Página 1977
II Série — Suplemento ao número 47
Terça-feira, 3 de Abril de 1979
DIÁRIO
da Assembleia da República
I LEGISLATURA
3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1978-1979)
SUMÁRIO
Provedor de Justiça:
Relatório do ano de 1978.
ÍNDICE
I — Oficio ao Presidente da Assembleia da República.
II — Dados estatísticos relativos ao ano de 1978.
III — Análise interpretativa dos dados estatísticos.
IV — Propostas de nova legislação e de revogação ou alterações
à vigente.
V — Pedidos de apreciação de inconstitucionalidade.
VI — Apreciação sumária, na especialidade, de processos con-
cluídos em 1978:
Administração pública.
Administração local.
Administração pública.
Direitos humanos.
Empresas.
Ensino.
Expropriações.
Habitação.
Licenciamentos.
Segurança social.
Trabalho.
Transportes e comunicações. Urbanização.
VII — Actuações da administração que, por menos legais ou cor-
rectas, se registam destacadamente. VIU — Inspecções a estabelecimentos prisionais.
IX — Esclarecimento público sobre o Serviço do Provedor de
Justiça.
X — Participação no Comité de Peritos em Direito Administra-
tivo do Conselho da Europa.
XI — Considerações finais.
Lisboa, 31 de Março de 1979. Sr. Presidente da Assembleia da República: Excelência:
Dando cumprimento ao disposto no artigo 21.°, n.° 1, da Lei n.° 81/77, tenho a honra de entregar a V. Ex.a o relatório das actividades do Serviço do Provedor de Justiça relativo ao ano de 1978.
Juntamente com esse exemplar faço entrega de mais seis sendo cinco destinados aos partidos políticos com assento na Assembleia, solicitando de V. Ex.a o favor de por eles os mandar distribuir, e o sexto para publicação no Diário da Assembleia da República.
Seguindo a orientação já traçada no 1.° relatório elaborado por este serviço, que vem sendo aperfeiçoada conforme a prática aconselha, visa-se levar ao conhecimento da Assembleia da República, portanto da Nação, a actividade, nos seus aspectos mais importantes, do Serviço do Provedor de Justiça durante o último ano, as dificuldades com que deparou, as deficiências mais salientes detectadas na Administração, as carências legislativas ou a necessidade de alterar certas disposições legais, seja para preencher lacunas, seja para as adaptar às realidades dos princípios que agora comandam as nossas instituições, e os resultados alcançados.
Espero que o relatório consiga o objectivo que se propôs e para o qual, em verdadeiro espírito de equipa, trabalharam não só o Provedor como o seu adjunto, os coordenadores, os assessores e o sector de documentação deste Serviço, como desde o início vem sendo hábito.
Muito grato me seria e a quantos comigo trabalham, e constituiria apreciável estímulo, vê-lo estudado, discutido e criticado pelos Srs. Deputados.
Com os protestos da minha mais elevada consideração pela Assembleia da República e por V. Ex.a, que a ela tão dignamente preside, apresento-lhe, Sr. Presidente, os meus melhores cumprimentos.
O Provedor de Justiça, José Magalhães Godinho.
Página 1978
1076-(2)
II SÉRIE - NÚMERO 47
3.° RELATÓRIO DO PROVEDOR DE JUSTIÇA À ASSEMBLEIA
DA REPÚBLICA (1978)
CAPÍTULO II "VER DIÁRIO ORIGINAL"
Página 1979
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(3)
QUADRO N.º 3 "VER DIÁRIO ORIGINAL"
Página 1980
1076-(4)
II SÉRIE — NÚMERO 47
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
Página 1981
3 DE ABRIL DE 1979
1076(5)
Das quais:
Reclamações............................ 479
Aditamentos............................ 223
Informações sobre o andamento das queixas . . I 322
Pedidos de arquivo das reclamações......... 21
Pedidos de audiência..................... 38
Questões fora da competência do Serviço do
Provedor de Justiça.................... 340
Outros assuntos......................... 154
Número de contactos telefónicos estabelecidos pelo sector de relações públicas......................... 475
Dos quais:
Da iniciativa do público.................. 456
Da iniciativa do Serviço .................. 19
III — Diligências pessoais
Do Provedor................................... 387
Do adjunto do Provedor, coordenadores e assessores .. —
Do sector de relações públicas..................... 9
Tentativas de conciliação ......................... 4
IV — Reuniões
Reuniões de trabalho do Provedor com o adjunto do
Provedor, coordenadores e assessores ............. 12
Reuniões de todos os trabalhadores do Serviço do Provedor de Justiça sobre assuntos de trabalho e de pessoal ......................................... —
Assistência ás reuniões do Conselho Superior da Magistratura ...................................... 8
GRÁFICO 1
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
Página 1982
107-(6)
II SÉRIE — NÚMERO 47
GRAFICO 2
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
CAPÍTULO III
Ânáíise interpretativa dos dados estatísticos
Comparando o quadro n.° 1 de 1977 com o de 1978, verifica-se ter havido no total de processos organizados um acréscimo de 35 %, sendo 38 % no número de queixas escritas e 25% nas verbais, uma diminuição de 30% nas iniciativas do Provedor e um aumento de 75 % nos pedidos de declaração de inconstitucionalidade.
Sabendo-se, como se vê no n.° iv do quadro n.° 1, que 594 processos transitaram de 1976, e de 1977, 1090, que se reabriram 12 e, em 1978, entraram 2703 e o Provedor rejeitou, sem organização de processo, 144 reclamações, temos que durante o ano se movimentaram 4543 queixas, contra 3297 em 1977,
ou seja, mais 1246, o que representa, em relação ao ano anterior, um acréscimo de 38 %.
A média mensal de processos organizados em 1978 foi de 225, contra 166 em 1977, o que representa um acréscimo de 27%.
Mais ainda do que em 1977, acentua-se o acréscimo do número de processos encerrados em 1978, representando mais 50% em relação àquele ano, ou sejam, mais 1036 processos, o que dá bem mostra do trabalho realizado.
E é curioso anotar ser o número de processos encerrados em 1978 quase igual ao de processos entrados durante o ano, pois que a diferença verificada é só de 58. Tem-se assim a ideia de que, se não fosse o atraso vindo de 1976, pelas razões que o relatório desse ano apontou, poder-se-ia dizei: ter o Serviço respondido com naíliral celeridade às solicitações dos cidadãos
Página 1983
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(7)
No que respeita ao estudo comparativo dos n.os i, li, ih, iv e v do quadro n.° 5 — Entidades visadas nas queixas —, verifica-se, em relação a 1977, um aumento de 444 nas queixas contra a Administração Central (33,2 %), de 137 (114 contra as câmaras municipais) contra a Administração Local (76 %), de 98 contra as empresas públicas e nacionalizadas (196 %), não sendo significativos os aumentos das queixas contra as empresas intervencionadas (2), nem quanto às outras entidades (16).
No grupo de queixas contra a Administração Central, continua a ser o Ministério da Educação e Investigação Científica o que regista o maior número, com um aumento de 118 em relação a 1977, passando o Ministério dos Assuntos Sociais de 3.° para 2.° lugar, com mais 117, seguindo-se-lhe, com mais 95, o Ministério das Finanças e do Plano, que assim passou de 5.° para 3.°; o Ministério da Reforma Administrativa, juntamente com a Secretaria de Estado da Administração Pública, que agora o substitui, ocupa o 4.° lugar, com mais 196 queixas (correspondente a 499%); vem depois o Ministério da Justiça, com menos 18, descendo assim de 2.° para 5.° lugar; o Ministério da Administração Interna, com menos 85 queixas, desce de 3.° para 6.°, não havendo alterações sensíveis nos demais departamentos, a não ser no Comissariado para os Desalojados, que sobe de 3 para 36.
No grupo «Outras entidades» mantêm-se em maior número as queixas contra os tribunais, apesar de serem menos 19 do que em 1977, e abrem-se pela primeira vez as rubricas «Conselho Superior da Magistratura», com 1 queixa, e «Ministério Público», com 4, passando para metade (2) o das apresentadas contra o Conselho da Revolução.
No quadro n.° 6, n.° i, relativo à situação sócio--profissional dos reclamantes de queixas individuais, aumentam substancialmente os números dos desempregados ou sem profissão, que passam de 49 para 189, dos emigrantes, que passam de 12 para 22, dos aposentados ou reformados, que sobem de 142 para 227, dos trabalhadores das empresas públicas ou nacionalizadas, de 24 para 93, do sector privado, de 246 para 323, e dos trabalhadores da Administração Central, de 544 para 782. Em contrapartida, e tem interesse salientá-lo, não tendo diminuído o número de reclusos, as queixas destes desceram de 150 para 93. Também baixou de 460 para 407 o número dos reclamantes que declararam a sua profissão.
Quanto às queixas colectivas figurando no quadro n.° 6, n.° li, verificam-se aumentos significativos: 41 contra 26 nos sindicatos e associações sindicais, 10 para 5 nas comissões de moradores e 13 para 4 nas comissões de trabalhadores. Em compensação, as queixas apresentadas por entidades públicas descem de 21 para 2. Tal como em 1977, agora o número de queixas não diferenciadas aumenta quase 100%, passando de 144 para 271.
Relativamente à origem geográfica das . queixas, como se pode ver nos grupos i, li e m do quadro n.° 7, continuam a ser os distritos de Lisboa, Porto, e, agora, por troca entre si, Coimbra e Setúbal, os de maior número de queixas, sendo que só Lisboa e Porto excedem em 192 a metade da totalidade das apresentadas e tendo o de Lisboa mais 693 do que o do Porto, ou seja, 375 %. Seguem-se-lhes os distritos de Braga, Santarém, trocando entre si as posições de
1977, Viseu, Leiria, que se adianta a Faro e Aveiro, os quais vão imediatamente com o mesmo número de queixas (65), Viana do Castelo, que troca o seu lugar com Vila Real, Portalegre (com mais 26), Castelo Branco e Évora (em igualdade com 39, cada um), Bragança, com 35 (mais 19) e Guarda {com mais 11); Beja (com mais 10) continua'a ocupar o último lugar, com 19.
Quanto às regiões autónomas, os números podem considerar-se sem alteração, assim como em relação às queixas provindas do estrangeiro (21 contra 20 em 1977).
No que toca ao serviço administrativo, vê-se pelos grupos I e li do quadro n.° 8, respectivamente, que o número de ofícios recebidos é, pode dizer-se, igual — menos 27 —, mas o de ofícios expedidos excede em 1892. Enquanto o Provedor atendeu menos 33 pessoas (219), o adjunto do Provedor atendeu mais 15 (84) e o sector de relações públicas atendeu mais 309 (2577), prestou sensivelmente o mesmo número de informações sobre o andamento das queixas e estabeleceu mais 30 contactos telefónicos.
Nos grupos iii e iv do mesmo quadro n.° 8, respectivamente, verifica-se que o Provedor fez mais 205 diligências pessoais (387) e o sector de relações públicas mais 8 e realizaram-se 4 tentativas de conciliação. Houve menos 8 reuniões conjuntas de trabalho (12) e o Provedor tomou parte, a partir de Julho, em 8 sessões do Conselho Superior da Magistratura.
Por último, impõe-se, para não dar lugar a erradas interpretações, uma explicação.
No grupo iv, referente ao quadro n.° 1 — Movimento geral de processos —, relativamente aos processos terminados durante 1978 sob a rubrica «Queixas rejeitadas liminarmente», na alínea ar) mencionam-se 144 rejeitadas directamente pelo Provedor e 1256 em processo organizado, das quais 1000 em processos organizados em 1978.
Só que tal não corresponde à realidade, já que só 144 é que podem considerar-se rejeitadas liminarmente. Com efeito, só estas rejeitadas directamente pelo Provedor o são sem sequer haver organização de processo e pela simples leitura que delas o Provedor fez. São as que lhe são dirigidas directamente, por escrito, em seu nome pessoal, para o Serviço ou para a sua casa e que, por demonstrarem desde logo, à simples leitura, não terem qualquer fundamento, desde logo são rejeitadas. Mas já não é isso o que sucedeu em relação às restantes 1256. Estas tiveram processos organizados, foram até distribuídas e analisadas dentro dos moldes habituais e, entre elas, houve as que foram rejeitadas após estudo, ainda que sem diligências efectuadas, e outras que só po-deram ser rejeitadas depois de estudo e de diligências preliminares esclarecedoras. Algumas delas representaram estudo difícil e aprofundado para se concluir pela rejeição.
Só depois de concluído o relatório, melhor, de analisados os quadros estatísticos, se verificou que não poderia manter-se, sob pena de se induzir em erro quem lê os quadros, uma classificação genérica de processos rejeitados liminarmente nos moldes que figuraram nos relatórios anteriores.
No relatório referente a 1979 se alterará a classificação nos moldes que aqui se deixam indicados.
Página 1984
2076-(8)
II SÉRIE — NÚMERO 47
CAPÍTULO IV
Propostas de nova legislação e de revogação ou alteração à vigente
1) Ao Presidente da Assembleia da República, em 13 de Janeiro, relativo ao processo n.° 77/R-1687-A-3
Considerando que o Decreto-Lei n.° 841-C/76, de 7 de Dezembro, possibilitava á suspensão preventiva de qualquer trabalhador arguido em processo disciplinar tendente ao despedimento com justa causa;
Considerando que tal possibilidade aparecia na sequência do n.° 2 do artigo 35.° da LCT (regime jurídico anexo ao Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969, que permitia, e permite, genericamente, a suspensão preventiva do trabalhador arguido em processo disciplinar);
Considerando que a Lei n.° 48/77, de 22 de Julho, que procedeu à ratificação com emendas do Decreto-Lei n.° 841-C/76, limitou as possibilidades de suspensão preventiva do trabalhador arguido em processo disciplinar à invocação de um número restrito de justas causas de despedimento;
Considerando que a Lei n.° 48/77 não instituía qualquer sanção para as entidades patronais que, invocando justa causa de despedimento, suspendessem preventivamente o trabalhador fora dos casos em que permitia tal suspensão;
Considerando que a inexistência de tal sanção torna improfícua a actividade fiscalizadora è repressiva da Inspecção-Geral do Trabalho, conferindo às entidades patronais prevaricadoras total impunidade no atropelo aos direitos dos trabalhadores:
Entende-se ser de recomendar:
1.° Que seja instituída uma multa a aplicar às entidades patronais que suspendam preventivamente trabalhadores com violação do disposto no n.° 10 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 372-A/75, de 16 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 48/77, de 11 de Julho.
2.° Que seja revogado o n.° 2 do artigo 31.° do regime jurídico anexo ao Decreto-Lei n.° 49408, de 24 de Novembro de 1969.
Em alternativa, poder-se-â alterar o n.° 10 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 372-A/75, de 16 de Julho, voltando-se à redacção constante do n.° 11 do mesmo diploma, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 841-C/76.
Não seria assim necessário tocar na disposição referida da lei do contrato de trabalho, ficando a ser possível suspender preventivamente, sem perda de retribuição, o trabalhador arguido em qualquer processo disciplinar.
Por ofício de 12 de Maio, a Assembleia da República comunicou que o ofício do Provedor foi lido na sessão plenária de 18 de Janeiro e enviado às Comissões Especializadas de Direitos, Liberdades e Garantias e de Trabalho.
2) À Comissão de Trabalho da Assembleia da República
e ao Primeiro-Ministro, em 2 de Fevereiro, referente ao processo n.° 77/R-767-A-2, a seguinte recomendação
Vem o Provedor de Justiça constatando, através de inúmeras reclamações que lhe têm sido apresenta-
das, que o princípio constante da alínea a) do artigo 53.° da Constituição Portuguesa não tem sido aplicado com a generalidade e amplitude que o respeito devido à lei fundamental parece claramente impor.
Continuam a verificar-se as mais incompreensíveis e chocantes discriminações em matéria de condições de trabalho, particularmente de retribuição, entre trabalhadores que desenvolvem a mesma actividade em idênticas circunstâncias de tempo e lugar. Discriminações que se tornam ainda mais chocantes quando se verifica ser no sector público que com mais frequência se revelam.
Não pode o Provedor de Justiça aceitar que se dêem tratamentos diferentes aos trabalhadores, aos regressados dos territórios dos novos países africanos de expressão portuguesa e aos portugueses que nunca saíram daqui, aos emigrantes e aos outros cidadãos. Isto, no plano das condições de trabalho, evidentemente.
Mas muito piores que estas discriminações, cujos fundamentos se não aceitam mas que ainda se podem tentar compreender, são aquelas cujos fundamentos são de todo em todo incompreensíveis: refiro-me às que assentam nas diversas naturezas dos vínculos jurídico-laborais. Tais discriminações podem fazer com que dois trabalhadores ligados a um ente público, trabalhando o mesmo número de horas semanais, na mesma categoria profissional, aufiram salários muito diversos, só porque um é do quadro e outro é eventual, contratado ou assalariado! E, infelizmente, exemplos destas situações não faltam.
Entende o Provedor de Justiça que a retribuição a que um trabalhador tem direito apenas deve depender ca qualidade, natureza e quantidade do trabalho prestado, sendo ilegítimas e mesmo inconstitucionais quaisquer diferenças de tratamento qur tenham por base outros «critérios».
E é neste sentido que recomendo que se ponha termo, o mais brevemente possível, a todas as diferenças de tratamento entre trabalhadores do sector público exclusivamente assentes nas diversas naturezas dos vínculos jurídicos que ligam aqueles trabalhadores e os entes públicos a que prestam serviço.
Até ao fecho deste relatório nenhuma notícia houve sobre o seguimento que terá tido esta recomendação.
3{ Ao Presidente da Assembleia da República o 3c Primeiro-Ministro, em 21 da Fevereiro, respeitante ao processo n.° 76,'R-205-Â-2
Tenho a honra ce levar ao conhecimento de V. Ex." as considerações seguintes, que um caso recentemente colocado a este Serviço me leva a atender como sendo inadiáveis e urger.tes:
1 — A Lei n.° 65/77, de 26 de Agosto, dispõe no n.° 1 do seu artigo 12.° que «é garantido o exercício do direito à greve n& função pública», prescre-vendo-se, porém, no n.° 2 daquele preceito que «sem prejuízo do disposto no número anterior, o exercício do direito à greve na função pública será regulado no respectivo estatuto ou diploma espe il».
TsJ regulamentação, contudo, ainda não foi publicada.
Página 1985
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(9)
2 — O condicionalismo existente é portanto este:
Reconhecimento do exercício do direito à greve
na função pública, uma vez que se garante
esse exercício; Inexistência, porém, da regulamentação legal
que defina as condições e os limites desse
mesmo exercício.
3 — Serão claros os graves inconvenientes que resultam da situação apontada, uma vez que a vacuidade que ocorre na definição da forma como pode ser exercido o direito à greve na função pública está a cercear indiscutivelmente a possibilidade de os respectivos trabalhadores actuarem um direito constitucionalmente consagrado e que o artigo 12.°, n.° 1, da lei citada veio garantir, conduzindo, por outro lado, a que sejam (ou possam vir a ser) proferidos despachos ministeriais facilmente contestáveis ou contestados (como, v. g., recentemente aconteceu com o despacho n.° 9/78, de 31 de Janeiro de 1978, de S. Ex.a o Ministro da Educação e Cultura), o que seguramente não sucederia se existisse já lei reguladora do exercício do aludido direito.
4 — É pois por estas razões que me permito recomendar vivamente a V. Ex.a a urgência da publicação breve da legislação a que se reporta o n.° 2 do artigo 12.° da Lei n.° 65/77, sem a qual a garantia reconhecida no n.° 1 do mesmo artigo valerá apenas, a meu ver, como princípio destituído de conteúdo que lhe dê vitalidade e com os inconvenientes de ordem social que necessariamente daí podem derivar.
Até ao encerramento deste relatório não há notícia do seguimento dado a esta recomendação.
4) Ao Ministro da Justiça, em Fevereiro, relativa ao processo n.° 76/R-1434-B-1
Alguns inconvenientes, para os quais se não descortina qualquer justificação, decorrem do regime segundo o qual ao recurso da recusa de conversão em definitivo do registo provisório por dúvidas, quando procedente, é aplicável o n.° 4 do artigo 257.° do Código do Registo Predial, que impõe o requerimento do interessado para efeito de realização do acto recusado.
Assim, para além das despesas inerentes à elaboração do novo requerimento, há que ter em consideração que, sendo este uma forma de petição, logicamente contém em si mesmo a possibilidade de não ser deferido, o que, a acontecer, deixa desprovida de qualquer sentido a sua exigência como meio de efectivar um acto que, em processo de recurso, foi considerado imperativo para a Administração.
Nestes termos, recomendo que seja alterada a legislação actualmente em vigor, no sentido de:
1." alternativa:
1 — Para os casos de o recurso da recusa de conversão em definitivo do registo provisório por dúvidas ser julgado procedente, ser instituído o averbamento oficioso dessa conversão.
2 — A fim de obviar ao inconveniente que deriva do facto de a documentação ser restituída ao interessado aquando da recusa, ser estabelecido que os
documentos respeitantes ao registo recusado apenas serão restituídos aos interessados depois de decorrido o prazo para o recurso sem que este tenha sido interposto.
2.' alternativa:
Ser prescrito que, nos casos em que o recurso da recusa de conversão do registo provisório por dúvidas em definitivo é considerado procedente, o requerimento necessário à efectivação da conversão é isento de selo e não pode ser recusado.
Pelo seu ofício de 13 de Março de 1978, o Sr. Ministro da Justiça mandou comunicar pelo inspector superior da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado que o problema posto e a solução preconizada serão devidamente considerados quando se proceder à revisão do Código do Registo Predial.
5) Ao Ministro das Finanças, em 28 de Fevereiro, referente ao processo n.° 76/R-563-A-2
Considerando que:
Se verifica em certos casos a utilização pelo Estado da força de trabalho de servidores seus aposentados por invalidez e velhice sem que esse tempo de serviço conte para efeito de melhoria das respectivas pensões;
Em idênticas circunstâncias o trabalho prestado no sector privado é sujeito a descontos e influencia o montante da pensão de reforma;
Tal dualidade de regime é injusta e contraria o direito de todos os cidadãos beneficiarem, em condições de igualdade, da segurança social;
Muito embora a organização do sistema de segurança social unificado e descentralizado previsto no artigo 63.° da Constituição da República Portuguesa não seja passível de realização a curto prazo, se impõe ir desde já harmonizando, através dè alterações pontuais, as disparidades existentes nos sectores público e privado, dando prioridade às que traduzem tratamento desfavorável dos trabalhadores de um dos referidos sectores:
Tenho a honra de recomendar a V. Ex.a que mande estudar a alteração das disposições legais que impedem a contagem de tempo de serviço prestado ao Estado, a qualquer título e em qualquer ponto do território nacional (incluindo as antigas colónias), após a aposentação.
Apesar de terem sido feitas já várias insistências, ainda não foi comunicada a este Serviço a sequência dada a esta recomendação.
6) Ao Primelro-Ministro, em Março, referente ao processo n.° 77/R-4S5A-2
Em regra, o abono para falhas é gratificação inerente ao cargo de tesoureiro.
Tal regime tem criado situações de flagrante injustiça, acontecendo, no caso de impedimento do titular do referido cargo, o funcionário que o substitui — algumas vezes por prazos de meses e até anos —
Página 1986
1076-(10)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ser responsável por eventuais falhas que vêm a verificar-se e o tesoureiro continuar a receber o respectivo abono às mesmas respeitante.
Julgo, assim, de toda a justiça e urgência que seja institucionalizado que aquele abono para falhas, na generalidade, deixe de ser gratificação inerente ao cargo de tesoureiro, passando a ser uma gratificação concedida a quem exerça legalmente as respectivas funções.
Refiro ainda a V. Ex.a que no diploma orgânico do Serviço do Provedor de Justiça, aprovado pela Assembleia da República, se introduziu disposição correspondente ao que defendo.
Nestes termos, dentro da competência que por lei é atribuída ao Provedor de Justiça, recomendo a V. Ex.a que, pelas vias competentes, seja providenciado que se estabeleça disposição legal com o objectivo referido.
O Ministério da Reforma Administrativa comunicou, por ofício, ao Serviço do Provedor de Justiça que a Direcção-Geral da Função Pública opinava pela necessidade de ser publicado diploma legislativo de igual força ao Decreto-Lei n.° 106/78, que trata do abono para falhas, a fim de contemplar a recomendação, tendo sido mandado preparar o aludido diploma.
7) Ao Ministro da Reforma Administrativa, em 20 de Março, relativo ao processo n.° 76/IP-11B-1
1 — Embora a exigência de atestado de bom comportamento moral e civil esteja a perder tradição na nossa legislação e apesar de se encontrar determinado no § 6.° do artigo 360.° do Código Administrativo (na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 30/70, de 16 de Janeiro) que os certificados de registo criminal e policial fazem prova de bom comportamento moral e civil exigido por várias leis administrativas, verifica-se que existem ainda diplomas que os consagram entre a documentação a apresentar para certos efeitos.
A título de exemplo, referem-se, entre outros: o Decreto-Lei n.° 35 106, de 6 de Novembro de 1945 (arrendamento de casas de câmaras municipais); a Lei n.° 2098, de 29 de Julho de 1959, a respeito de naturalização; o Decreto-Lei n.° 47 084, de 9 de Julho de 1966, quanto à concessão e cessão do direito à pensão por preço de sangue, e a relativamente recente Portaria n.° 271-A/76, de 29 de Abril, para admissão aos estágios de professores.
Aliás, a própria Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro, ao definir a competência das juntas de freguesia, não deixa de, no seu artigo 35.°, lhes continuar a confiar o poder de passar os atestados em questão.
Por seu turno, preceitos há ainda que — como os dos artigos 21.° e 29.°, n.° 2, do Estatuto do Ensino Particular (Decreto n.° 37 545, de 8 de Setembro de 1949) — condicionam a atribuição de certos direitos e regalias à apreciação do comportamento moral e civil dos interessados; no caso apontado, tal apreciação cabe àquela Inspecção-Geral do Ensino Particular, para efeitos de concessão do respectivo diploma.
2 — Os casos em que se mantém tal exigência apresentam-se-me, pois, como resquícios anacrónicos de legislação discriminatória e de discutível equida-
de, face à dificuldade de definir, por critérios objectivos, em que consiste o bom comportamento moral e civil.
Por outro lado, afigura-se-me essa exigência redundante, tidos em conta os fins dos certificados de registo criminal e policial.
Note-se que o conteúdo do Parecer da Prccurado-ria-Geral da República n.° 39/76, de 8 de Julho, publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 289, de 13 de Novembro de 1976, refere-se à matéria e vai no sentido de que a existência de um filho fora do casamento e depois da viuvez não justifica, só por si, que seja negada à viúva a pensão de preço de sangue, como pretendia fazer-se. [Cf. cs artigos !7.°, n.° 2, e 8.°, n.° 1, alinea c), do Decreto-Lei n.° 47 034, de 9 de Janeiro de 1966.]
Tendo conhecimento de que novo parecer está já em estudo, motivado por recusa do mesmo documento, exigido noutra situação.
3 — Em face destas considerações, recomendo a V. Ex.a que seja ponderada e posta em execução uma medida legislativa cue revogue na generalidade todos os preceitos legais que ainda considerem exigível a apresentação de atestado de bom comportamento moral e civil, ou de qualquer forma condicionem à apreciação desse comportamento a atribuição de quaisquer direitos ou regalias, substituintío-o para todos os efeitos pelos certificados de registo criminal e policial.
O Ministro da Administração Interna exarou em 24 de Julho o seguinte despache:
À Auditoria Jurídica, para emissão de parecer, ouvidos a Guarda Nacional Republicana e a Policia de Segurança Pública, bem como o Ministério da Justiça, e tendo em conta o direito comparado.
8) Ao Ministro dos Transportes e Comunicações, em 27 de Abril;, respeitante ao processo n.° 77/R-1776-A-2
1 — O Decreto-Lei n.° 122/77, de 31 de Março, conjugado com o Decreto-Lei n.° 561/77, de 31 de Dezembro, determina que:
1.1 — São criadas na dependência do Ministro dos Transportes e Comunicações a Direcção-Geral da Aviação Civil, que sucederá à Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, e a empresa pública Aeroportos e Navegação Aérea (ANA, E. P.) (artigo 1.° do Decreto--Lei r..° 122/77).
1.2 — O diploma orgânico da Direcção-Geral da Aviação Civil será promulgado por decreto simples, após análises de estudos e propostas resultantes da reestruturação do sector (artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 122/77).
