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23 DE JUNHO DE 1995 3129

O Orador: - Quando os agricultores, os pescadores, os mineiros, se encontram com a agricultura destruída, com a frota caminhando aceleradamente para a extinção e as minas para o encerramento, não é suficiente invocar a tendência europeia, o trend, as estatísticas ou a comparação com países terceiros, do alto de uma tecnologia de mercado que acata as decisões da mão invisível.
Um humanismo responsável tem de vir assumir o amparo desse passivo humano, ferido inevitavelmente por reformas estruturais de que não tem percepção salvo dos efeitos, o qual, entre nós, é largamente tributário de uma condição etária e cultural incompatível com qualquer reconversão.

Aplausos do CDS-PP.

Fala-nos hoje a maioria do regresso ao Estado regulador e esperamos que a proposta intervenção seja a da responsabilidade humanística, com repúdio da insistência num regulador intervencionismo estadual, que temos na vida privada e está a substituir a curiosidade que levou o País à Índia pela curiosidade que leva a espreitar pelo buraco da fechadura dos cidadãos.
Em lugar dessa prática, teria sido mais oportuno olhar para as modificações que se deram na sociedade civil, à revelia da atenção do Estado, e que agora estão a pôr gravemente em causa a sua credibilidade executiva. Não se trata apenas da degradação que se mostra na periferia das cidades mas também nas ruas das cidades grandes e pequenas, onde uma crescente exibição da prostituição, da mendicidade e da suprema derrota dos sem abrigo desmente os optimismos oficiais. Trata-se da mudança que se verifica em toda a Europa, exigindo novas políticas e novos instrumentos, e que entre nós se desenvolveu com algum descaso oficial e proveito do programa das obras públicas.
A questão das minorias culturais, ou étnico-culturais, volta a atingir níveis de risco que a Europa sofreu frequentemente e que agora dizem respeito, em particular, às migrações do Sul para o Norte. Quando a França tem 1O milhões de muçulmanos, vários países da comunidade europeia atingem os 5OOOOO, Londres abriga dois milhões de emigrantes do terceiro mundo e em Roma se ergue uma imponente mesquita em face do Vaticano, é preciso dar atenção aos estudiosos que advertem para a crescente importância do multiculturalismo em face da antiga ambição de generalizar o Estado nacional.

Aplausos do CDS-PP.

O Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, instituído em 1951, tem, por isso, alargado os seus conceitos da área de intervenção e responsabilidades.
Em Portugal, as Ordenações do Reino mantiveram em vigor o capítulo que, discriminatoriamente, definia as minorias, mas a questão desapareceu das percepções metropolitanas desde as intervenções de Sá da Bandeira como Ministro e do Visconde de Seabra como legislador, porque no seu Código Civil apenas o ultramar foi considerado e por ali reinou o Estatuto dos Indígenas até 1961.
Mas a descolonização desencadeou uma emigração dos antigos territórios coloniais em direcção aos mercados de trabalho do Norte, sem que isso impedisse os europeus do Sul de continuarem a emigrar. Entre nós, criaram-se comunidades étnico-culturais que repuseram em alguma medida a colorida paisagem humana oitocentista. Graves incidentes recentes suscitaram um debate sobre o racismo, que ou fez apelo à tradicional maneira portuguesa de lidar com etnias diferentes, ou apelou para uma categoria de crimes contra a portugalidade, ou incriminou a intolerância dos brancos. De facto, o trabalho da UNESCO sobre os mitos raciais, publicado na década de 6O, volta a ser um texto recomendável à leitura dos governos, de modo a evitar que a questão fique centrada em planos ideológicos ou dogmáticos.
Não há que discutir ou diminuir um património português que, certamente com passivos, apresenta realizações como Cabo Verde, exemplo de integração étnica e cultural. Mas não se pode ignorar que existem leis sociológicas que desencadeiam acções violadoras desses códigos; mercado de trabalho e as relações sexuais são os factos que merecem maior atenção da UNESCO.
Entre nós, foi instituída uma comunidade africana que nos dizem atingir, em Lisboa, 1OOOOO pessoas, das quais um terço constitui uma força de trabalho clandestina, explorada até em áreas de obras públicas. Esta força jovem, tal como aconteceu com os europeus que miscigenaram os trópicos, em regra não tem mulher, e sobre isso adverte a UNESCO. No caso, inevitável, de o Governo português aplicar a directiva comunitária que manda proporcionar a reunião das famílias dos trabalhadores emigrantes, a comunidade crescerá apreciavelmente. Os desbordos desta questão para a marginalidade estão à vista e a cadeia de reacção está em curso.
O fenómeno avolumou-se, sem qualquer advertida política de legalização, integração e assimilação, que deve incluir a instrução escolar. E necessário que qualquer governo reconheça que este fenómeno exige assumir uma política multicultural responsável, que esta questão não é de super-esquadras nem de tranquilização dos portugueses pelo exame comparativo das estatísticas, que todos os passivos e marginalidades concorrem para o crescimento da criminalidade que aflige a população e que a tranquilidade não regressa com a cuidadosa distinção entre insegurança subjectiva e objectiva.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - O que se passou, na área dos conflitos raciais, é um aviso sério e um sintoma preocupantíssimo. Mas essa preocupação aumenta quando a população desespera, organiza a prevenção e a repressão privadas, cria milícias e pressiona os autarcas no sentido de criaram polícias privativas. Tudo coisas de repudiar, mas todas alarmantemente significativas da quebra de confiança no Estado, um estado de espírito da Nação que não adianta amenizar por via semântica.
O projecto de uma comunidade dos países de expressão oficial portuguesa, que umas vezes parece acarinhado e, outras, posto em dúvida, será necessariamente afectado por estas questões. E tudo mais uma vez nos reconduz à prioridade da educação.
A série de ministros que se sucederam sob a regência do mesmo Primeiro-Ministro são demonstração suficiente de que maioria absoluta e estabilidade não são coincidentes.
Desde sempre, houve quem notasse que, para além da importância e gravidade da questão sobre cuja prioridade todos concordam, o instrumento que se chama Ministério da Educação não é adequado, não é manejável, não é ele próprio facilmente governável. Por isso, antes e depois de 1975, nunca se conseguiu fazer coincidir um bom discurso educativo com uma boa intervenção no aparelho e sem ambas as coisas não se obterão resultados animadores. A década não conseguiu essa convergência, embora

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