1912 I SÉRIE - NÚMERO 57
mente um aumento percentual de vencimento ilíquido indexado ao cargo de director-geral da Administração Pública, tal como acontece, segundo a legislação de 1984, com todos os titulares de cargos políticos ou equiparados.
Esse sistema foi criado com o propósito de equiparar retribuições de vários cargos a partir da atribuição, às categorias mais elevadas das carreiras das magistraturas, de um vencimento base semelhante à retribuição base de um ministro.
Em relação a outros países, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias não pôde deixar de constatar o favorecimento, em Portugal, do estatuto remuneratório das magistraturas. Como se lê no relatório da Sr." Deputada Odete Santos, quer em França quer na Alemanha, os juízes do tribunal mais elevado têm remunerações idênticas às dos parlamentares. Ora, em Portugal, só em 1993 os parlamentares atingiram um nível retributivo igual ao auferido pelos magistrados superiores no ano de 1990, isto é, há cerca de três anos atrás!
O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!
O Orador: - De qualquer modo, hoje as magistraturas têm remunerações niveladas para diferentes categorias, na medida em que recebem o mesmo vencimento os Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Administrativo, o Procurador-Geral da República, os juízes do Supremo ou da Relação, o procurador-geral-adjunto e mesmo os presidentes dos tribunais administrativos de círculo.
Estas categorias recebem apenas mais 18 700$ do que o Procurador-Geral da República ou o juiz de círculo. Tudo isto devido à suspensão do regime de indexação, efectuado pela Lei n.º 63/90, de 26 de Dezembro, apesar de ela não ter impedido o aumento das remunerações em termos tão drásticos como o fez para os políticos.
Em suma, temos uma situação remuneratória relativamente distorcida em relação aos cargos políticos, mas também anómala dentro das várias categorias das magistraturas.
A Lei n.º 2/90 já permitia que os magistrados não só pudessem ganhar mais do que os parlamentares como não tinha qualquer tecto que impedisse que pudessem mesmo ganhar mais do que os membros do Governo, designadamente o Primeiro-Ministro, ou seja, podiam até ter uma remuneração base superior à remuneração base do Primeiro-Ministro.
Com efeito, a referida lei apenas impedia que os magistrados pudessem auferir remunerações ilíquidas, resultantes da soma da remuneração base e despesas de representação, superiores a 75 % do montante resultante da soma do vencimento e do abono mensal para despesas de representação do Presidente da República. Ou seja, apenas impedia uma remuneração ilíquida superior à remuneração ilíquida - base e despesas de representação - do Primeiro-Ministro, que, nos termos da Lei n.º 4/85, de 9 de Abril, também corresponde a 75 % da remuneração ilíquida do próprio Presidente da República.
Foi a Lei n.º 63/90, de 26 de Dezembro, ao suspender a aplicação da Lei n.º 2/90, que veio fixar o tecto salarial dos magistrados por referência à remuneração base do Primeiro-Ministro. E não só não permite que a remuneração base dos magistrados seja superior à remuneração base do Primeiro-Ministro como não permite que o total das remunerações ilíquidas seja superior a essa remuneração base.
É a suspensão da aplicação da legislação referente ao sistema retributivo dos titulares de cargos políticos- a Lei n.º 26/84 - e a suspensão relativa da aplicação da Lei n.0 2/90, referente ao sistema retributivo dos magistrados, que nos termos atrás expostos, acentuam as distorções desniveladoras magistrados/políticos e cria as distorções niveladoras magistrados/magistrados.
Então, perguntar-se-á: como foi isto possível?
A suspensão da Lei n.º 63/90 impôs-se transitoriamente por causa das novas regras- também transitórias- estabelecidas para o estatuto remuneratório dos funcionários e agentes da Administração Pública, constantes do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro, visando melhorar extraordinariamente as remunerações dos titulares de altos cargos públicos, dado que a Administração precisa de quadros qualificados e sujeitava-se a perdê-los, em face das oportunidades de colocação no mundo empresarial.
Há que constatar a subida da retribuição base do director--geral da Administração Pública- 33 % em 1990-1991 e 23 % em 1991-1992-, que o poder político não considerou correcto abranger os seus titulares, dada a sua razão excepcional, apenas justificativa para os próprios titulares dos referidos cargos públicos, o que implicou também, embora em termos muito mais atenuados - reconheça-se -, uma relativa travagem das subidas dos vencimentos dos magistrados.
É óbvio que a situação existente não poderia ser querida por qualquer parlamento. A situação de desequilíbrio é «favorecedora» das magistraturas em relação aos titulares de altos cargos políticos e públicos, como o de director-
geral da Administração Pública, que, hoje, apesar do regime transitório citado, anda à volta dos 500 000$, sensivelmente ao nível das remunerações dos parlamentares, em termos de remuneração base, uns e outros com cerca de metade das remunerações base ilíquidas dos magistrados superiores, se se aplicasse a legislação ora suspensa, e mesmo que se aplicasse a legislação vigente, essa remuneração, quanto aos parlamentares, situar-se-ia em níveis de cerca de dois terços da remuneração ilíquida global destas categorias das magistraturas.
Trata-se de um mundo de remunerações tão distorcidas - a favor dos magistrados de certo modo, se tivermos em conta a legislação suspensa, e, entre estes, a favor dos de escalão intermédio, se tivermos em conta a legislação vigente - que não pode considerar-se existir um sistema retributivo minimamente aceitável ou coerente. Impõe-se, assim, sem dúvida, uma reflexão global para repor e refazer as coordenadas do sistema da indexação, o que, aliás, a própria legislação que suspendeu o sistema vigente refere e propõe em termos de futuro. E, provavelmente, em termos teóricos, seria preferível repor a legislação suspensa, sendo certo que, agora, apenas nos apressamos a tomar medidas isoladas enquanto o sistema não é recriado.
Ora, tomam-se essas medidas, desde já, porque se reconhece que, se em termos de remunerações, as magistraturas não são as mais atingidas, já em termos de princípios as suas representações da anomalia existente são inultrapassáveis para o legislador. É que, invocado o sistema praticado de indeferenciação de remunerações, o Parlamento não podia deixar de actuar para, no mínimo, e enquanto é ponderado o refazer global do sistema, corrigir esta evolução pérfida da medida suspensiva transitória.
Os magistrados têm as suas remunerações ligadas às dos titulares dos cargos políticos, por sua vontade própria, mas a anomalia criada pelo Parlamento não podia deixar de por ele ser corrigida no que diz respeito a este aspecto mais gritante.
Não se visa aumentar a remuneração, como se vê, apesar da justiça das pretensões para quem sempre revelou grande dedicação no exercício das funções que desempenha, mas, sim, corrigir injustiças mais gritantes, pois, se assim não