1.3 — A Direcção-Geral da Aviação Civil e a ANA, E. P., entrarão em funcionamento até à publicação da lei orgânica da Direcção-Geral da Aviação Civil (artigo í.° do Decreto-Lei n.° 561/77).
1.4 — A ANA, E. P., receberá todo o pessoal da Direcção-Geral tía Aeronáutica Civil que não seja indispensável à prossecução das atribuições próprias da Dirscção-Cerai da Aviação Civil (artigo í2.°, n.° ;, do Decreto-Lei n.° 122/77).
Página 1987
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(ll)
1.5 — Na transição do pessoal da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil para a Direcção-Geral da Aviação Civil e ANA, E. P., será facultada a possibilidade de o mesmo optar pelo organismo em que pretenda exercer a sua actividade, na medida em que for permitido pelo referido no número anterior e condicionado aos efectivos previstos no quadro do pessoal da Direcção-Geral da Aviação Civil, a constar da sua lei orgânica, prevista no artigo 4.° do Decreto--Lei n.° 122/77 (n.° 3 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 122/77).
1.6 —Deste modo, o pessoal que transitar para a Direcção-Geral da Aviação Civil continuará em funções na Direcção-Geral da Aeronáutica Civil, até á publicação do respectivo diploma orgânico e entrada em funcionamento daquela Direcção-Geral da Aviação Civil, fazendo-se então a transição para esta, nos termos a serem estabelecidos naquele diploma orgânico.
1.7 —Quanto ao pessoal da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil que transitar, nos termos do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 122/77, para a ANA, E. P., até à publicação do estatuto do pessoal da empresa (que deverá ser publicado no prazo de um ano, contado a partir da entrada em funcionamento da empresa), exercerá naquela as suas funções em comissão de serviço nos termos do n.° 1 do artigo 32.° do Decreto-Lei n.° 260/76 e sujeitos à legislação aplicável aos trabalhadores civis do Estado (artigo 13.° n.° 2, do Decreto-Lei n.° 122/77 e artigo 29.°, n.° 2, do estatuto da ANA, E. P., anexo ao Decreto-Lei n.° 122/77).
2 — Na reclamação em referência, os reclamantes manisfestam o seu receio quanto à situação dos funcionários da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil que transitarem para a ANA, E. P., na hipótese de antes da entrada em vigor do estatuto do pessoal daquela empresa se iniciar o funcionamento da Direcção-Geral da Aviação Civil com a publicação do seu diploma orgânico e transição do pessoal para o respectivo quadro, pelo que deixaria de poder funcionar a garantia que lhes é atribuída pelo artigo 32.° do Decreto-Lei n.° 260/76.
3 — Tal receio tinha plena justificação antes da publicação do Decreto-Lei n.° 561/77, pois, preven-do-se no Decreto-Lei n.° 122/77 que o diploma orgânico da Direcção-Geral da Aviação Civil deveria ser publicado até 29 de Julho de 1977, e que quer a Direcção-Geral da Aviação Civil, quer a ANA, E. P., deveriam entrar em funcionamento até 1 de Janeiro de 1978, e ainda que o estatuto do pessoal da ANA, E. Pv poderia ser publicado até um ano, contado da entrada em funcionamento da empresa, isto é, até 1 de Janeiro de 1979, natural seria que entre a entrada em funcionamento da Direcção-Geral da Aviação Civil e a publicação do estatuto do pessoal da ANA, E. P., mediasse um período de tempo em que os funcionários da ANA, E. P., transitados da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil ficariam desligados de qualquer quadro da Administração, só ligados à empresa por vínculo precário de comissão de serviço, pois o seu quadro de origem — da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil — teria totalmente deixado de existir.
4 — Contactada telefonicamente a Direcção-Geral da Aeronáutica Civil foi-me hoje — 23 de Fevereiro
de 1978 — informado pelo seu subdirector-geral que:
a) A ANA, E. P., já está em funcionamento des-
de 1 de Janeiro de 1978;
b) O pessoal da Direcção-Geral da Aeronáutica
Civil cujas atribuições próprias eram incompatíveis com a Direcção-Geral da Aviação Civil (aliás a maioria do pessoal da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil) transitou já, nos termos atrás expressos, para a ANA, E. P.;
c) Nesse pessoal estão incluídos os reclamantes
(controladores de tráfego e operadores);
d) Está constituído um grupo de trabalho com
vista aos estudos previstos no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 122/77 e elaboração do diploma orgânico da Direcção-Geral da Aviação Civil bem como constituída a comissão instaladora da ANA, E. P., prevista nos artigos 7.° a 9.° do mesmo decreto--lei.
5 — Com as prorrogações dos prazos estabelecidas pelo Decreto-Lei n.° 561/76, das quais resultam que a entrada em funcionamento da Direcção-Geral da Aviação Civil poderá iniciar-se até à data da publicação do seu diploma orgânico (cujo prazo se não fixa), estando ultrapassado o que era previsto pelo Decreto-Lei n.° 122/77, diploma orgânico cuja publicação ainda se não prevê para breve, e estando determinado que o estatuto do pessoal da ANA, E. P., cujo funcionamento se iniciou já em 1 de Janeiro de 1978, terá de ser publicado até 1 de Janeiro de 1979, o hiato temido pelos reclamantes entre a data da publicação do diploma orgânico da Direcção--Geral da Aviação Civil e desaparecimento dos seus — deles — quadros de origem (da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil) e a da publicação do estatuto do pessoal da ANA, E. P., tornou-se, se não imprevisível (que o não é), pelo menos de mais curto prazo.
6 — Mas o certo é que tal prazo pode ser facto e, durante ele, as garantias que pelo n.° 1 do artigo 32.° do Decreto-Lei n.° 260/76 são dadas à comissão de serviço dos funcionários da extinta Direcção--Geral da Aeronáutica Civil, que transitaram para a ANA, E. P., deixaram de ter razão de ser, pois terá então desaparecido totalmente o seu quadro de origem.
7 — Supõe-se, assim, que, tal como os reclamantes solicitam, haveria que salvaguardar-lhes todas as garantias estipuladas pelo Decreto-Lei n.° 260/76, embora em termos diferentes do estabelecido no n.° 1 do seu artigo 32.°, durante o referido prazo, eventualmente possível.
8 — Tal afigura-se-me possível, com estipulação legal de que a publicação do estatuto do pessoal da ANA, E. P., deverá, obrigatoriamente, ser publicado antes ou simultaneamente com o diploma orgânico da Direcção-Geral da Aviação Civil e sua entrada em funcionamento, o que afinal mais não seria que a alteração do prazo fixado no artigo 13.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 122/77, à semelhança do que, pelo Decreto-Lei n.° 56L/77, se já fez para os prazos fixados nos artigos 6.° e 8.° do mesmo Decreto-Lei n.° 122/77.
Página 1988
1076-(12)
II SÉRIE — NÚMERO 47
9 — Nestes termos, seria publicado um decreto-lei em que se estabelecia disposição semelhante a:
O estatuto do pessoal da ANA, E. P., previsto no artigo 13.°, n.° 1, do Decreto-lei n.° 122/77, devera ser publicado até à publicação da lei orgânica da Direcção-Geral da Aviação Civil, prevista no artigo 4.° do mesmo diploma, ou em data simultânea.
Solicito a V. Ex.a que me informe se porventura terá sido tomada alguma medida tendente a obviar os inconvenientes apontados pelos reclamantes.
Caso contrário, tenho a honra de recomendar a V. Ex.a, dentro da competência que a lei me atribui, que seja providenciada a promulgação de uma disposição legal nos termos propostos na informação elaborada por este Serviço e supra transcrita e a que, como já referi, dou a minha concordância.
Solicito ainda a V. Ex.a que me seja comunicada a decisão que sobre o assunto vier a ser tomada.
Em ofício de 16 de Novembro, por encargo do Secretário de Estado dos Transportes, foi comunicado a este Serviço que o assunto estava em estudo, em face da declaração de inconstitucionalidade do Decreto--Lei n.° 122/77, devendo ser tomadas em consideração as questões levantadas pelo Provedor de Justiça.
9) Ao Ministro do Trabalho, em 14 de Junho, referente ao processo n.° 76/R-1037-A-3
A Associação Nacional de Condóminos dirigiu ao Provedor de Justiça uma exposição protestando contra a regulamentação de trabalho das porteiras de prédios urbanos, consubstanciada nas portarias de 2 de Maio e 20 de Junho de 1975.
Este Serviço procedeu ao estudo da referida regulamentação e ficou com algumas dúvidas sobre se ela seria a mais adequada à situação das porteiras dos imóveis em regime de propriedade horizontal.
Alguns aspectos afiguram-se mesmo particularmente discutíveis: o regime da duração de trabalho, a obrigação de fornecer habitação à porteira, o sistema de avaliação desta. Pode mesmo perguntar-se se se justifica a obrigatoriedade da existência de porteira nos prédios em regime de propriedade horizontal: não poderiam os próprios condóminos assegurar a limpeza das partes comuns do imóvel?
Até porque hoje a existência de porteira — caídos em desuso os chamados «porteiros de portaria» — dificilmente pode fundamentar-se em imperativos de segurança, verificando-se mesmo uma tendência para o respectivo alojamento se situar no último andar do imóvel, de onde a vigilância de entradas e saídas é praticamente impossível.
Também a impossibilidade de os condóminos substituírem as porteiras se afigura desrazoável, se tivermos em consideração que são, as mais das vezes, colocadas nos prédios pelos próprios construtores e que os compradores das fracções já lá as encontram instaladas.
Por todas estas razões julga o Provedor de Justiça justificar-se uma revisão da regulamentação de
trabalho das trabalhadoras em questão, em cujos trabalhos deverá participar, como uma das partes interessadas, a Associação Nacional de Condóminos.
Até ao encerramento deste relatório não houve notícia alguma sobre o seguimento desta recomendação.
10) Ao Ministro das Finanças e do Plano, em 26 de Junho, respeitante ao processo n.° 77/R-1336-A-3
Considerando:
Que a todos os cidadãos que foram, por razões políticas, discriminados no acesso a funções públicas é devida reparação, ainda que, por obstáculos de ordem financeira, circunscrita a benefícios de segurança social;
Que o Decreto-Lei n.° 173/74 atentou nos problemas dos servidores civis ou militares perseguidos por motivos políticos, deixando, contudo, fora do seu campo de aplicação, todos aqueles que, por idênticas razões, nunca puderam ingressar na função pública ou nela foram admitidos após delongos anormais.
Recomendo a V. Ex.a que mande proceder ao estudo das soluções legislativas que permitam a contagem, para efeitos de aposentação, sem efectivação de descontos, do tempo de não exercício de funções públicas por impossibilidade de ingresso ou a re-troacção da inscrição na Caixa Geral de Aposentações à data em que deveria, em circunstâncias normais, ter-se verificado a admissão, desde que se comprove que a recusa ou retardamento de ingresso nos quadros da administração pública foi determinada por motivos políticos.
Apesar de pedida, o Ministério nunca deu informação sobre o seguimento dado.
11) Ao Ministro da Reforma Administrativa, em 21 de Julho, relativo ao processo n.° 78ÍR-1222A-2
Tendo-me sido apresentada uma reclamação relativa ao gozo dos feriados não obrigatórios, nos termos definidos no Decreto-Lei n.° 335/77, de 13 de Agosto, foi-me dado verificar que se levantam dificuldades na aplicação do diploma por não estar determinada qual a entidade que fixa se o dia de feriado é o municipal ou o distrital (no caso que me foi apresentado, a câmara municipal de certo concelho resolvera não considerar o habitual feriado municipal, tendo-se depois gerado discrepância sobre a entidade a que caberia fixar a observância de um feriado distrital).
Aliás, também não se sabe, cem precisão, o que é o feriado distrital, que parece não existir na maior parte dos distritos.
Se se entender como tal o feriado do município sede de distrito, parece dever ser clarificado.
Página 1989
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(13)
Assim, entendi dever dar conhecimento deste problema a V. Ex.a, com vista à revisão do diploma ou publicação de adequada regulamentação.
Em resposta, o Ministério informou o seguinte:
Contrariamente ao que poderá resultar da expressão «feriado distrital», não existem, propriamente, feriados distritais, mas sim feriados municipais. O designado feriado distrital mais não é que o feriado municipal da sede do distrito, que poderá ser observado naqueles concelhos que por qualquer motivo não disfrutam do seu próprio feriado municipal.
Deste modo, a questão de saber qual a entidade que fixa se o dia feriado a observar é o municipal ou o distrital, é, a nosso ver, uma falsa questão, na medida em que o feriado da sede do distrito ou feriado distrital, só pode ser observado na falta de feriado municipal da localidade (cf. n.° 2 do artigo único do Decreto-Lei n.° 365/77, de 13 de Agosto).
Assim, não há opção pelo feriado municipal ou pelo distrital, ao contrário do que pode acontecer no sector privado, mediante acordo da entidade patronal com os trabalhadores (cf. n.° 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 874/76, de 28 de Dezembro).
12) Ao Ministro das Finanças e do Plano, em 28 de Agosto, referente ao processo n.° 78/R-757-B-1
Na sequência de reclamações entradas neste Serviço em que os interessados se queixam dos prejuízos que para eles derivam da aplicação do Decreto-Lei n.° 23 465, de 18 de Janeiro de 1933, que regula o arrendamento de prédios do Estado e de outras pessoas de direito público, designadamente empresas públicas, analisou-se esse diploma, tendo constatado a sua flagrante desactualização e a injustiça relativa que resulta da concretização do seu regime.
Estes dois aspectos são tanto mais evidentes quanto é certo que as relações jurídicas visadas pelo diploma se processam no campo do direito privado, colocando assim os arrendatários numa situação de desigualdade relativamente àqueles que têm como senhorio um particular.
Isto não só pelo que respeita aos arrendamentos para habitação, como em relação a estabelecimentos comerciais e industriais ou exploração agrícola.
A desactualização do referido decreto-lei acentua--se ainda quando se confronta o tratamento que nele se dá aos arrendatários titulares de estabelecimento comercial ou industiral, ou de exploração agrícola, com aquele que está consagrado no Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 845/76, de 11 de Dezembro.
Com efeito, enquanto o Código das Expropriações prevê que aos referidos arrendatários seja concedida uma justa indemnização, que levará em conta as despesas relativas à nova instalação e aos prejuízos derivados do período de paralisação da actividade calculados nos termos gerais de direito, o Decreto-Lei n.° 23 465 não permite que a indemnização a receber pelos mesmos seja superior a dez vezes a renda anual do estabelecimento, se aquela for fixada por
acordo, e a cinco vezes essa renda na falta de tal acordo, critério este que tanto mais se agrava quanto mais antigo for o arrendamento.
Por outro lado, o Decreto-Lei n.° 23 465 permite que o Estado ou outra entidade pública na posição de locador despeje o arrendatário, em qualquer momento, quando lhe convier e sem necessidade de alegação de quaisquer fundamentos. A execução desse despejo é operada por via administrativa.
Ora, por um lado, afigura-se incompatível tal despejo administrativo com o disposto no artigo 206.° da Constituição Politica, na medida em que reserva aos tribunais a competência para administrar a justiça, nomeadamente dirimir conflitos de interesses públicos e particulares..
Por outro, o despejo em qualquer momento do contrato, e sem necessidade de fundamentação, aparece pouco congruente com os propósitos de justiça social que informam a actual sociedade portuguesa e o diploma fundamental que a rege.
A tudo o exposto acresce que o arrendatário pode, até, ao celebrar o contrato, não prever que lhe possa vir a ser aplicado o regime do Decreto-Lei n.° 23 465.
De facto, este não deixa de se efectivar — e há casos desse tipo, ilustrados em processos pendentes neste Serviço — se o originário proprietário e senhorio era um particular, mas depois alienou o prédio ao Estado ou outro ente público.
O que acabou de se expor exige pois que, em atenção a um princípio de justiça, se altere ou revogue o diploma em causa, pelo que solicito a V. Ex.a que se digne diligenciar nesse sentido, agradecendo que me seja anunciada a posição desse Ministério no assunto.
Em ofício de 27 de Dezembro, o Secretário de Estado das Finanças informou que, tendo em vista a virtual alteração da lei, conforme o sugerido por este Serviço, determinara a remissão do assunto ao auditor jurídico do Ministério, para parecer.
13) Ao Ministro das Finanças e do Plano, em 6 de Setembro, respeitante ao processo n.° 76/R-1347-A-2 e 1471
Na sequência da minha recomendação de 6 de Setembro de 1977 e por não aceitar as conclusões do parecer da Procuradoria-Geral da República referido no oficio do Gabinete do Sr. Secretário de Estado do Tesouro de 5 de Junho de 1978, insisto junto de V. Ex." para que dê seguimento às directrizes nela contidas.
Creio que, ainda que tivesse sido vontade histórica do legislador dar ao diploma em questão efeito retroactivo, a verdade é que, nos precisos termos do artigo 12.° do Código Civil, teriam de excluir-se da sua aplicação os direitos adquiridos, pois não vejo que possa, logicamente, ser outro o entendimento da disposição: «presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular», mesmo quando lhe seja atribuída eficácia retroactiva.
Nestas condições só me resta recomendar a V. Ex.a que profira despacho interpretativo no sentido de que o Decreto-Lei n.° 506/74, de 1 de Outubro,
Página 1990
1076-04)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ao revogar os Decretos-Leis n.os 48 605, de 4 de Outubro de 1968, e 92/73, de 30 de Março, não abrangeu os casos das pensões concedidas anteriormente à data da sua entrada em vigor.
Apesar da insistência, não houve, por parte do Ministério, até hoje indicação do seguimento dado a esta comunicação.
14) Aos Ministros das Finanças e do Plano e tíos Assuntos Sociais, em 19 de Setembro, referente ao processo n.° 78/IP-10-A-3
Considerando necessário que se proceda ao estudo da possibilidade de revisão do grau de incapacidade atribuída a trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho — independentemente da data da sua fixação inicial —, bem como do montante e forma de pagamento de indemnizações e pensões, solicito a V. Ex.a informação sobre a eventual existência de tais estudos ao nível desse departamento e, em caso afirmativo, indicação do seu estado de adiantamento e das soluções preconizadas.
Chamo igualmente a atenção para a injusta situação de desprotecção de muitos sinistrados durante a pendência dos respectivos processos em tribunal, a qual tem dado origem a múltiplas reclamações para este Serviço. Haverá que encarar a hipótese de lhes atribuir, automática e generalizadamente um determinado subsídio e ou de proceder à revisão das condições de fixação da pensão ou indemnização previstas no artigo 119.° do Código de Processo do Trabalho.
O Secretário de Estado do Tesouro comunicou, em 19 de Dezembro, ter enviado o ofício ao Ministro dos Assuntos Sociais, para estudo, indicando o Instituto Nacional de Seguros para nele colaborar, se tal fosse considerado conveniente. Entretanto, o Secretário de Estado da Segurança Social informou, em 23 de Novembro, afigurar-se-lhe difícil qualquer tipo de solução enquanto vigorar a Lei n.° 2127 e que, dado ter sido apresentado à Assembleia da República o projecto de lei n.° 63/1 em Junho de 1977, esperava que se iniciasse em breve o estudo de nova lei de protecção social às vítimas dos meios laborais.
Em face disso, foi enviado ao Sr. Secretário de Estado o oficio que a seguir se transcreve:
1 — Do Gabinete de V. Ex.a recebi o oficio n.° 22 485 (processo n.° 18/O-SS), de 23 de Novembro de 1978, pelo qual se pretende responder ao meu ofício n.° 8485, de 19 de Setembro de 1978.
Contudo, tal ofício limita-se, afinal, a ser uma mera transcrição dos esclarecimentos prestados pela Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais e que já eram, aliás, do conhecimento deste Serviço.
Por outro lado, na comunicação daquela Caixa faz-se alusão ao facto de haver sido apresentado à Assembleia da República o projecto de lei n.° 63/1 (cf. Diário da Assembleia da República, suplemento ao n.° 118, de 8 de Junho de 1977), da iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata (PSD), e
que assim terá sido o único até agora surgido sobre a matéria e cuja apreciação ainda não terá tido lugar.
2 — Ora naquele meu citado oficio — e por haver considerado necessário que se procedesse ao estudo da possibilidade de revisão do grau de incapacidade atribuído a trabalhadores vítimas de acidente de trabalho (independentemente da data da sua fixação inicial) bem como do montante e forma do pagamento de indemnizações e pensões — solicitara informação sobre a eventual existência de estudos ao nível desse Departamento e, a havê-las, a indicação do seu estado de adiantamento e soluções preconizadas.
Chamara também a atenção — e não será demais acentuar a importância deste aspecto — para a injusta situação de desprotecção de muitos sinistrados durante a pendência dos respectivos processos em tribunal e para a necessidade de se encarar a hipótese de atribuir àqueles, automática e generalizadamente, um determinado subsidio e (ou) de proceder a revisão de fixação de pensão ou indemnização provisórias e previstas no artigo 119.° do Código do Processo de Trabalho.
3 — Contudo, e relativamente a estes pontos, não me foi fornecida resposta ao oficio enviado, pelo que volto a insistir por ela e com a possível brevidade.
Parece-me, de resto, que uma matéria de tão relevante significado social merecerá toda a atenção dos departamentos ministeriais a ela ligados, designadamente a Secretaria de Estado, tanto mais que, pelas suas amplitudes e implicações, não pode nem deve confinar-se à iniciativa — ou à perspectiva — de uma única formação política.
15) Ao Ministro da Justiça, em 25 de Setembro, relativo ao processo n.° 78/FM724-A-2
Em 25 de Julho de 1978, deu entrada neste Serviço uma reclamação subscrita por Carlos Alberto Fernandes Cadilha, delegado do Procurador da República, e cuja fotocópia remeto em anexo para melhor esclarecimento de V. Ex.a
Têm-me sido expostas outras situações idênticas ou semelhantes de magistrados cuja carreira foi prejudicada por comprovadas razões políticas, anteriormente a 25 de Abril de 1974; é o caso, por exemplo, do juiz Dr. José Nuno de Almeida Valadas, e ainda do juiz Dr. Afonso de Azevedo Pinto e Meio.
Considerando de plena justiça as pretensões e queixas que apresentam, recomendo a V. Ex.a, dentro da competência que por lei me é atribuída, que se digne promover que seja promulgada medida legislativa que venha pôr fim a tal estado de coisas, determinando, designadamente, tal como se sugere na reclamação em referência:
a) Que se faça a graduação dos magistrados afectados por situações idênticas e análogas à descrita na citada reclamação, em resultado de comprovadas razões de ordem politica, no lugar que lhes compete
Página 1991
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(15)
nas correspondentes listas de antiguidade, mediante a extensão do disposto no artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 173/74; b) Que autorize a contagem de tempo de serviço prestado como subdelegado, na hipótese de ter sido através do exercício dessas funções que o interessado cumpriu a exigência da alinea b) do artigo 388.° do Estatuto Judiciário para a admissão a concursos por lhe ter sido recusada, pelas referidas razões de ordem poítica, a nomeação interna.
Em resposta o Ministro da Justiça mandou informar, nos termos do ofício que se transcreve:
Encarrega-se S. Ex.a o Ministro da Justiça de informar V. Ex.a de que as situações expostas por essa Provedoria através dos ofícios citados em referência, merecedoras embora de adequada tutela, não deverão, todavia, ser objecto de uma medida legislativa de que beneficiem apenas os magistrados exponentes ou quaisquer outros.
A adopção de uma providência, legislativa que contemple aquelas situações não deverá deixar de abranger os demais servidores do Estado que, por idênticos motivos, hajam sido lesados.
Por isso deverá ser encarada num contexto mais vasto, que, logicamente, transcende o âmbito deste Ministério.
16) Ao Presidente da Assembleia da República, em 27 de Setembro, respeitante ao processo n.° 78/R-1718-A-3
Em 3 de Janeiro de 1978 enviei ao Ministério do Trabalho, à Secretaria de Estado da Administração Pública e ao Instituto das Participações do Estado ofícios do teor daquele de que junto fotocópia.
Sem resultados práticos, pois a verdade é que não existe ainda no nosso País úm órgão encarregado de uniformizar as linhas gerais da gestão de pessoal no sector público.
No entanto, permito-me alertar V. Ex.a para um aspecto particular desta problemática que muito me vem preocupando: continua a ser muito comum, quer em serviços do Estado, quer noutras entidades oficiais (sobretudo empresas públicas), conferir preferência na admissão de novos trabalhadores aos parentes dos trabalhadores já no serviço da entidade que procede à admissão.
Esta prática, para além de parecer assentar numa estranha concepção — a de que os trabalhadores de um ente público têm, relativamente a ele, privilégios sobre os restantes cidadãos — é claramente inconstitucional, por violar o artigo 13.° da Lei Fundamental.
Já em tempos S. Ex.a o Ministro dos Assuntos Sociais, por despacho publicado no Diário da República, 2.8 série, de 17 de Agosto de 1977, proibiu expressamente que o parentesco com funcionários do serviço fosse considerado condição de preferência nas admissões em hospitais e estabelecimentos de saúde dependentes da Secretaria de Estado da Saúde.
Perfilho inteiramente os fundamentos de tal despacho que, de resto, se me afiguram aplicáveis a qualquer ente público.
Por tudo isto, não posso deixar de renovar o meu alerta a V. Ex.a, sugerindo a adopção de singela medida legislativa que ponha termo a tal estado de coisas. Sem prejuízo, evidentemente, do estudo da necessária uniformização das regras quanto a admissão e gestão de pessoal em todo o sector público a que já fiz referência.
O Ministério do Trabalho comunicou a este Serviço, em Novembro, que havia sido sobre esta recomendação prestada uma informação pela Direcção-Geral do Trabalho com a qual o Ministro concordara, e que, depois de várias conversações, concluía por entender que na concretização da revisão do regime jurídico do contrato individual de trabalho, seguramente a recomendação seria atendida, não parecendo, apesar do merecimento da sugestão, justificar-se a concretização de medida legislativa específica.
17) Ao Ministro da Justiça, em 19 de Outubro, referente ao processo n.° 78/R-706-B-4
Ao longo da curta duração deste Serviço tenho deparado com inúmeras situações de injustiça e mesmo ilegalidade emergentes de actos administrativos praticados pelas autarquias locais, a que, em boa verdade, não é possível pôr termo em ordem a salvaguardar os direitos dos administrados, dado que, nas mais vezes, pelo facto de tais deliberações serem constitutivas de direitos para terceiros, e ter decorrido o prazo para interposição do recurso contencioso, não é já possível à face da lei recomendar a revogação do acto administrativo em causa.
Tendo em conta esta preocupação e considerando que está em preparação a nova legislação sobre o contencioso administrativo, tenho por bem recomendar a V. Ex.a que o regime previsto no artigo 51.° do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo, no que respeita à fixação do prazo do recurso a interpor pelo agente do Ministério Público, seja tornado extensivo às auditorias administrativas.
Em Novembro, o Secretário de Estado da Administração Regional e Local mandou informar este Serviço de que no anteprojecto de lei do Governo, em estudo, está prevista a unificação de prazo de todos os recursos contenciosos passando sempre a ser de um ano o prazo de recurso do Ministério Público.
18) Ao Ministro da Justiça, em 7 de Dezembro, relativo ao processo n.° 76/R-924-A-3
A apreciação de algumas queixas que sobre o assunto me têm sido apresentadas e a revogação dos diplomas legais que expressamente consagravam regimes excepcionais e proteccionistas da habitação arrendada em território nacional pelos emigrantes portugueses leva-me a pensar numa solução de equilíbrio dos interesses em jogo, que não ignore integralmente a situação daqueles.
E assim é que, no pressuposto de que o «serviço particular por conta de outrem» referido na alínea b) do n.° 2 do artigo 1093.° do Código Civil abran-
Página 1992
1076-(16)
II SÉRIE - NÚMERO 47
gerá tão só o serviço prestado a residentes nacionais, ocorre-me pôr à consideração de V. Ex.a, com o pedido de parecer, a possibilidade e a oportunidade de introduzir àquela expressão o seguinte aditamento: «..., ainda que a entidade patronal seja estrangeira e não tenha sede ou sucursal em território português».
Até à data do fecho deste Relatório, não se recebeu qualquer indicação sobre a posição do Ministério sobre o assunto.
19) Ao Secretário de Estado da Administração Pública, em 14 de Dezembro, respeitante ao processo n.° 76/IP-9-A-2
1 — Pela Direcção-Geral da Função Pública, em Junho último, foi remetido a este Serviço um exemplar da «Proposta de lei — Princípios gerais de reestruturação das carreiras e do estatuto da função pública», elaborada nessa Secretaria de Estado.
