I SÉRIE — NÚMERO 82
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O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, a proposta do Governo que concretiza no plano criminal a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção
tem aspetos positivos, tem aspetos negativos e tem um ruidosíssimo silêncio.
A ausência de iniciativa do Governo sobre criminalização do enriquecimento injustificado foi explicada pela
Sr.ª Ministra pela suposta falta de necessidade de operar essa transformação da ordem jurídica portuguesa.
Esta falta de comparência, que a tardia iniciativa do Partido Socialista não disfarça, deixa a estratégia sem a
ambição de ir ao essencial, o que registamos.
Há pontos positivos que queremos registar também. A alteração dos prazos de prescrição, o alargamento da
aplicação da suspensão provisória de processo e, muito em especial, as alterações às regras sobre conexão e
separação de processos são, em nosso entender, contributos positivos para o combate a comportamentos
corruptivos.
Há, todavia, uma escolha do Governo que nos merece a maior reserva. Refiro-me à centralidade conferida
na proposta aos prémios penais e à negociação de sentenças. Bem sei que a Sr.ª Ministra justificará — como
já o fez aqui — esta escolha com o argumento do costume: que tudo isto já está na lei e que se tratou apenas
de concretizar. Mas não é assim.
Por exemplo, a atenuação especial de pena para os arguidos que colaborem até ao encerramento da
audiência de julgamento de primeira instância — repito, até ao encerramento da audiência de julgamento de
primeira instância! — é um escancarar de portas a uma forma perversa de processo penal da confissão
negociada, no lugar de um processo penal da investigação qualificada.
Uma estratégia séria de combate à corrupção implica dotar a investigação criminal de meios humanos,
técnicos e materiais mais fortes que os que estão ao dispor do mundo da corrupção. Mas o Governo escolheu
o caminho mais fácil e mais barato, que é o do direito premial aditivado.
Sr.ª Ministra, lembrar-se-á, certamente, de um Papa que, algures pelo século XV, concedeu indulgência
plenária a todos os pecadores que redimissem os seus pecados contribuindo financeiramente para as obras da
Basílica de S. Pedro. A pergunta é se o Governo quer enveredar por uma política de indulgências a troco de
confissões ou se quer ser determinado no reforço das condições de atuação dos órgãos de investigação criminal
contra a corrupção.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Carlos Peixoto, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. Carlos Peixoto (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, o PSD apresentou propostas na área do direito penal, do processo penal e também da ocultação
de riqueza, apresentando, neste caso, uma solução que, não sendo a mais espampanante, é, no nosso
entender, a mais eficaz de todas.
O Governo, nesta matéria, ficou estranhamente fora de jogo. Mostrou algum desdém pela criminalização do
enriquecimento injustificado ou ilícito, ou ocultação de riqueza, e ainda não explicou bem porquê. Acho que é
altura de o fazer hoje.
Mas uma coisa deve ser dita, Sr.ª Ministra, e também já aqui foi referida: não há boas leis com maus recursos
e com fracos meios e investimentos na investigação criminal. E o Governo, que tinha a obrigação de apresentar
um plano para quatro anos relativamente ao investimento na investigação criminal, ainda não o fez.
Portanto, também não há boas leis com más práticas e, em Portugal, nesta matéria, não temos estado bem
frequentados.
Sr.ª Ministra, deixe-me falar-lhe de uma outra dimensão do problema. O PSD tem algum tempo no debate e
falará, depois, de todas as propostas que estão em discussão. Sr.ª Ministra, concordará comigo que, enquanto
avançarmos a passos largos no sentido de nos tornarmos a Nação mais pobre da Europa, enquanto formos
pedintes da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu, enquanto o Governo subsidiar a comunicação
social e enquanto o poder socialista sufocar e se apropriar do Estado, viveremos sempre numa democracia