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II Série — Suplemento ao número 62 Quarta-feira, 19 de Abril de 1978

DIARIO

da Assembleia da República

I LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1977-1978)

SUMÁRIO

Relatório do Provedor de Justiça referente ao ano de 1977.

Lisboa, Março de 1978.

Sr. Presidente da Assembleia da República: Excelência:

Tenho a honra de fazer entrega a V. Ex.ª do relatório das actividades do Serviço do Provedor de Justiça relativo ao ano de 1977, cumprindo assim o disposto no artigo 21.°, n.° 1, da Lei n.° 81/77, e a fim de que o mesmo seja publicado no Diário da Assembleia da República.

Na sua elaboração —que, tal como a do relatório de 1976, não é obra individual do Provedor, mas o somatório do trabalho deste com o adjunto do Pro-

vedor, os coordenadores e o sector de documentação— houve o propósito de seguir a mesma orientação do relatório anterior, para mais facilmente proporcionar a comparação dos dados, e de levar ao conhecimento da Assembleia da República os aspectos mais relevantes da actividade do Serviço, de forma a habilitar os Srs. Deputados a ajuizar do trabalho realizado e dos resultados obtidos.

Manifestando a V. Ex.ª a mais elevada consideração pessoal pela Assembleia da República a que dignamente preside, apresento-lhe os meus melhores cumprimentos.

O Provedor de Justiça, José Magalhães Godinho.

RELATÓRIO DO PROVEDOR DE JUSTIÇA À ASSEMBLEIA

DA REPÚBLICA (1977)

I

Estatuto do Provedor da Justiça

Logo após a sua tomada de posse (12 de Novembro de 1976), o Provedor dedicou-se ao estudo dos De-cretos-Leis n.os 212/75, de 21 de Abril, e 120/76, de 11 de Fevereiro, que institucionalizaram o Provedor de Justiça, por entender que se impunha a sua substituição por um diploma único e actual.

Essa imposição resultava não só da necessidade de adaptar a instituição aos preceitos constitucionais que a haviam consagrado, mas ainda de definir o seu estatuto à luz do que a experiência já tinha revelado.

Por isso, e sem esquecer que a legislação nacional deve ser elaborada de harmonia com as características próprias do nosso país, das nossas instituições, do nosso sistema e da nossa maneira de ser e de viver, debruçou-se sobre os diplomas que em outras nações

com maior experiência de instituições desta natureza definiram a sua competência e as regras do seu funcionamento, do projecto de lei da autoria do Dr. Jorge Miranda apresentado à Assembleia da República pelo Grupo Parlamentar do PSD (de que, por amável deferência, obteve uma cópia) e viria a constituir o n.° 10/I.

Assim, veio a elaborar um projecto que em reuniões sucessivas foi estudado, discutido, melhorado e, por último, redigido em definitivo, entre o Provedor, Provedor-Adjunto, coordenadores e todos os assessores do Serviço do Provedor de Justiça.

Isto possibilitou que, tendo sido recebido do presidente da 1.º Comissão —Assuntos Constitucionais — da Assembleia da República, em 26 de Janeiro, um ofício em que se solicitava o envio dos elementos, sugestões e pareceres que entendesse por conveniente sobre o referido projecto n.° 10/I, logo em 31 do mesmo mês remetesse àquela Comissão as observa-

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ções e sugestões elaboradas com a colaboração já referida do sector técnico do Serviço do Provedor de Justiça e, bem assim, o projecto acima referido, elaborado nas mesmas condições.

Afigura-se de interesse, e por isso se faz, a transcrição neste relatório dessas observações e desse projecto e do ofício que os acompanhou:

Lisboa, 31 de Janeiro de 1977.

Ex.mo Sr. Deputado Vital Martins Moreira, presidente da 1.° Comissão —Assuntos Constitucionais— da Assembleia da República, Palácio de S. Bento, Lisboa:

Sr. Presidente:

Em seguimento do meu ofício de 26 do corrente, tenho a honra de, em anexo, enviar a V. Ex.ª as observações e sugestões relativas ao projecto de lei n.° 10/I, elaboradas depois de audição dos colaboradores do Serviço do Provedor de Justiça, bem como de um projecto versando a mesma matéria e elaborado nas mesmas condições.

Confio inteiramente não só no alto critério dessa Comissão, como no da Assembleia no seu plenário, para que venha a ser aprovada uma lei que corresponda às necessidades de operacionalidade do Provedor de Justiça, defenda a dignidade e independência do seu cargo e lhe permita ser, efectivamente, um guardião dos direitos, liberdades e garantias individuais e um garante da justiça e legalidade da Administração.

Colocando-me ao inteiro dispor de V. Ex.ª e da Comissão a que preside, apresento-lhe, Sr. Presidente, com os protestos da minha consideração, os meus melhores cumprimentos.

O Provedor de Justiça.

Observações e sugestões quanto ao projecto de lei n.° 10/I — Provedor de Justiça

Do relatório do Decreto-Lei n.° 212/75, de 21 de Abril, que criou o cargo de Provedor de Justiça na sequência e em cumprimento da aprovação, em 20 de Setembro de 1974, pelo Conselho de Ministros, do PJano de Acção do Ministério da Justiça, transcreve--se, em justificação da criação do cargo, o que a tal respeito se consignava nesse Plano:

Jnstituir-se-á entre nós o ombudsman, que visará fundamentalmente assegurar a justiça e a legalidade da Administração através de meios informais. Trata-se de uma inovação que satisfará indiscutivelmente os profundos anseios de justiça do povo, extremamente económica no seu funcionamento e de resultados apreciáveis noutros países, quer pela fiscalização imediata, quer na preparação de reformas (v. g. administração, prisões, polícias, corrupção, etc).

Mais adiante, o mesmo relatório, depois de se explicitar a função e âmbito de actuação do Provedor, salientava-se:

Contactando directa e informalmente com os cidadãos, agindo num plano de absoluta e rigorosa independência relativamente a todos os ór-

gãos da Administração, movimentando-se por iniciativa própria ou na sequência das reclamações que lhe sejam dirigidas, com acesso aberto e imediato a lodos os sectores administrativos, podendo efectuar as inspecções, interrogatórios e exames que houver por necessários, o Provedor de Justiça constituirá um garante dos direitos e liberdades dos cidadãos e um factor decisivo numa verdadeira e autêntica democratização da vida nacional.

O articulado do citado decreto-lei, se bem que hoje se possa considerar insuficiente, traduz, todavia, este pensamento do legislador, e todo ele está impregnado do espírito de conferir ao Provedor de Justiça a maior dignidade, independência e liberdade de movimentação, de forma que ele esteja em condições de desempenhar todas as suas funções, entre as quais se conta a fiscalização dos actos não políticos dos Ministros, ou seja, os praticados na superintendência da Administração Pública.

A garantia da eficácia da acção do Provedor tem de assentar —além da autonomia administrativa e financeira do seu Serviço, aspecto a considerar na respectiva lei orgânica — em dois pilares essenciais, sem o que a instituição perde a sua razão de ser, visto faltar-lhe a liberdade de movimentação, a rapidez de actuação, a discrição da sua acção. Esses pilares são: a iniciativa própria, com fácil e imediato acesso a todos os sectores da Administração, sem necessidade de autorização especial ou pré-aviso, por um lado, e o contacto directo entre os cidadãos e o Provedor de Justiça, através da publicidade dos seus relatórios e de comunicados a difundir pelos órgãos de comunicação social, por outro.

Tirando-se ao Provedor a iniciativa própria, transforma-se a instituição em simples caixa de correio para receber queixas, em mais uma repartição pública, que depressa se burocratizará e que de nenhum modo serve o elevado fim que presidiu à sua criação.

E não se compreende que o Provedor possa solicitar ao Conselho da Revolução que aprecie e declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de quaisquer normas e não possa ter a iniciativa de propor e recomendar a revogação, alteração ou integração de lacunas em diplomas legais obsoletos, deficientes ou incompletos, nem possa, sem que receba queixa de um detido, ir visitar sem pré-aviso, por sua própria iniciativa, um estabelecimento prisional para, por si, verificar como são tratados os presos e respeitados os direitos humanos.

Tão-pouco se compreende que se chegar ao seu conhecimento, sem ser por queixa directa, a suspeita de que se estão praticando actos discriminatórios, que podem até envolver corrupção, num sector da Administração Pública, numa autarquia local ou numa empresa nacionalizada, não possa o Provedor ir imediatamente averiguar o que se passa, para que, s'e for caso disso, a recomendação sua, se ponha termo a tal arbitrariedade, abuso ou imoralidade ou para que não seja afectado o prestígio e dignidade do serviço sobre o qual se insinuava a possibilidade de actuação incorrecta.

Por outro lado, não é admissível que o Provedor possa inquirir um acto de superintendência na Administração praticado por um Ministro e tenha categoria inferior à deste.

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Embora não tenha sido, disso se está seguro, intenção do projecto n.° 10/I minimizar o cargo do Provedor de Justiça, a verdade é que ele não atentou nestes aspectos, e, se ele fosse aprovado, a instituição sairia diminuída, até porque não é compreensível que, antes de o cargo ter dignidade constitucional, hoje consagrada no artigo 24.º da Constituição, o Provedor tivesse iniciativa própria e categoria, honras e regalias idénticas às de Ministro, que o Decreto-Lei n.° 212/75 lhe atribuía, e, depois da consagração constitucional, se lhe retirem essas iniciativas, categoria, honras e regalias.

Para além destas observações, há que considerar outras que o projecto n.° 10/I nos sugere e que, de seguida, se procurarão resumir:

1) Quanto à sistematização, afigura-se que a do

projecto não é a melhor. Cresse que, destinando-se o diploma a estabelecer o Estatuto do Provedor de Justiça, o capítulo 1.º deverá ser precisamente o que dele se ocupa.

Ora, no projecto essa matéria é relegada para o capítulo II. Igualmente se entende que deve ser no capítulo I que devem incluir--se as disposições relativas ao Provedor--Adjunto, não só porque este substitui o Provedor nos seus impedimentos, como porque parte dessas disposições têm de ser comuns.

2) O projecto não contempla certos aspectos que

se entende nele deviam estar contemplados. Assim:

a) Pensa-se que a dignidade do cargo

impõe que o Provedor não seja eleito por uma escassa maioria de Deputados presentes, mas, quando se ocupa da sua designação pela Assembleia da República, nada diz sobre tal assunto, sendo certo que deveria exigir para a eleição a maioria do número de Deputadas que compõem a Assembleia;

b) Não prevê a destituição do Provedor

pela Assembleia da República, e a verdade é que esta deve poder destituí-lo se entender que ele deixou de merecer a sua confiança. Evidentemente, para a aprovação dessa destituição deverá exigir-se uma maioria qualificada, pois pela mesma razão da dignidade do cargo e para que este não possa ser transformado em jogo de lutas partidárias, isso se impõe;

c) Não há referência ao apoio técnico

e instrumental ao Provedor de Justiça;

d) Não se estabelece a obrigação de se-

gredo profissional, que se afigura deverá ser estabelecida;

e) Na enumeração dos poderes do Pro-

vedor não se explicitam suficientemente os mesmos e a enumeração é incompleta;

f) Não se prevê a possibilidade de comunicação à Assembleia da República, por parte do Provedor, da falta de aceitação das suas recomendações pela Administração;

g) Não se encara a colaboração do Pro-

vedor com a Assembleia da República;

h) São insuficientes as normas sobre co-

laboração das entidades públicas;

i) Nada se dispõe quanto às diligências probatórias, quer relativamente à urgência, quer a sanções às pessoas que nelas não compareçam, apesar de convocadas;

j) Não se prevê a publicação dos relatórios do Provedor no Diário da Assembleia da República;

l) Nada se estabelece sobre utilização dos órgãos de comunicação social para divulgação de notas oficiosas ou comunicados do Provedor de Justiça;

m) Não exclui da competência do Provedor nem as forças armadas nem órgãos de soberania.

Estabelece o projecto o princípio da designação do Provedor de Justiça por quatro anos, proibindo-se a recondução. É certo que o cargo não deve prolongar-se por grande número de anos. Todavia, afigura-se excessivamente rigoroso o critério adoptado. Crê-se que a possibilidade de uma recondução — e só uma — seria mais aconselhável, já que não deve considerar-se excessivo um prazo de oito anos, tanto mais que, assim se sugere, deve dar-se sempre à Assembleia da República a faculdade de destituição. De resto, a Assembleia tem sempre a possibilidade de o não reeleger.

A disposição do n.° 2 do artigo 21.° do projecto deve ser eliminada por atentatória da dignidade e do carácter moral que tem de ser atributo do Provedor e que, se ele não souber respeitar, implicará a sua destituição pela Assembleia. Simplesmente, a inclusão desta disposição parece até desprestigiante para a própria Assembleia, na medida em que julga provável que esta eleja um Provedor sem capacidade moral, não sabendo ou não querendo ser imparcial, guardar isenção e ele próprio salvaguardar a dignidade da sua função.

De acordo com as observações que se deixam expressas, foi redigido o projecto junto, que tenho a honra de submeter à apreciação da 1.ª Comissão — Assuntos Constitucionais— da Assembleia da República, na fundada esperança de que esta, melho-rando-o ainda, aceite os seus princípios e disposições essenciais e elabore um projecto novo em substituição do actual n.° 10/I, defendendo-o e pugnando pela sua aprovação no Plenário da Assembleia, para que o Provedor de Justiça possa efectivamente corresponder ao elevado fim para que foi instituído.

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PROJECTO DE LEI... Provedor de Justiça CAPITULO I Estatuto

ARTIGO 1.º (Finalidade do cargo de Provedor de Justiça)

0 Provedor de Justiça, instituído pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.° 212/75, de 21 de Abril, visa fundamentalmente, nos termos do artigo 24.° da Constituição, a defesa dos direitos, liberdades e garantias individuais e assegurar a justiça e a legalidade da Administração Pública através de meios informais, por iniciativa própria ou investigando as queixas dos cidadãos contra a mesma Administração, procurando e propondo para elas as soluções adequadas.

ARTIGO 2.º (Designação, requisito e mandato)

1 — O Provedor de Justiça é designado pela Assembleia da República e toma posse perante o seu Presidente.

2 — A designação, nos termos regimentais, deverá recair em cidadão português, no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, de comprovada reputação de integridade e independência, e obter a maioria dos votos do número de Deputados que compõem a Assembleia.

3 — o Provedor é designado no início de cada legislatura e pelo período de tempo da sua duração, não podendo ser reconduzido senão uma vez, por igual período.

ARTIGO 3°

(Independência e inamovibilidade e responsabilidade)

1 — O Provedor de Justiça é independente e inamovível, não podendo cessar as suas funções, salvo nos casos previstos na presente lei.

2 — O Provedor de Justiça é civil e criminalmente responsável pelos actos que praticar.

3 — Movido procedimento judicial contra o Provedor pela prática de qualquer crime e indiciado por despacho de pronúncia ou equivalente, o processo só seguirá os seus termos, no caso de ao facto corresponder pena maior, se a Assembleia da República deliberar suspender o Provedor do exercício das suas funções.

4 — O Provedor não poderá ser preso preventivamente senão em caso de flagrante delito e por facto a que corresponda pena maior, e, nesse caso, deverá o procurador-geral da República solicitar à Assembleia da República, no prazo de quarenta e oito horas, autorização para a manutenção da prisão.

5 — Pedida a autorização, a Assembleia da República ou a sua Comissão Permanente, nos intervalos ou suspensão das sessões legislativas, deverá deliberar no prazo de quarenta e oito horas se concede ou nega a autorização.

ARTIGO 4.º (Honras, direitos e regalias)

o Provedor de Justiça tem competência, honras, direitos, remunerações e regalias idênticos aos de Ministro.

ARTIGO 5.º (Incopamtibilidades)

o Provedor de Justiça está sujeito às mesmas incompatibilidades que os juízes na efectividade de serviço.

ARTIGO 6.º (Obrigação do segredo profissional)

0 Provedor de Justiça é obrigado a guardar segredo profissional relativamente aos factos de que tome conhecimento no exercício das suas funções se (aí segredo se impuser em virtude da natureza dos mesmos factos.

ARTIGO 7.º (Garantias de trabalho)

1 — O Provedor de Justiça não pode ser prejudicado na estabilidade do seu emprego, na sua carreira e no regime de segurança social de que beneficia.

2 — O tempo de serviço prestado como Provedor de Justiça conta, para todos os efeitos, como prestado nas funções de origem, bem como para aposentação e reforma, mesmo que no momento da designação não exercesse funções que lhe conferissem tal direito.

3 — O Provedor de Justiça beneficia do regime de segurança social aplicável aos trabalhadores civis da função pública.

ARTIGO 8.° (Cessação de (unções)

1 — As funções de Provedor de Justiça só cessam antes do termo do seu mandato por morte, impossibilidade física permanente, perda dos requisitos de elegibilidade para a Assembleia da República, renúncia ou destituição pela Assembleia da República por maioria de dois terços do número de Deputados que a compõem.

2 — Os motivos de cessação de funções, excepto no caso de destituição, serão verificados pela Assembleia da República em resolução a publicar no Diário da República.

3 — o Provedor não está sujeito às disposições legais em vigor sobre a aposentação e reforma por limite de idade.

4 — O Provedor mantém-se em exercíc:o de funções até à posse do seu sucessor.

ARTIGO 9.º

(Identificação, livre trânsito e acesso e auxilio das autoridades)

1 — O Provedor de Justiça terá direito a cartão de identidade, passado pela Secretaria da Assembleia da República, do modelo anexo, autenticado com a assi-

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natura do Presidente da Assembleia da República e com o selo branco aposto sobre a assinatura e o retrato.

2 — O cartão de identidade é simultaneamente de livre trânsito e acesso a todos os locais de funcionamento da Administração Central, autarquias locais, serviços públicos, empresas públicas e nacionalizadas e pessoas colectivas de direito público em geral, devendo os funcionários de qualquer categoria e gestores desses serviços prestar toda a colaboração ao seu titular, facultando-lhe a entrada, a audição de funcionários e conceder-lhe livre acesso a documentos que pretenda examinar, com as restrições impostas pela lei.

3 — Mediante a apresentação do cartão de identidade, todas as autoridades e agentes de autoridade deverão prestar ao Provedor de Justiça o auxílio que lhes solicitar para o bom desempenho das suas funções.

ARTIGO 10.º (injúria e ofensa à honra e consideração)

A injúria ou ofensa à honra e consideração devidas ao Provedor de Justiça e ao Provedor-Adjumto será punida, nos termos do § 2.° do artigo 166.° do Código Penal.

ARTIGO n.° (Adjunto do Provedor de Justiça)

1—Haverá um adjunto do Provedor de Justiça, que o substituirá nas suas faltas e impedimentos e no qual o Provedor poderá delegar a prática de actos da sua competência, sempre que o entenda necessário.

2 — O adjunto do Provedor de Justiça é de livre escolha do Provedor e tem as honras, direitos, remunerações e regalias dos conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça.

3 — Ao adjunto do Provedor aplicam-se as disposições dos artigos 3.°, 5.°, 6.°, 7.° e 9.º deste capítulo.

ARTIGO 12.º (Coadjuvação nas funções)

O Provedor de Justiça é coadjuvado nas funções específicas do seu cargo por coordenadores e assessores e dispõe, para desempenho das funções de carácter instrumental, de um serviço administrativo.

ARTIGO 13.°

(Tentativas de impedimento de actuação do Serviço do Provedor)

1 — Constitui crime público impedir ou tentar impedir, mediante valências, ameaças ou assuadas, o regular funcionamento do Serviço do Provedor de Justiça ou o livre exercício das atribuições d'o Provedor de Justiça, do adjunto do Provedor ou dos seus colaboradores.

2 — O crime será punido nos termos do artigo 183." do Código Penal.

CAPITULO II Competência

ARTIGO 14.º (Funções)

1 — O Provedor de Justiça exerce as suas funções por iniciativa própria ou com base em queixas apresentadas pelos cidadãos individual ou colectivamente, executando as averiguações que considere adequadas em virtude de factos relacionados com a actuação das entidades públicas e seus agentes que por qualquer modo cheguem ao seu conhecimento.

2 — A actividade do Provedor de Justiça é independente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição e nas leis.

3 — O Provedor de Justiça não tem poder decisório, mas apenas o de dirigir aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir e reparar injustiças.

ARTIGO 15.º (Poderes e sua limitação)

1 — No exercício das suas funções, o Provedor de Justiça tem, designadamente, poderes para:

c) Efectuar, com ou sem aviso, visitas de inspecção a todo e qualquer sector da actividade administrativa pública, incluindo as autarquias locais, empresas nacionalizadas ou públicas, examinando documentos, ouvindo órgãos e agentes da Administração ou pedindo as informações que reputar convenientes;

b) Proceder a todas as investigações que consi-

dere necessárias ou convenientes e em matéria de produção de prova, podendo adoptar todos os procedimentos razoáveis, desde que não colidam com os direitos e interesses legítimos dos cidadãos;

c) Procurar, em colaboração com os órgãos

e serviços competentes, as soluções mais adequadas;

d) Assinalar as deficiências de legislação que ve-

rificar, formulando recomendações para a sua alteração, interpretação ou revogação e ainda para elaboração de nova legislação para casos omissos, as quais serão enviadas ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro e ao Ministro do Ministério directamente interessado e igualmente, se for caso diso, aos Presidentes das Assembleias Regionais e Primeiros-Ministros das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira;

e) Solicitar ao Conselho da Revolução a aprecia-

ção e declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas, nos termos e para efeitos do artigo 281.° da Constituição;

f) Emitir parecer, a solcitação da Assembleia da

República, do Governo ou do Conselho da Revolução, sobre quaisquer assuntos relacionados com a sua actividade;

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g) Promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais e da finalidade do Serviço do Provedor de Justiça, dos meios da sua acção e como se pode recorrer ao seu serviço.

2 — A intervenção do Provedor de Justiça não suspende o decurso de quaisquer prazos, designadamente os de recurso hierárquico e contencioso.

3 — Ficam excluídos dos poderes de inspecção e fiscalização do Provedor de Justiça os órgãos de soberania indicados no artigo 113.° da Constituição, as Assembleias e os Governos Regionais das Regiões Autónomas, com excepção, quanto ao Governo e aos Governos Regionais, dos actos praticados na superinten-dênca da Administração Pública e, quanto aos tribunais, os que respeitam ao seu funcionamento e actos não jurisdicionais dos seus servidores.

4 — Ficam igualmente excluídas dos poderes de inspecção e fiscalização do Provedor de Justiça as forças armadas.

ARTIGO 16.° (Comunicação à Assembleia da República)

1 — Se a Administração não actuar de acordo com as suas recomendações, poderá d:rigir-6e à Assembleia da República, expondo os motivos da sua tomada de posição.

2 — A Assembleia da República adoptará as providências que considerar oportunas, ou intervindo junto do Ministro competente ou do Primeiro-Mtaistro ou ainda aprovando as medidas legislativas que repute necessárias.

ARTIGO 17.°

(Relatório e colaboração com a Assembleia da República)

1—O Provedor de Justiça enviará anualmente à Assembleia da República um relatório das suas actividades, anotando as iniciativas que tomou, as queixas recebidas, as diligências efectuadas e os resultados obtidos, o qual será publicado no Diário da Assembleia da República.

2 — Tanto para justificação do pedido de providências referido no n.° 2 do artigo 16.° como para explanação do relatório anual, com vista à sua melhor apreciação pela Assembleia da República, o Provedor de Justiça poderá tomar parte nos trabalhos das Comissões da Assembleia dos Assuntos Constitucionais e dos Direitos, Liberdades e Garantias, quando o julgar conveniente e sempre que aquelas solicitem a sua presença.

CAPÍTULO III Funcionamento

ARTIGO 18.º (Queixas ao Provedor de Justiça)

1 — As queixas ao Provedor de Justiça não dependem de interesse directo, pessoal e legítimo, nem de quaisquer prazos.

2 — Serão indeferidas liminarmente as queixas manifestamente apresentadas de má fé ou desprovidas de fundamento.

3 — Será ordenada a sua substituição quando as queixas não sejam apresentadas em termos adequados.

ARTIGO 19.º (Formas das queixas e sua apresentação)

1 — As queixas podem ser formuladas oralmente ou por escrito, mesmo por simples carta, e devem conter a identidade e morada do queixoso e, sempre que possível, a sua assinatura.

2 — Quando formuladas oralmente, serão reduzidas a auto, que o queixoso assinará sempre que saiba e possa fazê-lo.

3 — As queixas podem ser apresentadas directamente ao Provedor de Justiça ou a qualquer agente do Ministério Público, que as transmitirá imediatamente ao Provedor.

ARTIGO 20.° (Diligências probatórias)

1 — As diligências probatórias consistirão em inspecções, exames, inquirições, pedidos de informações e qualquer outro procedimento razoável que não colida com os direitos fundamentais dos cidadãos e serão efectuadas por meios informais e expeditos, sem sujeição a regras processuais em vigor relativamente à produção de provas.

2 — As diligências serão efectuadas pelo Serviço do Provedor de Justiça e seus colaboradores, pelo Ministério Público, a solicitação directa aos respectivos agentes nas comarcas, ou por quaisquer outras entidades que disso sejam incumbidas pelo Provedor, sempre com urgência e com prioridade, quando for caso disso.

3 — As pessoas que devam ser ouvidas serão notificadas, por aviso postal registado, para comparecerem no dia e horas que tiverem sido designados.

Se faltarem e não justificarem a sua falta no prazo de três dias, incorrerão nas penas do crime de desobediência.

ARTIGO 21.º (Arquivamento)

Serão mandadas arquivar as queixas:

a) Quando não sejam da competência do Provedor;

b) Quando o Provedor reconheça não existirem elementos bastantes para ser adoptado qualquer procedimento.

ARTIGO 22.° (Encaminhamento para outros órgãos)

Quando o Provedor de Justiça reconheça que o queixoso tem ao seu alcance um meio gracioso ou contencioso especialmente previsto na lei, procurará, encaminhá-lo para a entidade competente.

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ARTIGO 23.º (Dever de colaboração)

1 — As entidades públicas civis e militares, incluindo os tribunais de qualquer natureza, as autarquias locais e as empresas públicas e nacionalizadas, prestarão ao Provedor de Justiça toda a colaboração que por este lhes for solicitada, designadamente prestando informações, efectuando inspecções através dos serviços competentes e facultando documentos e processos para exame, remetendo-os ao Provedor, se tal lhes for pedido, sem prejuízo do segredo de justiça quanto ao envio do processo, nem de interesse superior, devidamente justificado pelo Governo, por respeitarem à segurança, à defesa e às relações internacionais do Estado.

2— As publicações periódicas nacionais de natureza jornalística deverão enviar gratuitamente um exemplar ao Provedor de Justiça, no mesmo dia em que forem publicadas.

3 — Qualquer pessoa, ainda que não seja lesada no seu direito, tem o dever cívico de comunicar ao Provedor de Justiça qualquer facto de que tenha tido conhecimento e seja atentatório dos direitos fundamentais dos cidadãos ou represente atitude ilegal por parte de qualquer sector da actividade administrativa do Estado, das autarquias locais ou dos servidores de um e de outras.

ARTIGO 24.º (Casos de pouca gravidade)

Nos casos de pouca gravidade o Provedor tem a faculdade de considerar encerrado o assunto com a rectificação do erro ou de julgar-se satisfeito com as explicações fornecidas pelo órgão ou agente em causa e pode também limitar-se a uma chamada de atenção.

ARTIGO 25.º (Audição das pessoas postas em causa)

Fora dos casos previstos nos artigos 21.° e 24.°, o Provedor de Justiça deverá sempre ouvir os órgãos ou agentes postos em causa e poderá solicitar-lhes todos os esclarecimentos necessários ou convenientes antes de formular quaisquer conclusões.

ARTIGO 26.º (Participação de Infracções e publicidade)

1 — Quando no decurso do processo resultarem indícios suficientes da prática de infracções criminais ou disciplinares, o Provedor deve dar conhecimento delas ao Ministério Público ou à entidade hierarquicamente competente para a instauração de processo disciplinar.

2 — Quando as circunstâncias o aconselhem, o Provedor pode ordenar a publicação de comunicados e bem assim das conclusões alcançadas nos processos, utilizando, se necessário, os meios de comunicação social estatizados e beneficiando, num e noutro caso, do regime legal de publicação de notas oficiosas.

ARTIGO 27.º (Irrecorribilidade dos actos do Provedor)

Os actos do Provedor de Justiça não são recorríveis e só podem ser objecto de reclamação para o próprio Provedor.

ARTIGO 28.º (Comunicação dos actos)

As conclusões do Provedor serão comunicadas aos órgãos ou agentes visados e aos queixosos se tiverem origem em queixa apresentada.

ARTIGO 29.º (Queixas de má fé)

Sempre que se verifique que a queixa foi feita de má fé ou com negligência grave, o Provedor de Justiça promoverá junto do juiz de turno ou da comarca competente a condenação do queixoso com imposto de justiça, nos termos do artigo 178.°, n.° 1, alínea a), do Código das Custas Judiciais, sem prejuízo da responsabilidade criminal, se a ela houver lugar.

ARTIGO 30° (Isenção de custas e selos e dispensa de advogado)

Os processos organizados perante o Provedor de Justiça são isentos de custas e selos e não obrigam à constituição de advogado.

CAPÍTULO IV

ARTIGO 31.º (Disposições finais)

1 — O Governo reorganizará o Serviço do Provedor de Justiça, sob proposta do Provedor.

2 — Enquanto não se proceder à reorganização, manter-se-á em vigor o Decreto-Lei n.° 189-A/76, de 15 de Março.

ARTIGO 32.º (Norma revogatória)

São revogados os Decretos-Leis n.os 212/75, de 21 de Abril, 120/76, de 11 de Fevereiro, e 794-A/76, de 5 de Novembro.

Dentro do melhor espírito de colaboração, que muito lhe agradou e considerou de grande utilidade, a 1.º Comissão — Assuntos Constitucionais — honrou o Provedor, convidando-o a participar em algumas das suas reuniões para aí expor os seus pontos de vista e em franca troca de opiniões poder apresentar as suas observações e sugestões ao projecto entretanto elaborado pela própria Comissão.

Do trabalho meticuloso da Comissão, do elevado critério dos seus membros, do seu indesmentido propósito de dignificar a instituição do Provedor de Justiça e de a dotar dos meios indispensáveis para que esta possa corresponder ao elevado fim a que se destina veio a resultar, com aprovação unânime da Comissão, o projecto de estatuto do Provedor de

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Justiça, também aprovado por unanimidade no Plenário da Assembleia da República, primeiro na generalidade, em 10 de Agosto, e depois na especialidade, em 14 de Outubro, de que é hoje a Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro.

II

Lei Orgânica do Serviço do Provedor de Justiça

Aprovado o Estatuto do Provedor necessária se tornava a publicação de uma nova orgânica do Serviço do Provedor de Justiça.

Uma vez mais os ilustres Deputados que compõem a 1.ª Comissão, indo ao encontro da opinião expressa pelo Provedor de que para maior garantia da independência deste deveria ser a Assembleia da República, e não o Governo, a elaborar e aprovar tal diploma, se dispuserem a apresentar, a título individual, mas em conjunto, o respectivo projecto e dignaram-se aceitar como base de trabalho aquele que em resultados de reuniões conjuntas do sector técnico havia sido elaborado no Serviço do Provedor de Justiça.

E uma vez mais aquela Comissão honrou o Provedor convidando-o a tomar parte nas reuniões em que o mesmo foi apreciado, discutido e, por último, aprovado, com o consenso unânime dos seus componentes, para ser submetida à discussão e votação do Plenário da Assembleia da República, onde foi aprovada na generalidade, por unanimidade, em 16 de Dezembro (1).

Considerando que tal é de interesse, a seguir se transcreve o projecto e suas notas justificativas, enviados pelo Provedor à 1.ª Comissão — Assuntos Constitucionais:

Serviço do Provedor de Justiça

capítulo I Natureza e atribuições

ARTIGO 1.º (Autonomia administrativa e financeira)

0 Serviço do Provedor de Justiça, criado pelo De-creto-Lei n.° 189-a/76, de 15 de Março, é um serviço público dotado de autonomia administrativa e financeira e destinado a prestar ao Provedor o apoio necessário à prossecução das suas atribuições.

CAPÍTULO II

Estrutura e competência

ARTIGO 2.º (Apoio técnico e Instrumental)

1 — o Provedor de Justiça dispõe de uma assessoria e de um serviço administrativo.

2 — a gestão financeira do Serviço é assegurada por um conselho administrativo.

(1) Veio depois a ser aprovada na especialidade na sessão de 10 de Janeiro de 1978 e a constituir a Lei n.° 10/78, de 2 de Março.

ARTIGO 3.º (Assessoria)

0 Provedor de Justiça é coadjuvado no exercício das funções especificas do seu cargo por coordenadores e assessores, constituindo a assessoria, os quais executam as tarefas que por ele e pelo Provedor--Adjunto lhes forem determinadas.

ARTIGO 4.º (Serviço administrativo)

1 — Para desempenho das funções de carácter administrativo o Provedor de Justiça dispõe do serviço administrativo, chefiado por um director.

2 — O serviço administrativo compreende o sector administrativo e o sector técnico de redações públicas e de documentação.

3 — Ao sector administrativo incumbe a execução dos trabalhos de secretaria e das tarefas de índole administrativa.

4 — O sector técnico de relações públicas e de documentação divide-se em dois núcleos, cabendo ao de relações públicas o acolhimento das pessoas que pretendam apresentar directamente reclamações ao Provedor de Justiça e os contactos com os órgãos de comunicação social, e ao núcleo de documentação a recolha, tratamento e difusão da informação necessária ao Serviço do Provedor de Justiça e os dados estatísticos para o relatório anual ou outros que porventura o Provedor entenda elaborar.

5 — Aos núcleos de relações públicas e de documentação ficam afectos o técnico de 1.ª classe, que superintenderá em ambos, e os técnicos auxiliares referidos no quadro anexo a este diploma.

CAPÍTULO III

Gestão financeira

ARTIGO 5.º (Conselho administrativo e sua composição)

1 — O conselho administrativo terá a seguinte composição:

a) Provedor de Justiça-Adjunto, que presidirá;

b) Director do serviço administrativo;

c) Tesoureiro;

d) Um vogal a designar pelo Provedor de Justiça

de entre os trabalhadores do serviço administrativo.

2 — O conselho administrativo será secretariado por quem para o efeito for designado pelo Provedor de Justiça.

3 — Às reuniões do conselho administrativo assistirão dois delegados, um do Tribunal de Contas e outro da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, designados pelo Ministro das Finanças, que deverão pronunciar-se, especialmente, sobre a legalidade de todas as despesas.

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ARTIGO 6.º (Competência do conselho administrativo)

1 — Ao conselho administrativo compete a gestão financeira do Serviço, superintendendo na execução do respectivo orçamento.

2 — Ao mesmo conselho cabe especialmente:

a) Organizar o orçamento das receitas para o

ano seguinte, bem como o orçamento das despesas;

b) Organizar os orçamentos suplementares;

c) Organizar e submeter ao Tribunal de Contas

a conta de gerência referente às despesas efectuadas até 31 de Dezembro do ano anterior.

ARTIGO 7.º (Receitas do Serviço)

Constituem receitas do Serviço do Provedor de Justiça:

a) As dotações do Orçamento Geral do Estado;

b) O saldo de gerência do ano anterior;

c) Quaisquer outras receitas que lhe sejam atri-

buídas por lei, contrato ou outro título.

ARTIGO 8.º (Encargos do Serviço)

Constituem encargos do Serviço do Provedor de Justiça as despesas a realizar com a instalação e o funcionamento do Serviço e quaisquer outras que sejam necessárias para assegurar o desempenho das suas atribuições.

ARTIGO 9.° (Orçamento do Serviço e respectivas verbas)

1 — As receitas e despesas do Serviço constarão do orçamento anual, a aprovar pelo Provedor de Justiça, cuja dotação será inscrita no orçamento de Encargos Gerais da Nação afecto à Assembleia da República.

2 — São da competência do conselho administrativo as alterações ao orçamento anual dentro da dotação concedida, a efectuar através de orçamentos suplementares a aprovar pelo Provedor de Justiça.

3 — As despesas previstas nos orçamentos do Serviço, desde que aprovadas pelo Provedor de Justiça, serão realizadas sem dependência de outras formalidades, à excepção do visto do Tribunal de Contas para as despesas com pessoal, nos casos em que a lei o exige.

ARTIGO 10° (Autorização para realização de despesas)

1 — O Provedor de Justiça tem competência idêntica à de Ministro para efeitos de autorização de realização de despesas, podendo delegar no director do serviço administrativo a autorização de despesas até à quantia de 40 000$.

2 — Na ausência ou impedimento do Provedor de Justiça, a autorização referida no número anterior compete ao Provedor-Adjunto.

ARTIGO 11.º (Constituição de fundo permanente)

Mediante despacho do Provedor de Justiça, poderá ser constituído um fundo permanente, não excedendo a um duodécimo das respectivas dotações, para ocorrer a encargos com despesas correntes inadiáveis, a movimentar pelo director do serviço administrativo.

ARTIGO 12.º (Assinatura de documentos)

Todos os documentos relativos a levantamentos de fundos, recebimentos e pagamentos terão obrigatoriamente duas assinaturas, uma das quais será sempre a do Provedor-Adjunto ou do director do serviço administrativo e outra a de um vogal do conselho admi nistrativo.

ARTIGO 13.º

(Gratificação aos delegados Junto do conselho administrativo)

Os delegados do Tribunal de Contas e da Direcção--Geral da Contabilidade Pública junto do conselho administrativo têm direito a uma gratificação mensal de quantitativo a fixar pelo Ministro das Finanças, sob proposta do Provedor de Justiça.

ARTIGO 14.º (Tesoureiro)

0 lugar de tesoureiro será provido por escolha do Provedor de Justiça.

ARTIGO 15.º (Abono para falhas)

1 — O tesoureiro terá direito a abono para falhas de montante igual ao atribuído ao pessoal das tesourarias da Fazenda Pública, quando haja equivalência de vencimentos, e, nos restantes casos, será fixado pelo Provedor de Justiça, tomando o daquele pessoal como parâmero limitativo.

2 — Na ausência ou impedimento do tesoureiro, o abono reverterá a favor do seu substituto.

CAPÍTULO IV Pessoal

ARTIGO 16.º (Quadro do pessoal)

1 — O Serviço do Provedor de Justiça dispõe do pessoal constante do quadro anexo ao presente diploma.

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2 — O quadro de pessoal a que se refere o número anterior poderá ser alterado por portaria conjunta do Provedor de Justiça, do Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças.

ARTIGO 17.º (Competência)

1 — Compete ao Provedor de Justiça praticar todos os actos relativos ao provimento e à situação funcional dos funcionários do Serviço do Provedor de Justiça e exercer sobre eles o poder disciplinar.

2 — Das decisões do Provedor de Justiça cabe recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos da lei geral.

ARTIGO 18.º

(Recrutamento e formas de provimento do pessoal do quadro)

1 — O pessoal do Serviço do Provedor de Justiça, constante do quadro anexo ao presente diploma, é nomeado, ou contratado, ou provido, em comissão de serviço por tempo indeterminado, de acrodo com as regras seguintes:

a) Os Provedores de Justiça-Adjuntos são provi-

dos em comissão de serviço, por livre escolha do Provedor de Justiça, de entre indivíduos com curso superior adequado e comprovada reputação de integridade e independência;

b) Os coordenadores e assessores são nomeados

por livre escolha do Provedor de Justiça de entre indivíduos licenciados com curso superior adequado e cujo curriculum o justifique;

c) O director do serviço administrativo é provido

por nomeação ou em comissão de serviço, por escolha do Provedor de justiça, de entre indivíduos com curso superior e cujo curriculum o justifique;

d) O técnico de l.ª classe é nomeado de entre

indivíduos com curso superior adequado, preferencialmente por promoção, de entre técnicos de 2.ª classe de qualquer organismo ou serviço público;

e) Os técnicos auxiliares são nomeados de entre

indivíduos com o curso geral dos liceus ou equivalente, bons conhecimentos das línguas inglesa e ou francesa e dactilografia, concedendo-se, em igualdade de habilitações, preferência aos indivíduos que prestam já funções no serviço administrativo do Serviço do Provedor de Justiça;

f) O chefe de secção é nomeado entre indivíduos com curso superior adequado ou primeiros--ofiais com três ou mais anos na categroia e habilitados com o curso geral dos liceus ou habilitação equiparada;

g) O restante pessoal é provido por nomeação ou contrato, de acordo com a lei geral.

2 — O primeiro provimento do Serviço do Provedor de Justiça pode ser feito directamente para qualquer

das categorias sem dependência do serviço anteriormente prestado.

3 — O primeiro provimento dos lugares de coordenador e assessor é dispensado dos condicionalismos impostos pelo artigo 53.°, n.° 1, do Decreto-Leí n.° 294/76, de 24 de Abril.

4 — O Provedor de Justiça poderá dispor de dois secretários pessoais, aos quais é aplicável o regime geral dos secretários dos gabinetes ministeriais.

ARTIGO 19° (Nomeação)

1 — As nomeações feitas nos termos do artigo anterior terão carácter provisório durante o prazo de um ano, findo o qual o funcionário será provido definitivamente se tiver revelado aptidão para o lugar e será exonerado no caso contrário.

2 — Se a nomeação incidir sobre funcionário que já tiver provimento definitivo noutro Jugar da função pública, será nomeado definitivamente.

ARTIGO 20.º (Comissão de serviço)

1 — Por conveniência de serviço ou do funcionário, poderão os lugares de coordenador e assessor ser providos, temporariamente, em comissão de serviço.

2 — Quando a forma de provimento tiver sido a do número anterior, poderá o agente optar, em qualquer tempo, pela nomeação definitiva, desde que possua um ano de bom e efectivo exercício do cargo e nisso não haja inconveniência para o Serviço.

3 — Quando a comissão de serviço recair em funcionário público ou de empresa pública ou nacionalizada, não se considera aberta vaga no quadro de origem, podendo, no entanto, o respectivo lugar ser preenchido interinamente.

4 — O tempo de serviço prestado em comissão considera-se, para todos os efeitos legais, designadamente de promoção, reforma ou aposentação, como exercido no respectivo quadro de origem.

5 — Os funcionários públicos ou de empresas públicas ou nacionalizadas em comissão de serviço podem optar a todo o momento pelo vencimento, abonos e gratificações a que tenham direito no lugar de origem.

6 — No caso da opção referida no número anterior, ser-lhes-ão abonadas as referidas diferenças de remunerações, em conta das dotações previstas no artigo 7.°

ARTIGO 21.º (Situação dos magistrados)

Os magistrados judiciais e do Ministério Público nomeados em comissão de serviço consideram-se desempenhando funções não estranhas e equivalentes à actividade judicial.

ARTIGO 22.º (Pessoal além do quadro)

1 — Poderá ser requisitado além do quadro pessoal necessário para desempenhar temporariamente funções

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que não possam ser asseguradas pelo pessoal permanente.

2 — Para realização de tarefas que não possam ser asseguradas pelo pessoal permanente poderá ser contratado pessoal além do quadro.

3 — Aos indivíduos requisitados nos termos do n.° 1 aplicam-se as regras estabelecidas nos n.os 3 e seguintes do artigo 20.° e, quando magistrados ou do Ministério Público, o disposto no artigo 21.°

4 — A realização de estudos, inquéritos e outros trabalhos de carácter técnico eventual poderá ser confiada, mediante contrato, a entidades nacionais ou estrangeiras estranhas aos serviços.

5 — Poderá ainda ser contratado pessoal em regime de tempo parcial, o qual receberá uma gratificação mensal de quantitativo correspondente ao número de horas realizadas, com base no salário-hora a determinar nos termos da lei geral.

ARTIGO 23.º (Estatuto aplicável)

1 — O pessoal do Serviço do Provedor de Justiça rege-se pela legislação aplicável ao funcionalismo público.

2 — Ao pessoal do Serviço do Provedor de Justiça poderão, quando for caso disso, ser atribuídas ajudas de custo ou por deslocações, nos termos da lei geral.

3 — Os motoristas e contínuos do Serviço do Provedor de Justiça ficam sujeitos ao regime dos motoristas e continuos dos gabinetes ministeriais.

ARTIGO 24.º (Identificação, livre trânsito, acesso e auxílio)

1 — O Provedor de Justiça-Adjunto, os coordenadores e assessores têm direito a:

a) Uso de cartão de identidade, passado peio ser-

viço administrativo, do modelo anexo n.° 1, autenticado com a assinatura do Provedor de Justiça e com o selo branco do Serviço aposto sobre a assinatura e a fotografia;

b) Livre trânsito a todos os sectores da actividade

administrativa do Estado e das autarquias locais, serviços e empresas públicas ou nacionalizadas e demais pessoas colectivas de direito público, para recolha de informações ou esclarecimentos, exame de processos ou documentos e audição de quaisquer pessoas, para o que serão devidamente credenciados pelo Provedor de Justiça;

c) Receber auxílio de quaisquer autoridades e seus

agentes para o desempenho de missões de que se encontrem incumbidos.

2 — O restante pessoal do Serviço do Provedor de Justiça usará para identificação um cartão do moddo anexo n.° 2, passado pelo serviço administrativo e autenticado pela assinatura do Provedor-Adjunto e tendo aposto sobre a fotografia o selo branco do Serviço.

ARTIGO 25.º (Serviços sociais)

1 — O pessoal do Serviço do Provedor de Justiça fica abrangido pelos Serviços Sociais da Presidência do Conselho de Ministros.

2—O pessoal requisitado ou em comissão de serviço pode optar por manter a sua integração nos serviços sociais do departamento de origem.

CAPITULO V Disposições gerais e transitórias

ARTIGO 26.º (Disposição transitória)

1 — A requisição do actual Provedor de Justiça-Ad-junto é convertida em comissão de serviço, sendo-lhe apireadas as regras estabelecidas nos n.os 3 e seguintes do artigo 20.°

2 — O reatante pessoal que à data da entrada em vigor do presente diploma se encontre, a qualquer título ou situação, a exercer funções no Serviço do Provedor de Justiça é provido por nomeação, ou por contrato ou assalariamento quando impostos pelos termos da lei geral, nos lugares daquele Serviço que actualmente ocupa e constantes do quadro de pessoal anexo ao presente diploma, mediante lista nominativa, assinada pelo Provedor de Justiça, sem quaisquer formalidades, salvo o visto do Tribunal de Contas e a publicação no Diário da República.