2 — Aquela citada proposta de lei foi analisada em relação a situações que têm sido expostas em reclamações dirigidas ao Provedor de Justiça averi-guando-se que algumas delas, flagrantemente injustas, e cuja solução não tinha cobertura legal adequada, como se impunha, não estavam previstas nem eram resolvidas pelas normas contidas naquela lei de bases da função pública, como considero que seria pertinente, adequado e conveniente.
3 — Deste modo, foi feita uma seriação daquelas situações mais frequentemente e em maior número apresentadas neste Serviço e de mais flagrante injustiça, relacionando-as com disposições daquela futura lei de bases, na qual se considera necessário introduzir normas capazes de virem a dar apoio legal para a respectiva solução, que se impõe.
4 — A informação assim elaborada, que mereceu a minha inteira concordância, foi por mim entregue em mão ao então Sr. Ministro da Reforma Administrativa, Dr. Rui Pena, tendo ficado acordado que oportunamente este Serviço seria chamado a prestar colaboração nessa Secretaria de Estado com vista à elaboração da versão final da proposta daquela lei de bases da função pública, o que poderia mesmo ser feito em directa cooperação de representante deste Serviço com os técnicos dessa Secretaria de Estado que se ocupassem do assunto.
5 — Junto em anexo, para mais fácil esclarecimento de V. Ex.a, fotocópia da citada informação deste Serviço.
6 — Acontece, porém, que já posteriormente à elaboração daquela aludida informação, novas situações foram postas a este Serviço, em outras e frequentes reclamações, igualmente sem resolução justa, por falta de apoio legal, e que se me afigura deverem também ser previstas e resolvidas na futura lei de bases da função pública.
7 — São elas:
7.1 —A falta de estipulação legal de preferência conjugal na colocação dos funcionários públicos.
Com a publicação do Decreto-Lei n.° 13/78, de 14 de Janeiro, veio fixar-se a norma jurídica que estabelece certas preferências de ordem conjugal nos concursos para colocação de professores (norma que decorre, entre outras, de disposições do Decreto-Lei
n.° 263/77, alteradas pelo Decreto-Lei n.° 13/78; Decreto-Lei n.° 373/77, mantidas pelo Decreto-Lei n.° 13/78 e Decreto-Lei n.° 265/77, alteradas pelo mesmo Decreto-Lei n.° 13/78, e, ainda, do Decreto--Lei n.° 77/77, com conjugação com normas do Decreto-Lei n.° 262/77, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 13/78, já citadas).
Numerosas são as reclamações que: foram apresentadas neste Serviço relativas ao âmbito restrito que foi dado àquela norma legal, reivindicando a sua extensão para todo o funcionário público, quer quando casado com qualquer trabalhador da função pública, quer quando casado com empregado de empresas públicas ou nacionalizadas, quer mesmo, em alguns casos, para os casados com empregados de empresas privadas.
Foi até arguida a inconstitucionalidade daquela norma legal, aplicável só a casos especiais de docentes.
A Resolução n.° 88/78, de 1 de Junho de 1978, do Conselho da Revolução veio a não pronunciar-se pela sua inconstitucionalidade.
Reconheço ser assunto de extremo melindre e que requer estudo cuidadoso e aprofundado. Julgo porém que, a chegar-se à conclusão de ser justo e pertinente o alargamento do âmbito da preferência conjugal hoje só legalmente prevista em certos e restritos casos, que o princípio geral deveria ser incluído em norma da lei de bases da função pública.
Sou ainda de parecer que, a ser estabelecido o princípio da preferência conjugal em colocações de lugares de ingresso ou de acesso na função pública, aquele só deveria poder ser usado entre candidatos que apresentassem precisamente as mesmas condições que os outros e ainda que aquela preferência só deverá ser atendível entre candidatos a lugares públicos, não podendo ter-se em conta a colocação do cônjuge se não for também funcionário público.
7.2 — Funcionários que, por exclusiva culpa da Administração, são impedidos, dentro do prazo legal, de tomar posse do lugar em que são providos.
Como exemplo das situações referidas, citarei a V. Ex.a o caso constante de uma das reclamações que me foi apresentada, em 27 Setembro de 1978.
Uma servente do quadro do Liceu Nacional de D. Maria II, em Braga, foi nomeada continua do quadro do mesmo estabelecimento de ensino por despacho de 14 de Setembro de 1976, tendo sido publicada a respectiva nomeação no Diário da República, 2.a série, de 13 de Janeiro de 1977.
Aconteceu, porém, que a publicação passou despercebida no Liceu, por no extracto publicado não constar o estabelecimento de ensino para que aquela servente fora contratada, só tendo daquela tido conhecimento por uma exposição da interessada.
Em face dessa informação, foi rectificada e publicada de novo a nomeação da funcionária, cujo extracto foi publicado no Diário da República, 2.a séria, de 21 de Agosto de 1978, isto é, um ano e oito meses após a primeira publicação.
Deste modo, aquela funcionária, embora provida no cargo de contínua do citado Liceu desde 13 de Janeiro de 1977, data da primeira publicação da respectiva publicação, só após a publicação da rectificação daquela pôde tomar posse do respectivo lugar, unicamente a partir dessa data lhe sendo pago
Página 1993
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(17)
o vencimenrto e contado o tempo de serviço correspondente à sua nova categoria, face ao disposto no Decreto n.° 18 381, de 24 de Maio de 1930.
Nestes termos, tenho a honra de recomendar a V. Ex.a, dentro da competência que a lei me confere, se providencie pela publicação de disposição legal estabelecendo que, quando um funcionário é impossibilitado, por exclusiva culpa da Administração, de tomar posse do lugar em que for provido, a respectiva posse passa a produzir todos os efeitos legais (nomeadamente quanto a vencimento e a contagem de tempo de serviço na nova categoria) a partir da data do primeiro dia em que poderia fazê-lo se a tal não tivesse sido impedido por exclusiva culpa da Administração.
Considero ainda que a publicação imediata da disposição legal supracitada não deve prejudicar a sua futura inclusão em novo número a aditar ao artigo 13.° da proposta de lei de bases da função pública em referência, onde julgo a sua inserção adequada, pertinente e justa.
8 — Considerando que as medidas legislativas que, quer na informação anexa, quer nos n.os 7.1 e 7.2 do presente ofício, se propõem se fundamentam em reais e concretas situações de flagrante injustiça e cuja adequada resolução se torna impossível por actual falta de apoio legal que se impõe e por me parecer ser a lei de bases da função pública o diploma adequado para inclusão das normas propostas, tenho a honra de recomendar a V. Ex.a que estas sejam tidas na devida conta aquando do estudo e elaboração da versão final da citada Lei de Bases.
20) Ao Secretário de Estado da Segurança Social, em 28 de Dezembro, referente ao processo n.° 77/R-241-A-2
1 — A coberto do oficio n.° 5318, de 27 de Junho de 1977, tive a honra de remeter ao Gabinete de V. Ex.a fotocópia de uma exposição que, em 28 de Maio de 1976, Adriano Amaro Carlos Barata Lopes dirigiu ao então Secretário de Estado da Segurança Social solicitando informação acerca do despacho ministerial que sobre a mesma tivesse recaído.
2 — Em referência àquele ofício, foi, a coberto do ofício n.° 27 283, de 7 de Dezembro de 1977, desse Gabinete, remetida a este Serviço fotocópia do parecer da Auditoria Jurídica desse Ministério, sobre o qual, em 2 de Dezembro de 1977, foi exarado despacho de concordância do então Secretário de Estado da Segurança Social.
3 — Pelo constante naquele parecer, que se apoia em factos mencionados no ofício n.° 12154, de 29 de Julho de 1977, da 3." Repartição da Direcção--Geral da Previdência e do que nesse oficio é exposto, concluo que:
a) Para seriação dos funcionários nas categorias de inspectores de l.a e 2." classes, com vista à sua inclusão na relação nominal de pessoal a que se refere o artigo 28.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 228/73, de 12 de Maio, foi adoptado o critério da antiguidade no serviço consecutivo prestado no respectivo Ministério;
b) Tal critério afigura-se-me ilegal, por contrá-
rio à disposição expressa do n.° 1 do mesmo citado artigo, que determina que na inclusão do pessoal na referida relação nominal terão de ser respeitados, conjuntamente, as habilitações legais, a aptidão e a antiguidade no serviço daquele pessoal;
c) Por sua vez, não sendo explicita aquela dis-
posição quanto ao significado concreto que deve atribuir-se à «antiguidade no serviço» (antiguidade no serviço público, naquele serviço, na categoria?), parece-me, por todo o contexto do artigo, que aquela expressão devia ter sido entendida como reportando-se a todo o tempo de serviço nesse Ministério do pessoal em causa.
E, assim sendo, considero que foi igualmente ilegal a contagem de tempo de serviço que aos componentes daquela relação foi feita, ao tomar em conta só o serviço continuado exercido até àquela citada data;
d) Daquela contagem foi, portanto, prejudicado
o reclamante Adriano Amaro Carlos Barata Lopes, e quiçá outros, igualmente, visto não lhe terem sido contados os três anos e dois meses em que exerceu funções nesse Ministério antes do seu pedido de exoneração, só lhe tendo sido contado o tempo de serviço continuado depois de, em 11 de Fevereiro de 1967, ter reingressado no mesmo.
4 — Seria, assim, aconselhável uma revisão total da relação nominal de pessoal que foi publicada e entrou em vigor, nos termos do artigo 28.° do Decreto-Lei n.° 228/73, com uma reformulação em que fossem tidos em conta, conjuntamente, os três requisitos, cujo respeito o n.° 2 do referido artigo 28.° do Decreto-Lei n.° 228/73 impõe.
5 — Tal não se me afigura, porém, agora já possível, visto nem o reclamente, nem outros possíveis ilegalmente prejudicados por efeito da mesma relação, terem desta recorrido em tempo, graciosa ou contenciosamente, e as alterações eventualmente a resultar daquela revisão irem prejudicar direitos adquiridos de outros pela mesma beneficiados.
6 — Acontece, porém, que, conforme o reclamante me informou, em 12 de Outubro de 1978, em razão da reestruturação da Inspecção de Segurança Social, imposta pelo n.° 1 do artigo 40.° do Decreto-Lei n.° 549/78 (Lei Orgânica da Segurança Social), o projecto de decreto regulamentar que se encontra na fase de apreciação prevê a colocação do pessoal, por lista a publicar, em função da antiguidade dos actuais funcionários nas respectivas categorias, entre outras condições.
7 — Obviamente que, a assim ser, o reclamante e outros que tenham sido prejudicados na categoria que lhes deveria ter sido atribuída (no caso concreto do reclamante, de inspector de l.a classe), pela aplicação ilegal e incorrecta do critério adoptado para a elaboração da lista nominal do pessoal referida na alínea a) do n.° 3 do presente oficio, voltarão a ser prejudicados na categoria que lhes vier a ser fixada
Página 1994
1076-(18)
II SÉRIE — NÚMERO 47
na lista a publicar em função da reestruturação da Inspecção imposta pelo n.° 1 do artigo 40.° do De-creto-Lei n.° 549/78, o que se me afigura injustiça que há que impedir.
8 — Nestes termos e dentro da competencia que a lei me confere, tenho a honra de recomendar a V. Ex.a que nas regras a estabelecer no referido diploma regulamentar quanto ao critério para a reclassificação dos inspectores da Inspecção de Segurança Social seja introduzida cláusula que venha a permitir que para aqueles inspectores que por aplicação de critério ilegal de única contagem de tempo de serviço continuado, com exclusão de outro, interca-ladamente, prestado nesse Ministério foram prejudicados na categoria que lhes foi atribuída na lista nominal publicada no Diário da República, de 22 de Junho de 1973, rectificada, quanto ao reclamante, no Diário da República, de 17 de Dezembro de 1973, seja contado para efeitos da referida reclassificação o tempo de serviço prestado nesse Ministério e naquela data ilegal e indevidamente não tido em conta.
Em 26 de Dezembro, a Secretaria de Estado da Administração Pública informou, por encargo do Sr. Secretário de Estado, ter sido enviada fotocópia deste ofício à Direcção-Geral da Função Pública, para conhecimento e oportuna consideração.
21) Ao Ministro da Justiça, em 22 de Fevereiro, relativo ao processo n.° 76/R-75A-3
Foi oportunamente dirigida ao Serviço do Provedor de Justiça uma exposição — dela e do documento que a acompanhou envio, para melhor esclarecimento, as inclusas fotocópias — em que, fundamentalmente, se equaciona a questão da impossibilidade da substituição do tutor de um interdito, problema esse que, de imediato, aponta para a eventualidade de carácter económico — em resultado daquela impossibilidade.
Efectivamente, o Código Civil de 1966 não consente a chamada «escusa de tutela» senão na hipótese expressamente consagrada no n.° 1 do seu artigo 146.°, ou seja, na de ter ocorrido violação da regra de deferimento estabelecida no artigo 143.° (o que acontece igualmente com o condicionalismo envolvente da exoneração do cargo de tutor, sem prejuizo do disposto no n.° 2 do artigo 146.° citado e das suas limitações).
Foi assim seguido, e sem especial originalidade, o regime estabelecido nos Códigos Civis italiano (artigo 426.°), francês (artigo 508.°) e venezuelano (artigo 402.°), o qual, porém, se apresenta envolvido e marcado por uma rigidez que será incompatível (ou poderá ser incompatível) com a realidade concreta de muitas situações e, até, com a própria finalidade do instituto.
Aliás, deste regime, poderá até dizer-se que não será adequado ao princípio da livre revogalidade das decisões que caracteriza os chamados processos de jurisdição voluntária, onde, de pleno, deveriam caber, e decerto cabem, as vicissitudes que, na prática, possam envolver o funcionamento capaz e eficiente da tutela e o escapo que, através dela, se pretende atingir.
Desta forma e dentro do espírito que animou as recentes alterações contidas no Decreto-Lei n.° 496/77, de 25 de Novembro, pensa-se que se poderá e deverá ponderar numa fixação legislativa de casos susceptíveis de determinarem uma mais ampla possibilidade de escusa de tutela (ou de exoneração do cargo de tutor), designadamente nas hipóteses em que a indicação para o cargo ou a manutenção nele se revelem prejudiciais para o tutelado, precisamente na medida em que a debilidade económica do tutor contribua para um exercício improfícuo e ineficiente da sua função.
Nas alterações ultimamente consagradas não foi expressamente considerada toda essa problemática, havendo-se mesmo mantido o artigo 146.° do Código Civil de 1966; é lícito, porém, pensar-se que se abriu caminho para a valoração de condicionalismos como o apontado e tal convicção será tanto ou mais segura quanto se poderá ver no n.° 2 do artigo 143.°, agora com nova redacção, um embrião de uma futura reformulação que satisfaça ao exposto.
Eis o que me permito levar à consideração de V. Ex.a, certo de que me manterá ao corrente da atenção que o que acabo de expor possa vir a merecer.
Até ao encerramento deste relatório não foi recebida qualquer resposta do Ministério da Justiça sobre esta questão.
22) Ao Ministro da Relorma Administrativa, em 18 de Maio, relativo ao processo n.° 78/RS58-A-2
Tendo-me sido apresentadas várias reclamações relativas ao regime de subsidio de férias na função pública que me parecem fundamentadas, especialmente se se tiver em consideração o sistema vigente no sector privado, recomendo a V. Ex.a a breve alteração do_mesmo, no sentido, designadamente, de que os agentes que cessam a sua relação de emprego antes do mês de Junho possam receber i subsídio correspondente do período de férias a que tenham direito. Conviria, aliás, confrontar todo o regime com os mínimos legais do sector privado, a fim de, na medida do possível, estabelecer a desejada similitude.
Em 18 de Julho, o Sr. Ministro mandava, por ofício, comunicar o seu despacho de 16 desse mês, do seguinte teor:
Concordo. As questões suscitadas serão resolvidas, após o equacionamento a que neste momento se procede, através de diploma a aprovar no âmbito da autorização legislativa que a Assembleia da República recentemente nos concedeu.
Comunique-se ao Provedor de Justiça.
Depois desta data não houve mais notícia e, certamente por virtude da substituição do Governo, não chegou a ser aprovado o diploma referido no despacho. É de esperar, porém, que, quando o vier a ser, as questões suscitadas não deixem de ser resolvidas.
Página 1995
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(19)
23) Ao Presidente da Assembleia da República e ao Primeiro-Ministro, referente aos processos n.os 77/IP-41, 78/R-655 e 78/R-659
Têm-se dirigido ao Provedor de Justiça muitos cidadãos titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas que, por ainda não haverem recebido as indemnizações a que têm direito por virtude da nacionalização, se encontram impossibilitados de solver compromissos assumidos para com entidades públicas, designadamente o Estado, a banca nacionalizada e a Caixa Geral de Depósitos.
Esta situação, para além da imoralidade patente na circunstância de o Estado, directamente ou através de uma das muitas entidades que prosseguem fins públicos, exigir a satisfação de créditos a quem é credor do próprio Estado, provoca prejuízos, quantas vezes irreparáveis, sobretudo porque os entes públicos não se coibem de enviar a juízo os seus devedores.
Perante a gravidade de tal situação impõe-se a adopção de medidas legislativas que dêem protecção aos cidadãos que, sem culpa alguma, se encontram nestas situações deploráveis.
Neste sentido, o Provedor de Justiça recomenda:
1) Que seja concedida uma moratória legal aos
débitos para com entidades públicas, designadamente o Estado, a banca nacionalizada e a Caixa Geral de Depósitos, desde que os respectivos devedores sejam titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas, até pagamento das indemnizações a que têm direito;
2) Que se suspenda a instância nas acções exe-
cutivas de despejo e providências cautelares em que sejam autores entidades públicas quando sejam réus ou executados titulares de participações sociais de empresas nacionalizadas até pagamento das indemnizações a que têm direito.
As medidas propostas encontram ainda justificação na necessidade de assegurar a utilidade do disposto nos artigos 30.° e 31.° da Lei n.° 80/77, de 26 de Outubro, sem uma moratória que abranja as dívidas fiscais relativas ao ano de 1976, tendo em conta que a lei ainda carece de regulamentação e que o processo para emissão dos títulos representativos do direito à indemnização é complexo e moroso, o dispositivo contido naqueles preceitos legais resultaria ineficaz — o que não poderá ter sido querido pelo legislador.
Posteriormente, em 3 de Maio, remeti ao Sr. Presidente da Assembleia da República o seguinte ofício:
Vêm sido recebidas neste Serviço numerosas reclamações insurgindo-se contra o não cumprimento atempado do preceituado no artigo 30.° da Lei n.° 80/77, de 26 de Outubro, que não estará a ser tomado em consideração pela administração fiscal.
Considerando a acuidade e urgência da questão — até para que o mencionado artigo não perca o seu efeito útil —, que já me levou a dirigir a S. Ex.a o Primeiro-Ministro a recomendação de que junto fotocópia, permito-me solicitar a V. Ex.a que se digne informar-me se es-
tá prevista e para quando a discussão, por essa Assembleia, de diploma legal que a contemple, nomeadamente do projecto de lei n.° 73/1, que, em 24 de Novembro de 1977, terá baixado à Comissão de Economia, Finanças e Plano, para discussão e votação na especialidade, ou outro com idêntica finalidade.
Posteriormente foi publicada a Lei n.° 28/78, de 9 de Junho, e o Decreto-Lei n.° 355/78, de 25 de Novembro, os quais, porém, apenas resolvem o problema quanto ao pagamento de impostos directos, ficando ainda por resolver o pagamento dos demais débitos ao Estado.
CAPÍTULO V
Pedidos de apreciação de inconstitucionalidade
a) Critério orientador
No relatório de 1977, definiu-se o critério orientador que o Provdeor de Justiça entendia dever seguir relativamente aos pedidos de uso da prerrogativa que lhe confere o artigo 281.° da Constituição que lhe foram dirigidos.
Não se vê qualquer razão válida para alterar o critério então fixado, o qual, pois, foi mantido e, assim, como se verá nalguns casos adiante enumerados, em caso de dúvida sobre a inconstitucionalidade de uma norma, não se usou da prerrogativa constitucional de solicitar ao Conselho da Revolução a declaração da sua inconstitucionalidade.
0) Processos arquivados antes de concluído o seu estudo
1) Processo n.° 78/DI-3-A-3
Inconstitucionalidade das disposições dos artigos 2.° e 3.° do Decreto-Lei n.° 645/76, de 30 de Julho (pluriemprego na comunicação social).
Arquivado por, entretanto, a Assembleia da República ter aprovado a Lei n.° 12/78, de 21 de Março, que revogou aquelas disposições.
2) Processo n.° 78/DI-10-A-2
Inconstitucionalidade material do artigo 23.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, relativamente à possibilidade de se impor a pena de demissão para as infracções mais graves, que assim se equipara à pena de morte do direito penal.
Arquivado liminarmente, elucidando-se o peticionário de que não se vê o menor fundamento válido para satisfazer a sua pretensão, e por a pena de demissão para as infracções mais graves ser indissociável de qualquer regime disciplinar de funcionalismo público.
3) Processo n.» 78/DI-13-A-3
Inconstitucionalidade do despacho n.° 9/78, datado de 31 de Janeiro, e publicado no Diário da República, 2.a série, de 3 de Fevereiro, do Ministro da
Página 1996
1076-(20)
II SÉRIE - NÚMERO 47
Educação e Investigação Científica sobre a greve de professores.
Arquivado, em virtude de o Provedor já haver tomado posição no processo n.° 78/R-205-A-2 em reclamação idêntica apresentada pelo Sindicato dos Professores da Área da Grande Lisboa.
c) Processos estudados e concluídos em que se não usou da prerrogativa do artigo 281.° da Constituição.
1) Processo n.° 78/DI-2-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 439/77, de 25 de Outubro.
Parecer do assessor, Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou:
O Decreto-Lei n.° 439/77 é um diploma de índole acentuadamente técnica e cujos objectivos não se vê como possam ser mais do que meramente estatísticos.
Não se vê, pois, como se poderá considerar «legislação do trabalho» para os efeitos previstos na alínea d) do artigo 56.° da Constituição Política.
E é de pasmar a afirmação sindical de que a inexistência de sanção para a omissão da indicação do volume de vendas da empresa nos exemplares a enviar aos sindicatos e a afixar no local de trabalho viola o «controle de gestão», garantido pela alínea b) do artigo 56.° da Constituição: por um lado o direito ao controle não é reconhecido aos trabalhadores; por outro, triste controle que sò se pode fazer a partir dos volumes de vendas indicados pelas empresas!
2) Processo n.° 78/DI-7-A-3
Inconstitucionalidade da Portaria n.° 38-A/78, de 19 de Janeiro.
Parecer do assessor, Dr. João Caupers, que teve concordância do Provedor:
Não vejo qualquer viabilidade nesta reclamação: da sua análise resulta que os reclamantes se pronunciam contra um aspecto de alegada injustiça retributiva na Portaria n.° 38-A/78, de 19 de Janeiro. Não se trata de uma baixa de retribuição (v. artigo 20.° da portaria), mas de uma alegada violação do artigo 13.° da Constituição Política — princípio da igualdade [admito que se trate de um lapso, pois os reclamantes estavam a pensar na alínea a) do artigo 53.° — a trabalho igual, salário igual — e não no artigo 13.°].
Acontece, porém, que não encontro provas mínimas daquilo que os reclamantes afirmam: só através de uma cuidada análise de funções, seguida de um adequado estudo de carreiras profissionais, se poderiam fazer juízos sobre as alegadas injustiças, incorrecções e inconveniências da tabela salarial dos trabalhadores de repografia e microfilmagem. Com que fundamentos se iria dizer à SESS que um técnico de 1.a classe de reprografia devia ganhar 16 300$ e não 14 600$? Ou que a justiça impunha que um encadernador de 2.a classe ganhasse 11 000$ e não 8600$? Como pode o princípio «salário igual para
trabalho igual» impor que um operador de reprografia de 2." classe ganhe o mesmo que um operador de 1.» classe de microfilmagem — 11 0002 — se fazem duas coisas certamente diversas e não disponho de «metro» para as comparar?
Parece-me evidente que carecemos de respostas para estas questões. E também me parece claro que, à semelhança do que se tem feito em casos análogos, o Provedor não deve nelas intervir: por um lado, teria de requerer técnicos competentes, possivelmente à SEPE; por outro, onde nos levaria o precedente?
Em conclusão, propõe-se a rejeição da reclamação.
3) Processo a.» 78/DI-8-A-2
Inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 19/78, de 21 de Janeiro.
Proposta da assessora, Dr." Maria de Lurdes Garcia:
Propõe-se à consideração superior que, usando da competência que lhe é conferida pelo artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, o Sr. Provedor de Justiça solicite ao Conselho da Revolução a apreciação da provável inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 19/78, do Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, publicado no Diário da República, de 21 de Janeiro, por parecer que este diploma, ao proibir a admissão de pessoal que preste funções, a qualquer título, em serviço dependente do Ministério, sem previamente ter sido assegurado que o mesmo pode ser dispensado sem inconvenientes para o respectivo serviço, está a ofender os preceitos constitucionais respeitantes à liberdade de trabalho e igualdade de oportunidades, constantes do n.° 3 do artigo 51.° e da alínea c) dc artigo 52.°
Parecer do coordenador, Dr. Oliveira Guimarães: Penso que tem pertinência.
Para além da questão da inconstitucionalidade levantada, poderá ,;rer-se ainda que o despacho normativo em causa è susceptível de vir a dificultar a própria integração orgânica que o recente Decreto-Lei n.° 549/77, de 31 de Dezembro, buscou definir em termos de assegurar a efectiva criação e capaz funcionamento de um sistema de segurança social unificado (previsto na Constituição) e que exigirá, sem dúvida, precisamente uma maior mobilidade do pessoal adstrito ao sector (o que o referenciado despacho parece não ter tido em grande conta).
Despacho do Provedor:
Logo na primeira ocasião em que se me pôs o problema de suscitar a apreciação, pelo Conselho da Revolução, da inconstitucionalidade de um diploma, defini a minha orientação a tal respeito.
Porque considero que a solicitação de tal apreciação e declaração é uma prerrogativa concedida às entidades referidas no n.° 1 do artigo 281.°, que visa a defesa da Constituição em ordem a garantir o respeito pelo seu cumprimento, sempre entendi que o uso de tão importante prerrogativa não pode nem deve ser banalizado e antes só deve ter lugar, quando a entidade que a exerce está convencida de que a
Página 1997
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(21)
norma cuja apreciação e declaração de inconstitucionalidade solicita é, efectivamente, inconstitucional, não devendo, em caso de dúvida, suscitar o problema.
Assim, se ao Provedor, que é a hipótese que me interessa, for requerido o uso da prerrogativa, não deverá ele arvorar-se em simples transmissor de tal requerimento, pois que só fundadamente, e com apoio nas suas próprias razões e na sua própria convicção, poderá e deverá, justificando, ainda que não exaustivamente, suscitar a apreciação e declaração de inconstitucionalidade.
Este o critério que desde o início defini, que sempre mantive e não vejo razão válida para modificar.
No caso que me é posto não tenho sequer dúvida de que se não está em presença de uma inconstitucionalidade.
Com efeito, não vejo onde estará a ofensa à liberdade de trabalho contemplada no n.° 3 do artigo 51.°, nem à igualdade de oportunidades na escolha da profissão estabelecida na alínea c) do artigo 52.°
Vejamos:
Ao estipular que todos têm direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade, o n.° 3 do artigo 51.° alerta-nos para que se tenha presente que a nossa Constituição se orienta no sentido de uma filosofia política própria de um Estado democrático, sem dúvida, mas em transição para o socialismo, pois Portugal é uma república soberana empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes (artigos 2.° e 1.°).
Quer isto dizer que, se o interesse colectivo, o interesse da sociedade em transformação, rumo à meta socialista, não pode destruir a liberdade individual, pois que o Estado é democrático, a verdade é também que o interesse individual tem de ceder perante o interesse colectivo, porque o Estado já não é essencialmente um Estado liberal, mas sim em transição para o socialismo.
Quer dizer, liberdade individual e interesse colectivo têm de harmonizar-se mas tendo presente que, sem destruir a liberdade individual, tem de, sempre que o interesse colectivo o exija ou recomende, subordinar-se aquela a este.
Por isso mesmo é que o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, está sujeito às restrições legais impostas pelo interesse colectivo e inerentes à própria capacidade do trabalhador.
