impunham a presença de uma senhora.
Solução? Marido e mulher seguiram para a África; o filho do casal instalou-se em casa de parentes próximos; a casa de Lisboa passou a ser amiudadamente visitada por ele e pelas pessoas que iam cuidar da respectiva conservação e do mobiliário que a guarnecia. E este estado de coisas manteve-se por cerca de três anos.
Surgiu uma acção de despejo, com o duplo fundamento de que a casa estava fechada há mais de um ano e, além disso, de que o arrendatário não tinha nela a sua residência permanente, pelo que não podia recusar-se a um aumento de renda, para que fora notificado.
Um acordo, repito, arrumou a controvérsia. Mas, se mantivermos a alínea a) tal como está redigida, nada obstará a que, de futuro e em condições idênticas, se renove a injustiça que referi.
Observa-me o Sr. Dr. Sá Carneiro que a nova redacção abrange os dois casos. Peço licença para divergir.
E basta que dois jurisconsultos, em perfeita boa fé, discordem, para se impor o esclarecimento completo do novo preceito.
Repito, não tenho dúvidas, em face da redacção da alínea a), de que o fundamento de despejo autorizado pela aplicação do artigo 5.º do decreto-lei n.º 22:661 continua em aberto.
Logo, não há senão vantagem em adoptar uma redacção que se recomende pela sua clareza.
Como se põe o problema?
O problema tem duas facetas: à face da primeira, não é justo que os funcionários administrativos ou militares que, ao serviço da Pátria, têm de ausentar-se para longe e abandonar as suas casas de residência em Lisboa, Porto ou qualquer cidade da província corram o risco de vir a ser privados de habitação quando, terminadas as comissões, regressem às suas situações anteriores.
Examinada a hipótese do ângulo inteiramente oposto, também não é justo que numa época de crise, de habitação, como a que atravessamos, se mantenham desocupadas por um período de dois, três ou quatro anos casas que outros poderiam fruir utilmente.

O Sr. Sá Carneiro: - E a casa não se deteriora estando fechada quatro anos?

O Orador: - Não, porque todos nós sabemos que, quando se verifica uma situação destas, há pessoas, encarregadas pelo arrendatário, de todas as semanas ou todos os meses prestarem ao mobiliário e à casa onde se encontram os cuidados que a respectiva conservação, no interesse do próprio inquilino, reclama.
Vamos, por conseguinte, colocar nos pratos da balança, de um lado, o prejuízo proveniente da circunstância de estar encerrada uma casa durante mais de dois anos e, do outro, a situação de tragédia com que se debaterá o funcionário forçado a aceitar uma comissão de serviço na África ou no estrangeiro - sabe Deus, às vezes, com que transtorno e contrariedade -, e que ao regressar à metrópole vê perdida a sua residência anterior e não encontra meio de conseguir nova casa onde se instale.
Esta flagrante calamidade é evidente que sobreleva às considerações que se procura opor-lhe.
Como remediá-la?
Com um aditamento esclarecido ao final da alínea a) da proposta da comissão eventual.
Proponho, por isso, o seguinte:

Que à respectiva alínea a) se aditem as seguintes palavras: «ou ter conservado mais de um ano consecutivamente desabitada a dita casa».

A substituição seria esta:

Que o n.º 2 seja substituído pelo seguinte:

2. Se o arrendatário se ausentar no cumprimento de deveres militares, ou em comissão de serviço público, ou em cumprimento de funções públicas obrigatórias, nos dois últimos casos por tempo indeterminado.

Pausa.

O Orador: - O Sr. Dr. Mário de Figueiredo deu-me agora, particularmente, uma sugestão inteiramente razoável, qual seria a de se modificar a alínea a) no sentido de que sejam tidas em conta as comissões por tempo determinado ou as funções obrigatórias por tempo indeterminado.
Nada tenho a opor e, antes, a aceito a mãos ambas, pois não me anima outro desejo que não seja o de aperfeiçoar o que está, Sr. Presidente.
O Sr. Deputado Sá Carneiro requereu há pouco a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que se procedesse à discussão e votação número por número e alínea por alínea, ou sòmente à votação?
No primeiro caso, continuarei no uso da palavra, posto que tenho mais algumas considerações a fazer.
No segundo...

O Sr. Presidente: - A discussão pode fazer-se em conjunto. A votação é que será por alíneas ou por números.

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª o seu esclarecimento e continuo no uso da palavra, se V. Ex.ª mo permite.
Há outro número da proposta que desejo, Sr. Presidente, apreciar rapidamente.
É o da alínea b).
Reputo esta sugestão injusta em relação aos senhorios e em relação aos arrendatários.
Eu vou explicar porquê.
Injusta em relação aos senhorios, porque me repugna que só possa usar desta faculdade o senhorio que seja único proprietário e não o possam fazer os co-proprietários, quando se encontrem de acordo.
Imaginem VV. Ex.ªs a situação, que, aliás, é frequentíssima, de no património de determinada família haver apenas um prédio.

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Morre o chefe da família. Deixa vários filhos. O prédio fica na co-propriedade de todos eles.
Não compreendo, não atinjo, por mais que me esforce, qual a razão que possa ser invocada no sentido de proibir a esses co-proprietários que se unam e reivindiquem para todos em comum, ou para um deles, escolhido por acordo, o mesmíssimo direito que o falecido pai poderia legalmente reivindicar.
Ponderam-me aqui do lado que poderiam surgir amanhã dificuldades entre os co-proprietários por não se entenderem, e não se saber qual deles poderia reivindicar o direito.
Não interessa.
Se se desentenderem, sofrem as consequências desse desacordo. Nada mais.
Harmonizados e concordes entre si, é, porém, aberrativo que se lhes não reconheça o direito que assistia ao seu representado.
Sr. Presidente: discordo também da fórmula adoptada na alínea b) quanto à faculdade de despejo quando o senhorio necessitar da casa para sua habitação.
Reputo-a injusta em relação ao inquilino, que o senhorio pode forçar ao despejo sem que lhe garanta casa nova onde se aloje.
No primeiro parecer da Câmara Corporativa, e acerca desta possibilidade de despejo das casas arrendadas para habitação, recorda-se que se trata de um fundamento de despejo que, embora não exista na nossa legislação actual, tem, no entanto, sido admitido na generalidade das legislações estrangeiras, e era-o também pelas nossas Ordenações, como um dos fundamentos de despejo imediato.
E, em nota à expressão «generalidades das legislações estrangeiras», cita-se a lei francesa de 13 de Junho de 1933 e a lei espanhola de 18 de Dezembro de 1924.
É realmente assim. Na lei francesa de 1933 permitia-se que o senhorio que pretendesse a casa para habitação própria, seus descendentes ou ascendentes, ou descendentes e ascendentes do seu cônjuge, pudesse requerer o despejo do inquilino.
Não há, contudo, dúvida de que, com a evolução do tempo e das condições da vida social, essa faculdade conduziu, em França, a resultados que não foram bons. Tanto assim que, em 30 de Julho de 1947, foi promulgada uma nova lei muito mais justa e equilibrada. Por esta lei o senhorio que pretenda a casa para si, seus ascendentes ou descendentes ou para seu cônjuge tem de procurar, antes de mais nada, uma outra que satisfaça às necessidades e possibilidades do inquilino e pô-la à disposição deste.
Desde que encontre esta casa, notifica o arrendatário com determinada antecedência em relação ao tempo do arrendamento, a fim de que ele tome conhecimento das condições da nova casa que lhe é proposta e contrate com o respectivo proprietário. O arrendatário aceita ou não. Caso negativo, o senhorio requer ao tribunal a nomeação de um perito, que verifica se a nova casa satisfaz aos requisitos acima apontados, e, desde que seja assim, pode reclamar a entrega da casa para o termo do arrendamento.
Portanto, não é possível a deslocação do arrendatário sem que o senhorio previamente lhe tenha assegurado uma nova casa conforme às suas possibilidades e necessidades.
O que deve entender-se por esta expressão «possibilidades e necessidades do inquilino»?
É evidente que a troca não há-de fazer-se casa contra casa, isto é, habitação com tal número de divisões contra outra de igual volume, mas, sim, em atenção às necessidades do inquilino, isto é, da sua situação social, número de pessoas de família, etc., e, cumulativamente, às suas possibilidades materiais, isto é, da renda que possa pagar.
VV. Ex.ªs ouviram há pouco o Sr. Dr. Pacheco de Amorim desenhar em rápidas palavras o que é a situação da França em matéria de inquilinato, incalculàvelmente mais grave do que a nossa.
Eu acrescentarei que basta folhear os jornais franceses para deparar com as frequentes tragicomédias das invasões das casas de onde acaba de sair um enterro, com as «bichas» de pretendentes, sentados nos degraus da escada, aguardando que saia... o morto para os vivos lutarem pela prioridade do seu direito à casa vaga.
A lição do vizinho serve-me frequentes vezes de guia.
As experiências realizadas num país de gravíssima crise de casas para habitação representam, a meu ver, excelentes elementos de informação para todos nós.
Adaptei e melhorei, consequentemente, as determinações da lei promulgada em 30 de Julho do ano passado pelo Governo Francês, dando-lhe, nas suas linhas gerais, a orientação que passo a resumir:
O proprietário que desejar requerer o despejo com fundamento na necessidade da casa arrendada para nela se instalar, ou um dos seus descendentes ou ascendentes, principiará por descobrir e colocar à disposição do seu inquilino uma outra casa que satisfaça às necessidades e possibilidades deste último. Necessidades, quanto ao número de pessoas de família e situação social; possibilidades, no aspecto de rendimentos, fortuna pessoal, etc.
Notificado para dizer se a casa proposta lhe serve - ou não, o inquilino poderá recusar.
Se o fizer, sem mais perdas de tempo e recorrendo às regras de constituição e funcionamento dos tribunais arbitrais, já reguladas no Código de Processo Civil vigente, arrumar-se-á o diferendo por equidade, numa deliberação tomada por um árbitro representante do senhorio, outro do inquilino e um terceiro de desempate.
Indo porém, neste ponto, muito mais longe do que a lei francesa mencionada, asseguraríamos ao arrendatário o direito a uma indemnização que abrangeria as despesas de mudança e a eventual diferença para mais existente entre a renda que estava pagando e a que iria pagar, calculada com referência a um período de três anos (trinta e seis meses).
VV. Ex.ªs poderão perguntar: mas trinta e seis meses porquê? Qual a justificação de trinta e seis, e não de sessenta ou setenta?
A resposta não é difícil.
Com o ritmo das construções que estão sendo levadas a cabo, a conclusão desse prodigioso esquema dos novos bairros de Alferes Malheiro, as inúmeras construções provenientes da aplicação de fundos das Caixas de Previdência, etc., não é exagero calcular que dentro de dois anos a dois anos e meio a crise da casa de habitação em Lisboa diminuirá grandemente a sua acuidade. E, assim, atrevo-me á mandar para a Mesa a proposta que está concebida nos seguintes termos:

Propomos a substituição da alínea b) do artigo 29.º pelo seguinte:

Necessitar o senhorio da casa para sua habitação ou de seus descendentes em 1.º grau quando se verifiquem simultaneamente os seguintes requisitos:
a) Residir o senhorio ou o seu descendente em casa arrendada;
b) Colocar o senhorio à disposição do inquilino, para por ele poder ser tomada de arrendamento, outra habitação que, pela sua situação, número de divisões e classe, corresponda às suas necessidades e possibilidades;
c) Pagar ao inquilino, a título de indemnização, uma quantia que corresponda às despesas da mudança e à possível diferença entre a renda que aquele pagava e a da nova casa que vai

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habitar, calculada com relação a três anos de arrendamento.
Quando o senhorio pretenda usar deste direito deverá notificar o arrendatário pelo menos noventa dias antes do fim do prazo de arrendamento, indicando o nome e residência do proprietário da habitação proposta, a situação desta, respectiva renda e número de divisões.
O inquilino, quando deseje que se considere não aceite a proposta, terá de contranotificar o senhorio nos cinco dias imediatos à sua notificação.
O diferendo será, então, resolvido por árbitros ex oequo et bono, conforme os artigos 1561.º e seguintes do Código de Processo Civil, para o que o senhorio ou o inquilino poderão usar do direito consignado no artigo 1565.º do Código de Processo Civil dentro do prazo de dez dias, contado da data da contranotificação.
Considerar-se-á que constitui objecto do litígio decidir sobre o requisito constante da precedente alínea a) e fixar a quantia correspondente à indemnização pelas despesas da mudança.
Caberá ao terceiro árbitro determinar e promover os termos do processo, de forma a que a decisão seja proferida dentro do prazo máximo e improrrogável de trinta dias.
Nenhum senhorio poderá usar mais de uma vez a faculdade concedida na presente base.