3 — As nomeações feitas nos termos do número anterior terão carácter provisório se o agente à data da publicação do presente diploma tiver no Serviço do Provedor de Justiça, a qualquer título ou em qualquer situação, menos de um ano de exercício efectivo de funções, findo o qual será provido definitivamente, se tiver revelado aptidão para o lugar, ou será exonerado, no caso contrário.

4 — Se o funcionário já tiver provimento defintivo noutro lugar da função pública, será provido em nomeação definitiva.

5 — O disposto no n.° 2 do presente artigo não prejudica que aos funcionários em regime de requisição se possa converter esta em regime de comissão de serviço, por opção dos mesmos ou por conveniência do Serviço do Provedor de Justiça.

ARTIGO 27.º (Preenchimento de lugares vagos)

As vagas do quadro do pessoal anexo ao presente diploma que existirem após o provimento do pessoal previsto no artigo anterior serão providas à medida que as necessidades do Serviço o exijam e as possibilidades financeiras o permitam.

ARTIGO 28.º

(Execução do presente diploma)

O Ministro das Finanças fica autorizado a introduzir no Orçamento Geral do Estado as alterações necessárias à execução do presente diploma.

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ARTIGO 29.º (Disposição revogatória)

1—É revogado o Decreto-Lei n.° 189-A/76, de 15 de Março.

2 — O disposto no número anterior não prejudica a situação do pessoal que presta serviço, a qualquer título, ou em qualquer situação, no Serviço do Provedor de Justiça, o qual manterá provisoriamente as suas actuais situações neste Serviço até que seja integrado, nos termos do artigo 26.°, no quadro de pessoal anexo ao presente diploma.

ARTIGO 30.º (Entrada em vigor)

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Nota justificativa do projecto do diploma orgânico do Serviço do Provedor de Justiça

1—Pelo Decreto-Lei n.° 212/75, de 21 de Abril (com as alterações posteriormente introduzidas pelos Decretos-Leis m.os 120/76, de 11 de Fevereiro, e 794-A/76, de 5 de Novembro), e Decreto-Lei n.° 189-A/76, de 15 de Março, foram estabelecidos provisoriamente — até promulgação do regime a instituir-se pela nova Constituição —, respectivamente, o Estatuto do Provedor de Justiça e o diploma orgânico do Serviço do Provedor de Justiça, destinado a prestar a este o apoio técnico e instrumental necessário à prossecução das atribuições que lhe foram definidas no citado Estatuto (artigo l.° do Deoreto-Lei n.° 189-A/76).

2 — Entrada em vigor a Constituição da República, há que fazer a adequação daqueles diplomas ao disposto no artigo 24.° daquela lei fundamental.

3 — Em conformidade, foi já aprovado pela Assembleia da República, a 10 de Agosto de 1977, na generalidade, o novo Estatuto do Provedor de Justiça, destinado a substituir o Decreto-Lei n.° 212/75, de 21 de Abril, e os que posteriormente vieram introduzir-lhe algumas alterações, e que, obviamente, são revogados pelo citado novo Estatuto.

4 — Urge assim, da mesma forma, substituir o De-creto-Lei n.° 189-A/76, publicando o diploma orgânico definitivo do Serviço do Provedor de Justiça, publicação que, a não poder ser simultânea à do Estatuto do Provedor de Justiça, dever-se-lhe-á seguir de perto.

5 — O projecto do diploma orgânico do Serviço do Provedor de Justiça que se propõe pretende satisfazer aquela necessidade urgente.

Aliás, a urgência na sua publicação surge não só face aos considerandos acima expostos como à verificação, que o tempo e a experiência desde a entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 189-A/76 vieram trazer, da necessidade de clarificar e ajustar algumas das suas disposições a conceitos geralmente seguidos e que não foram naquele diploma observados (como, por exemplo, no caso do regime da requisição).

6 — Assim, no projecto que ora se propõe são mantidas todas aquelas regras estabelecidas pelo Decreto-

-Lei n.° 189-A/76 e que não se impõe alterar para ajustamento à Constítuicão da República e ao novo Estatuto do Provedor de Justiça ou para satisfação de necessidades que se foram verificando pelo funcionamento do Serviço.

Daí que só uma alteração de fundo é introduzida ao regime estabelecido pelo Decreto-Lei n.° 189-A/76 — atribuição de autonomia financeira —, as restantes constando, como referido, de meras clarificações ou ajustamentos das regras fixadas no Decreto-Lei n.° 189-A/76 aos regimes genéricos legais em vigor.

7 — Formulam-se de seguida algumas considerações acerca dos fundamentos que justificam as alterações que no presente projecto se introduziram ao Decreto--Lei 189-A/76:

7.1—CAPÍTULO I

Além da autonomia administrativa, já cstabefcdda pelo Decreto-Lei n.° 189-A/76, dota-se o Serviço de autonomia financeira.

7.1.1 —Quanto à manutenção da autonomia administrativa (competência para praticar actos definitivos), que o Serviço já usufrui desde a sua constituição, supõe-se tão óbvia a sua necessidade, tendo em vista, nomeadamente:

a) A acção dinâmica e eficaz do Serviço, pela

própria Comissão dos Assuntos Constitucionais da Assembleia da República reconhecida como necessária no relatório que elaborou sobre o projecto de lei n.° 10/I, relativo ao Provedor de Justiça;

b) A incongruência de sujeitar o Provedor de

Justiça e respectivo Serviço (que se desejam dotados de total isenção, independência e autonomia) à subordinação hierárquica a outra entidade a que o Provedor de Justiça teria de submeter a decisão final e definitiva dos seus actos e decisões e para a qual, logicamente, caberia também recurso hierárquico;

c) O desprestígio e a minimização que de tal

medida resultariam para & figura do Provedor de Justiça, retirando-se-lhe uma autonomia que já fora concedida até antes de o cargo ter dignidade constitucional, e em nítida contradição com as honras, direitos, categoria, remunerações e regalias idênticas às de Ministro que lhe são atribuídas pelo referido projecto de estatuto do Provedor de Justiça, já aprovado na generalidade pela Assembleia da República;

que nada se considera de ajuntar para sua justificação.

Aliás, aquela autonomia administrativa está implicitamente agora também reconhecida no novo referido projecto de estatuto do Provedor de Justiça quando disposição do mesmo estabelece que:

Os actos do Provedor de Justiça não são susceptíveis de recurso e só podem ser objecto de reclamação para o próprio Provedor.

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7.1.2 — Quanto à autonomia financeira, a principal razão que a justifica reside fundamentalmente na indispensabilidade manifesta de salvaguardar a independência do Serviço, permitindo-lhe naquele campo total maleabilidade de funcionamento.

Assim, no presente projecto, as receitas e despesas do Serviço do Provedor de Justiça passam a constar de orçamento anual, a aprovar pelo Provedor de Justiça, e cuja dotação será inscrita no orçamento de Encargos Gerais da Nação afecto à Assembleia da República, o que garante ao Serviço do Provedor de Justiça uma total independência de qualquer outro serviço.

Até agora as despesas do Serviço do Provedor de Justiça têm sido satisfeitas em conta das dotações, isentas do regime de duodécimos, inscritas no orçamento de Encargos Gerais da Nação afecto à Secre-taria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros, e estão dispensadas de quaisquer formalidades legais (à excepção do visto do Tribunal de Contas para as despesas com o pessoal, nos casos em que a lei geral o exige), fazendo-se o seu processamento por intermédio da Secretaria-Geral do Conselho de Ministros.

Esta situação é a que deriva do Decreto-Lei n.° 189-A/76, de 15 de Março.

Todavia, há que realçar que, sendo o Serviço do Provedor de Justiça um serviço público, não é um serviço do Governo da Nação, não se compreendendo de modo algum que as suas despesas continuem a ser inscritas no orçamento afecto à Presidência do Conselho de Ministros, como tem acontecido até agora, justificando-se plenamente a autonomia financeira do Serviço, passando as respectivas dotações a ser inscritas no orçamento de Encargos Gerais da Nação afecto à Assembleia da República.

Cumpre notar, porém, que o Serviço do Provedor de Justiça, embora ligado à Assembleia da República, na medida em que o Provedor é pela mesma eleito e a ela presta contas do exercício do seu cargo, não 6 propriamente um serviço da Assembleia da República.

Assim, sem autonomia financeira o Serviço do Provedor ficaria sujeito ao orçamento que fosse elaborado pelo Conselho Administrativo da Assembleia da República, e só com autorização do mesmo se poderia fazer alterações orçamentais, ainda que dentro da respectiva dotação concedida.

Seria, pois, a intromissão não da Assembleia da República, mas de um serviço dela noutro serviço que é, por natureza, independente de qualquer outro, o que, de certo modo, o colocaria na sua dependência, sem que nele o Serviço do Provedor tivesse qualquer representação, sendo certo que o Conselho Administrativo da Assembleia não é só constituído por parlamentares, mas tem na sua composição o secretário-geral da Assembleia e dois representantes dos trabalhadores.

Tal situação poderia originar situações delicadas, perdas de tempo, justificações constantes, uma burocracia, em suma, desgastante e inútil.

De resto, o diminuto montante do orçamento do Serviço do Provedor de Justiça, cerca de 13 000 contos, comparado com os de qualquer outro serviço, mais não é do que uma gota no Orçamento Geral

do Estado, pelo que a autonomia financeira proposta nenhuma perturbação poderá vir a introduzir no actual regime financeiro orçamental ligado às contas públicas da Nação.

Julga-se, assim, perfeitamente justificada a necessidade de autonomia financeira para o Serviço do Provedor de Justiça, que, aliada à autonomia administrativa já existente, lhe conferirá a indispensável independência inerente a um serviço da sua natureza.

7.2 —CAPÍTULO II

É nas disposições articuladas neste capítulo, e que correspondem ao que dispõem os artigos 2.° a 11.° do Decreto-Lei n.° 189-A/76, que se introduziram algumas alterações destinadas a clarificá-las ou ajustadas a conceitos e regras estabelecidos e que nem sempre estão bem definidos naqueles artigos.

Nestes termos:

7.2.1—ARTIGO 5.º DO PROJECTO

Ao contrário do que se faz no Decreto-Lei n.° 189-A/76, em que o pessoal do Serviço do Provedor de Justiça é distribuído por lugares de quadro, fixados em parte pelo artigo 1.° (coordenadores e assessores) e em parte no quadro anexo (pessoal administrativo e auxiliar), considerou-se mais conveniente fixar os lugares de quadro do pessoal do Serviço num mapa único, que se anexa ao diploma proposto.

Quanto ao n.° 2 do artigo 5.°, além de obedecer à regra geral estabelecida no Decreto-Lei n.º 59/76, de 23 de Janeiro, encontra-se consagrado já em vários diplomas orgânicos recentes, nomeadamente, por exemplo, o Decreto-Lei n.° 789/76, de 4 de Novembro (artigo 18.°, n.° 2), que aprova a Lei Orgânica da Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros.

A vantagem desta norma, destinada a permitir, através de uma simplificação de formalidades, que se possa proceder atempadamente a uma revisão dos quadros de modo a adaptá-los sucessivamente às reais necessidades dos serviços, parece evidente.

7.2.2—ARTIGO 6.º DO PROJECTO

7.2.2.1—Em clarificação das disposições do Decreto-Lei n.° 189-A/76, relativas às formas de provimento dos lugares do quadro do Serviço e as quais podem eventualmente conduzir a dúvidas acerca de qual a entidade competente para proceder àquele provimento, considerou-se conveniente especificar expressamente (artigo 6.°, n.° 1) que aquela competência é atributo do Provedor de Justiça, como tem sido, aliás, geralmente entendido, e parece poder também inferirle do disposto no antigo 14.% n.° 1, do actual projecto do Estatuto do Provedor de Justiça, aprovado na generalidade pela Assembleia da República, em que expressamente se atribui àquele a competência para nomear os seus adjuntos.

É certo que o artigo 4.º do Decreto-Lei n.° 212/75, depois de determinar no seu n.° 1 que o Provedor de

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Justiça requisitará os colaboradores e o pessoal necessário ao funcionamento do Serviço, vem estabelecer no seu n.° 2 que aquela requisição será feita através do Primeiro-Ministro ou do Ministro da Justiça, podendo conduzir eventualmente ao entendimento que é a estes que compete definitivamente o despacho de requisição.

É preciso entender-se aquela disposição —tal como, aliás, tem sido sempre interpretada— como medida transitória, imposta para permitir a tramitação burocrática necessária para o preenchimento dos lugares de um serviço que acabava de se criar e que não possuía, assim, logicamente, pessoal que da mesma se pudesse ocupar.

Atribuir, agora, a competência para proceder ao provimento do pessoal do Serviço do Provedor de Justiça a outra entidade que não fose o próprio Provedor, além de ilógico, seria atentar com o princípio de independência que se pretende dar àquele Serviço e ao seu pessoal.

7.2.2.2 — Por outro lado, considerou-se também conveniente estipular expressamente no mesmo n.° 1 do artigo 6.° que o Provedor de Justiça tem competência para praticar todos os actos relativos à situação funcional do pessoal do seu Serviço e sobre este exercer o poder disciplinar, pois não só estas atribuições são consequência lógica da competência para nomear, contratar ou requisitar o seu pessoal, como não se poderia entender um eficaz funcionamento do Serviço se a outra entidade, que ao mesmo não pertencesse, viessem a caber as competências referidas—desde, por exemplo, autorizar licenças, punir faltas injustificadas, até instaurar processos disciplinares e exonerar.

7.2.2.3 — Finalmente, visto não caber recurso hierárquico dos actos do Provedor de Justiça, embora seja implícito que nos termos gerais da lei deva dos mesmos caber recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, considerou-se conveniente que aquela disposição ficasse expressa — artigo 6.°, n.° 2.

7.2.3 — ARTIGOS 7.°, 8.º, 9.º 10.º E 11.° DO PROJECTO

7.2.3.1 —Pelo Decreto-Lei n.° 189-A/76 deve proceder-se ao preenchimento dos lugares do quadro do Serviço do Provedor de Justiça, de acordo com as seguintes regras:

a) Provedor de Jusitiça-Adjunto, coordenadores,

assessores, director do serviço de apoio e técnioo (com categoria da letra F) e técnicos auxiliares (artigo 5.°, n.os 1 e 2):

Por requisição;

Por nomeação por tempo indeterminado;

b) Pessoal administrativo e auxiliar:

Por nomeação (artigo 6.°, n.° 1);

Se a nomeação recair em funcionário público, ou administrativo, em comissão de serviço (artigo 6.°, n.° 3);

Por contrato, nos termos da lei geral.

7.2.3.2 — Como, aliás, se afirma também nas notas justificativas que acompanharam o anteprojecto da Lei de Bases da Função Pública, cujos primeiros dois capítulos foram já aprovados na generalidade pelo Con-

selho de Ministros, quer a requisição, quer a comissão de serviço, embora existentes no contexto jurídico-ad-ministrativo, não têm, porém, ainda, na lei, definição geral e precisa dos respectivos regimes.

No entanto, é conceito geralmente aceite que qualquer daquelas duas situações tem sempre caracter precário, tendo por fim o exercício de funções temporárias — a tempo certo ou indeterminado, mas em princípio e em regra, sempre temporárias —, devendo reservar-se a nomeação — e, para alguns casos, o contrato — como forma normal de provimento de lugares do quadro (admitindo-se, embora, a comissão de serviço como forma de provimento normal para aqueles lugares, em certos serviços, cujas condições específicas das respectivas funções exijam a necessidade de ao seu provimento corresponder precisamente o carácter precário da comissão de serviço).

Por outro lado, a requisição não deve destinar-se a preencher lugar do quadro (ao contrário da comissão de serviço), destinando-se a acudir a necessidades temporárias dos serviços, para desempenho de funções acidentais, de maior ou menor duração, e que o pessoal permanente não pode desempenhar.

Urge, assim, rectificar o estabelecido pelo Decreto--Lei n.º 189-A/76.

Note-se que, em consequência do que naquele diploma está disposto, resulta aotualmente a situação absurda de a maior parte do pessoal do quadro do Serviço do Provedor de Justiça se encontrar em situação de requisitado ou em comissão de serviço.

7.2.3.3 — Deste modo, e pelo exposto, no presente projecto determina-se como forma normal de provimento dos lugares do quadro do Serviço do Provedor de Justiça a nomeação ou, nos casos em que a lei expressamente o determine, o contrato.

Reduz-se o período de nomeação provisória de dois anos para um ano, de acordo com a orientação actualmente em regra estabelecida pela Direcção-Geral da Função Pública e já consagrada em vários recentes diplomas orgânicos.

Para aqueles cargos que se considera que motives inerentes aos mesmos impõem (Provedores de Justiça--Adjuntos), ou possam tornar conveniente (director de serviço), o provimento precário em comissão de serviço, estabelece-se esta, ou imperativamente, no primeiro caso, ou em alternativa com a nomeação, no segundo caso.

Tal forma de provimento (em comissão de serviço) é também admitida, a título excepcional, para os lugares de coordenador ou assessor para prevenir a hipótese da conveniência de algum daqueles lugares ser preenchido por indivíduo cuja especialização o tome necessário ao Serviço e que, ocupando já lugar na função pública ou em empresa pública ou nacionalizada, não queira exonerar-se do mesmo.

Quanto à requisição, embora seja admitida, de acordo com o seu conceito genérico, passa a não poder dar-se para lugares do quadro, destinando-se para desempenho temporário de funções que não possam ser asseguradas pelo pessoal permanente.

São mantidas, no entanto, as disposições do Decreto--Lei n.° 189-A/76 no que concerne aos efeitos da requ:sição, bem como da comissão de serviço.

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19 DE ABRIL BE 1978

590-(15)

7.2.4 — ARTIGO 12.º DO PROJECTO

Embora não pareçam possíveis dúvidas de que o pessoa] do Serviço do Provedor de Justiça se rege pelas leis respeitantes à função pública, considerou-se conveniente que tal ficasse expressamente determinado no diploma orgânico, tanto mais que, encontrando-se, em várias situações, pessoal a exercer funções no Serviço que, trabalhando pela primeira vez, não tem já, por situação anterior e que mantenha, estatuto que o reja, se torna imperioso que o mesmo fique bem claramente definido — e é o que se pretende com a disposição do n.° 1 do artigo 12.° do presente projecto.

Aliás, no anteprojecto da Lei de Bases da Função Pública, já referido, reconhece-se a mesma necessidade, quando na base I se abrange na classificação de «agentes administrativos» as pessoas que exercem funções no Serviço do Provedor de Justiça, justifi-cando-se a sua inclusão com a afirmação de que «a menção ao Provedor de Justiça [alínea b) do n.° 2J [...] destina-se a clarificar situações novas».

9 —CAPÍTULO V 9.1 — ARTIGO 27.º DO PROJECTO

9.1.1 —Tem sido regra geralmente seguida nas normas de transição de recentes diplomas orgânicos de serviços (por exemplo, artigo 34.°, n.° 3, do Decreto--Lei n.° 789/76, de 4 de Novembro, já atrás citado, e artigo 19.°, n.° 5, do Decreto n.° 48-1/77, de 4 de Maio), que o pessoal já pertencente à função pública, a qualquer título ou situação, e que vá preen-oher os lugares dos respectivos quadros, seja desde logo provido definitivamente.

9.1.2 — No presente projecto optou-se, porém, por não estabelecer tal regime para o actual pessoal do Serviço do Provedor de Justiça, resultando das disposições transitórias fixadas no artigo 27.° que o pessoal do Serviço virá a ter nos lugares que actualmente ocupa situações precisamente idênticas às que na data de entrada em vigor do diploma ora proposto lhe resultariam se, quando ingressou no Serviço, lhe tivessem sido aplicadas as regras de provimento establecidas nos artigos 7.º e seguintes do presente projecto.

Aliás, estando no momento presente providos todos os lugares do quadro do Serviço do Provedor de Justiça, só é previsível a entrada em funcionamento daquelas regras de provimento para o ingresso na hipótese de alguma vaga se vir a dar eventualmente no futuro ou para o preenchimento dos novos lugares de pessoal administrativo que no quadro de pessoal, anexo ao presente projecto de diploma, são criados.

9.1.3 — Desta forma, só serão providos, nos termos do artigo 27.°, com nomeação definitiva nos lugares que já ocupam no Serviço do Provedor de Justiça, os funcionários que já tenham provimento definitivo noutro lugar da função pública.

Para o restante mantém-se — à semelhança do que nos artigos 7.° e seguintes é estabelecido para o ingresso nos lugares do quadro do Serviço— a nomeação provisória pelo período de um ano, contado a partir da data em que entrou para o mesmo, findo o qual aquela nomeação provisória se converterá em definitiva.

Note-se que o actual pessoal do Serviço do Provedor de Justiça, na generalidade em situação de requisitado ou em comissão, teria tido a possibilidade, nos termos dos artigos 5.° e 6.° do Decreto-Lei n.° 189-A/76, de ter ingressado desde logo no Serviço como nomeado (excepto o pessoal administrativo e auxiliar, quando já era funcionário público ou administrativo, ao qual, inexplicavelmente, o n.° 3 do artigo 6.° impõe provimento obrigatório em comissão), pelo que, por força do artigo 27.° proposto, mais não resultará que corrigir a situação anómala actual daquele pessoal

— ocupando lugares do quadro em regime precário —, dando ao funcionamento do próprio Serviço garantias de estabilidade.

9.1.4 — Finalmente, a excepção prevista no n.° 4 do mesmo artigo 27.° destina-se a satisfazer o desejo manifestado por alguns coordenadores e assessores

— em regra, de profissão magistrados judiciais e do Ministério Público— na situação de requisitados no Serviço do Provedor de Justiça em conservarem o direito de regresso ao seu lugar do serviço de origem.

A referida norma tem por fim a conservação no Serviço do Provedor de Justiça daqueles funcionários que, postos perante a alternativa de terem de se exonerar do cargo que possuem no serviço de origem, em consequência de nomeação para o lugar que actual-mente ocupam como requisitados, ou voltarem para aquele primeiro lugar, eventualmente optariam por esta última hipótese, com manifesto prejuízo do serviço onde actualmente desempenham funções. Há ainda a considerar o reduzido número dos que irão usar da possibilidade de opção que lhes é concedida.

9.2 — ARTIGO 30.º DO PROJECTO

A disposição do n.° 2 do artigo 30.° é consequência lógica da revogação estabelecida no seu n.° 1 e destina-se a salvaguardar a situação do actual pessoal do Serviço do Provedor de Justiça e o seu funcionamento até à publicação da lista nominativa a que se refere o artigo 27.°

Aliás, disposição idêntica é comum em diplomas orgânicos recentes em que se processa provimento de pessoal para novos quadros por lista nominativa (por exemplo, o n.° 2 do artigo 37.° do Decreto-Lei n.° 789/ 76, de 4 de Novembro, e o n.° 2 do artigo 29.° do Decreto n.° 48-1/77, de 4 de Maio).

III

Dados estatísticos relativos ao ano de 1977

QUADRO N.º 1 Movimento geral de processos

I — Número de processos organizados

Queixas escritas .................................................. 1 554

Queixas verbais ................................................... 382

Iniciativas do Provedor ....................................... 42

Pedidos de declaração de inconstitucionalidade ......... 22

Total ............................. 2 000

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II SÉRIE — NÚMERO 62

II — Número de processos movimentados e a movimentar

o) Processos que transitaram de 1976 ..................... 1 290

b) Processos organizados em 1977 ......................... 2 000

c) Processos de 1976 reabertos em 1977 .................. 7

Total ............................. 3 297

d) Processos terminados durante 1977:

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

e) Processos que transitam para 1978:

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

III — Número de processos apensados

Processos apensados a outro já pendente por idêntica

reclamação ...................................................... 65

Processos incluídos em iniciativas do Provedor ......... 49

Total ............................._114

QUADRO N.° 2 Queixas rejeitadas liminarmente

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

QUADRO N.º 3 Proesssos com conclusão final

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

QUADRO N.º 4

Classificação das queixas por assunto

o) Administração da justiça: Processo penal:

Instrução ........................................... 10

Prisão preventiva ................................ 18

Questões diversas................................ 42

Outros processos judiciais:

Atrasos ............................................. 78

Questões diversas ................................ 113

b) Contribuições e impostos ................................. 37

c) Crimes (deficiência de previsão legal e ou de per-

seguição criminal) ....................................... 11

d) Descolonização ............................................... 90

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19 DE ABRIL DE 1978

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e) Direitos humanos:

Direito ao ensino ..................................... 45

Direitos familiares .................................... 7

Outros .................................................... 22

f) Direitos políticos ............................................. 5

g) Empresas:

Intervenção estatal .................................... 12

Ocupações ............................................... 9

Questões diversas ...................................... 11

h) Expropriações ................................................ 14

0 Habitação:

Arrendamento .......................................... 12

Despejos .................................................. 49

Ocupações ............................................... 13

Questões diversas ...................................... 8

f) Licenciamento de actividades industriais e comerciais ........................................................... 13

k) Obras:

Construções e obras ilegais ........................ 29

Licenciamento .......................................... 8

Questões diversas ...................................... 25

0 Polícia......................................................... 30

m) Processo administrativo .................................... 6

n) Questões agrárias:

Reforma Agrária — Ocupações .................. 13

Questões diversas ...................................... 15

o) Regime prisional ............................................. 76

p) Registos......................................................... 11

q) Segurança social:

Abono de família ..................................... 7

Aposentação e reforma.............................. 94

Pensão de sobrevivência ............................. 31

Questões diversas ...................................... 41

QUADRO N.° 5 Entidades visadas nas queixas

I — Administração Central

Governo ............................................................ 6

Primeiro-Ministro ................................................

Presidência do Conselho de Ministros ..................... 3

Comissariado para os Desalojados .......................... 30

Secretaria de Estado da Administração Pública ....... 39

Secretaria de Estado do Ambiente ........................

Secretaria de Estado da Comunicação Social .......... 14

Secretaria de Estado da Cultura ...........................

Secretaria de Estado da População e Emprego ....... 5

Ministério da Defesa Nacional ..............................

r) Trabalho:

Função pública:

Adidos .............................................. 102

Admissões.................... ...................... 21

Carreiras ........................................... 44

Concursos .......................................... 126

Demissões e despedimentos .................. 33

Disciplina .......................................... 28

Reintegrações ..................................... 20

Remunerações .................................... 88

Saneamentos ...................................... 13

Questões diversas ................................ 143

Sector privado:

Despedimentos .................................... 20

Questões diversas ................................ 26

s) Transportes e comunicações .............................. 20

t) Diversos ......................................................... 244

u) Assunto incompreensível.................................._3

Total ............................ 1936

Ministério do Plano e Coordenação Económica ....... 8

Ministério da Administração Interna ..................... 198

Ministério da Justiça ........................................... 213

Ministério das Finanças ....................................... 154

Ministério dos Negócios Estrangeiros ..................... 37

Ministério da Agricultura e Pescas ........................ 37

Ministério da Indústria e Tecnologia ..................... 25

Ministério do Comércio e Turismo ........................ 20

Ministério do Trabalho ........................................ 52

Ministério da Educação e Investigação Científica ..... 262

Ministério dos Assuntos Sociais ............................. 168

Ministério dos Transportes e Comunicações ............ 37

Ministério das Obras Públicas ............................... 14

Minstério da Habitação, Urbanismo e Construção ... 19

Total ............................. 1 341

II—Administração regional Administração regional ........................................ 4

III — Administração local

Governos civis .................................................... 6

Câmaras municipais ............................................. 158

Se viços municipalizados ....................................... 2

Juntas de freguesia ............................................. 14

Assembleias de freguesia ...................................... 1

Total ............................. 181

IV — Empresas públicas, nacionalizadas e intervencionadas

Empresas públicas e nacionalizadas ........................ 48

Empresas intervencionadas.................................... 2

Total ............................. 50

V — Outras entidades

Presidência da República ..................................... 2

Conselho da Revolução ....................................... 4

Assembleia da República ..................................... 1

Tr.bunais ........................................................... 229

Forças armadas................................................... 24

Comissão Nacional de Eleições .............................. -

Entidades particulares .......................................... 86

Indefinidas ........................................................._14

Total ............................. 360

QUADRO N.° 6 Situação sócio-profissional dos reclamantes

I — Queixas individuais

Agricultor .......................................................... 19

Comerciante ....................................................... 24

Industrial ........................................................... 23

Militar ............................................................... 13

Proprietário ........................................................ 7

Trabalhador da Administração Central ................... 544

Trabalhador da administração regional ................... 3

Trabalhador da administração local ....................... 25

Trabalhador de empresa pública ou nacionalizada ... 24

Trabalhador do sector privado .............................. 246

Aposentado ou reformado .................................... 142

Desempregado ou sem profissão ............................ 49

Emigrante .......................................................... 12

Recluso ............................................................. 150

Profissão não declarada ....................................... 460

Total ............................. 1 731

II—Oueixas colectivas

Associações profissionais ....................................... 3

Sindicatos e associações sindicais ........................... 26

Comissões de moradores ....................................... 5

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590-(8)

II SÉRIE — NÚMERO 62

Comissões de trabalhadores .................................. 4

Entidades públicas ............................................... 21

Partidos políticos ................................................. 2

Outros ............................................................... 144

Total ............................. 205

QUADRO N.º 7 Origem geográfica das queixas

I — Distritos continentais

Aveiro ............................................................... 38

Beja .................................................................. 9

Braga ................................................................ 77

Bragança ........................................................... 16

Castelo Branco ................................................... 33

Coimbra ............................................................ 116

Évora ................................................................ 30

Faro.................................................................. 51

Guarda .............................................................. 13

Leiria ................................................................ 35

Lisboa ............................................................... 856

Portalegre .......................................................... 20

Porto ................................................................ 259

Santarém ........................................................... 78

Setúbal .............................................................. 138

Viana do Castelo ................................................ 30

Vila Real ........................................................... 32

Viseu ................................................................. 54

Total ............................. 1 885

II — Regiões autónomas e território de Macau

Açores .............................................................. 18

Madeira ............................................................. 13

Macau...............................................................

Total ............................. 31

III — Estrangeiro e não identificada

Estrangeiro ........................................................ 20

Não identificada ..................................................

Total ............................. 20

QUADRO N.* 8

Funcionamento administrativo do Serviço do Provedor de Justiça

I — Correspondência

Número de ofícios recebidos ................................. 7 249

Número de ofícios expedidos ................................. 10 394

II — Atendimento do público

Número de pessoas atendidas pelo Provedor............ 252

Número de pessoas atendidas pelo adjunto do Provedor 69 Número de pessoas atendidas pelo sector de relações

públicas .......................................................... 2268

Dos quais:

Reclamações novas .................................. 374

Aditamentos ........................................... 389

Informações sobre o andamento das queixas 1 287 Questões fora da competência do Serviço do

Provedor de Justiça .............................. 132

Pedidos de audiência ............................... 86

Número de contactas telefónicos estabelecidos peto sector de relações públicas................................. 598

Dos quais:

Da iniciativa do público ........................... 374

Da iniciativa do Serviço do Provedor de Justiça .................................................... 71

Pedidos de arquivo de reclamação ............. 16

Outros assuntos....................................... 137

III — Diligências pessoais

Do Provedor ...................................................... 182

Do adjunto do Provedor, coordenadores e assessores 1

Do sector de relações públicas .............................. 1

IV — Reuniões internas

Reuniões de trabalho do Provedor com o adjunto do Provedor, coordenadores e assessores .................. 20

Reuniões de todos os trabalhadores do Serviço do Provedor de Justiça sobre assuntos de trabalho e de pessoal ............................................................ 5

IV

Análise interpretativa dos dados estatísticos

A análise do movimento geral de processos do quadro n.° 1, em comparação com o mesmo quadro de

1976, mostra-nos que em 1977 houve no total de processos organizados mais 24%, notando-se um acréscimo de 14 % e 77 % respectivamente em relação às queixas escritas e verbais e aumentos de 300 % quanto aos processos de iniciativa do Provedor e de 120% relativamente aos de declaração de inconstitucionalidade.

Se tivermos em consideração que de 1976 transitaram 1297 processos, terá de concluir-se que em 1977

se movimentaram 3297, o que significa, em comparação com aquele ano, um acréscimo de 100%.

A média mensal de processos organizados em 1977 foi de 166, contra 134 em 1976, o que representa um aumento de cerca de 26 %.

Como, porém, o ano de 1976 (ainda que começassem a ser entregues ao Provedor nomeado queixas a partir de Janeiro) o Serviço só teve instalações a funcionar a partir de 9 de Junho e durante o mês de Agosto esteve encerrado, parece que se pode considerar que a percentagem de queixas apresentadas mensalmente não teria variado significativamente se o Serviço estivesse instalado desde 1 de Janeiro e ininterruptamente a funcionar.

De notar também que o número de processos encerrados em 1977 representa um apreciável acréscimo relativamente a 1976, o que se compreende não só por o Serviço estar já «rodado», mas ainda porque a partir de Fevereiro ficou completo o quadro de assessores.

E, se olharmos para os números de processos encerrados anualmente nos serviços de outros países, podemos, sem vaidade, mas com legítima satisfação, concluir que o nosso jovem Serviço do Provedor de Justiça pode apresentar resultados dignos de registo, já que são raros os que num ano encerram 50 % dos processos movimentados e muitos movimentam um número inferior ao nosso.

E todos os Serviços dos outros países se podem considerar já «rodados», uma vez que são mais antigos e, portanto, com maior experiência.

Ora, o nosso Serviço encerrou 1609 processos em

1977, o que representa cerca de 50 % de um total de

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19 DE ABRIL DE 1978

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3297 movimentados e cerca de cinco vezes mais do número de processos encerrados em 1976.

É curioso anotar, ainda relativamente aos quadros do movimento gerai de processos, que o número dos apensados a outro já pendente por identidade de reclamação foi quase o dobro do de 1976 e, em contrapartida, o de processos incluídos em iniciativas do Provedor pouco passou de metade.

Note-se também que sete processos que haviam sido encerrados em 1976 foram reabertos em 1977, porque os reclamantes apresentaram novos elementos que tal justificaram.

Tem interesse o estudo comparativo dos quadros respeitantes às entidades visadas nas queixas (quadros I, II, III, IV e V), já que dele se alcançam conclusões curiosas. Assim, ao passo que o número de queixas contra a Administração Central subiu de 1022 para 1341 (cerca de 31 %), as que se dirigiram contra a administração local foram apenas de mais 12 (ou seja, cerca de 0,75%).

Dentro de cada um destes grupos verifica-se que no da Administração Central o número de queixas contra o Governo baixou de 50%, contra o Primeiro-Minis-tro nenhuma queixa foi apresentada, mas, em contrapartida, contra a Presidência do Conselho de Ministros houve um decréscimo de 50% (3 em 1977, contra 6 em 1976); o Ministério da Administração Interna, que era o que totalizava o maior número de queixas em 1976, passou em 1977 para o 3.° lugar, trocando assim de posição com o Ministério da Educação e Investigação Científica, que registou em 1977 mais cerca de 63 %.

Na ordem decrescente mantêm-se em 2.° lugar os serviços dependentes do Ministério da Justiça, com um aumento de cerca de 31 %, seguindo-se-lhe, em 4.\ o Ministério dos Assuntos Sociais, com um aumento de cerca de 30 %, e depois os das Finanças e do Trabalho, aquele com mais cerca dc 17% e este com menos cerca de 5 %. A maior diferença foi a que se reporta ao Comissariado para os Desalojados, com um aumento de 500% em 1977, ou seja, 30, contra 6 em 1976. Relativamente ao Ministério da Habitação, Urbanismo e Construção houve um aumento de 101 %, passando de 9 para 19, e quanto à Secretaria de Estado da Comunicação Social, que conhecera 4 queixas em 1976, elevou-se para 14 em 1977, ou seja, mais 360%. Em compensação, a Secretaria de Estado da Cuítura, que em 1976 fora objecto de duas queixas, não registou nenhuma em 1977.

No que toca ao sector da administração local, é de salientar que em 1976 nenhuma queixa foi apresentada contra governos civis e em 1977 foram recebidas 6 e surgiu também pela primeira vez uma queixa contra uma assembleia de freguesia.

Relativamente às queixas contra empresas públicas, nacionalizadas e intervencionadas, não há praticamente qualquer diferença.

Ainda no que se refere ao quadro n.° 5 —Entidades visadas nas queixas—, mantém-se a grande distância o número das que se dirigem contra os tribunais, a que se segue as que visam entidades particulares, exactamente como já se havia verificado em 1976, só que enquanto o número daquelas aumentou em cerca de 25 %, o destas diminuiu em cerca de 20 % e, pefla primeira vez, surgiram queixas contra o Conselho da Revolução (4) e Assembleia da República (1), mantendo-se sensivelmente igual o número de queixas

contra as forças armadas, diminuindo em quase 50 % o das queixas indefinidas.

Não deixa também de ser curiosa a análise comparativa do quadro 6 —Situação sócio-profissional dos reclamantes —, no seu duplo aspecto de queixas individuais e colectivas.

Quanto ao primeiro, aumentou o número de queixosos trabalhadores da Administração Central, logo seguido daqueles que não declararam a sua profissão — que se ignora— e, depois, dos do sector privado e dos aposentados ou reformados, sendo, e mui, significativo o aumento do número de queixas dos reclusos (cerca de 300% — 150/45).

Assim, é de 38 % o aumento do número de queixas dos trabalhadores da Administração Central e são significativas as diminuições de queixas de trabalhadores do sector privado (15 %), de comerciantes (cerca de 19%), de trabalhadores de empresas públicas ou nacionalizadas (cerca de 52 %) e de agricultores (cerca de 44 %).

Quanto ao segundo —queixas colectivas—, em 1977 duplica o número de queixas não diferenciadas (144/71) e sensivelmente igual às que provêm de sindicatos e associações sindicais (26/24) e diminui de 11/3 o de associações profissionais (cerca, pois, de 77 %).

Na análise comparativa do quadro n.° 7 — Origem geográfica das queixas — continuam a ser os distritos continentais de Lisboa, Porto, Setúbal e Coimbra os que fornecem maior número de queixas, seguindo--se-lhes Santarém, Braga, Viseu, Faro, Aveiro, Leiria. Castelo Branco e Vila Real, sendo os distritos que menos queixas fornecem os de Beja, com 9, Guarda, com 13, e Bragança, com 16, e Lisboa só para si reserva cerca de 45% do total, o Porto, 13,8%, Setúbal, 0,73 %, Coimbra, 0,06 %, e Santarém e Braga, 0,04 %. De notar que o distrito de Vila Real quase aumentou em 200% e o de Leiria diminuiu cerca de 30%.

Relativamente às regiões autónomas e ao estrangeiro, o panorama não sofreu alteração.

Verifica-se, pois, que continuam a ser pertinentes as observações feitas no relatório de 1976 quanto à origem geográfica das queixas, ou seja, que as diferenças que se verificam se deverão muito pessoalmente não só à maior densidade populacional, como ao seu maior ou menor grau de desenvolvimento sócio-econó-mico e cultural, tanto mais que as zonas donde chegam menor número de queixas são precisamente das que mais desfavorecidas se apresentam sob aqueles aspectos.

São deveras significativos os números revelados no quadro n.° 8—Funcionamento administrativo. Com efeito, no que se refere à correspondência, o número de ofícios recebidos aumentou em 4541 unidades, ou seja, 251,5%; o de expedidos passou de 4000, em 1976, para 10394, em 1977, isto é, mais 6394 unidades, ou seja, cerca de 260%.

E, no que se reporta ao atendimento do público, cujos dados só a partir de Janeiro de 1977 começaram a ser sistematicamente anotados, vê-se que o Provedor (em 1976 apenas se tinham tomado estas notas de 12 de Novembro a 31 de Dezembro) atendeu 252 pessoas, num período que equivale, descontados os sábados, domingos, 30 dias de férias e os feriados (12), a 219 dias úteis. Por seu turno, o sector de relações públicas atendeu 2268 pessoas e teve 598 contactos telefónicos, o que corresponde a ter recebido em média 9 pessoas em cada dia útil (o total é de 249 dias úteis,

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II SÉRIE — NÚMERO 62

visto não se descontarem 30 dias de férias, dado serem dois funcionários e, como é óbvio, não terem as suas férias no mesmo período de tempo); e atenderam em média de 2,07 telefonemas por dia.

Por outro lado, verifica-se que durante o ano o Provedor fez 182 diligências pessoais e teve 25 reuniões internas de trabalho, o que representa uma média de 15 diligências por mês e 2 reuniões internas em igual período.

V

Propostos de nova legislação e de alterações à vigente

1) Projecto enviado ao Sr. Ministro da Justiça

Com a publicação do Deoreto-Lei n.° 173/74, de 26 de Abril, teve-se em vista o cumprimento de uma das promessas do Programa do Movimento das Forças Armadas e ir ao encontro da justa aspiração de todos os antifascistas e democratas, reparando todas as prepotências, injustiças e abusos praticados pelo regime corporativo-fascista.

Ao abrigo das suas disposições e dentro do prazo que veio a ser assinalado pelo Decreto-Lei n.° 475/75, de 1 de Setembro, pode dizer-se que a quase totalidade das vítimas desses actos iníquos requereram e obtiveram reparação.

Acontece, porém, que houve interessados que não requereram em prazo a sua reintegração: uns por desconhecimento do direito que lhes havia sido reconhecido, outros por não .terem ainda regressado ao território nacional, do qual se encontravam afastados, seja por estarem exilados, seja por estarem em serviço ou a viver nas ex-colónias. É o que se verifica, por exemplo, com um reduzido número de marinheiros demitidos da Armada por terem tomado parte na revolução de 7 de Fevereiro de 1927 e na revolta de 1936.

Por outro lado, uma interpretação exclusiva da letra do decreto-lei e por isso inadequada, por contrária ao seu espírito, aos fins que ele pretendia visar e à vontade nacional que desejava satisfazer, levou a não considerar abrangidos por esse diploma indivíduos que, embora estando munidos dos respectivos e necessários requisitos para serem servidores do Estado, ou não foram nomeados, nem aproveitados, ou, tendo sido nomeados ou obtido aprovação em concurso, não entraram em efectividade de serviço, por acto da Administração de motivação política.

Essa mesma errada interpretação pode levar a esquecer que houve quem se visse afastado de lugares de docência e outros com o fundamento de não ter entregue os documentos necessários — apesar de o terem sido — ou que os mesmos se extraviaram.

E há que ter presente e contemplar a situação daqueles que, tendo sido bolseiros do Instituto para a Alta Cultura, lá fora ou no País, com notável aproveitamento e até com doutoramento em Universidades estrangeiras de assinalado prestígio, jamais foram aproveitados para a docência, com grave prejuízo não só para os próprios, como para o ensino e o progresso da ciência em Portugal, já que se viram forçados a ir ensinar para universidades estrangeiras.

Ora, todas estas situações, tendo a mesma origen — a da perseguição fascista—, têm igual direito a reparação.

Assim:

Tendo em vista que o Governo já definiu claramente a sua posição quanto ao âmbito de aplicação e entendimento a dar ao Decreto-Lei n.° 173/74, como se alcança do preâmbulo do decreto, promulgado em 3 de Novembro de 1976 e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.° 261, do dia 12 do mesmo mês, referendado por todos os Ministros, e

Considerando que seria discriminatório e contrário ao espírito e fim de reparação de todos os actos de abuso, prepotência e injustiça praticados pelo fascismo não procurar que todas as vítimas desses actos possam ter a devida reparação:

O Governo decreta, nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.° É concedido um novo prazo de sessenta dias, a contar da publicação deste diploma, para requererem a reintegração nas suas funções, aos servidores do Estado, civis e militares, que tenham sido demitidos, reformados, aposentados ou passados à reserva compulsivamente e separados do serviço por motivos de natureza política anteriormente a 25 de Abril de 1974.

Art. 2.° Igual concessão é feita a todas os que, por iguais motivos e antes da mesma data, tenham sido colocados numa das seguintes situações:

a) Impedidos de entrar em funções depois de

nomeados;

b) Não tenham sido nomeados para cargo a que

tivessem concorrido e obtido aprovação;

c) Cuja documentação entregue para concurso

documental tenha sido extraviada;

d) Que, tendo sido bolseiros do Instituto para a

Alta Cultura, fora do País ou dentro dele, e reunindo os requisitos necessários, não tenham sido contratados para a docência;

e) Se tenham visto compelidos a requerer a sua

exoneração ou aposentação.

Art. 3.° Os artigos anteriores beneficiam mesmo aqueles que porventura já houvessem requerido a sua reintegração e tiveram os seus requerimentos indeferidos com fundamento em apresentação fora do prazo estabelecido no artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 475/75, de 1 de Setembro, ou na não aplicabilidade do Decreto-Lei n.° 173/74, por o requerente não ter tido efectividade de funções ou nem sequer ter sido nomeado ou contratado, embora possuindo os requisitos para tal.

Art. 4.° — 1 — É aplicável a todos os que venham a ser reintegrados ao abrigo do presente diploma a disposição do n.° 2 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.° 173/74.

2 — A referida disposição será também aplicável aos servidores do Estado, civis e militares, que, pelos motivos políticos mencionados no artigo 1.° e antes de 25 de Abril de 1974, tenham sido preteridos ou prejudicados em provimento, promoção ou colocação a que tinham provado direito se não tivessem sido preteridos, desde que o requeiram no prazo de sessenta dias.

Em caso algum a reparação da injustiça poderá implicar o pagamento de quaisquer possíveis diferenças de vencimentos ou de indemnizações pecuniárias.

Art. 5.° — 1 — Os requerimentos, ao abrigo do disposto nos artigos anteriores, deverão ser entregues

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no Ministério que superintenda no departamento do Estado a que o requerente deva considerar-se subordinado.

2 — A instrução e parecer fundamentado sobre se a reintegração deve ou não ser deferida serão da competência da auditoria jurídica do respectivo Ministério, que, para o efeito, terá os poderes atribuídos no artigo 2.º do Decreto-Lei n.° 304/74, de 6 de Julho.

3 — A decisão de reintegração compete ao Ministro.

4 — Os processos que tenham sido indeferidos nas condições mencionadas no artigo 3.º serão, independentemente de requerimento dos interessados, apresentados ao Ministro respectivo pela auditoria jurídica para nova decisão, no prazo de vinte dias a contar da publicação do presente diploma, a qual deverá ser proferida nos dez dias imediatos.

Art. 6.° Os requerimentos apresentados ao abrigo deste diploma deverão estar instruídos, ter parecer e ser apresentados para decisão no prazo de noventa dias e esta proferida nos dez dias imediatos.

Art. 7.° Os processos poderão ser instruídos documentalmente ou através de depoimentos de testemunhas de reconhecida idoneidade democrática e antifascista, os quais poderão revestir a forma de declarações subscritas sob palavra de honra perante notário, que assim o certificará no reconhecimento da assinatura.