Ora, e por exemplo, o interesse colectivo exige que os postos de trabalho sejam, em cada sector da vida social, os necessários para preencher a necessidade do sector, para, no plano nacional, assegurar o pleno emprego e se não gere pel. incontrolada procura de certas profissões ou géneros de trabalho, ou a pletora de empregados, para além das necessidades do sector, ou o desemprego. Daí que hoje se lance mão da planificação do próprio trabalho, se procure encaminhar para certas profissões através da orientação profissional, evitar os excedentários e o desemprego, por meio de numerus clausus nas escolas que habilitam para certas profissões,
Isto tem de ser feito, mas com o cuidi o de não transformar o trabalho em forçado, respeitando na
medida do possível a liberdade de escolha que é um direito ou liberdade fundamental, sem dúvida, mas que como todo o direito não pode ser exercido com abuso, e o abuso, neste caso, significa o desprezo pelo interesse colectivo que terminaria por conduzir à negação do próprio direito ao trabalho, mais importante ainda do que o de ter a liberdade de escolha de profissão, já que o direito ao trabalho é primordial para a garantia da sobrevivência e da dignidade de vida.
Claro que não se pode ir até ao ponto de, ao planear o trabalho, tal como se tem de planear a produção, a vida colectiva em suma, se chegar ao absurdo da abolição da possibilidade de escolha de profissão e do género de trabalho, para que não possa criar-se uma forma autoritária de imposição de escolha de uma profissão, ou uma forma de pressão consistindo em diferenciações autoritárias e descriminações revoltantes.
O que é indispensável é que, tendo presente a necessidade que o plano nacional de produção e de emprego aponte, a liberdade de escolha possa exercer-se com as limitações que resultem tão-só das capacidades do próprio trabalhador, das possibilidades de ordem económica, da defesa do pleno emprego, do interesse geral, portanto, dentro do princípio de que o direito ao trabalho é inseparável do dever de trabalhar, e que o interesse colectivo obrigará a que a ele se sacrifique, sempre que necessário, o interesse individual. Ora, não se vê onde é que o facto de a um trabalhador já a exercer a profissão em serviço dependente de um determinado Ministério — neste caso concretamente a trabalhar nos sectores da saúde e da segurança social do Ministério dos Assuntos Sociais — se proibir a sua admissão, seja a título definitivo, seja eventual, sem previamente se certificar se ele é já funcionário ou trabalhador de qualquer outro serviço dependente do mesmo Ministério e se daí pode ser afastado sem inconvenientes, possa considerar-se lesivo do seu direito de livre escolha de profissão ou género de trabalho.
Não há proibição, pois que se ele puder ser dispensado sem inconveniente ele poderá ser admitido. O que há — mas sem discriminação porque a condição se aplica a todos — è tão-só que observar a condição de admissão: pode ser dispensado do serviço onde está sem inconveniente para o mesmo. Isto é, há que verificar se, com a dispensa para poder ser admitido noutro serviço, não é prejudicado o serviço donde será dispensado, e se, portanto, o interesse colectivo aqui representado pela melhor prestação de serviço à colectividade não é afectado pela dispensa do trabalhador de um serviço para outro, dentro da mesma organização de trabalho, portanto, um e outro dependentes do mesmo serviço central.
E é preciso não esquecer que a medida preventiva, digamos assim, instituída pelo despacho normativo, visa evitar situações que favorecem a acumulação dos funcionários nos grandes centros urbanos e a rarefacção ou falta absoluta deles rios serviços periféricos, com graves prejuízos para as populações do interior do País, que ficam sem a cobertura sanitária mínima indispensável, como o preâmbulo do despacho salienta, e, consequentemente, sem ter em conta que é para casos desses, de manifesto interesse colectivo, que o n.° 3 do artigo 51.° da Consti-
Página 1998
1076-(22)
II SÉRIE — NÚMERO 47
tuição admite e impõe restrições legais ao direito de escolher livremente a profissão ou o género do trabalho, sendo certo que a medida preventiva nem sequer ofende essa liberdade.
Da mesma forma que, no interesse da sociedade, não pode atingir a liberdade de escolha de profissão ou de género de trabalho a exigência de um certo grau de instrução, de preparação profissional, de aptidão física, também não pode atingir essa liberdade a não permissão de admissão num serviço sujeito à mesma dependência geral de outro, quando ainda que podendo beneficiar aquele o trabalhador não possa ser dispensado sem prejuízo deste último.
Relativamente à possível ofensa à igualdade de oportunidades prescrita na alínea c) do artigo 52.°, afigura-se-me que, além de ser possível interpretá-la como apenas se ter querido evitar que a escolha possa ser discriminada em função do sexo, não me parece que, de algum modo, o despacho normativo ofenda a igualdade de oportunidades na escolha da profissão.
É que qualquer funcionário ou trabalhador tem a mesma oportunidade de ser admirido definitiva ou eventualmente noutro serviço, sujeito à mesma condição que para todos é igual, desde que possa ser dispensado do serviço em que se encontre no Ministério dos Assuntos Sociais sem inconveniente para esse serviço.
São todos os funcionários e trabalhadores de qualquer serviço ou estabelecimento dependente do Ministério que ficam sujeitos à verificação prévia da não inconveniência da sua admissão, todos eles, pois, ficam na mesma situação, não há qualquer discriminação baseada em sexo, religião, ideologia ou outra que ofenda a igualdade dos cidadãos, mas uma condição de admissão que a todos é imposta igualmente.
E, se essa condição pode não beneficiar o trabalhador, a verdade é que ela é imposta em beneficio do interesse e da necessidade do serviço, logo do interesse colectivo, das necessidades sociais que sobrelevam ao interesse individual. Já contenderia com a liberdade de escolha de profissão e género de trabalho a proibição genérica, e sem remissão da proibição pura e simples, de um trabalhador de um serviço ou dependência do Ministério ser admitido noutro serviço ou noutra dependência. Mas, como se viu, não é esse o caso.
Em conclusão, e ainda que compreendendo as dúvidas que levaram a Sr.a Dr." Assessora e o Sr. Coordenador a proporem-me que suscite a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do despacho normativo referenciado, entendo, pelas razões expostas, não usar da prerrogativa do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição.
. 4) Processo n.» 78/DJ-9-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 68/77, de 17 de Outubro, e da Portaria n.° 38-A/78, de 19 de Janeiro.
Parecer do assessor, Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou:
1 — O Decreto Regulamentar n.° 68/77, de 17 de Outubro, dispõe que a regulamentação de trabalho
dos trabalhadores das instituições de Previdência Social será fixada por portaria dos Ministérios do Trabalho e dos Assuntos Sociais *» da Secretaria de Estado da Administração Pública. Dispõe também que tal portaria será feita com tuse num projecto elaborado por um grupo de trabalho do qual, além dos representantes dos departamentos referidos, farão parte representantes dos sindicatos dos trabalhadores da Previdência.
2 — Tal grupo de trabalho produziu a Portaria n.° 38-A/78, de 19 de Janeiro. Na sua elaboração não participaram representantes sindicais, apesar de instados pela Secretaria de Estado da Segurança Social a fazê-lo (cópias dos ofícios no processo).
3 — Quando o Decreto Regulamentar n.° 68/77 foi publicado já tinham começado — e sido interrompidas — as negociações para revisão do contrato colectivo de trabalho de 1976.
4 — Por pressão do Ministério do Trabalho, ao que parece, a Secretaria de Estado da Segurança Social recusou rever a convenção colectiva de trabalho, tendo em conta não só o disposto no n.° 4 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 887/76, de 29 de Dezembro, mas também o artigo 63.° da Constituição.
5 — Os sindicatos representativos dos trabalhadores da Previdência entendem que a Portaria n.° 38-A/78, como o Decreto Regulamentar n.° 68/77, são inconstitucionais por negarem o direito à contratação colectiva — artigo 58.°, n.° 3, da Constituição — e por, quanto ao Decreto Regulamentar n.° 68/77, não terem sido ouvidos — artigo 58.°, n.° 2, alínea a), da Constituição.
6 — 0 Decreto Regulamentar n.° 68/77 encontra os seus fundamentos na já referida norma do n.° 4 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 887/76: se se quiser defender o direito à contratação colectiva dos trabalhadores da Previdência parece cue se deverá pôr em causa aquela norma e não o Decreto Regulamentar n.° 68/77; entender-se-ia então que aquela norma violaria o n.° 3 do artigo 58." da Constituição. Acontece que o Decreto-Lei n.° 887/76 já está a ser apreciado no âmbito do Decreto-Lei n.° 3/77.
7 — Quanto à violação do n.° 2, alínea a), do artigo 58.° da Constituição pelo Decreto Regulamentar n.° 68/77 — falta de participação dos trabalhadores — entendemos que não procede: o Decreto Regulamentar n.° 68/77 não é legislação de trabalho — isso é-o, sim, a Portaria n.° 38-A/78. Só que, nessa, os representantes dos trabalhadores não participaram porque não quiseram.
8 — O problema de fundo reside em saber se o disposto no n.° 4 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 887/76, infringe o disposto no n.° 3 do artigo 58.° da Constituição, ofendendo o direito à contratação colectiva e sendo, pois, materialmente inconstitucional.
9 — O Decreto-Lei n.° 887/76 não reconhece aos trabalhadores do Estado, autarquias locais e serviços municipalizados, por um lado, e instituições de Previdência, por outro, o direito de verem as suas condições de trabalho reguladas por convenções colectivas, remetendo, no primeiro caso para lei especial, no segundo para diploma específico dos Ministérios da Administração Interna, das Finanças e do
Página 1999
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(23)
Plano, do Trabalho e dos Assuntos Sociais, a regulamentação de tais condições.
10 — Se no que toca aos trabalhadores do Estado, autarquias e serviços municipalizados a disposição encontra fundamento directo na alinea m) do artigo 167.° da Constituição, jà no que toca aos trabalhadores das instituições de Previdência a fundamentação constitucional é mais delicada.
11 — Em qualquer caso, tal fundamentação terá de assentar no artigo 63.° da Constituição, que comete ao Estado o encargo de «organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado».
12 — É deste encargo que se tem de partir para a consideração de que os trabalhadores das instituições de Previdência, trabalhadores encarregados da execução de um fim do próprio Estado, deverão ter um regime laboral tendencialmente análogo ao dos trabalhadores do Estado. Afigura-se, de facto, constitucionalmente lógica a integração dos trabalhadores da Previdência na função pública.
13 — É até possível que já tenha sido a pensar nos trabalhadores da Previdência — e em outros — que o legislador constitucional — artigo 167.°, alínea m) —, cometeu à Assembleia da República competência exclusiva para legislar sobre o «regime e âmbito da função pública».
De facto, a Assembleia da República poderá muito bem vir a incluir estes trabalhadores na função pública.
14 — Claro que a Constituição não nega aos trabalhadores da Previdência, como aos da função pública, o direito de terem convenções colectivas de trabalho: acontece, porém, que devendo estes instrumentos ser negociados com a Administração, parece compreensível e aceitável que esta não queira negociar antes de a Assembleia da República ter legislado sobre o regime e âmbito da função pública.
15 — Aliás, nada leva a crer que a Assembleia da República venha a retirar tal direito aos trabalhadores em questão: ela limitar-se-á, provavelmente, a produzir uma lei de bases sobre a matéria, sem impedir que os trabalhadores negoceiem com a administração a concretização das suas condições de trabalho.
16 — Nem se diga que assim se nega, na prática, o direito à contratação colectiva dos trabalhadores da Previdência e da função pública pois, no que concerne a este direito, a própria Constituição estabelece restrições: se a alínea m) do artigo 167.° não proíbe a contratação colectiva na função pública, a verdade é que constitui um condicionamento a essa contratação, ao pressupor a existência de uma lei reguladora do regime e âmbito da função pública que, fatalmente, irá conter normas que limitarão a matéria a negociar colectivamente e o sentido de tal negociação.
17 — Parece, pois, admissível que a lei ordinária do Governo, ao regular a negociação colectiva, determine a sua não aplicação a funcionários públicos e trabalhadores da Previdência, aguardando que a Assembleia da República defina o âmbito e regime da função pública.
18 — Não creio assim que o n.° 4 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 887/76, seja inconstitucional materialmente; e, pelo que atrás deixo dito, o mesmo se
diga do Decreto Regulamentar n.° 68/77 e da Portaria n.° 38-A/76. Antes penso que estas normas encontram justificação numa leitura prudente das disposições constitucionais referidas.
19 — Por comodidade, venho referindo os trabalhadores das instituições de Previdência sem fazer referência aos dos Serviços Médico-Sociais, a quem se aplica também a convenção colectiva de 1976.
20 — Os Serviços Médico-Sociais foram transferidos para a Secretaria de Estado da Saúde pelo Decreto-Lei n.° 17/77, de 12 de Janeiro.
O Decreto Regulamentar n.° 12/77, de 7 de Fevereiro, no seu artigo 8.°, garantia aos trabalhadores transferidos a manutenção de todas as regalias e direitos adquiridos. Assim, por despacho do Ministério dos Assuntos Sociais, de 19 de Janeiro de 1978, as condições de trabalho constantes da Portaria n.° 38-A/78 foram mandadas aplicar aos trabalhadores dos Serviços Médico-Sociais.
21 — Embora não se tenha desenrolado um processo autónomo para os trabalhadores dos Serviços Médico-Sociais, a verdade é que, se tal tivesse sucedido, o problema não teria sido muito diverso: as questões que colocámos a propósito do artigo 63.° e alínea m) do artigo 167.° pôr-se-iam, analogamente embora, quanto ao artigo 64.° e alínea m) do artigo 167.° Também os trabalhadores do futuro serviço nacional de saúde, serviço do Estado, deverão ter um regime laboral idêntico ao da função pública, se não mesmo ser incluidos no seu âmbito. Também quanto a eles a prudência recomenda que o Estado não comece a negociar colectivamente.
22 — E se no n.° 4 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 887/76, só se referem os trabalhadores das instituições de Previdência, isso apenas se deve à circunstância de, à data da publicação deste — 29 de Dezembro de 1976 —, os Serviços Médico-Sociais ainda não terem sido separados da Previdência, o que só veio a acontecer em Janeiro de 1978.
23 — Em conclusão, não creio que o Provedor de Justiça deva requerer ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração da inconstitucionalidade do Decreto Regulamentar n.° 68/77 nem da Portaria n.° 38-A/78.
S) Processo n.« 78/D1-11-B-4
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 376/77, de 5 de Setembro.
Instruído e relatado pelo assessor, Dr. Manuel Pina.
Para melhor elucidação, transcrevei a informação prestada pela Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, em virtude da qual se não pediu a apreciação da inconstitucionalidade, por ela ser suficientemente convincente, na parte transcrita:
4 — A justificação para a entrada em vigor do revogado Decreto-Lei n.° 47 892, bem como a sua substituição pelo Decreto-Lei n.° 376/77, foi descrita na informação referida no n.° 1, para a qual solicito a leitura prévia com o fim de não alongarem em demasia a presente análise, pela repetição de assuntos já ali tratados.
Página 2000
1076-(24)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Assim, do conteúdo da exposição será feita apreciação apenas às afirmações consideradas mais importantes.
5 — A meio da p. 2 afirmam os contestatarios que:
Admite-se, em princípio, que uma utilização intensiva das águas subterrâneas através dos meios técnicos modernos de perfuração dos solos venha afectar o equilíbrio que deve existir na natureza.
O que, porém já não parece legítimo é arvorar-se o Governo em guardião desse equilíbrio atribuindo à sua máquina burocrática o poder discricionário de decidir acerca das pessoas que podem ou não utilizar águas subterrâneas para fins privados, e em que condições o podem fazer.
Antes de comentar os dois parágrafos esclareço V. Ex.a que na informação referida em 1 dà-sfc algum desenvolvimento aos estudos já realizados e a iniciar a curto prazo, em estreita colaboração com a UNESCO, que, sob financiamento do PNUD, irá fornecer precioso auxílio, com vista ao estudo dos recursos hídricos subterrâneos da península de Setúbal.
Assim, esclarece-se que os elementos colhidos até à presente data revelam, sem sombra de dúvida, que os níveis piezométricos das águas subterrâneas na peninsula de Setúbal têm vindo a diminuir, nalgumas zonas de forma alarmante, conforme se conclui da análise de elementos fornecidos por limnigrafos instalados em locais relativamente afastados de captações em actividade.
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
Se estes números evidenciam nitida tendência para a exaustão das reservas hídricas subterrâneas da região, ou para o seu alargamento progressivo, como já aconteceu no delta do Lobregat em Barcelona, e se não compete a um órgão estatal agir no sentido de manter o equilibrio entre as extracções daquela água e as infiltrações naturais (eventualemnte adicionada por recargas artificiais), a quem caberá estudar e providenciar para manter o referido equilíbrio?
Terá o grupo contestatário já elaborado um plano de acção, devidamente fundamentado, que revogue o Decreto-Lei n.° 376/77 sem que se volte à anárquica situação anteriormente existente à sua aplicação?
Esta Direcção-Geral está inteiramente aberta ao diálogo com todos os que queiram ajudar a encontrar soluções justas e equilibradas que satisfaçam aos superiores interesses do País.
6—Nas 1.23 e seguintes da p. 2, o grupo contestatário refere-se ao problema dos grandes volumes de água subterrânea extraídos pelas grandes indústrias que lhes dão deficiente aproveitamento.
Esta situação, herdada por esta Direcção--Geral, constitui um dos delicados problemas que a preocupam.
Neste sentido, muito embora não seja possível em termos jurídico-sócio-económicos impedir às actuais indústrias de extraírem água subterrânea para a sua laboração, estes Serviços têm-se recusado a propor ao Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas autorização para a execução de novos furos para a Quimigal — Química de Portugal, E. P. (ex-CUF), e Siderurgia Nacional, cujos caudais permanentes
pretendidos para os próximos anos atingem algumas centenas de litros por segundo.
Por outro lado, esta Direcção-Geral, ao defender a não execução de novos furos de grandes extracções, tem actuado de maneira a procurar solucionar os problemas das grandes indústrias, tão indispensáveis ao desenvolvimento do Pais. Assim, realizou-se no passado dia 11 do corrente mês uma reunião com técnicos desta Direcção-Geral e das seguintes entidades:
Direcção-Geral do Saneamento Básico; Siderurgia Nacional;
Quimigal — Química de Portugal, E. P.
(ex-CUF); EPAL;
Hidroprojecto; e
Empresa de Sondagens A. Cavaco,
com o fim de procurar solucionar os problemas das futuras necessidades em água daquelas indústrias.
Faz parte ainda das preocupações destes Serviços promover, em acção conjunta com a Direcção-Geral dos Serviços Industriais, junto das vinte e três indústrias da península de Setúbal que têm extraído volumes de água superiores a l0 000m3 mensais (a Portucel em Mitrena extraiu 1 047 150 m3 mensais durante o ano de 1977) no sentido de um melhor aproveitamento das águas que extraem do subsolo, através da redução de consumos, reutilização, substituição por águas de superfície e diluição com águas salgadas.
7 — Na exposição em causa se,guem-se depois vários parágrafos com afirmações destituídas de base que porventura identificarão os objectivos dos contestatarios.
Página 2001
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(25)
8 — Nas 1. 6 e seguintes da p. 4 transcreve-se:
A ausencia total de qualquer linha de orientação objectiva coloca nas mãos do Governo um poderoso instrumento politico que escapa ao controle democrático das populações.
Sendo a Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos um órgão estatal, não poderá ser um instrumento político mas sim um sector executivo e com linha de orientação objectiva, embora nem sempre coadjuvada por uma parcela mínima de contestadores que põem os interesses pessoais acima dos nacionais e cujo tempo utilizado na angariação de cerca de um milhar de assinaturas seria melhor aproveitado se fosse dirigido para esclarecer e fazer cumprir as disposições legais em vigor, que contrariamente ao afirmado traduzem uma «linha de orientação objectiva».
9 — Até à presente data, a posição dos pedidos de licenciamento de furos de captação de água subterrânea na península de Setúbal é a que se resume a seguir:
Número de pedidos de licenciamento 48 Número de pedidos indeferidos (o) . .. 6
Número de pedidos deferidos...... 31
Número de pedidos com parecer favorável e que vão em breve ser despachados pelo Sr. Secretário de
Estado....................... 10
Número de pedidos com parecer desfavorável a ser levados muito em breve à consideração superior .... 1
(a) A Quimigal pretendia 41 l/s em 1978 e cerca de 300 l/s em 1985; a Siderurgia Nacional pretendia mais de 300 l/s, e nos restantes 4 requerimentos indeferidos os caudais oscilaram entre 5,6 l/s e 14 l/s.
Em face destes números verifica-se não ser verdade que esta Direcção-Geral dê protecção à Siderurgia Nacional ou a qualquer outra grande indústria nem haver «arbítrio por parte da administração, sem qualquer possibilidade de recurso ou revisão da decisão, para que logo esteja criado o ambiente de suspeição de que a lei poderá ser utilizada ou desviada para a satisfação de interesses particulares ou individuais que pouco ou nada terão a ver com a intenção que ela se arroga».
A confirmar a actuação destes Serviços está o facto de o Sr. Bartolomeu Matos Ferreira (processo n.° 22/77/Setembro) ter requerido a execução de uma captação donde pretendia extrair o caudal permanente de 16 l/s (60mVh) e que foi indeferida, por elevada. Todavia, após reconsideração pelos requerentes do volume de água efectivamente necessário, o requerimento foi submetido de novo à consideração do Sr. Secretário de Estado, que o deferiu condicionado à extracção do valor 1 l/s que dá satisfação aos fins pretendidos.
10 — Ao concluir esta breve análise, o signatário considera que a exposição em apreciação não está fundamentada em argumentação justi-
ficativa que abale o conteúdo do Decreto-Lei n.° 376/77, antes pelo contrário, só reforça a necessidade de o fazer cumprir com rigor, pois:
10.1 — Em face da evidente e progressiva diminuição das reservas hídricas de água subterrânea da península de Setúbal, há que disciplinar a sua extracção através da verificação, no próprio local das futuras captações, da finalidade, da justificação e da quantificação dos volumes de água a licenciar em cada caso, de acordo com o disposto naquele diploma, e não regressar à anárquica situação existente antes da sua entrada em vigor;
10.2 — Só através do conhecimento de todos os volumes de água subterrânea a extrair da península será possível fazer o seu balanço hídrico, que irá permitir a execução de um modelo matemático e a adopção de soluções tais como a recarga artificial dos seus aquíferos, substituição dos volumes de água subterrânea por água de superfície nalgumas das grandes indústrias consumidoras, etc;
10.3 — Para abreviar o estudo referido no número anterior torna-se necessário conjugar esforços, pelo que seria mais útil e vantajoso que os contestatarios começassem por colaborar e não perder tempo em colher assinaturas que, através dos vários organismos a qúe forem enviadas, irão custar ao erário público muitas dezenas de milhares de escudos e que não comprovarão que esta Direcção-Geral não está pisando um caminho certo e com confiança no futuro desta útil missão.
Sobre esta informação e estudo do diploma em causa, o assessor emitiu o seguinte parecer, que mereceu a concordância do coordenador, Dr. Vaz Serra, do adjunto do Provedor, Dr. Luís Silveira, e do Provedor:
1 — É verdade que as disposições do Decreto-Lei n.° 376/77, de 5 de Setembro, revestem natureza essencialmente técnica e por conseguinte não podem ser apreciadas pelo Serviço do Provedor de Justiça.
2 — Impressiona-nos, no entanto, o relatório da Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, justificativo do diploma em causa e, em nosso entender, deste deveria ser dado conhecimento aos signatários, após o arquivamento do processo.
6) Processo n.° 78/DM2-B-1
Inconstitucionalidade do artigo 44.° do Decreio--Lei n.° 76/77, de 29 de Setembro.
Parecer do adjunto do Provedor, Dr. Luís Silveira, com o qual o Provedor concordou:
Considero que esta disposição não viola a Constituição política, porquanto não existe nesta qualquer preceito que proíba genericamente a retroactividade das leis, apenas se encontrando neste aspecto normas especiais, designadamente em matéria de incriminação penal.
Página 2002
1076-(26)
II SÉRIE — NÚMERO 47
É no Código Civil que o princípio da não retroactividade das leis está consagrado; todavia, como esse diploma tem força de decreto-lei, é derrogável por lei da Assembleia da República.
O que se poderá discutir é a bondade do regime consagrado no artigo 29.° do citado decreto-lei; contudo, afigura-se-me que o legislador com esta norma teve por objectivo, e a meu ver bem, dar prevalência à efectiva exploração da terra sobre a sua mera titularidade, isto, de algum modo, como compensação de outras regras em que a actual lei do arrendamento esiebelece regime menos favorável ao arrendatário que o fixado na lei anterior.
7) Processo n.° 78/DI-14-B-1
Inconstitucionalidade da Portaria n.° 21 490, de 21 de Agosto de 1965.
Parecer da assessora, Dr." Branca Amaral, com o qual o Provedor concordou:
1 — Os professores do núcleo escolar de Laundos (Póvoa do Varzim) requerem a declaração de inconstitucionalidade da Portaria n.° 21 490, de 21 de Agosto de 1965, referente ao ensino da moral e religião nas escolas primárias, por ser contrária às disposições constitucionais referentes à liberdade de consciência, religião e culto.
2 — Pediu-se ao Ministério da Educação e Cultura a posição actual sobre a matéria e foi-nos remetida uma perspectiva geral sobre o ensino da religião e moral nos vários cursos e nos vários níveis.
Dela se conclui que a inscrição nessa cadeira nunca é obrigatória e é feita por opção expressa dos encarregados de educação dos alunos.
Corresponde a um tempo semanal a ministrar nos três primeiros anos do ensino liceal, nos dois primeiros do ensino técnico ou preparatório, dos 7.° e 8.° anos do ensino unificado e durante a instrução primária.
Nas escolas do magistério primário, a cadeira existirá desde que tenha havido alunos inscritos.
3 — O artigo 41.° da Constituição dispõe que a liberdade de consciência, religião e culto é inviolável (n.° 1); que ninguém pode ser perseguido, privado de direito ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa (n.° 2); que as igrejas e comunidades estão separadas do Estado e são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto' (n.° 3); que é garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticada no âmbito da respectiva confissão . . . (n.° 4) e, finalmente, que é reconhecido o direito à objecção de consciência (n.° 5).
O artigo 43.°, por sua vez, determina que p Estado não pode atribuir-se o direito de programar a educação e cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas (n.° 2) e que o ensino público não será confessional (n.° 3).
4 — O regime opcional que vigora de manifestação expressa parece-me que não é violador da liberdade religiosa, como direito dos cidadãos. Só. assi-iem às aulas de religião e moral os alunos nos primeiros anos de ensino cujos pais ou encarregados
de educação manifestem tal desejo e os alunos do magistério primário que expressamente declararem querer inscrever-se nessas aulas.
A reserva de um tempo para ser ministrado, no regime descrito, o ensino da matéria não se me afigura conferir ao ensino um carácter confessional, nem violar frontalmente o princípio de separação consagrado constitucionalmente entre a Igreja e o Estado. Aliás, como bem se compreenderá, estas disposições visam proteger as igrejas em face do Estado e não este em face daquelas.
5 — O problema parece-me que se põe, essencialmente (embora a letra dos conceitos constitucionais pudesse, por vezes, inculcar maior rigorismo e radicalismo de soluções), na preferência concedida, em confronto com as demais, à religião católica, com base na Concordata firmada em 1940 entre Portugal e a Santa Sé e ainda não denunciada.
Julgo que os preceitos constitucionais sobre liberdade religiosa não podem, sem mais, revogar o conteúdo desse acordo, aliás já modificado recentemente como se sabe, por diplomas referentes à matéria do casamento e divórcio (cf. Decreto-Lei n.° 261/75, de 27 de Maio, Decreto-Lei n.° 415/75, de 8 de Agosto, Decreto-Lei n.° 6/76, de 10 de Janeiro, Decreto-Lei n.° 561/76, de 17 de Julho, e Decreto-Lei n.° 605/76, de 24 de Julho).
Mantém-se, no restante, o conteúdo fora do protocolo adicional de 7 de Maio de 1940, não atingido pelas modificações referidas (algumas posteriormente a 25 de Abril de 1976).
Afirmou-se até e consta do referido protocolo «a vontade de manter o regime concordatario vigente para a paz e o maior bem da Igreja e do Estado».
A discriminação que possa existir relativamente a outras religiões, que não a católica, assenta portanto num tratado internacional que, por razões políticas reafirmadas, se mantém em vigor. Aliás, qualquer religião pode celebrar acordo semelhante se o considerar viável.