O Sr. Cerveira Pinto: - V. Ex.ª dá-me licença?

V. Ex.ª fala na sua proposta em possível diferença da renda. Ora eu creio que esta é sempre certa.

O Orador: - Engana-se V. Ex.ª Podem verificar-se três casos distintos: suponha V. Ex.ª um arrendatário que vive, sem família, numa casa pela qual paga de renda 2.000$ e que tem 12 ou 15 divisões. É claro que o senhorio arranja-lhe uma habitação apenas com 4 ou 5 divisões pela qual irá pagar, por exemplo, 1.000$. Neste caso, a nova renda será inferior à antiga e o arrendatário só receberá a importância referente à mudança. Suponhamos agora que as duas rendas - a antiga e a futura - são iguais: o arrendatário só receberá a indemnização resultante da mudança.
Na terceira e última hipótese, isto é, se a renda nova for superior àquela da casa que anteriormente ocupava, multiplica-se a diferença por 36 e soma-se ao produto a despesa com a mudança.
Isto é de um equilíbrio, de uma justiça e de uma atenção pelos interesses de arrendatários e senhorios que me dispenso de outros comentários, mormente depois de haver prometido a mim mesmo falar... em estilo de telegrama.
Apresso-me, por isso, a concluir.
Sr. Presidente: a terceira e última sugestão é no sentido de uma nova alínea à matéria desta proposta, e essa alínea visa exclusivamente, não o inquilino pobre, o inquilino em dificuldades, mas aqueles inquilinos que, pela sua abastança e pela sua facilidade de mobilização de capitais, sem conhecimento dos senhorios modificam a estrutura do prédio e realizam obras que muitas vezes põem em risco a própria segurança do imóvel. A fim de reprimir os abusos que têm sido cometidos, acrescentaria à proposta uma última alínea, que será a d):

2. Que à referida base se adite a seguinte alínea:
d) Ter o arrendatário realizado sem consentimento escrito do senhorio obras que alterem a estrutura do prédio ou que ponham em risco a respectiva segurança.
E, porque não desejo protelar a conclusão da votação desta importante matéria, dou por findas as minhas considerações, esperançado em que merecerão a consideração dos que tiveram a benevolência de me ouvir.
Tenho dito.

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: desejo simplesmente recordar à Assembleia que precisamente sobre os assuntos dos artigos 29.º e 31.º se encontra na Mesa uma proposta minha.

O Sr. Presidente: - A proposta de V. Ex.ª foi lida antes de se iniciar a discussão.

O Orador: - Duas palavras apenas para defender o ponto de vista dessa proposta.
Concordo inteiramente com o direito de o senhorio despejar a casa para a utilizar para si próprio ou para os seus descendentes ou ascendentes. Até, neste último caso, vou mais longe que a própria comissão eventual.
Simplesmente, na minha proposta a indemnização não seria o quíntuplo da renda anual, mas cem vezes a renda mensal se a casa for destinada ao senhorio e cento e vinte vezes se para os ascendentes ou descendentes.
Considero estas indemnizações justas e viáveis, embora bastante superiores às propostas pela comissão eventual. Simultaneamente, eu dava ao inquilino o direito de não sair da casa enquanto não lhe fosse concedida nova habitação em bairro social ou económico, adquirindo o direito de preferência para esse efeito pela entrega antecipada, por conta das rendas, da quantia que houvesse recebido como indemnização. Desta forma protegíamos o inquilino, que, sendo forçado a sair da casa por efeito de o senhorio a desejar, não encontraria facilmente outra nem mesmo com o dinheiro de cinco anos de renda.
Em segundo lugar, por efeito dessa inovação, transformaríamos o inquilino em semiproprietário, porque ele, entregando as rendas e obtendo direito de preferência nos bairros sociais, anteciparia muito o prazo de vinte anos de aquisição da casa. Quanto maior fosse a indemnização recebida do senhorio mais rapidamente ficaria sendo proprietário.
Por outro lado, formaria capital para a construção ou desenvolvimento de bairros sociais ou económicos.
Também, quando se trata de despejos ordenados por efeito de obras de ampliação do prédio, a minha proposta deixa ao inquilino o direito a optar entre três soluções: receber a indemnização de cento e vinte vezes a renda mensal, reocupar o prédio pouco mais ou menos em condições idênticas às previstas pela comissão eventual ou ocupar uma nova casa nos bairros sociais, adquirindo o direito de preferência pela entrega da indemnização, hipótese igual àquela que eu previa para os despejos de casas destinadas a senhorios e seus ascendentes ou descendentes.
Afirma-se, que as indemnizações que proponho são exageradas. Posso afirmar o contrário, por experiência própria.
Também sou senhorio e, se os meus inquilinos quiserem sair pagando-lhes eu cem ou cento e vinte vezes a renda mensal, acho que faço um óptimo negócio.
Não sou utopista, sou um homem de vida prática, que nasceu no nada e se fez por si próprio. Respeito o direito de propriedade, mas não respeito menos o direito de cada qual ter a sua casa.
Sr. Presidente: pelo n.º 4 da minha proposta não ficam esquecidos os arrendatários para habitação despejados por efeito de expropriação ou demolição ordenadas oficialmente. Mas neste caso a indemnização seria apenas de oitenta vezes o valor da renda mensal.
Sei que, no momento actual, por exemplo em relação às expropriações ou demolições que se estão efectuando

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na Mouraria, a Câmara Municipal de Lisboa, e muitíssimo bem, tem facultado moradias nos seus bairros aos inquilinos despejados, e inclusivamente lhes tem transportado as mobílias. É uma obra social muito para louvar. Mas entendo que na maior parte dos casos, porque os desalojados saem de prédios de rendas baixas para irem para prédios de rendas mais altas, se lhes deveria conceder uma indemnização, destinada a facilitar-lhes a aquisição da nova casa.
Esse é o espírito da minha proposta.
Quer dizer: se, por exemplo, a Câmara Municipal de Lisboa lhes pagava por um lado oitenta vezes a renda mensal, por outro recebia imediatamente essa quantia, mas a título ,de antecipação de prestações da compra da nova casa. É indispensável que o bem geral, constituído pelos melhoramentos urbanos, não seja conseguido através de desgraças particulares.
Tenho dito.

O Sr. José Nosolini: - Sr. Presidente: V. Ex.ª definiu que estava em discussão a matéria dos artigos 29.º e 31.º, e, por isso, referindo-me principalmente às alíneas c), d) e e) deste artigo, quero fazer algumas considerações muito breves.
Mas, previamente, desejaria que a comissão eventual me pudesse dar um esclarecimento quanto à seguinte matéria:
A alínea e) diz:
Leu.
Desejava saber, antes de mais nada, quais os dados concretos em que assentou a comissão eventual para fixar esta indemnização num quíntuplo da renda anual no caso de despedimento do arrendatário para efeito de obras em casa de habitação.

O Sr. Presidente: - Era melhor V. Ex.ª concluir as suas considerações e ser depois esclarecido pela comissão eventual.

O Orador: - Mas, se V. Ex.ª me permite, eu considero como terminadas por agora as minhas considerações, visto que para a dedução lógica do que porventura terei dó dizer necessito de obter o esclarecimento pedido.

O Sr. Sá Carneiro: - Se V. Ex.ª, Sr. Presidente, me permite, eu responderei já ao Sr. Dr. José Nosolini.

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª vai dar explicações breves, concedo-lhe a palavra.

O Sr. Sá Carneiro: - Muito breves, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Sá Carneiro: - A comissão eventual fixou a indemnização em cinco vezes a renda anual quando não se trate de arrendamento para comércio, indústria ou profissão liberal, casos em que a mesma indemnização se computa no décuplo da mesma renda, por considerar essa indemnização razoável.
Quando a lei permitia o despejo de estabelecimentos por não convir ao senhorio a continuação do arrendamento, estabelecia que a indemnização pudesse ir até vinte vezes o valor da renda. Se este correspondesse ao rendimento do prédio, a indemnização absorvia o preço da casa, feita a capitalização à taxa de 5 por cento.
Agora fixa-se a indemnização para essas hipóteses em metade e nos restantes arrendamentos num quarto, o que à comissão pareceu bastante, atendendo até a que o arrendatário tem a alternativa de ser indemnizado ou de reocupar a casa, se as dependências que ocupava ficarem em condições de servirem para o fim a que ele queira destinar o prédio. Foi este o nosso critério.

O Sr. José Nosolini: - Sr. Presidente: pelos esclarecimentos dados pelo ilustre Deputado Sr. Dr. Sá Carneiro verifico que realmente o meu raciocínio estava certo quando admiti que o quantitativo de indemnização fora arbitrariamente fixado, e daí que, se em muitos casos a indemnização referida pode até ser excessiva, em muitos outros é absolutamente precária e inútil.
Tratarei agora desta última hipótese.
Nalgumas cidades, e sobretudo no Porto, há grande número de casas humildes, cujas condições são verdadeiramente más. Nessas casas habita gente pobre, cuja dificuldade de mudança pode considerar-se invencível. Se, pois, a obra de renovação do prédio é indiscutivelmente justificável, a situação em que se colocará o arrendatário despedido será de tragédia. Acresce, Sr. Presidente, que estes casos serão inúmeros.
Na verdade, no século passado os nossos maiores resolveram a crise de habitação como nós estamos agora a resolvê-la, simplesmente alterando o sentido da construção. No século passado construía-se em profundidade, utilizando-se muito terreno. As casas eram pequeninas. Fizeram-se assim «as ilhas». Agora o terreno é pequeno e as casas são grandes. Quer dizer: nós fazemos «as ilhas» em altura.
Ora acontece que os arrendatários dessas antigas ilhas pagam rendas insignificantes, rendas de 10$, 20$, 30$ ou 40$ por casas que ocupam um terreno valioso. Assim, uma ilha que tenha dez casas dará ao senhorio a renda mensal - digamos - de 000$, isto é, 6.000$ por ano.
Nestas condições, pondo em andamento a mecânica das alíneas, os dez inquilinos serão irremediavelmente postos na rua, ficando sem tecto que os cubra. Receberão em troca, é certo, uma indemnização de cinco vezes a renda anual, ou seja uns 3.000$ por cada um, mas o senhorio ficará com um amplo terreno disponível, o que representa muito apreciável valor.
Daqui se conclui que, perante as vantagens recebidas pelo senhorio nestas hipóteses, a indemnização é insignificante, o que, aliás, ainda seria admissível, dados os prejuízos de anos de renda barata, se os arrendatários não ficassem sem abrigo.
E este resultado é terrivelmente certo, porque a reocupação do prédio só por milagre será possível, visto que o senhorio, utilizando o terreno, não deixará de construir prédio cuja classe e cuja renda tornem irrealizável a reentrada dos inquilinos desalojados.
Atendendo a estes inconvenientes, tenho a honra de enviar para a Mesa uma proposta de aditamento a estes artigos, nos seguintes termos:

O disposto nas alíneas c), d) e e) não será aplicável aos prédios de habitação cuja renda mensal seja inferior a 50$, excepto quando, tendo-se em conta o atenuamento da crise de habitação, o Governo entender não ser inconveniente a sua aplicação ou quando o senhorio obtiver alojamento ao arrendatário.

