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1426 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 70

E é de perguntar se, na actual situação internacional, de grande labilidade, seria oportuno levantar por parte de Portugal o problema da revisão da Concordata, a poucos meses de terroristas serem recebidos "de passagem", numa das sacristias do Vaticano, e ao conhecer-se os preconceitos contra nós dos países que insistem em não entender o nosso plurirracialismo e as razões da nossa permanência no ultramar.

O Sr. Tbemudo Barata: - V. EX.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Themudo Barata: - Eu não desejo trazer à Câmara problemas de natureza religiosa, mas, como Deputado ultramarino, desejava salientar essa parte da intervenção de V. Ex.ª, discordando, porventura, de alguma das considerações que faça ou venha a fazer sobre o assunto, porque em matéria tão delicada não desejava prolongar um aparte desta natureza, nem desejava exprimir-me sobre essa matéria sem a devida ponderação. Já tinha pedido a minha inscrição para falar precisamente sobre esse aspecto e para salientar a importância que, mesmo na lei aqui aprovada nesta Assembleia, em Maio de 1940, já era reconhecida ao Acordo Missionário, então realizado pela igreja católica.

O Orador: - Agradeço imenso os palavras de V. Ex.ª, que vieram completar o que eu penso a este respeito.

E ainda, quando parece desenhar-se certa viragem coincidente com o aparecimento da Rússia no Indico e dos Chineses no caminho de ferro Tanzânia-Zâmbia. E também é de interrogarmo-nos no plano das hipóteses: se os trinta anos de Concordata aconselhassem hoje alguma actualização em qualquer dos seus aspectos, não seria mais prudente enveredar, com discrição, por acordos suplementares, limitados e específicos, dirigidos a esses mesmos aspectos? De resto não é tradição a Santa Sé tomar a iniciativa de rever ou denunciar concordatas que haja feito.

Não posso aceitar a pecha de que os concordatas - como a portuguesa - predominem em relação a países de regimes totalitários ou a períodos pseudo-totalitários desses regimes e que não hajam sido necessárias em países onde a "Mariana" tenha barrete frígio mais bem delineado. Lembro-me, aliás de ter ouvido chineses chamarem "fascistas" aos de Moscovo e denominar-se "democracias económicas" às ditaduras totalitárias de além "cortina de ferro".

Em seguida à 2.º Guerra Mundial o Papa Bento XV procurou estabelecer ou reatar relações da Santa Sé com os novos países, ou países com novos regimes saídos da referida guerra. E num consistório em 1921 dizia: "Se aqueles que estão à frente dessas repúblicas ou Estados quiserem entrar em acordo com a Igreja, em condições que melhor se adaptem às mudanças de situação, saibam que a Sé Apostólica - a não ser que por outro motivo surja impedimento - se não recusará a tratar com eles o tal assunto, como já o fez com muitos." Pio XI, o Papa que lhe sucedeu, realizou pelo menos dezasseis convenções, entre as quais cerca de uma dezena de concordatas, com países considerados então de ortodoxo figurino demo-liberal.

Em relação à França, onde, por iniciativa do Estado, este é sempre ouvido previamente sobre a conveniência política da nomeação de bispos, certo espírito laicista, não dominável, fez substituir a possibilidade de uma concordata, que seria lógica, por um conjunto de acordou parcelares com a "Santa Sé, os quais, no conjunto e nos efeitos, correspondem quase a uma concordata.

O que não se conhece é concordatas ou acordos propriamente ditos firmados em textos oficialmente publicados, da Santa Sé com países comunistas. Há aqui e além recentes conversações em que a Santa Sé obteve mitigação mas perseguições e a possibilidade de o Estado comunista aceitar a existência de bispos mediante prévia autorização ou com determinados restrições na sua actuação.

Não encontro, Sr. Presidente, na Concordata motivo sério para uma revisão do conjunto com os riscos que ela comporta. Nenhuma vantagem em substituí-la por um grupo de acordos parcelares sucessivos que regulassem as relações da Santa Sé com Portugal em coerência com a nossa Constituição. Sem nenhum modus vivendi -hipótese absurda -, a Igreja ficaria praticamente à mercê do que cada governo português vrasse no futuro a legislar.

Há, evidentemente, fortes lacunas, omissões ou ausência de dispositivos legais que reconheçam no nosso país a existência das confissões religiosas não católicas uma a uma e os direitos dos seus ministros. Parece que o anteprojecto da futura lei sobre a liberdade religiosa teria em parte esse objectivo. Seja como for, sou de opinião que deve legislar-se nesse sentido. Todavia, mais de uma centena de templos e salas de encontro de confissões não católicos reúnem em Lisboa e arredores seus fiéis, livremente, têm seminários e (publicações em condições paralelas a igreja católica. Parece-me que este problema nada tem a ver com a Concordata.

Sempre despertou em mim especial interesse a pequena comunidade muçulmana de Lisboa, sem meios materiais para erguer seu templo. E acho que seria de ajudar-se, talvez até por via oficial, a construção em Lisboa de uma pequena mesquita, onde, além da comunidade local, os portugueses muçulmanos do ultramar que venham à capital do País possam exercer o seu culto. Seria homenagem a prestar aos milhares de portugueses de cor, muçulmanos, que na Guiné ou em Moçambique têm afirmado indiscutivelmente a sua fidelidade a Portugal.

Vozes: -Muito bem!

O Orador: - Na notável entrevista que o jornal Novidades publicou esta manhã, o Sr. Cardeal Patriarca, cuja figura marca uma obra notável da Igreja em Portugal nos trinta anos da Concordata, esclarece inteligentemente o problema dos pseudoprivilégios da igreja católica. São suas estas palavras:

Privilégios ou serviços? Privilégios, não; são, antes, serviços religiosos ou educativos da Igreja, reconhecidos, facultados ou garantidos pelo Estado na missão deste de assegurar a liberdade, a ordem e o bem comum, atenta a realidade católica portuguesa. O Estado não os oficializa, não os torna serviços oficiais, não obriga as consciências, não sai da sua natureza profana, secular. Numa palavra, o Estado coopera, não se clericaliza.

E, pelo que diz respeito às isenções, o caso refere-se aos estabelecimentos de formação eclesiástica; quanto às igrejas, nunca elas foram tributadas. Trata-se aqui do caso daquela mesquinha compensação já referida. Não seria antes o caso de reclamar que o Estado os subsidiasse substancialmente como estabelecimentos quase gratuitos de promoção cultural e social de grande parte da juventude portuguesa? Não se sabe que é insignificante o número