Art. 8.° Este diploma entra imediatamente em vigor.

Este projecto, conforme foi comunicado ao Provedor, foi aprovado na generalidade pelo I Governo Constitucional, devendo ser apresentado ao Conselho de Ministros para aprovação na especialidade, depois de lhe serem introduzidas certas alterações pelo Ministro da Justiça, o que, assim se espera, acontecerá na vigência do II Governo.

2) Processo n.° 76/IP-6 — Garantias da legalidade administrativa:

As observações feitas no ofício que a seguir se transcreve, enviado ao Gabinete do Sr. Ministro da Justiça, são o resultante do consenso em reunião conjunta do Provedor com o Provedor-Adjunto, coordenadores e todos os assessores sobre o estudo elaborado pela assessora Dr.° Maria Helena Carvalho Fernandes relativo ao projecto de lei respeitante ao reforço das garantias da legalidade administrativa:

Acuso a recepção do último projecto de decreto-lei relativo ao reforço das garantias da legalidade administrativa e dos direitos individuais dos cidadãos, que muito agradeço.

Tendo este Serviço analisado o teor desse diploma, tanto na sua generalidade como na especialidade, ofereceram-se as observações que a seguir se enunciam:

Na generalidade

Tendo em atenção as carências que na matéria a prática tem revelado e aproveitando os ensinamentos colhidos em variadíssimas experiências estrangeiras, considera-se de grande conveniência a consagração legal de determinados princípios

que reputamos essenciais numa perspectiva de maior garantia dos administrados no campo do processo administrativo gracioso. São eles:

A) Noção de interessado para efeito de actuação

no processo administrativo gracioso

Dada a crescente margem de intervenção dos particulares no processo administrativo, parece--nos importante definir a noção de interessado, aceitando-se, na falta de melhor critério, o conceito contido na Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo.

B) Direito de os interessados tomarem conheci-

mento do andamento do processo e do seu conteúdo

Estando este direito consignado no artigo 269.° da Constituição, afigura-se-nos que se impõe a sua regulamentação numa lei que vise reforçar as garantias da legalidade administrativa e dos direitos individuais dos cidadãos.

O Direito de ser ouvido antes que uma decisão administrativa seja tomada

De harmonia com este princípio, todos os cidadãos devem ter a possibilidade de fazer valer os seus pontos de vista sobre os factos e o direito que lhes assiste antes de ser preferida decisão que a eles respeite.

A adopção de tal princípio, pela prova e argumentação contraditória que permite, concorrerá certamente para a imparcialidade das decisões administrativas.

Todavia, a fim de se não prejudicar a celeridade do processo administrativo, não deve este princípio ser aplicado em todas as instâncias, im-pondo-se, portanto, uma ponderada regulamentação do mesmo.

D) Regulamentação dos requerimentos

Propõe-se que fique estabelecida na lei, por forma geral, a possibilidade de a parte que não tenha apresentado o seu requerimento devidamente formulado o regularizar dentro de um prazo a fixar, considerando-se a data em que o requerimento pela primeira vez foi apresentado como a de entrada para todos os efeitos legais; por outro lado, salienta-se também a necessidade de atribuir legalmente aos requerentes o direito a que os duplicados dos seus requerimentos sejam carimbados no serviço onde são entregues, o que terá indiscutível interesse para efeitos de prova, sobretudo no domínio do acto tácito.

Para a hipótese de remessa do requerimento pelo correio, dever-se-ia permitir que o administrado juntasse envelope, endereçado e selado, para a devolução do duplicado.

F) Extracção de certidões das peças do processo

Sendo princípio assente o de que os particulares dispõem do direito de tomarem conhecimento do andamento dos processos em que são interessados, justifica-se plenamente a inserção na lei do princípio segundo o qual todo o particular dispõe do direito a que lhe sejam passadas cer-

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tidões das peças do processo para efeitos de recurso e de efectivação de responsabilidade civil da Administração. Isto, como é evidente, salvo nos casos em que o interesse público o não aconselhe.

Na especialidade

Artigo 1.º

Pelo que respeita a este artigo, em que se indicam taxativamente os actos administrativos que devam ser fundamentados, considera-se preferível a fixação da regra geral da obrigatoriedade de fundamentação de todos os actos constitutivos de carácter definitivo e executório, ainda que a seguir se especifiquem, mas a título exemplificativo, os actos expressamente referidos no projecto.

Esta orientação, na medida em que diminuiria as probabilidades de dúvidas sobre a matéria, constituiria necessariamente uma garantia mais eficaz.

Por outro lado, entende-se que teria vantagem para os administrados ser a Administração a comunicar-lhes oficiosamente todos os actos administrativos que produzam efeitos jurídicos na esfera dos mesmos, indicando, para além da fundamentação respectiva, a data do despacho e a identificação da entidade que o haja proferido. Importaria, enfim, cominar com a sanção da nulidade a violação deste preceito.

Artigo 2.º

Entende-se que o regime proposto neste preceito é susceptível de gerar graves demoras e embaraços à Administração, coarctando ainda, em parte, a possibilidade de defesa dos particulares.

A este propósito, alerta-se para o facto de nos casos em que os interessados não efectivem a reclamação necessária ficar o Ministério Público inibido de interpor recurso, com a correspondente consequência no tocante ao prazo de revogabilidade.

Artigo 3.°

Com referência à matéria regulada na alínea a) do n.° 3 deste preceito, entende-se que devia ser legalmente estabelecido um prazo para à realização das formalidades especiais que a lei impõe como processo preparatório de qualquer decisão administrativa.

Por outro lado, a Administração deveria ficar vinculada a notificar o interessado da conclusão desse processo preparatório.

Neste contexto, o prazo para a formação do acto tácito a que se reporta a citada alínea a) deveria contar-se a partir da data daquela notificação.

Artigo 4.º

Considera-se demasiadamente longo o prazo de um ano fixado para a impugnação facultativa do acto tácito.

Artigo 5.º

Pelo que respeita à inexecução de sentença por causa legítima, considera-se que a Administração deve solicitar oficiosamente ao tribunal

que declare justificada essa inexecução, admitindo-se nesse processo que o interessado seja notificado para efeito de poder contrapor.

Artigo 10.º

Nos casos de inexecução de sentença por causa legítima, entende-se que a indemnização deveria ser fixada, em princípio, no próprio processo que julga daquela legitimidade, excepto quando seja necessário recorrer a meios de prova não compatíveis com o respectivo regime de funcionamento processual.

Nesta última hipótese, em que terá de haver acção autónoma, dever-se-ia prever, em benefício dos administrados, a isenção das respectivas taxas e outros encargos.

Artigo 13.º

A fim de permitir à Administração preparar-se devidamente para a correcta e eficaz, aplicação deste diploma, considera-se que teria interesse estabelecer um período de vacatio legis mais dilatado, pelo menos quanto ao disposto no artigo 1.°, recomendando-se, no entanto, a sua aplicação imediata, mas a título meramente experimental.

Cotejando estas observações com o diploma que veio a ser publicado, verifica-se que nem todas foram tomadas em consideração, ao que parece por o legislador as ter tido por utópicas.

3) Processo n.º 76/R-1118

A informação abaixo transcrita, elaborada pelo assessor Dr. Manuel Marcelino, foi enviada, com a indicação de ter a concordância do Provedor, ao Ministério das Finanças e ao Presidente da Assembleia da República, pelo ofício n.° 5383, de 28 de Junho de 1977, por respeitar a matéria da competência legislativa reservada à Assembleia:

A questão suscitada pelo reclamante, da situação dos cônjuges casados em regime de separação de bens, ainda que imperativamente, em sede de imposto complementar, pode ser apreciada à face da lei vigente, de jure constituendo, e, quanto aos órgãos competentes para a sua eventual alteração, na presente estrutura constitucional — o que faremos de seguida, com a observação prévia de que tal apreciação não será aplicável à situação, afim, dos cônjuges separados de facto, da qual, por isso e por não ser o caso da reclamação, abstrairemos em princípio.

I

Face ao artigo 7.° do Código do Imposto Complementar (ver ainda Acórdão de 17 de Maio de 1974 do tribunal pleno do Supremo Tribunal Administrativo, Acórdãos Doutrinais, 162, junto p. 887, na parte em que se refere ao disposto naquele preceito, e também Joaquim Pires, Código

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do Imposto Complementar, 1973, p. 41, era nota ao mesmo preceito), do seguinte teor:

Para efeitos do imposto complementar são atribuídos ao chefe de família:

a) Os rendimentos comuns do casal;

b) Os rendimentos próprios do outro

cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens;

c) Os rendimentos dos filhos, adoptados

e enteados, menores, não emancipados ou que sejam inaptos para o trabalho e para angariar meios de subsistência, de que seja administrador o chefe de família ou outro cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens;

não temos dúvidas de que a lei não quis excepcionar a situação do redamante, pelo que nada é possível fazer relativamente à tributação do ano a que o mesmo se reporta.

Tal solução, apoiada, aliás, no espírito que veremos ser o daquela norma, tem até raizes históricas concludentes: autorizado o Governo, pelo artigo 6.º da Lei n.° 2010, de 22 de Dezembro de 1945, «a remodelar o sistema de liquidação e cobrança do imposto complementar, com englobamento geral de rendimentos tributáveis, [...]», veio ele a exceptuar de tal englobamento, no artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 35 594, de 13 de Abril de 1946, a mulher casada em regime de separação absoluta de bens só quando não vivesse em comum com o marido, excepção que foi integalmente excluída pelo preceito transcrito.

Em face do exposto, não podia deixar de ser também aquela a conclusão da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, expressa na primeira parte e muito especialmente no terceiro parágrafo do seu ofício n.° 3170, de 22 de Setembro de 1976, que se junta.

II

1 — Contra a solução consagrada por aquele artigo 7.°, poderá argumentai-se, como se faz no citado acórdão, que, «devendo o imposto sair dos rendimentos sobre que incide, naturalmente que há-de caber o seu pagamento a quem legalmente tiver recebido esses rendimentos» e ainda que — argumento histórico—, tendo sido aquela «disposição legal redigida quando ainda vigorava o Código Civil de 1867, pelo qual a administração de todos os bens do casal, sem excepção dos próprios da mulher, pertencia ao marido (artigos 1117.º, 1104.° e 1189.º), enquanto pelo artigo 1678.°, n.° 2, alínea d), do actual já ele não é o administrador dos bens da mulher casada no regime de separação, mesmo no caso de o casamento se ter celebrado anteriormente à sua entrada em vigor (artigo 14.° da respectiva lei preambular), o que faz admitir que, se redigida depois de 1 de Junho de 1968, o teria sido em termos diferentes».

A primeira das críticas apontadas é a formulação abstracta das situações gritantes, como a apontada pelo reclamante, em que o sujeito pas-

sivo do imposto pode auferir, rectius, beneficiar minimamente dos rendimentos sobre que o mesmo incide.

Poder-se-á ainda acrescentar que a solução legal incita a uniões ilícitas e a actos simulados.

2 — Parece-nos, contudo, que tais considerações não devem impressionar demasiadamente.

Com efeito, a lei fiscal, ao atribuir ao chefe de família a totalidade dos rendimentos entrados no agregado familiar, fê-lo da óptica económica com que encara tal questão, consubstanciada na realidade de que, na maior a dos casos, tais rendimentos são, indiscriminadamente, afectados à subsistência do agregado familiar, em termos não (necessariamente) coincidentes com a titularidade jurídica dos bens que os geram, nem com os poderes legais da sua administração.

Estaremos, em nosso entender, perante um daqueles casos em que o «direito fiscal, de acordo com os seus fins, considera os actos e situações do mundo real fundamentalmente no seu aspecto económico, despojando-os das roupagens com que os revestem os outros ramos de direito, nomeadamente o privado» (Alexandre do Amaral, Direito Fiscal, Coimbra, 59-60, 43).

É esta consideração que reduz substancialmente o peso dos argumentos que arranquem —como o histórico supra-referido e o alegado pelo reclamante — do desfasamento, neste campo, entre as soluções civis e as soluções fiscais — desfasamento a que o reclamante atribui dignidade (in)constitu-cional! É, porém, por de mais evidente que não há qualquer subordinação hierárquica das leis fiscais às cíveis.

E que o legislador fiscal não terá andado mal ao ser aqui sensível menos a critérios jurídicos do que à afectação económica prova-o o facto de a lei civil fazer depender a atribuição da administração dos bens do casal de vários factores e situações (artigo 1678.°), mesmo no regime de separação absoluta, onde a própria vontade dos cônjuges não é irrelevante [alínea e) e Pereira Coelho, Direito de Família, Coimbra, 67, 100 (2)], peJo que, se o regime tributário do imposto complementar tivesse e devesse acompanhar o que aquela lei estatui a este respeito, tomar-se-ia aleatório, de uma flutuação praticamente incontrolável e, as mais das vezes, desfasado da situação económica real.

E não vemos que tais considerações sejam descabidas, mesmo para a hipótese de separação imperativa, que, no aspecto em causa e da óptica que sublinhámos, não temos por certo merecer, pelo menos como regra, autonomia (relativamente aos casos de separação não imperativa, até porque, no campo da administração, não há, naquela hipótese, especialidades.

3 — Há, assim, que encontrar o regime-regra preferível para a generalidade dos casos, que comporte válvulas de escape para as tas situações gritantes de verdadeiro abuso do direito fiscal objectivo. É, afinal, ao que se reconduzem as conclusões, a seguir transcritas, do Congresso de 1955 da Associação Fiscal Internacional (Cahiers

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de Droit Fiscal International, vol. XXVM), aliás nem todas concordantes com o que escrevemos no número anterior:

É anormal e prejudicial que o simples facto do casamento se traduza por um aumento das cargas tributárias impostas aos dois cônjuges, colocando-os assim, no plano fiscal, numa situação mais desfavorável que um casal não formalizado ou que outros contribuintes que vivam sob o mesmo tecto.

A adição dos rendimentos dos cônjuges compondo um casal formalizado é apenas um processo técnico que não deve ser condenado tanto quanto seja compensado por medidas apropriadas destinadas a corrigir as injustiças, como sejam o recurso a taxas diferenciais bem calculadas, a aplicação de uma «quota familiar» tendo em consideração a real solvabilidade fiscal dos dois cônjuges; todas as possibilidades de injustiça ficarão, por hipótese, excluídas quando a adição dos rendimentos dos dois cônjuges for facultativa e deixada à livre escolha do casal tributável, pelo que esta solução deveria ser especialmente recomendada aos legisladores de todos os países em que um tal processo de adição constitua uma característica primária ou secundária da política fiscal.

Ora e no tocante à definição do citado regime--regra, o sistema que precisamente mais favorável se revela, em princípio, para a família é o da tributação conjunta, desde que seja completado por uma divisão do rendimento colectável do agregado familiar apenas pelos cônjuges (sistema americano e alemão), ou pelo número total de pessoas que constituem o agregado familiar (sistema francês do «quociente familiar»), aplicando-se ao quociente a taxa progressiva que lhe corresponde e obtendo-se o imposto pela multiplicação deste resultado pelo número de partes.

É que assim se consegue limitar a progressividade do imposto, pela aplicação de taxa progressiva mais baixa, no caso, frequente, de haver uma só fonte de rendimento ou de desigualdade entre as duas ou mais fontes do agregado famüar [Alberto Xavier, Manual .... I, Lisboa, 1974, 367 (2)].

Estes expedientes serão, deste modo, uma primeira via de minimizar injustiças — inclusive do tipo da invocada pelo reclamante—, as quais, contudo, nos casos mais graves, seriam obviadas pela aplicação da tributação separada, mediante requerimento, ou através da tipificação legal destes casos, como vimos ter acontecido, no nosso país e até à entrada em vigor do novo Código do Imposto Complementar, com «a mulher que, não vivendo em comum com o marido, seja casada em regime de separação absoluta de bens» e como acontece, actualmente, na grande maioria dos países de técnica fiscal mais avançada, com a situação de simples separação de facto superior a determinado período de tempo.

Como acontece com a situação de simples separação de facto .... mas já não, segundo cremos,

embora não tenhamos dados seguros a este respeito, com o casamento em regime de separação de bens, confirmando assim, e com a reserva feita ao direito comparado, as reticências que pusemos quanto à justeza da aplicação àquele casamento da tributação separada.

E dispensamo-nos de repetir aqui o que atrás escrevemos quanto à separação de bens imperativa, como é a do reclamante.

III

Em face do exposto, somos de parecer que se deverá:

l) Oficiar o reclamante, dando-lhe conta da natureza da intervenção do Provedor e da impossibrlidade de a reclamação ser atendida no tocante aos rendimentos dos anos a que alude, sem prejuízo do recurso aos meios normais e das diligências deste Serviço no sentido de pôr termo, num futuro que se deseja breve, à injustiça de situações como a invocada — se, efectivamente, se decidir empreender tais diligências, como se sugere no número seguinte; junta-se minuta do ofício, elaborada em conformidade;

2) Face ao sistema de tributação conjunta actualmente vigente, levar ao conhecimento do Ministério das Finanças e da Assembleia da República (artigos 106.°, n.° 2, e 167.°, da Constituição) a reclamação, acompanhada ou não de recomendação, conforme se entenda, perante o que deixamos exposto.

4) Processo n.º 76/IP-14

Assistência a conceder ao arguido em processo penal.

Observações e sugestões enviadas ao Gabinete do Ministro da Justiça:

1 — A análise e o estudo de diversos casos que têm sido apresentados à consideração deste Serviço têm permitido, para além das questões concretas que neles são abordados, chamar a atenção ,para ,um aspecto que num Estado democrático de direito se julga inseparável de uma correcta e equitativa administração de justiça —o da assistência a conceder ao arguido nas diversas fases do processo penal—, tanto mais que o regime legal vigente nesta matéria afigura bastante insatisfatório e que na prática quotidiana processual, presa ainda a métodos ultrapassados, em muito pouco tem contribuído para superar a manifesta inadequação das normas a um condicionalismo que se quer de renovação social e jurídica.

O problema tem uma amplitude tão vasta que não seria possível escalpelizá-lo em todas as suas incidências sem um estudo profundo e consciente, estudo esse que será necessariamente moroso, mas que não deixará de ser feito.

De todo o modo, e para já, está a merecer todo o interesse ao Serviço do Provedor de Justiça.

2 — Desconhece-se qual o prisma pelo qual a comissão encarregada dos trabalhos de reformulação

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e revisão do direito processual penal tem encarado (ou encarará) a problemática em causa e mesmo se pretenderá, para breve, operar uma alteração profunda nos dispositivos presentemente em vigor.

Porém, neste Serviço —que, como se disse, tem sido colocado algumas vezes perante a realidade do que efectivamente se passa— vem ganhando relevo a necessidade urgente de se recomendar — sem embargo de outras realidades que este assunto imporá que se estudem— a superação dos óbices mais graves que ocorrem e que estão relacionados com irregularidades ou carencias que são ofensivas das indispensáveis garantias de defesa dos arguidos, como também, e até, da própria integridade física daqueles, mediante legislação adequada (ainda que, porventura, transitória, mas já acautelando uma futura e definitiva) que defina alguns pontos que podem ser tidos por essenciais para que os direitos dos sujeitos do processo criminal não sejam objecto de qualquer compressão, ainda que involuntária.

No fundo, uma disciplina a definir legalmente e com pragmática urgência e que, necessariamente, terá de passar pelo desenvolvimento e consagração legal dos pontos seguintes:

a) Obrigatoriedade da assistência de advogado

em todos os actos que digam respeito ao arguido (interrogatórios, buscas, apreensões, etc);

b) Não distinção, para efeitos dessa obrigatorie-

dade, entre arguidos presos e soltos (como é o critério da lei vigente);

c) Designação judicial de advogado no início do

processo, segundo lista de elaboração e responsabilidade da Ordem dos Advogados (sem embargo, como é evidente, de o arguido poder constituir, a todo o tempo, um da sua escolha), assim se evitando que, ao lado de defensores oficiosos leigos era direito ou apenas de «mero corpo presente», surjam os defensores que, embora advogados, se caracterizem pela passividade;

b) Necessidade de a intervenção do advogado se juntar por uma dinâmica actuância (o mesmo, aliás, será de exigir ao Ministério Público) que a lei largamente permitisse, ultrapassando-se um condicionalismo legalmente consagrado de passividade, como resulta com clareza do terceiro período do corpo do artigo 253.º do Código de Processo Penal em vigor;

e) Estabelecimento de uma tabela de honorários que deveria ter em consideração a natureza do processo, a sua complexidade, estudo de que necessita, duração da audiência de julgamento, interposições de recursos e respectivas alegações, a fim de por ela serem fixados e pagos pela Ordem dos Advogados os honorários dos defensores oficiosos.

Para tanto seria criado um fundo especial em cada um dos conselhos distritais da Ordem dos Advogados, constituído pelas quantias em que seriam obrigatoriamente condenados os assistentes nos processos em que os arguidos sejam absolvidos e ainda por uma percentagem sobre a procuradoria

contada nos processos cíveis, que seria paga juntamente com as custas, e entregue à Ordem por cheque judicial passado a favor dos respectivos conselhos distritais.

3 — É isto que, para já, me permito levar ao conhecimento desse Ministério, que, de certo, não deixará de lhe conceder o mais rápido e maior interesse — se é que esse interesse não estará já a ser concedido —, tratando o assunto como se lhe afigurar mais conveniente, pois que outro não é afinal o objectivo das sugestões agora feitas e dos pontos que foram esboçados.

O Sr. Ministro da Justiça, ao acusar a recepção desta recomendação, comunicou que a iria transmitir à comissão encarregada da reforma do processo penal, mas observou a existência de dificuldades na sua integral aceitação, por considerar que o óptimo é inimigo do bom.

5) Processo n.º 77/IP-40

A recomendação que se segue foi enviada ao Primeiro-Ministro em 28 de Outubro de 1977 e foi por S. Ex.ª encarregado o Ministro da Justiça de elaborar um projecto de decreto-lei, a submeter ao Conselho de Ministros, o que certamente será, assim se espera, levado a efeito pelo II Governo Constitucional:

Débitos de entidades patronais relativos a empresas ocupadas — Recomendação

Grande número de cidadãos tem apresentado ao Provedor de Justiça reclamações relativas à situação das entidades patronais de empresas ocupadas pelos trabalhadores e actualmente em regime de autogestão. E, na realidade, a situação destes cidadãos é, por vezes, muito difícil; afastados da gestão das empresas, são constantemente perseguidos por credores diversos —bancos, fornecedores, administração fiscal, senhorios —, que tentam obter a satisfação de créditos contraídos pela empresa, quer antes, quer depois da ocupação.

Com a impossibilidade legal, durante largo período, de accionarem as empresas autogeridas, os credores não perdem qualquer oportunidade para se lançarem sobre as antigas entidades patronais. Actuação aliás facilitada pela circunstância de, na prática comercial corrente, ser vulgar os empresários assumirem em nome próprio responsabilidades para benefício da empresa, quantas vezes comprometendo nessas responsabilidades os cônjuges e os filhos.

Não se afigura aceitável que antes de publicado o estatuto das empresas em autogestão e resolvida a situação de cada empresa se torne a vida impossível aos titulares destas. Até porque se encontra uma vasta gama de situações muito diversas umas das outras: há patrões que sabotaram as empresas, outros que fugiram, abandonando as unidades de produção, para se eximirem às suas responsabilidades. Mas também há os que foram vítimas de intrigas e invejas que deixaram empresas equilibradas à beira da falência. As generalizações são impossíveis. E, como tal, há que ser prudente.

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Neste sentido o Provedor de Justiça recomenda:

1) Que seja concedida uma moratória legal

aos débitos contraídos ou garantidos por comerciantes em nome individual e sócios gerentes de sociedades comerciais e respectivos cônjuges e filhos, quando as suas empresas e estabelecimentos tiverem sido ocupados e provem que tais débitos tiveram ligação imediata com a gestão da empresa ou estabelecimento de que foram afastados, até à publicação do diploma legal que definir o estatuto das empresas em autogestão;

2) Que se suspenda a instância nas acções

executivas, de despejo e providências cautelares em que sejam réus ou exe-tadas pessoas que se encontrem nas circunstâncias referidas no número anterior.

Propõe-se, em suma, para as empresas em causa, uma solução paralela à consagrada no Decreto-Lei n.° 111/77, de 26 de Março, para as «dívidas relacionadas com a exploração silvo-agro-pecuária de prédios rústicos abrangidos pelos Decretos-Leis n.os 406-A/75, de 29 de Julho, e 407-A/75, de 30 de Julho.

6) Processo n.° 77-1387.—Prazo para a legalização

das ocupações de casas Alertado pela Associação dos Inquilinos Lisbonenses para a dificuldade —se não impossibilidade— de dentro do prazo fixado no Decreto-Lei n.° 294/77 se poder proceder à notificação (que, segundo a rectificação ao decreto-lei, publicada no Diário da República, n.° 211, de 12 de Setembro, deveria ser judicial) e à celebração dos contratos de arrendamento, correndo o prazo mais a mais em grande parte no período das férias judiciais, solicitou o Provedor uma audiência ao Sr. Ministro da Justiça, que prontamente lha concedeu nesse mesmo dia, a quem expôs a sua apreensão face àquelas dificuldades e recomendou verbalmente, dada a urgência, a necessidade de aquele prazo ser prorrogado pelo menos com noventa dias.

O Sr. Ministro concordou com as razões que lhe foram apresentadas e prometeu levar atempadamente ao Conselho de Ministros a proposta de prorrogação, o que efectivamente se verificou, vindo a ser aprovado e publicado o Decreto-Lei n.° 510/77, de 14 de Dezembro, que prorrogou aquele prazo por noventa dias.

7) Processo n.° 77-IP-41

Débitos ao Estado de titulares de bens de empresas nacionalizadas

Em 24 de Novembro foi remetido ao Primeiro-Mi-nistro um ofício com a recomendação que a seguir se transcreve:

Recomendação

Têm-se dirigido ao Provedor de Justiça muitos cidadãos titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas que, por ainda não have-

rem recebido as indemnizações a que têm direito por virtude da nacionalização, se encontram impossibilitados de solver compromissos assumidos para com entidades públicas, designadamente o Estado, a banca nacionalizada e a Caixa Geral de Depósitos.

Esta situação, para além da imoralidade patente na circunstância de o Estado, directamente ou através de uma das muitas entidades que prosseguem fins públicos, exigir a satisfação de créditos a quem é credor do próprio Estado, provoca prejuízos, quantas vezes irreparáveis, sobretudo porque os entes públicos não se coíbem de enviar a juízo os seus devedores.

Perante a gravidade de tal situação, impõe-se a adopção de medidas legislativas que dêem protecção aos cidadãos que, sem culpa alguma, se encontram nestas deploráveis situações.

Neste sentido, o Provedor de Justiça recomenda:

1) Que seja concedida uma moratória legal

aos débitos para com entidades públicas, designadamente o Estado, a banca nacionalizada e a Caixa Geral de Depósitos, desde que os respectivos devedores sejam titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas, até pagamento das indemnizações a que têm direito;

2) Que se suspenda a instância nas acções

executivas, de despejo e providências cautelares em que sejam autores entidades públicas quando sejam réus ou executados titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas até pagamento das indemnizações a que têm direito.

As medidas propostas encontram ainda justificação na necessidade de assegurar a utilidade do disposto nos artigos 30.° e 31.° da Lei n.° 80/ 77, de 26 de Outubro, sem uma moratória que abranja as dívidas fiscais relativas ao ano de 1976, tendo em conta que a lei ainda carece de regulamentações e que o processo para emissão dos títulos representativos do direito à indemnização é complexo e moroso, o dispositivo contido naqueles preceitos legais resultaria ineficaz — o que não poderá ter sido querido pelo legislador.

Foi pelo Governo enviado à Assembleia da República um projecto de lei que, pelo menos no que respeita ao pagamento de contribuições, parece contemplar aqueles titulares, pois nele se regulamenta o diploma legal que permitia efectuar o pagamento das contribuições com títulos de empresas nacionalizadas.

8) Problemas de desintervenção de empresas guando se decida entregá-las a uma cooperativa de trabalhadores

Em 28 de Novembro de 1977, o Provedor remeteu ao Sr. Primeiro-Ministro o ofício e o projecto de decreto-lei que a seguir se transcrevem e cuja justificação é bem patente:

A fim de se poder evitar que se consumam, por falta de legislação apropriada, algumas ver-

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dadeiras e gritantes injustiças, junto tenho a honra de remeter a V. Ex." um projecto de decreto-lei precedido de um curto relatório, pelo qual se mostra a necessidade da publicação do mesmo.

Essa publicação é, de resto, urgentíssima, dado estarem em curso prazos já estabelecidos para algumas desintervenções de empresas e, se não existirem os dispositivos legais preconizados no projecto, entregar-se-ão a entidades patronais manifestamente sabotadoras e indiferentes aos interesses da economia e dos trabalhadores, em detrimento destes, que, através de uma administração exemplar e de uma actuação honesta, exercida não selvaticamente, agiram tão-só no propósito de salvar os postos de trabalho e as empresas.

Ê só por atender à urgência de resolver estas situações que remeto esta recomendação já em forma de projecto de decreto-lei, o qual, não pretendendo ser de irrecusável perfeição, certamente o Governo aperfeiçoará ainda, utilizando-o apenas como instrumento de base de trabalho.

O Decreto-Lei n.° 422/76, de 29 de Maio, estabelece como uma das formas de desintervenção das empresas a constituição de sociedades cooperativas pelos trabalhadores.

É evidente que quando o Conselho de Ministros, a quem cabe tal decisão, resolve a desintervenção por esssa forma é porque do estudo a que procedeu concluiu não só ser essa a maneira justa para pôr termo à intervenção, como ainda porque reconheceu a viabilidade económica da empresa e que os trabalhadores, ao solicitarem a intervenção e durante esta, deram provas de capacidade para a dirigirem e de disciplina no trabalho e não agiram para destruir a empresa, mas sim para a salvar ou conservar.

Por outro lado, quando uma tal decisão é tomada é porque —nem de outra forma tal se compreenderia — não são a administração da empresa nem os titulares dos seus bens quem merece o apoio e protecção do Estado, mas sim os seus trabalhadores.

Acontece, porém, que o decreto-lei citado não tomou as medidas necessárias para obstar a que, em certos casos, a sua justa decisão possa não ser cumprida, seja por recusa dos titulares a venderem os bens da empresa, seja por exigências especulativas dos mesmos.

Assim —e a experiência já o veio mostrar—, se os titulares dos bens da empresa, abusando do seu direito de receber o pagamento do preço da venda desses bens, exigem uma soma especulativa, e não o preço justo a que tenham direito, tendo em atenção, como se impõe, que o preço a fixar deve considerar os valores sociais e a situação da empresa na data em que se iniciou a intervenção, o fim «de protecção aos trabalhadores e de moralização que a constituição de cooperativa como forma de desintervenção quer atingir ficará totalmente frustrado.

Ora, como toda a lei que reconhece um direito deve proporcionar os meios para a sua efectivação, cabe preencher a lacuna do Decreto-Lei

n.° 422/76, disciplinando as regras que devem ser observadas quando não se verifique acordo das partes ou quando uma delas não dê cumprimento ao acordo realizado. É esse o fim do presente diploma.

Artigo 1.º

1 — Sempre que, nos termos do Decreto-Lei n.° 422/76, de 29 de Maio, o Conselho dé Ministros decida pôr termo à intervenção de uma empresa através da constituição de uma sociedade cooperativa, é reconhecido aos trabalhadores que a constituem o direito potestativo de aquisição não só da denominação social ou firma, como do respectivo estabelecimento com todos os seus bens e direitos, incluindo o direito ao arrendamento e traspasse, quaisquer marcas ou patentes, maqui-nismos e mobiliário.

2 — Para a concretização da decisão referida no número anterior, observar-se-ão as seguintes regras:

a) Em fase inicial será tentado o acordo entre os detentores ou detentor da titularidade da empresa e a cooperativa, em negoc:ações de iniciativa e dirigidas pelo Ministério da Tutela, quer quanto à fixação do preço justo da aquisição da respectiva titularidade, quer quanto ao prazo e modo do seu pagamento; b) Na falta de acordo, será a divergência submetida obrigatoriamente a julgamento arbitral, nos termos do artigo 1525.° do Código de Processo Civil.

Artigo 2.º

1 — Verificando-se acordo nos termos da alínea a) do artigo anterior, será o mesmo reduzido a auto pelo representante do Ministério da Tutela, que o assinará e autenticará com o selo branco do mesmo Ministério.

2 — O auto será lavrado em triplicado, ficando um exemplar arquivado no Ministério da Tutela, no proceso de desintervenção da empresa, e sendo cada um dos outros exemplares entregue às partes, as quais deverão assinar e rubricar todas as suas folhas.

3 — O auto é considerado documento autêntico e é por si só bastante para os registos porventura necessários da transferência da titularidade e dos bens da empresa para a cooperativa.

4 — Igualmente o auto é considerado título exequível para, no caso de falta de pagamento do preço nos termos ou prazos convencionados, poder ser movida acção executiva contra a cooperativa.

Artigo 3.°

1 — Durante as negociações e até trinta dias depois de ter sido lavrado o auto de acordo manter-se-á em exercício a comissão administrativa ou os gestores que tenham sido nomeados para gerir a intervenção.

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2 — Findo o prazo referido no número anterior, a comisão administrativa ou os gestores cessam os seus poderes e farão a sua transferência para a direcção da cooperativa.

Artigo 4.º

Se se verificar a falta de acordo a que alude a alínea b) do artigo 1.°, lavrar-se-á auto consignando que não foi possível obter o acordo das partes, o qual será assinado e autenticado pelo representante do Ministério da Tutela.

Artigo 5.º

1 — A constituição do tribunal arbitral necessário será requerida ao juiz de direito da comarca em que a empresa tiver a sua sede por qualquer das partes, que, para o efeito, juntará cert:dão do auto de não acordo, e o processo será preparado e julgado de harmonia com as disposições do presente decreto-lei, que substituem e têm o mesmo valor do compromisso arbitral.

2 — O tribunal arbitral será constituído por três árbitros: um será indicado por cada uma das partes e o terceiro, que prés dirá, será escolhido por acordo dos outros dois, cabendo-lhe preparar o processo.

3 — Se qualquer das partes notificada para a nomeação dos árbitros não comparecer e não se fizer representar, ou, comparecendo, se recusar a nomear o árbitro que deveria indicar, não haverá adiamento da diligência e caberá ao juiz a sua nomeação.

4 — Se os árbitros nomeados pelas partes não chegarem a acordo para a nomeação do terceiro, será este nomeado nos precisos termos indicados no número anterior.

5 — Para a sua decisão os árbitros estimarão o valor da titularidade e dos bens da empresa em relação à data em que tiver sido iniciada a intervenção e estabelecerão o prazo e modo de pagamento do valor assim estimado.

6 — O terceiro árbitro, ao qual compete a preparação e orientação do processo, é obrigado a votar nas condições determinadas no artigo 1526.° do Código de Processo Civil.

7 — O julgamento será feito de acordo com as disposições do artigo 1521.° do Código de Processo Civil e à decisão aplica-se o disposto no artigo 1522.° do mesmo Código.

8 — As sociedades cooperativas para as quais se transferem a titularidade e os bens da empresa são isentas de preparos e de custas.

Artigo 6.º

A fim de que a actividade da empresa não sofra qualquer paralisação e não seja afectada a sua produção e comercialização nem os trabalhadores deixem de receber os seus salários, a desin-tervenção e cessação de autoridade da comissão administrativa ou dos gestores que hajam sido nomeados pelo Ministério da Tutela para a sua gestão só poderá concretizar-se trinta dias depois de proferida a decisão arbitral.

Artigo 7.º

1 — Se os titulares dos bens da empresa desin-tervencionada se recusarem a receber o preço acordado entre as partes ou fixado pela decisão arbitral, a cooperativa fará a sua consignação em depósito, nos termos do artigo 1024." do Código de Processo Civil.

2 — Feito o depósito, serão citados os titulares dos bens para o impugnar.

3 — O depósito só poderá ser impugnado:

a) Provando documentalmente que não

houve decisão do Conselho de Ministros determinando a desintervenção e a constituição da cooperativa;

b) Por ser maior ou diversa a quantia devida,

o que só poderá provar-se por certidão do auto de acordo ou da decisão arbitral.

4 — Na falta de contestação, ou não sendo a mesma instituída com as decisões referidas no número anterior, é logo declarada extinta a obrigação e os requeridos condenados nas custas.

5 — O processo de consignação em depósito seguirá os termos do processo sumário, qualquer que seja o seu valor.

Artigo 8.º

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Como, entretanto, surgiu a crise governamental, é de esperar que o II Governo Constitucional não deixe de dar seguimento a esta recomendação.

VI

Pedidos de apreciação de inconstitucionalidade

a) Critério orientador

O Provedor de Justiça é uma das entidades a quem o artigo 281.° da Constituição Política confere a prerrogativa de solicitar ao Conselho da Revolução que aprecie e declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de quaisquer normas.

Ê da essência deste preceito constitucional que a sua finalidade é a de confiar às entidades nele enumeradas a defesa da legalidade constitucional. £ quis que essas entidades fossem as que, mercê da sua posição —excepção do Priraeiro-Ministro—, sejam uma garantia de isenção, de não partidarismo político, capazes de se guiarem apenas pelo interesse nacional, do respeito pelo Estado de direito.

Não quis que entidades às quais cabem difíceis e altas funções na vida do Estado fossem meras caixas de correio, obrigatoriamente transmissoras de todo e qualquer pedido de uso da prerrogativa que lhes foi conferida, mas sim verdadeiros julgadores da necessidade e oportunidade da formulação de tão grave solicitação.

Quis-se, com o preceito constitucional, rodear o uso de tão importante prerrogativa da cautela bastante para garantir a não solicitação de desestabilização

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legislativa que uma utilização imoderada, irreflectida, não seriamente fundamentada, bem poderia provocar.

Se assim não fosse, então ter-se-ia concedido a todo e qualquer cidadão, ou a determinadas associações, até mesmo aos partidos políticos e organizações sindicais, o direito de suscitar a apreciação e declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas, o que traria para o campo da luta política partidária o que deve ser apenas a defesa da legalidade, o respeito da Constituição, a não transformação de uma análise que deve ser eminentemente jurídica, ainda que dentro de um determinado contexto político, numa querela apaixonada, sem grandeza nem rigor científico, incapaz de avaliar o que deve ser a aplicação do direito constitucional num Estado em transição para o socialismo.

Com efeito, a nossa Constituição declara no seu artigo 1.° que Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes.

Por seu turno, o artigo 2.° da nossa lei fundamental define o que é a República Portuguesa como constituindo um Estado democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização política democráticas, que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do Poder pelas classes trabalhadoras.

Temos assim que as grandes bases, as traves-mestras, do nosso edifício constitucional assentam nos seguintes princípios fundamentais:

1.1—A Nação é uma República soberana que se baseia na dignidade da pessoa humana e na vontade popular.

1.2 — A República empenha-se na sua transformação numa sociedade sem classes.

2.1 —A República Portuguesa constitui um Estado democrático baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organizações políticas democráticas.

2.2 — Dentro daquelas bases, o Estado democrático tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do Poder pelas classes trabalhadoras.

Daqui se infere, sem dificuldade nem possibilidade de controvérsia, que no estádio presente da nossa evolução social os princípios dominantes são a vontade popular como legitimadora da soberania, tendo esta por limites o respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais e o pluralismo de expressão e organização política democráticas.

Tais princípios dominantes têm o objectivo de assegurar a transição para o socialismo através da criação de condições para se passar da transição à transformação da Nação numa sociedade sem classes na qual o poder democrático será exercido pelas classes trabalhadoras.

Quer isto dizer que nestes aspectos fundamentais a nossa Constituição é programática, na medida em que programa as fases do processo histórico da nossa evolução social até se alcançar a meta, programada, do socialismo.

Logo, nesta fase de evolução Portugal cria as condições de transição, quer dizer, está na fase de transição para essa transformação social que se tem como meta a atingir.

Consequentemente, as disposições da nossa Constituição, não sendo disposições transitórias, são, todavia, de transição, o que implica que o nosso direito constitucional, não sendo necessariamente transitório, é igualmente de transição.

Afirmando-o, não se pretende ser original, mas tão-só acompanhar a corrente constitucionalista moderna, que, tirando as consequências lógicas do princípio da história como processo dialéctico, considera ser necessário construir um direito constitucional que prepare o processo de transição até uma sociedade socialista, o que significa que, por um lado, é necessário apartar-se do totalitarismo fascista que nega garantias e direitos, por outro, articular estas garantias e direitos num sistema cujo formalismo não seja simplesmente um elemento protector dos interesses do Estado burguês, segundo a definição de Enrique Tierno Galvan, ou, como sustenta Stefan Rozmarin, «deve evitar-se o confronto das leis publicadas actualmente com as normas constitucionais que respeitam nex thesi» às etapas mais longínquas da evolução social.

As normas constitucionais deste género estão em vigor hic et nunc, mas não devem influenciar o legislador na sua actividade actual senão na medida em que deve ter em conta as metas fixadas para o futuro. Elas não significam, de nenhum modo, que as relações sociais actuais devam, em nossos dias, ser apreciadas no seu conjunto segundo os critérios que, em virtude da própria Constituição, só serão aplicáveis em etapas ainda afastadas da evolução.

Por outras palavras: tem de entender-se que nos países edificando as bases do socialismo não se pode apreciar o presente segundo os critérios que serão os próprios do socialismo já edificado. Mas pode e deve apreciar-se a acção do legislador no ponto de vista de saber se ela afasta ou não o dever que lhe incumbe de assegurar a evolução no sentido indicado pela Constituição.

Dentro desses critérios, a ideia de classe dominante deve ser, e é, substituída pela de grupo dirigente representativo e que a administração do poder político por este grupo dirigente representativo não tem correlação com a existência de um partido único, antes é causal do pluralismo, já que o grupo dirigente pode ser constituído por partidos que, tendo concepções diferentes do mundo, aceitam o pressuposto geral da crise da ideologia burguesa da classe dominante e admitem, por conseguinte, um sistema constitucional que vai contra a manutenção dos privilégios dessa classe. Concretamente, é perfeitamente admissível um sistema normativo no qual as concepções do mundo — marxistas, cristãs ou simplesmente libertadoras do sistema capitalista — concordam com a ideia da necessidade de uma transformação político--social regida por normas constitucionais de transição. Isto o que se alcança dos ensinamentos de Tierno Galvan e que a evolução social portuguesa pós 25 de Abril inteiramente ilustra e corrobora.

Sendo assim, o direito constitucional prefixa umas tantas etapas da sua própria transformação, admitindo processos impostos pela necessidade dessa transformação e, por conseguinte, com uma legalidade

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que define a sua própria vigência de acordo com os critérios admitidos para a transformação das estruturas.

É, a nosso ver, à luz destes ensinamentos e concepções que se deve colocar a questão da inconstitucionalidade das normas, face a disposições constitucionais de transição, muitas delas necessariamente programáticas e visando estabelecer um princípio cuja forma de cumprimento terá de ser diferente, conforme o estádio de evolução.

Foi certamente tendo em conta todos estes condicionalismos e aspectos que a nossa Constituição, no seu artigo 279.°, consagrou o princípio da inconstitucionalidade por omissão, a cuja luz não serão inconstitucionais e terão de ser aplicados os diplomas legais que porventura contendam com normas programáticas da Constituição, que não tenham medidas legislativas a tomá-las desde já exequíveis, conferindo, quando assim for, ao Conselho da Revolução, como garante do cumprimento da Constituição e do regular funcionamento das instituições democráticas, o poder de, se assim o julgar, recomendar aos órgãos legislativos competentes que as emitam em tempo razoável.

De tudo o que dito fica se pode concluir que, em face da nossa Constituição, o nosso direito constitucional é um direito de transição, e que só deverá decretar-se a inconstitucionalidade de um diploma legal quando este contrarie frontalmente:

1) A destruição do totalitarismo, pois este im-

pede o exercício das liberdades e garantias fundamentais, não admite o pluralismo, ofende, pelos seus métodos, a dignidade humana e, como sistema capitalista que é, opõe-se a um autêntico processo de transição para o socialismo;

2) O princípio da legitimação da soberania pela

vontade popular, regra-mãe contida no artigo 3.°, n.os 1 e 3, da Constituição e que se concretiza através das normas dos artigos 48.°, n.°a 1 e 2, 111.°, 112.°, 116.°, 177.°, 124.°, 155.°, 167.°, 245.°, 246.°, 247.°, 250.°, 251.°, 252.°, 258.°, 259.° e 260.°;

3) Quando elimine um direito ou liberdade ou

retire a garantia do seu exercício ou ainda quando de todo não permite o exercício de um direito. Não se deve considerar inconstitucional um diploma legislativo que não leve às consequências máximas o exercício de um direito ou de uma liberdade não especificamente disciplinados na Constituição quando esse mesmo diploma reconheça esse direito ou liberdade, dê expressão ao seu exercício, num espírito de respeito pelo direito constitucional de transição e de acordo com o princípio do processo histórico de evolução, e dentro do conceito de que se não pode julgar o presente segundo os critérios da etapa só a atingir no futuro;

4) Tratando-se de diploma regulador de exercí-

cio de norma programática da Constituição, quando o mesmo seja manifestamente contrário ao princípio programático da norma constitucional.

Em caso de dúvida sobre a inconstitucionalidade de uma norma, não deve o Provedor de Justiça usar da prerrogativa de solicitar ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade.

Este o critério à luz do qual o Provedor norteou a sua conduta neste aspecto da sua competência.

b) Processos arquivados antes de concluído o seu

estudo

1) Processo n.° 76-DI-2

Inconstitucionalidade dos Decretos n.os 411/76 e 530/76 — arquivados por, entretanto, terem sido revogados aqueles decretos.

2) Processo n.° 76-DI-9

Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.8 583/76— arquivado por ter sido revogado pelo Decreto-Lei n.º 293/77.

3) Processo n.° 76-DI-10

Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 841-B/75 (arquivado por ter sido publicada a Lei n.° 55/77).

4) Processo n.º 76-DI-11

Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 841-C/76 (arquivado por ter sido resolvido, entretanto, peio Conselho da Revolução).

5) Processo n.° 77-DI-15

Inconstitucionalidade da lei sobre comissões de trabalhadores (arquivado por, entretanto, ter sido resolvido pelo Conselho da Revolução).

c) Processos estudados e concluídos

1) Processo n.° 76-DI-1

Inconstitucionalidade da Lei n.° 8/75.