Com ela pretendo evitar que, sob o fundamento de se resolver a crise de habitação, se agrave afinal essa crise em relação a famílias pobres, cuja dificuldade de novo alojamento é maior.

O Sr. Cerveira Pinto: - Sr. Presidente: na alínea b) da base com a qual a comissão eventual pretende substituir os artigos 29.º e 31.º do texto da Câmara Corporativa prevê-se que o senhorio pode requerer o despejo para o fim do prazo do arrendamento ou da renovação.

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se necessitar da casa para sua habitação e desde que se verifiquem os seguintes requisitos que na mesma alínea estão expressos:
Leu.
Representa esta alínea uma desalmada violência contra a estabilidade e a segurança do lar do inquilino. Mas há pior ainda: é que, à sombra da disposição que a comissão eventual pretende ver aprovada, pode o senhorio cometer as mais espantosas fraudes, que toda a gente pode prever e que a comissão eventual é absolutamente incapaz de eliminar.
Mas, enfim, a violência e a fraude estavam de certo modo atenuadas com o facto de a comissão eventual ter proposto na alínea e) da base em discussão que o arrendatário despejado nos termos das alíneas anteriores teria direito a uma indemnização correspondente ao quíntuplo da renda anual, actualizada na totalidade, nos termos desta lei, no caso de habitação e correspondente ao décuplo no caso de arrendamento comercial ou industrial.
É pouco, mas é alguma coisa.

O Sr. Presidente: - Devo informar V. Ex.ª de que há na Mesa uma rectificação da comissão eventual que consiste em substituir no segundo período da alínea e) as
palavras «das alíneas anteriores» por «das alíneas c), d) e e)».

O Orador: - Ouvi ler há momentos essa rectificação e é precisamente por isso que pedi a palavra a V. Ex.ª Mas antes de entrar nesse ponto, que constitui o objecto principal da minha fala, quero expor à Câmara alguns exemplos comezinhos, e que indefinidamente se podem multiplicar, de fraudes que, à sombra da famigerada alínea, o senhorio pode cometer em prejuízo do inquilino: o senhorio tem casa própria, onde habita; vende-a simuladamente a um parente, a um familiar ou a pessoa de sua confiança; vai depois requerer o despejo de outra casa, que tinha dado de arrendamento, com o alegado motivo de a desejar habitar. Obtém o despejo e no dia seguinte ou arrenda a casa por maior quantia, ou a vende e regressa à posse do prédio que antes simuladamente vendera.
Outro exemplo: o proprietário de uma casa dada de arrendamento habita por sua vez uma casa arrendada e pela qual paga uma renda antiga.
Subloca-a ou combina com o seu senhorio entregar-lhe a casa, mediante o recebimento de uma alta indemnização, que este apressadamente pagará, visto poder arrendá-la a outro inquilino por um preço de especulação, visto hoje não haver outros preços para as casas que actualmente se arrendam. Vai em seguida requerer o despejo da casa que é sua propriedade, despejo que fatalmente será decretado.
Praticou-se uma imoralidade, perpetrou-se uma pouca vergonha de que foi única vítima o pobre inquilino que se verá com os tarecos no meio da rua, sem saber onde há-de acolher os seus ossos e os da família, por não ter dinheiro para pagar uma renda de especulação, pois que, como já disse e toda a gente o sabe, hoje não há outra espécie de rendas.
Praticou-se uma imoralidade, mas... enfim ela seria adoçada com o recebimento, por parte do inquilino, do quintuplo da renda anual, a título de indemnização, nos termos da alínea e) da base que se discute, proposta pela comissão eventual e assinada pelo Sr. Dr. Mário de Figueiredo e por outros Srs. Deputados.
Acabo, porém, de verificar, com surpresa, mais do que com surpresa, com verdadeiro espanto, que o Sr. Deputado Mário de Figueiredo havia reconsiderado na proposta que anteriormente fizera e resolvera rectiflcá-la; resultando dessa rectificação, que o inquilino for despejado por motivo de o senhorio pretender a casa para sua habitação irá para o meio da rua, sem receber um centavo de indemnização. É isto justo, é isto humano, é isto decente? Decididamente, não é.

A proposta do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, em nome da comissão eventual, com a qual se pretende rectificar a anteriormente apresentada por aquele ilustre Deputado, e que traduz o pensamento da mesma comissão, é injustíssima e injustificável.
E injustíssima e injustificável por retirar a indemnização ao inquilino e por nem sequer lhe dar um prazo razoável para desocupar a casa. Mas isto não quer, evidentemente, dizer que com a indemnização prevista na anterior proposta a obra fique perfeita. Muito longe disso, porque, como já demonstrei, votar essa proposta seria nem mais nem menos que votar a fraude arvorada em sistema.
Ora para evitar a fraude é que tenho a honra de juntamente com outros Srs. Deputados, apresentar a seguinte proposta:

Propomos o seguinte aditamento à alínea b) da base da comissão eventual proposta para substituir os artigos 29.º e 31.º

b) Necessitar o senhorio da casa para sua habitação quando se verifiquem à data da publicação desta lei simultaneamente os seguintes requisitos:

Dava-se desta forma satisfação ao senhorio que não tivesse de facto casa própria ou arrendada há mais de um ano e que tivesse verdadeira, notem VV. Ex.ªs bem, verdadeira necessidade de despejar o inquilino para ir habitar na casa dada de arrendamento; mas evitar-se-ia que de futuro se pratiquem as mais extraordinárias fraudes.
Dar-se-ia com a minha proposta satisfação às pretensões sérias dos senhorios, mas colocava-se um dique aos seus propósitos desonestos.
Em resumo: com a minha proposta todos os senhorios que actualmente não tenham habitação poderão reclama-la aos seus inquilinos. Não se permitirá, porém, que para o futuro eles se coloquem artificial e fraudulentamente nas condições previstas na alínea b) da base proposta pela comissão eventual para conseguirem despejar os seus inquilinos.
Não representará a minha proposta a perfeição ? Absolutamente de acordo. Mas que ela é mil vezes mais perfeita e mil vezes mais justa do que a da comissão eventual isso é manifesto.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?
V. Ex.ª admitiria a redacção da comissão nos termos em que se acha feita se se aditasse - mas sem referência ao estado de necessidade no momento da publicação desta lei - uma disposição que atribuísse ao arrendatário nessa hipótese uma indemnização a. calcular, mesmo que não fosse a que está aqui...

O Orador: - Não; a indemnização, embora dó alguma justiça ao inquilino e atenue as fraudes que infalivelmente se praticarão à sombra da proposta de V. Ex.ª, não chega. O que é necessário é evitar essas fraudes. Ora a minha proposta, se não tiver o condão de as eliminar completamente, terá pelo menos o mérito de as reduzir a bem insignificante número.
De resto, a minha proposta tem tradição no nosso Direito.
O artigo 6.º da lei n.º 1:662 permitiu às Misericórdias, asilos, hospitais e outros institutos, de beneficência

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despejar os prédios de que tivessem necessidade para o alargamento das suas instalações, mas restringiu esses despejos aos arrendamentos existentes na data da publicação da lei. Não permitiu que os institutos de beneficência pudessem requerer o despejo de prédios que arrendassem posteriormente à publicação da lei. Ora é precisamente este princípio que desejo ver consignado na alínea b) da base em discussão.

O Sr. Sá Carneiro: - Mas isso foi para se evitar o caso de doações de particulares às entidades aí referidas para conseguirem o despejo dos inquilinos.

O Orador: - Exactissimamente. A lei n.º 1:662 quis evitar a fraude. Pois é isso precisamente que eu desejo que aconteça com a nova lei do inquilinato que estamos a gizar à pressa.
Agradeço muito a ajuda que, com o seu aparte, V. Ex.ª deu à defesa da minha tese, embora a intenção de V. Ex.ª não fosse ajudar-me, mas sim contrariar-me.

O Sr. Sá Carneiro: - O Sr. Deputado Cerveira Pinto queixa-se de se ter restringido a alínea e), eliminando dela a referência à alínea e); mas aquela alínea prevê a reocupação. E, no caso da alínea b), pretende-se o despejo. Era, pois, evidente que não podia facultar-se a reocupação ao arrendatário despejado.

O Orador: - Nos termos desta proposta o inquilino despejado não receberá uma indemnização.

O Sr. Sá Carneiro: - Podo receber alguma coisa.

O Orador: - Como?

O Sr. Sá Carneiro: - Há uma proposta nesse sentido.

O Orador: - Não conheço essa proposta, porque ainda a não ouvi ler. Mas é simplesmente extraordinário que, contrariando essa proposta a da comissão eventual, que por V. Ex.ª também foi assinada, e segundo a qual o inquilino despejado por motivo de o senhorio necessitar da casa para ir para lá morar não receberá qualquer indemnização, venha V. Ex.ª agora defender a proposta da comissão com o argumento de que há outra em que essa indemnização é estabelecida.
Rica defesa, não há dúvida.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Sim, senhor.

O Sr. Mário de Figueiredo: - É só para observar o seguinte: a correcção que se fez restringindo na alínea e) a sua aplicação às alíneas tal e tal é uma correcção pura e simples, originada no facto de para a Imprensa se ter mandado mal aquilo que se mandou; e isso denuncia-o a própria redacção da alínea e), na qual se estabelece indemnização ou reocupação como alternativa, de onde imediatamente se conclui que não pode ser aplicada à disposição da alínea b), onde o problema da reocupação não pode razoavelmente pôr-se.
Esclarecido isto, é a comissão agora tocada por uma hipótese, que é esta: deve ao inquilino que é despejado em consequência da necessidade de o proprietário ocupar o prédio atribuir-se uma indemnização ou não?
Posta a questão neste pé, suponho poder afirmar - apesar de a comissão não posto o problema - que a sugestão é realmente de considerar. E sendo de considerar a possibilidade de uma indemnização, a única dúvida que ao meu espírito, e necessariamente ao dos membros da comissão, ocorre é se essa indemnização deve ser igual à que se prevê em alternativa ou deve ser outra menor.

O Orador: - Mas V. Ex.ª com a sua proposta da última hora corta cerce toda e qualquer indemnização.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Realmente a indemnização menor compreende-se.
A razão dessa disposição, que deve ser das mais fecundas desta proposta, é esta: poder fazer-se, sem prejuízo grave para os inquilinos, a transformação de bairros e de cidades através do aumento da construção, que pode realmente valorizar enormemente o terreno, aproveitando-se a altura. Se a fórmula é possível, decerto que a empresa que se abalança à transformação pode pagar cinco vezes ou dez vezes.
Mas com o proprietário que precisa do seu prédio as coisas não se passam nos mesmos termos, porque ele pode não estar nas condições das tais empresas para dar uma indemnização igual.
Se é razoável uma indemnização, não me parece no entanto razoável que a indemnização seja igual à que se prevê para a outra hipótese.

