21 DE JANEIRO DE 1994 965
0 Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Manuel dos Santos, o caso Banesto totta, veio confirmar as crescentes preocupações e críticas sobre a falta de transparência no processo de privatizações, designadamente quanto à clara ultrapassagem do limite de participação de capital estrangeiro. Mas é evidente que este caso não é novo, nem único. Não é novo nos seus contornos gerais, nem é único quanto à falta de transparência no processo.
0 PCP, desde o início do processo de privatizações, tem tido a este respeito uma posição clara e coerente, nalguns casos até criticada pelo próprio Partido Socialista.
Sempre afirmámos que o processo de privatizações iria conduzir ao desmantelamento de sectores estratégicos da economia portuguesa sem a criação de alternativas. Sempre afirmámos que o processo de privatizações iria conduzir, mais cedo ou mais tarde, ao controlo da economia portuguesa por parte de grupos estrangeiros, e também afirmámos, várias vezes, que ele estava a ser conduzido com uma total falta de transparência, com processos de cambão, de tráfico de influências, que desrespeitavam, inclusivamente, a legislação aprovada por maioria, contra o voto do PCP, nesta Assembleia da República.
A vida, Sr. Deputado, como é evidente, deu-nos inteira razão e a primeira questão, Sr. Deputado, é a seguinte: agora, concorda, ou não, com estas questões de fundo que o PCP tem colocado em relação ao processo das privatizações?
A segunda questão tem a ver com o caso Banesto/Totta, que é importante, obviamente, mas é a ponta de um iceberg. Ao longo destes anos, colocámos questões ligadas à Mundial Confiança, à Tranquilidade, ao Banco Espírito Santo, à Centralcer e ao seu domínio pelo Grupo Bavária, à Petrogal e ao seu previsível domínio pelo Grupo Totta] francês... Portanto, este é a ponta de um iceberg!
Por isso mesmo, o PCP apresentou, nesta Assembleia da República, dois pedidos de inquéritos parlamentar, que foram inviabilizados pelo PSD. Apresentámos, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, no início deste mês, uma audição parlamentar, a que o Sr. Deputado já se referiu, que esta manhã acabou por ser chumbada pelo PSD. 0 PSD, é evidente, tem medo, tem receio de apurar a verdade destes processos e, por isso, hoje de manhã, proeurou reduzir a audição de várias entidades à mera audição familiar, em circuito fechado, do Sr. Ministro das Finanças, o que não é uma forma de apurar a verdade.
Aliás, aproveito para convidar os Deputados do PSD, quando acabarem a visita turística que estão a fazer, à procura dos dinheiros da CEE, a fazerem uma outra visita, aos «subterrâneos» do processo de privatizações. Talvez aí pudesse haver conclusões mais importantes para a economia portuguesa e para os interesses nacionais...
Vozes do PCP: - Muito bem!
0 Orador: - Por isso mesmo, Sr. Deputado, por os processos de inquérito terem sido rejeitados pelo PSD, com o argumento de serem muito genéricos, e porque a audição de hoje de manhã também foi rejeitada, anunciamos, ou confirmamos, aqui, em Plenário, o que já dissemos hoje na Comissão de Economia, Finanças e Plano, ou seja, que vamos apresentar na Mesa da Assembleia da República um processo de inquérito ao caso Totta & Açores/Banesto, para que, de uma vez por todas, se esclareça, em sede própria, tudo o que ocorreu no processo de privatização e as eventuais incidências da crise do Banesto no Banco Totta & Açores. Sobre isto, gostaria de ouvir também a opinião do Partido Socialista.
Vozes do PCP: - Muito bem!
0 Sr. Presidente: - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos,
0 Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, começando pela parte final do pedido de esclarecimento, aproveito para informar não só o Sr. Deputado Lino de Carvalho mas também, indirectamente, o Sr. Deputado Rui Rio de que a única alteração que fiz, desde a manhã até agora, no meu discurso foi, exactamente, numa frase final, onde claramente se indicia que o Partido Socialista apoiará essa iniciativa, não só por ser uma questão de princípio, pois o PS sempre apoiou todas as propostas de inquérito que entraram - e tenho-o afirmado como uma questão de princípio -, mas por parecer haver neste caso, visto estarem a ser inviabilizados todos os outros mecanismos de inquirição, lugar a esse inquérito, Portanto, penso que respondi à sua última questão e à observação feita, há pouco, pelo Sr. Deputado Rui Rio.
Este é um caso importante e é assim que o vamos tratar, mas já tivemos oportunidade de discutir esta matéria, várias vezes e em várias circunstâncias, uma vez que o tema privatizações é trazido regularmente ao Plenário da Assembleia da República.
Há, realmente, uma divergência de fundo - temos de o reconhecer - entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português. Não somos contra o princípio das privatizações, afirmámo-lo claramente no debate da lei--quadro, concretamente quando apresentámos um projecto lei-quadro - fomos, aliás, os primeiros a apresentar um projecto neste sentido - e o discutimos com amplos sectores da sociedade civil, tendo, aliás, havido da parte da sociedade civil a aceitação de muitos dos nossos princípios, o que até permitiu introduzir-se algumas alterações.
Portanto, há realmente uma divergência de fundo quanto à forma como encaramos o processo de privatizações, relativamente ao Partido Comunista Português.
Quanto à questão da transparência, levantada por V. Ex.ª, não esgrimindo aqui com a ideia de quem falou antes ou depois, e também respondendo um pouco lateralmente ao Sr. Deputado Rui Rio, que nos acusava de já termos falado várias vezes sobre este assunto e de o Secretário-Geral do Partido Socialista o ter feito recentemente, direi que, com certeza, falámos muitas vezes sobre este assunto e falaremos tantas vezes quantas forem necessárias, para ficar claro,...
0 Sr. Rui Rio (PSD): - Falem bem, não mal!
0 Orador: - Sr. Deputado, repito, falaremos tantas vezes quantas as necessárias para deixar claro a existência de irregularidades, de ilegalidades, de falta de transparência, e a não existência de um sentido estratégico no processo de privatizações conduzido pelo Governo. Produziremos as declarações que forem necessárias, quer o Secretário-Geral, quer os Deputados com especial responsabilidade nesta matéria, quer todos os agentes políticos, que acharmos convenientes!
Portanto, quanto a isso, não se preocupe, porque ainda irá ouvir-nos falar muitas mais vezes sobre privatizações.
Voltando à questão da transparência, o PS, nomeadamente eu e o Sr. Deputado José, Penedos, em várias circunstâncias - estou a recordar-me de uma iniciativa trazida aqui pela CGTP, que foi objecto de discussão e que o PCP transformou em inquérito parlamentar às privatizações, já