Na pendência do estudo deste processo houve uma troca de ofícios entre o Serviço do Provedor de Justiça e o juiz auditor do 1.° Tribunal Militar Territorial, que, pelo seu interesse, aqui se transcrevem:

Porto, 26 de Janeiro de 1977.

Em face do teor do ofício em referência, permito-me fazer as seguintes considerações:

O simples facto de a questão da inconstitucionalidade da Lei n.° 8/75 se encontrar em apreciação nessa Provedoria, que ainda não informou que não usaria dos poderes de petição junto do Conselho da Revolução, por si só impede que o Tribunal exerça os seus poderes de fiscalização da constitucionalidade própria e independente.

É que, se porventura houvesse entendimentos divergentes, daí resultaria benefício ou prejuízo para os arguidos cujos processos entretanto tivessem sido apreciados.

Sendo assim, solicito a V. Ex.ª uma resposta sobre o comportamento que vai seguir, continuando entretanto o Tribunal a aguardar uma decisão e só usará dos seus poderes próprios depois de recusados os poderes de petição dessa Provedoria.

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A este ofício respondeu o Provedor, em 28 de Janeiro, nos seguintes termos:

Apresso-me a responder ao ofício de V. Ex.ª n.° 269/76, processo n.° 212/76, datado de 26 do corrente.

0 Provedor de Justiça, no ofício n.° 3182, de 2 de Dezembro último, foi bem claro ao fazer saber a V. Ex.ª que o facto de existir no seu Serviço um «estudo» sobre a constitucionalidade da Lei n.° 8/75 não significava que o processo pendente no Tribunal em que V. Ex.ª é juiz auditor se mantivesse sem andamento, uma vez que o preceituado no artigo 282.° da Constituição, quanto à fiscalização judicial da constitucionalidade, define uma movimentação própria e independente.

Quis-se, assim, por forma que não pudesse pensar-se envolver intervenção do Provedor na função jurisdicional de V. Ex.ª, mostrar que não é legalmente possível suspender o andamento de um processo com base no facto de o Provedor de Justiça ter, nessa data, em apreciação no seu Serviço a questão da constitucionalidade daquela lei.

De resto, e entretanto, sobre essa arguição de inconstitucionalidade pronunciou-se pela negativa o Supremo Tribunal Militar, o que certamente é do conhecimento de V. Ex.ª

Se, apesar disso, V. Ex.ª entendia que a lei era inconstitucional, teria de agir de acordo com o artigo 282.° citado, recusando-se a aplicar a lei, mas, salvo o devido respeito, o que não pode é escudar-se na existência de um estudo no Provedor de Justiça para paralisar a marcha normal do processo.

Tão-pouco tem V. Ex.ª, porque a solução ao seu dispor era a constante do citado artigo 282.°, possibilidade de se dirigir ao Provedor de Justiça a solicitar que este use da prerrogativa que lhe confere o artigo 281.°, n.° 1, da Constituição, fugindo assim a lançar mão do seu poder de juiz.

Por último, devo esclarecer V. Ex.ª de que o Provedor de Justiça não tem de lhe dar satisfação ou notícia do comportamento que vai seguir, nem V. Ex.ª se pode servir da existência de um assunto em apreciação neste Serviço para se eximir a tomar a posição que, como juiz, lhe caberá em seu entendimento tomar, na certeza, mais a mais, de que a inconstitucionalidade neste caso, quando muito, seria duvidosa, e o Provedor só usará a prerrogativa que a Constituição lhe confere quando seja sua segura convicção de que está em presença de um caso líquido de inconstitucionalidade.

Com base no parecer do adjunto do Provedor, decidiu o Provedor não solicitar o pedido de apreciação de inconstitucionalidade.

É esse parecer e o despacho que sobre ele recaiu o que a seguir se transcreve:

1 — Não me parece que sejam convincentes os argumentos no sentido da inconstitucionalidade da Lei n.° 8/75.

2 — Não colhe, por um lado, dizer-se que é possível que uma norma da Constituição (neste caso o artigo 309.°) seja inconstitucional.

Essa asserção é, desde logo, inadmissível do ponto de vista da pura lógica formal.

As disposições de um mesmo diploma terão de interpretar-se por forma que se conciliem.

No caso presente, trata-se do confronto entre uma norma geral —a do artigo 29.°— e uma norma especial — a do artigo 309.°

No seu âmbito de aplicação prevalece, segundo os princípios comuns, a regra especial

3 — Este raciocínio não é, porém, meramente de lógica formal — implica também um juízo valorativo.

Basta ler a discussão do artigo 309.° na Assembleia Constituinte para se depreender que a expressa intenção dos intervenientes dos vários partidos foi a de que aos abrangidos pela Lei n.° 8/75 não se aplicasse o princípio geral nidia poena sine lege, consagrada no artigo 29.°

4 — E creio perfeitamente admissível tal posição.

O princípio nulla poena sine lege é próprio e adequado a uma sociedade estabilizada, assente em estrutura constitucional devidamente aprovada e democrática.

Não é forçoso que se aplique quando, de um movimento revolucionário ou similar, se transita de um sistema político-jurídico para outro.

Então, não é de rejeitar que a «nova sociedade» resolva criminalmente as actuações anteriores ofensivas dos seus princípios — até porque tais actuações, por definição, decerto não seriam (como não eram) puníveis à face da legislação do regime deposto.

5 — Nem convence dizer-se que a Lei n.° 8/75 já seria ofensiva da Lei Constitucional n.° 3/74, que manteve em vigor parte da Constituição Política de 1933, da qual constava o princípio nulla poena sine lege.

É que essa aplicabilidade foi pela mesma Lei Constitucional n.° 3/74 afastada em tudo o que a Constituição Política de 1933 se revelasse em desacordo com o Programa do Movimento das Forças Armadas; ora esse seria decerto o caso da apreciação da existência e actuação da ex--PIDE/DGS.

6 — Note-se que, em rigor, não creio que seja exacto dizer-se que a Lei n.° 8/75 se tornou lei constitucional.

Tal lei continuou a ser lei ordinária: «Mantém--se em vigor a Lei n.° 8/75 [...]»

O que o legislador constitucional pretendeu foi, indo para além da regra geral do artigo 293.° — que manteve a legislação ordinária à Constituição Política, desde que não contraditória com ela—, deixar expresso, por não suscitar dúvidas, que a Lei n.° 8/75 era, pela própria Constituição Política, considerada compatível com os seus princípios.

E tal força lhe deu que não permitiu que essa lei ordinária fosse livremente revogável ou alterável, mas apenas nos restritos termos dos n.º 2 e 3 desse mesmo artigo 309.°

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7 — Isto não quer dizer que os abrangidos pela Lei n.° 8/75 foram todos e os mais responsáveis pelo regime deposto.

Outros de maior peso se escaparam pelas malhas da política e outras ...

Só que isso não obsta a que se esqueça a responsabilidade de quem voluntariamente ingressava na instituição em causa.

8 — À consideração do Sr. Provedor.

A minha posição já estava definida aquando do ofício de resposta ao Tribunal Militar do Porto. Se, porventura, pudesse, num excesso de boa vontade, considerar-se duvidosa a constitucionalidade da Lei n.° 8/75, o Provedor nunca usaria da prerrogativa de pedido dessa declaração de inconstitucionalidade, pois, pelo menos enquanto for eu o Provedor, ela só será usada nos casos em que, para mim, não subsista qualquer dúvida sobre a inconstitucionalidade, que não é esse o caso. No caso em apreço, do que não restam dúvidas é que o diploma citado é constitucional, pois não posso conceber que possa ser tida como inconstitucional uma norma inscrita na própria Constituição e cuja razão de ser e fundamento está devidamente apontada no parecer do Sr. Provedor--Adjunto e cuja constitucionalidade é patente no exaustivo estudo do Sr. Assessor.

Nos termos do artigo 309.° da Constituição, os preceitos da Lei n.° 8/75 continuaram a caber na lei ordinária e receberam consagração constitucional.

2) Processo n.° 76-DI-3

Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 672/76, de 25 de Agosto.

Parecer da assessora Dr.ª Branca Amaral:

I

Determinou-se a abertura de um processo DI para análise da questão levantada por alguns reclamantes da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 672/76, de 25 de Agosto, publicado no Diário da República, 1.ª série, da mesma data.

São dois os aspectos focados:

1) É, o primeiro, referente ao pretenso privilégio

instituído pelos artigos 3.°, n.° 2, alínea d), 9.°, n.° 1, e 16.º do referido decreto contra a expressa disposição do n.° 2 do artigo 13.° da Constituição da República;

2) Trata-se, no segundo, da não audiência dos

trabalhadores na elaboração deste diploma em aspectos que os atingem ao serem revogadas disposições do anterior Decreto-Lei n.° 713-B/75, de 19 de Fevereiro.

A alteração teria sido feita mesmo contra o parecer expresso do Sindicato dos Professores e o compromisso de suspensão assumido perante ele pelo Ministro da Educação do VI Governo Provisório.

Desta forma, pretender-se-ia que foram ainda violadas outras disposições constitucionais, designadamente, o n.° 2, alínea a), do artigo 58.° e o artigo 293.°

II

Começamos por analisar o conteúdo do artigo 13." da Constituição da República Portuguesa.

Insere-se esta disposição na parte i daquele diploma, que corresponde aos direitos e deveres fundamentais.

O n.° 2 do referido artigo 13.° tem de ser interpretado conjuntamente com o n.° 1, que dispõe:

Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.

O n.° 2 «explica» depois que «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de [...] instrução, situação económica ou situação social».

É óbvio que não pode considerar-se discriminatório um preceito que exija determinadas habilitações para o exercício de qualquer profissão ou que garanta aos trabalhadores regalias decorrentes da sua situação como tal, designadamente da antiguidade ou do mérito demonstrado.

A pretensão da reclamante teria o sentido que poderia ser dado à exigência de uma carteira profissional para o exercício das profissões que a exijam ou à preferência de um trabalhador de uma empresa relativamente a um candidato que para ela pretendesse entrar.

Não pode, pois, fundamentar-se a existência de inconstitucionalidade neste aspecto.

III

Do mesmo modo, a leitura que possa fazer-se do artigo 293.°, n.° 1, da Constituição nunca poderá conduzir simplistamente a uma declaração de inconstitucionalidade, isto sob pena de se entender que as leis só poderiam ser revogadas se fossem inconstitucionais.

Tal corresponderia a coarctar a função dos órgãos legislativos e a negar o aperfeiçoamento ou a evolução do sistema jurídico. Ê como disposição esclarecedora e no sentido de assegurar a estabilidade das relações jurídicas que o n.° 1 do artigo 293." estabelece que «o direito anterior à entrada em vigor da Constituição se mantém, desde que não seja contrário à Constituição ou aos princípios nela consignados».

IV

As disposições invocadas nas alíneas b) e d) do artigo 52.° da Constituição da República, contra as quais disporia o Decreto-Lei n.° 674/76, ao revogar preceitos do Decreto-Lei n.° 713-B/75, não são igualmente aplicáveis à matéria.

Não se trata de promover despedimentos sem justa causa nem provocar a insegurança do emprego quando se legisla no sentido de dar ao ensino uma garantia de qualidade e são preteridos os professores de formação inadequada por aqueles que a possuem ou os menos qualificados pelos que se revelaram à partida mais aptos.

De resto, em relação aos professores profissionalizados, mantém-se no Decreto-Lei n.° 672/76 a preferência para os que exerceram funções no ano lectivo anterior.

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-

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tável o pedido de declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 672/76, sendo de informar de harmonia os reclamantes que o fizeram.

Janeiro de 1977.

O parecer mereceu a concordância do Provedor e, assim, não foi solicitada a apreciação da inconstitucionalidade.

3) Processo n.° 76-DI-5

Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 781/76, de 28 de Outubro.

Despacho do Provedor: Penso que:

1) A proibição do despedimento sem justa causa

não contende com a permissão do contrato a prazo, pois ela continua a ter de ser respeitada pelo tempo —prazo— da duração do contrato.

2) Se com o contrato a prazo o Governo se

propõe propiciar a breve prazo um significativo aumento de oferta de emprego, susceptível de posterior estabilização, com o decreto o que se tem em vista é garantir a segurança no emprego, de acordo com a alínea b) do artigo 52.° da Constituição,, que é um dever do Estado, e não um direito dos trabalhadores.

3) O direito de participação dos trabalhadores nSo

foi violado, por isso que, não estando regulada a forma de o fazer funcionar, desde que foram eles, através de notas oficiosas nos meios de comunicação, convidados a apresentar as suas sugestões, podiam ter participado.

Nem é relevante o facto de se terem fixado apenas quinze dias para o efeito, já que a Constituição também não fixa prazo, e saber se este é ou não suficiente, é critério meramente subjectivo.

Só neste aspecto, de resto, se poderia pensar em possível inconstitucionalidade, mas duvidosa, e ela seria, quando muito, resultante de omissão, pelo que o que haveria que pedir não era a declaração de inconstitucionalidade, mas sim, nos termos do artigo 279.°, recomendar aos órgãos legislativos que, em tempo razoável, emitissem medidas legislativas para tornar exequíveis as disposições dos artigos 56.°, alínea d), e 58.°, n.° 2, alínea a).

4) Estas razões, aliadas à aduzida pelo

Sr. Dr. Cauperes na sua primeira informação, e que demonstra não ser o trabalhador afectado no seu direito a cento e oitenta dias de salário, e logo ao direito ao subsídio de desemprego, mesmo que trabalhe um só dia, no contrato, a prazo, levaram-me a não alterar o ponto de vista por mim já manifestado na reunião em que se apreciou o critério segundo o qual o Provedor de Justiça pediria ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade e, portanto, mesmo com o bene-

V

Finalmente, a pretendida violação do preceituado no artigo 58.°, n.° 2, alínea a), da Constituição não existe, em face do que ficou exposto no n.° IV.

1 — A «formação complementar» dos docentes admitidos só pode compreender-se dentro do condicionalismo em que o seu recrutamento for necessário por falta de docentes já completamente formados.

De outra forma, cair-se-ia num desperdício de técnicos já especializados a favor de outros cujo rendimento, em face do duplo esforço exigido de ensinar e de aprender, teria logicamente de ser inferior.

Dado que os cursos adquiridos o foram em grande medida à custa do Estado, haveria um nítido prejuízo a nível global.

De resto, não pode haver, como pretendem os reclamantes, uma violação de contrato entre os professores e o MEIC estabelecido através do referido decreto de 1975.

2 — Por outro lado, o facto de o Decreto-Lei n.° 672/76 não ter respeitado um ponto da nota oficiosa do Ministério da Educação do VI Governo em resposta à apresentação de um caderno reivindicativo dos Sindicatos dos Professores, não fundamenta em si qualquer declaração de inconstitucionalidade.

O n.° 3 do artigo 58.° da Constituição determina que «compete às associações sindicais exercer o direito de contratação colectiva e a alínea a) do n.° 2 do mesmo artigo, bem como a alínea d) do artigo 56.º, cometem aos sindicatos e às comissões de trabalhadores a participação na elaboração da legislação do trabalho».

VI

Salvo melhor critério, também neste ponto se verifica não existir razão para pedido de declaração de inconstitucionalidade.

Dada a especificidade do sector —Administração Pública—, a possibilidade de aplicação prática do artigo 58.° da Constituição não está definida.

Para além disso e em todo o caso, a falta de participação do Sindicato dos Professores ou da sua audiência prévia antes da aprovação do Decreto-Lei n.4 672/76 não está enquadrada na previsão legal, em virtude de não corresponder a questões específicas de trabalho a matéria nele versada.

Trata-se, sim, de um problema de habilitações exigíveis para o bom funcionamento de um sector administrativo e da sua estruturação, que, pelo seu carácter técnico-administrativo, é da estrita competência do responsável pelo sector do ensino e do Governo em geral.

O considerar-se, neste caso concreto, exigível a participação do Sindicato dos Professores por haver trabalhadores envolvidos corresponderia ao absurdo de negar ao Governo e à própria Assembleia da República a possibilidade de legislar sem audiência dos trabalhadores dos sectores abrangidos, o que na prática, directa ou indirectamente, quase sempre acontece.

VII Conclusão

Atenta a análise correspondente aos números anteriores, não nos parece fundamentado nem fundamen-

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fício da dúvida a entender que, par isso mesmo, continuando a não ser líquida a inconstitucionalidade do diploma, não é de solicitar tal declaração. 5) Este é precisamente um dos casos em que, evitando que o direito constitucional porque é de transição, visto a Constituição estar toda ela nas suas regras-mães subordinada ao princípio de que é obrigação do Estado

— melhor, objectivo do Estado — assegurar a transição para o socialismo. Tem de ser compreendido, nas disposições programáticas da Constituição, como um direito que tem de ter em conta o estado da evolução social no momento em que é legislado

— logo, como norma de transição—, e não como legislação, própria do momento em que a fase de transição já estivesse ultrapassada.

Quer isto dizer que na fase de evolução

— de transição — se não pode legislar como se estivesse atingida já a meta que essa transição aponta.

Assim, e dentro de todos estes condicionalismos e razões que deixo referidos, não vejo que possa com liquidez verificar-se inconstitucionalidade, e apenas noto a possível —mesmo assim duvidosa— omissão da legislação adequada à exequibilidade da norma constitucional acerca de participação dos trabalhadores na legislação laboral, a qual, aliás, não conduziria ao pedido de declaração de inconstitucionalidade, mas só à recomendação a que se refere o artigo 279.° da Constituição, conforme mencionei no n.° 3).

Parece-me, pois, não dever tomar qualquer iniciativa relativamente ao Decreto-Lei n.° 781/76, de 28 de Outubro, pelo que o processo é de arquivar.

28 de Março de 1977.

4) Processo n.° 76-DI-6

Insconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 781-A/76, de 28 de Outubro.

Informação inicial do Provedor-Adjunto: Parece que:

1) Não pode servir de critério a data da publi-

cação do diploma, pois que, então, a inconstitucionalidade de um decreto-lei emanado com autorização legislativa dependeria de factor extrínseco ao Governo que o aprova, e até posterior à data da aprovação.

2) Embora certifique a existência do diploma,

tão-pouco parece de atender à data da promulgação, por razões paralelas do n.° I.

3) O que importa, afigura-se, é apurar se a apro-

vação pelo Governo se deu ou não no prazo da autorização concedida.

8 de Janeiro de 1977.

Pelas razões sucintamente expostas pelo Provedor--Adjunto, Dr. Luís Silveira, e dado que o decreto-lei em causa foi aprovado dentro do prazo da autorização legislativa e depois rectificado na Assembleia da República, não foi solicitada a apreciação de inconstitucionalidade.

S) Processo n.º 76-DI-8 Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 667/76.

Despacho do Provedor sobre o parecer do assessor Dr. Manuel Marcelino:

São duas as questões fundamentais a decidir para se poder concluir pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 667/76, promulgado em 13 de Julho e publicado no Diário da República, de 5 de Agosto:

1.° Se era ou não lícito ao Governo legislar sobre impostos, alterando taxas e estabelecendo um adicional, sendo tal matéria da competência da Assembleia da República, na data em que o fez (artigo 167.° da Constituição).

2.° Ainda que ao Governo fosse lícito legislar, como o fez, se não é inconstitucional a aplicação de novas taxas de imposto a rendimentos de 1975, portanto anteriores ao decreto-lei em apreço.

Quanto ao ponto 1°:

Pondo de parte a discussão sobre se a alteração da taxa de um imposto ou a criação de um adicional se devem considerar como integrados na reserva de competência legislativa que a alínea o) do artigo 167.° da Constituição confere à Assembleia da República, e aceitando, apenas para facilidade de raciocínio, por não importar ao caso concreto em apreço, que assim é, vejamos:

a) O decreto-lei em causa foi aprovado em Conselho de Ministros e promulgado pelo Presidente da República, que ainda o era à data, em 13 de Julho de 1976 e publicado no Diário da República, de 5 de Agosto seguinte;

b) o Presidente da República, eleito em 25 de Abrii de 1976, tomou posse em 14 de Julho seguinte;

c) o artigo 294.° da Constituição determina que o sistema dos órgãos de Soberania previstos na Constituição entre em funcionamento com a posse do Presidente da República, eleito nos termos da Constituição, e que até essa data continuarão em vigor as leis constitucionais vigentes sobre a organização, a competência e o funcionamento dos Órgãos de Soberania posteriores a 25 de Abril de 1974;

d) Em 13 de Julho de 1976 vigoravam ainda as Leis n." 3/74, de 14 de Maio, e 6/75, de 26 de Maio, as quais, respectivamente nos seus artigos 16." e 3.°, conferiam ao Governo Provisório competência para legislar em matéria de impostos. Nessa data, pois, o Governo tinha competência para legislar;

é) Â promulgação de uma lei é o acto pelo qual o Presidente da República atesta solenemente à Nação a existência de uma lei aprovada e ordena a sua publicação;

f) A falta de promulgação ou de assinatura do Presidente da República determina a inexistência jurídica do acto [artigo 137.°, n.º 1, alínea b), e 2, da Cons-iituição];

g) A publicação é o acto através do qual a existência cs uma lei, já aprovada e promulgada, é levada ao conhecimento do público;

h) A entrada em vigor de uma lei consiste na obrigatoriedade do seu cumprimento, pois até esse momento não obriga nem víncula;

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O A data de uma lei é a da sua publicação, pois só a partir desta se torna executória;

j) Sobre a data da entrada em vigor dispõe a Lei n.° 3/76;

0 Para efeitos de constitucionalidade, o que releva é a aprovação e promulgação, e nunca a publicação ou entrada em vigor, porque:

1) O que interessa é o conteúdo da norma que

pode infringir o disposto na Constituição;

2) Só a aprovação e promulgação podem gerar

a inconstitucionalidade (formal e material), e nunca a publicação;

3) Basta ler o artigo 277.° da Constituição para se

alcançar que o que interessa para a verificação da constitucionalidade é a promulgação e não a publicação no Diário da República. Com efeito, enviados à Presidência da República para promulgação, os decretos-leis só podem ser promulgados passados cinco dias, visto que, simultaneamente, têm de ser enviados ao Conselho da Revolução para este apreciar da sua constitucionalidade e, se tiver dúvidas, comunicar ao Presidente da República, dentro de cinco dias, para que não efectue a promulgação.

Assim, não devem restar dúvidas de que quando o decreto-lei foi aprovado e promulgado o Governo tinha competência para legislar sobre impostos, pois não havia que cumprir a reserva legislativa da Assembleia da República, que nem sequer ainda entrara em funcionamento.

Quanto ao ponto 2.º, referente à retroactividade:

A Constituição só para matéria penal consagrou o princípio da não retroactividade (artigo 29.°, n.° 1).

Não é por acaso que tal acontece, mas sim porque a partir de 1911 em Portugal se estabeleceu e veio a arreigar-se a doutrina de que a regra da não retroactividade da lei perdera o seu carácter constitucional.

É assim que a Constituição de 1911 não reproduz o § 2.° do artigo 141.º da Carta Constitucional da Monarquia, de 24 de Julho de 1826.

Com efeito, quando na Assembleia Nacional Constituinte o Dr. Bernardino Roque propôs a inclusão do princípio da não retroactividade das leis, que o primitivo projecto inserira no n.° 50 do artigo 54.° e o segundo eliminara, não houve, além do proponente, quem defendesse tal proposta, que foi vivamente combatida pelos constituintes Afonso Costa e Barbosa de Magalhães (veja-se, além do Diário da Assembleia Nacional Constituinte, a Gazeta da Relação de Lisboa, ano 35.°, pp. 65 e seguintes), e o proponente retirou-a.

Os principais argumentos aduzidos foram:

a) O princípio da retroactividade não tinha já,

nem podia ter, a força, a intangibilidade, que tivera antigamente, quando predominavam no direito a orientação individualista e a doutrina dos princípios e dos direitos absolutos, imutáveis e intangíveis;

b) A Constituição da República tinha de tomar

uma posição mais social, para não dizer socialista, e tinha de acompanhar a evolução jurídica que se fizera no sentido de negar a tais direitos e princípios esses caracteres;

c) A necessidade de dar a algumas leis efeito

retroactivo não só em épocas excepcionais, como sejam as de guerra, mas mesmo em épocas de normalidade, para defesa de superiores interesses públicos, fizera com que esse princípio perdesse a sua importância, deixasse de se considerar constitucional, para ficar sendo um princípio de interpretação das leis de direito privado, tendo, portanto, o seu lugar próprio nos respectivos códigos;

d) As leis não se fizeram só para regular o futuro.

São inúmeros os exemplos em todos os tempos e em todos os países;

e) Não se trata de fazer observar leis ainda não

existentes, trata-se de sujeitar ao domínio de uma lei nova actos jurídicos realizados no domínio de uma lei anterior, o que pode ser aconselhado e até imposto pelos interesses e necessidades públicas, ou, como se dizia antes, pela razão de Estado ou pela salvação pública.

Trata-se, pois, de sacrificar o interesse do indivíduo ao interesse colectivo, que tem de ser o sinal de uma sociedade em transição para o socialismo, como a define a nossa actual Constituição.

Por isso, proclamou Baudry-Lacantinerie (Précis de Droit Civil, t. I, n.° 46): «O que não é racional é que se negue ao legislador o direito de fazer leis retroactivas.»

E que o princípio da não retroactividade das leis deixou de ser princípio constitucional, na vigência da 1.» República, é jurisprudência pacífica dos nossos tribunais a partir do Acórdão da Relação de Lisboa de 30 de Junho de 1917 {Gazeta da Relação de Lisboa. ano 32.°, n.° 6, p. 92).

Tal princípio, de resto, tinha já sido abolido da maior parte das constituições, só se conservando nas da Noruega, do Brasil e da América do Norte.

Na mesma esteira seguiu a Constituição de 1933, talvez por outras razões, pois só consagrou o princípio da não retroactividade para a matéria penal, no n.° 9 do artigo 8.º

É que houve até tratadistas que entenderam que o princípio passava a ser outro, isto é: «A lei tem efeito retroactivo, excepto quando [...]» (Theodorslade, «Essai sur la non retroactivité de la loi»; Gabba, «Teoria della retroactività delle Legi»; Paciffici-Maz-zoni, Istituzioni di diritto civile italiano, 5." edição, citada por Barbosa de Magalhães na Gazeta da Relação de Lisboa, ano 36.°, p. 67).

Que em Portugal deixou a não retroactividade das leis de ser regra constitucional é opinião unânime dé todos os escritores juristas, como pode ver-se em Carneiro Pacheco, Código Civil Português Actualizado; Fezas Vital, Boletim da Faculdade de Coimbra; Oliveira Salazar, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, e Cunha Gonçalves, citados por Pires da Cruz em Da Aplicação das Leis no Tempo, p. 217.

De resto, segundo Guilherme Moreira, no 1.º volume da Constituição do Direito Civil, era uma hipocrisia manter o princípio constitucional da Carta da Monarquia, pois que a norma foi constantemente violada, tendo sido inúmeras as leis de efeito retroactivo da monarquia.

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E a retroactividade da lei fiscal tem tradição na legislação portuguesa. Citamos três casos, para ilustrar a afirmação.

Assim, o Decreto n.° 15 467, de 14 de Maio de 1928, a pretexto de interpretar o significado de «outros rendimentos» do artigo 49.º da Lei n.° 1368, de 21 de Setembro de 1922, ordenou que os contribuintes inserissem nas suas declarações determinados rendi' mentos e que tinham de incluir não só esses rendimentos do ano 1926-1927, como dos quatro anos anteriores, tendo de fazer essa declaração até 30 de Junho e pagar em 1 de Outubro.

O Decreto-Lei n.° 196/72, de 12 de Junho, no seu artigo 13.°, estabelece que o adicional criado se aplicaria aos rendimentos de 1971.

O Decreto-Lei n.° 375/74, de 20 de Agosto, manda, no seu artigo 21.°, que os artigos 12.° a 15.° se aplicam aos rendimentos de 1973 e o artigo 13.º substitui as taxas, aumentando-as, de imposto complementar.

Nestas condições, e ainda que possa haver dúvidas, como bem salienta o Dr. Marcelino no seu bem elaborado parecer, e possa haver quem opine pela constitucionalidade como pela inconstitucionalidade, tanto no que toca à competência do Governo para legislar como no que respeita ao efeito retroactivo da lei, a verdade é que enfileiro com os que entendem não se verificar a inconstitucionalidade, nem formal nem material, do Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto, pelo oue decido não solicitar a apreciação da sua constitucionalidade ao Conselho da Revolução.

6) Processo n.° 76-DI-l0

Inconstitucionalidade do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado.

Parecer do assessor Dr. João Caupers:

I

Introdução

Suscitado numa reclamação dirigida ao Serviço do Provedor de Justiça por alguns trabalhadores do Serviço de Formação Profissional do Ministério do Trabalho o problema da inconstitucionalidade do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, e porque a questão já se levantara noutros processos pendentes neste Serviço, foi determinado que se procedesse ao estudo do problema, em ordem a encontrar as linhas gerais que deveriam presidir à revisão daquele diploma legal à luz da nova Constituição Política e da desejável vivência democrática.

Foi o que se fez, tentando extrair do texto constitucional todas as suas consequências e partindo da necessidade de conciliar os direitos e liberdades que a lei reconhece a todos os cidadãos, funcionários públicos ou não, com a necessidade de dignificar o exercício de funções públicas, apagando más recordações e varrendo definitivamente certos parti pris quanto às qualidades profissionais e métodos de trabalho dos chamados «servidores do Estado», que são afinal servidores do público.

A revisão do Estatuto Disciplinar ¿os Funcionários Civis do Estado é uma tarefa que urge realizar. Depois de ter atravessado um período de esquecimento, semelhante a uma forma de desuso, justificável na base do vácuo legislativo que a queda do fascismo provocou, vácuo esse por vezes preenchido com nem sempre razoáveis «emanações» da legalidade revolu-

cionária, o Estatuto renasceu, já na fase de institu-cionalidade de democracia portuguesa. As tentativas de impor a sua aplicação não foram, normalmente, bem sucedidas, visto que muitas das suas disposições se revelaram manifestamente obsoletas ou apresentavam acentuado cunho repressivo. Torna-se, pois, indispensável produzir um texto que substitua o (ainda) vigente (parcialmente), até porque algumas das suas disposições foram revogadas pela própria Constituição.

Não cabe, obviamente, ao Serviço do Provedor de Justiça a elaboração de um projecto para regular a matéria; parece que, no entanto, a intervenção do Provedor poderá servir para dinamizar a resolução do problema, cuja responsabilidade recai, em última análise, sobre a Assembleia da República [artigo 367.°, alínea m), da Constituição] ou sobre o Governo, através do departamento competente [artigos 168.° e 202.°, alínea f), da Constituição], sempre com a participação dos trabalhadores interessados (artigos 56.°, 57.° e 58.° da Constituição).

É, pois, com este espírito que procedemos ao presente estudo.

II

Os preceitos constitucionais

As normas constitucionais com particular relevo na matéria são as seguintes:

a) O n.° 2 do artigo 18.° colocou «fora da lei» al-

gumas normas do Estatuto que restringem direitos dos funcionários garantidos pela Constituição: é o caso, crê-se, do artigo 38.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado ao estabelecer que «em processo disciplinar a única nulidade absoluta é a falta de audiência do arguido, nos casos em que a lei a impuser». Como o n.° 3 do artigo 270.° garante ao arguido em processo disciplinar a sua «audiência e defesa», parece que qualquer circunstância que conduza à impossibilidade ou dificuldade de o arguido se defender convenientemente deve ser considerada nulidade absoluta;

b) O n.º 1 do artigo 271.º da Constituição res-

ponsabiliza os funcionários ou agentes que, no exercício das suas funções e por causa do seu exercício, causem prejuízos a outrem. Supõe-se que este princípio constitucional deve levar a rever a questão da eventual responsabilidade disciplinar de um superior hierárquico que de má fé instaura um processo disciplinar a um subalterno. Actualmente, a irresponsabilidade do superior é completa e nem mesmo em recurso contencioso se podem indagar as motivações da instauração do processo;

c) Também dos n.os 2 do artigo 267.° e 2 do ar-

tigo 269.° se devem extrair consequências susceptíveis de influenciar o futuro estatuto disciplinar: por exemplo, deverá considerar-se infracção disciplinar a actuação do funcionário orientada não pele interesse de servir o povo, mas por inclinações de carácter partidário ou outras;

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d) Os n.os 2 e 3 do artigo 271.° da Constituição

terão de levar a proceder a alterações na matéria dos artigos 9.° e 10.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado: a expressão constitucional «[...] ou tiver exigido a sua transmissão ou confirmação por escrito» não é compatível com o «direito de respeitosa representação» de que fala o Estatuto; o problema das ordens cujo cumprimento implique a prática de um crime não está autonomizado no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, que impõe o cumprimento de ordens ilegais sem distinções;

e) Os direitos garantidos pelos artigos 23.°, 37.°

e 46.º da Constituição impõem também alterações no Estatuto, designadamente no que concerne às chamadas «infracções disciplinares por actos da vida privada», cuja noção se nos afigura de difícil conciliação com o primeiro daqueles preceitos constitucionais, e às «infracções disciplinares de carácter político», reminiscência absurda de um passado que se quer morto de «declarações anticomunistas», «informações da PJDE» e perseguições políticas variadas.

Aqui e ali surgem no texto constitucional normas que poderão impor outras alterações pontuais; serão adiante referenciadas.

Passar-se-á agora à desmontagem das linhas gerais do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, tendo sempre era vista cs princípios inicialmente referidos:

A dignificação da função pública;

A defesa e promoção da ilegalidade democrática, a que se refere a Constituição {v. g., «Preâmbulo», artigo 3.°, n.° 4, e artigo 202.°, alínea f)].

Sistematizaremos a matéria a abordar do seguinte modo:

1) Princípios do processo disciplinar;

2) A infracção disciplinar;

3) A sanção disciplinar;

4) O processo disciplinar comum;

5) Recursos;

6) Inquéritos e sidicâncias;

7) Conclusão.

III

Os princípios gerais do processo disciplinar

Abordar-se-ão agora os princípios por que se tem regido o processo disciplinar na perspectiva dos que deverão regê-lo e dos que deverão ser afastados.

1 — O carácter sumário do processo disciplinar

Não vemos razões para o processo disciplinar perder esta sua característica; ela deve, no entanto, ser limitada pelo reconhecimento dos direitos inalienáveis do arguido: o carácter sumário não pode significar cerceamento das garantias de defesa do cidadão

funcionário. Designadamente, a «recusa do qw for impertinente, inútil ou dilatorio» cae pode fundamentar a destruição da defesa do arguido e o atropelo das normas constitucionais (artigos 27C1.0, a.° 3, da Constituição e 28.º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado).

2 — A indispensabilidade da organização do processo disciplinar como condição do exercício do direito de punir

Em nossa opinião, a norma do artigo 30.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado deve ser alterada, pois não são de admitir excepções a este princípio: a aplicação de qualquer sanção disciplinar deve pressupor a prévia instauração de processo disciplinar. Ninguém deve ser punido sem ter tido possibilidade de se defender; para tal, é indispensável a organização de um processo. Tai parees ser, sem dúvida, um corolário da legalidade democrática.

3 — O princípio do contraditório

Este princípio deve ser aceite em processo disciplinar: este deve ter sempre uma fase contraditória, em que o arguido poderá contestar as acusações produzidas, requerendo reinquirições de testemunhas;, peritagens de documentos, etc Sem esta fase não pode o arguido defender-se convenientemente, ficando irremediavelmente cerceados os seus direitos.

4 — A confidencialidade do processo

Também a questão da «natureza secreta» (artigo 29.º do Estatuto) do processo disciplinar tem de ser reapreciada: pensamos mesmo que o princípio a adoptar deveria ser o inverso —o da natureza pública do processo disciplinar—, neste particular entendido como conjunto de documentos (dossier). Não se vêem nesta solução os inconvenientes que lhe são apontados pelos defensores do seoretismo: a possibilidade de perturbação dos serviços não se afigura desvantagem mais grave do que a consequência provável da confidencialidade — uma certa consciência da impunidade que pode afectar o instrutor mais escrupuloso ... Adiantaríamos mesmo que a natureza pública do processo contribuirá para uma mais correcta organização do processo. E, diz-se, quem não deve, não teme ...

Seria também necessário ter em consideração o problema dos documentos classificados na origem oomo confidenciais, que não podem ser objecto de divulgação nem de cópia.

Também a eventual publicação de elementos do processo não parece carecer de especial previsão: para sancionar possíveis abusos temos uma Lei ¿e Imprensa, o que é suficiente.

S — Impulso processual—Competêcia para a instauração do processo

A norma constante do artigo 31.° do Estatuto atribui competência para desencadear o processo disciplinar aos Ministros e, por referência ao artigo 17.°, aos administradores, directores e inspectores-gerais, directores de serviços, chefes de repartição, chefes de

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divisão, chefes de serviços externos e chefes de secções administrativas. Afigura-se que o princípio da competência do superior hirárquico para instaurar processos é de manter, embora a questão se deva ver em conjunto com as da competência para instruir processos e para aplicar sanções.

Deverá, no entanto, discutir-se até que nível (descendente) de responsabilidade se deve cometer essa competência para instaurar processos.

6 — A livre apreciação dos meios de prova

Pensamos que no direito processual disciplinar deve vigorar o princípio da livre apreciação dos meios de prova, característico do direito processual penal. Não se descortinam quaisquer razões para adoptar princípio diverso em processo disciplinar.

1 — A prescrição da acção disciplinar

Também esta questão, regulada no artigo 3.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, deve ser revista: deverá ponderar-se o encurtamento do prazo de prescrição, que parece exageradamente longo; talvez uma redução para três anos. Por outro lado, certas infracções deveriam ser imprescritíveis: estamos a pensar nas infracções disciplinares que se traduzam em violação dos direitos mais elementares do cidadão, designadamente os consignados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem. No entanto, esta questão pressupõe alterações ao regime da prescrição dos crimes, pois desde que exista prescrição criminal terá de existir prescrição disciplinar, dado a infracção criminal ser mais grave que a disciplinar.

8 — Subsidiariedade do direito processual penal

Crê-se que este princípio deve ser consagrado no futuro diploma regulador da responsabilidade disciplinar dos trabalhadores da função pública: por um lado, o processo penal é aquele que, até constitucionalmente, mais garantias oferece ao arguido (v. artigo 32.° da Constituição); por outro, o processo disciplinar conduz, possivelmente, à aplicação de uma sanção disciplinar que muitas vezes, pela sua gravidade e consequências directas e indirectas para o atingido, não se compara com as sanções disciplinares aplicáveis aos trabalhadores das empresas privadas. Só o processo penal oferece (oferecerá, depois de revisto à luz da Constituição) condições para integral as lacunas do processo disciplinar.

IV

A Infracção disciplinar

O conceito de infracção disciplinar consta do artigo 2.º do Estatuto. Diferentemente do ilícito criminal, que representa a violação de uma ordem normativa que se impõe genericamente (tão genericamente quanto o contrôle do mecanismo de produção legislativa por uma ou outra classe social o permite ...) a todos os membros da sociedade civil, o ilícito disciplinar traduz a violação de uma normatividade espe-

cial, imposta a um círculo restrito de cidadãos, funcionalmente adstrito à salvaguarda de uma determinada instituição. Nas empresas o direito disciplinar está indissociavelmente ligado ao processo de organização social do capital e do trabalho; no aparelho de Estado o direito disciplinar depende, evidentemente, do tipo de organização estadual e dos fins que lhe são cometidos pela lei fundamental.

Ao contrário da infracção penal, sujeita ao princípio da tipicidade (artigo 29.° da Constituição e artigo 5.° do Código Penal), o ilícito disciplinar é, como o ilícito civil, atípico: qualquer facto voluntário praticado pelo funcionário com violação de algum dos deveres gerais ou especiais decorrentes da função que exerce ou com ofensa dos deveres gerais dos cidadãos impostos pela lei ou pela moral social constitui infracção disciplinar. Quer dizer que a lei não indica quais as condutas qualificáveis como ilícitos disciplinares; limita-se a apontar características que essas condutas, quaisquer que sejam, devem possuir.

A lei exige apenas que se trate de um facto voluntário, portanto imputável a uma vontade livre e correctamente formada (imputabilidade, ausência de coacção e de erro), e que esse facto viole deveres a que o funcionário se encontra sujeito.

Que pensar deste estado de coisas?

Não parece que a legalidade democrática imponha, só por si, a adopção do princípio da tipicidade. Não temos dúvidas de que a consagração deste princípio teria inegáveis méritos; revestir-se-ia, no entanto, de dificuldades se não insuperáveis, pelo menos dificilmente transponíveis. Duas coisas se poderão e deverão fazer:

1. Limitar-se a referência à violação dos «deveres gerais dos cidadãos impostos pela lei ou pela moral social», em ordem a prevenir quaisquer ingerências na vida privada dos cidadãos, expressamente protegida pelo artigo 33.° da Constituição;

2. Condicionar-se mais rigorosamente a aplicação das sanções disciplinares mais graves, enumerando taxativamente as infracções que as poderão justificar. A título meramente exemplificativo: a discussão pública dos actos dos superiores (artigo 19.°, § 5.°, do Estatuto) só deve ser punida quando tiver lugar no serviço a que pertencem o funcionário prevaricador e o superior; os «procedimentos atentatórios da dignidade e. prestígio do funcionário ou da função» (n.° 3 do artigo 21.° do Estatuto) devem ser concretizados; tal como os «factos desonrosos» do n.° 5 do § í.° do artigo 23.°

Também deverá ser revisto o problema das causas de justificação da infracção disciplinar, designadamente da legítima defesa; do mesmo modo, a questão das circunstâncias atenuantes, que devem ser revistas, e das agravantes, ficando inequivocamente expresso o princípio da enumeração taxativa destas.

V

A sanção disciplinar

Distinguiremos dois aspectos:

a) A enumeração das sanções; b) A competência para punir.

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A) Enumeração das sanções

As sanções disciplinares referidas no capítulo IV são as seguintes:

1) Advertência;

2) Repreensão;

3) Multa;

4) Transferência («afastamento») de serviço;

5) Suspensão (a sanção de inactividade é uma

forma de suspensão);

6) Aposentação compulsiva;

7) Demissão.

Várias modificações vantajosas se poderiam realizar:

a) Eliminação da multa

Esta sanção é especialmente «antipática», podendo revestir-se de maior onerosidade que a suspensão, geralmente considerada mais gravosa: é que a multa traduz-se, no fundo, numa imposição de trabalho gratuito. Enquanto o trabalhador suspenso perde a retribuição mas não é forçado a trabalhar, o trabalhador multado é obrigado a trabalhar sem salário (artigo 11.°, n.os 2-A, 2-B e 3, do Estatuto). Além de que a retribuição do trabalho é um direito dos trabalhadores garantido constitucionalmente [artigo 53.°, alínea «)]. Temos para nós que é inconstitucional manter um cidadão a trabalhar sonegando-lhe o salário, legítima e irrenunciável contrapartida do trabalho prestado. A multa deve desaparecer do direito disciplinar português. Em compensação, deverá proceder-se a uma maior graduação da pena de suspensão.

b) Supressão da pena de inactividade Deverá ser reconduzida à suspensão que é.

c) Substituição do afastamento de serviço pela trans-

ferência de serviço com eventual baixa de categoria e diminuição de vencimento

Parece razoável a adopção desta sanção, prevista na legislação do saneamento na função pública (De-creto-Lei n.° 123/75). Conviria pôr um limite à baixa de categoria — uma letra parece suficiente.

A transferência de serviço deve ser realizada dentro da mesma localidade ou, se de todo impossível, do mesmo distrito, para evitar que a sanção seja agravada com prejuízos, porventura elevados, para o trabalhador.

d) Eliminação da pena de advertência

Dada a pouca diferença entre a advertência e a repreensão verbal, ficaria a existir apenas esta última (e a repreensão escrita, é claro).

Os princípios contidos no corpo do artigo 13.° e no artigo 14.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado são de manter: as sanções disciplinares só podem ter os efeitos previstos na lei e não é possível aplicar duas sanções à mesma infracção. São princípios assentes do direito processual penal cuja aplicação ao processo disciplinar é perfeitamente razoável.

Neste ponto, assume particular relevo a eliminação dos efeitos «odiosos» da pena de demissão: não é admissível que a aplicação desta pena comporte a

impossibilidade ad eternum de o trabalhador sancionado voltar a exercer funções públicas. Se o sector público já representa quase 70% da economia nacional, onde é que estes «condenados» a uma espécie de «morte civil» vão trabalhar? No sector privado? E que obrigação tem este de suportar aqueles que o Estado a caminho do socialismo vota ao ostracismo? Emigram? Dedicam-se ao crime? Bem se pode dizer que a demissão é a única pena perpétua do sistema jurídico português.

B) A competência para punir

É este um problema de inegável delicadeza: o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado admite perfeitamente que a mesma pessoa possa ser vítima de uma infracção disciplinar, instaurar o respectivo processo, nomear o instrutor, decidir e executar a sanção! É de facto muita responsabilidade e grande risco para um só homem, por mais isento que seja. Devem distinguir-se três realidades diversas:

Competência para instaurar o processo — já atrás disse-mos ser aceitável deferir tal competência aos superiores hierárquicos;

Competência para instruir o processo — adiante

voltaremos a este ponto;

Competência para decidir e aplicar a sanção — é este o aspecto que agora abordamos.

Podem encarar-se várias soluções possíveis:

I.° Deferir a competência para punir à entidade que determinou a instauração do processo, ainda que, eventualmente, restringíndo-a a certos níveis mais elevados da hierarquia e prevendo esquemas de delegações de competência.

2.° Atribuir ao instrutor competência para punir. 3.a Considerar competente para decidir e aplicar a sanção uma terceira entidade.

A primeira solução é a do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado (artigos 17." e 11.°). E não é certamente a melhor.

A segunda solução também apresenta inconvenientes: não parece ser o instrutor, que acompanhou o processo desde o início, que falou com o arguido, que ouviu as testemunhas, que executou as diligências, a pessoa mais indicada para julgar e condenar (ou absolver). Aliás, esta concentração de funções instru-tor-julgador tem sido considerada inconveniente no processo penal.

Quanto à terceira solução, o problema que se levanta é este: que entidade?

A nosso ver, o ideal seria um órgão colegial, paritário, composto por funcionários de designação ministerial e funcionários eleitos pelos trabalhadores ou escolhidos pelas suas associações sindicais — um conselho de disciplina.

No entanto, envolvendo a criação destes órgãos uma inovação no direito disciplinar português, seria prudente não lhe atribuir desde logo competência decisória. Embora esta fosse a meta a atingir.