6 — Afiguram-se dispensáveis considerações de oportunidade e de mero senso comum que desaconselhariam um confronto com a igreja sobre uma matéria cujo ensino opcional está de tal modo garantido, que se torna impossível configurar qualquer concretização de ofensa do conceito da liberdade religiosa, entendido em termos genéricos.
Julgo, portanto, de propor o arquivamento da reclamação sem qualquer intervenção do Provedor de Justiça no pedido da declaração de inconstitucionalidade da Portaria n.° 21 490, que regulamenta o ensino da religião e moral nas escolas primárias.
8) Processo n.° 78/DI-20-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 484/77, de 16 de Novembro, e dos Decretos-Leis n.os 808/76, 809/76 e 814/76.
Parecer do assessor, Dr. João Caupers:
ASSUNTO: Inconstitucionalidade de vários diplomas legais que reestruturaram o sector de navegação marítima.
I — A Comissão de Trabalhadores da Companhia Nacional de Navegação dirigiu-se ao Provedor de
Página 2003
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(27)
Justiça solicitando que este pedisse ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade dos Decretos-Leis n.os 808/76, 809/76, 814/76 e 484/77 ou que, de qualquer modo, usasse a sua influência no sentido de impedir a aplicação dos diplomas em questão.
A Comissão de Trabalhadores juntava um parecer do Dr. Miguel Galvão Telles e outro do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, ambos favoráveis à sua pretensão. E falava ainda num terceiro parecer que teria sido elaborado pela Presidência da República e que teria concluido no mesmo sentido. Pude confirmar a existência de tal parecer, mas a Presidência da República não nos quis facultar uma cópia, pelo que desconheço o seu conteúdo.
Dispenso-me de reproduzir aqui as considerações do Dr. Galvão Teles e do Dr. Moitinho de Almeida, relator do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, por se me afigurarem inteiramente pertinentes, ao menos quanto à questão de fundo, a inconstitucionalidade dos diplomas em causa.
Fica, pois, já assente que também o autor desta informação considera inconstitucional o Decreto-Lei n.° 484/77, de 16 de Novembro, que criou a NAVIS, E. P., por violar o artigo 13.° da Constituição e juridicamente inexistentes, por violação do disposto no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 260/76, de 8 de Abril, os Decretos-Leis n.os 808/76, 809/76 e 814/76.
II — A grande dúvida, para nós, reside no que se afirma no n.° 5 das conclusões do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, que se transcreve:
Não cabe ao Procurador-Geral da República solicitar, nos termos do artigo 281.°, n.° 1, da Constituição, a declaração de inconstitucionalidade de normas jurídicas.
A razão de ser da dúvida apontada reside na circunstância de se afigurar discutível que a expressão «normas juridicas» do n.° 1 do artigo 281.° tenha o sentido que se lhe atribuiu no referido parecer.
O Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República parece considerar (v. p. 9 do parecer) que na expressão «normas juridicas» se reconduziu o conceito de norma jurídica à ideia de comando ge-al e abstrato ou, se se preferir, lei formal de duração potencialmente ilimitada (Crisafulli, «Atto normativo», Enciclopedia del Diritto).
III — Acontece que a generalidade e abstracção como características essenciais da norma jurídica há muito que foram postas em causa não só pelos defensores da «novidade» como característica da norma jurídica, como Jellinek e Laband, mas também por muitos autores italianos modernos, como Donati, Virga e Crisafulli.
E tal sucedeu fundamentalmente por duas razões:
a) Por um lado, nos Estados modernos tende a atenuar-se o princípio da sepai io dos poderes, fundamento e sustentáculo principal da existência da generalidade e da abstracção como características da norma jurídica (v. sob a epígrafe «Lei» o artigo do Dr. Miguel Galvão Teles, na Enciclopédia Verbo);
b) Por outro, assistimos a um alargamento sempre crescente da intervenção do Estado, enquanto poder organizado, nas vidas dos cidadãos: tal intervenção não se limita à produção de normas jurídicas no sentido tradicional de normas de conduta, vertidas no usual esquema previsão--estatuição, assumindo frequentes vezes a forma de disposições organizativas e instrumentais que visam fornecer ao Estado meios para prosseguir determinados objectivos de natureza política ou administrativa. São as chamadas leis-medida ou leis--providência (Massnahmegesetz), que criam um serviço público ou nacionalizam uma empresa, por exemplo.
IV — Deverão estas leis-medida ser consideradas normas juridicas para efeitos do disposto no artigo 281.° da Constituição?
Antes de tentar responder a esta questão, haverá que prestar um esclarecimento prévio: as leis-medida não se identificam com os actos administrativos praticados sob forma de lei.
O acto administrativo traduz sempre a aplicação de uma norma a um caso concreto. Ainda quando se trate do exercício de poderes discricionários, a entidade que pratica o acto irá decidir, ou deverá decidir, optando pela solução que admite que o legislador escolheria se tivesse que resolver o caso concreto.
É possível, embora bem pouco ortodoxo, praticar um verdadeiro acto administrativo sob forma de lei: mas isso é diferente de criar uma lei-medida que, sujeitando-se embora ao mesmo mecanismo de produção legislativa das restantes leis, não traduz a aplicação a um caso concreto de uma determinada norma.
Temos plena consciência que a distinção envolve grandes dificuldades, mas entendemos indispensável trabalhar nela.
Note-se que estamos a versar estas questões obviamente ao nível do conceito de lei em sentido material, pois rejeitamos que, ao menos para efeito da aplicação do artigo 281.°, se considere norma jurídica toda e qualquer disposição constante de um diploma com força de lei (lei em sentido formal). Adiante voltaremos a este ponto.
Crisafulli, no artigo epigrafado «Atto normativo» que escreveu para a Enciclopedia del Diritto e que já referimos afirma:
[. . .] Contestare che simili disposizioni (o autor está a referir-se às disposições que criam e regulamentam um ente público) siano costitutive delFordinamento statale, repugna indubbiamente al senso comune, prima ancore che al senso giuridico.
Mas o problema não é só, embora o seja também, de bom senso; é que, se não se admitir a fiscalização a posteriori da constitucionalidade das chamadas leis-medida, as possibilidades de defesa do cidadão contra estas ficam fortemente cerceadas, limitando-se à fiscalização judicial da inconstitucionalidade (artigo 282.°). Para 'provocar tal fiscalização o cidadão teria de impugnar judicialmente um acto praticado
Página 2004
1076-(28)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ao abrigo da lei-medida em causa (por exemplo, a compra de um navio pelo conselho de gerência da NAVIS), com fundamento na inconstitucionalidade da norma que teria fornecido cobertura legal a tal acto.
No que concerne aos actos administrativos sob forma de lei, já não equacionamos a questão da mesma forma: tais actos deverão ser passiveis de recurso contencioso de anulação, pese embora a interpretação contrária que o Supremo Tribunal Administrativo dá ao artigo 16.° da sua Lei Orgânica. Haverá que perguntar se esta norma, na interpretação que lhe é dada, se conforma com os artigos 20.°, n.° 1, e 269.°, n.° 2, da Constituição.
Inclinamo-nos, pois, no sentido de que as leis--medida devam ser consideradas verdadeiras normas jurídicas para efeito do disposto no artigo 281."
V — Já vimos que, em nossa opinião, as leis-- medida são normas jurídicas em sentido material.
Mas, se admitirmos que o não são, e tão-somente normas em sentido formal, nem assim ficaria afastada pela letra da Constituição a possibilidade de recurso ao artigo 281.°
É verdade que o n.° 1 do artigo 281.° utiliza a expressão «quaisquer normas», por contraposição à expressão «qualquer diploma» do n.° 1 do artigo 278.°
Mas tal não significa, como se poderia pensar, que a fiscalização prévia da inconstitucionalidade incide sobre a lei em sentido formal, enquanto a fiscalização a posteriori sobre a lei em sentido formal.
Para confirmar tal asserção basta ler as alíneas a) e c) do artigo 146.°: aí, quer para referir a fiscalização prévia, quer a fiscalização a posteriori utilizou--se exactamente a mesma expressão — «quaisquer diplomas».
Com isto não queremos dizer que o Conselho da Revolução pode apreciar a inconstitucionalidade de actos administrativos sob forma de lei. O que pensamos é que a letra do artigo 281.° não fornece, só por si, solução para o problema.
VI — O Decreto-Lei n.° 484/77 é um exemplo típico da lei-medida. Como tal e por tudo o que ficou dito, avolumam-se as dúvidas sobre a bondade do n.° 5 das conclusões do parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.
Afigura-se-nos que o Provedor de Justiça, como o Presidente da República, o procurador-geral da República ou o Presidente da Assembleia da República podem muito bem solicitar ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração da inconstitucionalidade do diploma em causa.
VII — Mas ainda que se considere correcta a posição da Procuradoria-Geral da República exigindo para a norma jurídica as características da abstracção e da generalidade, entenderemos que pelo menos algumas normas do Decreto-Lei n.° 484/77 têm tais características. É o caso, por exemplo, do n.° 1 do artigo 2.° que viola frontalmente o artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 598/73, disposição que visa garantir os direitos dos credores das empresas a fundir.
O artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 598/73 é, sem dúvida, uma disposição geral e abstracta. Ora, se se entender que uma norma deste tipo pode ser derrogada por outra sem essas características, então a generalidade e a abstracção deixarão de funcionar, mesmo para os seus defensores, como garantia da igualdade dos cidadãos perante a lei.
Se uma norma geral e abstracta afirma que todos os cidadãos na situação X têm o dever de Y e posteriormente outra vem afirmar que os Srs. A, B e C estão isentos do cumprimento de tal dever, esta última norma tem de se considerar também geral e abstracta, entendendo-se que atinge negativamente todos os restantes cidadãos abrangidos pela primeira.
É, aliás, por este motivo que vários Deputados têm defendido na Assembleia da República que na reserva de competência legislativa fiscal deste órgão — artigo 167.°, alínea o), da Constituição — se têm de incluir as isenções fiscais. Que sentido faria dizer que só a Assembleia pode criar um imposto se o Governo pudesse isentar do seu pagamento qualquer cidadão? Apesar de a isenção, sobretudo quando dele beneficia uma determinada pessoa singular ou colectiva, não se traduzir numa norma jurídica geral e abstracta, ela tem de ser considerada como tal para os que entendem que tais circunstâncias são indispensáveis para o recurso ao artigo 281.°, sob pena de a inconstitucionalidade orgânica de um diploma do Governo que concedesse uma isenção não poder ser apreciada a posteriori pelo Conselho da Revolução.
A norma do n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 484/77 ê susceptível de produzir grave lesão dos direitos dos credores das empresas fundidas, discri-minando-os relativamente aos restantes credores e com isso violando o artigo 13.° da Constituição. E não só pelas razões que o Dr. Moitinho de Almeida aponta a pp. 7 e 8 do seu parecer, mas também porque os bens das empresas públicas são impenhoráveis com as excepções consignadas na alínea a) do n.° 1 do artigo 823.° do Código de Processo Civil, pelo que os credores das empresas de capitais públicos fundidas podem ver os seus créditos, aeora sobre a NAVIS, despojados de garantia.
VIII — Em conclusão e por todas as razões apontadas:
1 — Não temos dúvidas de que o Decreto-Lei n.° 484/77 ê materialmente inconstitucional.
2 — Afigura-se-nos que o Provedor de Justiça pode solicitar ao Conselho da Revolução, nos termos do artigo 281.° da Constituição, a apreciação e declaração da inconstitucionalidade do diploma referido.
Diríamos mesmo que, ainda que ao Sr. Provedor fiquem dúvidas sobre se o poderá ou não fazer, seria conveniente que o fizesse, pois a Comissão Constitucional seria assim chamada a produzir jurisprudência sobre a matéria.
Sobre este parecer, proferiu o Provedor o seguinte despacho:
Não aceito o ponto de vista do parecer da Procuradoria-Geral da República, quando entende não ser de solicitar a declaração de inconstitucionalidade por considerar o Decreto--Lei n.° 484/77, de 16 de Novembro, não um diploma de normas jurídicas gerais e abstractas, e, portanto, não caber dentro da expressão «normas jurídicas» do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, já que uma tal expressão não abrange leis de conteúdo individual e concreto.
Os argumentos da Procuradoria-Geral da República não convencem e encaram esse pro-
Página 2005
3 DE ABRIL DE 1979
l076-(29)
blema num aspecto que se deve considerar ultrapassado, como com profundidade e irrefutável argumentação demonstra o Sr. Dr. Caupers, no seu desenvolvido e inteligentemente fundamentado parecer.
Portanto, e quanto a mim, nada impediria, de acordo com o artigo 281.° da Constituição, solicitar a declaração de inconstitucionalidade de normas jurídicas contemplando ou tendo um conteúdo individual e concreto.
A tal respeito, perfilho integralmente o parecer do Sr. Dr. Caupers.
Quanto ao fundo da questão, discordo, tanto do parecer da Procuradoria-Geral da República, como do do Dr. Miguel Galvão Teles e, consequentemente, também não perfilho o ponto de vista do Sr. Dr. Caupers da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 487/77, bem como dos Decretos-Leis n.05 808/76, 809/76 e 814/76, que o antecederam e com ele estão intimamente ligados.
Com efeito, não encontro qualquer violação do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 260/76, nem do artigo 13.° da Constituição e muito menos do Decreto-Lei n.° 589/73.
Não aceito, de nenhum modo, a tese que aos Decretos-Leis n.os 808, 809 e 814 falta a referência exigida pelo artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 260/76, por não terem a assinatura dos Ministros das Finanças e do Planeamento.
É que, nesse ponto, o artigo 4.° tem de considerar-se revogado pela Lei n.° 3/76, de 10 de Setembro.
Efectivamente, esta lei veio determinar, no n.° 7 do artigo 8.°, que os decretos-leis do Governo aprovados em Conselho de Ministros apenas levam as menções da aprovação em Conselho de Ministros e da data da promulgação, as assinaturas do Presidente da República e do Primeiro-Ministro.
Ora os Decretos-Leis n.os 808/76, 809/76 e 814/76, foram aprovados em Conselho de Ministros, são do Governo, e a sua aprovação e promulgação dá-se no domínio da vigência da Lei n.° 3/76, pelo que não carecia de mais assinaturas do que das do Presidente da República e do Primeiro-Ministro, e essas encontram-se nos documentos.
Tão-pouco posso aceitar o argumento de que tais decretos, incorporando na Companhia Nacional de Navegação e na Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos a Transfruta, a Transnavi e a Construções Metálicas, violam o Decreto-Lei n.° 598/78 e, logicamente, o artigo 13.° da Constituição, porque não é licita a fusão de sociedades comerciais de capitais públicos em empresas públicas.
E a razão é simples.
Dando de barato que a incorporação é o mesmo que a fusão, a verdade é que aquelas empresas já haviam perdido a natureza de sociedades comerciais, desde o momento em que se verificou a nacionalização da Companhia Nacional de Navegação e da Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos.
Efectivamente, nos Decretos-Leis n.°5 205-C/75 e 205-D/75, de 16 de Abril, que nacionali-
zaram estas empresas, estabelece-se, respectivamente, nos seus artigos 4.°, n.° 1, e 5.°, n.° 2, «que a universalidade dos bens, direitos e obrigações que integram o activo e passivo daquelas companhias nacionalizadas, ou que se encontrem afectos à sua expansão, são transferidos para o Estado, integrados no património autónomo das empresas resultante de nacionalização, ou a ela igualmente afectos», e que «a empresa nacionalizada assumirá igualmente a posição social que a Companhia Nacional de Navegação [ou a Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos, conforme os casos] detiver em sociedades de que seja sócia à data do inicio da eficácia da nacionalização».
Ora, como se vê nos preâmbulos dos citados decretos, o capital social da Transfruta e da Transnavi encontrava-se totalmente subscrito pelas Companhia Nacional de Navegação e Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos e o da Construções Metálicas integralmente subscrito pela Companhia Portuguesa de Tans-portes Marítimos.
Logo, a incorporação resultante dos citados decretos, na Companhia Nacional de Navegação e na Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos respectivamente, das duas primeiras sociedades e da terceira, não foi mais do que transformar uma situação de facto numa situação de direito, já que estas tinham de considerar-se também nacionalizadas pela nacionalização daquelas.
E, a partir do momento em que o seu capital estava detido, na totalidade, por empresas nacionalizadas, não mais a elas se poderiam aplicar nenhuma das disposições do Decreto-Lei n.° 598/73.
E, não era possível considerar uma tal fusão ou incorporação como atingindo, ou podendo atingir, os direitos dos credores de tais sociedades, ou causar-lhes prejuízo, colocando-os em situação discriminada e, portanto, com violação do artigo 13.° da Constituição.
Com efeito, os credores não sofreram, nem se vê que pudessem sofrer, qualquer prejuízo com a incorporação, já que, com a nacionalização e consequente transferência do activo e passivo dessas sociedades para as empresas nacionalizadas, estas, de maior potencialidade económica passam a ter todo o património a responder pelas dívidas daquelas, e não só, como antes, a ser só o activo daquelas a responder pelas suas dividas.
E, tanto isto é assim, que não há notícia de que os credores se tenham queixado, ou sequer tenham representado, por virtude das incorporações referidas.
O que, de resto, se compreende facilmente, sabendo-se que os principais credores dessas sociedades eram empresas estatizadas, bancos nacionalizados, companhias de seguros nacionalizadas, a Lisnave, e, para além destas, pequenos fornecedores que continuam a fornecer as suas mercadorias como antes.
De resto, não pode haver dúvida que aquelas sociedades foram nacionalizadas por arrastamento das nacionalizações da Companhia Na-
Página 2006
1076-(30)
II SÉRIE — NÚMERO 47
cional de Navegação e da Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos pois só assim se compreende que, no Decreto-Lei n.° 704/75, de 18 de Dezembro, ao criar-se uma comissão administrativa para as três empresas nacionalizadas — Companhia Nacional de Navegação, Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos e Sofamar —, a justificasse declarando no preâmbulo que as medidas de nacionalização dos maiores operadores nacionais de transportes marítimos visavam, como foi expressamente reconhecido, preparar as condições indispensáveis para a integração do sector, com vista a uma perfeita e total coordenação de uma política em matéria de comércio externo. Com a promulgação das referidas medidas, o Estado passou a controlar a quase totalidade da frota portuguesa.
Nem deixa de ser de anotar que seria até uma mera ficção dar-se cumprimento às disposições do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 598/73, e efectuar-se assembleias gerais na Transfruta, Trasnavi e Construções Metálicas, quando o capital pertencia integralmente a uma só entidade, com outras empresas já nacionalizadas. Nem havia que dar publicidade a tal deliberação, pois, neste caso, a publicidade adviria da publicação dos decretos-leis de incorporação, para que os credores pudessem reclamar o pagamento dos seus créditos.
Do que também não devem restar dúvidas ê de que se, como se afigura, o Decreto-Lei n.° 598/73 só se aplica a sociedades comerciais e só à fusão destas se pode referir, então não se pode já aplicar à Transfruta, Transnavi e Construções Metálicas, pois o respectivo capital pertencia integralmente a empresas nacionalizadas.
Seria até ridículo, caricato, verdadeiro número de comédia, convocar uma assembleia geral da Transfruta, outra da Transnavi e ainda outra das Construções Metálicas, sendo certo que nas das duas primeiras só poderia estar presente a Companhia Nacional de Navegação, visto que delas possuía todo o capital, e na última só estaria presente a Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos que dela possuía todo o capital, e ser o único presente a deliberar incorporar em si mesmo aquela sociedade de que ele já possuía todo o capital!
Dizer, pois, que o Decreto-Lei n.° 484/77 é inconstitucional porque na fusão se abrangem sociedades comerciais e nestas a fusão só é possível entre elas é pura ficção, fora de todas as realidades, já que, desde a nacionalização da Companhia Nacional de Navegação e da Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos essas sociedades ficaram indirectamente nacionalizadas, já que o decreto de nacionalização determinava que a universalidade dos bens, incluindo, pois, a propriedade do capital das outras sociedades, direitos e obrigações, que integravam, são tranferidos para o Estado e integrados no património da empresa resultante da nacionalização, ou a ela igualmente afectos, e que a empresa nacionalizada assumirá igualmente a posição social que tanto a Com-
panhia Nacional de Navegação como a Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos detiverem em sociedades de que sejam sócias à data do inicio da eficácia da nacionalização que, como a lei determinava, é a referida a 15 de Abril de 1976.
Logicamente, a Transfruta, a Transnavi e a Construções Metálicas, ficaram desde essa altura incorporadas na Companhia Nacional de Navegação ou na Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos conforme os casos, perdendo desde essa altura a natureza de sociedades comerciais, pois passaram até a ser propriedade do Estado.
O contrário disto, seria até violação das normas constitucionais.
Nestas condições, entendo que não há qualquer inconstitucionalidade, nem formal nem material, e, por isso, determino o arquivamento da reclamação, com a informação aos reclamantes de que, por se não considerarem inconstitucionais nem o Decreto-Lei n.° 484/77, nem os Decretos-Leis n.os 808/76, 809/76 e 814/76, o Provedor decidiu não solicitar a declaração de inconstitucionalidade e, consequentemente, ordenou o arquivamento do processo dos reclamantes.
9) Processo n.» 78/DI-21-A-3
Inconstitucionalidade de certas disposições do Decreto-Lei n.° 215-B/75, de 30 de Abril.
Parecer do assessor Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou:
I — Pela Confederação Democrática dos Trabalhadores e peio Sindicato Democrático da Química e Farmacêutica é solicitado ao Provedor de Justiça que peça ao Conselho da Revolução, ao abrigo do artigo 281.° da Constituição a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 8.°, 10.°, n.os 3, 5 e 6, e 17.° da Lei das Associações Sindicais por alegada violação do artigo 57.° da Constituição e da Convenção n.° 87 da OIT, ratificada pela Lei n.° 45/77, de 7 de Julho.
II — A matéria contida nas disposições postas em causa é a seguinte:
Artigo 8.° — Regras quanto ao funcionamento da assembleia constituinte — publicidade da convocação, número mínimo de presenças, condições de deliberação.
Artigo 10.° — Publicação dos estatutos e respectivas alterações e controle judicial da legalidade dos mesmos.
Artigo 17.° — Gestão dos sindicatos, democracia interna, regras quanto à convocação das assembleias, destituição dos corpos gerentes.
III — Tanto a Constituição como a Convenção n.° 87 da OIT garantem a liberdade de constituição de associações sindicais. Facto indesmentível e louvável. Mas será que as disposições legais em questão ferem tal liberdade?
O artigo 8.°, ao estabelecer normas que, de facto, limitam o direito de associação sindical apenas pre-
Página 2007
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(31)
tendeu impedir a pulverização sindical. Será garantir a liberdade sindical assegurar a possibilidade de formação de sindicatos a qualquer grupo de amigos? Aos vencidos inconformados numa eleição democrática? Não conduziria esta absoluta liberdade sindical à destruição dos próprios sindicatos?
Compreende-se perfeitamente que a liberdade de associação não conheça limitações de representatividade: na relidade, as associações, se exceptuarmos os partidos políticos, dada a sua especificidade, mais não fazem do que exercer, colectivamente, direitos reconhecidos pela Constituição e nas leis a todos os cidadãos.
O mesmo não acontece com os sindicatos, aos quais a Constituição confere importantes direitos, direitos esses que acompanham a própria designação «sindicato» e a justificam:
O direito de contratação colectiva;
O direito de participação na elaboração da legislação do trabalho;
O direito de participação na gestão das instituições de segurança social e outras organizações que visem satisfazer os interesses das classes trabalhadoras;
O direito de participação no controle de execução dos planos económicos e sociais.
Parece razoável que o Estado, reconhecendo aos sindicatos tão relevantes direitos, tenha de se precaver contra a proliferação daqueles, proliferação que, em última análise, iria dificultar ou impossibilitar o exercício desses direitos. Em Portugal, e ião obstante a norma do artigo 8.° da Lei das Associações Sindicais, temos o exemplo da designação dos representantes sindicais no Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, designação que originou um conflito entre a CGTP-IN e o Secretário de Estado da Segurança Social, acerca do qual corre um processo no Serviço do Provedor de Justiça (processo n.° 77/R-1726-A-3).
IV — Não se pense, aliás, que preocupações deste tipo apenas existem em Portugal.
Em França, pais com tradições de respeito pela liberdade sindical, que há muito ratificou a Convenção n.° 87 da OIT, não existem limitações numéricas à constituição de sindicatos: «Un syndicat peut exister entre deux personnes» (Camerlynck et Lyon-Caen, Droit du travail, 8C édition, Dalloz, p. 538). Mas, consciente da indispensável necessidade de impedir a pulverização sindical, o Estado instituiu um meio indirecto de a evitar: não restringe a constituição de sindicatos a quem reconhece os direitos que constituem a própria essência do estatuto jurídico sindical, através de critérios de representatividade assentes no § 2 do artigo 123.° do Code du Travail.
Apenas aos sindicatos mais representativos — porque com maior número de associados, mais antigos ou mais independentes face ao patronato — é reconhecido o direito de contratação colectiva ou o dire:*o de participarem nas instituições de segurança social. Note-se que a representatividade é apurada em relação a uma determinada área geográfica e a uma certa profissão.
Se considerarmos a liberdade sindical uma liberdade total, pois não há dúvida que a lei francesa, como a lei portuguesa, a limita: não é pela utilização
de meios indirectos que essa limitação é menos real; e suponho mesmo que é mais eficaz.
V — Simplesmente, a liberdade sindical, mais propriamente de constituição de sindicatos, não é uma liberdade ilimitada, como o não é nenhum direito. O direito de formar um sindicato é susceptível de abuso e de colisão com outros direitos.
A lei não pode dar-se ao luxo de permitir a pulverização sindical; e isso tanto num Estado a caminho do socialismo como noutro que se encontre fora de tal caminho.
A proliferação de sindicatos lesa seriamente os trabalhadores, prejudica o Estado e acaba por dificultar a vida das empresas, obrigadas a negociar com cada vez maior número de sindicatos.
Directa ou indirectamente, è indispensável conferir um mínimo de seriedade à formação de um sindicato: um sindicato não se forma por «birra» e a Constituição assegura, no n.° 5 do artigo 39.°, o exercício do direito de tendência, de acordo com os respectivos estatutos, precisamente para garantir a expressão de todas as correntes políti^-sindicais, designadamente das minoritárias.
Pode e deve discutir-se se o mecanismo do artigo 8.° é o mais adequado para evitar os excessos de liberdade (libertinagem?) sindical ou se um sistema semelhante ao francês se revelaria mais apropriado.
O que se afigura inquestionável é que tem de existir um dispositivo para prevenir tais excessos e que tal dispositivo não ofende a liberdade sindical, antes visa protegê-la.
VI — Os protestos do reclamante abatem-se também sobre os n.os 3, 5 e 6 do artigo 10.° Temos sérias dificuldades em compreender tais protestos, se pensarmos que as disposições em causa se referem ao registo e publicação dos estatutos das associações sindicais e ao controle judicial da legalidade dos mesmos.
Entenderá o reclamante que os estatutos não deveriam ser registados e publicados? Ou que o controle da sua legalidade deveria ser administrativo, como nos tempos do fascismo?
VII —O artigo 17.°, que o reclamante também contesta, contém, como muito bem observa o Sr. Provedor-Adjunto, normas mínimas de democraticidade da vida sindical.
Normas que, aliás, constam, embora como princípio, do n.° 3 do artigo 57.° da Constituição.
Tais normas são perfeitamente justificáveis: o Estado, cometendo aos sindicatos importantes :fas, tem de se certificar de um mínimo de demouatici-dade na gestão daqueles (não me digam que isto é «paternalismo» ou «intervencionismo»!).
E para que é que o reclamante quer suprimir as. disposições do artigo 17.°? Para criar um sindicato gerido não democraticamente? Em que as mulheres não possam ser dirigentes? Ou que o voto seja indirecto? Em que não existam comissões eleitorais? Ou em que o lugar de presidente da direcção seja hereditário?
O Estado democrático não pode permitir que entidades sem representatividade, geridas por princípios antidemocráticos, participem na elaboração da legislação laboral ou no controle da execução dos planos económicos e sociais.
Página 2008
1076-(32)
II SÉRIE — NÚMERO 47
VIII — Em conclusão:
Embora se possa discutir a bondade de algumas das soluções constantes do Decreto-Lei n.° 215-B/75, suponho que as que eram claramente inconstitucionais — o artigo 11.° por exemplo— já foram revogadas.
Embora se possam suscitar algumas dúvidas quanto ao artigo 8.°, não as reputo suficientes para que o Provedor de Justiça solicite a apreciação e declaração da sua inconstitucionalidade ao Conselho da Revolução.
