23 DE MARÇO DE 1949 271
Mexia, que é exactamente o que expressa, à evidência, o trágico drama desta questão.
Por esse mapa verifica-se que aumentaram as percentagens da cortiça semifabricada e da cortiça em obra, que aumentou a quantidade de cortiça exportada, de 109:063 toneladas para 200:000,/bem como o valor que passou de 291:808 para 800:000 contos, e que apenas o preço por que se pagou a cortiça à lavoura foi o mesmo para a cortiça de 1.ª qualidade, tendo baixado de 25$ para 23$50 nas outras.
Este é que é o mapa revelador do drama e da crise grave em que vivemos neste momento, e eu pergunto se não merece a pena considerar um género que fez entrar neste País, num ano, 800 mil contos.
Suponho, Sr. Presidente, que toda a atenção que dermos a este assunto é uma atenção bem merecida.
Todavia, Sr. Presidente, quando se instituiu a Junta Nacional da Cortiça esqueceram-se de que existia a lavoura. Todos os elementos têm aí a sua voz. Têm-na o comércio e a indústria e só a não tem quem verdadeiramente lhe deu origem.
Podemos, porém, afirmar que foi a lavoura que criou esta riqueza, a mantém e a acresce em cada dia.
Se a alguém assiste o direito de ter assento na Junta Nacional da Cortiça é à lavoura.
É, porém, necessário fixar que não queremos excluir ninguém, porque é do conjunto de todas as actividades que pode naturalmente sair uma orientação definida com bom senso e bases seguras.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Eis, Sr. Presidente, o assunto que me trouxe a esta tribuna.
Magoou-me o tom agreste com que se o discutiu nesta tribuna.
Pelo respeito que tenho ao meu ilustre colega e amigo Sr. Dr. Bustorff da Silva, pelo muito que admiro o seu valor como homem, como advogado e como parlamentar, que é dos mais brilhantes, espero que S. Ex.ª possa vir a ser um paladino das nossas questões agrícolas, porque só assim S. Ex.ª será um verdadeiro Deputado de uma nação que é essencialmente agrícola e que ainda não encontrou maneira de deixar de o ser.
Quero ainda dar uma explicação ao Sr. Dr. Bustorff da Silva sobre o que outro dia disse acerca dos proprietários.
Imaginou S. Ex.ª que existiriam cerca de 200:000 e que os generosos eram afinal um número muito reduzido. Lembrei nessa altura que os proprietários agrícolas eram pobres e quero fazer agora a justificação dessa minha afirmação, conquanto S. Ex.ª não me tivesse dado o que me prometeu sobre um erro palmar que me atribuiu.
Devo informar S. Ex.ª de que há apenas 6:000 grandes proprietários em Portugal, 33:500 médios proprietários, 914:000 pequenos proprietários e 383:000 pequeníssimos proprietários, donde posso concluir que os proprietários em Portugal são muito mais para serem assistidos do que para assistirem.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Camarate de Campos: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: razões absolutamente alheias à minha vontade, a que a doença não foi estranha, fizeram com que eu não tivesse possibilidade de me deslocar a Lisboa aquando do aviso prévio do ilustre Deputado Sr. Melo Machado a propósito da criação do Ministério da Agricultura, aviso prévio que em boa hora S. Ex.ª trouxe à Câmara.
Outrossim, não me foi possível, pelas mesmas razões e motivos, estar presente nesta Câmara nas primeiras sessões em que começou a ser discutido o aviso prévio, também em boa hora trazido à Assembleia pelo não menos ilustre Sr. Deputado Nunes Mexia, sobre um problema a que eu poderei chamar o problema corticeiro.
É que na discussão do aviso prévio do Sr. Deputado Melo Machado eu queria aprofundar alguns dos vários problemas que aflorei no chamado período parlamentar de antes da ordem do dia sobre e principalmente a situação económico-financeira do pequeno e médio lavrador, do pequeno e médio produtor, e do trabalhador rural, do trabalhador agrícola, daquele trabalhador que só sabe fazer uma coisa: cavar.
Não é, Sr. Presidente, que não sejam tão de respeitar os interesses da grande lavoura como os da pequena e média. Eles são tão de respeitar e são tão sagrados como os interesses da pequena e da média agricultura, mas é que o grande produtor tem defesas que não tem o pequeno e o médio lavrador.
É que no caso do grande lavrador, se o trigo não dá, dá o azeite; se o azeite não dá, dá a cortiça; se a cortiça não dá, dá o arroz, e se o arroz não dá, dão os porcos, e, Sr. Presidente, assim o grande lavrador tem sempre mais ou menos garantida a sua defesa, enquanto o pequeno e o médio proprietário só têm, em geral, o produto da semente que deitam à terra. Estes pequeno e médio lavradores é que no momento se encontram numa situação aflitiva, visto os últimos anos agrícolas terem sido de uma produção inferior e mínima.
Para estes é que vai, neste momento, a minha atenção.
É que, na verdade, a lavoura atravessa, como aqui tem sido acentuado, uma crise enorme, e os avisos prévios que aqui têm aparecido são a prova evidente, a prova provada, das suas grandes dificuldades.
Sou pela criação do Ministério da Agricultura, não porque eu esteja convencido de que é um elixir para todos os males, um remédio para todas as doenças. Sou pela criação desse Ministério por uma razão a que chamarei de ordem moral: c que, estando quase todos os portugueses ligados à A ida agrícola, quer directa quer indirectamente, sendo a agricultura como que o nervo da Nação, sendo a agricultura como que o melhor sangue do País, não se compreende que não haja um Ministério em que sejam tratados e versados os problemas de agricultura, mas concomitantemente entendo que ao lado do Ministério da Agricultura, como foi aqui acentuado aquando do aviso prévio do Sr. Melo Machado, deve haver um Ministério de Coordenação Económica.
Um Ministério em que superiormente sejam tratados e versados os problemas da produção, do comércio e da indústria.
Muitos dos males de que a lavoura se queixa resultam um pouco da forma como a terra é explorada; principalmente quando a terra é explorada em regime de arrendamento.
Eu sou daqueles que entendem que os proprietários da terra devem estar inteiramente ligados à vida da sua própria terra, sou daqueles que entendem que o proprietário da terra não deve estar apenas, e tão-sòmente, ligado ao quantitativo da renda. Entendo que o dono da terra deve sofrer as consequências dos maus anos agrícolas e, como é óbvio, os resultados dos bons anos.
Mas não acontece assim. A maioria da terra em Portugal está explorada em regime de arrendamento, e o seu dono preocupado apenas com o quantitativo da renda. Os arrendamentos, em geral, não vão além de quatro anos.
Tais contratos não só prejudicam a vida do rendeiro, mas a vida do proprietário e os interesses da Nação, visto, Sr. Presidente, o rendeiro não ter absolutamente