Numa fase transitória, necessariamente experimental, começar-se-ia por atribuir aos conselhos de disciplina funções meramente consultivas, devendo dar

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parecer sobre todos os processos disciplinares antes da sua decisão. Seria unia espécie de período de rodagem.

Quanto à decisão, embora lhe reconheçamos graves defeitos, manter-se-ia transitoriamente a competência do superior hierárquico, de categoria não inferior a direotor-geral. Aliás, os defeitos seriam minorados não só pela intervenção do conselho de disciplina, como pela atribuição da direcção da instrução do processo a um magistrado, como veremos. Também a indispensabilidade de fundamentação da decisão disciplinar e o alargamento do âmbito do recurso contencioso contribuirão para o esbatimento do inconveniente de atribuir ao superior hierárquico competência para punir.

Finalmente, aos conselhos de disciplina seria cometida competência para decidir os recursos interpostos de actos do instrutor do processo.

VI

O processo disciplinar

Também, ou até especialmente, a matéria relativa à marcha do processo deve ser largamente revista. No processo disciplinar distinguiremos cinco fases:

1) Instrução preliminar;

2) Acusação;

3) Defesa;

4) Relatório;

5) Decisão.

1) instrução preliminar

a) Designação do instrutor

Determinada a instauração do processo pela entidade para tal competente, levanta-se a questão de saber quem deverá instruí-lo. O instrutor de um processo disciplinar deve reunir, a nosso ver, as seguintes condições: competência técnica, isenção, independência hierárquica relativamente à entidade que mandou instaurar o processo e ao respectivo ministro. Estas três qualidades apontam inequivocamente para a escolha de um magistrado. E pensamos que deve ser efectivamente adaptado o princípio de cometer a direcção da instrução disciplinar a um magistrado. E onde se irá buscar tal magistrado? Só vemos duas possibilidades:

Requisitá-lo ao Ministério da Justiça. Com a actual falta de magistrados e a orientação do Conselho Judiciário no sentido de os «segurar», orientação que já se faz sentir no Serviço do Provedor de Justiça, supomos que este sistema se revelaria impraticável;

Encarregar da instauração o auditor jurídico junto de cada Ministério. Esta solução teria várias vantagens: por um lado, o auditor preenche as condições que se exigem para o «instrutor ideal»; por outro, o próprio auditor ganharia, pois sendo ele que tem de responder aos recursos interpostos para o Supremo Tribunal Administrativo dos actos dos ministros, incluindo os que aplicam sanções disciplinares, teria a sua missão facilitada, limitando-se a

defender posições suas, assumidas no próprio processo, o que não acontece hoje, tendo o auditor, em respostas a recursos, de defender frequentemente posições de muito difícil fundamentação sustentadas por outros e cujas motivações desconhece.

Claro que esta solução comporta o inconveniente de sobrecarregar os auditores jurídicos; tal inconveniente poderia ser superado dotando os auditores do indispensável aparelho humano e técnico e permitindo que os auditores delegassem a sua competência instrutória nos seus assessores, juristas que poderiam mesmo ser técnicos do respectivo departamento, mas que ficariam desligados de qualquer subordinação hierárquica, respondendo apenas perante o próprio auditor.

Questão diferente desta e, a ser adoptado o sistema que sugerimos, de menor importância relativa é a das suspeições: o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado não prevê, à semelhança do que acontece no Código de Processo Penal relativamente aos juízes (e não só), a possibilidade de o arguido deduzir o incidente da suspeição. Muito embora o instrutor não seja o julgador, parece que se poderá estudar esta possibilidade em processo disciplinar, uma vez que sempre se poderá dar o caso de existirem razões objectivas — parentesco, amizade, inamizade — que desaconselhem a escolha de determinada pessoa para instrutor. Acrescente-se que deve ser reconhecida à entidade que mandou instaurar o processo competência para, também ela, deduzir a suspeição.

Também deverá ser estudada a possibilidade de alargar o mecanismo das suspeições aos restantes intervenientes, a título decisório ou consultivo, no processo disciplinar.

Finalmente, parece-me de abolir o condicionamento estabelecido no artigo 43.° do Estatuto: não vejo motivo, a não ser em aparelhos fortemente hierarquizados, como as forças armadas ou as polícias, para que o instrutor haja forçosamente de ser um funcionário de categoria superior à do arguido ou mais antigo do que este na mesma categoria.

b) Diligências preliminares

A ordem de instauração do processo será transmitida à auditoria jurídica; o auditor iniciará ele próprio a instrução ou designará para tal um dos seus assessores (delegação da competência para instruir).

A lei deverá estabelecer um prazo, findo o qual as diligências deverão estar concluídas. Penso, aliás, que todo o processo deve estar sujeito a prazos rígidos e o mais curtos possível, para obviar ao arrastamento dos processos, com as inevitáveis injustiça e insegurança que tal circunstância provoca e até a produção de situações do tipo facto consumado, quantas vezes de difícil ou impossível correcção, de que temos exemplos em reclamações pendentes no Serviço do Provedor de Justiça.

Durante este período o instrutor efectuará as diligências que entender: audição de testemunhas, exames de documentos, etc. o instrutor pode convocar o arguido para prestar declarações, devendo ser assegurados a este os direitos de:

Não responder às perguntas feitas; Não responder com verdade;

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Fazer-se acompanhar de advogado e ou dirigente ou delegado da associação sindicai que o represente;

Requerer as diligências que tiver por convenientes;

Representar testemunhas; Produzir prova documental.

No caso de o instrutor indeferir o requerimento para realização de determinadas diligências, fundamentará, por escrito, a sua decisão. Tratando-se ainda da fase preliminar do processo, parece dispensável atribuir ao arguido a possibilidade de recorrer de tal indeferimento.

Nesta fase deve ser garantida ao instrutor a maior liberdade de acção possível, sem obstáculos e sem pressões (como durante todo o processo, de resto).

2) A acusação

Terminado o prazo para realização das diligências preliminares, o instrutor optará entre:

a) Propor o arquivamento, em relatório que apre-

sentará ao conselho de disciplina, se entender que não existiu infracção ou que se não pode imputar a sua autoria ao arguido. Eventualmente, poderá sugerir à entidade que mandou instaurar o processo a abertura de um processo de inquérito, se constatar a existência da infracção mas não existirem quaisquer motivos para atribuir a sua prática ao arguido:

b) Apresentar ao arguido uma nota de culpa

contendo a descrição precisa dos factos imputados ao arguido, localizados no tempo e no espaço, e a menção das normas jurídicas violadas pela prática de tais factos. A nota de culpa deverá concluir pela fixação de um prazo para o arguido entregar a sua defesa. Seria conveniente que uma cópia da nota de culpa fosse remetida à associação sindical em que o arguido se encontrasse filiado, caso este assim o requeresse.

Deve ficar assente que, se no decorrer da instrução contraditória o instrutor verificar que não foram as normas indicadas na nota de culpa as ofendidas, mas sim outras, comportando a aplicação de pena mais grave, deverá ser apresentada ao arguido nova nota de culpa, podendo este defender-se nos termos gerais. O arguido nunca poderá ser sancionado pela ofensa de normas não referidas como violadas na nota de culpa, salvo se determinarem a aplicação de sanção de menor gravidade.

O problema da suspensão preventiva do arguido

Esta é uma questão muito versada em reclamações pendentes no Serviço do Provedor de Justiça; o artigo 45.° do Estatuto é, sem dúvida, uma das mais injustas e imorais disposições daquele diploma legal: não só permite a suspensão preventiva ad eternum (períodos consecutivos de noventa dias) do arguido, como possibilita que ao arguido seja retirado, total ou parcialmente, o vencimento, perda que poderá ser reparada, confirmada ou levada em conta na decisão final do processo. Esta inaudita violência outra coisa

não representa que uma forma de condenação antecipada do trabalhador, considerado culpado pelo facto de o processo ter sido instaurado! Não se descortina razão para, no processo disciplinar, não valer o princípio que a Constituição estabelece para o processo criminal: «Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação.» (Artigo 32.°, n.° 2.)

Poderá perguntar-se que razão terá levado ao tratamento da suspensão preventiva a propósito da acusação. A resposta é simples: entendemos que normalmente o arguido não será suspenso antes da apresentação da nota de culpa. Só com a apresentação desta o instrutor formula o seu juízo (precário) sobre as responsabilidades do arguido.

Sobre a suspensão, temos de focar os seguintes pontos:

Quando se pode decretar a suspensão; Quem pode decretar a suspensão; Duração máxima da suspensão.

A suspensão poderá ser determinada no acto que manda instaurar o processo ou, posteriormente, até à apresentação do relatório final ao conselho de disciplina; em qualquer das fases do processo que antecedem a apresentação daquele relatório o instrutor pode convencer-se da necessidade de suspender o arguido das suas funções.

Só o Ministro poderá suspender o arguido, sob proposta fundamentada do instrutor, ou, se este ainda não tiver sido designado, da entidade que mandou instaurar o processo. Em qualquer dos casos, o instrutor poderá sempre propor ao Ministro o levantamento da suspensão.

A suspensão preventiva deve ter duração máxima mais reduzida que a actual —aí uns sessenta dias parece razoável— e ser prorrogável uma única vez, por trinta dias, no máximo. A prorrogação será proposta ao Ministro, fundamentadamente, pelo instrutor, com o parecer favorável do auditor jurídico (quando não for ele próprio o instrutor).

Deve ficar assente que o arguido suspenso preventivamente mantém direito à integral percepção dos seus vencimentos de categoria e exercício, bem como de todas as remunerações acessórias, incluindo eventuais participações emolumentares.

Tomadas que forem todas estas medidas, afigura-se desnecessário possibilitar ao arguido o recurso do despacho ministerial que ordena a suspensão preventiva: trata-se de acto interlocutório, de algum modo preparatório da decisão final.

3) A defesa

Durante o prazo fixado na nota de culpa —e que deve ser mais longo do que o escandaloso mínimo de três dias previsto no corpo do artigo 50.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado (dez dias, pelo menos) — é facultada ao arguido a consulta c fotocópia ou transcrição dos elementos do processo, com uma única ressalva quanto à fotocópia dos documentos classificados na origem como confidenciais, que não será permitida.

O incidente de suspeição poderá ser deduzido pelo arguido desde o momento em que tomou conhecimento da designação do instrutor até quarenta e oito

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horas após a notificação da nota de culpa e deverá ser decidido pelo auditor jurídico no prazo de quarenta e oito horas (ou pelo conselho de disciplina, se for o auditor jurídico o suspeito). Para evitar abusos, a decisão deve ser irrecorrível e não suspender o decurso do prazo de apresentação da defesa.

O documento de defesa do arguido deve também ser apresentado dentro deste prazo: pelo que pode o arguido alegar o que entender, arrolar testemunhas (talvez seja conveniente elevar os limites do § 2.º do artigo 52.° do Estatuto — três por facto e dez no total), juntar documentos ou requerer a realização de quaisquer diligências. Deve estabelecer-se o princípio, diverso do actual, de que os documentos são sempre iuntos ao processo e todas as testemunhas são ouvidas. As testemunhas presenciais poderão ser ouvidas por deprecada, se à data da infracção eram trabalhadores do serviço a que o arguido pertence. Neste caso, serão ouvidas por agentes de serviços do mesmo departamento ou, se os não houver, pelo agente do Ministério Público. As testemunhas abonatórias deverão ser apresentadas pelo arguido no local onde decorrer a instrução.

Poderá o instrutor indeferir o requerimento para realização de determinadas diligências — só o fará, no entanto, com fundamento na sua total inutilidade para o apuramento da verdade, na impossibilidade prática da sua realização ou na circunstância de envolverem escândalo público ou grave prejuízo para a dignidade do serviço e da função pública em geral. Nestes casos, o instrutor fundamentara, por escrito, o indeferimento, de que caberá recurso para o conselho de disciplina.

O instrutor pode convocar o arguido para prestar esclarecimentos, sendo legítima a recusa deste em o fazer. Em todos os actos processuais em que intervenha pode o arguido fazer-se acompanhar de advogado e ou de dirigente sindical da associação de classe em que se encontre filiado. Em todos os actos que não seiam estritamente pessoais o arguido pode fazer-se representar por advogado constituído, advogado que poderá exercer sem entraves todos os direitos conferidos ao arguido.

O problema da prova na defesa

No âmbito do Estatuto funciona um curioso princípio de direito probatório: o Estado não tem o encargo de provar as acusações que imputa ao arguido — este é que tem de destruir a imputação de tais acusações. Ou seja, é culpado se não conseguir provar que é inocente! Esta circunstância, ligada aos factos de:

O instrutor poder recusar a realização de diligências e os documentos apresentados pelo arguido;

O Supremo Tribunal Administrativo não poder apreciar a prova da inexistência da falta apresentada pelo arguido;

faz com que a defesa do arguido assuma frequentemente o papel de simples formalidade essencial (!) do processo. É um pouco como se num combate de boxe amarrassem as mãos de um pugilista atrás das costas e o enviassem para o ringue defender-se (!?)

O princípio a consagrar nesta matéria tem de ser o oposto: a Administração tem de provar os factos imputados ao arguido. Se o não fizer, terá de se considerar este ilibado de todas as acusações. Como em

processo penal, o arguido não tem de demonstrar a inocência: esta presume-se se quem acusa não demonstrar do Supremo Tribunal Administrativo, em sede de recursos.

4) O relatório final

Terminada a produção da prova, começará a correr um prazo até ao termo do qual o instrutor apresentará o relatório final do processo ao conselho de disciplina.

O relatório final indicará e descreverá todas as infracções dadas como provadas e imputadas ao arguido, as circunstâncias agravantes e atenuantes, apontará a gravidade das infracções, que qualificará, e relacionará todos os meios de prova que fundamentaram o juízo do instrutor. Concluirá por sugerir o arquivamento ou propor a sanção que entende adequada para a infracção cometida.

O instrutor remeterá à associação sindical que representar o arguido uma cópia do relatório final, fixando-lhe um prazo para se pronunciar (quando não sejam designados por esta os representantes dos trabalhadores no conselho de disciplina).

S) A decisão

Em face de todos os elementos do processo — e recebido o parecer da associação sindical, quando a ele haja lugar, ou terminado o prazo fixado—, o conselho de disciplina pronunciar-se-ia quanto à existência e gravidade da infracção, quanto à culpabilidade do agente e quanto à sanção a aplicar, podendo limitar-se a concordar com o parecer do instrutor (não havendo acordo entre os representantes da Administração e dos trabalhadores no conselho, elaborar-se--iam dois documentos expondo cada uma das posições).

Acompanhado do parecer do conselho de disciplina, todo o processo seria remetido ao superior hierárquico com competência para punir, a fim de decidir e aplicar a sanção.

Da decisão do superior hierárquico, quando não fosse um Ministro ou um Secretário de Estado, caberia recurso hierárquico necessário para o Ministro, que homologaria ou não a sanção aplicada.

Parece de alterar o princípio do artigo 59.° do Estatuto: estabelecer-se-ia um prazo, contado desde a notificação ao arguido da homologação ministerial ou desde o termo do prazo para a interposição de recurso hierárquico necessário, durante o qual aquele teria de cumprir a sanção, sendo o momento exacto desse cumprimento determinado pela conveniência do serviço.

VII Recursos

Deverão existir duas vias de recurso: a) O recurso para o conselho de disciplina

Poderá ser interposto das decisões do instrutor que o arguido entenda limitarem as suas possibilidades de defesa: por exemplo, indeferimento do requerimento para a realização de certa diligência probatória. Estes recursos não devem ter efeito suspensivo e só serão apreciados a final, com o relatório do processo, para evitar expedientes dilatórios do arguido.

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b) O recurso contencioso

Será interposto para a 1.ª secção do Supremo Tribunal Administrativo, do despacho de homologação do Ministro (artigo 15.° da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo).

É indispensável alterar o artigo 20.° da Lei Orgânica, pois que este preceito estabelece Imitações inadmissíveis dos poderes de cognição do Supremo Tribunal Administrativo em matéria de recursos interpostos de decisões proferidas em processos disciplinares com prejuízo das garantias de defesa do arguido. O Supremo Tribunal tem de poder, em qualquer caso, apreciar a existência material da infracção e a sua imputação ao arguido, bem como a adequação da pena aplicada à gravidade da infracção.

De outra forma não estará eficientemente assegurada, como exige a Constituição (artigo 270.°, n.° 3), a defesa do funcionário arguido em processo disciplinar.

VIII

Inquéritos e sindicâncias

No capítulo dos processos disciplinares especiais faremos apenas referência ao inquérito e à sindicância, relegando para ulteriores análises os processos por abandono de lugar e por falta de assiduidade.

A estes processos especiais, que se destinam a apurar determinados factos —inquérito— ou a analisar o funcionamento de um serviço — sindicância —, devem aplicar-se as regras gerais do processo disciplinar comum (v. g., condução por magistrado) cem poucas excepções:

1 — Não deve ser admissível a suspensão preventiva dos inquiridos: porque estes processos se não destinam a apurar a responsabilidade das pessoas, mas sim a analisar factos ou situações. Quando, no decorrer do processo, o inquiridor (ou sindicante) tiver indícios bastantes da responsabilidade disciplinar de um funcionário, sugerira ao superior hierárquico deste a instauração do indispensável processo disciplinar, propondo desde logo, se o entender, a suspensão preventiva daquele.

Se não for possível abolir a suspensão preventiva nestes processos, deverá e9tabelecer-se que o prazo máximo de suspensão preventiva conta para o conjunto do período de suspensão durante o processo de inquérito ou sindicância e do processo disciplinar que porventura se lhes siga.

2 — Os inquiridos devem ser convocados para depor sob cominação de instauração de processo disciplinar; a não ser assim, inutilizar-se-ia o objectivo do inquérito ou sindicância, pois bem poderia acontecer que todos os inquiridos se recusassem a prestar declarações.

3 — No relatório final, que será sempre presente ao Ministro em caso de sindicância e à entidade que o mandar abrir em caso de inquérito, poderão o inquiridor ou sindicante propor a instauração de processos disciplinares e a suspensão preventiva dos respectivos arguidos. Nesta circunstância o instrutor designado pode dispensar a fase processual da instrução preliminar, apresentando de imediato as notas de culpa aos arguidos.

4 — A lei deve condicionar rigidamente o processo de publicização da sindicância, interditando praticas

imorais, como o envio aos funcionários do serviço sindicado ou a outros de cartas ameaçando com sanções os que não informarem sobre este ou aquele facto ou, pior ainda, sobre determinadas pessoas. Só devem admitir-se como meio de publicização os editais e os anúncios através de órgãos de comunicação social.

IX Conclusão

Ao longo deste estudo expendemos as nossas opiniões sobre a necessidade de revisão do Estatuto Discplinar dos Funcionários Civis do Estado; foi uma primeira, e muito superficial, aproximação do problema. Devido à época de férias não pudemos dispor de quaisquer referências de direito comparado, nem sequer das recomendações da Organização Internacional do Trabalho na matéria. Limitámo-nos a sopesar o Estatuto, pensar sobre ele, rever alguns casos da sua aplicação recente e «medi-lo» à luz da Constituição. O texto que resultou é um simples e despretensioso documento de trabalho, com o único e modesto objectivo de servir de base a uma conversa sobre o assunto. Não resolve questões — limita-se a colocá-las. Não exprime concepções — equaciona vias para a abordagem dos problemas.

Sintetizando, podemos dizer que a revisão necessária do Estatuto deverá passar pelos seguintes parâmetros:

1) Reforço das garantias de defesa do arguido;

2) Demarcação das funções de instauração, ins-

trução e decisão do processo disciplinar;

3) Participação dos representantes dos trabalha-

dores na aplicação da justiça disciplinar;

4) Amplificação do objecto do recurso conten-

cioso;

5) Condicionamento da marcha do processo a

prazos rígidos;

6) Aplicação do princípio de que qualquer pessoa

é inocente até se provar o contrário (corolário: a Administração deve provar as suas acusações).

Finalmente relembra-se a necessidade de, conjuntamente com o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, proceder à revisão dos artigos 558.° a 618.° do Código Administrativo, que regulam o exercício do poder disciplinar no âmbito dos corpos administrativos.

Este estudo foi amplamente apreciado em reuniões de trabalho do Provedor com o Provedor-Adjunto, os coordenadores e todos os assessores do Serviço, sendo esta resolução final resultado do consenso entre todos estabelecido. Foi remetido à Secretaria de Estado da Função Pública, a qual informou o Serviço do Provedor de Justiça, de que ele seria levado em conta no projecto da Lei de Bases da Função Pública.

7) Processo n.° 77-DI-1 Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 907/76.

O facto de não terem sido ouvidas as comissões de trabalhadores na elaboração do Decreto-Lei n.° 907/76 não viola nenhum preceito constitucional, como muito bem se sustenta e demonstra no parecer do Sr. Dr. Caupers.

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Tão-pouco, como igualmente se demonstra no mesmo parecer, se verifica qualquer outra inconstitucionalidade do referido decreto-lei.

Apenas no parecer, com a concordância tanto do Sr. Coordenador como do Sr. Provedor-Adjumto, se suscita a inconstitucionalidade que resultaria do facto de a desintervenção trazer consigo a reorganização da unidade produtiva desintervencionada, e para essa reorganização impõe-se, pela alínea c) do artigo 56.° da Constituição, a intervenção das comissões de trabalhadores.

Salvo o devido respeito, porém, parece-me não poder colocar-se o problema nesses termos.

Com efeito, nem o Decreto-Lei n.° 907/76 nem o Decreto-Lei n.° 422/76 proíbem ou impedem a audição das comissões de trabalhadores na reorganização das unidades produtivas.

Tanto um como outro — sendo certo que o 907/76 é regulamentador do 422/76 — apenas estabelecem as condições em que o Estado intervirá nas empresas e aquelas em que decidirá cessar a intervenção.

Nem para uma nem para outra dessas decisões se impõe na Constituição a intervenção ou audição das comissões de trabalhadores.

São actos políticos — abrangendo a própria política económica e financeira do Estado—, por isso mesmo tomados pelo Conselho de Ministros, e são simples actos de superintendência administrativa, e que, por isso mesmo, só o Governo está em condições de praticar, ajuizando da sua oportunidade e das razões que os justificam, quer quanto à intervenção, quer quanto à desintervenção.

E a decisão de desintervenção é outra coisa do que reorganizar a unidade produtiva — a reorganização só virá depois da decisão de desintervenção. Depois desia, por qualquer das medidas previstas no artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 422/76, é que surge a reorganização — se for caso disso.

E só para esta última é que a Constituição entende e dispõe que haja intervenção das comissões de trabalhadores. Será, pois, esta a altura de as ouvir, e não antes.

Sendo assim, como parece ser, não há razão justificativa para qualquer pedido de declaração de inconstitucionalidade quer do Decreto-Lei n.° 907/76, quer do Decreto-Lei n.° 422/76.

E, não a havendo, não vejo como justificar uma recomendação ao Governo para que oiça, antes de se pronunciar sobre o relatório a que se refere o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 907/76, as comissões de trabalhadores.

Ê que esse relatório não é a reorganização da empresa — que até pode nem ser uma unidade produtiva—, mas tão-só o balanço da gestão, nos seus vários aspectos (possibilidades de mercado, volume das transacções, clientela, possível rendibilidade, necessidades de pessoal, situação económica, etc.), como elemento de estudo para que o Governo possa decidir se deve ou não desintervencionar a empresa.

Assim, julgo que apenas se justifica, e essa entendo que é de fazer, uma recomendação ao Governo no sentido de, uma vez que tome a decisão de desintervencionar uma empresa, faça intervir, ouvindo-as, as comissões de trabalhadores da mesma na reorganização a levar a efeito, depois da decisão e, obvia-

mente, antes da cessação da intervenção, isto nos termos do artigo 20.° do Decreto-Lei n.° 422/76.

Assim, penso que, como pedido de declaração de inconstitucionalidade tanto do Decreto-Lei n.° 907/76 como do Decreto-Lei n.° 422/76, este processo é de arquivar, mas que, apesar disso, se faça uma recomenda-ção ao Governo no sent:do que deixo expresso.

21 de Março de 1977.

Em virtude deste despacho, foi elaborada a recomendação que a seguir se transcreve e enviada ao Sr. Primeiro-Ministro, o qual, conforme comunicação feita ao Provedor de Justiça, a remeteu a todos os Ministros para que não deixassem de a observar:

Recomendação

O Decreto-Lei n.° 422/76, de 29 de Maio, reuniu num texto único as normas fundamentais relativas à intervenção do Estado nas empresas. Posteriormente o Decreto-Lei n.° 907/76, de 31 de Dezembro, veio regulamentar o processo de cessação daquela intervenção, em execução do disposto no referido Decreto-Lei n.° 422/76.

As razões que conduziram à intervenção do Estado nas empresas são variadas; o que não é muito diversa é a situação actual em que se encontram: quase falidas, trabalhando a «meio gás», carecidas de novos investimentos, apoio financeiro e medidas reorganizativas.

Em muitos casos, se não mesmo na ma:oria, a sua sobrevivência não será possível sem que as suas estruturas produtivas sejam revistas e reformadas. E tais revisão e reforma exigem a participação activa dos trabalhadores, não só para serem eficazes, mas também para serem constitucionais. Constituição, aliás, que na alínea c) do artigo 56.° considera que tal participação se deve fazer através das comissões de trabalhadores.

Como não podia deixar de ser, a legislação aplicável à cessação da intervenção debruça-se sobre a questão: quer o Decreto-Lei n.° 422/76 (artigos 20.° e 24.°), quer o Decreto-Lei n.° 907/76 [artigo 9.°, n.° 1, alínea d)], referem, directa ou indirectamente, alterações da estrutura da empresa.

Entende, pois, o Provedor de Justiça ser de recomendar ao Governo que, decidida a cessação da intervenção estatal numa empresa e sendo necessário levar a efeito a reorganização da sua estrutura produtiva, possibilite sobre esta matéria a participação da respectiva comissão de trabalhadores, fornecendo-lhe todos os estudos e relatórios existentes e dando-lhe um prazo razoável para se pronunciar.

8) Processo n.º 77-DI-4

Inconstitucionalidade do aumento do preço da gasolina.

Despacho do Provedor sobre a informação do assessor Dr. João Caupers:

Em complemento da sua informação de 3 de Meio de 1977 e por entretanto terem sido juntos ao processo documentos por mim solicitados à Direcção-Geral dos Combustíveis, o Sr. Assessor elaborou uma nova in-

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formação em 1 de Agosto, na qual, não alterando totalmente os pontos de vista expressados na informação anterior, todavia extrai da análise desses documentos algumas conclusões que, pelo menos, o levam a considerar duvidoso, embora admissível, se possa ter o aumento da taxa de compensação, uma vez que reveste a forma de aumento do preço da gasolina como não abrangido nos termos «criação de impostos e sistema fiscal» da alínea o) do artigo 167.° da Constituição.

Assim, e perfilhando a doutrina do recente parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais da Assembleia da República de que, havendo dúvida sobre a constitucionalidade, deverá o caso ser remetido ao Conselho da Revolução para, nos termos do artigo 281.°, apurar da sua constitucionalidade, o Sr. Assessor termina propondo essa remessa.

Acontece, porém, que, para mim, é ponto assente, que me não suscita dúvida, de que a fixação do preço da gasolina não constitui criação de um imposto ou de um sistema fiscal e que, portanto, não cabe na competência reservada da Assembleia da República, antes é da competência exclusiva e própria do Governo, através da Secretaria de Estado da Indústria, ouvida a Secretaria de Estado do Comércio, conforme dispõe o Decreto-Lei n.° 329-A/74, de 10 de Julho, emanado do I Governo Provisório, pelo que a aprovação, no caso em apreço, por resolução do Conselho de Ministros reveste-se ainda de maior garantia para os cidadãos do que se se tratasse de simples despacho de um só Secretário de Estado.

É que a fixação do preço de um produto, desde que, como é o caso, se não revista de um aspecto especulativo flagrante e evidente, não pode ser equiparado à criação de um imposto, ainda que indirecto, nem como tal se pode encarar o estabelecimento de uma taxa sobre esse preço com destino a um fundo de abastecimento, que se destina a suportar parte do custo de alguns produtos essenciais ao abastecimento público, de maneira a tornar o seu preço comportável para o consumidor, e, estabelecendo diferenciais de preços dos combustíveis, constituindo um processo de compensação para preços inferiores aos custos.

É assim que desse fundo, para o qual revertem os diferenciais, se pagam, entre outros encargos (que não podem ser objecto de um valor médio por litro, quer pela sua diferenciação, quer por não poderem ser exactamente conhecidos por sujeitos a variações, o que obriga a que a fixação do preço se faça por previsão — e tudo isto lhe retira a característica de imposto), por exemplo, as diferenças de câmbio (a desvalorização do escudo arrastou desde logo um aumento de 15% no custo de aquisição dos dólares), o aumento das taxas aduaneiras e o dos fretes, diferimento pelo Banco de Portugal a cento e oitenta dias das autorizações de despacho de divisas, taxas de ponte-cais, imposto de comércio marítimo, taxa de porto e outras.

E é ainda à custa do diferencial que se está pagando para o gasóleo, petróleo e fuelóleo para a CP, fuelóleo e gasóleo para a marinha de guerra e para as forças armadas e fuelóleo para a indústria, o que importa avultada quantia e vai beneficiar os custos dos transportes e da produção industrial, o que reverterá em proveito dos economicamente mais débeis.

E é ainda deste fundo que sairá — ou se esperava que saísse — o pagamento de subsídios a produtos ali-

mentares essenciais ao cabaz das compras. Tudo isto servindo o interesse colectivo e só onerando o pro-duro caro —gasolina—, cujo principal consumidor é o dos mais abastados.

Sabendo-se que em 1976 o Fundo de Abastecimento, depois de ter pago todos os encargos com combustíveis, ficou com cerca de 6 milhões de contos para satisfazer outros sectores e que, em 1977, as previsões mais optimistas, segundo os mapas da Direcção-Geral dos Combustíveis, não permitem calcular a obtenção de quantia superior a 4 milhões, e que, mesmo que o Banco de Portugal revogasse a sua determinação de só autorizar o despacho de divisas a cento e oitenta dias de prazo (o que não se verificou até agora), não seria possível ultrapassar os 5 milhões de contos, é óbvio que a taxa-mãe sofreu qualquer aumento em relação ao ano anterior, mas que o aumento de preço fixado visa tão-só a cobrir o aumento dos encargos de importações de petróleo bruto e de refinações, taxas e impostos e comercialização e refinação.

Eis por que, sem necessidade de maior desenvolvimento, entendo não poder considerar-se o diferencial que é consignado a despesas previamente estabelecidas como um imposto indirecto; pois, como não deixa de o admitir o Sr. Assessor no seu parecer, tal consignação contraria o princípio básico orçamental da não consignação de receitas.

Aliás, como se salienta no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18 de Janeiro de 1963, publicado no apêndice ao Diário do Governo, 2.c série, n.° 291, de 14 de Novembro de 1963, desde a celebração do alvará com a Sacor e a entrada em vigor da legislação sobre petróleos assumiu o Governo a obrigação da fixação dos preços dos combustíveis líquidos, e, citando o Prof. Marcelo Caetano, o mesmo acórdão em outro passo salienta que «a cobrança dos diferenciais corresponde não a uma tributação dos combustíveis, mas a mero acerto de contas por ajustamento da realidade à previsão».

Não tenho, pois, qualquer dúvida de que se não está em face de criação de um imposto nem de um sistema fiscal e, que, portanto, não é a fixação do preço da gasolina matéria da competência reservada da Assembleia da República, e, ainda que dúvida alguma subsistisse no meu espírito, não usaria da prerrogativa que me é conferida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, pois continuo a entender não dever usar dela em caso de dúvida, já que não concebo, mormente num período de transição como este o é, e assim o define a nossa Constituição, em que importa não só possibilitar os meios financeiros para o Estado poder indo melhorar as condições de vida das classes mais desfavorecidas e consolidar, pela recuperação económica, a nossa vivência democrática, que se criem ambientes de dúvida sobre o respeito dos princípios constitucionais e se estabeleça —como parece já ir sendo condenável tendência— uma constante acusação de inconstitucionalidade a todas as medidas que se vão tomando a nível legislativo, quase que pretendendo manietar o Estado na sua missão e obrigação governativa.

A circunstância de ser diferente o ponto de vista da Comissão de Assuntos Constitucionais da Assembleia da República, apesar do muito respeito que me merecem sempre as opiniões contrárias, não me convence a modificar o meu modo de ver o problema, já que não só nem é ele vinculativo, como ainda me não

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parecem suficientemente convincentes as razões que fundamentam a conclusão desse parecer.

Além do ma:s, considero altamente importante a prerrogativa concedida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição às personalidades no mesmo mencionadas, para que estes a possam ou devam banalizar através do uso sistemático, mesmo com dúvidas, pois, de pedidos de apreciação de constitucionalidade, que só devem, portanto, sen formulados quando tenham como segura a inconstitucionalidade.

Atendendo a que este assunto já foi discutido, se bem que sem a informação complementar do Sr. Assessor, em reunião geral, entendo, mais a mais face à posição que tomo perante ele, que não há que o submeter a nova reunão geral.

Em consequência, deverá o presente processo ser arquivado, com comunicação à Confederação do Comércio Português.

5 de Agosto de 1977.

9) Processo n." 77-DI-ll

Inconstitucionalidade do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 141/77.

Depois de apreciado o estudo da assessora

Dr.a Branca Amaral acerca do problema suscitado, em reunião conjunta do Provedor com o adjunto do Provedor, os coordenadores e todos os assessores e ainda que concluindo pela inconstitucionalidade, entendeu o Provedor, pelas razões que se apontam no ofício dirigido ao Conselho da Revolução, tendo em vista a competência legislativa do Conselho, sugerir a revogação e substituição do referido artigo 2."

Es o teor do ofício remetido ao Conselho da Revolução:

Foi apresentado neste Serviço um requerimento pedindo-me para, usando da prerrogativa que me é concedida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição Política da República, solicitar ao Ex.mo Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade do artigo 2.° do Decreto--Lei n.° 141/77, de 9 de Abril, que aprovou o Código de Justiça Militar.

Tem sido meu critério, que não vejo motivo para alterar, não atender a tais solicitações se, procedendo ao necessário estudo prévio e exaustivo, não adquirir a firme convicção de que os preceitos ou diplomas postos em causa estão efectivamente feridos de inconstitucionalidade.

Entendo que uma competência da importância e gravdade como a que o referido n.° 1 do artigo 281.° atribui tem de ser exercida com a imaior ponderação e só em casos isentos de dúvida deve exercer-se, o que logo exclui a obrigatoriedade do uso dessa competência em face de petição dos cidadãos, já que o Provedor de Justiça, como qualquer das outras entidades a quem tal competência é conferida, não é, nem pode ser, mera instância de trânsito dessa petição.

No caso presente, estudado o mesmo com a profundidade e ponderação necessárias, adquiri a convicção de que efectivamente o n.° 2 do artigo 2." do decreto-lei citado é todo ele inconstitucional.

Com efeito, e salvo melhor entendimento, esse artigo 2.° ofende frontalmente o artigo 13.° da Constituição Política, na medida em que para cidadãos passíveis da mesma incriminação e sujeitos ao mesmo foro se estabelece para uns mais longa privação de uberdade do que para outros.

É que o n.° 1 do citado artigo 13.° estatui a igualdade de todos os cidadãos perante a lei e o n.° 2 estabelece, completando o sentido dessa igualdade, que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer d xeito ou isento de qualquer dever em razão de vários elementos de diferenciação que enuncia. Ora, não pode admitir-se que seja elemento de distinção um elemento meramente factual, como terá de considerar-se a data da detenção.

A prisão antes ou depois da publicação de um diploma não pode subverter as regras jurídicas pacificamente aceites e ser relevante para alterar as garantias constitucionais quanto ao direito à liberdade e à igualdade de tratamento perante a lei.

Também relativamente ao n.° 1 do artigo 2." do decreto-lei em causa, há uma desigualdade de tratamento ao estabelecer que a prisão preventiva não poderá exceder seis meses em relação aos arguidos que se achem detidos à data da entrada em vigor do decretonlei, já que para os detidos posteriormente o prazo, ainda que podendo ser prorrogado por dois períodos únicos e sucessivos de trinta dias, é de cento e vinte dias, como se alcança do artigo 368.° do Código de Justiça Militar.

Esta disposição do n.° 1 contraria, portanto, o mesmo artigo 13.° da Constituição, pelo que se justificaria a solicitação de declaração de inconstitucionalidade dos n.°" 1 e 2 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 141/77, de 9 de Abril.

Porém, e uma vez que o Conselho da Revolução é o órgão de competência reservada para legislar nesta matéria, permito-me anotar que uma outra solução é possível, sem necessidade da declaração de inconstitucionalidade: a de revogar o artigo 2.°, substituindo-o por outro com uma redacção do n." 1 em que a parte inicial podia ser igual, mas que no final, a seguir a «diploma», se dissesse: «[...] até ser deduzida a acusação a prisão preventiva não poderá exceder cento e vinte dias, contados a partir daquela data». O n.° 2 podia ser assim redigido: «O prazo do número anterior, nos processos de difícil instrução, mediante decisão fundamentada do juiz, poderá ser prorrogado por dois períodos únicos e sucessivos de trinta dias.» E o n.° 3 continuaria a ser igual ao actual.

Assim se harmonizavam, em ambos os casos, detidos antes e detidos depois, as respectivas situações de prisão preventiva, não criando, pois, discriminações.

Não veja V. Ex.» no que acabo de escrever qualquer recomendação ao Ex.mo Conselho da Revolução, uma vez que para tanto não tenho competência legal, e portanto seria atitude incorrecta face a um órgão de Soberania, mas apenas, dentro de um espírito colaborante, a indicação de

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uma via menos solene e mais rápida, uma vez que, se fosse declarada a inconstitucionalidade, haveria, do mesmo modo, que revogar-se o actual artigo 2° e substituí-lo em conformidade com essa declaração.

o Conselho da Revolução entendeu, porém, não ser de atender a sugestão, o que comunicou ao Provedor, inquirindo se, em face disso, desejava apresentar o pedido de apreciação e declaração de inconstitucionalidade, o que, todavia, o Provedor não fez por nessa altura não ter já alcance prático devido ao tempo decorrido e estar, assim, a expirar o prazo de seis meses referido no n.° 1 do artigo 2." do Decreto-Lei a.° 141/77.

10) Processe n-º 77-DI-13

Inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 135-A/77, de 30 de Maio.

o estudo efectuado pelo assessor Dr. José Porto foi objecto de apreciação em reunião conjunta do Provedor com o adjunto do Provedor, os coordenadores e todos os assessores, tendo-se concluído, pelas razões expostas no seu texto, ser preferível chamar a atenção do Governo para que procurasse a solução para os problemas que suscitou através de adequado processo legislativo, sem que, contudo, se não exclua a possibilidade de ainda vir a pedir a apreciação da inconstitucionalidade, se não for dada a preconizada solução legislativa.

Eis o ofício enviado ao Secretário de Estado da Administração Regional e Local, no qual se insere o estudo acima referido:

1 — Em exposição dirigida a este Serviço pretende o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local que o Provedor de Justiça, ao abrigo do artigo 281.° da Constituição da República Portuguesa, solicite ao Conselho da Revolução a apreciação e a declaração de inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 135-A/77, de 30 de Maio.

2 — O despacho normativo em causa, após cuidadosa análise, mereceu-me as considerações que seguidamente se enunciam.

3 — Como se diz no próprio preâmbulo do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, com taí diploma visou-se, em síntese, pôr termo ao princípio de diferenciação salarial em função dos níveis económicos regionais, corrigir as disparidades e as assimetrias dos quadros de pessoal aprovados pelo Decreto-Lei n.° 506/75, de 18 de Setembro, e, ainda, evitar a proliferação indiscriminada de categorias, adequando as designações das mesmas ao conteúdo funcional dos cargos respectivos.

4 — Da documentação junta pela entidade peticionária facilmente se infere que o diploma em causa foi bem acolhido pelas estruturas representativas dos trabalhadores, muito embora transpareçam facilmente as dúvidas de interpretação resultantes da sua aplicação.

5 — É exactamente na sequência da aplicação do diploma que nasceu o Despacho Normativo n.0 135-A/77, de cuja análise se trata, por ordem dos pontos assinalados.

a) N.º 1 do despacho normativo

No artigo 1.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 76/77 estabelecem-se as categorias do pessoal das administrações local e regional.

Por sua vez, mo artigo 2.° do mesmo diploma estabeleceu-se a obrigatoriedade de fazer a adaptação dos lugares e categorias existentes nos quadros de pessoal ao novo elenco de categorias criado pelo diploma.

Através do n.° 1 do despacho normativo veio dizer-se que a adaptação referida poderia abranger o pessoal que na mesma data se encontrava vinculado aos serv:ços, embora não integrado nos quadros, desde que houvesse sido admitido até 24 de Novembro de 1973 e exercesse funções que correspondessem de modo efectivo a necessidades efectivas dos respectivos serviços.

Visou-se, assim, através do despacho, permitir a integração nos quadros de pessoas que até ali não tinham direito à integração.

Todavia, ao referir-se à integração nos novos quadros (artigo 2.°, n.° 2), nada diz a lei quanto aos contornos do direito à integração. Parece que o legislador, no preceito em análise, não cuidou da definição de novas integrações exactamente por partir do pressuposto de que só haverá lugar à integração nos novos quadros para aqueles trabalhadores que, por direito próprio anterior, pertencessem já aos quadros. Aliás, nem será muito de estranhar tal técnica legislativa, se nos lembrarmos do entendimento que ainda prolifera relativamente à conceptualização dos funcionários públicos ou administrativos: exercício de um lugar do quadro da Administração Pública por um agente administrativo a tempo completo, com submissão ao regime legal da função pública (v. André Laubadère, 16.a ed:ção, Paris, 1975, pp. 20-21, e Marcelo Caetano, tomo II, 8.° edição, pp. 606 e seguintes).

Mas a ser assim, como nos parece que é, dúvidas não surgiriam, porquanto tratava-se apenas de saber quais os trabalhadores que à data de entrada em vigor do diploma já pertenciam aos quadros, o que era bastante fácil tendo em conta a legislação anterior.

A não ser assim entendido, dúvidas só poderia ter quem aceitasse que a integração, que, no caso concreto, se devia cingir à adaptação dos quadros de pessoal, abrangeria outros trabalhadores.

Parece, pois, que só no caso de a letra do preceito em causa suscitar dúvidas quanto ao âmbito dos trabalhadores a integrar haveria lugar a possíveis interpretações para desfazer tal ponto obscuro.

Quanto a nós, porém, a letra do preceito não suscita qualquer dúvida, pois limitou-se a regular o modo de aprovação dos quadros e a transferência automática do pessoal do quadro anterior para o actual, instituído pelo novo diploma.

Quando se vem dizer que o pessoal que tenha sido admitido antes de 24 de Novembro de 1973 poderá ser integrado nos novos quadros, está-se manifestamente a inovar, isto é, a regular ex novo, a inclusão no novo quadro de pessoal até aí não integrado, inclusão essa que, nem de perto nem de longe, a letra e o espirito permitem considerar. Está-se, numa palavra, a modificar o estatuto do pessoal ainda não incluído nos quadros, embora exerçam efectivamente funções a tempo completo e preencham necessidades permanentes dos serviços.

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Repare-se, contudo, que, ao contrário do que possa parecer, até somos adeptos de que o «pessoal permanente» deve ser incluído em quadros, posto é que trabalhe a tempo completo e faça das suas funções a sua actividade profissional principal.

Simplesmente, o legislador do diploma em análise jamais pensou na integração desse pessoal. A ter previsto tal hipótese, tê-lo-ia dito de forma expressa.

Mas, a pensar-se e a admitir-se, o que não se concebe, que tal integração era possível, face à sua aceitação implícita pelo preceito, por que restringir tal integração ao pessoal admitido até 24 de Novembro de 1973?

Será só este o pessoal permanente a tempo completo, isto é, o pessoal que exerce as suas funções com carácter de profissionalidade, por preencher necessidades permanentes dos serviços? Porquê remeter, um tanto arbitrariamente, para a citada data, a não ter-se, como ponto de referência, a data de entrada em vigor do diploma a interpretar?

De duas uma: ou se entende que a integração dos novos lugares ocorre automaticamente só para os já integrados nos quadros, ou, então, a integração abrange ainda, e tão-só, todos aqueles que com carácter de profissionalidade desempenhavam as suas funções (deve notar-se que esta ideia, ainda que em campo de estatuição diferente, não deixa de transparecer da letra do artigo 1.°, n.° 1, do citado diploma).

Na primeira hipótese, ao contemplar-se a situação dos não integrados anteriormente, está-se a criar a norma jurídica específica daqueles que estavam afastados da previsão legal —fattispecie— do preceito interpretado. E nem se diga que existe caso omisso merecedor de tutela jurídica, pois, mesmo que tal hpótese se verificasse, nem por isso se deixaria, como não se deixou, de criar uma norma inovadora. A ter de ser entendido o artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 76/77 em termos hábeis, é evidente que, fora do período da autorização legislativa, ao Governo restam apenas os poderes interpretativos.

A não se entender assim, está criado um modus faciendi muito simples de defraudar a extensão das autorizações legislativas, assim se permitindo a invasão ad eternum das competências legislativas reservadas.

Neste quadro, consequentemente, não se percebe muito bem a possibilidade de, quer por via de interpretação, quer por via de integração de eventuais lacunas, se ter regulado a situação dos não integrados. Tais métodos utilizados colocam-nos no seio da mais revolucionária de todas as teorias modernas no domínio da interpretação da lei —escola de direito Kvre (Stammler, Mayer e Adickes, todos eles doutrinadores germânicos, para quem o julgador e o intérprete têm a missão especial da realização da ordem jurídica, pese embora o valor dos postulados legais— Noções Fundamentais de Direito Civil, Pires de Lima e Antunes Varela, 1961, vol. I, pp. 179 e seguintes).

Na segunda hipótese, perfilhando a tese de que a integração devia aproveitar a outros trabalhadores, hipótese que só em tese peregrina admitimos, nada na lei autoriza a interpretação restritiva feita, e, consequentemente, afastando de tal concessão trabalhadores, em identidade de situações, está-se manifestamente a restringir direitos amplamente concedidos.

Numa palavra, derrogam-se princípios legais em vigor, o que só seria de admitir se, através de algum dos métodos de interpretação conhecidos, fosse de considerar, com certeza e segurança, que o legislador tinha ido além do que pretendia, pois só nesse caso seria possível a interpretação restritiva.