O Orador: - Felicito-me por ter usado da palavra, porque isso deu origem a que o Sr. Deputado Mário de Figueiredo reconsiderasse e viesse confessar que era justa a indemnização.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Não o faço pessoalmente, mas só na medida em que for apoiado pela confiança da comissão eventual.

O Orador: - Ainda melhor: felicito-me duas vezes, por não só V. Exa, mas também a comissão eventual, terem reconhecido que se devia dar uma indemnização ao inquilino despejado por motivo de o senhorio necessitar da casa para sua habitação.
No entanto, eu insisto: esta alínea, mesmo com indemnização para o inquilino, vai dar lugar às maiores fraudes e será profundamente lamentável que as fraudes se conheçam e se votem.
Este inconveniente só poderá ser minorado com a adopção da minha proposta de aditamento.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: pedi a palavra simplesmente para dizer que de tudo o que tenho ouvido e tem aparecido aqui a propósito de despejo de inquilinos é a proposta do Sr. Deputado Bustorff da Silva a que me agrada mais.
Porquê? Porque é a única que atende à circunstância de o inquilino ter uma casa para onde se mudar, o que me parece ser fundamental nesta questão.
Eu vou contar a VV. Ex.ªs o que se deu em Coimbra há poucos anos. Na casa onde viveu e faleceu o saudoso Dr. Calisto havia umas barracas de madeira onde vivia uma dúzia, pouco mais ou menos, de famílias, contando ao todo sessenta e tal pessoas. Toda essa gente foi despejada pela policia em pleno mês de Dezembro, que, por sinal, foi um dos mais frios que tenho conhecido, e estiveram três dias e três noites ao relento, velhos, mulheres e crianças, sustentados pela caridade dos vizinhos, pois não tinham sequer onde fazer a comida.
Qual o pretexto do despejo? Ouvi dizer que a necessidade de obras!... Ora a verdade é que uma só obra se impunha - a demolição; e foi o que fez o senhorio. est modus in rebus. Não há o direito de, em pleno

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e rigoroso inverno, atirar para a rua com uma dúzia de famílias, onde estiveram três dias e três noites.
E digo, em abono da verdade, que ali estariam mais tempo se não fosse a caridade do Sr. presidente da Câmara, única autoridade que se preocupou com aquela desgraçada gente.
Ora, meus senhores, não vamos agravar o que já está, de modo que estas cenas se tornem o pão nosso de cada dia.

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença?
Era para esclarecer que a minha proposta prevê exactamente esse caso.
Ninguém pode ser despejado por qualquer desses motivos sem que tenha casa. Mas, além de nova casa, receberá indemnização determinada, conforme os casos.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: embora não tenha assinado a proposta da base em discussão, a verdade é que ela traduz o pensamento da comissão eventual, a que pertenço.
Todavia, a discussão que se tem desenrolado a propósito das casas arrendadas a pessoas que se ausentam do Pais por motivo de serviço oficial, militar ou civil, fez surgir novo aspecto digno de ponderação.
Quero referir-me a outras classes de pessoas que frequentemente se encontram nas mesmas condições, por motivo de serviços particulares, e nomeadamente os que prestem por conta de outrem.
Ausentam-se por períodos forçadamente longos no exercício de actividades de que os incumbem e a que não podem esquivar-se.
A situação é igual; e, consequentemente, igual deve ser o direito.
Por isto, entendo que na alínea em discussão devem ser incluídos os que se ausentarem em serviço por conta de outrem.

O Sr. José Nosolini: - Eu admito, em princípio, a justiça das considerações de V. Ex.ª Simplesmente faço esta pergunta: como evitar a fraude? A comissão oficial está marcada; nitidamente se conhece, e no caso a que V. Ex.ª se refere não sucede assim. Daí pode porvir, por vezes, a fraude.

O Orador: - A fraude pode evitarão mediante a declaração escrita do patrão ou do director da casa ou empresa onde o inquilino presta serviço, sob pena de falsas declarações, se ocultarem a verdade.
Sobre o n.º 2 da base, há uma proposta de aditamento apresentada por vários Srs. Deputados, que eu também assinei.
A comissão eventual, nas restrições ao direito conferido ao arrendatário para ir ocupar prédio seu, contemplou a circunstância de ele já viver em casa sua situada em localidade pouco afastada. E assim propôs que se negue aquele direito aos que vivam em casa própria dentro do perímetro das comarcas.
Mas, como se dá a circunstância de quer em relação a Lisboa quer em relação ao Porto, haver terras muito próximas que pertencem a outras comarcas - como sucede a Sintra, Almada, Vila Franca de Xira, Granja, Espinho, etc. -, onde vivem permanentemente e em casa sua pessoas que, por esse facto, não deixam de exercer em Lisboa e Porto a sua actividade normal, foram incluídas na excepção as comarcas limítrofes.
Simplesmente, como justificadamente fez notar o ilustre Deputado Sr. Mira G ai vão, em muitas comarcas e mesmo concelhos e freguesias, sobretudo no Alentejo, há povoações que ficam a algumas dezenas de quilómetros das sedes e sem facilidades de transportes; e isto não permite aos que vivem em casa própria naquelas povoações
deslocar-se diariamente para a cidade ou vila onde exercem a sua actividade.
É este o fundamento da proposta de substituição que mandamos para a Mesa.
Tenho dito.

O Sr. Carlos Borges: - Sr. Presidente: serei o mais rápido possível.
De uma maneira geral, concordo com a proposta da comissão eventual, salvo a questão do tempo do prazo do n.º 2, alínea a); concordo com a indicação do Sr. Dr. Braga da Cruz relativa ao título de aquisição da propriedade, porque no n.º 1 diz-se:
Leu.
Quer-me, porém, parecer que o aditamento não acautela os inquilinos contra as possibilidades de fraude, uma vez que é fácil dissimular um contrato de compra e venda com a doação puta e simples, isto é, com uma transmissão a título gratuito.
Para evitar fraudes deveria apenas exceptuar-se o caso de sucessão legítima e de o senhorio falecido haver estado no domínio do prédio durante mais de cinco anos.
Na parte final da proposta da comissão que estamos apreciando diz-se:

Na petição inicial da acção de despejo, que será acompanhada do respectivo projecto, devidamente aprovado, o senhorio tomará o compromisso de iniciar as obras no prazo de três meses e concluí-las no de doze, a contar da efectivação do despejo, salvo caso de força maior.
Está bem. Agora pergunto: e se o senhorio faltar ao compromisso? Se tomar o compromisso de fazer obras e nem sequer as iniciar e a sua atitude for propositada? O senhorio despeja o prédio e não faz as obras. Que se lhe faz? Eu só ponho o problema; não lhe indico solução nem remédio; limito-me a pedir à comissão que o resolva. Mais uma vez: qual é a responsabilidade que pode exigir-se ao senhorio que, usando de má fé, por meio da faculdade que lhe confere este artigo, toma um compromisso e não o cumpre?
E aqui termino as minhas considerações.
Tenho dito.

O Sr. Sá Carneiro: - Vou referir-me, em primeiro lugar, ao caso da alínea a):
O Sr. Deputado Bustorff da Silva tem, de certo modo, razão em querer aclarar aquilo que a mim, aliás, me parece evidente.
Este fundamento de o arrendatário não ter residência permanente no prédio pressupõe que não houve encerramento por mais de um ano. Por isso nas propostas anteriores do Governo e no segundo parecer da Câmara Corporativa estava deslocada a excepção, visto que não se aplicava ao caso de poder haver encerramento do prédio, mas sim residência intermitente, em que não houvesse desocupação por mais de um ano.
Todavia, desde que se consente o encerramento por mais de um ano, em casos excepcionais, convém esclarecer bem até que ponto é derrogado o artigo 5.º, § 9.º, da lei n.º 1:662.
Quanto à alínea b), trata-se do preceito do projecto - aliás muito restringido e suavizado - que levantou mais protestos.
Ainda há minutos recebi mais uma carta anónima, pretensamente escrita por oficiais da guarnição do Porto filiados no MUD.
Ora eu não creio que algum oficial do exército português, mesmo filiado no MUD, escreva cartas anónimas.
A Câmara Corporativa perfilhou este fundamento, embora estabelecendo a sanção do n.º 2 do artigo 30.º

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E na proposta do Governo nada aparece a esse respeito, o que significa que o Governo é contra a inovação; mas a Câmara Corporativa, no primeiro parecer, entende...

O Sr. Bustorff da Silva: - E muito bem...

O Orador: - ... que é da essência do direito de propriedade que o dono de uma casa que não tem, na localidade ou vizinhanças, onde habitar possa ir ocupá-la.
Assim pensou também a comissão eventual, embora procurasse evitar fraudes...

O Sr. Botelho Moniz: - Todas?

O Orador: - Todas aquelas que nos ocorreram.
Limitámos muito, mesmo muito, o exercício desse direito.
Pôr-lhe mais entraves equivaleria a estabelecer uma disposição meramente platónica, que jamais poderia aplicar-se.
Pelo que toca à eliminação do prazo de dois anos, à comissão é indiferente a proposta do Sr. Dr. Bustorff da Silva ou a do Sr. Botelho Moniz. À nossa solução era a mais vantajosa para os funcionários que o texto do Governo ou o do segundo parecer.
O Sr. Botelho Moniz: - É mais vantajosa em relação à proposta do Governo.

O Sr. Bustorff da Silva: - Ah! Não! Desculpe V. Ex.ª

O Orador: - V. Ex.ª, Sr. Presidente, podia mandar ler a proposta?
Foi lida.

O Orador: - Eu estava na ideia de .que a proposta do Sr. Dr. Bustorff da Silva não abrangia esses casos; desde que os abrange, a minha observação desaparece.
Voltemos agora à alínea b).
A estabelecer-se, como está no espírito da proposta, que só pode usar dessa faculdade uma única vez, não vejo inconveniente em que se faculte este direito aos comproprietários, quando o exerçam em conjunto. O que se quis evitar foi que cada comproprietário pudesse usar desse direito separadamente.
Nós pensámos na hipótese da sucessão e, quanto a herdeiros legitimários, concebe-se que não se exija prazo algum, desde que o autor da herança fosse dono do prédio há cinco anos. No entanto, há situações como esta: conheço uma família com catorze filhos que vai fazer partilhas dentro de dias. Ora, se cada um dos herdeiros quisesse uma casa, isso significaria que catorze arrendatários podiam ser despedidos.

O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença?
Não seria preferível alargar um pouco mais o assunto como eu fazia, traduzindo isso em dinheiro econòmicamente falando?
Este processo é muito mais amplo e, sob ponto de vista económico, é perfeitamente admissível. No actual regime, apesar de não poder obrigar nenhum inquilino a sair da sua casa, realizei alguns entendimentos.
Seja para o caso de obras, seja paca o caso do inquilino entrar para o prédio, reparem VV. Ex.ªs que a simples desocupação de um andar duplica o valor de todo o prédio; de maneira que o senhorio continua a fazer muito bom negócio pagando cento e vinte vezes a renda.

Uma voz:-Isso não se dá nos prédios hipotecados.

