I SÉRIE — NÚMERO 7
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O Sr. Presidente: — Não havendo pedidos de esclarecimento, tem a palavra, para uma intervenção, a Sr.ª
Deputada Isabel Pires, do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A discussão sobre a Europa e sobre o
projeto europeu é um debate sempre pertinente, mas deve ser um debate sério e crítico, coisa que não nos é
proposta hoje pelo PSD e pelo CDS.
O projeto que nos apresentam não traz nada de novo, não responde a nenhum debate em curso neste
momento na Europa e não pretende sequer discutir a própria Europa. Serve apenas e só para o jogo político
marcado pelo desespero do PSD e do CDS. É uma espécie de renovação de votos para a fotografia, que não
será por amor mas apenas por conveniência política.
Esta é a proposta e o debate dos mesmos PSD e CDS que, durante quatro anos, foram subservientes às
ordens de Merkel, daqueles que acham que à Europa da austeridade não se pode mudar uma única vírgula,
que as regras europeias são gravadas na rocha e que os cortes são o único objetivo das políticas públicas. E é
por causa desse seguidismo cego que o PSD e o CDS nos apresentam um projeto sem crítica à
burocratização da União Europeia, à degradação da democracia, à falta da participação popular e à
proliferação de espaços de decisão que fogem ao escrutínio. Falta até a crítica à Europa que se fecha em
muros, que nega valores fundamentais, como o da solidariedade entre os povos, ou que cala e consente a
agenda extremista de direita de vários governos europeus.
O Bloco de Esquerda não tem uma visão imobilista da Europa, nem desistimos, como europeístas
convictos que somos, de lutar por uma Europa que valha a pena, que não diga que os bancos são mais
importantes do que as pessoas, que se una na solidariedade entre os povos e na melhoria concreta da vida
das pessoas.
Aplausos do BE.
A Europa de hoje está a fragmentar-se. Esta é a Europa de Merkel e Schäuble, Juncker e Dijsselbloem. A
Europa em que há países de primeira e países de segunda.
Os países de primeira moldam as regras à sua vontade, mas também as violam quando e porque querem;
os países de segunda são sempre obedientes, sempre subservientes, para quem as regras são draconianas.
É isto que vemos acontecer com o tratado orçamental. Não é novidade que o Bloco de Esquerda sempre
se opôs a este Tratado. É um Tratado que não foi referendado pelos povos, nem tão-pouco a sua discussão
existiu na esfera pública, por mais tentativas que fossem feitas, e elas foram!
O tratado orçamental é, assim, um instrumento de imposição e obrigação que paira sobre os países da
Europa, obrigando-os a cumprirem metas para o défice e para a dívida que são, virtualmente, impossíveis de
cumprir. E em nome destas metas são os povos sujeitos a pesados planos de austeridade, como temos
assistido, provocando desemprego, corte de rendimentos do trabalho, corte de pensões, destruição do Serviço
Nacional de Saúde e de educação, o abandono completo do Estado social.
PSD e CDS não questionam o tratado orçamental, porque esta é a sua melhor desculpa para a sua
verdadeira agenda política e ai de quem ouse questionar uma vírgula que seja do documento.
No entanto, convém reavivar a memória do PSD e do CDS sobre posições, não tão longínquas quanto isso,
de alguns dos seus dirigentes: Manuela Ferreira Leite referiu que as exigências do tratado orçamental são
inexequíveis e que, a serem concretizáveis, serão «muito penosas». Dizia ela o seguinte: «Não há política
orçamental que resista a uma tal restrição orçamental». Que ousadia, realmente!
Mas também Bagão Félix, ex-Ministro das Finanças, disse: «O tratado orçamental foi criado para não ser
cumprido».
Sr.as
e Srs. Deputados do PSD e do CDS, são figuras de referência da vossa área política que proferiram
estas declarações. O que lhes dizem?! Ou, mais simplesmente, o que dizem às pessoas? Se um governo
quiser mudar na Europa a política de empobrecimento, estarão de que lado? Do lado de Ferreira Leite e
Bagão Félix, que dizem que o tratado orçamental é irresponsável? Ou do lado de Merkel que diz que é para
cumprir, custe o que custar? Esta é a verdadeira pergunta a que PSD e CDS deveriam responder e não o
fazem. Já conhecemos o currículo dos defensores do tratado orçamental: «custe o que custar».