Ora tal derrogação só pela entidade com competência própria [Assembleia da República — artigo 167.°, alínea m)] poderia ser estabelecia, o que envolve, necessariamente, a inconstitucionalidade orgânica e formal do ponto 1 do despacho normativo.

Do mesmo modo, na primeira hipótese, ao criaremos* novas normas jurídicas para os não integrados, invadiu-se competência reservada da Assembleia da República, e, assim, de igual vício de inconstitucionalidade está ferido o despacho.

Sendo estas as considerações que me merece o ponto em análise do despacho, apreciado sob o ponto de vista jurídico formal, reconheço, contudo, o largo alcance que se teve em vista com a integração do pessoal não pertencente aos quadros.

Simplesmente, escasseiam-me elementos suficientes que possam demonstrar a intenção do legislador do Decreto-Lei n.° 76/77 quanto à delimitação do direito à integração.

Nesta medida, solicita-se a V. Ex.ª se digne indicar-me se na perspectiva do legislador em causa houve a preocupação de resolver o problema dos eventuais, e na afirmativa, quais as razões que terão levado à restrição contemplada na parte final do ponto 1 do despacho normativo, embora se reconheça que a não integração de alguns eventuais é bem menos gravosa para os trabalhadores em causa do que a exclusão, da integração de todos os eventuais.

b) N.º 2 do despacho normativo

Através deste ponto do despacho excluem-se da integração dos quadros de pessoal os trabalhadores rurais.

Para além das razões, já apontadas na alínea anterior, no que concerne à delimitação do conceito de integração, outras razões há para mostrar a ilegalidade do despacho nesta parte.

Muito embora seja por demais conhecido o estatuto de menoridade (capitis deminutio) conferido aos trabalhadores rurais, não se vislumbra por que não foram as categorias de trabalhadores rurais, ao serviço das autarquias, adaptadas às novas nomenclaturas do Decreto-Lei 76/77, no caso de prestarem serviço em regime de tempo completo e independentemente da forma de provimento. Ora, impondo o diploma em análise (artigo 1.°, n.° 1), tal adaptação, ao excluir-se os trabalhadores rurais da eventual integração cria-se uma norma derrogatória, o que só poderia ser feito por quem detivesse competência legislativa (Assembleia da República).

Assim: ou se entende, como anteriormente, que quem não pertencia aos quadros não pode ser integrado, ou se perfilha a outra tese mais ampla, e, nesta hipótese, nada na lei autoriza a interpretações restritivas.

Nesta parte, pois, parece também estarmos perante mais um caso de inconstitucionalidade orgânica ou formal.

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c) N.º 7 do despacho normativo

O conteúdo deste ponto do despacho, designada-mente na sua segunda parte, parece não ter do ponto de vista legal qualquer razão justificativa.

O problema é em tudo similar às considerações formuladas na análise feita ao ponto 1 do despacho. Numa palavra: tal pessoal ou não é integrado nos novos quadros, porque de tal não cuidou o legislador, ou, sendo-o, o que se nos afigura não autorizado pela letra e espírito do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 76/77, não se vislumbra qualquer razão legal para se restringir o seu âmbito de modo a contar apenas o tempo de serviço prestado aos organismos e serviço a que se encontra vinculado à data de entrada em vigor do citado diploma, o que difere substancialmente do pessoal já integrado anteriormente nos quadros.

Parece, pois, que também nesta parte o despacho enferma dos vícios de inconstitucionalidade já apontados.

d) N.º 8 do despacho normativo

Também, em nosso entender, esta parte do despacho se encontra ferida do vício de inconstitucionalidade formal e orgânica.

Na verdade, é por de mais inquestionável que, na economia do diploma, os novos quadros de pessoal são resultantes, por um lado, das meras alterações dos lugares e categorias anteriores ao novo elenco criado pelo Decreto-Lei n.° 76/77 e, por outro lado, uma consequência necessária e directa da modificação de situações funcionais operadas por efeito da transição de alguns funcionários (veja artigos 6.°, 7.°, 8." e 9.°) para outras categorias profissionais.

Todavia, quer a adaptação genérica, quer a alteração das situações profissionais de determinados funcionários traduzem-se na alteração unitária do quadro do pessoal. Como corpo único que são, os novos quadros de pessoal verão os efeitos das alterações produzir-se nos termos da regra geral contida no n.° 2 do artigo 2.º Deve, aliás, notar-se que a ratio principal do diploma é a de reparar certas injustiças de que foram vítimas alguns trabalhadores. Grande parte desses trabalhadores inclui-se naqueles que agora foram beneficiados com aumentos de retribuição por efeito das chamadas transições de categorias profissionais. Ora, a reparação das injustiças é tanto maior quanto mais longe no tempo, isto é, mais longe na retroacção se produzirem os seus efeitos, e por aqui se vê a justificação de tais trabalhadores beneficiarem do regime regra contido na alínea a) do n.° 2 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 76/77.

O conteúdo do despacho, ao modificar a regra geral do artigo 2.°, n.° 2, cerceia direitos amplamente concedidos pelo diploma interpretado, pelo que, mais uma vez, inovou contra legem anterior. Tal regulamentação nova só pela Assembleia da República poderia ser criada, pelo que, assim, se evidencia de novo o vício de inconstitucionalidade de que continua a enfermar o despacho em análise.

6 — Por tudo o exposto, solicita-se a V. Ex.ª se digne indicar as razões justificativas dos pontos assinalados do despacho, dado que o respectivo preâmbulo é omisso quanto à fundamentação.

Reconhecendo V. Ex.ª que os vícios apontados aos pontos do despacho em causa não poderão ser resolvidos em sede de interpretação ou normas de integração do Decreto-Lei n.° 76/77, sugere-se que se procure a sua resolução através do adequado processo legislativo, dado que a declaração da inconstitucionalidade do mesmo despacho poderá gerar problemas de difícil solução.

Agradeço que, com a urgência que o caso impõe, me seja comunicada a tomada de posição de V. Ex.ª sobre as questões enunciadas.

11) Processo n.º 77-D1-14

Inconstitucionalidade da Lei da Greve.

Resposta enviada à CGTP-IN dando a razão pela qual o Provedor não exercerá a prerrogativa de solicitar a apreciação de inconstitucionalidade pedida por aquela central sindical:

Recebi o vosso ofício n.° 3011/EM, de 29 de Julho de 1977, que acompanhava dois documentos relativos à recém-aprovada Lei da Greve. O envio de tais documentos fazia-se «para os efeitos julgados convenientes,», admitindo que os efeitos julgados convenientes por esse secretariado fossem aqueles a que se refere o artigo 281.° da Constituição.

A nova Lei da Greve é um diploma da autoria da Assembleia da República, cuja elaboração foi precedia de debate público, no qual puderam participar livremente sindicatos e comissões de trabalhadores. As suas disposições que, de algum modo, restringem o direito à greve têm ampla justificação no desejo de evitar que a arma da greve, arma de todos os trabalhadores, possa ser monopolizada por alguns ou lesar gravemente os direitos da população em geral. Aliás, o próprio secretariado da CGTP-IN reconhece que a lei representa um substancial progresso relativamente ao Decreto-Lei n.° 392/74.

Os representantes dos Portugueses foram até onde pensaram dever ir. Não creio que o texto final dà lei contenha aspectos contrários à Constituição, motivo pelo qual não vou solicitar ao Conselho da Revolução a apreciação da sua constitucionalidade. Determinei, pois, o arquivamento da reclamação apresentada por esse secretariado.

12) Processo n.º 77-DI-16

Inconstitucionalidade da Lei n.° 79/77, de 27 de Outubro.

Resposta remetida ao reclamante, informando que não será feita a solicitação de apreciação de inconstitucionalidade:

Informo V. Ex.ª de que, tendo apreciado a exposição que me dirigiu, relativa à inconstitucionalidade da Lei n.° 79/77, de 27 de Outubro, concluí não dever usar a faculdade que me é conferida pelo artigo 281.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa.

A conclusão a que cheguei assentou no facto de entender que enquanto não forem instituídas as regiões administrativas não é obrigatório que a lei ordinária discipline a criação do órgão cole-

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gial executivo que, nos termos dos artigos 258.º e 260°, ambos da Constituição, passará a ser junta regional.

Concluí, assim, pela inexistência de qualquer vício de inconstitucionalidade, uma vez que para o período transitório apenas se torna obrigatória a existência de uma assembleia deliberativa (artigo 263.°, n.° 2, da Constituição), norma constitucional que a lei ordinária respeitou, em toda a linha, no artigo 82.°,- n.° 2, ao criar as assembleias distritais.

13) Processo n.º 77-DI-19

Inconstitucionalidade por omissão de normas reguladoras do contrato de serviço doméstico.

Resposta enviada à direcção do Sindicato do Serviço Doméstico:

Em aditamento ao ofício deste Serviço n.° 8483, de 19 de Outubro de 1977, informo-o de que me não é legalmente possível tomar qualquer providência no caso que me expôs: se a Constituição me confere a faculdade de pedir ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas, a verdade é que não me concede a possibilidade de intervir no problema da inconstitucionalidade por falta de normas (inconstitucionalidade por omissão).

Não posso, pois, recomendar ao Conselho da Revolução, órgão de Soberania, que recomende ao Governo ou à Assembleia da República a emissão de determinadas normas. Nada impede, aliás, que essa direcção sindical se dirija directamente ao Conselho da Revolução.

Quanto à legislação que apontam como inconstitucional, não posso estar de acordo convosco: a natureza específica do contrato de serviço doméstico impõe a sua regulamentação por normas especiais, não fazendo sentido aplicar-lhe as normas gerais reguladoras do contrato de trabalho.

Resolvi, em consequência, determinar o arquivamento da vossa reclamação.

VII

Apreciação sumária na especialidade ds processos concluídos em 1977

Ilustração da aplicação dos critérios de rejeição de queixas

Cingindo-se a competência do Provedor à fiscalização de actuação de entidades públicas, mereceram rejeição liminar quaisquer queixas dirigidas contra particulares, quer fossem pessoas singulares, quer colectivas.

Assim é que, designadamente, se não conheceu de uma queixa contra uma companhia de seguros não nacionalizada, por compreender capital estrangeiro (processo n.° 77/R-558), nem de outra relativa a despedimentos efectuados por uma empresa privada estrangeira, embora com participação minoritária do Estado Português no respectivo capital (processo n.° 77/R-72), nem tão-pouco, prosseguindo, aliás, orientação já estabelecida no ano anterior, de uma

referente a cláusulas da convenção colectiva de trabalho dos trabalhadores da Previdência, acordo era que uma das partes é constituída por entidade ou entidades particulares, os sindicatos; semelhante destino teve, por análogas razões, um conjunto de queixas de pescadores de Aveiro contra o Sindicato Livre dos Pescadores de Lisboa (processo n.° 77/R-1025).

Foi apreciável o número de queixas contra decisões judiciais ou relativas a matérias da exclusiva competência dos tribunais.

Foram elas liminarmente rejeitadas com critério sempre rigorosamente seguido, por força da natureza de órgãos de soberania que dos tribunais é própria.

De entre elas, e a título apenas exemplificativo, pode referir-se uma em que um recluso, condenado a prisão maior por roubo, alegava tê-lo cometido por haver sido drogado (processo n.° 77/R-531). Obtida do tribunal a informação de que o interessado já aludira a esse facto no âmbito do julgamento — todavia sem qualquer comprovação—, não pareceu haver suficiente base para que o Provedor suscitasse ao Ministério Público a possibilidade de promover a revisão de sentença.

De qualquer modo, ao comunicar-se àquele o não recebimento da queixa, por o Provedor não poder apreciar a sentença contra ele proferida, não deixou de se lhe elucidar que, se entendesse dispor de novos meios de prova não consideradas no processo, poderia pedir a revisão deste, por si ou mediante solicitação ao Ministério Público, sugerindo-se-lhe que se informasse através de competente juiz de execução das penas e da direcção do estabelecimento prisional quanto ao modo de a fazer.

Ainda de acordo com a mesma orientação se não recebeu uma queixa em que se alegava que certo cidadão haveria, mediante falsas declarações, podido ser eleito para um corpo administrativo, apesar de sofrer de incapacidade eleitoral em face do Decreto--Lei n.º 621-B/74, de 15 de Novembro (processo n.° 77/R-254). Ponderou-se, com efeito, que o contencioso eleitoral é da exclusiva competência do tribunal, ao qual se não havia atempadamente suscitado o caso concreto em referência. Não obstante, porque se indiciava a existência de crime de falsas declarações, foi a situação comunicada ao competente agente do Ministério Público.

A mesma ordem de considerações conduziu também à rejeição liminar de uma queixa contra o Conselho Superior da Magistratura por não haver responsabilizado a actuação — pelo autor considerada irregular— de determinado juiz, no âmbito de um processo cível (processo n.° 77/R-312). Para tanto, entendeu-se que, embora o Conselho Superior da Magistratura não seja, em rigor, um órgão de soberania, a sua exclusiva competência disciplinar em relação aos juízes é, enquanto elemento do princípio do autogoverno da magistratura, factor essencial da independência dos tribunais, característica indissociável, perante a Constituição, da natureza de órgãos de soberania que a estes últimos é próprio.

A manifesta falta de fundamento é outro dos motivos susceptíveis de conduzir à rejeição liminar de queixas.

Com base nela se não atendeu, por exemplo, â reclamação de uma mulher casada que protestava por a caixa de previdência de seu marido se recusar a pagar-lhe a ela, directamente, o abono de família

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relativo aos filhos, com a alegação de que aquele não lhe entregava os quantitativos necessários ao sustento destes. De facto, a caixa de previdência actuava legalmente, por a queixosa não estar divorciada nem sequer separada, judicialmente ou de facto, do seu cônjuge, com o qual continuava a viver em comunhão de mesa e habitação.

De qualquer modo, esclareceu-se & interessada de que poderia propor acção contra o marido, exigindo--lhe, com base no artigo 1416.° do Código Civil, a devida comparticipação nas despesas domésticas.

Um recluso da Colónia Penal de Santa Cruz do Bispo queixou-se de que, tendo sido condesado em duas diferentes comarcas, não havia sido efectuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas.

Averiguando o assunto junto do estabelecimento prisional, apurou-se que o cúmulo jurídico fora já operado e do facto deu-se conhecimento ao reclamante, aconselhando-o a de futuro procurar elucidar os seus problemas aates de os apresentar ao Provedor.

Um grupo de estudantes da Faculdade de Letras de Lisboa protestou contra os despachos do Ministério da Educação e Investigação Científica reguladores do numerus clausus e dos exames de aptidão è Universidade, por os considerarem contrários ao preceito constitucional que garante o direito ao ensino, e entendiam que, tendo-se inscrito no Serviço Cívico ao abrigo da legislação que então o disciplinava, dai lhes teria decorrido um direito ou, pelo menos, expectativa legítima de acesso à Universidade.

Estudado o assunto, elucidaram-se os reclamantes de que a inscrição no Serviço Cívico em 1976-1977 não conferiu direito ao ingresso no ensino superior no ano escolar de 1977-1978 e de que não ofendem quaisquer normas constitucionais diplomas reguladores do numerus clausus e dos exames de aptidão à Universidade.

Um habitante do concelho de Felgueiras queixou-se por forma vaga da especulação na venda dos sacos de cimento, tendo-lhe sido respondido que devia colocar com precisão o problema à Direcção-Geral de Fiscalização Económica, já que o Provedor só poderia intervir se aquele departamento deixasse de actuar ou agisse irregularmente.

Um recluso da Cadeia de Monsanto reclamou pelo facto de não lhe ser concedida liberdade provisória e pela situação de grave carência económica em que se achavam os seus familiares.

Comunicou-se ao exponente que não era possível interferência na sua situação prisional, pois esta se achava definida por decisão judicial não controlável pelo Provedor de Justiça.

E alertou-se a direcção do estabelecimento prisional no sentido de eventual protecção ou auxílio à família do recluso em causa.

Por outro lado, com base neste e em outros casos, abriu-se um processo de iniciativa do Provedor — que ainda está pendente — para estudo do problema geral da assistência e segurança sociais dos reclusos e suas famílias.

Um recluso da Colónia Penitenciária de Alcoentre reclamou por não benificiar da liberdade condicional e por ter problemas com a celebração do seu casamento.

Obtidos esclarecimentos acerca do caso, verificou-se que o casamento tinha sido autorizado, no processo legalmente previsto e devidamente organizado, bem

como havia sido judicialmente indeferida a liberdade condicional almejada.

O reclamante foi elucidado de que ao Provedor não cabia discutir esta decisão (devendo aquele aguardai? nova e eventual proposta com o mesmo objectivo) e que a sua situação era inteiramente regular.

Mas em processo da iniciativa do Provedor passou a recomendar-se, em geral, a questão do actual condicionalismo legal do casamento dos reclusos.

Assim, e como já se expressou ao relatório do ano anterior, continuou a referir-se o critério de se equacionarem em processos da iniciativa do Provedor os problemas gerais que se extraem de diversas reclamações individuais e que indicara deficiências das normas legais vigentes ou omissão de legislação pertinente e adequada.

Relativamente a determinados casos em que se colocou em causa a actuação política dos órgãos de soberania e nessa qualidade actuando, continuou & manter-se, aliás em obediência ao legalmente prescrito, critério anteriormente utilizado e do qual se deu conta, designadamente através de alguns exemplos que mais expressivamente o ilustravam, no relatório respeitante ao ano de 1976.

Entretanto, alguns mais se apontam, agora referentemente ao ano de 1977.

Assim, e em aplicação prática de tal regra, foi rejeitada uma reclamação-exposição subscrita por um grupo de promitentes-compradores da Urbaco, na qual se solicitava não só a manutenção do regime provisório da intervenção naquela empresa até à conclusão dos estudos de viabilização económica da mesma e à definição das garantias dos interesses dos promitentes-compradores e gerais, como também que a desintervenção fosse estudada pelo Governo com a participação das partes interessadas, nomeadamente através de representantes seus eleitos; de facto, entendeu-se que se tratava de matéria especificamente afecta à política económica do Governo, logo o consequentemente fora do campo Segal de intervenção do Serviço do Provedor de Justiça (processo n.° 77/R-630-A-3).

Pelo mesmo motivo se não admitiu urna queixa apresentada pelo designado Núcleo da Régua dos Pequenos e Médios Accionistas e em que se suscitava a necessidade de o Governo definir uma política susceptível de dar solução ao problema das indemnizações a conceder aos titulares de capital nacionalizado; com efeito, concluiu-se que se estava em presença de assunto situado na esfera político-legislativa da competência da Assembleia da República [alínea a) do artigo 167.° da Constituição], sendo certo que, relativamente a este Órgão de Soberania não cabe ao Provedor de Justiça qualquer tipo de intervenção (processo n.° 77/R-1197-A-3).

Estas regras influenciaram também as decisões de rejeição das respectivas reclamações nos seguintes casos concretos:

Um grupo de representantes dos médicos candidatos ao internato de especialidade veio colocar uras questão —a da criação de uma especialidade destinada aos Hospitais Civis e centros de saúde—, que se entendeu ser das atribuições do Ministério dos Assuntes Sociais, através do seu órgão próprio para o efeito (a Direcção-Geral dos Hospitais). Na veerdade, e de harmonia com o artigo 64." da Constituição, não poderia, nem deveria, o Estado, e, logicamente

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por ele, o Governo, demitir-se do seu direito de legislar em matéria tão importante e de âmbito nacional como é a de organização e estruturação de um serviço nacional de saúde, com a inerente regulamentação das carreiras médicas (processo n.° 77/R-1555-A-3);

Um grupo de reclamantes veio abordar a questão da integração dos tribunais marítimos no sistema judiciário comum, o que, aliás, se encontra consagrado no texto constitucional, não estando, porém, definida a entidade competente para a elaboração do diploma regulador das respectivas competências; estando efectivamente em causa o exercício da função política de legislar que não pertence à Administração e por não se tratar de matéria regulamentar, não poderia o Provedor de Justiça ter qualquer interferência imediata no caso (processo n.° 77/R-626-B-.1);

Pelo promotor de justiça de um tribunal militar territorial foi enviado um requerimento do defensor oficioso de um réu condenado por acórdão daquele tribunal e através do qual se pretendia obter a comutação de uma pena, acto, porém, que é da exclusiva competência do Presidente da República, que, como órgão de Soberania, não está sujeito ao contrôle do Provedor de Justiça; a questão, acompanhada de todos os elementos fornecidos e a ela respeitantes, foi remetida à consideração de S. Ex.ª o Presidente da República (processo n.° 77/R-1867-B-1).

Por bastante próximos das razões determinativas dá rejeição dos casos antecedentemente referidos, merecem ainda anotação:

Uma queixa apresentada pela Associação Comercial de Espinho relativamente ao Decreto-Lei n.° 75-G/ 77, de 28 de Fevereiro (no qual se estabeleceu a equiparação a grossistas «das pessoas que habitualmente exerçam a actividade de florista»), por entender que aquele regime, a manter-se, determinaria o desaparecimento de uma nobre e tradicional actividade nacional (a dos floristas), foi rejeitada, por se haver concluído que a revisão da matéria tratada naquele diploma legal não caberia na esfera legal de intervenção do Provedor de Justiça; deste modo, foi sugerido que a Associação reclamante se dirigisse ao Ministério das Finanças (donde emanara o dito diploma) e, se assim o entendesse, à Assembleia da República (processo n.° 77/R-579-A-3);

Uma reclamação aparentemente baseada em declarações recentes (em função da data em que foi apresentada) de S. Ex.ª o Presidente da República, nas quais se focava a possibilidade de criação de um fundo de apoio à terceira idade, e com reporte à pretensão concreta de que o pagamento da remuneração por serviço prestado por trabalhador da função pública fosse feito a outro que não ao próprio que o efectivou justificou que, não se havendo contudo tomado no Serviço do Provedor de Justiça qualquer providência pontual ou genérica, se tivesse endereçado ao reclamante a sugestão de um contacto directo com os serviços da Presidência da República, aos quais manifestaria a sua intenção e dos quais indagaria da sua viabilidade, se se viesse a constituir o mencionado fundo (processo n.° 77/R-833-GP).

Também sempre que se suscitaram ao Provedor de Justiça assuntos que pela sua natureza predominantemente técnica escapariam ao escopo e às possibilidades de uma intervenção adequada do seu Serviço

se optou pela rejeição das queixas onde aquele condicionalismo se reflectia.

Assim, e como caso paradigmático, pode apontar-se uma exposição apresentada e na qual se recordava ter sido já chamada a atenção dos Ministros da Educação e Investigação Científica e dos Assuntos Sociais e, igualmente, do provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa para o que de grave resultaria da extinção de escolas próprias de cegos. O processo foi encerrado na base do critério antes indicado (processo n.° 77/R-588-B-4).

Julga-se ainda de curiosidade a referência a uma reclamação que foi rejeitada por se entender que o assunto exposto poderia ter resolução através da entidade directamente competente para isso — a Câmara Municipal de Lisboa.

Com efeito, o respectivo reclamante apontava o facto de a Bandeira Nacional não estar vindo a ser hasteada, pelo menos aos domingos e dias feriados, no Castelo de S. Jorge.

Não obstante a rejeição, o Serviço do Provedor de Justiça transmitiu o reparo do reclamante à aludida Câmara para os efeitos que esta tivesse por convenientes e veio a ser posteriormente informado peio respectivo presidente que se havia oficiado à Junta de Freguesia do Castelo solicitando a sua colaboração no sentido de que a Bandeira Nacional não deixasse de ser hasteada aos domingos e feriados (processo n.° 77/R-71-B-1).

Aquela reclamação e esta solução traduziram, no seu conjunto, algo de muito positivo: a consciência por pacte de um cidadão da existência de uma entidade susceptível de poder dar guarida às suas preocupações e a vontade de colaborar na satisfação daquilo que assume interesse e relevância social por parte da entidade competente, sem que, para esse fim, houvesse sido feita qualquer recomendação.

Na sua simplicidade, este caso representará saborosamente para este Serviço o sinal do respeito que já merece e da aceitação que já tem.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA

Processo n.° 76/R-802

Um advogado escreveu ao Provedor chamando a atenção para o facto de a assistência judiciaria, regulamentada pelo Decreto n.° 562/70, de 18 de Novembro, em execução da Lei n.° 7/70, de 9 de Junho, não ser extensível aos tribunais do trabalho.

Estudado o assunto, concluiu-se que se tratava de facto de situação indesejável — e não conciliável com o artigo 20.° da Constituição da República, que estabelece que a todos é assegurado o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de recursos económicos.

Isto, aliás, agravado pela circunstância de, rto processo laboral, uma das partes —o trabalhador— se encontrar em regra em posição que exige do legislador especial protecção.

Suscitado o caso aos Ministérios da Justiça e do Trabalho, estes promoveram a preparação de diploma legai que instituísse a assistência judiciária também perante cs tribunais do trabalho, projecto esse que veio a transformar-se no Decreto-Lei n.° 44/77, de 2 de Fevereiro.

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CUMPRIMENTO DE PENA — DECISÃO CRIMINAL NÃO TRANSITADA DE TRIBUNAL DE EX-COLÔNIA

Processo n.° 76/R-307-B-1

A mulher de um cidadão detido em estabelecimento prisional de Portugal continental veio reclamar contra a situação do marido, que tinha sido condenado em duas instâncias numa sanção penal antes da independência da ex-colónia de Angola e que, tendo interposto recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, soubera não ter sido dado seguimento ao mesmo por o Tribunal da Relação da República Popular de Angola haver considerado transitado o acórdão impugnado.

Dada a peculiaridade e gravidade do assunto, averiguou-se se este estava a ser tratado e solucionado no tribunal competente.

Apurou-se que o problema estava a ser encarado de forma correcta e sugeriu-se a sua resolução em ordem a promover-se e remoção de eventuais óbices administrativos a uma decisão final.

O processo deste Serviço foi arquivado depois de o marido da reclamante haver sido restituído à liberdade por acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra e de se constatar que o assunto em causa, que fora também objecto de exaustivo parecer da Procurado-ria-Geral da República, continuava a ser apreciado, nomeadamente em juízo, não cabendo ao Provedor interferir nesse âmbito.

PROCESSO CRIMINAL —PAGAMENTO 3>E PERITAGEM

Processo n.º 77/765-B-l

Um guarda-livros do concelho de Vila Nova de Ourém reclamou pelo facto de não lhe serem pagas as despesas efectuadas e os dias de trabalho gastos na peritagem (exame a escrita comercial) realizada anos antes em processo criminal preparatório que correra termos no Tribunal Judicial da sua comarca.

Colheram-se informações e, no decurso e na sequência das diligências do Provedor, o problema foi colocado pelo competente delegado do procurador da República ao Serviço dos Cofres do Ministério da Justiça.

Este efectuou o pagamento da quantia devida ao perito reclamante, pelo que o caso foi encerrado.

ADMINISTRAÇÃO DE JUSTIÇA Processo n.° 77/R-838-R-S

Reclusos — Julgamento em comarca diferente daquela em que estão detidos

Em 6 de Maio de 1977, um recluso da Colónia Penai de Pinheiro da Cruz, em Grândola, alegando que só lhe serie autorizado assistir ao seu próprio julgamento, a realizar no Tribunal de Oeiras, se procedesse ao pagamento das despesas de transporte necessárias para o efeito, solicitou ao Provedor de Justiça que fosse providenciado para que a sua presença se pudesse verificar, independentemente daquela condição.

Após diligências realizadas pelo Serviço do Provedor de Justiça, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais permitiu a transferência do referido recluso

para estabelecimento prisional de Lisboa, a fim de poder estar presente em julgamento, conforme pretendia.

A solução dada ao caso foi comunicada a este Serviço pela Colónia Penal de Pinheiro da Cruz (ofício n.° 4643, de 20 de Junho de 1977), e pelo Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras (ofício n.° 757, de 20 de Junho de 1977).

E o problema concreto suscitou a abertura de processo da iniciativa do Provedor, em ordem a estudar-se a adequação e constitucionalidade da norme do artigo 418.° do Código de Processo Penal.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — EXAMES MÉDICO-FORENSES

Processo n.º 76/R-199

Uma cidadã comunicou ao Provedor que em processo crime pendente na comarca de Castro Daire fora há mais de ano e meio aberto incidente de alienação mental do réu, ainda não concluído.

Pedida informação ao Tribunal de Castro Daire, o juiz confirmou que, ordenada em Outubro de 1974 a realização de exame mental ao réu —preso preventivamente sem admissão de caução—, só após doze insistências fora enfim cumprida a deprecada a propósito feita, tendo o exame tido lugar em 7 de Maio de 1976 no Hospital de Miguel Bombarda.

Perante tão indesejável situação, perguntou-se ao Hospital de Miguei Bombarda qual a razão da demora havida. O hospital transcreveu, em resposta, uma informação do perito médico que realizara o exame, o qual chamava a tenção para o facto de qualquer exame mental exigir a realização de exames complementares que costumam demorar um ano a concluir, bem como para o de o relatório fina! ser feito fora das horas de serviço no hospital, aludindo ainda às «condições legais» em que tais exames estariam sendo levados a cabo.

Pediu-se, em face desta resposta, esclarecimento ao Hospital sobre se entendia haver condicionalismos legais que dificultassem a oportuna realização de exames mentais.

Após três insistências —que incluíram o pedido de intervenção directa do Ministério—, recebeu-se resposta do estabelecimento hospitalar.

Este referiu entender que a situação só se solucionaria mediante a criação de um serviço de psiquiatria forense junto do Ministério da Justiça exclusivamente incumbido da realização dos exames em causa.

Na realidade, os dez especialistas de que o Hospital dispõe para o efeito estariam quase completamente absorvidos pelos serviços de urgência, de consulta externa, de orientação de internos e da docência de psiquiatria no âmbito da Faculdade de Medicina.

A ausência de remuneração pelos exames forenses, a complexidade destes e a necessidade de normalmente elaborar os respectivos relatórios após o serviço teriam levado vários peritos a demorar a sua realização e até, por vezes, a recusar-se à mesma.

Dada a gravidade da situação assim detectada, decidiu-se tornar este caso em conta em processo de iniciativa do Provedor, destinado e promover a resolução das deficiências observadas em exames médico-forenses.

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ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA - ACÇÃO DE ALIMENTOS — DESCONTOS

Processo n.° 77/R-998-B-1

Decisão proferida por um tribunal de Angola

Foi recebida neste Serviço em 15 de Junho de 1977 uma reclamação em que a interessada, solicitando a intervenção do Provedor de Justiça em ordem a poder receber os alimentos que o seu ex-marido foi condenado a pagar-lhe, dá conhecimento dos seguintes factos:

Instaurou, há cerca de dez anos, no Tribunal Judicial da Comarca da Huíla, Angola, uma acção de alimentos contra o então marido, que também ali residia.

Por força de decisão que veio a ter lugar nesse processo, foi aquele condenado a contribuir mensalmente com determinada importância a favor de sua mulher.

Nessa sequência, têm vindo a ser processados no vencimento do devedor os respectivos descontos à ordem do Tribunal da Comarca da Huíla, não obstante, no momento presente, tanto o réu como a sua ex-mulher viverem em Portugal, encontrando-se aquele na situação de adido.

Sucede que, embora os referidos descontos venham a ser efectivados, a reclamante nada tem recebido.

Face a esta reclamação, o Serviço do Provedor de Justiça procedeu a diligências junto da Secretaria de Estado da Integração Administrativa no sentido de conseguir uma solução para o problema.

Daí derivou terem os serviços daquela Secretaria de Estado entendido substituir os referidos descontos qué vinham a ser efectuados no vencimento do devedor por deduções nesse mesmo vencimento, em termos de a interessada passar a receber na repartição de finanças da localidade em que actualmente reside os alimentos a que tem direito.

Esta orientação foi comunicada ao Serviço do Provedor de Justiça através do ofício n.° 71 738, de M de Novembro de 1977, do Serviço Central de Pessoal.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — LIBERDADE CONDICIONAL

Processo n.º 77/R-702-B-1

Verificou-se a repetição de reclamações de reclusos quanto a demoras consideráveis na apreciação de processos de liberdade condicional concernentes ao Tribunal de Execução das Penas de Évora.

Após várias diligências, concluiu-se que tais demoras eram motivadas por deficiências naturais correspondentes ao início do funcionamento daquele Tribunal e também pelas dificuldades advindas para os estabelecimentos prisionais da adaptação ao novo regime legal.

Apesar disso, foi recomendado à Direcção-Geral a conveniência de chamar a atenção dos estabelecimentos prisionais para a necessidade do tempestivo envio aos tribunais de execução das penas dos elementos necessários para a apreciação da concessão de liberdade condicional.

Há longos meses que se não recebem reclamações sobre este assunto.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — LIBERDADE CONDICIONAL

Processo n.º 77/R-798-B-1

Um estrangeiro reclama para o Provedor de Justiça do facto de lhe ser negada a liberdade condicional em razão da nacionalidade.

Verificou-se que a reclamação não era fundamentada e elucidou-se o reclamante de que a liberdade condicional lhe não fora negada pelo facto de ser estrangeiro, mas apenas porque o juiz do tribunal de execução das penas, em cuja decisão não podia o Provedor intervir, considerava inviável e injustificada uma libertação antecipada.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PRISÃO PREVENTIVA—EXCESSO

Processo n.° 77/R-695-B-1

Através de vários processos apreciados neste Serviço, verificou-se que era frequente a demora para além do razoável na remessa aos estabelecimentos prisionais pelos agentes do Ministério Público dos processos individuais dos reclusos.

Foi levado c facto ao conhecimento do procurador--geral da República com o pedido de que, dentro do espírito de colaboração que deve existir entre a Procuradoria-Geral da República e o Serviço do Provedor de Justiça, fosse determinada aos referidos agentes a urgente satisfação dos pedidos de documentos feitos pelos serviços prisionais.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — ENTREGA DE MENOR

Processo n.º 77/R-390-1

Foi pedida a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de ser concretizada a entrega de uma menor a sua mãe já decretada há muito tempo e ainda não concretizada.

Após várias diligências, verificou-se existir da parte da família do pai da criança uma actuação sistemática no sentido de ocultar ou mudar a criança de residência sempre que um agente da autoridade se apresentava para concretizar a entrega.

Houve então que estabelecer contactos pessoais entre várias entidades, designadamente entre o tribunal de Estremoz deprecante e o de Lisboa deprecado para a entrega, finalmente executada em 20 de Julho de 1977, dos anos depois de proferida a sentença que a ordenou.

ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PRISÃO PREVENTIVA (DURAÇÃO DEMASIADO LONGA)

Processo n.º 76/R-1573-B-1

De diversos casos submetidos à consideração deste Serviço concluiu-se que nem sempre está a ser observado o cumprimento do disposto no artigo 337.°, § 2.°, do Código de Processo Penal (onde se prevê que o Ministério Público informe o procurador-geral da República com vista a serem tomadas as providências necessárias a evitar que a duração da prisão preventiva exceda em demasia os prazos legalmente fixados), facto de profunda gravidade, uma vez que

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dele resulta o prolongamento de estádios de detenção sem culpa formada.

Nessa sequência, oficiou-se à Procuradoria-Geral da República, sublinhando o interesse de uma chamada de atenção dos magistrados do Ministério Público para a necessidade de rigorosa observância daquele preceito legal.

REGIME PRISIONAL — VISITA A CABEIA PENITENCIARIA DE COIMBRA

Tendo-se recebido diversas queixas de reclusos da Cadeia Penitenciária de Coimbra, considerou o Provedor de Justiça oportuno que se realizasse uma visita à mesma, a qual veio a ter lugar nos dias 13 e 14 de Abril, nela tendo participado quatro elementos do Serviço. A visita abrangeu também o Estabelecimento Prisional Regional de Coimbra, anexo à Cadeia.

Sintetizam-se, de seguida, os aspectos que, apreciados nessa visita, parecem merecer maior atenção:

A) Pessoal 1 — Reclusos

1.1 — Composição

O total de reclusos era à data da visita de 319.

Verificou-se que entre eles se contava certo número — para cima de uma dezena— de menores.

Também se observou a existência de um ou outro elemento de imputabilidade diminuída. Designadamente, detectaram-se sintomas desse género num dos reclusos que foram directamente contactados, por haverem apresentado queixa ao Provedor.

Ê claramente indesejável a reclusão —já encontrada também na Colónia Penal de Pinheiro da Cruz— de menores e de indivíduos sem plena imputabilidade em conjunto com presos maiores e imputáveis, designadamente peia influência perniciosa que estes podem exercer sobre os primeiros e pela falta de acompanhamento adequado aos segundos (1).

1.2 — Situação prisional

Na Cadeia Penitenciária de Coimbra encontravam-se internados quer indivíduos já condenados definitivamente, quer outros ainda em situação de prisão preventiva.

Quanto a estes últimos, tratava-se, sobretudo, de elementos condenados em penas de longa duração mas cuja sentença ainda não transitara em julgado, por dela pender recurso, bem como de pessoas já condenadas num processo e com outro ou outros processos ainda pendentes.

O internamento em cadeia penitenciária de indivíduos daquele primeiro grupo é pelo menos discutível, à face da lei vigente, cabendo ponderadamente estudar-se e tomar posição sobre a questão.

2— Pessoal ao serviço da Cadeia 2.1 — Guardas

O corpo de guardas era de cinquenta elementos, no total.

(1) Entretanto, obteve-se informação da Cadeia de que o referido recluso mentalmente afectado já fora transferido para estabelecimento adequado.

Todavia, só cerca de metade estava, em cada dia, em efectivo exercício de funções — isto em resultado das normais ausências por férias e doença, berra como, ainda, de recentes pedidos de passagem à aposentação de uns tantos.

A proporção entre o número de guardas em cada momento disponível e o de reclusos apresentava-se, pois, inferior à desejável — embora se previsse possível melhoria com o projectado aumento de guardas dos serviços prisionais.

2.2 — Outros elementos

A Cadeia dispunha de um assistente social (licenciado em Direito) e de um orientador (licenciado em Engenharia).

Não tinha, à data, professor de Educação Física.

Tinha assistência médica regular, no tocante à clínica geral. Mas observaram-se deficiências no concernente ao apoio ao anexo psiquiátrico, por a presença do respectivo médico, também exercendo funções, por inerência, no Instituto Criminal, não ser tão regular quanto desejável.

A falta de quem oriente e fomente a educação física dos reclusos parece especialmente gravosa, pela benéfica influência que aquela pode ter na ocupação do respectivo tempo e até no seu equilíbrio psico-somático.

O pessoal de apoio existente é escasso, revelando-se na sua composição, tal como noutros estabelecimentos prisionais, a ausência de elementos com habilitação escolar específica para as funções de assistente social e orientador.

Isto pode comprometer, em larga medida, a eficiência e o dinamismo da acção de recuperação social que aos estabelecimentos prisionais incumbe.

B) Instalações

Afiguraram-se aceitáveis as condições das celas (em que é permitido um certo arranjo pessoal), da capela, do refeitório, das instalações médicas e escolares.

O mesmo se poderá dizer das salas de convívio, dotadas de equipamento de televisão, pingue-pongue e outros jogos de mesa.

Os campos de jogos, de voleibol e de futebol de cinco, revelavam certo abandono, porventura resultante da falta de instrutor adequado.

A biblioteca tem um número apreciável de livros, mas uma relevante parte deles é já antiquada ou de reduzido e discutível interesse para os reclusos.

Nota-se a inexistência de apoio que poderia ser solicitado à Secretaria de Estado da Cultura e t Fundação Gulbenkian para elevação do nível escolar e cultural geral dos reclusos. Já chegou a existir, mesmo, a nível oficial, um sistema de bibliotecas móveis das prisões, hoje infelizmente abandonado.

De entre as instalações oficinas as que parecera proporcionar melhor aproveitamento são as relativas à encadernação e à reparação de automóveis.

As demais — alfaiataria, sapataria, cestaria, carpintaria, marcenaria, latoaria, etc. —, além de corresponderem a actividades menos procuradas (algumas por certo anacronismo em relação às actuais condições de produção), dispõem de equipamento insuficiente e desactualizado.

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C) Ocupação do tempo 1 — Trabalho

1.1 — Número de ocupados

Apenas se encontravam ocupados a trabalhar (nas oficinas e na exploração agrícola) cerca de metade dos reclusos da Cadeia.

Como causas desta situação aponta a direcção da Cadeia: o facto de aos presos preventivamente não caber trabalhar, nos termos do regime vigente; o desinteresse de muitos reclusos por profissões tradicionais, às quais se destina a maioria das instalações oficinais da Cadeia; a progressiva escassez de encomendas.

O trabalho acaba, assim, com frequência, por surgir mais como forma de ocupação do tempo do que meio de produção útil e factor de readaptação à vida em liberdade.

O elevado número de inactivos, a desactualização das instalações e equipamentos e a falta de uma abordagem dinâmica da questão parecem apontar no sentido da necessidade de se repensar e reestruturar planificada e adequadamente todo o sistema de trabalho prisional.

1.2— Remunerações

As remunerações aplicadas são as definidas pelas normas regulamentares vigentes.

Todavia, nota-se que o respectivo cômputo não é feito rigorosamente em termos de salário, nele se entrando ainda em conta com os factores de duração da obra e rendimento apresentado. Embora se compreenda o intuito de consideração destes elementos, é discutível a vantagem deste critério, por não correspondente com o da vida activa normal e susceptível de implicar a relevância de circunstâncias ou apreciações de índole parcialmente subjectiva.

1.3 — Destino das obras

Parte considerável das queixas recebidas referia-se a alegado indevido aproveitamento dos objectos produzidos pelos reclusos por parte dos funcionários da Cadeia, que estariam beneficiados, no que concerne à respectiva aquisição, em confronto com aqueles.

Analisado o valor global das receitas cobradas nas oficinas e estação agro-pecuária, verifica-se que este tem vindo a decrescer sensivelmente — de 3 863 393$. em 1973, para 1 594 280$40, em 1976 (uma redução, pois, de mais de 50% em três anos).

Ao invés, tem aumentado a proporção e o valor total das aquisições feitas por funcionários da Cadeia—de 147 248$60 para 343 575$, relativamente àqueües mesmos quatro anos.

O preço de venda dos bens produzidos na Cadeia é normalmente constituído pela soma do custo do material, da mão-de-obra e de uma percentagem de lucro de 30%.

Esta percentagem é especialmente reduzida para 15 % no tocante aos bens adquiridos pelos funcionários com destino ao seu agregado familiar.

A direcção da Cadeia refere que o regime aplicável aos reclusos é análogo, encontrando-se a esse propósito estabelecido que só podem, por força de ordem de serviço emanada em 1972, beneficiar de condições especiais as aquisições de «vestuário, calçado, ferra-

mentas ou outras destinadas a uso próprio e, porventura, as que puderem considerar-se relacionadas com a preparação de uma próxima libertação».

Embora se reconheça estar-se perante sistema já praticado desde longa data neste e noutros estabelecimentos prisionais, é de ponderar se ele não merece ser reapreciado no que concerne à aquisição de bens por parte dos próprios funcionários. Pode duvidar-se, com efeito, da justificação do regime especial de que beneficiem. E não deixa de impressionar a circunstância de no ano de 1976, a que respeitam os mais recentes dados obtidos, mais de 20 % das vendas efectuadas o terem sido a elementos em serviço na Cadeia.

2 — Ensino

Embora sem grande frequência, pareceu aceitável a forma por que se estava processando a ministração do ensino aos reclusos que o pretendem receber.

Uma acção deliberada e decidida no sentido de incrementar o interesse pelo estudo dos que voluntariamente o não procuram poderia, porventura, aumentar relevantemente o número de alunos dos cursos em funcionamento.

Verificam-se dificuldades de tipo organizativo que seria desejável ultrapassar, no sentido de proporcionar o estudo aqueles que também trabalham.

3 — Actividades culturais, desportivas e recreativas

Encontrava-se, por decisão da direcção tomada em consequência de incidente ocorrido tempos antes da visita e ainda não esclarecido (explosão de uma bomba no recreio), suspensa a actividade e a designação dos corpos gerentes da associação de reclusos, em cujo âmbito se realizam actividades de tipo cultural, desportivo e recreativo.

Posteriormente à visita, a direcção da Cadeia informou ter-se normalizado o funcionamento da associação, nomeadamente através da eleição dos seus dirigentes.

Nota-se a falta de elementos (pessoal da Cadeia) que, devidamente habilitados, possam promover com regularidade a realização de actividades culturais e desportivas, as quais parecem por isso padecer de falta de iniciativa e de organização.

A assistência à televisão é restrita aos reclusos que trabalham, medida que, embora possa assentar em determinadas razões de organização interna do estabelecimento, se afigura insuficientemente justificada.

D) Regime e tratamento

f — Alimentação

Nos dias da visita a alimentação afigurou-se minimamente aceitável.

2 — Recreios

Os reclusos tinham, em geral, três horas diárias de recreio.

Observa-se, porém, que aqueles que trabalham, assim como os faxinas, só ao fim de semana beneficiam de recreio.

Embora se admita que para haver dificuldades de organização a superar esta situação não pareceu ser a melhor, não só pela maior necessidade de repouso

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decorrente do exercício do trabalho, como, em contraposição, pelo incentivo à inactividade que pode constituir.

3 — Visitas

Os reclusos podem receber visitas de uma hora em três dias úteis da semana e de três horas aos domingos.

Nota-se uma certa atitude restritiva no tocante ao âmbito das pessoas autorizadas a visitar os reclusos. Este procedimento decorre, contudo, da aplicação das normas da Reforma Prisional vigente, cujo teor interessará reapreciar.

Um dos reclusos contactados queixou-se de, nos termos do regime especial de isolamento em que se encontrava, lhe ter sido autorizada a visita de familiares apenas ao sábado durante uma hora, o que seria inviável, por aqueles trabalharem em tal dia da semana.

Obteve-se posteriormente comunicação da direcção da Cadeia segundo a qual a autorização de tal visita fora entretanto transferida para os domingos, como o interessado requerera.

4 — Informação jurídica e disciplina

Observou-se, tal como se tem deparado em relação a outros estabelecimentos prisionais, uma insuficiente informação dos reclusos quanto à sua situação prisional e disciplinar.

Isso derivará, em parte, segundo a direcção da Cadeia, da circunstância de os mandatos judiciais que promovem o internamento dos reclusos não serem explícitos quanto à situação destes, bem como de a comunicação das decisões judiciais sobre os processos em que estão envolvidos ser com frequência demasiado tardia, o que designadamente obsta à apreciação da possibilidade de concessão de liberdade condicional.