O Sr. Botelho Moniz: - Dá-se, sim senhor; e sob. o ponto de vista económico VV. Ex.ªs não me ensinam. Podem ensinar-me sob o ponto de vista jurídico, mas, sob o ponto de vista económico, repito, é que não me ensinam, porque eu lido diariamente com estes casos.

O Orador: - Não será imodéstia de V. Ex.ª?

O Sr. Botelho Moniz: - Não é imodéstia, é verdade, e com a afirmação que fiz respondo àqueles que me disseram que eu- não podia ensiná-los sob o ponto de vista jurídico.

O Orador: - Não ouvi que alguém dissesse isso. E, pelo que vejo, V. Ex.ª até mestre de Direito quer ser.
Quanto a indemnizar-se o arrendatário, a comissão não vê inconveniência em que se conceda indemnização.
Finalmente, a comissão estabeleceu um critério de escolha, quando, o senhorio tenha várias casas, para evitar que ele pudesse extorquir indemnizações aos diversos arrendatários para não requerer o despejo deles.
O Sr. Dr. Bustorff da Silva citou o exemplo da lei francesa.
Ora, no artigo 55.º do decreto n.º 15:289, que apenas está suspenso, temos o mesmo princípio.

ão precisamos, assim, de citar o que na lei gálica se preceitua.

O Sr. Bustorff da Silva: - Isso é tão diferente como o dia da noite.

O Orador: - Se V. Ex.ª se der ao trabalho de ler aquele artigo, verificará que está enganado.
O Governo entendeu que esse preceito não era praticável e por isso jamais o regulamentou. Pelos motivos expostos, a comissão não pode aceitar a proposta do Sr. Dr. Bustorff da Silva.
Com relação à proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz, sinto também que a comissão não possa concordar com ela senão relativamente à indemnização.
Quanto a descendentes e a ascendentes, há, sem dúvida, um fundo moral no critério apresentado, mas ele pode dar lugar a situações abusivas.
A comissão aceita, como disse, o principio de indemnização.
Quanto a expropriações, já a Assembleia votou sobre o assunto uma base da Câmara Corporativa.

O Sr. Botelho Moniz: - Quanto a expropriações há apenas um número. Não vale a pena, sequer, pôr a hipótese...

O Orador: - Isto era apenas para esclarecer. É a base XXVI-B.
A proposta do Sr. Deputado José Nosolini tem uma intenção humanitária: evitar o despejo de gente pobre. S. Ex.ª pretende que não se apliquem as alíneas c) e d) no caso de rendas de 50$ por mês.
As considerações do ilustre Deputado deram-me a impressão de que S. Ex.ª achava excessivas as indemnizações de cinco e de dez anos, consoante se tratasse de habitação ou comércio, mas creio que afinal acaba por achá-las diminutas.
Se o arrendatário paga pouco, não deveria obter uma indemnização que exceda os cinco anos.
Todavia, se a Assembleia entender que é de atender a miséria dos arrendatários que paguem menos de mensais, a comissão não vê inconveniente em que se lhes aplique o regime do comércio, indústria ou profissão liberal, mas sem direito a reocupação; e a indemnização apenas seria dada quando o senhorio não obtivesse outra casa para o arrendatário.
Tenho dito.

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O Sr. José Nosolini: - Sr. Presidente: o Sr. Deputado Sá Carneiro assenta num pressuposto que não é absolutamente certo. Não foram motivos de ordem humanitária que determinaram a minha proposta de aditamento. Podiam sê-lo, mas, na verdade, foram apenas aquelas razões que informam a maior parte das disposições desta proposta de lei quando procuram evitar que se efectue o despejo.
Que os chefes de família tenham ou não tenham habitação é um problema de carácter social que as indemnizações por vezes não resolvem. E se, em relação aos que têm mais facilidades económicas, a indemnização constitui auxiliar apreciável para a solução daquele problema, em relação aos pobres - digamos, aos habitantes das «ilhas» - a indemnização não serve em igual medida.
E nem se diga que da aprovação da minha proposta resultará a impossibilidade de destruição desses terríveis pardieiros e até da modificação dos prédios mesquinhos que existem ainda nas áreas centrais das principais cidades.
Na verdade, a minha proposta não só não exclui que o Estado promova a construção rápida de casas destinadas a gente pobre, como até constitui incitamento a essa construção, porque fiz depender do atenuamento da crise de habitação a aplicação das disposições das alíneas.
Além disso o problema das casas pequenas espalhadas pelas cidades é diferente do das «ilhas», até porque o número de inquilinos atingidos é muito menor em cada caso e porque para a elevação desses prédios haja, nesta proposta de lei, disposições próprias que a Assembleia aprovou na parte que respeita a expropriações.
Demais, veja-se esta outra diferença: enquanto relativamente ao despejo das «ilhas» e pequenos casebres dos pobres funcionará o preceito das alíneas em plena força, em consequência da ânsia do senhorio de se libertar do arrendatário e de readquirir por baixo preço o direito de utilização de um bom terreno, relativamente aos prédios a modificar por motivos de ordem estética funcionará o regime das expropriações, sem dúvida mais lento, porque os trabalhos de urbanização não se realizam em cada cidade abrangendo-a simultaneamente em todas as suas zonas.
Pelas considerações que produzo entendo que é de manter a minha proposta e que o objectivo da lei de modificação de quaisquer prédios deve ser realizado através de disposições aplicáveis à expropriação.
Antes de terminar devo à Assembleia o esclarecimento seguinte:
Porque a proposta, obedecendo ao nosso Regimento, tinha de ser assinada por cinco senhores Deputados e porque eu não tive ensejo, ao falar pela primeira vez, de ouvir o Sr. comandante Quelhas Lima, o Sr. coronel Linhares de Lima e outros Srs. Deputados que também a assinaram, só depois pude completá-la e só agora posso dar conhecimento à Assembleia de que à parte final foram acrescentadas as palavras seguintes: «ou quando o senhorio obtiver alojamento para o arrendatário».
Desta sorte o despejo dos prédios de renda inferior a 50$ para efeito de novas construções ou adaptações só será possível quando o Governo entender que a crise de habitação se atenuou ou quando o senhorio obtiver alojamento para o arrendatário.
Disse.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: o Sr. Deputado Cerveira Pinto propõe que se restrinja a faculdade de despejo para habitação dos próprios donos aos que o sejam na data da lei.
A comissão não pode dar o seu apoio a essa proposta. O caso não tem semelhança com o regulado no artigo 6.º da lei n.º 1:662.
Houve aí o intuito de evitar que as entidades a quem fosse concedida essa regalia recebessem, por doação ou venda, o prédio, para o efeito de se conseguir o despejo.
Tratava-se não só de Misericórdias, como de associações de socorros mútuos, asilos e outras entidades que, possivelmente, seriam levadas a colaborar em combinações menos lícitas.
O caso em debate é muito diverso.
De duas uma: ou se considera justo que o dono de um prédio que há mais de um ano não vive na localidade ou nas vizinhanças em casa própria ou arrendada possa ir ocupar a casa adequada às suas condições de vida e família, ou se repele o princípio.
No primeiro caso não deve limitar-se o beneficio aos actuais proprietários nas condições da proposta e, antes, devem atingir-se os que de futuro venham a satisfazer esses requisitos.
No segundo caso tal vantagem deve ser rejeitada in limine.
O mais que poderia conceder-se - à semelhança do votado quanto a aumento de renda de prédios sublocados - era que nos contratos futuros apenas fosse lícito exercer este direito ao senhorio que expressamente o reservasse.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão por alguns minutos.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 20 horas.

O Sr. Presidente: - Vão ler-se as propostas de alteração chegadas à Mesa.

Foram lidas. São as seguintes:

Propomos que o n.º 2 da alínea a) do artigo 29.º tenha a seguinte redacção:

2. Se o arrendatário se ausentar por tempo não superior a dois anos, em cumprimento de deveres militares ou no exercício de outras funções públicas, ou de serviço particular por conta de outrem; e por tempo determinado se a ausência for motivada por comissão de serviço público civil ou militar.

Sala das Sessões, 30 de Abril de 1948. - Os Deputados: Mário de Figueiredo, João Antunes Guimarães, França Vigon, João Cerveira Pinto, José Gualberto de Sá Carneiro, José Nosolini, José Soares da Fonseca, José Maria Braga da Cruz, Manuel Hermenegildo Lourinho, João Garcia Nunes Menxia.

Propomos a eliminação da alínea b) da base de substituição dos artigos 29.º e 31.º

Os Deputados: Diogo Pacheco de Amorim, João Cerveira Pinto, José Maria de Sacadura Botte, Ribeiro Cazaes, António Cortês Lobão, João Ameal, Alberto Cruz, Luís de Carvalho Viegas, Henrique Galvão»

Propomos O seguinte aditamento à alínea b) da base da comissão eventual, proposta que substitui os artigos 29.º e 31.º

b) Necessitar o senhorio da casa para sua habitação, quando se verifiquem à data da publi-

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cação desta lei, simultaneamente, os seguintes requisitos:

Os Deputados: João Cerveira Pinto, João Ameal, Joaquim Quelhas Lima, José Maria de Sacadura Botte, Ricardo Durão.

Propomos a seguinte redacção para o n.º 1 da alínea b) da base que substitui os artigos 29.º a 31.º:

Ser o senhorio proprietário ou usufrutuário há mais de cinco anos, ou, independentemente de qualquer prazo, se tiver adquirido a casa por sucessão.

Acréscimo ao n.º 2:

O senhorio terá de pagar ao arrendatário indemnização correspondente a dois anos e meio da renda na data do despejo.

Novo:

3. O senhorio não poderá usar da faculdade que lhe confere esta alínea senão uma vez.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, José Nosolini, Manuel Ribeiro Ferreira, Manuel Múrias, António de Sousa Madeira Pinto.

2.º período da alínea e):

O arrendatário despejado nos termos das alíneas c), d) e e) terá direito a uma indemnização correspondente ao quíntuplo da renda anual que estiver a ser paga e ao décuplo quando se trate de arrendamento para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal, ou para habitação por renda inferior a 50$ mensais; neste caso quando o senhorio não arranje para o arrendatário habitação correspondente à que ocupava.

Acréscimo à alínea e):

O senhorio que não inicie as obras no dito prazo é obrigado a facultar ao arrendatário a reocupação do prédio, sem restituição da indemnização; se não as concluir no prazo de doze meses, terá de pagar ao arrendatário 10 por cento da indemnização já satisfeita por cada período de um ano que demore a conclusão das obras.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, Francisco de Melo Machado, Manuel Múrias, António de Sousa Madeira Pinto, Manuel Ribeiro Ferreira, José Gualberto de Sá Carneiro.

Em substituição do artigo 30.º, n.º 1:

1. O aviso a que se refere o artigo 970.º do Código de Processo Civil tem de ser feito com a antecedência mínima de seis meses; mas, se faltar menos tempo para a renovação, esta não se dará e o arrendatário terá de despejar o prédio naquele prazo, a contar da notificação.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, França Vigon, Manuel Ribeiro Ferreira, José Nosolini, João Antunes Guimarães.

Quanto ao artigo 29.º propomos:

1.º Que à respectiva alínea a) se aditem as seguintes palavras: a ou ter conservado mais de um ano consecutivamente desabitada a dita casas.
2.º Que à referida base se adite a seguinte alínea:
d) Ter o arrendatário realizado sem consentimento escrito do senhorio obras que alterem a estrutura do prédio ou que ponham em risco a respectiva segurança.

Os Deputados: António Júdice Bustorff da Silva, José Maria Braga da Cruz, Manuel Magalhães Pessoa, Rui de Andrade, Manuel Colares Pereira.

