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4 DE FEVEREIRO DE 1986 999

Do que se trata, nesta intervenção e neste debate, é de fundamentar o pedido de inquérito parlamentar e deliberar sobre a sua realização, atribuindo à comissão respectiva os poderes de investigação que lhe permitam apurar os factos no âmbito do objectivo que lhe for definido. Num quadro muito claro: no quadro das funções de fiscalização da Assembleia da República, no quadro da sua competência para apreciar os actos do Governo e da Administração.
Vejamos então: são os actos e omissões imputados ao Ministério da Agricultura e serviços dele dependentes justificativos da realização do inquérito parlamentar?
É necessário, desde já, acentuar que nenhum benefício de boa fé pode ser invocado pelos actuais responsáveis governamentais em todo este processo.
O facto é que, de há vários anos para cá, está suficientemente definido o quadro interpretativo em que se move o Supremo Tribunal Administrativo.
Não é difícil prová-lo. Vejamos alguns exemplos (poucos, porque o tempo não é muito).
É o caso do Acórdão de 3 de Dezembro de 1981, referente ao recurso n.º 15 307, que anulou dois despachos exarados pelo Secretário de Estado da Estruturação Agrária, Goulão (1.º governo da AD), por falta de fundamentação de facto, explicitando concretamente que «não se encontra suficientemente fundamentado o despacho que atribui reservas invocando disposição legal, mas sem referir os factos concretos «e acrescentando ainda que também não constitui fundamentação de facto suficiente a mera indicação de documentos que se reportam a factos diferentes dos previstos abstractamente na norma legal».
Outro caso é o do Acórdão de 16 de Dezembro de 1982, que anula o despacho do mesmo Secretário de Estado do 1.º governo da AD por invalidade, já que foram preteridas formalidades essenciais, designadamente por não ter sido comunicado, na fase contraditória, à UCP respectiva o conteúdo dos requerimentos de reservas, designadamente fundamentos legais e técnicos, definição de área e pontuação (incluindo majorações), localização das reservas, etc.
Outro caso é o do Acórdão de 15 de Abril de 1982, que anulou um despacho do mesmo Secretário de Estado Goulão por ter atribuído uma reserva autónoma a um arrendatário (em vez de, se fosse caso disso, lhe atribuir o direito de arrendamento relativamente à área de reserva atribuída ao antigo proprietário).
Outro caso é o do Acórdão de 13 de Dezembro de 1981, referente ao processo n.º 15 004, que anulou um despacho do mesmo Secretário de Estado por erro nos pressupostos de facto, ao atribuir uma reserva de 70 000 pontos a um alegado explorador directo que não só tinha os prédios arrendados como não exibia, nem em 25 de Abril nem à data da ocupação, quaisquer gados, máquinas ou outros bens a restituir, tudo como estava amplamente demonstrado no próprio processo.
Outro exemplo é o do Acórdão de 14 de Julho de 1983, que anulou um despacho do mesmo Secretário de Estado Goulão, com fundamento em inexistência jurídica, já que a reserva foi atribuída a quem na altura já tinha falecido.
Outro exemplo ainda é o do Acórdão de 18 de Novembro de 1982, que anula cinco despachos do mesmo Secretário de Estado, concedendo 5 reservas a membros da mesma família, 4 deles por não ser feita qualquer prova das condições de tratamento não unitário de co-titulares e o outro por dar relevância automática a uma doação de área expropriável celebrada - pasme-se! - em 8 de Julho de 1977.
Outro caso é o do Acórdão de 4 de Fevereiro de 1982, que anula um despacho ainda do mesmo Secretário de Estado por violação da lei, ao conceber uma reserva a quem não é proprietário, mas tão-só usufrutuário, reserva que acrescia à já atribuída ao proprietário.
Estes são alguns casos, meramente exemplificativos, dos acórdãos anulatórios produzidos nos primeiros anos e que se traduzem em números significativos: 7 em 1980. 40 em 1981 e 69 em 1982.
Esperar-se-ia que o Ministério arrepiasse caminho, que se conformasse à lei, que garantisse a transparência e moralidade da actuação?
Os últimos anos não deram nenhum sinal disso - pelo contrário, particularmente pelo que respeita às imputações feitas às acções do Ministério da Agricultura durante a permanência do actual responsável, Ministro Álvaro Barreto.
Alguns dos casos citados nas petições aqui presentes devem merecer aturada investigação.
A família Franco Mira, que em 1978 requereu e obteve uma reserva alegando uma exploração comum através da Sociedade Franco Mira (conforme informação prestada por um determinado funcionário), vem em 1985 requerer 5 reservas, no total de 350 000 pontos, majoráveis em 30%. Isto a partir de uma informação de um adjunto do Ministro, que este despachada favoralvemente, em que se dava eficácia a uma doação posterior a 25 de Abril, e depois de o mesmo funcionário, que em 1978 tinha analisado o processo da Sociedade, vir, 7 anos depois, descobrir que afinal havia 5 unidades agrícolas autónomas.
Outro caso: o reservatário Sousa Cabral obtém em 1980 uma reserva de 70 000 pontos por ser explorador directo, majorada em 35 000 pontos, por, como alegou e provou, a sua mulher ser doméstica. Mas, em 1985, o mesmo funcionário que informou o processo de 1980 vem propor uma nova reserva à mulher do reservatário, dando como provado que explorava um estabelecimento agrícola distinto do marido, tudo tendo concluído em que o casal Sousa Cabral dispõe hoje de mais de 1100 ha e mais de 200 000 pontos.
Outro caso invocado: o reservatário Luís Piçarra Cabral, que recebeu em 1979 uma reserva, majorada em função do número de filhos, veio a ver anos mais tarde a atribuição a 5 filhos de uma reserva a cada e mais uma reserva para os restantes co-titulares, através do reconhecimento de eficácia de uma doação posterior a 25 de Abril e provando os cinco filhos que exploravam anteriormente a terra através de facturas de empresas em que eles próprios trabalham ou de que o seu pai é sócio gerente.
Outro caso ainda: o reservatário António Fernandes Piçarra Cabral obtém uma reserva de 171 000 pontos, assim majorada em função do agregado doméstico, reserva que veio a ser anulada pelo Supremo Tribunal Administrativo em 1979, através de acórdão, que, aliás, nunca foi cumprido. Para resolver o problema, o Sr. Ministro, em 16 de Janeiro de 1985, dá eficácia a uma doação feita em meados de 1975, manda reinstruir o processo e, em consequência, revoga a portaria de expropriação, mandando devolver toda a terra à casa agrícola do António Fernandes, com o fundamento de que as «áreas dos reservatários donatários não excedem» os limites da lei.

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4 DE FEVEREIRO DE 1986 1003 sem admitir nas suas discussões as interpretações de situações
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