Por outro lado, nota-se que a notificação aos presos das decisões judiciais que lhes respeitam, embora feita nos termos legais, nem sempre é em condições de eles se aperceberem perfeitamente do significado daquelas e dos recursos ou outros meios de que dispõem para contra as mesmas reagirem.

Enfim — e parte das queixas recebidas reportavam--se a esta matéria—, ao invés do que sucede no tocante às infracções disciplinares, as medidas de alteração do regime prisional (nomeadamente a de aplicação do regime de isolamento) aplicadas em função do comportamento dos reclusos não se encontram devidamente tipificadas na Reforma Prisional, sobretudo no tocante à sua duração, nem se mostra que sejam comunicadas aos reclusos por forma suficientemente elucidativa. Como algumas dessas providências apresentam, de facto, grande analogia com as punições disciplinares propriamente ditas, gera-se nos reclusos uma certa e indesejável incompreensão quanto à situação em que se encontram, bem como uma sensação de insegurança quanto à sua situação futura.

E) Estabelecimento Prisional Regional

Da mais breve visita ao Estabelecimento Prisional Regional de Coimbra resultou a impressão de os reclusos nele internados estarem submetidos a regime e tratamento aceitáveis, em geral.

Notou-se, contudo, uma excessiva acumulação de reclusos em cada cela colectiva. As instalações disponíveis são antiquadas e dotadas de condições de habitabilidade que apenas satisfazem ao mínimo exigível.

Uma situação que importa superar é a das reclusas. De facto, não existindo guardas do sexo feminino, segundo a direcção da Cadeia, ainda certas condições de adequado enquadramento, as internadas no Estabelecimento Regional vêem-se impossibilitadas de sair da zona edificada que lhes é destinada, não podendo gozar de recreios ao ar livre.

OCUPAÇÕES

Processo n.° 77/R-900-B-4

O presente processo nasceu da reclamação apresentada pela Associação de Moradores do Campo de 24 de Agosto e Eirinhas, na qualidade da administradora da creche infantil denominada Comuna Infantil Soldado Luís, situada na cidade do Porto, e onde estavam internadas setenta e cinco crianças.

A reclamação pretendia impugnar o despacho do Ministro da Administração Interna, de 5 de Maio de 1977, que havia indeferido o requerimento apresentado pela reclamante no sentido de aquela entidade ministerial legalizar a ocupação abusiva do prédio sito na Rua do Morgado de Mateus, 137, no Porto, legalização essa possível nos termos do artigo 3.», n.° 2, do Decreto-Lei n.° 198-A/75, de 14 de Abril, com base no reconhecimento do fim social e humanitário da ocupação levada a cabo em 16 de Março de 1975.

Ouvido o Ministro da Administração Interna sobre os fundamentos do indeferimento, pronunciou-se tal entidade no sentido de que o requerimento de legalização havia sido extemporâneo por já ter decorrido o prazo de vinte dias previsto no artigo 5.°, alínea c), do diploma, e daí o seu indeferimento.

Atendendo a que as razões formais invocadas não eram bastantes para arredar a razão substancial do reclamante, chegou-se a fazer o estudo tendente à recomendação no sentido da revogação do despacho e consequente legalização da ocupação, mas entretanto foi publicado o Decreto-Lei n.º 294/77, de 20 de Julho, que retirou às entidades administrativas competência para legalização das ocupações, razão por que não se prosseguiu com o processo e se aconselhou o reclamante a dirigir-se aos tribunais para eventual celebração do contrato de arrendamento com o proprietário do prédio, nos termos do artigo 1.% n.° 2, do último diploma citado.

ADMINISTRAÇÃO LOCAL Processo n.º 77/R-1459-B-4

O presente processo nasce de uma reclamação apresentada por uma agremiação recreativa do Barreiro que pretende impugnar uma deliberação da Câmara Municipal daquela vila que lhe indeferiu um requerimento de restituição do valor das taxas de mais--valia devidas pelo facto de anteriormente ter requerido licença para demolição e construção nova no lugar da edificação anterior s de posteriormente íer desistido de tais propósitos.

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Porque se estava longe dos principios que regulara os negócios jurídicos habituais, porque a matéria respeitante a receitas e despesas públicas está subordinada ao princípio da legalidade, porque, no caso presente, estavam preenchidos os requisitos que faziam nascer o facto tributário (artigo 1.°, n.° 3, do Decreto--Lei n.° 46 950, de 9 de Abril de 1966) e, finalmente, porque era inequívoca a não existencia de erro de facto imputável aos serviços, conclui-se pela sem--razão do reclamante, sem que, consequentemente, se fizesse qualquer reparo à Câmara Municipal do Barreiro.

Processo n.º 77/R-853-B-4

O presente processo teve origem em reclamação apresentada por um senhorio da Figueira da Foz que impugnava a deliberação da Câmara que o havia intimado a fazer obras no prédio de que é proprietário, fundamentando a sua reclamação no facto de que, por força do contrato de arrendamento, as obras de reparação de que o prédio carecesse seriam da conta do inquilino.

O problema jurídico existente resultava da interpretação das disposições do Regulamento Geral das Edificações Urbanas que conferiam poderes às autarquias locais para impor a realização de obras a certos proprietários de prédios urbanos.

Depois de analisado o problema, concluiu-se que atribuições das autarquias nessa matéria têm justificação em razões de interesse público —salubridade, risco de incêndio e segurança — e visam directamente os proprietários como responsáveis, não se podendo, consequentemente, compaginar tais razões de interesse público com a análise e interpretação a fazer das cláusulas contratuais celebradas pelo senhorio com quaisquer terceiros.

Face ao exposto, negou-se razão ao reclamante, não se tendo feito qualquer censura à actuação da Câmara Municipal da Figueira da Foz,

Processo n.º 77/R-1031-3-4

Teve origem este processo numa reclamação apresentada por um concorrente a uma vaga da licença para um automóvel ligeiro para uma freguesia do concelho de Barcelos.

Tal concorrente havia sido graduado em 1.° lugar na lista provisória e na lista definitiva veio a ser graduado em 2.° lugar.

Ouvida a Câmara, informou que a alteração da classificação foi feita pelo facto de o concorrente preterido ser empregado por conta de outrem e que, presumivelmente, não iria dedicar-se, em regime de exclusividade, à profissão de motorista de automóveis de aluguer.

Face a tal resposta, imediatamente se recomendou à Câmara a revogação da deliberação que decidira da classificação, porquanto o factualismo descrito, a verificar-se no futuro, poderia levar ao cancelamento da licença, mas nunca poderia conduzir à alteração da classificação, pelo que a deliberação estava inquinada do vício de violação da lei (artigo 8.°, n.° 2, do De-creto-Lei n.° 512/75, de 20 de Setembro).

A Câmara de Barcelos aceitou que havia cometido uma ilegalidade, mas como entretanto já havia sido interposto recurso contencioso da deliberação, não podia esta, por força do disposto nos artigos 83.°,

n.° 1, e 357.° do Código Administrativo, ser revogada, pelo que a sorte de tal deliberação dependerá da decisão do Supremo Tribunal Administrativo.

Porém, ainda se aconselhou o reclamante a interpor uma acção cível para ressarcimento dos danos sofridos, nos termos do Decreto-Lei n." 48 051, de 24 de Novembro de 1967.

Processo n.º 77/R-510-B-4

Teve origem este processo numa reclamação apresentada pela proprietária de um prédio sito em Vila Nova de Gaia e ocupado abusivamente antes de 14 de Abril de 1975, ocupação essa depois legalizada pela Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 198-A/75, com a celebração do contrato de arrendamento.

Ouvida a Câmara sobre a reclamação, pronunciou-se no sentido de a legalização ter sido efectuada por falta de contratação da reclamante nos termos da lei.

Feitas mais algumas diligências, concluiu-se que, muito embora a reclamante nada tivesse dito sobre a legalização da ocupação, o que é facto é que já anteriormente havia requerido ao Município a desocupação da casa por esta não oferecer as mínimas condições habitacionais, dado que ameaçava ruína, mais se tendo concluído que a Câmara se substituiu na celebração do contrato a uma filha da reclamante, e não a esta como verdadeira proprietária.

Tendo em conta o valor da renda fixada — 50$ — e a situação de ameaça da ruína do citado prédio, emitiu-se o parecer no sentido de ser duvidosa a existência das condições mínimas de habitabilidade para que tal casa fosse dada de arrendamento pela Câmara, quando há muito deixou de ser para tal fim destinada, pelo que se concluiu ter havido manifesta precipitação daquela autarquia local.

Fez-se, assim, o devido reparo à Câmara de Vila Nova de Gaia e, quanto ao problema do contrato — ineficácia em relação à reclamante — e da ocupação, aconselhou-se a interessada a dirigir-se acs tribunais.

Processo n.º 77/R-802-B-4

Tem este processo origem em reclamação apresentada por uma reclamante que se queixava de inércia da Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha relativamente à situação resultante de um seu vizinho habitualmente efectuar os despejos para uma dependência de sua casa, queixando-se ainda a reclamante de que aquela autarquia local não lhe passava certidão do ofício enviado à Câmara Municipal pela delegação de saúde em que se deu conta da situação.

Após diligências feitas pelo Serviço conseguiu-se que a Câmara Municipal actuasse junto do senhorio para que fossem feitas obras, designadamente um quarto de banho, dado que era a inexistência deste que estava na origem do problema.

Na parte que respeitava à passagem da certidão, negou-se razão à reclamante, porquanto se tem entendido doutrinariamente que a correspondência oficiai tem sempre natureza confidencial, alicerçando-se tal conclusão, por via analógica, no disposto no § único do artigo 4.° do Decreto n.° 8624, de 7 de Fevereiro de 1923, e dado, por outro lado, que não se estaria perante a previsão contida no artigo 259.° da Constituição da República.

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Processo n.º 77/R-738-B-4

Teve origem este processo na reclamação apresentada pelo inquilino de um prédio sito na Rua de D. João I, 235, em Guimarães, com o fundamento de que a Câmara Municipal, apesar de ter intimado a senhoria do prédio a fazer nele obras de reparação, jamais procedeu a execução coerciva das obras na falta de cumprimento voluntário do conteúdo do mandato da intimação.

Ouvida a entidade reclamada e feitas outras diligências, chegou-se à conclusão de que a Câmara não havia procedido à execução coerciva das obras por incapacidade económica e por falta de meios técnicos, enquanto, por outro lado, a senhoria apenas tinha de rendimento certo a renda de 250$ que extraía do citado prédio.

Face ao factualismo apurado, perfilhou-se a opinião de que nos casos em que as obras a executar são manifestamente deproporcionadas com o rendimento extraído dos prédios e se a capacidade económica de quem deve suportar os encargos for, como era o caso, manifestamente débil, bem andam as câmaras se usarem com ponderação os poderes que o artigo 10.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas lhes conferem, tanto mais que no caso concreto não estávamos perante o poder-dever a que se refere o § 1.° do citado preceito, que respeita aos casos de prédios que ameaçam ruína ou oferecem perigo para a saúde pública.

Recomendou-se, pois, à Câmara Municipal que não procedesse à execução coerciva das obras e, porque era evidente o desafogo económico do reclamante, aconselhou-se o mesmo a entrar em negociações com a senhoria no sentido de as obras serem por si realizadas e depois deduzidas, pelo processo a combinar, no valor da renda.

Processo n.° 77/R-751-B-4

Teve origem o processo na reclamação apresentada por um actual chefe de secretaria de uma câmara municipal que vinha reclamar o pagamento do trabalho executado durante o tempo em que trabalhou para a Câmara Municipal de Soure.

Pretendendo averiguar da aplicação ao caso dos princípios gerais que regulam a situação dos agentes do facto, consultou-se a entidade reclamada, que veio a informar que ao reclamante, uma vez acabados os seus estudos liceais, havia sido tolerada a sua permanência na Câmara para que fosse adquirindo alguma experiência dos serviços administrativos, não tendo, consequentemente, havido qualquer provimento, ainda que irregular, ou mesmo qualquer ajuste de funções.

Face às explicações fornecidas, concluiu-se que o reclamante, enquanto praticante, não chegou a reunir os requisitos de agente de facto, dado que não tinha havido qualquer provimento, isto é, a instalação num cargo, além de que tal categoria profissional —praticante— jamais existiu nos quadros privativos das autarquias locais, e, por outro lado, é por de mais evidente que o mais beneficiado, com a permissibili-dade que lhe foi conferida pela Câmara, foi exactamente o reclamante, que, por via da experiência adqui-

rida, havia de ingressar na carreira de funcionário administrativo.

Negou-se, consequentemente, razão ao reclamante e arquivou-se o processo.

Processo n.º 77/R-678-B-4

Teve origem o processo na reclamação apresentada por um ex-funcionário administrativo da Câmara Municipal de Alandroal que, por deliberação daquele corpo administrativo de 17 de Maio de 1961, hav:a sido demitido por abandono do lugar.

Auscultada a entidade reclamada sobre o teor da reclamação, pronunciou-se a mesma no sentido de lhe oferecer bastantes dúvidas a posição assumida pelos antigos gestores daquele corpo administrativo, posição essa apreciada pelo conteúdo do processo disciplinar, bem como pelo teor das deliberações que ao problema diziam respeito.

Face ao circunstancialismo verificado e depois de cuidadosa análise do problema, chegou-se à conclusão de que, no caso concreto, o trabalhador apenas e só de forma inequívoca e publicamente havia manifestado a vontade de rescindir unilateralmente o contrato que o ligava àquela autarquia local, situação essa de que resultavam efeitos jurídicos totalmente diversos da situação de abandono do lugar.

Elaborou-se então a adequada recomendação para que, ao abrigo do artigo 83.°, aplicável por força do artigo 357.°, ambos do Código Administrativo, fosse convertida a deliberação de demissão por abandono do lugar em deliberação de aceitação da rescisão unilateral do contrato, recomendação que foi totalmente aceite, e assim se possibilitou que o reclamante beneficiasse das regalias concedidas pelo Estatuto da Aposentação.

Processo n.º 77/R-1373-B-4

Este processo nasce com a reclamação apresentada pelo proprietário das instalações onde funcionam o ciclo preparatório e a Escola Secundaria de Santiago do Cacém.

Tais instalações foram numa primeira fase dadas de arrendamento à Câmara Municipal daquela localidade, que, em Julho de 1974, cessou o pagamento da renda, por dificuldades económicas.

Entretanto, e embora o Estado continuasse a beneficiar da utilização das instalações, gerou-se um grande impasse entre o Ministério da Educação e o Primeiro--Ministro, traduzido na circunstância de aquela primeira entidade entender que a utilização por parte do Estado das referidas instalações determinaria que a correspondente responsabilidade com o pagamento das rendas passasse, outrossim, para o Estado, pelo menos a partir de Agosto de 1974, enquanto o Sr. Ministro de Estado, por entender que só por despacho de 25 de Junho de 1976 se tinha autorizado a celebração do contrato de arrendamento com o proprietário, só, consequentemente, a partir dessa data o Estado devia satisfazer a aludida responsabilidade.

Dado que o proprietário, com certa legitimidade, se propunha entravar o início das aulas no ano escolar de 1977-1978, determinou o Provedor que o processo tivesse natureza urgente, e, depois de contactado o Sr. Ministro de Estado, foi elaborado o adequado

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parecer, onde se concluiu que, embora a relação jurídica contratual não estivesse devidamente formalizada, o circunstancialismo descrito era por si mais que suficiente para, com base no princípio do enriquecimento sem causa, justificar o pagamento das rendas em atraso.

Efectuada a recomendação, a mesma foi aceite na sua globalidade e por via dela satisfeito o pagamento das rendas em atraso, no valor mensal de 30000$, valor este com que a Direcção-Geral do Património concordou totalmente.

Processo n.° 75/R-656-B-4

Um proprietário do concelho de Lisboa reclamou contra o facto de a Câmara Municipal de Lisboa não dar seguimento a um requerimento que lhe havia apresentado, ao abrigo do artigo 5.º do Decreto-Lei n.° 198-A/75, de 14 de Abril, para despejo administrativo dos ocupantes de uma fracção de um seu prédio urbano.

Colheram-se numerosas informações junto do Município e no decurso dessas diligências veio a ser publicado o Becreto-Lei n.° 293/77, de 20 de Julho.

Dada a alteração legislativa da matéria, determinou-se o arquivamento do processo deste Serviço por haver sido retirada às autarquias locais a atribuição de procederem a despejos administrativos das ocupações não legalizadas (hoje a pretensão do reclamante só por via judicial poderá ser resolvida).

No entanto, o Provedor dirigiu uma censura à Câmara Municipal pela demora na apreciação do caso exposto pelo reclamante, fazendo notar a conveniência de ser apurado a quem cabe a responsabilidade de injustificadas delongas e de serem tomadas as medidas disciplinares que o caso requeria em relação a quem se mostrasse responsável.

Como este e com idêntico resultado contra a mesma e outras câmaras foram tratados diversos outros casos.

Processo n.º 76/R-1175-B-4

Foi recebida uma queixa contra a actuação da comissão administrativa de uma autarquia paroquial, a qual vinha assinada com a menção de O Povo.

Tratava-se, afinal, de uma queixa/anónima.

Dada a natureza do assunto (omissão ou deficiência na prestação das contas), decidiu-se, por iniciativa do Provedor, a sua averiguação.

Colheram-se diversas informações junto de diferentes entidades públicas, vindo a apurar-se que tinha havido procedimentos pouco ortodoxos durante a gestão da comissão administrativa em causa e que as contas por esta apresentadas estavam pendentes de julgamento do Tribunal de Contas.

Considerando que a referida comissão administrativa fora oportunamente substituída, por eleição local, pela actual junta de freguesia, que não surgiram neste Serviço queixas formuladas por cidadãos que se tenham sentido directamente lesados e que no julgamento das aludidas contas da gerência o Tribunal de Contas determinará a existência ou não da responsabilidade financeira dos membros da visada comissão administrativa, foi determinado o arquivamento do processo deste Serviço.

No entanto, o Provedor ponderou ao presidente da junta de freguesia a necessidade de toda a actuação dos órgãos da administração paroquial se pautar pelo integral acatamento das leis em vigor e pelo respeito dos direitos dos cidadãos.

Processo n.º 76/R-400-B-4

Uma comissão de moradores queixou-se contra o novo traçado escolhido para a implantação, em certo lugar, da Auto-Estrada do Norte, pois entendia que ia prejudicar uma povoação e destruir parte de um valioso monumento nacional.

Solicitaram-se e obtiveram-se de diferentes entidades públicas numerosos e detalhados esclarecimentos e documentos, tendo-se concluído que o traçado oficialmente fixado para a via era o preferível.

O processo foi arquivado por esse facto e por a comissão de moradores reclamante haver desistido da sua queixa depois de haver sido elucidada pela entidade competente acerca dos procedimentos (que veio a considerar prudentes) da solução anteriormente posta em causa.

ASSISTÊNCIA SOCIAL — TERCEIRA IDADE Processo n.° 77/R-286-B-1

Um associado das Conferências de S. Vicente de Paulo denunciou a situação de uma pessoa idosa que deixara de visitar por imposição da hóspede que dela «tomava conta».

Verificou-se que estava a ser vítima dos sublocatários, interessados em ficarem senhores da casa, de renda antiga e muito baixa, que inicialmente a tratavam bem, mas que, por último, com o agravamento das dificuldades inerentes à idade da locatária, haviam perdido a noção dos seus deveres.

Foi chamada a atenção da Santa Casa da Misericórdia, mas a assistente social encarregada de um inquérito referiu que não tinha sido possível fazê-lo, pois nem sequer lhe foi permitida a entrada na residência.

Foi visitada por duas vezes por funcionários do Serviço do Provedor para avaliação concreta da situação, em resultado da qual se diligenciou, de harmonia com a vontade manifestada, para o seu internamento numa casa de repouso, onde actualmente se encontra. Recebe agora da Caixa Nacional de Pensões a pensão correspondente, até aí entregue à sublocatária, a quem a beneficiária passara para o efeito uma procuração e que pretendeu revogar.

CONTRATO DE FORNECIMENTO Processo n.° 76/R-83

Um empresário queixou-se pelo facto de, havendo sido estipulado com os Correios e Telecomunicações de Portugal (CTP) o fornecimento de aparelhos de detecção de fugas de gás para diversos serviços seus, desses apenas foram adquiridos trinta e dois exemplares, tendo-se aquela empresa pública recusado a comprar mais, alegando razões de índole técnica que ele considerava incorrectas.

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Acrescentou que, em gesto, em seu entender, de «boa vontade», teria entregue um dos referidos detectores na residência de um administrador dos CTP.

Tempos depois este devolvera-lhe o detector, danificado, referindo que c seu funcionamento se revelara insatisfatório. O queixoso contraditava esta afirmação, entendendo que decerto o detector fora colocado em lugar inadequado e discutindo perante os CTP a atitude do seu administrador.

Estudado o assunto, após apreciável troca de correspondência com os CTP, pôde chegar-se à conclusão de que a aquisição dos detectores pelos CTP fora celebrada por forma meramente verbal, aliás admitida pela lei civil geral, aplicável ao caso.

Das declarações das duas partes e da análise do processo extraía-se que só se perfizera a compra dos referidos trinta e dois detectores efectivamente pagos ao queixoso.

Não havia qualquer vinculação dos CTP no sentido da continuidade do fornecimento. Esta ficara dependente da experiência de funcionamento daqueles, a qual não fora, de resto, satisfatória. Os estudos técnicos a tal respeito elaborados pelos competentes serviços dos CTP eram concludentes — de resto, sempre esta empresa pública seria livre de não comprar mais detectores.

Foi, pois, arquivado o processo, observando-se, contudo, aos CTP que a não devolução imediata, pelo acima indicado administrador, do exemplar do detector que o queixoso (em gesto de discutível lisura) entregara em sua casa deu azo a uma situação delicada, logo por este último aproveitada. Realçou-se que «importa evitar —em qualquer serviço ou organismo público, aliás— a possibilidade de surgirem novas situações desse tipo».

CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — CONTRIBUIÇÃO INDUSTRIAL

Processo n.° 76/R-1355

O proprietário de um estabelecimento de tabacaria e papelaria queixou-se contra a Repartição de Finanças do 5.º Bairro Fiscal de Lisboa pelo facto de, segundo ele, esta se haver recusado a receber a reclamação que pretendera apresentar pelo facto de ter sido tributado não só em relação àquele estabelecimento, como ainda a respeito de outro congénere que tivera em Queluz, concelho de Sintra, mas cuja exploração cessara em 1973 — e isto, afirmou, depois de na Repartição de Finanças deste último concelho lhe haver sido dito que já nada devia ao Fisco pelo estabelecimento sito na sua área.

Auscultada a Repartição de Finanças do 5.° Bairro Fiscal, apurou-se que a tributação pelo estabelecimento de Queluz fora correcta e que o atraso com que se operou a liquidação da contribuição respeitante ao estabelecimento de Lisboa se deveu, em larga medida, à circunstância de o reclamante não haver declarado na Repartição daquele outro concelho a natureza de filial do estabelecimento que aí explorava.

Quanto à invocada não recepção da reclamação, a Repartição de Finanças, embora alegasse não poder já confirmar o facto, declarou que, por norma, não recusava a recepção de reclamações, conquanto aconselhasse os interessados a corrigir as que lhe parecessem susceptíveis de indeferimento liminar —

o que se verificaria, em seu entender, com a que o queixoso teria pretendido apresentar.

A actuação do Fisco não pareceu, quanto ao fundo, susceptível de reparo.

Entendeu-se necessário, não obstante, recordar à Repartição de Finanças a conveniência em, além de dever prestar aos contribuintes esclarecimentos tão precisos quanto possível, aceitar sempre as reclamações que lhe sejam dirigidas, mesmo que porventura passíveis de indeferimento liminar — isto para possibilitar eventual recurso do acto de indeferimento, e, de qualquer forma, dar azo a uma clara definição da situação.

CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — IMPOSTO ©E COMPENSAÇÃO

Processo n.º 76/R-934

O queixoso reclamou por, apesar de haver vendido em Abril de 1974 o seu veículo automóvel movido a gasóleo —do que teria informado a Direcção-Geral de Transportes Terrestres—, ter continuado a ser tributado pelo respectivo imposto de compensação.

Ouvida a Direcção-Geral de Transportes Terrestres, esta respondeu que não consta dos seus arquivos a referida carta do interessado.

Todavia, perante a interpelação do Provedor, procedera oficiosamente à revisão da liquidação do imposto em causa, tendo no processo de licenciamento do veículo encontrado documento através do qual o reclamante dava baixa da sua licença de circulação, com fundamento na transmissão da propriedade do veículo, registada em Fevereiro de 1975.

A Direcção-Geral operou, então, por sua iniciativa, a anulação da liquidação do imposto de compensação respeitante ao período posterior à data do regsío de transmissão do veículo — atitude que foi considerada legalmente correcta.

CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — IMPOSTO PROFISSIONAL

Processo n.° 76/R-1104

A reclamação baseia-se num erro da Repartição de Finanças do 1.° Bairro Fiscal de Lisboa na liquidação do seu imposto profissional relativo ao ano de 1974.

As diligências levadas a cabo conduziram è conclusão de que o reclamante se enganara a preencher a declaração modelo n.° 1 do imposto profissional, não sendo imputável qualquer falta à entidade pública.

Contudo, numa louvável manifestação de boa vontade para com o contribuinte, o chefe da referida Repartição de Finanças decidiu aceitar a reclamação que lhe havia sido dirigida como reclamação extraordinária, com fundamento na alínea e) do artigo 85." do Código de Processo das Contribuições e Impostos.

CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — TAXA DE CONSEVAÇÃO DE ESGOTOS

Processo n.º 76/R-1168

O Grupo de Amigos da Praia de Santa Cruz (em organização) reclamou pelo facto de os Serviços Municipalizados da Câmara Municipal de Torres Vedras

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haverem, na área daquela praia, aplicado a taxa de conservação de esgotos mesmo aos prédios ainda não servidos pela rede existente, fazendo-o, aliás, com base em valores não condizentes com o regime legal aplicável.

Perguntou-se à Câmara Municipal se tais factos se confirmavam e, a ser assim, qual o seu apoio legal — já que, segundo o Regulamento Geral das Canalizações de Esgoto, aprovado pela Portaria n.° 11 338, de 8 de Maio de 1946, a taxa de conservação só é cobrável em relação aos prédios já beneficiados com a rede de esgotos e não pode exceder 3 % do respectivo rendimento colectável.

Aproveitou-se para indagar se, por ventura, o pro-ced mento havido decorreria de nova regulamentação elaborada pelo município ao abrigo do Decreto-Lei n.° 158/70, de 13 de Abril.

A Câmara Municipal respondeu que não fora aprovado novo regulamento nos termos do citado diploma, sendo, pois, aplicável ao caso a antes referida legislação geral.

Comunicou, ademais, que, de facto, a anterior comissão administrativa deliberara, em 1976, cobrar taxa de conservação mesmo a prédios ainda não ligados à rede de esgtos, tendo para o efeito mandado avaliá-los especialmente por funcionários camarários» por entender serem muito baixos os rendimentos colectáveis apurados para efeito de contribuição predial.

O corpo administrativo em funções reconheceu, porém, em face da interpelação do Provedor, haver sido ilegal aquela actuação, tendo-a corrigido, nos termos do regime jurídico vigente.

DIREITO AO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA

Processo n.° 76/R-1437

Um cidadão alertou o Provedor para o facto de a proibição de fumar em transportes públicos ser frequentemente desrespeitada no trajecto que costuma utilizar, compreendendo a carreira fluvial Lisboa-Ca-cilhas e a de camioneta Cacilhas-Sesimbra.

Indagou-se, em consequência, da Transtejo e da Rodoviária Nacional quais os termos em que estaria sendo cumprida a lei nos meios de transporte respectivos, designadamente no tocante à afixação de dísticos elucidativos e à fiscalização de eventuais infracções.

A Transtejo respondeu que, apesar de nas suas embarcações existirem dísticos indicando a proibição de fumar, o seu desrespeito era frequente. Em face disso, iria proceder à afixação em vários locais de colantes chamando a atenção para o cumprimento da lei, bem como delimitar espaços destinados a fumadores.

A Rodoviária Nacional, por seu turno, realçou que a lei não proíbe que se fume nos transportes colectivos interurbanos, mas sim apenas nos urbanos. Indicou que já chamou a atenção da Direcção-Geral de Transportes Terrestres para a necessidade de alterar esta situação, em especial no tocante aos transportes suburbanos.

Atendendo a que, com efeito, a Portaria n.° 23 440, de 19 de Junho de 1968, apenas estabelece a proibição de fumar nos transportes urbanos, entendeu-se necessário ouvir a Secretaria de Estado do Ambiente e os Ministérios dos Assuntos Sociais e dos Transportes e Comunicações, indagando da sua posição quanto a esta matéria directamente relacionada com o direito

ao ambiente e qualidade de vida consagrado no artigo 66.° da Constituição Política.

Obteve-se resposta de estar em preparação portaria conjunta dos departamentos em causa destinada a obviar a situação. Do respectivo projecto, enviado ao Provedor, consta a proibição geral de se fumar nos veículos afectos a transportes colectivos de passageiros urbanos e interurbanos.

Prevê-se que se reservem, nos comboios e nas embarcações, zonas especiais destinadas a fumadores.

Estando, portanto, a questão a ser adequadamente tratada, entendeu-se de aguardar a publicação de tsl diploma.

DWEITO A SAÜDE Processo n.º 76/R-1215

O núcleo de Terras de Bouro do Partido Sociai--Democrata expôs ao Provedor a indesejável cobertura sanitária do concelho, referindo que não disporia de subdelegado de saúde e que nas Casas do Povo da área só eram dadas consultas duas vezes por semana, a um máximo de quinze doentes por cada vez.

Embora com a consciência de se estar perante um reflexo de uma situação de âmbito geral, insusceptível de cabal resolução através de meras intervenções pontuais, não deixou de se ouvir sobre o caso apontado a Câmara Municipal de Terras de Bouro e o Ministério dos Assuntos Sociais.

A autarquia respondeu que a situação concreta referida estava ultrapassada e que com a projectada criação de um centro de saúde as necessidades do concelho poderiam vir a ser relevantemente reduzidas.

O Ministério, por seu turno, enviou extenso e bem documentado relatório do director de Saúde do Distrito de Braga, do qual se pôde extrair que:

A falta do subdelegado de saúde fora esporádica, devido á circunstância de ele ter ido frequentar um estágio, em Novembro e Dezmbro de 1976, havendo contudo nesse período sido substituído por outro médico;

A cobertura sanitária do concelho de Terras de Bouro, claramente insuficiente, é contudo similar à da restante zona menos desenvolvida do distrito de Braga e decorrente de condicionalismos sócio-económicos de base; de qualquer modo, espera-se que melhore eficazmente com a instituição do centro de saúde cujo programa de instalação igualmente se enviou ao Serviço do Provedor.

Em face do exposto, afigurou-se que nenhuma intervenção mais caberia ao Provedor neste caso.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA)—AFASTAMENTO DE TRABALHADORES SEM PRECEDÊNCIA DE PROCESSO DISCIPLINAR

Processo n.º 76/R-694

Trabalhadores da Casa Pia de Lisboa viram os seus contratos de prestação de serviço denunciados por despacho ministerial, com fundamento em falta de capacidade para impor o mínimo de ordem indispensável ao ensino.

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Tendo em conta as funções dos reclamantes — orentador educativo e coordenador de disciplina —, o Provedor de Justiça considerou que o afastamento daqueles tinha a natureza de sanção disciplinar. E, sendo jurisprudencia constante do Supremo Tribunal Administrativo que a Administração não pode dispensar do serviço, por motivos disciplinares, nenhum trabalhador, qualquer que seja a natureza do vínculo que o liga àquela, sem prévia instauração de procedimento disciplinar, recomendou a S. Ex.ª o Ministro dos Assuntos Sociais a revogação do despacho em causa e a instauração de processos disciplinares aos reclamantes.

O Sr. Ministro invocou os graves inconvenientes que resultariam para os serviços do acatamento da recomendação do Provedor de Justiça, explicação aceite por este, que, no entanto, fez questão de recomendar que, para futuro, fosse aceite o entendimento que vinha defendendo, sugerindo ao mesmo tempo que na hipótese de um eventual recrutamento de pessoas com as qualificações dos reclamantes para entidades dependentes do Ministério dos Assuntos Sociais, fosse concedida preferência a estes, se então ainda se encontrassem desempregados.

TRABALHO (FUNÇÃO PUBLICA) — COMISSÃO DE SERVIÇO — CESSAÇÃO

Processo n.° 76/R-50

Foi apresentada reclamação contra um despacho do Secretário de Estado dos Investimentos Públicos que dava por finda a comissão de serviço do reclamante no Gabinete da Área de Sines, por conveniênc:a de serviço, pois o afastamento daquele, impedido de entrar nas instalações do JAS pelos trabalhadores da delegação de Lisboa, era uma indiscutível situação de facto que justificaria a medida determinada.

Analisada a reclamação, concluiu-se estar o despacho reclamado inquinado de desvio de poder, pois que:

A delimitação da conveniência de serviço nunca poderia fazer-se em termos de abranger uma medida que encontrava a sua única e expressa justificação numa situação de facto prolongada e imputável à própria Administração, que a criara e que a qualificara de indiscutível, reconhecendo embora não existirem razões para tal criação;

A fundamentação com que se pretendia justificar a medida tomada revela-se, assim, inadequada aos motivos que determinaram o legislador a conceder o poder de a tomar.

Como, entretanto, o reclamante havia sido nomeado, em comissão de serviço, director-geral da Fiscalização Económica, entendeu-se, sem deixar de censurar a Administração por um procedimento incorrecto, não ser de recomendar a revogação do despacho em causa.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA) — CONCURSOS Processo n.° 76/R-525

Uma candidata a servente de escola primária insurgiu-se por ter sido preterida por outra interessada que teria apresentado mais tardiamente a sua pre-

tensão. Alegou, ademais, que era casada, esperava um filho e seu marido estava desempregado.

Analisada a documentação em causa, oportunamente pedida à Direcção-Geral de Pessoal do Ministério da Educação e Investigação Científica, observou-se que esta aplicara correctamente as regras de preferência fixadas no despacho n.° 333/76, de 9 de Novembro.

De facto, por um lado, a data de apresentação da candidatura não releva, em face desse diploma, para efeitos de graduação.

Ao invés, a candidata nomeada beneficiava da preferência da alínea j) do n.° 2 daquele despacho, por ser desalojada das ex-colónias. Ademais, era casada e tinha um filho a estudar.

A queixosa, ao concorrer, era ainda solteira, não tendo actualizado a sua candidatura quando mudou de estado civil.

Apreciado, porém, todo o teor do despacho aplicável, considerou-se, embora sem incidência no caso concreto, que não parecia adequada a seguinte ordem de prioridade nele fixada:

g) Viúvas de militares falecidos durante a pres-

tação de serviço militar obrigatório, sem direito a pensão de sangue;

h) Viúvas que sejam chefes de família ou casa-

das que, por doença comprovada dos maridos, sejam amparo de família com carências económicas devidamente fundamentadas;

O Divorciadas, separadas judicialmente ou de facto e mães solteiras, com filhos a seu cargo.

De facto, não há motivo bastante para distinguir entre viúvas, divorciadas, separadas judicialmente ou de facto, solteiras ou casadas (em caso de inactividade do marido), pelo que todas deveriam ser abrangidas numa mesma alínea, funcionando, quando caso disso, os critérios gerais de desempate consignados no n.° 4 do despacho n.° 333/76.

Por isso se recomendou que as prioridades em questão fossem alteradas, no sentido de se colocarem em pé de igualdade, independentemente do seu estado civil, as mulheres que arcam sozinhas com as responsabilidades de família com carências económicas.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA) — REINTEGRAÇÃO Processo n.° 76/R-322

Um ex-professor demitido por motivos políticos sob o regime deposto em 25 de Abril queixou-se ao Provedor pelo facto de, tendo requerido a sua reintegração ao abrigo do Decreto-Lei n.° 173/74, de 25 de Abril, esta ainda não se ter efectivado. Posteriormente, veio pedir também que o Provedor interviesse no sentido de promover a rápida promulgação do diploma que, já aprovado em Conselho de Ministros, permitia que aos indivíduos nas suas condições fosse, após a reintegração, contado para efeitos de aposentação o tempo decorrido entre a demissão e c reingresso no serviço.

Não era possível, claro, intervir no tocante à promulgação, pois isso significaria uma indevida inge-

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rência do Provedor em matéria da competência de um Órgão de Soberania, o Presidente da República.

No que concerne à efectivação da reintegração, começou por se auscultar a Comissão de Reintegração dos Servidores Civis do Estado, que esclareceu já ter dado parecer favorável nesse sentido, o qual fora remetido ao Ministério da Educação e Investigação Científica.

A subsequente interpretação feita a este departamento levou-o a promover o andamento do respectivo processo, que se encontrava atrasado, tendo sido proferido despacho ministerial de reintegração em 13 de Julho de 1976.

Por deficiência de procedimento burocrático, não se operou, contudo, atempadamente, a publicação do referido despacho ministerial.

Após nova intervenção do Provedor, que suscitou que se procedesse à reforma do processo, que entretanto se extraviara, foi enfim publicada a reintegração, em Março de 1977.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA) — CONCURSOS — PARTICIPAÇÃO CRIMINAL INDEVIDA

Processa n.° 76/R-770

Uma cidadã concorreu a um lugar de escriturária--dactilógrafa do Tribunal Judicial da Comarca de Chaves, tendo sido preterida. Reclamou para o Provedor de Justiça, considerando que a candidata nomeada fora admitida extemporaneamente ao concurso.

A Direcção-Geral dos Assuntos Judiciários, irritada com os protestos da reclamante, participou dela à Polícia Judiciária por prática do crime de denúncia caluniosa, previsto e punido pelo artigo 245.° do Código Penal, negando ao mesmo tempo que ela tivesse razão.

O Serviço do Provedor de Justiça, com a apreciável colaboração do Sr. Delegado do Procurador da República na comarca de Chaves e do Sr. Chefe da Repartição do Contencioso dos CTT, concluiu que a reclamante tinha razão, pois o requerimento da candidata nomeada havia dado entrada na Direcção-Geral dos Assuntos Judiciários no dia seguinte ao termo do prazo.

Face às circunstâncias, à DGAJ só restou admitir o erro e reconhecer a verdade. Infelizmente para a reclamante, já estava esgotado o prazo para a interposição do recurso do despacho de nomeação da candidata que preenchera o lugar, visto tratar-se de acto constitutivo de direitos.

Não se deixou, contudo, de censurar a actuação da DGAJ, particularmente ao que concerne à prestação de informações erradas e à indevida participação à Polícia Judiciária, manifestando-se o desejo de que casos destes se não repetissem, não só por lesarem direitos fundamentais dos cidadãos, como por comprometerem a imagem da administração pública.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA) — FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS — TRANSFERÊNCIA

Processo n.º 76/R-194

Um tesoureiro da Fazenda Pública reclamou das circunstâncias em que se operara a sua transferência do concelho de Alijó para o da Horta. Estudada a

reclamação, concluiu-se que era fundamentai esclarecer várias questões de natureza jurídica:

Regularidade da colocação do reclamante na Horta;

Condições de desistência de uma colocação; Condições da cessação de funções de um tesoureiro num determinado concelho, etc.

Com base nesse parecer, foram pedidos diversos esclarecimentos ao Ministério das Finanças: com início em 29 de Setembro de 1976 e termo em 21 de Outubro de 1977, o Provedor de Justiça remeteu a S. Ex." o Ministro das Finanças e a vários departamentos deste Ministério, com destaque para a Direcção-Geral do Tesouro, oito ofícios, tendo estabelecido inúmeros contactos telefónicos e pessoais. Considerou o Provedor de Justiça que, para além de saber se o reclamante havia ou não sido vítima de ilegalidade — e o Supremo Tribunal Administrativo considerou que não—, ele havia, sem dúvida, sido objecto de tratamento injusto e discriminatório. A Direcção-Geral do Tesouro demonstrou injustificável falta de consideração pelo redamante, como cidadão e funcionário, recusando resolver o problema que lhe causara, e além disse não prestou a colaboração devida ao Provedor de Justiça, recusando injustificadamente os esclarecimentos pedidos, não respondendo cabalmente às perguntas feitas e fornecendo mesmo informações erradas.

O Provedor de Justiça não deixou, como lhe competia, de censurar, mais de uma vez, este comportamento.

Quanto ao reclamante, acabou por ser transferido, a seu pedido, para o concelho do Porto.

TRABALHO (FUNÇÃO PÚBLICA) — FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS — TRANSFERÊNCIA

Processo n.° 76/R-343

Foi apresentada por um funcionário reclamação contra a Direcção-Geral de Fiscalização Económica, devido ao facto de, encontrando-se a prestar serviço nesta entidade, vindo do ex-Grémio dos Armazenistas e Retalhistas de Mercearia, ter sido transferido para a Administração-Geral do Açúcar e do Álcool, com fundamento em que não interessaria à DGFE, por ter sofrido ume repreensão registada em 1963.

Instalada pelo Serviço do Provedor de Justiça, a DGFE viria a dar a conhecer a este as verdadeiras razões do afastamento do reclamante: através de documentes confidenciais existentes fora do processo individual do requerente e que foram remetidos ao SPJ, concluir-se-ia decisivamente no sentido da inconveniência em cometer ao reclamante funções de fiscalização, vista a conduta anterior deste.

Considerando a natureza dos elementos referidos e atendendo a que o reclamante pertencia de direito à AGAA, para onde fora transferido aquando da extinção do Grémio e donde fora destacado para a DGFE, sendo, pois, a manutenção ou cessação deste destacamento objecto de um poder discricionário da Administração, deu-se o caso por encerrado. Não se podia, evidentemente, ficar indiferente perante a exigência, que se compreende e impõe, a cidadãos que vão exercer funções de fiscalização de rigorosas qualificações e informações profissionais.

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Considerando a confidencialidade das informações prestadas pela DGFE, entendeu-se não as dever dar a conhecer ao redamante, deixando à DGFE o encargo de ajuizar das informações que, sem inconvenientes, lhe poderiam ser prestadas.

FUNÇÃO PÚBLICA —CONCURSOS —PRETERIÇÃO

Processo n.° 77/R-1S8

Em 17 de Janeiro de 1977, a reclamante dirigiu-se ao Provedor de Justiça contestando não ter sido colocada como auxiliar de limpeza da Escola de Algarez, Vila Marim, tendo sido nomeada para aquele lugar uma outra candidata, pelo que, considerando ter sido injustamente preterida, dirigiu ao Ministério da Educação e Investigação Científica um pedido de revisão do respectivo processo, em 1 de Setembro de 1976, não tendo, até àquela data, recebido qualquer resposta.

Com vista a obter os esclarecimentos necessários, foram os mesmos solicitados ao Gabinete do Ministro da Educação e Investigação Científica e à Direcção--Geral de Pessoal do MEIC, tendo-se apurado que a candidata preferida tinha sido nomeada de acordo com o despacho ministerial n.° 333/76, de 20 de Novembro, que estabelece os critérios de prioridade que vinham sendo aplicados nos processos de admissão e nomeação do pessoal auxiliar para os estabelecimentos de ensino.

O despacho n.° 22/77, de 15 de Fevereiro, do Secretário de Estado da Administração e Equipamento Escolar definiu a tramitação do processo de recrutamento do pessoal auxiliar aos estabelecimentos dos ensinos primário, preparatório, secundário e médio.

No seguimento das diligências do Provedor de Justiça e tendo em conta o último citado despacho de 7 de Março de 1977, foi mandada anular a nomeação contestada pela reclamante e ordenada a abertura de novo processo para o preenchimento da vaga em causa, por despacho ministerial de 7 de Março de 1977.

FUNÇÃO PÚBLICA — ADMISSÕES E PROMOÇÕES

Asunto: Aplicação do Decreto n." 360/76, de 14 de Maio. — Admissão de escriturarios-dactilógrafos e terceiros-oficiais e promoção a chefes de secção no quadro administrativo da Direcção-Geral dos Recursos Florestais (hoje Direcção-Geral do Ordenamento e Gestão Florestal):

Trabalhadores da DGRF, que não escriturários--dactilógrafos e escriturarios-dactilógrafos e outros, reclamaram por não terem sido incluídos nas listas dos candidatos aos lugares, respectivamente, de escriturarios-dactilógrafos e de terceiros-ofieais, previstas no artigo 2.° do Decreto n.° 360/76, de 14 de Maio, publicadas em conformidade com aquela disposição legal.

Verificou-se que, sistematicamente, as respectivas reclamações advinham dos seus autores não interpretarem convenientemente a alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° e o n.° 2 do mesmo artigo, pelo que todas as reclamações, por improcedentes, foram mandadas arquivar. Já o mesmo não aconteceu quanto a uma

reclamação em que primeiros-oficiais daquela Direcção-Geral (proceso n.° 76/R-980) contestavam não terem sido promovidos em conformidade com a alínea a) do artigo 1.º citado.

Contestavam os reclamantes que tendo sido dado cumprimento ao artigo 2.° do Decreto n.° JÉO/76, de 14 de Maio, em relação à publicação das listas dos candidatos aos lugares de promoção e admissão para primeiros-oficiais, segundos-oficiáis e terceiros-oficiais e escriturarios-dactilógrafos, ordenadas segundo as condições estabelecidas nas alíneas a) e b) do artigo 1.° do mesmo diploma, a secção de pessoal daquela Direcçãc-Geral dos Recursos Florestais (hoje Direcção-Geral do Ordenamento e Gestão Florestal) elaborara uma lista, para preenchimento, por promoção, para as vagas de chefe de secção «extemporânea, para contemplar funcionários segundo escolha, de tai maneira arbitária que alguns dos segundos-cficiais passavam imediatamente a chefe de secção, com flagrante desrespeito pelos primeiros-oficiais concursados e mais antigos na classe e na antiguidade total, indo portanto contra o decreto promulgado».

Segundo ainda alegavam, «o facto não passou despercebido ao douto Tribunal de Contas, que, em face do estratagema a que recorreram, devolveu à procedência o processo enviado, dos candidatos escolhidos para chefes de secção, negando o visto».

Em 13 de Abril de 1977, e na sequência de diligências efectuadas pelo Provedor de Justiça, foi pela DGRF informado que sobre o asssunto S. Ex.D o Secretário de Estado das Florestas elaborou o seguinte despacho:

Dadas as razões que assistem aos interessados, confirmadas pela informação do auditor jurídico doMAP de 25 de Fevereiro de 1977, e o conteúdo do despacho ministerial dessa mesma data sobre a suspensão temporária das promoções, submeta-se o assunto à consideração do Sr. Ministro.