Propomos o aditamento seguinte aos artigos 29.º e 31.º:

O disposto nas alíneas c), d) e e) não será aplicável aos prédios de habitação cuja renda mensal seja inferior a 50$, excepto quando, tendo-se em conta o atenuamento da crise de habitação, o Governo entender não ser inconveniente a sua aplicação, ou quando o senhorio obtiver alojamento ao arrendatário.
Os Deputados: José Nosolini, Luís Cincinato Cabral da Costa, Ricardo Malhou Durão, Albano de Magalhães, Joaquim Quelhas Lima, Henrique Linhares de Lima.

Artigo 29.º:

2. Não ter na área das comarcas de Lisboa e Porto e suas limítrofes ou na própria localidade no resto do País casa própria ou arrendada há mais de um ano.
Os Deputados: José Martins de Mira Galvão, Paulo Cancela de Abreu, Francisco de Melo Machado, José Maria Braga da Cruz, Albano de Magalhães, Mário de Figueiredo.

Propomos a substituição da alínea b) do artigo 29.º pelo seguinte:

Necessitar o senhorio da casa para sua habitação ou de seus descendentes em 1.º grau, quando se verifiquem simultaneamente os seguintes requisitos:

a) Residir o senhorio ou o seu descendente em casa arrendada;
b) Colocar o senhorio à disposição do inquilino, para por ele poder ser tomada de arrendamento, outra habitação que, pela sua situação, número de divisões e classe, corresponda às suas necessidades e possibilidades;
c) Pagar ao inquilino, a título de indemnização, uma quantia que corresponda às despesas da mudança e à possível diferença entre a renda que aquele pagava e a da nova casa que vai habitar, calculada com relação a três anos de arrendamento.
Quando o senhorio pretenda usar deste direito deverá notificar o arrendatário pelo menos noventa dias antes do fim do prazo de arrendamento, indicando o nome e residência do proprietário da habitação proposta, a situação desta, respectiva renda e número de divisões.
O inquilino, quando deseje que se considere não aceite a proposta, terá de contranotificar o senhorio nos cinco dias imediatos à sua notificação.
O diferendo será, então, resolvido por árbitros, ex oequo et bono, conforme os artigos 1561.º e seguintes do Código de Processo Civil, para o que o senhorio ou o inquilino poderão usar do direito consignado no artigo 1565.º do Código de Processo Civil dentro do prazo de dez dias, coutado da data da contranotificação.

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694 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 157

Considerar-se-á que constitui objecto do litígio decidir sobre o requisito constante da precedente alínea a) e fixar a quantia correspondente à indemnização pelas despesas da mudança.
Caberá ao terceiro árbitro determinar e promover os termos do processo, de forma a que a decisão seja proferida dentro do prazo máximo e improrrogável de trinta dias.
Nenhum senhorio poderá usar mais de uma vez a faculdade concedida na presente base.

Os Deputados: Manuel de Magalhães Pessoa, Rui de Andrade, Mário de Aguiar, Manuel Colares Pereira, Camarote de Campos, António Júdice Bustorff da Silva.

O Sr. Bustorff da Silva: - V. Ex.ª, Sr. Presidente, dá-me licença?
Para não estar a cansar mais a atenção da Câmara, peço a V. Ex.ª o favor de consultar a Assembleia sobre se autoriza a retirada dessa minha proposta.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Bustorff da Silva deseja, como VV. Ex.ªs ouviram, retirar esta sua última proposta.
Vou consultar a Câmara sobre se concede essa autorização.
Submetida à votação, foi autorizada a retirada da proposta.

O Sr. Presidente: - Vai continuar-se a fazer a leitura das propostas de alteração que foram apresentadas.
Vai ler-se agora uma proposta do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu e outros.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos que o n.º 1 da alínea a) do artigo 29.º tenha a seguinte redacção:

1. Se o arrendatário se ausentar no cumprimento de deveres militares ou em comissão de serviço público, ou em cumprimento de funções públicas ou de conta de outrem, mas nos três últimos casos por tempo determinado.

Sala das Sessões, 30 de Abril de 1948. - Os Deputados: Paulo Cancela de Abreu, Manuel Murtas, Francisco de Melo Machado, Frederico Bagorro de Sequeira, Alberto Cruz.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: com vénia dos meus colegas que assinaram essa proposta, peço a V. Ex.ª se digne consultar a Assembleia sobre se permite que ela seja retirada, visto que a sua matéria foi posteriormente incluída noutra enviada para a Mesa.

Consultada a Assembleia, foi concedida a autorização

O Sr. Presidente: - Vai ler-se agora a proposta do Sr. Dr. Antunes Guimarães sobre o n.º 1 do artigo 29.º

Foi lida. É a seguinte:

NOVA BASE

Artigo 29.º:
c) ....

1. Ser o senhorio o único proprietário ou usufrutuário,, devendo sê-lo há mais de cinco anos se o for por titulo oneroso.

Os Deputados: Luís da Cunha Gonçalves, João Antunes Guimarães, José Maria Braga da Cruz, Albano de Magalhães, José Martins de Mira Galvão.

O Sr. Antunes Guimarães: - Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de consultar a Assembleia se autoriza que eu retire esta proposta.
Consultada a Assembleia, foi autorizado o Sr. Deputado Antunes Guimarães a retirar a sua proposta.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se uma proposta de alínea nova da autoria do Sr. Deputado Manuel Lourinho.
Foi lida. É a seguinte:

BASE XLIII

(Alínea nova)

d) Vivendo o senhorio em prédio arrendado e necessitando de casa para sua habitação.
O senhorio que usar desta faculdade, o que poderá fazer apenas por uma só vez, e dê o prédio de arrendamento nos cinco anos posteriores ao uso da referida faculdade será multado no equivalente ao rendimento colectável ilíquido correspondente aos três últimos anos, além das penalidades que lhe possam caber por se encontrar incurso no disposto na base XLII, salvo se o arrendamento for feito ao antigo inquilino à data do despejo do prédio.

Assembleia Nacional, 16 de Abril de 1948. - O Deputado Manuel Hermenegildo Lourinho.

O Sr. Manuel Lourinho: - Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, o favor de consultar a Assembleia sobre se permite que eu retire essa minha proposta.

Consultada a Assembleia, foi autorizada a retirada da proposta.

O Sr. Presidente: - Vai ler-se agora uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Cunha Gonçalves.

Foi lida. É a seguinte:

Proponho que na base XLIII da Câmara Corporativa se acrescente:

a) Carecer da casa o senhorio para a sua própria habitação.

O Deputado Luís da Cunha Gonçalves.

O Sr. Cunha Gonçalves: - Sr. Presidente: solicito de V. Ex.ª o favor de consultar a Assembleia sobre se autoriza a retirada dessa proposta.

Consultada a Assembleia, foi autorizado o Sr. Deputado Cunha Gonçalves a retirar a sua proposta.

O Sr. Presidente: - Não se encontra mais ninguém inscrito sobre a matéria do artigo em discussão.
Em face disso, vai passar-se à votação.

O Sr. Alberto Cruz: - Sr. Presidente: peço prioridade para a proposta do Sr. Deputado Cerveira Pinto acerca da eliminação da alínea b).

O Sr. Presidente: - Informo V. Ex.ª de que as propostas de eliminação têm sempre prioridade, são sempre votadas em primeiro lugar.

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: a minha proposta não é de eliminação; não foi lida agora na Mesa porque já o tinha sido anteriormente.
Porque ela constitui um sistema completamente diverso das restantes, eu pedia a V. Ex.ª que ela tivesse prioridade.

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O Sr. Presidente: - O caso de V. Ex.ª e o do Sr. Deputado Alberto Cruz são inteiramente diferentes.
Se a Câmara votasse prioridade para a proposta da comissão eventual, teria de votar então, em primeiro lugar, a eliminação da alínea b).
V. Ex.ª requereu que a proposta que mandou para a Mesa fosse votada em primeiro lugar.
Devo dizer a V. Ex.ª que não é faculdade discricionária para a Mesa a alteração da ordem das votações.
Tratando-se de propostas da mesma natureza de substituição de texto, só por deliberação da Câmara se pode alterar a ordem da votação das propostas.
V. Ex.ª requereu prioridade para a votação da sua proposta e eu vou submeter esse pedido à deliberação da Câmara.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: eu não vou agora fazer oposição a que se vote a prioridade, mas desde que o problema, nos termos em que está posto, é um problema de prioridade e a questão se põe relativamente a um conjunto de propostas de alteração, que constituem um sistema, o deferimento do pedido conduzirá a que não seja considerado o requerimento, que a V. Ex.ª foi feito inicialmente, de a votação ser feita por números. Mas isto não constitui da minha parte qualquer espécie de oposição a que se faça de uma maneira ou de outra.

O Sr. Presidente: - Efectivamente, no princípio desta discussão requereu-se a votação por números da proposta de substituição apresentada pela comissão eventual, mas isso é uma questão diferente da ordem de prioridade para as votações.
Quer dizer, portanto, que, se a Câmara votar a prioridade da proposta da comissão eventual, a votação far-se-á por números, porque assim foi requerido e me parece conveniente para a boa ordem das votações.
Está na Mesa uma proposta sistematizada da comissão eventual, que foi objecto de alterações que se integram na proposta dessa mesma comissão.
A proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz constitui um sistema próprio. A Câmara foi pedida a prioridade sobre a proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz e pronunciar-se-á por essa prioridade ou pela da comissão eventual.
Vou pôr à votação a prioridade pedida para a proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz.
Em seguida foi submetida à votação a prioridade sobre a proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz.

Pausa.

O Sr. Presidente: - A votação pareceu-me indecisão por parte da Câmara, talvez por não revelar ter sido suficientemente claro sobre, o alcance da votação, que não incide sobre o mérito das propostas, mas sobre a ordem por que hão-de ser postas à deliberação da Assembleia.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Pedi a palavra, apenas para dizer que acresce à circunstância de se estar em presença de dois sistemas a circunstância de que, no momento actual, a proposta da comissão eventual, digamos, é já uma proposta de transacção.

O Sr. Presidente: - Vou submeter à votação a prioridade sobre a proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz.

Submetida à votação a prioridade da proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz, foi rejeitada.

O Sr. Presidente: - Vai agora votar-se em primeiro lugar a proposta da comissão eventual. A votação far-se-á por alíneas, conforme foi requerido pelo Sr. Deputado Sá Carneiro.
Vai votar-se a proposta da comissão eventual até à alínea a), sobre a qual há na Mesa uma proposta de aditamento, apresentada pelo Sr. Deputado Bustorff da Silva.

Submetida à votação, foi aprovada a proposta, incluindo a alínea a) com o
aditamento proposto pelo Sr. Deputado Bustorff da Silva.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o n.º 1 tal como se contém no texto da comissão eventual.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vou submeter à votação o n.º 2 com a proposta apresentada pelo Sr. Mário de Figueiredo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - A votação vai agora incidir sobre o n.º 3 da proposta da comissão eventual, sobre a qual não há na Mesa qualquer alteração.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Segue-se agora a alínea b), sobre a qual há uma proposta de eliminação, apresentada pelo Sr. Cerveira Pinto e outros Srs. Deputados. Vai votar-se.

Submetida à votação, foi rejeitada a proposta de eliminação do Sr. Deputado Cerveira Pinto.

O Sr. Cerveira Pinto: - Requeiro a contraprova.

Procedeu-se à contraprova.

