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0026 | I Série - Número 01 | 20 de Setembro de 2001

 

sendo uma delas a do património adquirido cinco anos antes da notificação inicial, o que me parece uma comparação com a chamada prescrição fiscal. A explicação que se dá é a de que a pessoa pode ter-se esquecido do modo como, cinco anos antes, «amealhou», de como arranjou o seu património. Bem, acho que cinco anos é um espaço de tempo muito curto para que alguém, para mais suspeito de crime, não se lembre se a apropriação foi lícita ou ilícita!… Mas, vá lá, formalmente diz-se que em cinco anos o arguido já caiu na amnésia, não se lembra de onde lhe veio o dinheiro...
No entanto, o problema que se suscita é que não se afasta do património o que ele herdou, a não ser que o próprio de cujus tivesse incorrido num dinheiro sujo!

O Sr. Presidente: - Terminou o seu tempo, Sr. Deputado.

O Orador: - Em segundo lugar, coloca-se o problema de saber da boa fé dos terceiros na cadeia de transmissão e, portanto, a prevalência do registo predial dos terceiros adquirentes de boa fé, não no elo imediato, mas a seguir, aqueles que foram transmitindo, também não está devidamente solucionada.
Em terceiro lugar, considero existir um problema no que diz respeito à corrupção passiva, do que falarei mais tarde, em intervenção que irei proferir.
Finalmente, uma outra questão: a corrupção dos privados. Sr. Ministro, não acha que a corrupção dos privados deveria aguardar uma queixa em vez de ser considerada um crime público?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça: - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, creio que a questão essencial quanto ao objecto deste diploma é a que sublinhou. Hoje, na articulação entre as redes criminosas, deixou de haver uma separação efectiva entre o crime de colarinho branco e os crimes de sangue. Hoje, o homem do colarinho branco tem as mãos sujas de sangue.
De facto, trata-se de uma cadeia contínua: o dinheiro é gerado no tráfico, é branqueado e é reinvestido. Aliás, nos últimos dias, tivemos a oportunidade de ler na comunicação social a grande diferença que existe entre o terrorismo dos dias de hoje e o terrorismo dos anos 60 e 70. Nessa altura, o terrorismo punha bombas na Bolsa; hoje, o terrorista investe na Bolsa e obtém nela o dinheiro para a sua acção terrorista.
Portanto, isto implica que mudemos, muito claramente, o nosso paradigma relativamente ao tipo de criminalidade com que estamos a lidar e quanto aos mecanismos que temos de utilizar para combater esta criminalidade. Creio que isso ajudará muito ao debate sobre a relevação dos sigilos fiscal e bancário, para percebermos que esse é hoje um instrumento fundamental para o combate a esta criminalidade. Em vez do velho brocardo «cherchez la femme», agora é necessário dizer «cherchez l'argent» para descobrir o criminoso.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Se disser «cherchez l'homme», também não está mal.

O Orador: - Estamos totalmente abertos, como é evidente, para, em sede de especialidade, trabalharmos as questões técnicas.
O facto de termos relevado o património com mais de cinco anos tem a ver com o seguinte: ao condenado é imposto o ónus de provar a licitude e, portanto, limitámo-nos aos cinco anos porque esse é o prazo hoje vigente na ordem jurídica portuguesa para conservar a documentação para efeitos fiscais. Receámos que alargar esse prazo fosse, no fundo, prejudicar pessoas que, não tendo de conservar a documentação, poderiam ter dificuldades em provar.
Quanto ao património herdado, esse está relevado, porque a herança é, à partida, uma forma totalmente lícita de aquisição do património, salvo se, de alguma forma, o condenado tiver contribuído para que o detentor anterior do património se tivesse convertido em de cujus. Mas esta é uma das situações relativamente fáceis de provar a origem lícita do património.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr. Ministro, a questão que quero colocar tem a ver, sobretudo, mas não apenas, com a proposta de lei n.º 94/VIII, que estabelece medidas de combate à criminalidade organizada e económico-financeira, justamente para chamar à colação deste debate uma questão que tivemos oportunidade de discutir não há muito tempo, em Março de 2001, a propósito de uma iniciativa do Partido Comunista Português, sobre a qual o Sr. Ministro, nesse debate, se pronunciou.
Quero recordar ao Sr. Ministro uma passagem da intervenção que então aqui fez, onde disse, designadamente, entre outras coisas: «Acreditamos que é possível desenhar um procedimento que, mantendo a intervenção do juiz, permita uma investigação criminal eficaz». E explicou depois como, dizendo, designadamente, que o sigilo devia e podia ser levantado, genericamente, por um certo período, como forma de contornar as dificuldades e as morosidades que se criam num procedimento que pode obstaculizar e obstar a uma eficiente investigação, que todos desejamos, em relação a esta matéria. No entanto, o que verificamos é que nesta proposta de lei se prescinde, em muitas circunstâncias, da intervenção necessária do juiz para o levantamento do sigilo, designadamente do sigilo bancário.
Sr. Ministro, nós não somos contra o levantamento do sigilo bancário, mas julgamos que estamos numa área que faz parte e integra, até nos termos da Constituição, um conjunto de direitos dos cidadãos, quaisquer que eles sejam, que têm de ser acautelados e respeitados. E não vemos, como não via o Sr. Ministro em Março deste ano, que a intervenção necessária de um juiz, sobretudo em processos especiais como este, possa obstar e possa obstaculizar a essa eficiência da investigação, acrescentando, por um lado, uma coisa que nos parece muito significativa e que é uma especial garantia ao cidadão - a qualquer cidadão -, sobretudo nestas fases do processo, de que há uma avaliação imparcial e isenta, que é própria da magistratura judicial, em relação ao pedido que é feito pelas entidades que investigam. Não vemos por que é que o Ministério Público estará melhor colocado para proceder da forma que aqui vem prevista e vem proposta