Em conformidade com despacho do Ministro da Agricultura e Pescas (publicado no Diário da República, 2.º série, n.° 284, de 10 de Dezembro de 1977), foi publicada no Diário da República, 2.º série, n.° 294, de 22 de Dezembro de 1977, a lista dos candidatos á chefes de secção, «organizada de harmonia com o artigo 2.° do Decreto n.° 360/76», dando-se assim plena satisfação aos reclamantes.

FUNÇÃO PÚBLICA — PROMOÇÃO

Um funcionário do Instituto dos Produtos Florestais reclamou da injustiça de que teria sido alvo em relação a outros funcionários que iniciaram a sua carreira na mesma categoria, ou até em categoria inferior, com as mesmas habilitações que a sua e menos anos de serviço e que já são fiscais de 1.ª, enquanto o reclamante, que iniciou as suas funções na ex-Junta Nacional dos Resinosos em 1947, continua ainda como contínuo de 1.ª classe.

Segundo informou o Instituto dos Produtos Florestais, «as razões que levaram a direcção, ouvidos os competentes serviços, do extinto organismo a assim proceder não as podem precisar agora, por se terem passado muitos anos sobre este assunto e não haver documentos escritos que as expliquem.

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Como é do conhecimento geral as promoções e outros movimentos de pessoal, quando não sujeitos a regulamento bem definido, eram realizados atendendo a inclinações pessoais que criavam situações injustas e discriminatórias e que, não constituindo precedente, tornavam difícil a eliminação de situações como a que o reclamante expõe».

Não obstante, a direcção da extinta Junta Nacional dos Resinosos propôs, em 1966 e 1977, à Comissão de Coordenação Económica a passagem do reclamante para o quadro de fiscalzação na categoria de auxiliar de fiscalização, mas, apesar das diligências, mesmo pessoais, feitas na altura, nunca foi concedida a autorização necessária, nem sequer resposta ao pedido feito.

No seguimento das diligências feitas o Provedor de Justiça foi informado, em 19 de Outubro de 1977, pelo Instituto dos Produtos Florestais de que fora encontrada uma solução satisfatória para o caso do reclamante, tendo-se efectuado a sua promoção a «mestre de campo», de categoria idêntica à de fiscal de 1.ª classe.

FUNÇÃO PÚBLICA — PAGAMENTO DE RETROACTIVOS — EQUIDADE

Uma trabalhadora da lavadaria central do Centro Sanatorial do Lumiar dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação, na qual alegava fundamentalmente:

o) Existir um Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Fevereiro de 1974 proferido sobre um recurso interposto por uma colega da reclamante, em situação precisamente idêntica à sua, e no qual fora reconhecido à respectiva recorrente o direito ao vencimento da letra Y desde 1 de Janeiro de 1970 a 31 de Julho de 1971;

b) Acontece que, por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 5 de Junho de 1975, foi determinada a anulação dos despachos do administrador do Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos que tinham indeferido os requerimentos de colegas da reclamante, em situação idêntica à sua, e em que solicitavam que se lhes aplicasse, por extensão, a doutrina do aludido Acórdão de 21 de Fevereiro de 1974, tendo sido pelo administrador do IANT determinada, e executada, a liquidação àquelas funcionárias da diferença entre os vencimentos que lhes tinham sido pagos de 1 de Janeiro de 1970 a 31 de Julho de 1971 e àqueles a que se julgavam com direito, colocando-as assim em situação idêntica à da que fora beneficiada por força do disposto no aludido Acórdão de 21 de Fevereiro de 1974 do Supremo Tribunal Administrativo;

c) Por absoluta falta de meios não pôde a reclamante acompanhar as suas colegas e subscrever os actos que conduziram ao Acórdão de 5 de Junho de 1975 do Supremo Tribunal Administrativo e à posterior reparação de uma situação de injustiça relativa.

Mas, crente de que não se deixaria também de se lhe fazer justiça, requereu ao director do IANT que lhe fosse aplicada também a doutrina do referido Acórdão de 21 de Fevereiro de 1974;

d) Porém, com surpresa sua, o seu requerimento foi indeferido «porque tinha o ónus de requerer no prazo legal».

Foram então pelo Provedor de Justiça solicitados esclarecimentos ao presidente da Comissão Instaladora

do Serviço de Luta Antituberculosa, acentuando-se que pela reclamante não havia sido posta em causa a legalidade ou ilegalidade da retroactividade a 1 de Janeiro de 1970 da categoria Y, que às trabalhadoras em referência fora atribuída por força da Portaria n.° 385/71, de 21 de Julho, e do respectivo vencimento fixado pelo Decreto-Lei n.° 49 410, de 24 de Novembro de 1969, mas sim um aspecto de pura justiça relativa, face à situação que para a reclamante derivava de na altura ser a única funcionária em idêntica situação à de todas as suas restantes colegas a que não fora aplicada a medida que solicitara.

Aquela Comissão Instaladora respondeu que.

A reclamante, aliás como as demais lavadeiras, recebeu até 31 de Julho de 1971 salário mensal fixo, não tendo portanto a categoria da letra Y, pelo que não podia aproveitar do correspondente vencimento previsto no n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 49 410.

Só a partir dos efeitos produzidos pela Portaria n.° 385/71 é que haveria base legal para pagamento à reclamante do vencimento correspondente.

No entanto, e face às diligências desenvolvidas pelo Provedor, em defesa da justiça da pretensão da reclamante, fora por aquele Serviço solicitada decisão sobre o assunto ao Secretário de Estado da Saúde.

Mais tarde a mesma Comissão Instaladora do SLAT comunicou ao Provedor de Justiça que o Secretário de Estado da Saúde havia concordado com o pagamento das diferenças salariais pedidas pela reclamante, bem como de todos os funcionários que se encontrassem em idênticas situações.

O conhecimento desse despacho fora já determinado, aguardando, contudo, concessão de subsídio extraordinário pelo Orçamento Geral do Estado para se efectivarem os pagamentos devidos.

CONTRATOS

Processo n.º 77/R-704-A-2

Dois técnicos experimentadores do Instituto Geofísico do Infante D. Luís expuseram ao Provedor de Justiça que, tendo aquele Instituto proposto, a 27 de Outubro de 1975, à Reitoria da Universidade de Lisboa o contrato dos mesmos como investigadores para prestar serviço naquele Instituto, com autorização para a celebração dos respectivos contratos pela Direcção-Geral do Ensino Superior, até 11 de Novembro de 1977 os mesmos ainda se não tinham efectivado.

No seguimento das diligências do Provedor de Justiça, pela Reitoria da Universidade de Lisboa foi--lhe comunicado que por despacho do Secretário de Estado do Ensino Superior tinham sido autorizados os contratos dos reclamantes, pelo que os mesmos iam ser celebrados.

FUNÇÃO PÚBLICA —VENCIMENTOS Processo n.° 77/R-1207-A-2

Em 1977 deu entrada neste Serviço uma reclamação na qual o reclamante referia que, prestando serviço na Herdade dos Gagos, Almeirim, distrito de Santarém, há dezoito anos, e para a Junta de Colonização Interna (actual IRA) desde Julho de 1976, não lhe

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pagavam o vencimento, bem como os subsídios de férias e diuturnidades a que tinha direito.

Segundo alegou, pensava que a única explicação para este condicionalismo seria a de, em Agosto de 1975, se ter recusado «a participar nas ocupações selvagens que esses senhores do IRA protegeram».

Em resultado das diligências do Provedor de Justiça para esclarecimento do assunto, foi-lhe comunicado pelo IRA que o mesmo tinha sido posto à consideração do Sr. Secretário de Estado da Estruturação Agrária, que tinha determinado que se fizesse a sua regularização com a máxima urgência.

Processos n.º 77/R-S2J.-A-2, 76/R-1442-A-2 e IP 77/R.-19-A-2

Assunto: Casos de comprovado prejuízo profissional por motivos políticos.

Têm sido presentes neste Serviço numerosos processos, entre os quais os supra indicados, em que os reclamantes solicitam a sua reintegração na função pública por terem sido da mesma afastados compulsivamente, ou por se terem demitido ou aposentado, embora voluntariamente, mas a tanto levados por manifesta perseguição, ou em que alegam terem sido prejudicados na sua carreira profissional, todos por razões de ordem política.

De acordo com o disposto no Decreto-Lei n.° 173/ 74, de 26 de Abril, o Provedor de Justiça tem recomendado às entidades competentes a reintegração dos primeiros, quando, em alguns dos casos, os serviços se tenham recusado a fazê-lo, embora já haja para isso, nos termos legais, despacho adequado.

Quanto aos segundos e terceiros, visto o artigo 2.° do citado Decreto-Lei n.° 173/74 só ter aplicação para os servidores do Estado que tenham sido demitidos, reformados, aposentados e separados do serviço, compulsivamente, por motivos de ordem política, o Provedor de Justiça não considerou procedentes as reclamações.

Considerando, porém, nos casos em que houve comprovado prejuízo na carreira profissional dos reclamantes, embora sem afastamento, nos termos do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 173/74, que era de absoluta justiça que para os indivíduos assim prejudicados se deveria promulgar medida legal semelhante à estabelecida no Decreto-Lei n.° 173/74, para os afastados compulsivamente o Provedor de Justiça, por iniciativa própria, entregou ao Governo projecto do respectivo diploma.

Processo n.º 77/R.-139

Assunto: Despachos ministeriais não cumpridos pelo Instituto Nacional de Estatística.

Recebeu-se neste Serviço uma reclamação de um funcionário do Instituto Nacional de Estatística na qual o reclamante alegava que tinha, por motivo de cumprimento do serviço militar obrigatório, sido forçado a demitir-se do cargo de segundo-oficial eventual que ocupava no INE. Uma vez terminado aquele em 26 de Agosto de 1974, requerera a sua readmissão, com a categoria que possivelmente teria naquela data se tivesse continuado a trabalhar nesse Instituto sem interrupção.

Foi então exarado despacho ministerial de concordância com a sua readmissão e na categoria em que se encontrava à data da saída do INE, por motivo de cumprimento do serviço militar obrigatório.

O despacho, porém, não foi cumprido.

Mantendo-se o impasse da situação, o reclamante entregou no Gabinete do então Ministro sem Pasta uma exposição em que terminava por solicitar de novo a sua readmissão. Pelo Gabinete daquele Ministro foi comunicado ao reclamante que sobre a exposição citada tinha sido exarado despacho ministerial determinando a sua admissão no INE.

Este despacho também não foi cumprido.

Publicado que foi em 7 de Agosto de 1975 o Decreto-Lei n.° 410/75, fez o reclamante entrega no aludido Instituto de um novo requerimento, em que, após se referir aos citados despachos ministeriais, de novo requeria a sua admissão, ao abrigo do referido Decreto-Lei n.° 410/75.

Apesar de diversas insistências dirigidas em cartas à comissão da direcção do INE, o reclamante não obteve qualquer resposta.

Procedidas as necessárias averiguações junto do I-NE chegou-se à conclusão de que: não havia qualquer despacho ministerial revogando os despachos ministerial de reintegração. O conselho de direcção actual do INE informou que era sua convicção que aquando de uma entrevista havida em 1975 entre funcionários do INE e o então Ministro teria revogado tacitamente o seu despacho, datado de 20 de Janeiro de 1975, pelo que, apoiada na presunção de uma atitude -ministerial, considerava que não era de dar cumprimento ao mesmo despacho de readmissão do reclamante.

Considerou o Provedor de Justiça que:

Qs actos administrativos só podem ser revogados pela mesma forma por que foram elaborados, pelo que os despachos ministeriais em causa, exarados por escrito sobre requerimentos do reclamante, só por escrito poderiam ser revogados.

Além diso, não constava que qualquer desses despachos ministeriais tivesse sido oportunamente impugnado, oficiosa ou contenciosamente.

Assim, entendeu-se recomendar ao Ministro das Finanças e do Plano que determinasse ao conselho de direcção do INE o cumprimento dos referidos despachos ministeriais de reintegração do reclamante, sendo o reclamante readmitido no INE, e que fosse ponderada a possibilidade de a mesma se fazer na categoria que possuiria se aquela tivesse sido operada na data devida.

HABITAÇÃO — ARRENDAMENTO Processo n.º 76/R-1362

A proprietária de uma casa queixou-se por lhe ter sido aplicada multa pelo facto de não haver conseguido apresentar o respectivo contrato de arrendamento para visto da Câmara Municipal de Lisboa no prazo de dez dias, previsto no artigo 19.°, n.° 3, do Decreto--Lei n.° 445/74, de 12 de Setembro.

Referiu que esse atraso se deveu à circunstância de os serviços da autarquia não lhe aceitarem o contrato, quando, dentro daquele prazo, para tanto os contactou, sem que obtivesse prévio visto da junta de freguesia, através da comisão de moradores.

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Estudado o assunto, verificou-se que a lei não impõe a obtenção do visto da junta de freguesia.

Assim, ponderou-se à Câmara Municipal que, a pretender continuar a obter o visto da junta de freguesia, isso não deveria fazer-se em termos de prejudicar os particulares, cabendo, ao invés:

Ou promover a obtenção do visto através dos seus próprios serviços, uma vez apresentado a estes o contrato pelos interessados;

Ou, na hipótese de deixar a estes últimos o ónus de conseguir o visto da junta de freguesia/comissão de moradores, considerar por eles cumprido o prazo legal desde que dentro dele hajam inicialmente exbido o contrato de arrendamento na Câmara.

A Câmara Municipal informou, mais tarde, que o caso concreto fora judicialmente resolvido e que deixara, em geral, de exigir o visto da junta de fregues:a, não previsto pela lei.

REFORMA AGRARIA Processo n.º 76/R-821

O proprietário de um lagar e de uma adega sitos em Campo Maior queixou-se ao Provedor pelo facto de essas instalações haverem sido requisitadas pelo Centro Regional da Reforma Agrária de Portalgre, apesar de não se encontrarem integradas nos prédios rústicos, também seus, que haviam sido expropriados no âmbito da Reforma Agrária.

Apreciado o caso, afigurou-se que as instalações em questão não deveriam considerar-se afectas aos prédios rústicos expropriados, dos quais aliás se encontravam distanciadas, sendo antes adjacentes à casa de habitação do queixoso. Não parecia legalmente justificada, pois, a sua requisição.

Auscultado o Ministério da Agricultura e Pescas, este começou por referir que a requisição em causa fora confirmada pelo Conselho Regional da Reforma Agrária, não podendo o departamento deixar também de a sancionar enquanto se não concluisse a apreciação jurídica da situação.

Insistiu-se várias vezes pela indicação da resolução final do caso, tendo havido necessidade de o Provedor solicitar a resposta pessoalmente, primeiro por ofício, depois telefonicamente, ao Ministro da Agricultura e Pescas.

Recebeu-se por fim comunicação de que o Secretário de Estado da Estruturação Agrária veio a revogar, em 6 de Abril de 1977, a requisição contestada, concordando com o parecer jurídico elaborado no seu Gabinete, no qual se concluíra —tal como se afigurava ao Provedor— que o lagar e a adega eram prédios autónomos, urbanos, não componentes nem integrantes dos prédios rústicos expropriados, pelo que a sua requisição não fora legal.

REGIME PRISIONAL Processo n.° 76/R.-958

O familiar de um recluso indicou ao Provedor que este sofreria de doença mental, à qual, aliás, seria atribuível a sua actividade delituosa, mas que não fora

tida em conta ao proceder-se ao seu internamento em estabelecimento prisional normal, a Colónia Penitenciara de Alcoentre.

Começou por se perguntar ao estabelecimento em questão qual a situação prisional do interessado.

Obteve-se a resposta de que o mesmo cumpria pena por vários crimes de furto, actividade pela qual, de resto, já antes várias vezes fora punido. Embora houvesse sofrido algumas punições disciplinares por infracção ao regulamento prisional, não constava que houvesse em qualquer dos processos sido objecto de exame mental.

Diligenciou-se para que a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais promovesse a realização de tal exame, o qual veio a ter lugar na Colónia Penal de Santa Cruz do Bispo.

Nas suas conclusões, o perito médico afirmou revelar o recluso oligofrenia, sendo imputável mas com certo grau de debilidade mental.

O recluso passou, assim, a ficar internado em estabelecimento adequado ao seu estado — aquele em que fora examinado.

Processo n.° 76/R-749-B-1

Assunto: Reclusos — Demora no andamento das petições.

A propósito de uma queixa formulada por um recluso em determinado estabelecimento prisional que tinha por objecto o facto de esse mesmo estabelecimento não ter comunicado, em devido tempo, ao tribunal a sua pretensão de saída precária (para assistir à comunhão de seu filho), o Provedor de Justiça chamou a atenção da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais para a necessidade de as pretensões dos reclusos serem tempestivamente apresentadas às entidades competentes para lhes darem segumento e resolução.

Esta recomendação foi feita em 9 de Março de 1977.

REGISTOS E NOTARIADO Processo n.º 76/R-979

Um cidadão dirigiu-se ao Provedor por ter sido informado na Conservatória dos Registos Centrais de que a transcrição do seu casamento, que nela requerera, e de que necessitaria para emigrar, em Janeiro de 1977, iria demorar meses a efectivar-se, não tendo provavelmente lugar até essa data.

Enviado um primeiro ofício à Conservatória indagando da situação, recebeu-se entretanto comunicação do interessado de que àquela se deslocara de novo, não se encontrando agora o respectivo processo.

Havendo-se insistido com a Conservatória por uma resposta, esta retorquiu ter o queixoso razão: a demora devera-se a ter havido dificuldade em encontrar o processo, que, afinal, veio a ser detectado, tendo-se realizado a transcrição ainda tespestivamente. O conservador salientou, a propósito, que a esta ocorrência não tinham sido estranhas as «condições calamitosas» em que a Conservatória vinha funcionando, designadamente em resultado da necesidade de satisfazer os pedidos de dezenas de milhares de desalojados das ex-colónias. Esta situação ter-se-ia até agravado

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após análoga exposição já remetida ao Provedor em 1976 e que dera origem a reparo ao Ministério da Justiça.

Perante a continuidade desta indesejável situação, de novo se ponderou ao Ministro da Justiça a necessidade de «rápido estudo e resolução das aludidas carências, em ordem ao regular e eficiente funcionamento da Conservatória em causa.

Processo n.° 76/R-903

Um sacerdote católico comunicou ao Provedor que a Conservatória do Registo Civil de Vila Real se recusara a organizar um processo de casamento pelo facto de a nubente não poder apresentar, para efeitos de suprimento de consentimento, certidão de óbito de seu pai, falecido numa ex-colônia.

Pediu-se à Conservatória que definisse a sua posição sobre o caso, designadamente em face dos artigos 169.°, n.° 3, e 364.° do Código do Registo Civil.

Esta respondeu que não entendia esses preceitos aplicáveis se os nubentes fizerem inicialmente a declaração de o progenitor em causa ter falecido. Acrescentou que esclarecera os nubentes em questão de que a certidão de óbito poderia ser substituída por certificado de notariedade.

Para melhor esclarecimento, perguntou-se então à Conservatória se à margem do assunto de nascimento do pai da nubente não estaria já averbado o seu óbito, e, na afirmativa, se esse facto e o documento que o titulara não poderia suprir a certidão de óbito.

A Conservatória retorquiu que tal averbamento existia e que, em face das especiais circunstâncias dos registos relativos às ex-colónias, considerava atendível aquele para suprimento da certidão de óbito, entendendo, de qualquer modo, que conviria que a questão fosse decidida através de instrução geral.

Posta a questão ao Ministério da Justiça, este comunicou que, ao abrigo do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 419/74, de 7 de Setembro, foram emanados despachos ministeriais autorizando as conservatórias a exarar averbamentos com base em averbamentos de actas lavradas nas ex-colónias e a lavrar assentos (por transcrição) com base nos boletins para averbamento ou nas certidões que basearam os averbamentos de actas lavradas nas ex-colónias, desde que em cada caso se verifique a existência de elementos essenciais da espécie de registo a lavrar. Para os casos de falta de apoio documental foi entretanto, pelo Decreto-Lei n.° 249/77, de 14 de Junho, estabelecido um regime simplificado de suprimento de omissão do registo.

Processo n.° 77/R-764-B-1

Um habitante do concelho de Marvão reclamou contra o facto de não lhe serem entregues documentos há muito tempo requeridos à Conservatória dos Registos Centrais e de que necessitava urgentemente para regularizar a sua situação perante as autoridades policiais.

Dada a urgência do caso, o Provedor diligenciou pessoal e telefonicamente pela sua resolução, que foi obtida em pouco mais de vinte e quatro horas.

Apurou-se que a demora ocorrera por o interessado não haver declarado e comprovado à entidade competente a urgência do assunto, já que a Conservatória

visada, apesar de se achar com enorme volume de serviço (agravado com as petições apresentadas por milhares de retornados após a independência das ex--colónias), satisfaz imediatamente os pedidos com justificada prioridade.

SEGURANÇA SOCIAL — DIREITO A PENSÃO B>3 SOBREVIVENCIA

Processo n.° 76/R-1309-A-2

Por despacho do Secretário de Estado do Orçamento fora atribuída pensão de sobrevivência ao ex--cônjuge de um funcionário falecido, depois de sucessivas reclamações de um parente daquele que se considerava injustamente preterido.

Pedida a intervenção do Provedor de Justiça diligenciou-se no sentido da obtenção dos pareceres que deram origem ao referido despacho, entre eles o da Auditoria Jurídica do Ministério das Finanças.

Estudados e ponderados todos os elementos, chegou-se à conclusão de que não era líquida a orientação seguida do ponto de vista jurídico, designadamente quanto à interpretação da declaração de vontade do falecido e ao condicionalismo legal em que se integra o direito à pensão referida.

Feitas diligências várias no sentido de apurar certos elementos factuais foram ouvidos alguns declarantes e pediu-se à junta de freguesia que atestasse algumas referências obtidas.

Verificada a divergência em relação às informações consideradas pela 10.º Delegação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, providenciou-se para que o agente do Ministério Público junto do Supremo Tribunal Administrativo interpusesse oficiosamente recurso do referido despacho, processo que segue os seus trâmites.

Entretanto, comunicou-se ao director da 10.° Delegação que o Provedor de Justiça considerava ferido de ilegalidade o despacho de S. Ex.ª o Secretário de Estado que indeferira o recurso hierárquico da reclamante, do qual, por já não ser possível recorrer contenciosamente nem recomendar a respectiva revogação, se solicitava ao agente do Ministério Público junto do STA o recurso oficioso.

SEGURANÇA SOCIAL — APOSENTAÇÃO Processo n.° 76/R-271

Um ex-administrador da Companhia Portuguesa de Pescas protestou por, tendo pedido a aposentação, após haver sido suspenso daquelas funções, a comissão administrativa da empresa haver deliberado que, a partir de 1 de Julho de 1975, deixaria de receber qualquer abono por ter sido saneado.

Posteriormente, e sobre reclamação do interessado, o Secretário de Estado das Pescas decidiu que àquele devia ser atribuída uma pensão de aposentação, mas computada apenas em relação ao tempo e à última remuneração respeitantes ao período em que fora trabalhador da Companhia, tendo por irrelevante, pois, o subsequente exercício de funções de administrador.

Estudado o assunto, verificou-se que a decisão do Secretário de Estado violava o artigo 19.° dos Estatutos da Companhia, aprovados em 1971, segundo os quais o tempo de exercício como administrador e as remunerações respectivas devem ser tidos era

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conta para fixação da correspondente pensão de aposentação. Aliás, nem a tanto obstaria o facto de não se haver durante o período em causa feito descontos para a aposentação, dado que se encontrava estatutariamente previsto mecanismo adequado à fixação da pensão em tais condições.

O Provedor recomendou, assim, ao Secretário de Estado das Pescas que determinasse o pagamento, ao reclamante, da pensão que legalmente lhe cabia — o que de facto veio a acontecer, mediante despacho de 24 de Novembro de 1977, depois homologado pelo Ministro da Agricultura e Pescas, em 5 do mês seguinte.

SEGURANÇA SOCIAL — ACIDENTES DE TRABALHO Processo n.° 74/R-418

Um trabalhador da construção civil sofreu um acidente de trabalho em 1972.

Tendo solicitado à respectiva caixa de previdência a reforma por invalidez, foi a mesma denegada, por a situação se dever a acidente de trabalho cuja acção passou a correr, desde Março de 1973, no Tribunal do Trabalho de Vila da Feira.

Esteve internado até Outubro de 1975 em hospital da Companhia de Seguros A Mundial, a qual, a partir de certa altura, cessou o abono de prestação que lhe vinha atribuindo, afirmando aguardar a decisão judicial do caso.

O interessado queixou-se ao Provedor em Junho de 1976, por o seu caso ainda não estar solucionado, não se encontrando a receber qualquer apoio pecuniário.

A sentença veio a ser proferida em 10 de Janeiro de 1977, atribuindo ao interessado uma pensão anual de 3615$15, por incapacidade permanente parcial de 0,275.

Resolvido o caso concreto, foi o respectivo processo encerrado.

Mas o Provedor considerou necessário abrir, com base nesta e noutras situações similares detectadas, um processo de sua iniciativa destinado a estudar, em geral, as alterações legislativas e de procedimento adequadas à consecução de uma maior justiça no regime dos acidentes de trabalho, quer no tocante ao valor das pensões atribuídas, quer no que concerne a situações dos trabalhadores acidentados durante a pendência dos respectivos processos.

SAÚDE PÚBLICA — CEMITÉRIOS Processo n.° 76/R-874

Transladado um cadáver de Lisboa para Ferreira do Alentejo, em 1976, só foi autorizada a respectiva inumação, no cemitério desta localidade, desde que o caixão fosse revestido com uma placa de chumbo.

A mulher do defunto considerou a exigência ilegal e devida a má vontade das autoridades locais, exigindo uma indemnização de 10 000$ pela despesa suplementar que tivera de realizar.

Alegou, a propósito, que semelhante exigência não fora feita aquando da inumação de seus pais, em 1965 e 1966, na mesma localidade.

Interpelado pelo Provedor, o delegado de saúde esclareceu que se tratara de uma inumação em jazigo subterrâneo, para o que a lei geral vigente (Decreto n.° 44 220, de 3 de Março de 1962) e o Regulamento

Municipal do Cemitério de Ferreira do Alentejo, de 27 de Julho de 1969, exigem o encerramento em caixão de chumbo, com a espessura mínima de 1,5 mm. A não ser colocado em jazigo o corpo teria de ser enterrado à profundidade de 1,15 m.

Quanto aos outros casos referidos pela reclamante, o delegado de saúde revelou que as respectivas inumações teriam sido ilegalmente efectuadas, assinalando que teria sido a repetição de ocorrências desse tipo que teria levado à elaboração do Regulamento Municipal de 1969.

Apreciada a questão, verificou-se ter sido legal a actuação das entidades públicas envolvidas no caso que originou a queixa, apenas se não comunicando ao Ministério Público as infracções penais detectadas por as mesmas haverem entretanto prescrito.

SERVIÇOS PÚBLICOS — DEMORAS Processo n.° 76/R-1494-B-1

Um funcionário queixou-se ao Provedor de Justiça de que necessitando de uma certidão do serviço prestado no Ministério do Ultramar e tendo-a pedido em 20 de Julho, a sua passagem foi sendo por várias vezes e sucessivamente adiada com fundamento em falta do pessoal necessário para o volume de serviço, e em 20 de Dezembro ainda não tinha o documento necessário.

Como, entretanto, haviam sido alterados os emolumentos devidos, reclamava o interessado não só pela demora, pedindo providências, como pelo injustificado agravamento de despesas por culpas que lhe não pertenciam.

Foi dirigido um ofício ao director-geral da Contabilidade Pública pedindo a justificação da situação descrita, ao qual foi dada a resposta de que a demora se fundava na falta de apetrechamento da 9.ª Delegação, sem meios humanos para dar satisfação à verdadeira avalancha de serviço que, em virtude da descolonização, aflui àquela repartição, e agravada ainda pela falta de dois elementos entretanto aposentados.

O acréscimo emolumentar verificou-se por força do Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto, publicado dias depois do pedido, razão pela qual se não considerou aceitável a reclamação no sentido de manter o emolumento que vigorava anteriormente.

Foi recomendada a adopção de providências imediatas adequadas à remoção das deficiências apontadas, referidas à carência de pessoal.

SERVIÇO PÚBLICO — NEGLIGÊNCIA Processo n.° 76/R-931-A-2

Tinham sido dadas instruções à Direcção-Geral de Saúde, em 5 de Julho de 1976, para promover o cumprimento de um despacho do Secretario de Estado da Saúde de 15 de Julho do ano anterior que ordenava o pagamento de uma percentagem correspondente às receitas das análises de laboratório aos funcionários do Centro de Saúde de Setúbal.

Procedeu-se a várias diligências, das quais resultou o apuramento de que havia uma funcionária que abusivamente retinha as importâncias.

Essa funcionária teve um processo disciplinar e foi destacada para outras funções.

Entretanto, as importâncias devidas foram pagas.

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TRABALHO — DICRIMINAÇÃO Processo n.° 75/R-138

Foi apresentada uma reclamação, com fundamento no facto de o Ministério do Trabalho ter entregue aos trabalhadores um de dois estabelecimentos comerciais de que era proprietário e que haviam sido objecto de ocupação ilegal pelos mesmos, o que levou o citado Ministério, face ao impasse em que se caíra, a encerrá-los e selá-los.

Instruído o processo, apurou-se que aquela «restituição» aos trabalhadores ocupantes fora feita sem audiência da entidade patronal, proprietária do estabelecimento, bem como que àqueles, entretanto constituídos em cooperativa, fora atribuído um subsídio sem que, na sua afectação, se cuidasse de indemnizar o proprietário esbulhado. Em face disso, foi dirigida ao Ministério do Trabalho uma censura pela falta de base legal e contratual da sua actuação, que não considerou, como devia, todos os interesses em jogo.

TRABALHO — INSPECÇÃO Processo n.º 77/R-1226-B-1

Assunto: Demora de uma inspecção de trabalho a determinada empresa solicitada por um sindicato.

Em 19 de Julho de 1977 o Sindicato dos Engenheiros Técnicos do Norte solicitou a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de levar a Inspecção do Trabalho a realizar uma visita à empresa José Duarte Rodrigues, L.da, que, com o objectivo de classificar profissionalmente um determinado engenheiro técnico, tinha sido referida em Agosto de 1976, com diversas insistências posteriores, sem qualquer resultado útil.

Estabelecidos os necessários contactos entre o Serviço do Provedor de Justiça e a Delegação da Secretaria de Estado do Trabalho em Braga, resultou que a pretendida inspecção viesse a ter lugar em 23 de Outubro de 1977.

TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES Processo n.º 76/R-1248

Um cidadão desalojado das ex-col6nias reclamou perante o Provedor, em Novembro de 1976, pelo facto de se encontrar em pendência, desde igual mês do ano anterior com a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses, a propósito de uma taxa de armazenagem de bagagem que lhe fora cobrada, na estação do Fundão, em seu entender ilegalmente. Apesar de múltiplas diligências junto da Companhia e de exposição feita ao Ministério dos Transportes e Comunicações, o caso não encontrava solução.

Solicitada a pronunciar-se sobre o assunto, a Companhia respondeu que, após averiguação, verificara que, de facto, a estação do Fundão cobrara indevidamente a taxa de armazenagem, pois que a bagagem do queixoso aguardara dez das antes de por ele ser levantada, pela razão de o mesmo não haver sido tempestivamente avisado para o fazer.

O quantitativo irregularmente cobrado veio, pois, a ser restituído ao interessado.

ARMAS — LEGALIZAÇÃO Processo n.º 77/R-245-B-1

Pedida a legalização de uma arma, verificou-se a certa altura que o livrete respectivo era exigido dentro de determinado prazo sob pena de condenação, prazo esse que as autoridades administrativas pareciam ignorar para darem execução ao pedido.

Por uma diligência pessoal do Provedor de Justiça foi possível dirimir o «conflito» e evitar uma condenação injusta, embora formalmente correcta na aplicação da lei.

TAXAS DE ELECTRICIDADE Processo n.° 77/R-333-B-4

Um cidadão residente no Porto queixou-se da forma como foi estabelecida a aplicação do sistema tarifário de energia eléctrica aprovado pela Portaria n.° 31-A/ 77, de 21 de Janeiro, pois entendia que a incidência das novas taxas em consumos de electricidade anteriores à data daquele diploma era ilegal.

Estudado o asunto, o Provedor concluiu que, não existindo lei ou decreto-lei que permitisse a imposição das novas taxas ou adicionais a consumos de energia eléctrica anteriores à entrada em vigor da Portaria n.° 31-A/77, esta seria ilegal nessa parte (por não haver lei ordinária permissiva da retroactividade).

Colocou, portanto, o problema ao Governo (Ministério da Indústria e Tecnologia) para adopção das providências adequadas.

Reconhecendo a justificação da posição que lhe foi exposta, o Secretário de Estado da Energia e Minas veio a remover a anomalia detectada através do Des-pacho Normativo n.° 202/77, de 30 de Setembro, publicado no Diário da República, 1.° série, de 18 de Outubro de 1977.

Por outro lado, foi determinada a oportuna restituição aos consumdores das quantias que lhes houvessem sido cobradas a mais.

VIII

Participação no Comité de Peritos em Direito Administrativo do Conselho da Europa

Tendo o Ministério da Justiça solicitado ao Provedor de Justiça que fosse assegurada através do seu Serviço a participação no Comité de Peritos em Direito Administrativo do Conselho da Europa, fundamentalmente ocupado no estudo de questões relativas à protecção dos cidadãos perante a administração pública, foi para o efeito designado o adjunto do Provedor de Justiça, Dr. Luís Silveira.

No âmbito dos trabalhos do Comité, houve oportunidade de tomar parte nas reuniões em que se ultimou um projecto de resolução sobre a protecção do indivíduo perante os actos da Administração, o qual se veio a transformar na Resolução (77) 31, aprovada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 28 de Setembro de 1977, e cujo texto se transcreve adiante, dada a especial relevância que assume no campo de actuação própria do Provedor de Justiça.

Presentemente, o Comité ocupa-se — com vista, também, à adopção de eventuais providências peio Conselho da Europa — do estudo de duas matérias: a do exercício dos poderes discricionários e a da

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responsabilidade das autoridades administrativas por prejuízos causados a particulares.

Quanto ao primeiro tema, foi elaborado um plano de trabalhos segundo o qual, se tanto vier a ser sancionado pelos competentes órgãos do Conselho da Europa, se abordarão os seguintes principais aspectos relativos ao regime do exercício dos poderes discricionários: definição de normas gerais tendentes a obstar à arbitrariedade no exercício de tais poderes (designadamente: vinculação, ao fim que os justifica; princípios da igualdade, da boa fé, da proporcionalidade, do prazo revogável para esse exercício e do prévio exame particular de cada caso; incidência especial dos direitos e liberdades fundamentais; valor das directivas); estabelecimento de regras de processo administrativo especificamente adequadas ao sector da discricionariedade e contrôle do exercício dos poderes discricionários (contrôle de legalidade e ou de mérito; contrôle administrativo, judicial e através de outros órgãos, nomeadamente do tipo Ombudsman).

Da redacção final do referido plano de trabalho foi incumbido um grupo de elementos do Comité, do qual faz parte o adjunto do Provedor de Justiça, o que se regista com agrado pelo que representa de reconhecimento do mérito da participação do adjunto do Provedor nos trabalhos do Comité.

No que ao segundo concerne, propôs-se que o seu tratamento começasse pelas questões relativas à responsabilidade das autoridades administrativas relativa à prática de actos ilegais.

RÉSOLUTION (77) 31

Sur ta protection de l'Individu au regard des actes de l'Administration

(Adoptée par le Comité des Ministres le 28 septembre 1977, lors de la 275 réunion des Délégués des Ministres)

Le Comité des Ministres,

Considérant que le but du Conseil de l'Europe est de réafliser une union plus étroite entre ses membres;

Considérant qu'en dépit des différences entre les systèmes administratifs et juridiques des Êtats membres, il existe un large accord sur les objectifs fondamentaux à atteindre par les règles relatives aux procédures administratives et notamment sur la nécessité de garantir le respect de l'équité dans les rapports entre l'individu et l'Administration;

Considérant qu'il est souhaitable que les actes administratifs soient pris dans des conditions propres à assurer la réalisation de ces objectifs;

Considérant qu'étant donné le développement de la coopération et de l'entraide administratives entre les États membres et l'ampleur croissante des mouvements internationaux de personnes, il est opportun d'enarriver à un niveau commum de protection dans tous les États membres:

Recommande aux gouvernements des Êtats membres:

a) De s'inspirer dans leur droit et leur pratique

administrative des principes énoncés dans l'annexe à la présente résolution;

b) D'informer, en temps utile, le Secrétaire Gé-

néral du Conseil de l'Europe de tout développement important survenu dans les matières sur lesquelles porte la présente résolution;

Charge le Secrétaire Générale du Conseil de l'Europe de porter le contenu de la présente résolution à la connaissance des Gouvernements de la Finlande et de l'Espagne.

Annexe à la Résolution (77) 31

Les principes énoncés ci-après s'appliquent à la protection des personnes, physiques ou morales, dans les procédures administratives à Regard de toute mesure ou décision d'ordre individuel prise dans l'exercice de la puissance publique et de nature à produire des effets directs sur les droits, libertés ou intérêts de ces personnes (actes administratifs).

Dans la mise en œuvre de ces principes, il convient de tenir dûment compte des exigences d'une administration bonne et efficace, ainsi que des intérêts publics majeurs. Lorsque ces exigences commandent de modifier ou d'exclure un ou plusieurs de ces principes, dans des cas particuliers ou dans des secteurs spécifiques de l'administration publique, il convient néanmoins de s'efforcer, conformément aux objectifs fondamentaux de la présente résolution, de garantir le respect d'un maximum d'équité.

I

Droit d'être entendu

1. À propos de tout acte administratif de nature à porter atteinte à ses droits, à ses libertés ou à ses intérêts, l'intéressé peut proposer des faits et des arguments et, le cas échéant, offrir des moyens de preuve dont l'autorité administrative tiendra compte.

2. Dans les cas appropriés, l'intéresse est informé, en temps utile e de la façon appropriée à l'affaire, des droits visés à l'alinéa précédent.

II

Accès aux éléments d'Information

À sa demande, l'intéressé est informé, par tout moyen approprié, avant que Tact administratif n'intervienne, de tous les éléments disponibles en fonction desquels cet acte doit être pris.

III

Assistance et représentation

L'intéressé peut se faire assister ou représenter dans la procédure administrative.

IV

Motivation des actes administratifs

Lorsqu'un acte administratif est de nature à porter atteinte à ses droits, ses libertés ou ses intérêts, l'intéressé est informé des motifs sur lesquels il se fonde. Cette information est donnée soit par l'indication des motifs dans l'acte, soit, à la demande de l'intéressé, par leur communication par écrit à celui-ci dans un délai raisonnable.

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viço do Provedor de Justiça devidamente apto a responder, operacionalmente e com eficácia, àquilo que os cidadãos dele reclamam, ou seja, a permanente defesa dos seus direitos fundamentais, e assegurar a justiça e a legalidade na Administração.

A segunda é a que se vai verificando gradualmente uma maior compreensão por parte da Administração e a percepção da real vantagem deste Serviço — não só para os cidadãos, como para as entidades visadas nas reclamações—, que a leva a procurar responder mais pronta e concretamente aos pedidos de esclarecimentos que lhe são formulados.

Se é certo que em alguns sectores da Administração e numa ou noutra autarquia local —excepções que confirmam a regra— parece existir um certo agas-tamento e uma renitência em aceitar os pedidos e as indicações do Provedor, a verdade é que se nota que as excepções vão diminuindo, o que autoriza a esperança de que venham a acabar de todo.

E, assim, no dia em que todos se capacitem de que os seus serviços só se prestigiam quando, colaborando pronta e lealmente com o Provedor, facilitarem a averiguação rápida da razão ou da sem-razão das queixas formuladas contra a sua actuação, contribuir--se-á amplamente para que se criem melhores condições de convivência entre a Administração e os administrados, uma maior confiança dos cidadãos nos serviços públicos. Para tal também terá de contribuir em grande escala o desaparecimento de certos resquícios que ficaram de um passado que não deve voltar, e que leva alguns a julgarem que são donos dos lugares que desempenham, que a ninguém têm de dar contas dos seus actos e a não aceitar a sua substituição pelo princípio democrático do respeito pela lei e pelos direitos dos cidadãos, característica fundamental de um Estado de direito.

É de realçar que não pode considerar-se excessivo, atentos os nossos condicionalismos culturais, o número de queixas disparatadas ou sem qualquer fundamento e que, por outro lado, no número de queixas rejeitadas liminarmente muitas delas só o são depois de estudo minucioso do assunto, o que significa que a rejeição liminar não se refere só a queixas desde logo consideradas como não recebíveis, mas também a muitas em relação às quais só depois de ponderadamente estudadas se pode concluir pela sua rejeição.

Assim, pode dizer-se que das 728 queixas rejeitadas liminarmente, o número das que o foram logo de entrada, apenas pela sua leitura, não atingiu talvez 30% desse total.

Outra conclusão que o Provedor pôde virar foi a de que por parte dos responsáveis ao mais alto nível da Administração Central houve sempre um declarado propósito de prestar colaboração franca, sem jamais se tentar violentar a independência do Provedor e, excepto num caso que se vier a ser necessário será levado ao relatório de 1978, aceitando e acatando sem azedume as recomendações que lhe têm sido apresentadas.

Foi ainda verificado que, para além das carências financeiras que tornam impossível às autarquias locais realizar as obras indispensáveis nas áreas da sua jurisdição, designadamente nos mais pequenos concelhos e nas freguesias, existe uma acentuada carência de pessoal técnico e burocrático, pelo que há uma nítida incapacidade de resposta atempada às múltiplas solici-

V

Indication des voies de recours

Lorsqu'un acte administratif qui est communiqué par écrit porte atteinte aux droits, libertés ou intérêts de l'intéressé, il indique les recours normaux dont il peut faire l'objet, ainsi que le délai imparti pour en faire usage.

IX

Esclarecimento público sobre o Serviço do Provedor de Justiça

Em 1976, como se vê a p. 24 do relatório desse ano, preparou-se para elucidação do público um projecto de folheto informativo contendo, além da transcrição da legislação aplicável, um conjunto de instruções práticas, formuladas em moldes acessíveis, sobre os objectivos e funções da instituição do Provedor de Justiça, bem como sobre a forma de apresentação das queixas e seus tratamentos.

A sua publicação, feita através da Secretaria de Estado da Comunicação Social, com uma tiragem de dez mil exemplares, teve lugar em Março de 1977, dele se fazendo larga difusão.

Com efeito, foram distribuídos exemplares nos serviços públicos, em todas as câmaras municipais e juntas de freguesia, por todos os jornais diários e pela imprensa regional e postos à disposição do público não só naquela Secretaria de Estado, mas também nas instalações do Serviço do Provedor de Justiça.

Com o mesmo objectivo, o Provedor concedeu entrevistas ao vespertino A Capital, em 27 de Janeiro; à Agência Terceiro Mundo, em Maio, sendo publicada na revista Opção na íntegra, e em extractos noutros órgãos da imprensa, incluindo o original; no Portugal Socialista, em Junho, e ao Diário de Notícias, em 14 de Outubro.

Por outro lado, a Radiodifusão Portuguesa, no seu programa 3, que já havia difundido em Dezembro de 1976, na rubrica «A Lei em Que Vivemos», do Dr. Rui de Sousa Moura Guedes, exposições da sua autoria e entrevistas por si conduzidas com o Provedor de Justiça, difundiu novas entrevistas nos dias 1, 4, 5 e 8 de Janeiro e, mais tarde, a propósito da publicação do Estatuto, novas exposições daquele advogado nos dias 2, 3, 6, 7, 9 e 10 de Dezembro e entrevistas com o Provedor nos dias 20, 21, 23 e 24 do mesmo mês.

X

Considerações finais

Dezasseis meses de exercício, que tantos são os que leva o Provedor desde a data da sua posse até ao momento em que redige estas palavras finais, representam já uma experiência que permite tirar algumas conclusões.

A primeira, que o enche de satisfação e o deixa encarar o futuro com confiança, é a de que com a prestimosa, competente e leal colaboração do adjunto do Provedor e dadas as qualidades de competência, isenção, sentido das realidades, trabalho e dedicação de todos os coordenadores e assessores, está o Ser-

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II SÉRIE —NÚMERO 62

tacões das populações, que a boa vontade e a devoção dos responsáveis, por maiores que sejam, não chegam para superar.

Caberá igualmente anotar que, apesar de serem em escasso número ainda as tentativas feitas, há casos em que é aconselhável procurar-se a conciliação entre os reclamantes e as entidades visadas, pois que resultaram com êxito as até agora levadas a efeito em diferendos que vinham a arrastar-se, como, por exemplo, numa divergência entre a administração dos CTT e um funcionário, e num impasse entre uma entidade patronal e os trabalhadores numa empresa intervencionada, alcançando-se um acordo para a desinterven-ção com entrega aos trabalhadores organizados cm cooperativa.

Finalmente, tirou-se a conclusão —aliás previsível— de que a iniciativa própria é condição indispensável para uma actuação útil do Provedor.

Com efeito, pela leitura aturada da imprensa, pelo contacto aberto com os cidadãos que nele confiam e assim lhe revelam sem receio todos os elementos dos casos que os preocupam, pode ele detectar a necessidade de serem adoptados determinados procedimentos, alteradas certas formas de agir, modificar disposições legais, revogar outras e propor novas medidas legislativas.

Esta acção, que já o Decreto-Lei n.° 212/75 contemplava e que o Estatuto do Provedor, aprovado pela Lei n.° 81/77, confirmou, agora alargada, como é lógico, à Assembleia da República, não deixará o Pro-

vedor de a levar a cabo, não na intenção, que seria mera estultícia, de se substituir aos órgãos com competência legislativa, mas tão-só com o propósito de, no cumprimento de um dever que o seu próprio Estatuto lhe impõe, contribuir para que se supram as deficiências de legislação que verificar, formulando recomendações para a sua alteração, interpretação ou revogação, e ainda para elaboração de nova legislação para casos omissos.

Ao encerrar este relatório, o Provedor sente de seu dever deixar nele exarado o seu agradecimento a todos quantos —sem distinção de sectores ou de categorias— trabalham no Serviço do Provedor de Justiça com o zelo e a conduta que lhes são impostos pela especificidade de um serviço que, tendo poderes para censurar os demais, tem de ser exemplar e não pode, em nenhuma circunstância, possibilitar qualquer censura, por mais leve que seja.

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