10) Processo n.° 78/DI-22-A-2
Inconstitucionalidade da Portaria n.° 250/78, de 3 de Maio.
Parecer da assessora Dr." Maria de Lurdes Garcia, com o qual o Provedor concordou:
1 — Um grupo de médicos, em situação de internato hospitalar, apresentou queixa ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, com conhecimento do Sr. Provedor de Justiça, por considerar inconstitucionais os preceitos da Portaria n.° 250/78, de 3 de Maio, que incluem entre as faltas as dadas por ocasião de parto.
2 — A análise do diploma referido mostra que os efeitos da contagem desse período e do de doença comprovada entre os limites das faltas ao estágio tem por único efeito a obrigação de «completar um período de estágio de duração igual ao número de faltas dadas para além das sessenta», per:' tidas, no estágio de especialidade cuja apreciação c aproveitamento é anual (n.° 8 da parte li) e a repetição dos estágios ou estágio de internatos de policlínica cujo aproveitamento é determinado após a realização de cada estágio.
3 — 0 artigo 68.° da Constituição da República Portuguesa determina, no seu n.° 2: «As mulheres trabalhadoras têm direito a um período de dispensa do trabalho, antes e depois do parto, sem perda de retribuição e de quaisquer regalias», e o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 112/76, de 7 de Fevereiro, estabelece, no n.° 1, que «ê concedido a todas as trabalhadoras o direito de faltar durante noventa dias no período da maternidade os quais não poderão ser descontados para quaisquer efeitos, designadamente, licença para férias, antiguidade ou aposentação».
4 — Será o estágio dos intervalos hospitalares um mero contrato de trabalho?
É certo que, nos termos do artigo 1.° da Portaria n.° 760/73, de 3 de Novembro, o internato médico constitui a 1." fase da carreira médica hospitalar e o regime de provimentos dos médicos é feito por contrato, conforme estabelece o seu artigo 17.°, mas o internato tem como objectivos, de acordo com o artigo 2° da mesma portaria, «proporcionar a todos os licenciados em Medicina idênticas possibilidades de aperfeiçoamento profissional e promover a <;ua valorização no sentido de se formarem eleme os aptos à cobertura médico-sanitária do Pais». Estão, assim, em causa outros factores que levam a considerar a relação hospital-interno, como um contrato especial em que, além dos direitos e deveres normais de uma relação de emprego público, existem os de-
correntes da obrigação, para a entidade pública, de fornecer as possibilidades de aperfeiçoamento profissional e, para o estagiário, de se tornar um elemento apto à cobertura médico-sanitária do País, como diz o diploma acima referido. Estão, portanto, em causa interesses superiores de ordem pública. Quando a recente Portaria n.° 250/78 exige que os estágios sejam repetidos ou prolongados no caso de doença ou licença de parto, não está a coarctar os direitos do trabalhador, que, como tal, receberá os seus respectivos vencimentos, está a defender o interesse público impondo ao estagiário que preencha as condições técnico-pedagógicas consideradas essenciais para que adquira a prática conveniente ao exercício das funções para que se está a preparar.
5 — Parece-me, assim, não haver qualquer inconstitucionalidade no diploma contestado, pelo que proponho o seu arquivamento com informação aos reclamantes.
11) Processo n.° 78/DI-26-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 773/76, de 27 de Outubro.
Segundo parecer do assessor Dr. João Caupers, com que o Provedor concordou, foi arquivado o pedido por não ter o mesmo fundamento válido.
12) Processo n.° 78/DI-27-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 113/78, de 29 de Maio.
Parecer do assessor Dr. João Caupers, que teve a concordância do Provedor:
1 — Quanto à alegada inconstitucionalidade por omissão, concordo inteiramente com o Sr. Provedor--Adjunto: o Provedor de Justiça não tem competência em tal domínio.
2 — Quanto à inconstitucionalidade rssultante da falta de participação das organizações de trabalhadores (material ou orgânica), corre já os seus termos o processo n.° 78/DI-25, no âmbito c.o qual o Ministério do Trabalho foi oficiado sobre a questão. Aliás, por sugestão minha, o Sr. Dr. Vaz Serra determinou já a apensação dos dois processos. É, pois, supérfluo tornar a inquirir o Ministério do Trabalho sobre este ponto.
3 — Suponho que nunca existiu um salário mínimo nacional em Portugal: desde o Decreto-Lei n.° 217/74, de 27 de Maio, passando pelo Decreto--Lei n.° 292/75, de 16 de Junho, e pelo Decreto-Lei n.° 49-B/77, de 12 de Fevereiro, sempre foram exceptuadas da obrigação de pagar o salário mínimo dito nacional certas empresas — pequenas empresas, certos sectores (agricultura, trabalho doméstico) — e certos trabalhadores — menos de 20 anos.
O Decreto-Lei n.° 49-B/77 fixa mesmo montantes mínimos diversos para a agricultura e os restantes sectores, e ainda para os menores de 20 anos, e exceptua o serviço doméstico.
4 — A meu ver, esta è, mais do que uma questão de interpretação do normativo constitucional, uma
Página 2009
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(33)
questão de bom senso: não me parece sequer possível, e ainda menos razoável, exigir a fixação de um salário minimo igual para todos os trabalhadores de todos os sectores da actividade económica.
A meu ver, a alínea b) do artigo 54.° da Constituição tem de ser interpretada no sentido de assegurar a cada trabalhador um salário mínimo legalmente fixado, pelo que a fixação de salários mínimos sectoriais em nada contende com o preceito constitucional.
A fixação imediata de um salário mínimo nacional, mais do que beneficiar os trabalhadores mais desfavorecidos, iria prejudicar os menos desfavorecidos, sem quaisquer vantagens visíveis para ninguém.
5 — Já normas como a do artigo 6.° do Decreto--Lei n.° 113/78, que não asseguram aos trabalhadores a que se podem aplicar qualquer retribuição mínima, contendem com o imperativo constitucional. Evidentemente que os dispositivos do artigo 6.°
— que vêm na linha de legislação anterior já referida, que tendia a exceptuar pequenas empresas —, são severamente criticáveis; mas não é menos de considerar que têm a explicá-los poderosas razões de natureza económica.
6 — 0 artigo 54.° da Constituição é uma norma que impõe certos deveres do Estado, deveres que são insusceptíveis, pela própria natureza das coisas, de execução imediata: são deveres que assinalam ao Estado um caminho a percorrer. Percurso mais ou menos longo, consoante as reais possibilidades do Pais em cada momento.
Nesta linha de pensamento, pode aceitar-se
— pensamos — como medida de carácter transitório uma norma como a do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 113/78. Sem perder de vista que se trata de uma medida de excepção, só admissível em tempo de crise — e reconstrução — económica, pela necessidade de evitar o desmoronamento das pequenas e médias empresas e o consequente aumento do desemprego.
7 — Quanto à suficiência ou insuficiência dos salários mínimos estabelecidos, não se nos afigura obviamente possível qualquer intervenção do Provedor de Justiça.
8 — No que concerne ao disposto no n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 113/78, suponho que a sua correcta interpretação é a feita pela CGTP-1N: não cremos que tenha sido intenção do legislador que um trabalhador abrangido na alínea c) do artigo 1.° e cumprindo um horário semanal de 40 horas, por exemplo, tenha como salário mínimo 4750$ (cinco sextos de 5700S, visto o seu horário ser cinco sextos do horário máximo nacional).
Admitimos que a intenção subjacente à norma seja exactamente o estabelecimento de uma garantia de duração semanal máxima do trabalho para os trabalhadores que a não têm, como é o caso dos rurais, do serviço doméstico.
Não faria sentido a redução do salário mínimo que exemplificámos, nem mesmo no plano económico, pois as empresas já têm os seus planos de produção e de encargos de mão-de-obra feitos em função de uma determinada duração do trabalho que, para elas, funciona como um máximo, nunca au-mentável, mas apenas redutível em função de aumentos de produtividade. A redução referida funcionaria como um castigo aos trabalhadores que hou-
vessem conseguido reduções da duração do trabalho, o que se afigura inaceitável.
Mas, trata-se de um problema de interpretação e não de constitucionalidade.
9 — No que respeita à alegada inconstitucionalidade orgânica por violação da competência reservada da Assembleia da República [artigos 52.°, alínea a), 17.° e 167.°, alínea c)], temos dúvidas que ela se verifique: pensamos que a alínea a) do artigo 53.° da Constituição não impede o Governo de fixar, por decreto e sem autorização legislativa, salários mínimos. Reservada à Assembleia da República está sim, por exemplo, a revisão da convenção colectiva de trabalho — capítulo v, onde se encontram as normas reguladoras da retribuição do trabalho. O Decreto-Lei n.° 113/78 não regula o direito à retribuição — seria então organicamente inconstitucional —, antes se limita a fixar as retribuições mínimas, o que é muito diferente.
10 — Em conclusão: não creio que se justificasse o pedido de apreciação e declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 113/78 ao Conselho da Revolução, podendo arquivar-se o processo sem prejuízo de o Decreto-Lei n.° 25/78 continuar a correr os seus termos.
13) Processo n.» 78/D1-30-A-3
Inconstitucionalidade do artigo 1.°, n.° 3, do Decreto-Lei n.° 364/76 e do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 366/77, de 14 de Maio.
Parecer do assessor Dr. Manuel Marcelino: Considerando:
a) As razões expressas, contra a alegada in-
constitucionalidade nos artigos 46.° e seguintes, das alegações de recurso da S. E. Transportes que tão evidentes são, num contexto constitucional vocacionado para o socialismo, que logo ocorrem quando se lê a reclamação [dá realmente vontade de perguntar se a interpretação do alcance económico do princípio da igualdade feita, como tem de ser, naquele contexto (artigos 2.° e 80.°) e à luz dos imperativos económico-sociais com os contidos nas alíneas a), c), d) e g) do artigo 81.° da Constituição, conduz à leitura que a reclamação faz daquele princípio, ou antes abonam e até postulam as soluções legais contestadas];
b) A pendência do caso no Supremo Tribunal
Administrativo através de dois recursos, tendo, aliás, já sido de^-ogada a suspensão da executoriedade (informação ao Sr. Provedor), e
c) Que não deverão ser considerações de viabili-
dade ou planeamento económico do sector que devem determinar o Serviço a intervir, claras como são as suas limitações nesse plano, aliás controverso (v. citadas alegações), afigura-se serem muitas e grandes as dúvidas quanto a dever o Serviço pedir a declaração de inconstitucionalidade e, mesmo, intervir no caso.
Página 2010
1076-(34)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Sobre este parecer proferiu o Provedor o seguinte despacho:
Concordo. O problema da inconstitucionalidade está levantado nos recursos interpostos para o Supremo Tribunal Administrativo. O caso reveste aspectos de natureza económica e financeira que escapam às possibilidades de intervenção do Serviço do Provedor de Justiça.
Assim, é de arquivar, tal como propõe o Sr. Dr. Marcelino.
14) Processo n.» 78/DI-32-B-1
Inconstitucionalidade do artigo 16.° da Portaria n.° 210/78, de 15 de Abril.
Parecer da assessora Dr." Maria Helena Carvalho Fernandes, com o qual o Provedor concordou:
1 — O problema que este processo suscita é o de saber se o preceito da Portaria n.° 210/78, que estabelece que a classificação das provas do Ano Propedêutico não é susceptível de recurso, é ou não inconstitucional.
2 — Compulsando os diversos artigos da Constituição, aquele que, em nossa opinião, pode efectivamente levar a admitir uma certa hesitação quanto ao assunto é o artigo 49.° Todavia, atendendo melhor no teor do mesmo, conclui-se que não se está na verdade perante um caso de inconstitucionalidade.
3 — Dispõe-se nesse artigo que: «Todos os cidadãos podem apresentar, individual ou colectivamente, aos Órgãos de Soberania ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição e das leis ou do interesse geral».
É, pois, na medida em que este articulado refere que os cidadãos podem apresentar reclamações para defesa dos seus direitos ou do interesse geral que levanta certas dúvidas.
Todavia, atendendo a que o aluno, quando faz uma prova de exame e pretende recorrer da nota que lhe é atribuída porque entende que a mesma foi mal valorada, não põe em causa a defesa de qualquer direito mas tão-somente uma mera circunstância de facto — a própria avaliação —, há pois que afasta a hipótese de inconstitucionalidade.
E não se diga que é o direito a transitar de ano que é afectado, pois que esse direito só nasce com a classificação positiva do respectivo exame.
Por outro lado, o facto de o artigo 49." da Constituição tornar legítimo que os cidadãos façam petições no sentido de vir a ser instituído o recurso da classificação das provas do Ano Propedêutico — trata-se de matéria de interesse geral — também, como é evidente, não significa que um preceito que expressamente afasta esse recurso seja inconstitucional, quando muito poderá ser inconveniente.
15) Processo n.° 76/DI-4-B-1
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 463/75, de 27 de Agosto, e da Portaria n.° 260/76, de 4 de Maio.
Entretanto, foi deliberado aguardar, antes de solicitar a apreciação ao Conselho da Revolução, o pa-
recer da Procuradoria-Geral da República, à qual o problema também fora suscitado. Eis o teor do parecer do Dr. Caupers:
I — Engil — Sociedade de Construção Civil, L.da, com sede em Lisboa, ao abrigo o disposto no artigo 49.° da Constituição da República e com vista à produção do efeitos do n.° 1 do artigo 281.° do mesmo diploma fundamental, vem arguir a inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 463/75, de 27 de Agosto, e da Portaria n.° 280/76, de 4 de Maio — que criaram e disciplinaram a orgânica e o funcionamento das chamadas comissões de conciliação e julgamento —, na base da argumentação largamente aduzida na exposição apresentada e que aqui se dá por integralmente reproduzida e da qual se salientam, como de mais expressiva relevância, os tópicos seguintes:
O legislador substituindo as «comissões corporativas» pelas comissões de conciliação e julgamento entendeu alargar a natureza pré--judicial de que se revestia a actuação daquelas a uma natureza verdadeiramente jurisdicional que ora tonaliza grande parte da actividade destas, o que, aliás, ressalta do próprio preâmbulo do citado Decreto-Lei n.° 463/75 onde se faz alusão expressa a que «parece, ainda, particularmente oportuno experimentar um novo tipo de órgão jurisdicional, em que se achem representados os trabalhadores e as empresas, mesmo antes de estabelecida a indispensável forma do Código de Processo do Trabalho, já em curso».
Sucede, assim, que, para além de uma tentativa de conciliação em todas as questões individuais emergentes de contratos de trabalho, foi cometido às comissões de conciliação e julgamento «o julgar, sem recurso, aquelas cujo valor não exceda 20 000S, além das que, independentemente do valor, as partes, por acordo prévio, lhes submetam para julgamento».
Dr leitura do artigo 6.°, n.° 1, alínea b), e do artigo 7.°, n.os 1 e 5, do Decreto-Lei n.o 463/75 ou dos artigos 71.c, n.° 1, 79.°, n.° 3, 82.°, n.° 5, 86.° e 87.°, n.° 5, da Portaria n.° 280/76, recolhe-se, com clareza, esta ideia de actividade jurisdicional que, indubitavelmente, lhes é concedida, competindo-lhes, consequentemente, dirimir, suprapartes, conflitos de interesse para cuja apreciação só elas detêm competência.
O que, necessariamente, ofende os princípios consagrados nos artigos 205.°, 208." e 210.°, n.° 1, in fine da Constituição da República, sendo certo que, segundo ela. o exercício do poder judicial cabe, única e exclusivamente, aos tribunais.
E ofenderá também o que se preceitua nos artigos 212.° e 213.°, n.° 1, da Constituição, porquanto o julgamento das questões de trabalho está cometido aos tribunais judiciais, mesmo que estes hajam de ter competência especifica ou especializada.
De todo o modo sempre sujeitos à disciplina dos artigos 212." a 223." da Constituição.
Página 2011
3 DE ABRIL DE 1979
l076-(35)
Pelo que também se viola, no tocante à composição das comissões de conciliação e julgamento (cf. artigos 2.° e 3.° do Decreto-Lei n.° 463/75), o disposto no artigo 220.° da Constituição.
Atingida igualmente será a inamovibilidade, garantia inerente aos magistrados judiciais (como resulta do artigo 221.°, n.° 1, da Constituição) pelo disposto nos artigos 2.° e 4.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 463/75.
E o regime da incompatibilidade firmado no artigo 222.°, n.° 1, da Constituição, violado é, igualmente, pelos artigos 7.°, n.° 2, e 10.°, n.° 2, da Portaria n.° 280/76.
Donde, decorrentemente, se ofende, em geral, o principio definido no artigo 208." da Constituição, ou seja, o da independência dos tribunais.
Por outro lado, os princípios constitucionalmente consagrados nos artigos 18.", n.° 3, e 20." da Constituição são atingidos pelo disposto no artigo 85.°, n.° 2, da Portaria n.° 280/76.
Perante o conjunto da argumentação traçada e da qual se acabam de recordar os pontos de mais agudo interesse, forçoso será reconhecer que, se com efeito os diplomas em causa são passíveis de algumas dúvidas quanto à sua constitucionalidade, certas objecções se podem alinhar em contrário à tese propugnada.
II — É indubitável que, quer face ao que se acentuou no preâmbulo do citado Decreto-Lei n.° 463/75, quer ao que decorre dos artigos do mesmo diploma e da referenciada portaria que foram enunciados, as comissões de conciliação e julgamento exercem autênticas funções jurisdicionais — ou mais expressivamente actuam como autêntico tribunal — quanto a determinadas questões; e exercem mesmo essa actividade jurisdicional como tribunal de instância única, em certos casos.
Porém, ainda assim, não encontrarão tais comissões de conciliação e julgamento enquadramento no vigente texto constitucional?
Dispõe o artigo 212.° da Constituição:
1—Haverá tribunais judiciais de 1.» insta cia, de 2." instância e o Supremo Tribunal de Justiça.
2 — Haverá tribunais militares e um Tribunal de Contas.
3 — Poderá haver tribunais administrativos e fiscais.
E o artigo 213.°:
1 — Na 1.» instância pode haver tribunais com competência específica e tribunais especializados para o julgamento de matérias determinadas.
2— .................................
3— .................................
Da análise destes dois preceitos constitucionais — que são os que especialmente importam à ponderação do caso em apreço — poder-se-â estabelecer eventualmente uma distinção — permitida pela expressão literal que neles se utiliza — entre tribunais não judiciais e tribunais judiciais.
Realmente, o qualificativo «judicial» é aposto, por exemplo, no n.° I do artigo 212.° (tribunais judiciais de 1." instância, de 2." instância e o Supremo Tribunal de Justiça), no artigo 215.°, no artigo 220.°, etc... .
Contudo, não se utiliza já o mesmo qualificativo quando no n.° 2 do citado artigo 212." se alude a «tribunais militares» e ao «Tribunal de Contas» ou quando no n.° 3 da mesma norma se faz referência a «tribunais administrativos e fiscais».
Igualmente esse dito qualificativo não é usado no n.° 1 do artigo 213." onde se consagra a possibilidade de poderem existir em 1." instância tribunais com competência específica e tribunais especializados para o julgamento de matérias determinadas (ainda que aqui — mas o argumento não é inequívoco — se possa remeter para o n.° 1 do artigo 212.° onde se fala de tribunais judiciais de l.a instância, razão por que os tribunais a que se reporta o n.° I do artigo 213." poderiam ser tidos como tribunais judiciais, embora específicos).
De todo o modo — e passando por aquilo que pode simplesmente traduzir inexpressividade dos artigos em causa ou deficiente redacção dos mesmos — sempre poderia estabelecer-se uma distinção entre tribunais judiciais e tribunais não judiciais, embora exercendo, uns e outros, função jurisdicional, na base de que aqueles seriam compostos total ou fundamentalmente por magistrados judiciais e estes não necessariamente por magistrados judiciais.
E, de facto, não parece poder extrair-se de forma peremptória do diploma constitucional que não possa haver tribunais não compostos por magistrados judiciais, tanto mais que o capítulo ih do título vi da Constituição e que se reporta à magistratura dos tribunais judiciais, não elimina a possibilidade da existência de tribunais não judiciais de que façam parte (ou compostos) por magistrados não judiciais, limitando-se a definir certos aspectos que dizem, em exclusivo, respeito à magistratura judicial.
De resto, a própria Constituição ao perspectivar a possibilidade da criação de juízes populares, de esti belecer formas de participação popular na administração da Justiça ou de encarar a participação de assessores tecnicamente qualificados no julgamento de determinadas matérias (artigo 217.°) consagra a ideia de que pode haver tribunais com juizes não magistrados judiciais.
Por outro lado, retornando ao aspecto já atrás abordado, deve dizer-se, em consequência, que se os tribuna.., de 1." instância e 2." instância são judi-' ciais, sâo-no por regra (cf. artigo 214.°, n.os 1 e 2) e não obrigatoriamente.
Parece assim que o contexto geral da exposição da arguente da inconstitucionalidade se prende em demasiado a um argumento que, porventura, não é decisivamente relevante: a de que os artigos que compõem o referenciado capítulo v/ da Constituição e referentes a «magistratura dos tribunais judiciais» se têm necessária e inafastavelmente de articular com os que integram o antecedente capítulo n relativo à organização dos tribunais.
Consequentemente:
A meu ver, poderá ser defensável, à luz destes raciocínios, a constitucionalidade dos diplomas citados.
Página 2012
1076-(36)
II SÉRIE — NÚMERO 47
E, pelos mesmos motivos, não ocorrerão os argumentos de anticonstitucionalidade colocados no tocante à composição das comissões de conciliação e julgamento, designadamente em matéria de garantias e incompatibilidades, desde que se entenda que tais garantias e incompatibilidades só funcionam —como aliás resulta do texto constitucional (cf. artigo 220.° para além da epígrafe do1, capítulo ih) — para e exclusivamente os magistrados judiciais (sem prejuízo de a tais regras se poder recorrer subsidiariamente).
III — O reparo feito ao artigo 8S.°, n.° 2, da Portaria n.° 280/76 e a arguição da sua inconstitucionalidade, face aos princípios consagrados nos artigos 18.°, n.° 3, e 20." da Constituição, poderiam ter ampla razão de ser na medida em que realmente sugerem ofensa à defesa dos direitos dos interesses e inibem por, v. g., carência técnica, uma cobertura total desses direitos.
Desconhecendo, porém, como na prática se tem vindo a disciplinar as presenças nas audiências, e ignorando-se mesmo se não tem vindo a ser entendido como interessado também o seu patrono, não se tornará possível formular uma conclusão concreta.
De todo o modo, afigura-se-me que aqui a solução estará mais numa correcta interpretação do texto legal — considerando, inclusive, as diferenças entre as características da fase pré-conciliatória e de uma que é já de discussão em julgamento — e nessa interpretação — concedendo que face ao contexto literal do preceito teria de ser uma interpretação extensiva — não será sequer difícil consentir actuação do patrono (representante do interessado).
Sem esquecer, de resto, que o que ali se discute é predominantemente matéria de facto.
IV — Quanto à questão de estar desde logo condenada ao insucesso uma arguição de inconstitucionalidade perante as comissões de conciliação e julgamento, ou não se vislumbrar como possível que aquelas, elas próprias, coloquem a questão dessa inconstitucionalidade, porque, num caso e noutro, estariam a pôr em causa a própria lei que as criou, parece isso sem dúvida óbice importante.
Todavia não será decisivo uma vez que se prende mais com a isenção dos membros componentes do que com problema de ordem técnico--jurídica.
O mesmo, aliás, se deverá ter em conta no concernente às pretensas «inabiiidades técnicas» porque seria preciso demonstrar, numa panorâmica baseada em casuística acentuada, que elas se têm vindo a revelar na prática com grau pelo menos preocupante, e não, como se insinuará, partindo-se a priori de uma presunção.
V — É evidente que, para além da pertinência das questões focadas e desenvolvidas na exposição em apreço, não pode igualmente deixar de relevar — face a diplomas da natureza dos postos em causa— a necessidade de uma ponderação (que, agora, em plena vigência da Constituição, terá de ser muito mais acentuada ainda) acerca da composição e estruturação de determinados órgãos1".
Para além da própria problemática da constitucionalidade agora frontalmente colocada, não poderei
(') O problema também colocado em 3) da informação inicial, no tocante aos chamados tribunais arbitrais, não se me afigura, aqui, merecedor de tratamento especialmente desenvolvido.
deixar, embora adentro de um prisma pessoal, de entender coimo criticável a não obrigatoriedade de ser magistrado judicial o Presidente da Comissão (embora já mão assim quanto aos assessores pois que estes têm uma significação fundamentalmente técnica e informadora, ligada aos aspectos específicos das questões debatidas, que dispensará e até aconselhará não possuírem aquela qualidade).
Com efeito, quer o modo de provimento, quer o vínculo da ligação administrativa que caracteriza a função, pode consentir dúvida na isenção ou receio de que na decisão possam ser tomadas, menos em atenção aos casos concretos debatidos e suas incidências do que às directivas, quiçá de natureza política, que se entendam como circunstancialmente mais convenientes, embora equitativamente menos justas.
De todo o modo, repete-se, recordando o que antecedentemente se esboçou, não penso que se possa concluir inequivocamente por que esta tonalidade da questão encerra um problema de inconstitucionalidade propriamente dito.
VI — Concluindo:
1 — Para além dos aspectos em genérico abordados e que poderiam eventualmente interferir com a validade da suscitada arguição de inconstitucionalidade, quer-me parecer que o problema posto terá a iliquidez bastante, a delicadeza suficiente e a margem de interesse precisa para que, com plena razão de ser, se coloque ao Conselho da Revolução, nos termos do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição da República, a sua apreciação.
2 — Nesse sentido me pronuncio, pois, sem embargo das objecções que me ocorreram, de modo algum superadoras da necessidade da ponderação da valoração dos argumentos exibidos pela exponente, os quais, por isso, deverão ser integralmente transmitidos àquele órgão.
Para já — encarando a sua subsistência nos quadros de direito constituendo — poderá afoitamente dizer-se que o diploma constitucional os não proscreve e, apesar de lhes não fazer referência especifica (seria necessário?), o contexto de certos normativos (v. n.° 1 do artigo 213." e n.° 2 do artigo 217.°) é de molde a fazer pensar que não terá tido em vista extingui-los.
De resto, e agora no plano do direito vigente, uma similitude — ou para utilizar a expressão usada na informação inicial uma «possível aproximação» — entre o tribunal arbitral e as comissões de conciliação e julgamento é mais aparente do que real.
Na verdade, os tribunais arbitrais constituem fundamentalmente uma manifestação de vontade privada para resolução de um pleito ou para sanação do mesmo, não sendo as partes estranha;, ao funcionamento do órgão e estando mais ou menos directamente ligadas à sua composição; além disso, tais tribunais estão completamente informados pela equidade e mais por ela do que pelo direito positivo. Se se procuresse para tais órgãos de justiça uma definição expressiva, estaria tentado a considerá-los como tribunais privados.
Parece evidente que o escopo de órgãos do tipo das comissões de conciliação e julgamento é diferente, quer quanto aos objectivos a atingir, quer quanto ao campo em que se sirva, quer quanto à susci-
Página 2013
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(37)
tacão de funcionamento: alvo fundamentalmente social, âmbito marcantemente público, iniciativa não primacialmente nascida da vontade das partes.
Não se me afigura possível, portanto, de momento, encarar sequer a inconstitucionalidade das normas reguladoras da criação e funcionamento dos chamados tribunais arbitrais (cf. artigos 1508." e seguintes do Código de Processo Civil) que actuam num condicionalismo jurídico essencialmente pri-vatístico, por isso menos apto (ou nulamente apto) a fazer nascer questões de inconstitucionalidade que, como é sabido, se ligam sempre à problemática da compreensão ou limitação dos direitos individuais por parte do legislador e . . . sem iniciativa ou «colaboração» dos cidadãos, como bem se compreenderá, para tais compressão ou limitação.
Não chegou a ser enviada ao Conselho da Revolução por, entretanto, ter sido publicada z Lei n.° 82/77, de 6 de Dezembro, que, pela alínea c) do n.° 2 do artigo 83.°, extinguiu as comissões de conciliação e julgamento com efeitos a partir de 31 de Julho de 1978.
16) Processos n.<" 77/DI-2-A-3 e 77/DI-3-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 887/76, de 29 de Dezembro.
Os dois processos, por versarem a mesma matéria, foram, de acordo com o parecer do assessor Dr. João Caupers, fundidos num só.
