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1052 | I Série - Número 026 | 03 de Dezembro de 2001

 

Srs. Deputados, este é, com certeza, o Orçamento do «Inverno do nosso descontentamento»!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Em representação do Grupo Parlamentar do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Vicente Merendas.

O Sr. Vicente Merendas (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Para nós, Grupo Parlamentar do PCP, o debate que acabámos de travar sobre as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 2002 não foi um debate a fingir de sério, um ritual parlamentar ou um jogo de oratória.
Nós não fazemos do Orçamento do Estado um mero exercício de contabilidade pública, nem das GOP uma inofensiva síntese das boas intenções e de planos perdidos do Governo.
Não, este, como outros Orçamentos, estabelece opções estratégicas para o País, concretiza políticas, determina orientações para o investimento público e para a redistribuição da riqueza nacional. Opta entre interesses económicos e sociais, divergentes e contraditórios e faz opções de classe.
No debate e votações que acabámos de fazer estiveram presentes, em sentidos diversos, as recentes lutas dos trabalhadores portugueses, em particular as concentrações e manifestações de 7 de Novembro por melhores salários e qualidade do emprego,…

Aplausos do PCP.

… as lutas dos estudantes do ensino superior, que vieram até nós reclamar meios para uma universidade melhor,…

Aplausos do PCP.

… as lutas dos reformados contra as pensões degradadas e por aumentos adequados e, com muita força, as lutas dos trabalhadores da função pública.

Aplausos do PCP.

Mas também as preocupações de importantes sectores do pequeno e médio empresariado português pelo abocanhar das margens de lucro e do mercado pelos grandes grupos da distribuição e da finança, pelas políticas económicas do Governo. Estiveram presentes no debate as 191 514 assinaturas de portugueses e portuguesas que reclamam melhores salários.
A estas lutas e preocupações correspondeu o PCP com inúmeras propostas de alteração, para procurar garantir que os trabalhadores da função pública vissem valorizados os seus vencimentos e não registassem, pelo terceiro ano consecutivo, uma perda do poder de compra e para, assim, se definir, também para 2002, um referencial que significasse um aumento real nos salários dos trabalhadores portugueses.
São propostas para uma revalorização das pensões de reforma; propostas para reforçar os recursos financeiros do ensino superior público e da acção social escolar, permitindo que as bolsas de estudo fossem pagas 11 meses por ano; propostas para corrigir e melhorar o PIDDAC; propostas para garantir um Serviço Nacional de Saúde público de qualidade e com meios suficientes, opondo-nos aos processos em curso de privatização de um importante conjunto de hospitais; propostas para travar a contra-reforma fiscal presente na proposta de Orçamento do Estado, assegurando os princípios de justiça e de equidade fiscal.
A estas e a muitas outras propostas para defender os interesses dos trabalhadores, dos reformados e da generalidade do povo português, o Grupo Parlamentar do PS disse «nada»! Salvou-se apenas a proposta que compromete o Governo ao aumento gradual e progressivo das comparticipações do regime geral para as próteses, ortóteses e ajudas técnicas, equiparando-as às da ADSE.
Mas também as pressões e chantagens dos grandes grupos financeiros, em defesa dos seus interesses, estiveram presentes (e de que forma!) no debate orçamental. A batalha contra a reforma fiscal, a batalha pela desregulamentação do mercado de trabalho e pela privatização de funções e sectores do Estado. Recordemos «Uma Nova Ambição para Portugal», divulgada por uma associação empresarial que, com pompa e circunstância, em vésperas do debate orçamental, lançou o apelo ao «emagrecimento» do Estado, com o despedimento de 150 000 trabalhadores da função pública e onde se defendeu não dever existir «receio de aumentar o desemprego».
A estas «lutas» e reclamações do grande patronato o Governo e o PS disseram «tudo». É ver como o Grupo Parlamentar do PS confirmou e consolidou, em sede de debate na especialidade, com dezenas de novas propostas, corrigidas às vezes uma e duas vezes, a contra-reforma fiscal.
São razões da nossa profunda crítica, da nossa radical oposição a estas Grandes Opções do Plano e ao Orçamento do Estado alguns outros aspectos que queremos ainda salientar, como sejam a perversidade económica e orçamental que o Pacto de Estabilidade, que enquadra a elaboração deste Orçamento, introduz na transparência das contas públicas, no empolamento de cenários económicos, no iludir dos problemas financeiros de médio e longo prazo para o País, através da desorçamentação sistemática, explicitada ou não, e a manipulação de números e índices para que todos nos convençamos de que tudo corre pelo melhor, no melhor dos mundos. E também o milagre da multiplicação dos orçamentos rectificativos… Ou ainda a constatação de um Orçamento que agrava as desigualdades sociais e assimetrias regionais e não responde aos problemas centrais da economia nacional, em particular dos sectores produtivos.
Este é um Orçamento que afirmamos não corresponder ao que a propaganda do Governo e do PS dele proclamam. Não é um Orçamento virado para o social, como os valores das pensões e das reformas para 2002 decididas pelo Governo bem demonstram. Não é um Orçamento virado para o interior e o mundo rural, como resulta claro da distribuição das verbas do PIDDAC e do III Quadro Comunitário de Apoio e, em particular, das políticas e orientações de investimento do Ministério da Agricultura.
Este é um Orçamento com um PIDDAC verdadeira gelatina em plano inclinado, deslizando de ano para ano, paralisando e adiando investimentos estruturantes e nucleares para a defesa da qualidade de vida dos portugueses. Trata-se de um investimento que, em parte substancial, o Estado não orienta, não projecta, antes segue ao ritmo dos impulsos de um investimento privado de que nem o Governo se atreve a quantificar a evolução.