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25 DE JUNHO DE 1971 2233

O Orador: - Suponho que realmente é assim.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade de continuar. E não é necessário suprimir qualquer passo, desde o momento que o considere útil para a sua conclusão.

O Orador: - Se V. Ex.ª me dá licença, eu continuo. Não deve o consumidor esquecer que, ao comer um pão, ao refrescar-se com uma salada, ou ao saborear a vianda, de muito trabalho não remunerado ou insuficientemente pago, se estará talvez a aproveitar.
Em segundo lugar (continuemos o raciocínio), porque toda a intervenção directa do Estado nas actividades económicas tem a sua discreta inspiração no socialismo materialista, cuja filosofia desconhece a finalidade transcendente da vida humana. E a verdade é que o sistema político e sócio-económico que elegemos, além de se inspirar na tradição nacional, mergulha as suas raízes na doutrina social da igreja romana, que sómente reconhece e pretende servir - cremos que ainda assim será - não o homo economicus, ou mesmo o homo socius, porventura animado de «sensibilidade e de reacções psicológicas de naturezas múltiplas» (no conceito de certos escritores da especialidade), mas o verdadeiro ser humano, para o qual a posse e fruição de bens materiais apenas se justifica na medida em que estes sirvam o seu aperfeiçoamento moral e espiritual.
Por tudo isto queremos, desde já, adiantar (e que fique aqui bem vincado este nosso pensamento) que a protecção do consumidor se deverá principalmente fazer, não por aquele processo anti-social e, portanto, anti-humano, mas através de uma equilibrada e justa política de ordenados e salários, sem discriminações sectoriais e no âmbito de todo o território nacional.
Enquanto a promoção dos agricultores terá de se efectuar, não à custa de vexatórios subsídios, mas com base numa sábia organização da empresa, conjugada com a criteriosa valorização dos seus produtos.
É que também neste campo devemos ir em busca da realidade.
Mas para toda esta brumosa panorâmica da pequena lavoura - faz-se-lhe, na verdade, essa acusação - terão concorrido, entre outros, os seguintes factores:

1) O regime do minifúndio em que se vive, com a sempre crescente pulverização da propriedade rústica, que impede a conveniente utilização das indispensáveis máquinas agrícolas;
2) Os processos rotineiros de cultura, ainda usados pela maior parte dos agricultores, que vão resistindo à introdução das novas técnicas;
3) As fracas perspectivas que se vêem no que respeita à espontânea reconversão agrária, com a manutenção de culturas de menos interesse, em detrimento de outras de maior rendimento. E, com tudo isso,
4) O agravamento do custo de produção dos géneros agrícolas que - diz-se também - a colectividade não tem obrigação de suportar, por se dever a uma culposa inadaptação do agricultor às exigências da vida económica moderna.

Em boa verdade, não podemos negar a pertinência e até, em certa medida, a justeza de toda esta argumentação crítica.
Quer-nos, no entanto, parecer que dessa precária situação da lavoura não será o agricultor o único, nem mesmo o principal responsável.
Expliquemos:
Entre os processos de solucionar o instante problema, teve a primazia o emparcelamento fundiário.
De facto, veio este a ser legalmente instituído entre nós pela Lei n.º 2116, de 14 de Agosto de 1962, regulamentada pelo Decreto n.º 44 647, de 25 de Outubro do mesmo ano, e é agora também contemplado nos artigos 1376.º e seguintes do novo Código Civil.
Mas a verdade é que, à parte um ou outro pequeno ensaio, essas providências legislativas ficaram letra morta.
Como razões justificativas dessa inércia têm-se invocado determinadas limitações orçamentais e, sobretudo, inevitáveis perturbações sociais e políticas que, porventura, surgiriam - diz-se - com a instalação do novo estatuto agrário.
Ora, nenhum desses argumentos nos merecerá incondicional audiência.
Quanto ao aspecto financeiro, devemos considerar que nem tudo se faria de uma só vez, podendo distribuir-se por muitos anos (e já lá vão nove) as verbas necessárias a esse empreendimento.
Acresce ainda que, tratando-se da resolução de um problema vital para a economia do País, seria perfeitamente justificável um eventual sacrifício com mais esse investimento, aliás largamente reprodutivo.
Quanto às apreensões de ordem política e social, também o argumento não seria decisivo e muito menos inibitório.
É que nem todos os agricultores enjeitam de um modo absoluto a ideia do emparcelamento. Nota-se mesmo, em algumas regiões, certa receptividade a essa inovadora solução.
Por outro lado, sabe-se que já abundam pelo País terras abandonadas ou disponíveis (damos como exemplo as do vale do Lis) que, sem qualquer oposição válida ou inconveniente de maior, facilitariam, strictu sensu, o emparcelamento fundiário.
Mas, certamente para fugir a tais dificuldades, reais ou virtuais, de Instalar e fazer funcionar a máquina do emparcelamento, ou talvez por outras insondáveis razões, vêm sendo os agricultores, além do convite à industrialização dos seus produtos, reiteradamente solicitados para se associarem em cooperativas e outros agrupamentos afins, panaceia considerada agora debeladora, por excelência, de todas as enfermidades da paciente lavoura.
Quer dizer: em vez de se promover o decretado emparcelamento e de se entregar à organização corporativa a resolução desses problemas, prefere-se, para tanto, enveredar pelo associacionismo de promoção estadual, ou «associativismo», como agora se diz, figurino de além-Pirenéus, onde as ideologias sócio-políticas divergem essencialmente das nossas.
Parece-nos, todavia, que se inicia aqui um negligente desvio dos fundamentais princípios em que assenta o nosso sistema sócio-económico.
Não se julgue, porém, que vemos qualquer inconveniente na livre associação dos agricultores em cooperativas ou, de outro modo, para, a seu prazer, melhor defenderem os interesses comuns. Em certos casos essa prática será da maior utilidade e até a única aconselhável.
Mas já não entendemos que seja o Estado ou qualquer dos seus departamentos a promover e a fomentar deliberadamente - quando não a impor - esse movimento associativista, atendendo a que semelhante orientação poderá levar-nos directamente ao colectivismo, que é contrário à nossa convicção.
Basta pensarmos no que sucederia se em todo o país, ou na sua maior parte, a produção e o consumo, com a