514 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 127
do qual o Governo desejou ouvir previamente a Câmara antes de decidir publicá-lo sob a forma de decreto-lei ou transformá-lo numa proposta a ser presente à Assembleia Nacional.
O referido projecto não passou de uma tentativa legislativa, mas o estudo a que deu lugar por parte do Governo e da Câmara serviu ao melhor esclarecimento e equacionamento das várias questões ligadas ao turismo e está na base deste novo projecto, como esteve no da elaboração da Lei n.° 2073, promulgada sobre a indústria hoteleira.
A apreciação a realizar agora não pode efectuar-se à margem ou sem ter em conta o referido estudo, pois, de uma maneira geral, estamos perante os mesmos problemas, os quais voltam a ser considerados novamente para uma solução por via legislativa.
Procurar-se-á neste parecer abordar apenas os novos aspectos ou as soluções diferentes, fugindo-se assim a repetições, a não ser as impostas pelas exigências do melhor ordenamento e compreensão das várias matérias, mas mesmo assim não para além do que for estritamente necessário. A Câmara, deste modo. remete-se especialmente para o seu trabalho de 1052 e, pela mesma ordem de razões, igualmente se remete para os pareceres que elaborou a propósito da Lei n.° 2073 (Colecção dos Pareceres da Cornara Corporativa, pp. 365 e seguintes, vol. i, do ano de 1954) e do projecto de decreto-lei n.° 509, que se destinava a interpretar autenticamente determinadas disposições da mencionada Lei n.° 2073 e a aplicar os seus princípios a alguns casos nela não previstos (Diário das Sessões n.° 116, de 25 de Janeiro de 1956, pp. 325 e seguintes). Certas considerações gerais e especiais, certos dados estatísticos e elementos de informação constantes destes dois últimos pareceres também têm relevância para o exame do presente projecto, particularmente no que toca à sua apreciação na generalidade.
4. O projecto vem antecedido de um elucidativo relatório, que se destina a esclarecer o pensamento do Governo e onde, em síntese, se indicam as razões justificativas das bases propostas.
Diz-se em tal relatório que, ao retomar o problema do turismo em Portugal, a proposta se limita «a definir a orgânica administrativa dos serviços centrais e locais e a facultar-lhes os meios considerados indispensáveis à sua actuação eficiente». E acrescenta-se que o Governo entende que «deverá constar de diplomas especiais, à semelhança do que se fez na lei hoteleira, a regulamentação dos vários sectores da actividade privada que mais de perto tocam nos interesses do turismo nacional. Daí que a presente proposta de lei não pretenda abarcar todos ou sequer os mais sérios dos problemas concretos postos ao turismo em Portugal: o que se teve em vista foi apenas a criação ou o aperfeiçoamento dos instrumentos necessários para a solução desses problemas».
Destas transcrições resulta à evidência que o Governo deixou de considerar necessário um estatuto do turismo e que opta pela definição dos princípios básicos através de leis fundamentais, remetendo para diplomas especiais a regulamentação das matérias de maior particularidade aos vários sectores da actividade turística.
5. Nos termos do n.° 26.° do artigo 23.° do Decreto n.° 34 134, de 24 de Novembro de 1944, competia ao Secretariado Nacional da Informação elaborar o Estatuto do Turismo.
No parecer de 1952, a que atrás se fez referência, apreciou-se o projecto que o Secretariado preparara para o fim de dar cumprimento à disposição citada. E, a propósito do problema que consistia em saber se o projecto correspondia aos requisitos ou exigências de um estatuto, escreveu a Camará, nessa altura, o seguinte:
Uma questão prévia interessa resolver antes de se apreciarem os vários problemas que se prendem com o projecto: há, na verdade, que formar juízo sobre o que se deve entender por «estatuto» à face da técnica portuguesa e, consequentemente, definir a orientação a seguir quanto à elaboração das respectivas bases.
A Camará Corporativa já teve ocasião de se pronunciar sobre problema da mesma natureza. Fê-lo, em 1944, a propósito da apreciação do projecto do Estatuto de Assistência Social (parecer acerca da proposta de lei n.° 25).
Escreveu-se então o seguinte:
Na legislação portuguesa o termo «estatuto» designa ou o conjunto de princípios normativos gerais que informam certo ramo de direito (Estatuto do Trabalho Nacional) ou a codificação de regras aplicáveis a certos funcionários, a certas entidades ou a certos serviços (Estatuto Judiciário, Estatuto dos Oficiais da Armada, Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis ...).
Em qual destes tipos de «estatuto» se enquadra o projecto? Na segunda das categorias indicadas é evidente que não cabe, dado que não constitui uma codificação de leis e outros diplomas. Mas não parece à Câmara que as bases propostas correspondam inteiramente ao outro tipo considerado, e isto não só porque algumas delas são de natureza puramente regulamentar, mas também porque o projecto, embora enuncie certos princípios normativos gerais, omite outros que também interessam à definição de uma política superior.
A análise da legislação aplicável, nomeadamente do disposto no § único do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 34133, de 24 de Novembro de 1944, onde pela primeira vez se fala no Estatuto de Turismo e se determina que até à sua publicação deve permanecer em vigor a legislação então vigente, na parte não revogada ou substituída pelas disposições daquele decreto-lei e do seu regulamento, faz-nos chegar à conclusão de que se tinha em vista que o estatuto viesse a ser uma codificação da numerosa e dispersa legislação em vigor.
Sem pretensão de ter feito um inventário rigoroso, a Câmara tomou conhecimento de nada menos do que duzentos e quarenta e dois diplomas publicados desde 1911 sobre matérias relacionadas com o turismo. Se outras razões não existissem, o simples enunciado deste número bastaria para aconselhar uma simplificação da legislação, codificando-se a que conviesse manter em vigor. A Câmara, contudo, entende que não se devo começar por ai.
Uma codificação corresponde, de qualquer modo, a um conjunto de regras do certa estabilidade, perfeitamente adaptadas às necessidades do momento. Ora a legislação actual não tem sido instrumento suficiente para u solução do problema em aberto que é sem dúvida o turismo em Portugal. Algumas tentativas sérias se fizeram, e nem tudo é para pôr de parte nessas dezenas de diplomas legislativos, mas a uma codificação de regras, muitas delas inadequadas às circunstancias e outras inoperantes, parece ser preferível a definição de uma política superior de turismo, concretizada em bases inspiradoras de novas providências. É este o parecer da Camará, e por isso ela opta pela elaboração de um