Entretanto, como por resolução do Conselho da Revolução, publicada no Diário da República, 1.a série, n.° 266, de 14 de Dezembro de 1978, este não se pronunciou pela inconstitucionalidade das normas constantes dos Decretos-Leis n.os 353-G/77, de 29 de Agosto, e 887/76, de 29 de Dezembro, foi o processo, já fundido, mandado arquivar, por despacho de 27 de Dezembro de 1978.
17).Processo n.° 77/DI-6-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 57/77, de 18 de Fevereiro.
Parecer do assessor Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou no tocante às conclusões, pelo despacho que a seguir se transcreve:
Solicita-se a intervenção do Provedor de Justiça para, usando da prerrogativa que lhe é concedida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição Política, suscitar ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 57/77, de 18 de Fevereiro, que estabeleceu o esquema mediante o qual se pretende viabilizar o exercício do direito de voto pela totalidade dos trabalhadores das empresas na eleição das comissões de
trabalhadores e na aprovação dos estatutos e eleição das direcções sindicais e aprovação dos respectivos estatutos.
Pretendem os reclamantes fundamentar a sua solicitação arguindo a inconstitucionalidade do citado diploma por duas ordens de razão:
a) A matéria legislada è da competência reser-
vada da Assembleia da República por respeitar os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos trabalhadores, vio-lando-se, pois, a alínea c) do artigo 167.° da Constituição, tanto mais que das disposições do decreto-lei resulta o intuito de levantar obstáculos à eleição das comissões de trabalhadores, mormente ao exigir a presença da maioria dos trab°lha-dores da empresa no acto eleitoral jara que este seja válido;
b) Não se conhece que qualquer comissão de
trabalhadores ou direcção sindical tenha participado na elaboração do projecto do decreto-lei referido, o que violaria os artigos 56.°, alínea a), igualmente da Constituição.
Vejamos:
Quanto ao mérito do diploma e à sua possível intenção de levantar obstáculos à eleição das comissões e apreciação dos estatutos, dou a minha inteira concordância à posição expressa pelo Sr. Dr. Caupers nas alíneas 1) e 4) do seu parecer, assim como estou de acordo quanto à posição que toma relativamente ao problema suscitado pelo Sr. Dr. Silveira no seu parecer inicial, entendendo, portanto, que não há violação de qualquer preceito constitucional pelo facto de o Governo publicar um decreto-lei sobre matéria constante de projecto já pendente na Assembleia da República.
Tal facto não implica existência de procedimento anticonstitucional, mas, tão-só, de actuação passiva de censura política por parte da Assembleia da República.
Resta apreciar os dois aspectos:
a) Será a matéria do decreto-lei em causa da competência reservada da Assembleia da República e, consequentemente, estaria vedado ao Governo, de acordo com a alínea c) do artigo 167.° da Constituição? Para apreciar essa questão, há que fixar se a matéria legislada contende com os direitos, liberdades e garantias fundamentais dos trabalhadores. O decreto-lei em questão em nada modifica, impede, ou restringe os direitos reconhecidos aos trabalhadores na criação das suas comissões.
Efectivamente, nele se respeitam o direito dessa criação, os fins que são visados pelas comissões, a forma de eleição por voto directo e secreto, em plenário de trabalhadores e a aprovação dos seus estatutos em plenários, isto é, todos os que são consagrados no artigo 55.° da Constituição. E, tudo o que nele se contém limita-se a facilitar o exercício do direito de voto, a garantir um mínimo de democraticidade, de autenticidade, de genuidade no acto eleitoral, permitindo que ele se exerça no local e durante as horas de trabalho, marcando a antecedência
Página 2014
1076-(38)
II SÉRIE — NÚMERO 47
mínima para a marcação e anúncio do acto eleitoral, obrigando à sua ampla publicidade, bem como a da menção no anúncio da hora, local e objecto da realização do acto eleitoral, e dispondo sobre a sua validade, tudo em ordem a assegurar não só a intervenção de todos os que queiram participar no acto eleitoral e, consequentemente', a representatividade de que as comissões assim eleitas ficam revestidas. Não é legislar sobre direitos, liberdades e garantias fundamentais, mas tão-só tornar exequíveis, sem alterar, impedir, restringir ou de qualquer modo desrespeitar os direitos, liberdades e garantias fundamentais que a Constituição consagra.
E isto é perfeitamente constitucional.
Nem obsta a este entendimento o facto de o artigo 17.° da Constituição dispor que o regime dos direitos, liberdades e garantias, se aplica aos direitos dos trabalhadores, pois que, quanto a mim, tai significa que as disposições dos artigos 18.°, 19.° e 20.° são aplicáveis aos direitos dos trabalhadores, já que são estas que prescrevendo sobre a força jurídica, a suspenção e a defesa desses direitos, caracterizam o regime dos direitos, liberdades e garantias fundamentais.
Sendo certo que o decreto-lei em causa respeita integralmente, reproduzindo-os, os preceitos constitucionais que regem a criação e eleição das comissões de trabalhadores, não legisla sobre matéria que possa rotular-se de direitos, liberdades ou garantias fundamentais dos trabalhadores, não pode tal conduzir à sua inconstitucionalidade.
b) Houve falta de participação das comissões de trabalhadores ou das associações sindicais na elaboração do decreto-lei em causa? O artigo 56.°, alínea d), declara constituir direito das comissões de trabalhadores participar na elaboração da legislação do trabalho; e a alínea a) do artigo 58.° reconhece igual direito às associações sindicais. Logo, e desde o inicio, há que determinar se o Decreto-Lei n.° 57/77 pode considerar-se legislação de trabalho. Creio que a resposta não pode deixar de ser negativa.
Efectivamente, o decreto-lei não dispõe sobre relações de trabalho, contratação, despedimentos, remunerações, férias, segurança no trabalho, acidentes, direito à greve, procedimento disciplinar, em suma, sobre qualquer matéria relacionada com a prestação ou regulamentação do trabalho. Não é, pois, legislação em cuja elaboração a Constituição reconheça o direito de participação dos trabalhadores através das suas comissões ou das suas associações sindicais.
Consequentemente, e desde logo, ainda que, porventura, não tivesse havido a referida participação, tal não feria o decreto-lei de inconstitucionalidade, dado que a Constituição não estabelecia para este caso concreto o direito de participação.
Tanto basta para que se tenha de concluir que também esta argumentação não é procedente.
Por todas as razões expostas, entendo não dever usar da prerrogativa do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, e, assim, não suscitar a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 57/77, de 18 de Fevereiro, determinando o arquivamento da reclamação, com elucidação aos reclamantes, a qual consistirá no envio da cópia deste despacho.
18) Processo n.° 77/D1-9-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 49-A/77, de 12 de Fevereiro.
Parecer do assessor Dr. João Caupers:
Procedi à apreciação, ponto por ponto, dos quatro aspectos referidos pelo reclamante. Assim:
1 — Remetemos para as informações incluídas nos processos n.°' 76/DI-12-A-2, 76/DI-15-A-3 e 77/DI-Í6-A-3 em que o problema posto pelo reclamante é tratado.
2 — Na informação incluída no processo n.° 76/DI-15-A-3 também esta questão foi estudada.
3 — No sistema vigente antes de 24 de Abril de 1974 — artigo 24.°, n.° 3, do Decreto-Lei n.° 492!2, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 492/70, de 22 de Outubro — o Estado controlava, através do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, a legalidade, quer formal quer substancial, dos textos convencionais e até os apreciava com base na equidade. Só as convenções que passam por este crivo institucional eram homologadas e produziam efeitos.
O Decreto-Lei n.° 164-A/76, de 28 de Fevereiro, acabou com a homologação ministerial (na prática esta havia acabado logo em 25 de Abril de 1974). Os textos convencionais eram obrigatoriamente depositados no Ministério do Trabalho e este depósito só podia ser recusado com fundamento em ilegalidade formal — artigos 19.°, n.° 2, e 8.° (falta de conteúdo obrigatório). Quanto às ilegalidades substanciais, eias não obstavam ao depósito e publicação, mas podiam ser anuladas pelos tribunais de trabalho pelos interessados — artigo 24.°
Este estado de coisas não foi alterado pelo Decreto-Lei n.° 887/76, de 29 de Dezembro — artigos 19.°, n.° 2, 7.° e 8.°
A situação alterou-se com a publicação do Decreto-Lei n.° 49-A/77, de 12 de Fevereiro; e se ainda se pode entender que o n.° 3 do artigo 2.° deste diploma estabelece um controle formal, na medida em que se está ainda perante uma exigência de conteúdo obrigatório, já o mesmo se não pode afirmar quanto ao n.° 2 do artigo 9.° De facto, através deste preceito, o Ministério do Trabalho, através da possibilidade de recusa do registo, passa a controlar importantes aspectos da legalidade substancial das convenções colectivas — todos os que se prendem com remunerações.
Esta alteração traduz, a nosso ver, um retrocesso na matéria, pois o princípio de que o controle da legalidade substancial de uma convenção colectiva apenas pode ser cometido ao poder judicial afigura--se correcto. Simplesmente, não encontrámos nem na Constituição, nem em qualquer convenção internacional ratificada pelo Estado Português a consagração de tal princípio. Pelo que se torna impossível usá-lo para fundamentar a inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 49-A/77.
4 — Sobre este aspecto, não me pronuncio:
Em primeiro lugar, desconheço o grau de exactidão dos números apresentados pelo reclamante;
Em segundo lugar, não me parece possivel ajuizar da constitucionalidade de um diploma
Página 2015
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(39)
confrontando consequências previsíveis da sua aplicação a um caso concreto com principios programáticos da Constituição; Em último lugar, tenho conhecimento que a Assembleia da República está a rever ou vai rever este aspecto do diploma.
Em conclusão:
Como em outros casos, mantenho que, com base no primeiro ponto — falta de audição eficaz dos sindicatos e comissões de trabalhadores —, é de pedir ao Conselho da Revolução a apreciação da constitucionalidade do Decreto-Lei n.° 49-A/77 [artigos 56.°, alinea a), e 58.°, n.° 2, alínea a), da Constituição}. Continuo a entender que o respeito pelas normas constitucionais exige que as entidades em questão tenham possibilidade de se pronunciar sobre os projectos dos diplomas. Ê, aiiâs, a prática da Assembleia da República.
Sobre este parecer, proferiu o Provedor, em 16 de Fevereiro de 1978, o seguinte despacho:
Concordo com a informação do Sr. Dr. Cau-pers, excepto no seu ponto i.
Expus já noutro processo — não tenho bem certo se o DI-12 se o DI-15, ou qual — o meu ponto de vista sobre o problema da audição das comissões de trabalhadores e associações sindicais e, quanto a tal matéria, não estou de acordo com o ponto de vista, aliás como sempre defendido com viva convicção pelo Sr. Dr. Cau-pers, sustentado.
Continuo, não por «birra», mas por convicção, a entender que é muito mais útil até a audição antes de existir projecto de legislação, portanto enquanto apenas há o propósito de legislar, do que sobre um projecto já elaborado.
As razões que me levam a assim pensar constam desses meus despachos noutros processos. Não vejo necessidade de as repetir aqui. Sendo assim, entendo que não é de pedir a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 49-A/77, devendo o processo arquivar-se, com elucidação ao reclamante.
19) Processo n.° 77/D1-10-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 29931, de 15 de Setembro de 1939 (Regulamento da Carteira Profissional dos Técnicos de Prótese Dentária).
Parecer do assessor Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou:
I — A Associação dos Industriais de Prótese dirigiu-se ao Provedor de Justiça no sentido deste requerer ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração da inconstitucionalidade das alterações em epígrafe constantes de despacho do Secretário de Estado do Trabalho de 16 de Março de 1977. Fundamenta a reclamante o seu pedido em alegada inconstitucionalidade material por violação do disposto na alinea b) do n.° 2 do artigo 57.° da Constituição.
Vejamos qual o teor das referidas alterações: elas limitaram-se a alterar e criar categorias profissionais,
modificar a composição do júri das provas práticas, que passou a ser totalmente designado pela direcção do Sindicato dos Técnicos de Prótese Dentária, alterar uma taxa e criar outra. Esclarecendo, diremos que estas alterações incidem sobre o Regulamento em epígrafe, aprovado pelo então Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social, de 9 de Abril de 1946, e elaborado nos termos do Decreto-Lei n.° 29931, de 15 de Setembro de 1939.
II — O ponto importante da questão reside nisto: o exercício da profissão de técnico protésico está condicionado à posse da respectiva carteira profissional, documento emitido pelo sindicato. Por este serviço cobra o sindicato taxas de revalidação de montante diverso, consoante se trate ou não de sócios.
A alínea b) do n.° 2 do artigo 57." da Constituição garante aos trabalhadores a Uberdade de inscrição, não podendo nenhum trabalhador ser obrigado a pagar quotizações para sindicato em que não esteja inscrito.
Convém notar que a exigência de carteira profissional não é, só por si, inconstitucional: ela pode ter uma poderosa justificação de interesse público na necessidade de garantir a competência dos trabalhadores que exercem determinadas actividades. O que se pode pôr em causa é a constitucionalidade de serem sindicatos a ter o privilégio de emitir tais carteiras profissionais.
III — Em rigor, não estamos nem perante um caso de obrigação de contribuir com uma quota para um sindicato em que não se está inscrito — a taxa de revalidação é o preço da prestação de um serviço, não é uma quota — nem tão-pouco perante a obrigação de se ser sócio de um sindicato, dado que a inscrição como sócio não condiciona o exercício da profissão.
Estamos sim, perante uma situação em que um documento exclusivamente emitido por um sindicato condiciona o exercício de uma profissão, sendo cobradas taxas diversas pela sua missão consoante os requerentes sejam ou não sócios do referido sindicato.
Não entendemos que este estado de coisas infrinja o disposto na alínea b) do n.° 2 do artigo 57.° da Constituição.
IV — Aliás, a originalidade da situação assenta na lei que permite a emissão de carteiras profissionais — Decreto-Lei n.° 29931, de 15 de Setembro de 1939 (este diploma baseia a sua lógica no sistema corporativo-fascista dos sindicatos nacionais). Com este tipo de sindicatos — únicos e de que os trabalhadores eram contribuintes obrigatórios — o sistema tinha uma certa lógica: o Estado cometia aos sindicatos a função de passar carteiras profissionais, mediante o pagamento de uma taxa remuneratória do serviço prestado. E cometia aos sindicatos como poderia cometer a outra entidade.
Actualmente, com a liberdade de inscrição e de constituição de sindicatos, o sistema afigura-se aberrante: imagine-se, por exemplo, que se constituía outro sindicato de técnicos de prótese — o outro sindicato' continuaria a passar carteiras profissionais aos sócios do novo sindicato!
V — Em conclusão:
1 — Entendemos que não procede a invocação da inconstitucionalidade da alteração ao Regulamento
Página 2016
1076-(40)
II SÉRIE — NÚMERO 07
da Carteira Profissional dos Técnicos de Prótese .Dentária, não se constatando violação da alínea b) do n.° 2 do artigo 57.° da Constituição.
2 — Não temos dúvidas de que os actuais regulamentos de carteira profissional, bem como o Decreto--Lei n.° 29 931, são pouco compatíveis com o princípio da livre constituição dos sindicatos. Urge, pois, proceder às necessárias alterações legislativas.
Em face deste parecer foi enviado ao Ministério do Trabalho, em 16 de Setembro de 1977, a recomendação seguinte:
Considerando que os vários regulamentos de carteiras profissionais encontram fundamento legal no velho Decreto-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939;
Considerando que a atribuição aos então sindicatos nacionais de competência exclusiva para a emissão de carteiras profissionais assentava no pressuposto dos sindicatos únicos, característicos do sistema corporativo-fascista;
Considerando que a actual Constituição consagrou os princípios da liberdade de constituição de sindicatos e da liberdade de inscrição nos mesmos, corolários da liberdade sindical (artigo 57.o);
Considerando finalmente que estes princípios parecem incompatíveis com o condicionamento do exercício de uma profissão à posse de documento exclusivamente emitido por um sindicato:
Recomenda o Provedor de Justiça:
1) A revogação do Decreto-Lei n.° 29 931,
de 15 de Setembro de 1939;
2) A atribuição a uma ou várias entidades
públicas da competência para a emissão de carteiras profissionais, retirando-se tal competência aos sindicatos e alterando-se em conformidade os regulamentos de carteiras profissionais actualmente em vigor.
O processo foi arquivado por o Ministério do Trabalho, em ofício de 3 de Fevereiro de 1978, ter comunicado estarem em curso estudos preparatórios tendo em vista a revisão da legislação em causa.
28) Processo n." 77/DI-J8-8-I
Inconstitucionalidade da norma constituinte do artigo 469.° do Decreto-Lei n.° 46 311, de 27 de Abril de 1965.
Parecer da assessora Dr." Branca Amaral, com o qual o Provedor concordou:
I
1 — José Luís Tabuada Teixeira, casado, despachante oficial da Alfândega do Porto, requer ao Provedor de Justiça que aprecie e proponha a declaração de inconstitucionalidade do artigo 469.° da Reforma Aduaneira, por considerar tal norma violadora dos preceitos contidos nos artigos 13.°, 18.°, 46.°, n.° 3, e 51.°, n.° 3, da Constituição da República.
Dispõe o referido artigo 469.° do Decreto-Lei n.° 46 311, de 27 de Abril de 1965:
A Câmara dos Despachantes Oficiais ê um organismo corporativo do qual farão parte todos os despachantes oficiais como condição indispensável ao exercício da sua profissão.
2 — À semelhança de outras associações de carácter profissional de inscrição obrigatória, a Câmara dos Despachantes Oficiais era, à data do diploma referido, um organismo corporativo.
Parece-me, hoje, ponto incontroverso que deve, nessa qualidade, considerar-se extinta, persistindo como organização profissional.
A alínea g) do ponto 1 do Programa do Governo Provisório, cuja orgânica foi definida pelo Decreto--Lei n.° 203/74, de 15 de Maio, previa a extinção progressiva daquela organização, extinção essa que se foi sucessivamente concretizando a partir das Corporações (Decreto-Lei n.° 362/74, de 17 de Agosto) até aos organismos dos vários graus que nelas culminavam.
Damos, assim, por assente que, nessa parte, a norma referida se encontra revogada, absurdo como seria considerar a Câmara dos Despachantes Oficiais um reduto dessa organização.
3 — No entanto, não pode deixar de se notar a aparente desatenção com que se procedeu, depois de 25 de Abrii de 1974 às múltiplas alterações concernentes à referida Reforma Aduaneira — nada menos de doze, entre 27 de Junho de 1974 e 2 de Julho de 1977 — sem que alguém houvesse por bem actualizar a redacção do artigo 469.°
Aliás, o Decreto-Lei n.° 680/74, de 20 de Novembro, modificou a redacção dos artigos 472.°, 474.°, 476.° e 524.° da Reforma Aduaneira, referentes todos à nomeação de ajudantes de despachantes.
4 — Levou-nos este «lapso» estranho a contactar o representante da Direcção-Geral das Alfândegas, na Câmara dbs Despachantes Oficiáis;, para esclarecimentos.
Fomos informados, então, pelo Dr. Mascarenhas de que estão já adiantados os trabalhos de um grupo presidido por um representante pessoal de S. Ex.a o Secretário de Estado do Orçamento para total reformulação do livro v da Reforma Aduaneira, onde se insere o referido artigo 469.°, tendo-se desistido de alterações pontuais por essa razão.
Por outro lado, disse-me que a Câmara continua em pleno funcionamento, considerando-se, obviamente, inexistente como organismo corporativo.
II
1 — Nesta perspectiva, restar-nos-á apreciar a legalidade ou constitucionalidade do artigo 469.° perante os direitos constitucionalmente consagrados da liberdade de associação e de trabalho.
Para além de preceitos idênticos contidos já na Declaração dos Direitos do Homem de 1948, a matéria da* liberdade de associação foi objectivamente regulamentada, logo em 1974, pelo Decreto-Lei n.° 594/74, de 7 de Novembro.
A Constituição voltou a consagrá-la nos artigos 46.°, n.° 3, e 51.°, n.° 3, aplicáveis por força dos artigos 23.° e 18.° a todos os cidadãos.
Página 2017
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(41)
O reclamante pretende que a obrigatoriedade de inscrição numa associação violaria não só o princípio da liberdade associativa como o do livre acesso ao trabalho.
2 — Os textos constitucionais citados referem-se a associações constituídas voluntariamente por um determinado número de cidadãos, com fins específicos, presidindo-lhes, em regra, um animas personificandi, ou seja, a criação de um novo ente jurídico que representa, em relação a esses fins, os que nela se enquadram.
No entanto, existem, no nosso como noutros sistemas jurídicos, a par destas, outras associações de características diferentes, nas quais se exige a inscrição (em aparente contradição com a amplitude dos princípios enunciados) como condição sine qua non do exercício de certas profissões, designadamente, das profissões liberais.
3 — Prática idêntica e assente em razões semelhantes é a que se fundamenta no artigo 469.° da Reforma Aduaneira e que exige para o exercício da profissão de despachante oficial a inscrição na Câmara dos Despachantes Oficiais.
Os estatutos deste organismo, aprovados pelo Decreto-Lei n.° 40 363, de 25 de Outubro de 1955, consagram também no artigo 7.° a mesma exigência confirmada pelo artigo 15.° em razão da defesa da deontologia profissional.
Por seu lado, o artigo 461.° do Decreto-Lei n.° 46 311, de 27 de Abril de 1965, estabelece que a profissão de despachante se regulará, em tudo o que não estiver previsto na Reforma Aduaneira, pelas disposições da lei geral sobre mandato e prestação de serviços no exercício das profissões liberais.
Como profissão liberal é igualmente considerada a profissão de despachante oficial na tabela respectiva do Código de Imposto Profissional.
Assim, pode concluir-se que as razões do artigo 469.° da Reforma Aduaneira, ao imporem uma restrição ao acesso dos despachantes (existe mesmo um numerus clausus de 400), são idênticas às que exigem a inscrição: nas ordens, para os engenheiros, médicos e advogados; nas câmaras para os solicitadores, revisores, oficiais de contas, técnicos de contas, etc.
III
1 — Tanto as ordens como as câmaras não são associações livremente formadas e liquidáveis por idêntico processo, assentes exclusivamente no animus associandi, concretizado pela vontade de um determinado número de indivíduos.
É-lhes conferido um decisivo interesse público e a defesa de códigos deontológicos impõe-lhes, do ponto de vista legal, diferentes características.
Não se podem considerar associações no exacto sentido em que, nos preceitos indicados, elas são tomadas pela Constituição e em relação às quais — e só a elas — valem amplamente os princípios do livre acesso e da liberdade de constituição e extinção.
2 — A obrigatoriedade da inscrição nestes «organismos profissionais» não viola o n.° 3 do artigo 51.° da Constituição; pelo contrário, ê expressamente ressalvada por ele quando este prevê «restrições legais impostas pelo interesse colectivo, ou inerentes à própria capacidade profissional».
Ninguém é obrigado a escolher determinada profissão, nem qualquer cidadão pode ser obrigado a inscrever-se numa associação, mas, se optar pelo exercício de uma actividade que exija essa inscrição, tem de aceitar tal limitação como condição a juntar à exigência das habilitações literárias ou dos estágios, porventura impostos.
A obrigatoriedade de inscrição assenta pois num imperativo legal, baseado por sua vez num interesse social, que confere a certos organismos de base associativa o controle de regras deontológicas e de disciplina de actividade.
Não está, portanto, em causa a liberdade de associação ou o livre acesso ao trabalho, quando a exigência da inscrição obedece a um incontestado interesse público que se atribui a certa profissão {livremente escolhida) mas cujo exercício é controlado do ponto de vista profissional.
Além de se manter a obrigatoriedade de inscrição nas ordens, o exercício de outras profissões consideradas liberais já foi regulamentado depois da entrada em vigor da Constituição — cf., v. g., os Decre-tos-Leis n.05 483/76, de 19 de Junho, quanto à Câmara dos Solicitadores, e 282/77, de 5 de Julho, quanto aos médicos.
IV
Concluindo:
1 — Pelas razões expendidas, parece-me sem fundamento o pedido de declaração de inconstitucionalidade do artigo 469.° da Reforma Aduaneira.
2 —A Constituição prevê, no n.° 3 do artigo 51.°, a existência de restrições impostas ao exercício de certas actividades que se justificam por superiores interesses de ordem pública e que exigem um controle permanente do ponto de vista deontológico e de capacidade profissional, a exercer por um organismo de base profissional.
Logo a seguir a ter sido proferido o parecer, antes transcrito, o Conselho da Revolução, indo ao encontro do ponto de vista que aquele parecer expressava, pela sua Resolução n.° 12/78, publicada no Diário da República, 1.a série, de 26 de Janeiro, não se pronunciou pela inconstitucionalidade, pelo que o processo foi mandado arquivar em 2 de Fevereiro de 1978.
21) Processo n.» 77/DI-20-A-3
Inconstitucionalidade dos Decretos-Leis n.os 353-H/77 e 353-1/77.
Parecer do assessor Dr. João Caupers, com o qual o Provedor concordou:
Trata-se de mais um caso de alegada falta de participação das estruturas representativas dos trabalhadores na elaboração da legislação laboral — artigo 56,°, alínea d), e 58.°, n.° 2, alínea a), da Constituição. Acontece, porém, que neste caso — legislação laboral do chamado «2.° pacote» — o Ministério do Trabalho fez publicar os projectos dos Decretos-Leis n.os 353-H/77 e 353-1/77 em separata ao Boletim do Trabalho e Emprego, fixando o prazo de quinze dias para apresentação de críticas e sugestões.
Página 2018
1076-(42)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Na minha perspectiva, que nào é a mesma do Sr. Provedor — v. processo n.° 77/DI-2 —, a primeira exigência para uma participação dos trabalhadores na legislação de trabalho está satisfeita. Se o Ministério do Trabalho passar também a fazer aquilo que o Sr. Provedor sugere na alínea c) da recomendação que fez no âmbito do processo n.° 77/DI-2, a questão, pelo meu lado, estará resolvida a contento. De qualquer modo, o procedimento do Ministério do Trabalho, neste caso, é o bastante para entender que se não deverá pedir a apreciação e declaração da inconstitucionalidade dos diplomas em causa.
22) Processo n.º 77/DI-22-GP
Inconstitucionalidade, por omissão, de legislação sobre organizações populares de base.
Arquivado por, segundo parecer do adjunto, com o qual o Provedor concordou, se ter entendido que emanação de legislação, cuja falta constituiria inconstitucionalidade por omissão, é da exclusiva competência do Conselho da Revolução.
23) Processo n.° 78/DI-19-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 34 178.
Parecer da assessora Dr." Maria de Lurdes Garcia, com o qual o Provedor concordou:
1—Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 148.° da Constituição da República Portuguesa compete ao Conselho da Revolução «fazer leis e regulamentos sobre a organização, o funcionamento e a disciplina das forças armadas».
2 — Como já se disse, em informação anterior (processo n.° 77/R-1646, o regime do pessoal civil ao serviço das forças armadas não está definido com clareza, mas tem-se entendido, como aliás o documenta mais este diploma, que, prestando a sua actividade nas forças armadas, se encontra abrangido no âmbito da sua organização, funcionamento e disciplina, o preâmbulo do Decreto-Lei n.° 289/75, de 14 de Junho, diz expressamente que as disposições de um diploma geral para a função pública — Decreto-Lei n.° 656/74 — são inaplicáveis aos servidores civis dos departamentos militares, por força da autonomia estabelecida entre as estruturas das forças armadas e do Governo (v. Lei n.° 4/74, de 1 de Julho).
3 — Tradicionalmente só eram aplicáveis aos funcionários civis das forças armadas os diplomas que se lhes referissem expressamente (por exemplo Decreto-Lei n.° 49 410) ou que, por diploma próprio, lhes fossem mandados aplicar.
4 — Assim, uma vez que o regime dos civis das forças armadas não é necessariamente o mesmo dos funcionários da Administração Pública, não se pode considerar que a duração semanal do trabalho tenha de ser exactamente a mesma. Aliás, dentro da vasta gama de trabalhadores da função pública, também existem horários diferenciados de acordo com as funções e categorias. Os diplomas genéricos referidos — Decreto-Lei n.° 37 118, de 27 de Outubro de 1950, e Decreto-Lei n.° 42 800, de 11 de Janeiro de
1960, dizem apenas respeito ao «trabalho de secretaria em todas as direcções gerais dos Ministérios e nos serviços destes dependentes . . .» (artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 37 118).
5 — Mesmo que as categorias do pessoal de secretaria e dos civis ao serviço das forças armadas tivessem as mesmas designações e vencimentos seria difícil fazer comparação exacta dos vencimentos e das funções desempenhadas, de modo a provar-se a infracção do artigo 53.°, alínea a), da Constituição da República Portuguesa.
