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30 DE JUNHO DE 1994 2753

Por outro lado, o Governo manteve-se surdo à proposta da Comissão Revisora quanto à exclusão da ilicitude do aborto engénico, quando praticado nas 22 semanas. Está demonstrado que a previsão do actual Código é, de todo em todo, ineficaz. A ciência médica refere-o.
Esta é também uma das matérias em que apresentaremos propostas, aliás no seguimento de outras que, outrora, já apresentámos nesta Assembleia.
Os crimes contra a honra e a reserva da vida privada foram objecto de grande debate na Comissão. É nesta sede que algumas das propostas de alteração, vindas umas do Governo e outras da Comissão Revisora, entram em conflito com o direito a informar. A marca dos tempos e da ofensiva a que vem sendo submetida a comunicação social, com certeza, levou o Governo a determinadas opções, muitas delas até para além das propostas apresentadas pela Comissão Revisora.
Assim se tem de entender que essa marca dos tempos está presente no n.º 3 proposto para o artigo 180.º; na manutenção - apenas de responsabilidade do Governo - do actual n.º 4 do artigo 164.º; no alargamento de uma classe de «intocáveis », protegidos por uma moldura penal agravada, relativamente a crimes cometidos contra o comum dos mortais; na previsão de um novo tipo de crime - da responsabilidade governamental -, vazado no artigo 187.º; e ainda nas alterações a que se procedeu relativamente a alguns tipos de crimes, como acontece com as gravações e fotografias ilícitas.
Relativamente a todos estes artigos, vamos apresentar propostas de alteração. Entendemos, de facto, que neste capítulo se reflecte um comportamento reactivo da classe política perante a actuação da comunicação social.
É difícil não concluir que o Governo pretende a opacidade dos serviços do Estado, atemorizando a comunicação social com o artigo 187.º.

Vozes do PCP e do Deputado independente Mário Tomé: - Muito bem!

A Oradora: - E é difícil escamotear que, na base de tal artigo, estão as denúncias de ilegalidades cometidas, por exemplo, no DAFSE e no SIS.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Também, só um comportamento reactivo da classe política justificará - e mal - que se proíba a prova da verdade dos factos quanto a imputações relativas à vida privada e familiar.
A parte geral do Código já protege a esfera íntima da vida dos cidadãos. Aquela que nenhuma relevância tem para a opinião pública.
Assim, o n.º 3 do artigo 180.º pode querer inculcar - para nós, contudo, sem sucesso- que há uma esfera da vida privada igual para todos os cidadãos. E sabemos que assim não é. O círculo da vida privada das figuras públicas é consideravelmente mais reduzido do que o do comum dos cidadãos. Neste aspecto, a formulação do projecto de Código Penal espanhol é bem mais cautelosa.
Na avaliação das alterações que se introduziram a alguns tipos de crimes, eliminando a expressão «sem justa causa », que para uns constitui uma menção redundante da ilicitude, e para outros integra a própria factualidade do tipo, quanto ao crime das gravações e fotografias ilícitas, registamos que, a propósito da expressão «sem justa causa », alguma doutrina conclui que há uma «extensão acrescida da incriminação ».
Ponderados os interesses em conflito - o das vítimas e os daqueles que exercem o direito de informar -, parece-nos que, apesar de a parte geral do Código poder resolver o problema, se deve entender como útil, como diz a doutrina alemã, que as normas incriminatórias advirtam que ocorrem muitas vezes situações de conflito que reclamam a justificação da conduta, apesar do preenchimento do tipo.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Num momento em que está pendente, nesta Assembleia, uma proposta de lei de alteração da Lei de Imprensa, configurando reais ameaças contra os jornalistas, a Assembleia da República não lhe deverá juntar, em sede de Código Penal, propostas que constituam um verdadeiro pacote anti-informação.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não obstante os avanços introduzidos no capítulo sobre crimes sexuais, entendemos que não se erradicaram, desse capítulo, todos os ideais tabu que não assentam em qualquer defesa da dignidade da pessoa humana, mas em ancestrais ideias de protecção do património familiar por via sucessória.
Explicitaremos o que afirmamos agora nas propostas que iremos apresentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Destacado o quadro negativo que condicionou as propostas de alteração ao Código Penal, há, no entanto, que assinalar as preocupações debatidas na Comissão Revisora no sentido de não se enveredar, por força de momentâneas conjunturas, num sentido punitivo aproximado do law and order. A que, no entanto, não fugiu o Governo, como vimos, no capítulo dos crimes contra a honra e contra a reserva da vida privada.
Deve, no entanto, assinalar-se que é precisamente do texto governamental, que não do da Comissão Revisora, que o princípio vitimológico, já aqui referido pelo Sr. Ministro da Justiça, também necessariamente director de um programa político-criminal, sai enfraquecido.
Na verdade, o Governo abandona definitivamente a criação de um seguro social, previsto no actual artigo 129.º, para assegurar as indemnizações ao lesado.
Aliás, o triângulo lesado, Estado, vítima e a avaliação da efectivação do princípio vitimológico só poderá ser feita depois de conhecidas as alterações ao Código do Processo Penal. Os seus trabalhos preparatórios são desconhecidos pela Assembleia.
Assim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, concluímos que a Assembleia da República teve e tem sobre os seus ombros um trabalho difícil, desmuniciada como está dos elementos fundamentais para que a sua avaliação se não transforme em decisionismo.
Onde, aqui ou além, surgem as iras da lei, a exemplaridade do castigo, situação a que se não conseguiu fugir, como vimos, nos crimes contra a honra e a reserva da vida privada.
Contávamos com o precioso labor da Comissão Revisora, que se suplantou, tentando colmatar a inexistência de um consenso social prévio sobre as alterações e a indefinição do Governo relativamente aos objectivos e metas da política criminal.
No Governo, como resultou da crispação em torno da proposta da Comissão Revisora, há quem considere o Código Penal o instrumento da política criminal por excelência. Mas todos, dentro do Governo, estão de acordo numa política anti-social, geradora de mais delinquência.
Esse é o perigo principal que ameaça o labor daqueles que continuam a acreditar que é possível que o Estado não

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