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23 DE JULHO DE 1997 3669

Tratado da União Europeia; a França, na sequência da vitória do partido socialista, dos ecologistas, enfim, da esquerda, suscitou o problema de não estar de acordo com o Pacto de Estabilidade e colocou-o na Cimeira de Amsterdão. Naturalmente, poder-se-ia dizer - e já ouvimos o Ministro das Finanças fazê-lo nesta tribuna - que o Pacto de Estabilidade é uma mera e inelutável consequência do Tratado da União Europeia, não podendo ser posto em causa. Mas foi! E foi-o por vontade do povo francês, do governo francês, e não seria aplicado se efectivamente tivesse havido condições para tal.
Por isso mesmo, dizemos que o povo português e esta Assembleia têm o direito de, na sequência da revisão da Constituição e se fosse essa a vontade do poder de revisão constitucional, se pronunciar sobre a questão de saber se e quando queria a moeda única e se eventualmente pretendia essas prioridades. Mal estaríamos se, como ainda aconteceu esta tarde, ouvíssemos invocar a necessidade de sermos bons alunos,...

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Olha se não fôssemos!

O Orador: - ... de não perturbar o caminho para a moeda única - e isto a propósito do artigo 105.º sobre o Banco de Portugal - e, à noite, disséssemos que estamos obrigados, que o caminho é inevitável e que nada, absolutamente nada, nem a vontade do povo português, pode impedir. que assim seja.
Naturalmente, é preciso que, nesta matéria, haja um mínimo de decoro. E, a propósito de decoro, convém ainda chamar a atenção para o seguinte aspecto: quando o artigo 256.º foi acordado pelo PS e pelo PSD, os dois partidos afirmaram, e bem, que não se tratava de perguntar ao povo português se queria ou não as regiões administrativas;...

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!

O Orador: - ... tratava-se, sim, de perguntar se queria as regiões administrativas tal como estavam estabelecidas na lei. Ora, isto significa que, nesta matéria, era a vontade soberana, maioritária, desta Assembleia da República que era sujeita a referendo. E a minha pergunta é esta: por que é que a vontade desta Assembleia é sujeita a referendo no caso das regiões administrativas e não o pode ser no caso da moeda única?

O Sr. João Amaral (PCP): - Bem perguntado!

O Orador: - Evidentemente, há aqui uma duplicidade de critérios. Duplicidade de critérios que leva, aliás, a ouvir também com muita frequência o seguinte: quando ouvimos falar de moeda única ou de aspectos que convém meter debaixo da mesa, diz-se imediatamente que "há uma vontade da Assembleia da República", "a Assembleia da República votou"; quando não convém, como aconteceu, por exemplo, com as regiões administrativas, ouvimos dizer imediatamente - e o líder do PSD disse-o amplamente - que "a Assembleia da República não tem legitimidade para decidir uma tal questão, ela tem de ser sujeita a referendo". Isto é, há também aqui uma duplicidade de critérios.
O problema que temos em cima da mesa e que, a meu ver, é muito claro é este: temos de consagrar a viabilização da democracia directa, nisso estamos de acordo, e este facto é importante. Mas não é a democracia directa para fazer traquinices, tropelias, isto é, para usá-la contra a democracia representativa, quando convém, e para escondê-la quando não convém.
A propósito desta questão, quero colocar um outro problema, o dos referendos acerca de tratados que têm a ver, corri o n.º 6 do artigo 7.º, ou seja, de tratados que dizem respeito à construção da união europeia. E para quê? Para dizer, também aqui, o seguinte: não me congratulo tanto como o PP nesta matéria. E, desde logo, porquê? Porque pode dar-se o caso de haver um tratado nos termos do qual Portugal não tem direito a um comissário europeu - isso é algo que está desenhado e muitos de nós pronunciámo-nos sobre esta matéria - e, então, o referendo sobre um tal tratado pode dizer algo muito simples: pode perguntar se as pessoas estão de acordo com o reforço de verbas a Portugal para garantir a coesão económica e social, se estão de acordo com o reforço de políticas sociais, se estão de acordo com o reforço da política de emprego, e esquecer o problema de Portugal não ter um comissário europeu sobre esta matéria. Isto é, o que é referendado não é o tratado no seu conjunto, mas as questões politicamente correctas que o poder político, a maioria - eventualmente, a mesma maioria de revisão constitucional, que aqui se desenhou e que normalmente funciona também para as questões comunitárias -, entender que convém para obter resultados pré-determinados. E a prova disto é, neste momento, a situação que temos em cima da mesa: não relativamente à moeda única, parque isso já está decidido - e creio que já vimos que, independentemente de estar previsto no Tratado da União Europeia, o problema do "se", do "quando", do caminho, é um problema da decisão soberana de cada povo. Alguma coisa nos impede, por exemplo, de aumentarmos o défice do Orçamento do Estado e de, com isso, Portugal não entrar para a moeda única imediatamente? Por acaso, algum dos Srs. Deputados defende que o Governo português está privado de apresentar uma proposta de lei de Orçamento do Estado, que, em vez de 3% de défice, tenha 3,15% ou 3,05%? Naturalmente que não!
Assim, convém que, nesta matéria, haja um mínimo de contenção e de coerência e, já agora, se reduza ao mínimo a hipocrisia.
Uma outra questão que quero colocar neste plano é a seguinte: o n.º 2 adianta a proposta de iniciativa dos cidadãos. A iniciativa dos cidadãos é importante, trata-se de mais uma questão que é remetida para a lei ordinária mas, naturalmente, tem um significado.
Entretanto, gostaria de sublinhar que o que está aqui previsto é uma petição qualificada e não um direito de os cidadãos, eventualmente um número muito elevado de cidadãos, verem a respectiva proposta de referendo ter seguimento.
De resto, é esta a questão que se coloca, e que o Sr. Deputado Jorge Lacão referiu, em relação à matéria da iniciativa legislativa.
Um outro problema que quero referir é o de voto dos emigrantes no referendo.
O que se desenha desde já nesta matéria - e basta ouvir com atenção os Srs. Deputados do PSD e do PS é de duas uma: ou uma constante abdicação do PS, como, aliás, tem sido muito frequente, ou, então, um conjunto de problemas que vão substituir o consenso constitucional por um permanente conflito sobre as mais diferentes questões. Ou seja, em matéria de sistema eleitoral da Assembleia da República, já temos remissão para a lei ordiná-