O Sr. Presidente: - Está rejeitada.
Sobre a alínea b) está ainda na Mesa uma proposta do Sr. Deputado Cerveira Pinto.
Vai votasse o corpo da alínea b) com esta alteração proposta pelo Sr. Deputado Cerveira Pinto.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Mas a Assembleia já se pronunciou sobre a prioridade da proposta da comissão.

O Sr. Presidente: - A observação de V. Ex.ª tem razão de ser; a proposta da comissão tem prioridade.

O Sr. Cerveira Pinto: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Sim, senhor.

O Sr. Cerveira Pinto: - A Assembleia pronunciou-se sobre a prioridade da comissão eventual, mas a minha proposta é de alteração à proposta de alteração da comissão eventual, de modo que penso dever ser votada primeiro.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: à face do Regimento, não me consta que possam apresentar-se propostas de alteração a propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Eu reconheço que a questão da prioridade dos textos, da comissão eventual e do Sr. Deputado Cerveira Pinto, para efeito das votações, é discutível; mas é necessário resolver, e para isso há uma base, que é a de a Assembleia ter votado já a prioridade para a da proposta da comissão eventual.

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696 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 157

Quanto ao reparo feito pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo, regimentalmente, é exacto; e eu já fiz saber isso mesmo a alguns Srs. Deputados que quiseram apresentar propostas de alteração a este texto da comissão. Mas, neste momento, e em face do que se tem passado, não desejo ser muito rigoroso na aplicação do Regimento quanto a este ponto...
Vai votar-se, portanto, o corpo da alínea b), com a alteração proposta pela comissão eventual.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o n.º 1 da alínea b) com uma proposta de alteração do Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

Submetido â votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o n.º 2 com a proposta de alteração do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu, também assinada pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo e outros Srs. Deputados.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Cerveira Pinto: - V. Ex.ª pode dar-me um esclarecimento?
Porque razão não foi posta à votação a minha proposta?

O Sr. Presidente: - A proposta de V. Ex.ª refere-se ao corpo da alínea b) e não foi submetida à votação por eu a ter considerado prejudicada pela votação já feita.

O Sr. Cerveira Pinto: - Mas ela foi considerada ,um aditamento.

O Sr. Presidente: - A proposta de V. Ex.ª não é regimentalmente um aditamento. Para ser um aditamento era necessário que ela consistisse na junção de um parágrafo, de uma alínea ou de um número.

O Sr. Cerveira Pinto: - Mas mesmo assim porque se não votou, se de qualquer forma era uma proposta?

O Sr. Presidente: - Porque estava prejudicada pela prioridade da proposta da comissão eventual, que foi aprovada e que se me afigurou concluir a alteração proposta por V. Ex.ª

O Sr. Cerveira Pinto: - Mas havia também uma proposta do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu, que foi votada antes.

O Sr. Presidente: - Peço desculpa a V. Ex.ª mas a proposta do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu foi votada simultaneamente.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se agora o período seguinte do n.º 2 da alínea b) com o acréscimo proposto pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

Submetido à aprovação, foi aprovado.

Em seguida foi aprovado o n.º 3 proposto pela comissão.

Consultada a Assembleia, foram seguidamente aprovadas as alíneas c) e d) tal como constam do texto da comissão eventual.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o primeiro período da alínea e).

O Sr. José Nosolini: - Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª um esclarecimento, para saber como orientar o meu voto.

O Sr. Presidente: - Tem a bondade.

O Sr. José Nosolini: - A nova proposta da comissão eventual sobre a alínea e] estabelece agora um regime especial de indemnizações para os arrendatários de prédios para habitação cuja renda seja inferior a 50$, mas admite ainda o despejo. A minha proposta não o admite desde que não haja garantia de alojamento.
Pergunto: da aprovação da proposta da comissão resulta ficar prejudicada a minha proposta?

O Sr. Presidente: - A questão que o Sr. Deputado José Nosolini suscitou diz respeito ao segundo período desta alínea, e não ao primeiro, que é o que vamos votar.

O Sr. José Nosolini: - Então fica de pé a minha observação pelo que diz respeito à segunda parte.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o primeiro período da alínea e) tal como se encontra no texto da comissão eventual.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Quanto ao segundo período do texto da comissão eventual com a alteração que já foi lida na Mesa, parece efectivamente prejudicado o aditamento do Sr. Deputado José Nosolini, de forma que o Sr. Deputado José Nosolini fica inteirado de que a votação desse segundo período com a alteração que já foi lida à Câmara prejudicará o sen aditamento.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se, portanto, o segundo período com a alteração que já foi lida.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Sobre os terceiro, quarto e quinto períodos do texto da comissão eventual relativo à alínea e) não há outras propostas.
Submeto, portanto, à votação da Câmara esses períodos da proposta de substituição mandada para a Mesa pela comissão eventual.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Está, portanto, prejudicado o aditamento do Sr. Deputado José Nosolini.
Há ainda um aditamento do Sr. Deputado Bustorff da Silva no sentido de se aditar um período à alínea e).

Vai votar-se.

Submetido à aprovação, foi rejeitado.

O Sr. Presidente: - Há ainda na Mesa uma proposta da comissão de aditamento à sua alínea e), ou seja para se fazer o acréscimo do seguinte período: «O senhorio que não inicie as obras no dito prazo, etc.».
Vai votar-se.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Considero prejudicada a proposta do Sr. Deputado Botelho Moniz sobre o artigo 29.º
Está em discussão o artigo 30.º
Vai ler-se, para ser submetida à votação, a proposta do Sr. Dr. Mário de Figueiredo relativa ao n.º 1 do, artigo 30.º
Foi lida.

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O Sr. Presidente: - Vai votar-se o n.º 1 do artigo 30.º com a alteração proposta pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação do n.º 2 do artigo 30.º

Submetido À votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se agora o n.º 3 do artigo 30.º

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - O artigo 31.º está já substituído pela proposta da comissão eventual que há pouco foi aprovada.
Estão pois em discussão os artigos 32.º e 33.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa.
Sobre estes dois artigos não há na Mesa qualquer proposta de alteração. ]

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra, vai proceder-se à votação dos artigos 32.º e 33.º do primeiro parecer da Câmara Corporativa.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 34.º, 35.º e 36.º

O Sr. Sá Alves: - Eu peço a. V. Ex.ª para informar a Câmara sobre se há alguma proposta sobre estes três artigos.

O Sr. Presidente: - Aos artigos 34.º, 35.º e 36.º não tenho qualquer apontamento de propostas de alteração.

O Sr. Sá Carneiro: - Creio que V. Ex.ª poderia pôr o capítulo todo à votação.

O Sr. Presidente: - Ponho à votação todo o capítulo, com excepção do artigo 39.º, sobre o qual há uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho.

Submetidos à votação, foram aprovados os artigos 34.º a 38.º, inclusive.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 39.º com a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho, que pretende a eliminação dos n.ºs 1 e 2 deste artigo.
Como se trata de uma eliminação, vai votar-se a mesma em primeiro lugar.

Submetida à votação, foi rejeitada a proposta de eliminação, apresentada pelo Sr. Deputado Manuel Lourinho.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o texto do artigo 39.º tal como se contém no parecer da Câmara Corporativa.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 40.º Também sobre este artigo há uma proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho destinada a eliminar o n.º 1.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vou pôr esta proposta à votação.

Submetida à votação, foi rejeitada a proposta do Sr. Deputado Manuel Lourinho.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se o texto do artigo 40.º tal como consta do parecer da Câmara Corporativa.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: -Está em discussão o artigo 41.º, sobre o qual não existe na Mesa qualquer proposta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 42.º, sobre o qual há uma proposta do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Nova redacção do artigo 42.º:

1. Esta lei é aplicável aos arrendamentos do pretérito, sem excepção das disposições relativas à forma do contrato, desde que não haja acções pendentes.
2. Os interessados poderão invocar relativamente a contratos anteriores a esta lei o artigo 1.º do decreto-lei n.º 22:661, de 13 de Junho de 1933.
3. O disposto no n.º 1 não afecta a validade dos contratos a que se referem os artigos 1.º e 2.º quando tenham sido celebrados antes da exigência legal de titulo escrito ou de escritura.
4. Todos os arrendamentos do pretérito para comércio, indústria ou exercício de profissão liberal relativamente aos quais não penda litígio serão válidos, sem prejuízo do disposto no n.º 2, desde que exista recibo e tenha sido pago o imposto do selo devido.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, França Vigon, Alberto Henrique» de Araújo, Luís Maria da Silva Lima Faleiro, José Gualberto de Sá Carneiro.

O Sr. Presidente: - Está em discussão também esta proposta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado pede a palavra, vai votar-se.
Submetido à votação, foi aprovado o artigo 42.º com a nova redacção do Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 43.º Sobre este artigo há também uma proposta do Sr. Deputado Mário de Figueiredo, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos que o artigo 413.º seja substituído pela seguinte base:

A acção destinada a obter o despejo com base na caducidade do arrendamento, regulada nos artigos 7.º a 9.º e fundada em factos anteriores a esta lei, caduca se não for intentada no prazo de um ano posterior à vigência da mesma.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, António Júdice Bustorff da Silva, Francisco de Melo Machado, José Gualberto de Sá Carneiro, João das Neves, Paulo Cancela de Abreu.

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O Sr. Presidente: - Está também em discussão esta proposta.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum dos Sr s. Deputados deseja fazer uso da palavra, vai votar-se.

Submetido à votação, foi aprovado o artigo 43.º com a redacção proposta pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo.

O Sr. Presidente: - Estão em discussão os artigos 44.º, 45.º e 46.º

Pausa.

O Sr. Presidente: - Como nenhum Sr. Deputado deseja pronunciar-se sobre estes artigos, vou pô-los à votação.

Submetidos à votação, foram aprovados.

O Sr. Presidente: - Vai entrar em discussão a base nova proposta pela comissão eventual.
Vai ler-se.

Foi lida. É a seguinte:

Propomos a seguinte nova base:

1. Constitui crime de especulação, sendo punível nos termos da legislação respectiva, além da infracção da base que substitui o artigo 1.º e da base I:
a) A infracção prevista no artigo 110.º e § único do decreto n.º 5:411, de 17 de Abril de 1919;
b) O facto de o arrendatário receber pela extinção do arrendamento qualquer quantia que não seja indemnização devida por lei;
c) O facto de o arrendatário receber qualquer quantia pela cessão do local a novo arrendatário em caso diverso do de traspasse.
2. Nos casos previstos na alínea a) do n.º 1 a sentença condenatória é título bastante para compensação nas rendas futuras do que o locatário tiver pago indevidamente.

Os Deputados: Mário de Figueiredo, Manuel Ribeiro Ferreira, João das Neves, Paulo Cancela de Abreu, José Alçada Guimarães, Luís Maria Lopes da Fonseca, Francisco de Melo Machado, José Cabral, José Gualberto de Sá Carneiro.

O Sr. Presidente: - Estão ainda na Mesa propostas de bases novas, apresentadas pelos Sr s. Deputados Antunes Guimarães e Álvaro da Fontoura.
Vão ler-se.

Foram lidas. São as seguintes:

BASE NOVA

Logo que esteja debelada a crise actual de habitação será restabelecida a liberdade contratual.

Lisboa, 23 de Abril de 1948. - O Deputado João Antunes Guimarães.

Propomos a adopção da seguinte base:

1. Em relação aos arrendamentos para habitação celebrados depois da entrada em vigor desta lei a renda não poderá ser superior ao duodécimo do rendimento colectável ilíquido.
2. Não pode passar-se licença para habitação de prédios devolutos ou celebrar-se contrato de compra e venda tendo por objecto prédios novos sem que a comissão de avaliação fiscal tenha determinado o seu rendimento colectável.

Os Deputados: Álvaro da Fontoura, Francisco Higino Craveiro Lopes, Frederico Bagorro de Sequeira, António de Almeida, António Augusto Esteves Mendes Correia.

O Sr. Querubim Guimarães: - Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que mande ler novamente a base nova proposta pelo Sr. Deputado Mário de Figueiredo.
Foi lida.

O Sr. Querubim Guimarães: - Sr. Presidente: pedi a V. Ex.ª que mandasse fazer essa leitura justamente para ver se tinha sido feita alguma alteração a respeito do § único do artigo 110.º do decreto n.º 5:411.
Peço para o caso a atenção da comissão eventual, visto que esse § único já não está em pleno vigor.
Esse artigo diz o seguinte:
Leu.
Ora acontece que este § único não está em pleno vigor, porquanto, em face do artigo 21.º do decreto n.º 16:731 e várias outras disposições complementares, foi imposta ao inquilino de prédios urbanos a obrigação do pagamento de aumento da contribuição predial. Portanto, parece que a referência a este § único, aqui citado, deve ser restringida ao que ainda se encontra em vigor.

O Sr. Presidente: - Continua em discussão esta base da comissão e conjuntamente a base nova proposta pelo Sr. Deputado Antunes Guimarães.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Salvo o devido respeito, a proposta do Sr. Dr. Antunes Guimarães parece-me, em primeiro lugar, platónica, e estabelece apenas um voto, uma aspiração que a própria sequência dos acontecimentos virá a realizar um dia.
Por outro lado, pode prestar-se, injusta e indevidamente embora, a interpretações erradas, imaginando-se que há o propósito de precipitar os acontecimentos.
Aproveito estar no uso da palavra para dizer o seguinte:
Quando o projecto Sá Carneiro e o primeiro parecer da Câmara Corporativa foram apreciados na Ordem dos Advogados, levantou-se discussão entre ilustres colegas meus, com intervenção dos professores e também doutos advogados Drs. José Gabriel Pinto Coelho e Paulo Cunha, acerca da oportunidade de nova lei sobre matéria de inquilinato.
Os que a julgaram inoportuna apontaram, entre outros, os inconvenientes que havia de ser um diploma a acrescentar às dezenas e dezenas deles que há sobre o assunto. Julgaram preferível que se elaborasse um código da locação, que, é claro, abrangesse, coordenasse e aperfeiçoasse toda a legislação em vigor.

O Sr. Botelho Moniz: - Era mais um...

O Orador: - Mas consubstanciava toda a matéria. Todavia eu tenho para mim que esta designação de Código não é ainda apropriada porque a situação é anormal, e, por motivo dela, grande parte da legislação vigente é de emergência.
Apoiados.
A designação de Código será mais apropriada à legislação normal e estável.
Sem embargo, entendo que o Governo deve desde já compilar num só diploma toda a legislação avulsa que fica em vigor.
Seria um preliminar do futuro Código.
Eis o voto que deixo formulado.
Tenho dito.

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1 DE MAIO DE 1948 699

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: quanto à proposta do Sr. Deputado Antunes Guimarães, tenho dúvidas sobre se ela poderá ser posta à votação, por motivos idênticos àqueles que V. Ex.ª invocou quando não submeteu ao veredicto da Assembleia a proposta do Sr. Deputado Bustorff da Silva.
Trata-se, não de normas de direito, mas de mera aspiração, que não tem conteúdo legislativo.
No tocante às observações do Sr. Deputado Querubim Guimarães, pode parecer que S. Ex.ª tem razão, mas a comissão eventual, ao perfilhar essa nova base, apenas reproduziu o que constava da base XLII da proposta do Governo e XLIII-A do parecer da Câmara Corporativa. Falta a palavra a sublocatário B, porque se entendeu que este é também sublocatário em relação ao seu sublocador.
O artigo 110.º do decreto n.º 0:411 está em vigor, com a reserva intuitiva de que, quando a lei obriga o arrendatário a pagar parte da contribuição predial, tal pagamento não pode constituir infracção.
Nós votámos já a base I, em que se fala de especulação.
O que o arrendatário paga porque a lei o obriga, é legitimo; o que paga fora disso, é ilegal.
Nem o Governo nem a Câmara Corporativa erraram.
Tenho dito.

O Sr. Álvaro da Fontoura: - Sr. Presidente: sou também da opinião do Sr. Deputado Sá Carneiro sobre as dificuldades de se pôr em execução o princípio da liberdade contratual para quando estivesse debelada a crise de habitação.
Tenho pena de não ter tido oportunidade de fazer algumas considerações à Assembleia sobre os inconvenientes da liberdade contratual no momento presente, quando está longe de debelada ainda a crise da habitação.
O caso era tratado na base XXXIII da proposta do Governo, mas não tive oportunidade de a ela me referir, porque no primeiro parecer da Câmara Corporativa não havia base em correspondência com esse assunto, e por esse motivo não foi marcado para discussão.
A proposta do Governo tem uma orientação de movimentos convergentes, resultantes, por um lado, da actualização das rendas antigas e, por outro, de restrições à liberdade contratual para os prédios futuros sujeitos a justa avaliação para fixação de renda. Eu quero dizer a V. Ex.ª que, em face das dificuldades de habitação actuais, estou absolutamente a favor da orientação da proposta do Governo.
Sou contrário a que se altere essa orientação, que constitui um todo com esses movimentos convergentes, como resulta de não ter sido discutida na altura própria, como eu esperava, a base XXXIII.
A liberdade contratual para os prédios construídos nos últimos anos tem dado os resultados que todos temos visto: preços incomportáveis para os inquilinos que querem obter casas nos centros urbanos.
Esse assunto seria de grande importância e interesse para ser tratado aqui na Assembleia.
Todavia, como não me foi possível, quero pedir a V. Ex.ª para que a minha declaração fique consignada no Diário das Sessões, bem como a dificuldade que eu encontro de em relação aos prédios antigos, a uma tão grande distância, nos pronunciarmos sobre se convém a liberdade contratual.
Todos nós temos visto os inconvenientes que têm resultado da liberdade de fixação de rendas, a que, muito, justamente, o Governo queria obviar, o que, infelizmente, não acontecerá, devido à resolução tomada por esta Câmara.
Esta orientação é também a de alguns Srs. Deputados pelo menos de todos aqueles que comigo assinaram uma proposta nesse sentido.
E já que a nossa proposta não pode ser considerada, que ao menos fique consignado no Diário das Sessões que eu e mais alguns Srs. Deputados, pelo menos os que assinaram a proposta, apoiávamos firmemente a base XXXIII da proposta do Governo.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Como mais nenhum Sr. Deputado deseja usar da palavra vai votar-se a base nova proposta pela comissão eventual.

Submetida à votação, foi aprovada.

O Sr. Presidente: - Sobre a base nova apresentada pelo Sr. Deputado Antunes Guimarães, entendo que não se trata de uma proposta com conteúdo, legislativo, mas meramente de um voto. E, assim, está na mesma situação da do Sr. Deputado Bustorff da Silva apresentada na sessão de ontem; isto é, não pode ser admitida; e assim o declaro.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Há ainda uma proposta do Sr. Deputado Álvaro da Fontoura e de outros Srs. Deputados.
Já disse particularmente ao Sr. Deputado Álvaro da Fontoura o meu pensamento sobre essa proposta.
O facto de esta proposta ter chegado à Mesa quando já tínhamos votado o n.º 2 do artigo 13.º do primeiro, parecer da Câmara Corporativa torna inoportuna a sua apresentação; e portanto não posso submetê-la à apreciação da Assembleia. O Sr. Deputado Álvaro da Fontoura foi decerto induzido em erro por supor que as bases da proposta de lei, ou do segundo parecer, que não têm correspondência no texto que a Câmara adoptou como base da discussão teriam discussão e votação à parte. Mas não é assim: essas bases só poderiam ser objecto de discussão na altura própria, se houvessem sido perfilhadas por alguns dos Srs. Deputados. Lamento não poder atender os desejos do Sr. Deputado Álvaro da Foutoura. É regimentalmente impossível.

O Sr. Álvaro da Fontoura: - Muito obrigado a V. Ex.ª

O Sr. Presidente: - Está concluída a votação desta proposta de lei.
Quero declarar, para elucidar a Comissão de Legislação e Redacção, que as bases da proposta do Governo que não têm correspondência no texto que serviu de base à discussão, e, por isso, não foram objecto de discussão e votação, se consideram prejudicadas.
Vai passar-se à segunda parte da ordem do dia: apreciação do texto aprovado pela Comissão de Legislação e Redacção relativo ao projecto de lei sobre feriados.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum dos Srs. Deputados tem qualquer reclamação a fazer, considero-o aprovado.
Como hoje terminam os nossos trabalhos e a respectiva Comissão tem de dar a última redacção à proposta que agora foi votada, consulto a Câmara sobre se lhe concede um voto de confiança, como é costume.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Interpreto o pensamento da Câmara no sentido afirmativo. Portanto, está a Comissão de Legislação e Redacção habilitada com um voto de confiança para poder redigir o texto do diploma votado.

Página 700

700 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 157

Creio que estamos chegados ao fim dos nossos trabalhos, e, como a hora vai muito adiantada, as minhas despedidas serão breves: apenas para agradecer a VV. Ex.ªs todas as facilidades que me concederam para o bom desempenho da minha missão nesta sessão legislativa e lhes desejar muitas prosperidades.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: em nome da Assembleia desejo agradecer a V. Ex.ª o bom acolhimento que sempre dispensou a todas as nossas intervenções nos diferentes debates e a atitude de estima com que sempre nos distinguiu também.

O Sr. Presidente: - Está encerrada a sessão.

Eram 21 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Albano da Câmara Pimentel Homem de Melo.
André Francisco Navarro.
António de Almeida.
António Carlos Borges.
António Maria Pinheiro Torres.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Proença Duarte.
Camilo de Morais Bernardas Pereira.
Diogo Pacheco de Amorim.
Eurico Pires de Morais Carrapatoso.
Henrique de Almeida.
Henrique dos Santos Tenreiro.
João Carlos de Sá Alves.
Jorge Botelho Moniz.
José Dias de Araújo Correia.
José Pereira dos Santos Cabral.
José Teodoro dos Santos Formosinho Sanches.
Luís da Câmara Pinto Coelho.
Luís Lopes Vieira de Castro.
Luís Teotónio Pereira.
Manuel Colares Pereira.
Manuel de Magalhães Pessoa.
Manuel Maria Múrias Júnior.
D. Maria Luísa de Saldanha da Gama van Zeller.
Mário Correia Carvalho de Aguiar.
Querubim do Vale Guimarães.
Ricardo Malhou Durão.
Rui de Andrade.
Sebastião Garcia Ramires.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Fernão Couceiro da Costa.
Francisco Eusébio Fernandes Prieto.
Gaspar Inácio Ferreira.
Horácio José de Sá Viana Rebelo.
Jacinto Bicudo de Medeiros.
João Mendes da Costa Amaral.
Joaquim de Moura Relvas.
Jorge Viterbo Ferreira.
José de Sampaio e Castro Pereira da Cunha da Silveira.
Manuel Beja Corte-Real.
Mário Lampreia de Gusmão Madeira.
Pedro de Chaves Cymbron Borges de Sousa.
Rafael da Silva Neves Duque.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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