6 — Não se vê, assim, qualquer fundamentação válida para considerar inconstitucional o Decreto-Lei n.° 34 178, pelo que o processo parece de arquivar. À consideração superior.
Em face deste parecer, foi o processo mandado arquivar em 13 de Novembro de 1978.
d) Processos em que se usou da prerrogativa do artigo 281.°, rt.° 1, da Constituição Política da República
1) Processe 77/lP-!6-B-l
Inconstitucionalidade dos §§ 1.°, 2° e 3.° do artigo 418.° do Código de Processo Penal.
Parecer do adjunto do Provedor, Dr. Luís Silveira, com o qual o Provedor concordou:
1 — Concordo com o Sr. Coordenador, na medida em que entende que não haverá que esperar mais por qualquer atitude do Ministério da Justiça.
2 — Ouviu-se o Ministério da Justiça, à cautela, para evitar formular-se qualquer recomendação que correspondesse, afinal, a propósito já definido da Administração, ou, pelo menos, a matéria que estivesse a ser tratada.
3 — jsjão parece ser esse o caso, pelo menos o Ministério da Justiça não dispõe de quaisquer elementos concretos que indiquem estar-se perante alguma das situações referidas em 2.
4 — Creio, pois, que será de tomar a iniciativa de assumir já uma posição sobre o caso.
5 — Uma hipótese seria, como o Sr. Coordenador indica, a da formulação da recomendação legislativa ao Ministério da Justiça.
6 — Pessoalmente, entendo — e, discutindo o assunto com o Sr. Coordenador, ele adere a esta opinião — que se trata mesmo de disposições inconstitucionais, que justificariam a apresentação da questão ao Conselho da Revolução, nos termos do artigo 281.° da Constituição Política.
7 — De facto, por um lado, o § 1.° e a parte final do § 2.° do artigo 418.° do Código de Processo Penal impedem que em determinados casos os réus presos sejam presentes a julgamento, em comarca diversa. ?or seu turno, a parte inicial do § 2.° citado não impõe a requisição, mesmo em processo de querela, deixando-a ao arbítrio do julgador.
Ora, penso que essas regras ofendem frontalmente o artigo 32.°, n.° 1, da Constituição Política, quando determina que ao réu serão asseguradas todas as garantias de defesa.
A presença no julgamento, e consequente faculdade de nele se pronunciar sobre os seus interesses e posições é, decerto, uma dessas garantias de defesa.
Página 2019
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(43)
O argumento ganha especial força na medida em que se atente em que no caso em vista se não trata de afastar quaisquer óbices extrínsecos à plenitude das garantias de defesa dos réus, mas sim de ser o próprio Estado a obstacular a essa presença, não procedendo à deslocação de uma pessoa nesse momento directamente sujeita à sua autoridade.
Isto, já sem acrescentar que, do ponto de vista da adequada administração da justiça, é sem dúvida sempre preferível a comparência pessoal dos réus perante seus julgadores.
8 — Por outro lado, o § 3.° da mesma prescrição legal, ao condicionar, nos casos que prevê, a deloca-ção do preso ao pagamento de certa quantia por parte dele, introduz uma limitação de ordem económica ao seu direito de acesso ao tribunal que contradiz o disposto no artigo 20.° da Constituição Politica.
Com efeito, parece-me que o «direito ao acesso» ao tribunal nesse preceito consagrado deve ser entendido no seu mais amplo significado, não abrangendo apenas a faculdade formal de surgir como parte num processo, mas ainda a possibilidade de utilização de todas as formas legais de representação escrita ou verbal ao órgão julgador nos quais se integra a condição pessoal em julgamento.
É de notar que nem sequer a lei admite qualquer eventualidade de isenção do pagamento da quantia em causa aos que comprovassem carecer de meios económicos para tanto (por exemplo em termos análogos aos consignados para a concessão de assistência judiciária).
O óbice económico em questão introduz, ademais, uma discriminação em função da riqueza, coarctando as possibilidades de defesa dos mais desfavoreci-
9 — Parece-me, pois, que será de suscitar a questão ao Conselho da Revolução (apesar de estarmos perante normas de aplicação imediata, por força dos artigos 17.° e 18.° da Constituição Política, penso que o instituído previsto no açtigo 281.° da Constituição Política também é aplicável a estes casos — se não necessariamente, pelo menos como possibilidade, com vist obter-se a definição genérica e segura da const ionalidade ou não de tais normas).
Uma mera recomendação ao Ministério da Justiça não obstaria a que, no lapso ainda decerto longo até à publicação de novo Código de Processo Penal, surgissem casos de aplicação do artigo 418.° deste diploma.
Deve reconhecer-se que os tribunais não têm deixado (bem como a própria Direcção-Geral dos Serviços Prisionais) de procurar, na prática, conseguir sempre a presença dos réus em julgamento, mesmo por vezes forçando o próprio texto legal.
Mas já pende no Serviço do Provedor de Justiça pelo menos um caso em que um estabelecimento prisional, apoiando-se na lei vigente, procurou obstar a uma de tais deslocações de recluso para julgamento — e não está excluído que outras situações similares venham a surgir.
O Conselho da Revolução, em sua reunião de 19 de Abril, resolveu, nos termos da alínea c) do artigo 146.° e do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das referidas normas, por infringirem o disposto nos n.os 1 e 5 do artigo 32.° da Constituição.
2) Processo n.° 77/D1-5-A-3
Inconstitucionalidade da segunda parte do corpo do artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos.
Parecer do assessor Dr. Manuel Marcelino, que teve concordância do Provedor:
I
1 — No presente processo requer-se que, ao abrigo do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, o Provedor de Justiça solicite a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do segundo período do corpo do artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos (Decreto-Lei n.° 45 005, de 27 de Abril de 1963), por violar o n.° 1 do artigo 20.° daquele diploma fundamental, preceitos que se transcrevem:
Art. 262." O recurso só poderá ter efeito suspensivo nos termos do artigo 160.°
Se o processo for de transgressão, o recurso só terá seguimento se o arguido prestar caução por qualquer das formas indicadas no § 1.° daquele artigo.
Art. 20.° — 1 — A todos è assegurado o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos.
Acrescenta-se que as formas de caução indicadas no § 1.° do artigo 160.° são o depósito de dinheiro, papéis de crédito, fundos públicos com cotação na Bolsa, pedras ou metais preciosos ou a fiança bancária e que o requerente explana a situação concreta que fundamenta a sua petição, nos seguintes termos:
Não tendo o requerente e sua irmã possibilidades económicas para depositarem a quantia de 1200 contos, nem possuindo papéis de crédito, fundos públicc pedras ou metais preciosos, restava-lhes a possibilidade de prestação de fiança bancária; contudo, os bancos têm hoje directivas de orientação diversa das de épocas anteriores e por isso recusam-se a prestar fianças bancarias deste género e deste montante, vendo-se, assim, o requerente e sua irmã impedidos de prestar caução e, consequentemente, negada a possibilidade de subida do seu recurso ao Supremo Tribunal Administrativo e a reposição da verdade traduzida na sentença absolutória da 1.a instância.
2 — Liminarmente, diremos que os mecanismos de reacção ao eventual conteúdo anticonstitucional do referido artigo 262.° (segundo período) não nos parecem ser os da declaração da sua inconstitucionalidade pela via do artigo 281.° da Constituição, mas sim os da sua «adaptação até ao fim da 1.a sessão legislativa», nos termos do n.° 3 do artigo 293.° da mesma, por se tratar de norma anterior, atinente (porventura) ao exercício dos direitos, liberdades e garantias consignadas naquela (v. integração sistemática do mencionado artigo 20.°, n.° 1).
Página 2020
1076-(44)
II SÉRIE — NÚMERO 47
II
A questão posta exige uma interpretação do artigo 20.°, n.° í, da Constituição e do artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos, a deste último à luz de determinado princípio que enforma o direito fiscal.
1 — Assim é que, no tocante ao primeiro, entendemos que não está assegurado o «acesso aos tribunais» e à «justiça» naqueles casos em que ao cidadão seja vedado, por circunstâncias mais ou menos acidentais, o julgamento pela última instância de recurso que o pleito admita. Por outras palavras, sendo o controle das decisões dos tribunais inferiores exercida, tão-só, pelas instâncias superiores, a justiça e o acesso aos tribunais, com o alcance real e pleno que comportam e que levam ao seu enquadramento nos «Direitos e deveres fundamentais» (parte i da Constituição), serão denegados, se e enquanto o cidadão não puder exercer o seu direito ao juízo da última instância.
Ao referirmo-nos às circunstâncias mais ou menos acidentais — no caso, a possibilidade de prestar caução — e à última instância de recurso que o pleito admita, pensamos, obviamente, naquelas excepções em que a lei, directamente e através do sistema das alçadas, limita a possibilidade de recurso. Em boa verdade, nem de excepções se trata, mas de casos com últimas instâncias específicas ou diferentes das normais.
2 — A esta luz, o mencionado artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos, ao condicionar, em termos absolutos, o seguimento do recurso no processo de transgressão à prévia prestação de caução — o mesmo é que dizer às possibilidades económicas, ou ao crédito necessário — parece, efectivamente, violar aquele direito fundamental.
Mas, sendo o direito fiscal, no nosso como na generalidade dos países, dominado por princípios próprios, que radicam, potenciando-se, na sua natureza de direito administrativo, entre os quais sobreleva o privilégio da execução prévia, em que medida aquele principio constitucional também neste âmbito se quis impor, ou se deverá impor? Mais concretamente, é perguntar que peso, ou que relevo deve ser atribuído, na presente questão, ao princípio do solve ei repete — segundo o qual o contribuinte só è admitido a discutir a legalidade do imposto depois de o ter pago —, relevo que será, obviamente, tanto menor, quanto mais ténue for a sua consagração no respectivo sistema legal.
Ora, o nosso sistema fiscal não adopta, como regra, o princípio do solve et repete: as reclamações e a impugnação judicial são admitidas e seguem os seus termos sem necessidade de pagamento prévio do imposto, mas também não afectam em princípio e, sem mais, o normal desenvolvimento da relação tributária; é o que resulta do artigo 160.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos, segundo o qual a impugnação e o recurso (que não seja de processo de transgressão) suspendem a execução até à decisão, desde que a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, ou, se ainda não houver penhora ou os bens penhorados nào chegarem, desde que o executado preste cauçãc por qualquer das formas já aludidas.
E, abstraindo dos casos de cobrança eventual, onde o pagamento prévio do imposto surge como uma consequência necessária da natureza e regime de tal cobrança e não da consagração como tal, autonomamente, do princípio solve et repete (Cardoso da Costa, Aditamentos às Lições de Direito Fiscal, Coimbra, 1965, p. 21), é só, precisamente, na segunda parte do artigo 262.° que tal princípio foi expressamente consagrado pelo nosso direito [idem, p. 22, nota (!)], ou, em todo o caso, logrou um maior grau de expressão (Ruben Carvalho e Rodrigues Pardal, Código de Processo das Contribuições e Impostos, Coimbra, 1969, p. 456). A sua estatuição nessa parte surge, assim, desta óptica, excepcional. Cremos que a sua razão de ser reside no facto de o legislador, no recurso do processo de transgressão e quando o imposto deva ser cumulativamente nele cobrado (cf. artigos 105.° e 117.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos), não ter querido prescindir da prévia garantia de pagamento da quantia devida, garantia que o mencionado artigo 160.° não asseguraria, porque aplicável, em matéria de recurso, apenas aos interessados do processo de impugnação. Daí que tenha condicionado o seguimento daquele à prestação de caução pelo arguido.
a) Mas não será ir longe demais, no único caso onde o princípio do solve et repete foi expressamente consagrado, ou, pelo menos, alcançou maior afloramento, levá-lo logo a abranger também (a garantia de) o pagamento das próprias multas fiscais (em regra, até, só de multas)? Tal principio cobre também as multas? E estará certo que o faça em termos de tolher, na prática, a possibilidade de recurso?
É dizer que duvidamos da justeza e da coerência da solução no próprio âmbito do direito fiscal.
b) E o mesmo se diga fora desse âmbito, mas ainda dentro do direito ordinirio.
Com efeito e não obstante a exposta razão de ser do normativo em causa, discorda-se que o legislador tenha adoptado para o (recurso do) processo de transgressão uma solução, cujas consequências práticas podem ser mais gravosas para o contribuinte do que a perfilhada para os demais processos fiscais, esquecendo, naquele, ou, de qualquer modo, menosprezando o principio in dúbio pro reo, agora com assento constitucional no artigo 32.°, n.° 2. É que, nem pelo facto de, em princípio, se tratar de ilícito . ministrativo, deixa de ser ilícito e cuja ave-riguaçà está sujeita ao princípio da verdade material (v. artigo 121.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos), onde aquele outro princípio pode e deve ter pleno cabimento. E não nos parece que esta conclusão seja invalidada pelas circunstâncias de, no caso, já haver unia sentença condenatória e de o princípio in dúbio pro reo ser, pelo menos para certos autores, atinente só à prova. É que, nem a sentença transitou em julgado, nem fixou e apreciou a prova em termos que possam ser considerados inalteráveis (v. artigos 257.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos e 749.° do Código de Processo Civil).
Por outro lado, se passarmos em revista os diversos ramos de direito, cremos não se encontrar situação idêntica, ou seja, de o seguimento de o recurso estar condicionado a prévia prestação de caução pelo recorrente.
Página 2021
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(45)
III
Em face do exposto, parece-nos real e de difícil justificação a colisão entre o preceituado no segundo período do artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos e o direito fundamental assegurado no n.° 1 do artigo 20.° da Constituição, pelo que se imporá a urgente recomendação ao Governo da «adaptação» daquele, nos termos e prazos fixados no n.° 3 do artigo 293.° da Constituição.
O Conselho da Revolução, na sua reunião de 1 de Março, declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante da segunda parte do corpo do artigo 262.° do Código de Processo das Contribuições e Impostos, na parte em que, com violação do n.° 1 do artigo 20.° da Constituição, obsta ao seguimento do recurso quando o recorrente não prestou caução ou não prestou toda a caução, devido a insuficiência de meios económicos.
3) Processo n.° 77/DI-12-A-3
Inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 619/76, de 27 de Julho, e do Decreto-Lei n.° 198/77, de 17 de Maio, no que toca ao desaforamento do julgamento e à instrução de crimes (ou infracções, o que é igual) previstos naqueles decretos-leis, dos tribunais comuns.
Parecer do assessor Dr. Manuel Marcelino, com o qual o Provedor concordou:
I
São dois os aspectos contra os quais o reclamante se insurge: a «ilegitimidade» da eficácia retroactiva atribuída ao Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto, e a punição com a pena de prisão — aliás, substituível por multa — de infracções que propiciem a evasão ou fraude fiscal, estabelecida no Decreto-Lei n.° 619/76, de 27 de Julho, de que se junta cópia.
1 — Começando por este último problema, diremos que ele se desdobra em duas questões.
a) Referindo-se a alínea e) do artigo 167.° da Constituição, ao reservar à competência legislativa exclusiva da Assembleia da República «a definição dos crimes, penas e medidas de segurança e processo criminal . . .», tão-só, com certeza, ao ilícito criminal, importa, antes de mais, assentar se as infracções, criadas pelo Decreto-Lei n.° 619/76, se integram neste tipo de ilícito, ou, antes, tipificarão um ilícito meramente administrativo.
O âmbito fiscal das matérias deste diploma e os bens ou valores que as respectivas infracções visem proteger — de duvidosa coincidência com os valores fundamentais da comunidade, que subjazem ao ilícito criminal — poderão, porventura, legitimar aquela dúvida.
Mas, como se sabe (v. Eduardo Correia, Direito Criminal, Coimbra, 1968, t, pp. 27 e seguintes), não é o conteúdo do ilícito o único aspecto, nem o mais importante (até pelas dificuldades de ordem prática que suscita), a que devemos recorrer na indagação em causa.
Com efeito, há, ainda, que atender ao aspecto processual e, sobretudo, ao tipo de sanção, já que aquelas dificuldades apontam cada vez mais para a adopção de um critério formal, em que sobreleva este último aspecto.
E, no caso, dá-se até a circunstância de não podermos colher subsídios da entidade processualmente competente para a apreciação das infracções — os tribunais comuns ou a administração, nela incluída os tribunais fiscais — pela simples razão de que o diploma é (intencionalmente?!) equívoco a este respeito. Tão equívoco quanto o foram os seus fautores! Na verdade, contactado telefonicamente um adjunto do Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos, a fim de que informasse quais daqueles tribunais estavam, na prática, a aplicar as penas em análise, informou ignorar; que, parece que ainda não foram aplicadas vez alguma; que, supõe, terão sido pensadas para os tribunais fiscais; que admite estar em estudo uma alteração cometendo a sua aplicação aos tribunais comuns . . .
É evidente que só esta última é aceitável, face a penas de prisão que podem ir até um ano, as quais nos permitem afirmar estarmos perante um ilícito criminal, dada a especial relevância, já referida, atribuída ao critério formal do tipo de sanção cominada — multa ou prisão — pela doutrina nacional e estrangeira (na Alemanha) (v. autor e ob. cit., p. 34, nota 1).
b) Expostas as razões em que nos apoiamos para considerarmos as infracções tipificadas no Decreto--Lei n.° 619/76, abrangidas pela alínea é) do artigo 167.° da Constituição, ainda se poderá negar a sua inconstitucionalidade, com fundamento em que foi promulgado em 13 de Janeiro de 1976, portanto (um dia) antes da posse do Presidente da República, e, consequentemente, antes da entrada em funcionamento da Assembleia da República (artigo 294.° da Constituição).
Tendo, porém, sido publicado e adquirido existência jurídica em 27 de Julho de 1976 (artigo 122.°, n.° 4, da Constituição), portanto já depois daquela posse, a nossa opinião não poderá diferir da expressa sobre o caso análogo do Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto (nossa informação de 10 de Março de 1977; n-B, processo DI-8), e que aqui reproduzimos: ele veio sujeitar os destinatários á sua esratui-ção, já em plena vigência do comando constitucional, que visa, precisamente, proteger os cidadãos contra as normas emanadas pelo Governo com tal conteúdo, ou seja, incriminadoras.
Esta a realidade iniludível, que nos faz concluir pela inconstitucionalidade orgânica do diploma.
Quem discorde de tal conclusão irá naturalmente indagar se o Governo teria poderes para emanar normas incriminadoras no período que antecedeu a entrada em funcionamento dos actuais Órgãos de Soberania (14 de Julho de 1976).
No sentido negativo, isto é, de uma reserva de tal matéria para a Junta de Salvação Nacional e, posteriormente, para o Conselho da Revolução, quando este sucedeu àquela, podem invocai-se os artigos 1.°, n.°» 7, 8 e 9, e 2.°, n.° 1, da Lei n.° 3/75, de 19 de Fevereiro [v., ainda, A), n.° 2, alínea j), do Programa do Movimento das Forças Armadas], bem como os artigos 1.° e 6.°, n.° 1, da Lei n.° 5/75, de 14 de Março.
Página 2022
1076-(46)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Em sentido contrário, de que também o Governo poderia emanar normas com aquele conteúdo, pode jogar-se com as alíneas a), b) e c) do n.° 3 e ri) do n.° 4 do Programa do Governo Provisório, constante do preâmbulo do Decreto-Lei n.° 203/74, de 15 de Maio.
E se é certo que esta alínea n) refere expressamente a «adopção de medidas excepcionais destinadas a combater a especulação e a fraude fiscol», certo é, também, que aquelas leis são posteriores e só elas falam, inequivocamente, em legislar («. . . à falta de legislação adequada, elaborar os decretos--leis e decretos que forem necessários» — artigo 2.°, n.° 1, da Lei n.° 3/75).
Temos dúvidas sobre a conclusão, razão por que nos limitamos a expor as premissas.
Como dado — e, porventura, contributo — histórico, informamos que a Constituição de 1933, pelo menos na redacção vigente em 25 de Abril de 1974, já reservava à Assembleia Nacional «a aprovação das bases gerais sobre definição das penas criminais. . .» [artigo 93.°, alínea e)\.
Parece-nos, contudo, que o diploma estará, também, ferido de inconstitucionalidade material e esta abrangendo todos ps crimes tipificados no seu artigo l.° e não apenas aqueles não previstos já no Código de Processo Penal e legislação penal avulsa (ou aí previstos, mas com penas menores) — alíneas c), d)-tf) (cf. artigos 219.°, 424.°, 14.°, § 3.°, 188.°, e 455.°; todos do Código de Processo Penal) —, como ainda poderá defender-se, quanto à inconstitucionalidade orgânica.
É que, como já escrevemos, o decreto-lei em causa ío\ pensado para ser aplicado pelos tribunais fiscais e (em primeira linha) segundo os trâmites processuais fiscais, como resulta do seu artigo 11.° Ora, a Constituição não só proíbe o desaforamento dos tribunais comuns «de certas categorias de crimes» (artigo 213.°, n.° 1) como, também no julgamento penal, exige as garantias de defesa que só o processo penal dá, ou dará (artigo 32.°, n.° 1)!
2 — Quanto ao problema da eficácia retroactiva do Decreto-Lei n.° 667/76, de 5 de Agosto, nada temos a acrescentar ao que escrevemos em 1M-B da nossa citada informação de 10 de Março de 1977, processo n.° Dl-8, de que juntamos cópia e que aqui damos por reproduzida nessa parte. Lembramos, ainda, que tal problema foi suscitado, também, nos processos n.os 76/R-891, 908 e 940.
O Conselho da Revolução, na sua reunião de 24 de Maio de 1978, pronunciou-se pela inconstitucionalidade, por violação do n.° 4 do artigo 32.° da Constituição, das normas do n.° 1 do artigo único do Decreto-Lei n.° 198/77, de 17 de Maio, e da alínea a) do artigo 2.°, da autorização legislativa contida na Lei n.° 16/77, de 25 de Fevereiro, na parte em que determinava ser da competência de juizes dos tribunais de l.a instância das contribuições e impostos a instrução relativa às infracções tributárias previstas no Decreto-Lei n.° 619/76, de 27 de Julho.
4) Processo n.» 77/DI-I3-B-4
Inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 135-A/77, publicado no Diário da República, 1.» série, n.° 125, de 30 de Maio de 1977.
Parecer do assessor Dr. José Porto, com o qual o Provedor concordou, e em virtude do qual foi ne-dida, em 2 de Agosto de 1978, ao Conselho da e-volução, a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do despacho normativo:
l
\ — Antes de nos debruçarmos sobre a questão que é posta ao Serviço do Provedor de justiça, vamos aflorar alguns conceitos, tidos por inatacáveis, cuja utilização é importante para a clarificação do problema que temos entre mãos.
Assim:
o) Despacho normativo — Em sentido material tem afinidades com a lei, em virtude das suas características de generalidade e de abstracção. Escasseia--Ihe, contudo, o elemento novidade, dado que as suas normas são sempre o desenvolvimento ou a aplicação de outras normas, de valor superior, ou então constituem a simples concretização de matérias abandonadas intencionalmente pela norma ou fonte de direito superior que lhe serve de suporte.
Como forma de regulamento ministerial que é, o despacho normativo só pode estatuir na medida em que a lei lho consinta, e a sua força obrigatória depende da publicação no Diário da República, l.a série (Lei n.° 3/76, de 10 de Setembro).
b) Actividade interpretativa. Normas interpretativas, normas inovadoras — O preceito legal surge aos olhos do intérprete como um amontoado de palavras. Interpretar a norma consiste em tirar das palavras um certo conteúdo de pensamento, o sentido e alcance com que ele deve valer. À determinação do sentido prevalente da norma, no dizer de Manuel Andrade (Noções Fundamentais de Processo Civil, pp. 26 e seguintes), dá-se o nome de actividade interpretativa.
Tal actividade depara, por vezes, com expressões obscuras, ambíguas ou equívocas. Fixar-lhes o sentido e alcance é tarefa conseguida através dos vários métodos de interpretação. Em muita; das situações, não sendo possível, com alguma dose de certeza e segurança, optar-se pelo sentido unívoco da lei, é preferível criar-se normas interpretativas, ou seja, as normas que de uma forma uniforme esclareçam o conteúdo de disposições anteriores.
Às normas interpretativas poderão contrapor-se as normas inovadores, que, em vez de interpretar uma disposição anterior, introduzem uma nova disciplina de certas matérias, inovam alguma coisa dentro da ordem jurídica ou dos institutos jurídicos.
c) O problema das lacunas da lei — O campo da previsão legal assenta na necessidade de regular as relações da vida social merecedoras da tutela jurídica. Todavia, para além das situações directamente previstas pelo legislador, há outras não regulamentadas que bem merecem a protecção do direito. Haverá, assim, lacunas quando, esgotados todos os métodos de interpretação, se concluir que o caso merecedor de tutela jurídica transcende manifestamente a respectiva fattispecie, isto é, quando se possa concluir que o pensamento do legislador, aferido pela correspondência verbal da letra da lei, não pretendeu abarcar na sua estatuiçào a situação jurídica em causa.
Página 2023
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(47)
d) Valor das disposições legais tendentes a resolver as dúvidas de interpretação — Frequentemente dispõe-se em diplomas legais (veja-se, a título de exemplo, o artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março) que as dúvidas resultantes da aplicação respectiva são resolvidas por despacho de determinada entidade ministerial. Outras vezes permite-se nos mesmos preceitos que os casos omissos sejam resolvidos pela mesma via.
Porque a análise de normas deste jaez assume particular importância quando se legisla através de autorizações legislativas, vamos, agora, tecer alguns comentários sobre o valor e significado jurídico de tais normas.
Limitando-nos ao campo de resolução de dúvidas de interpretação, tem apontado a doutrina que os despachos interpretativos produzidos ao abrigo de tais normas apenas têm a natureza de instruções uniformizadoras para os serviços dependentes do órgão governamental donde dimana o despacho. Esta parte da doutrina chega a admitir, pois, que o despacho interpretativo não obriga a terceiros e só tem valor para o futuro como regulamento ou despacho interno, sem que os tribunais lhe devam obediência. Tratar-se-ia, pois, de uma actividade de interpretação administrativa que se chama interpretação quase--autêntica (veja-se, por todos, Manual de Direito Administrativo, Marcelo Caetano, t. i, 9.a ed., 1970, p. 114).
Temos para nós, embora com algumas dúvidas, que a interpretação elaborada por resolução do Conselho de Ministros ou mesmo por despacho ministerial é equivalente à interpretação autêntica. Se é o próprio diploma-matriz que tal consente, parece--nos que os despachos interpretativos se devem integrar na norma interpretada com a mesma força legal do diploma que lhe serve de suporte.
Diz-se, é certo, que a tais depachos falta a forma de fonte de direito igual ou superior à norma interpretada, e daí o seu diminuto v?'--r jurídico. Todavia, pensamos, a não se considc. vinculativa tal interpretação para todos os destinatários da norma, parece sem significado o facto de tal método ser autorizado pela norma interpretada, o que equivale a dizer que se traduz num método de interpretação em tudo semelhante ao valor e significado das interpretações ao alcance do vulgar intérprete, o que, convenhamos, não é de aceitar.
De qualquer modo, quer se atribua o valor indicado em primeiro lugar, quer se atribua o significado indicado em segundo lugar, é óbvio que o Governo, mais concretamente o Ministro da Administração Interna, no que concerne ao Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, detém amplos poderes de interpretação para resolver as dúvidas surgidas na aplicação do mesmo diploma.
Já o mesmo não se poderá dizer quanto à regulamentação dos casos omissos. Estando, como estamos, no domínio da competência reservada à Assembleia da República (artigo 167.°, alínea m), da Constituição da República Portuguesa], è óbvio que permitir-se ao Governo que regule ex novo situações jurídicas fora do período de autorização legislativa, se traduz numa manifesta invasão da competência de outro Órgão de Soberania.
Parece, pois, inequivoco que a segunda parte do artigo 19.° do Decreto-t.ci n.° 76/77, de 1 de Mar-
ço, está ferida do vício :ie inconstitucionalidade orgânica. Não se diga, porém, que a resolução dos casos omissos se pode ainda fazer durante o período da autorização legislativa, e daí o sentido útil de tal norma e a sua constitucionalidade. Também não é de aceitar tal tese. É que, nos termos do artigo 168.° da Constituição, a autorização legislativa deve ser usada de uma só vez. Ora, a resolução dos casos omissos não pode deixar de entender-se como criação de novas normas jurídicas, o que equivale a dizer-se que, mesmo no período de autorização legislativa, a regulamentação dos casos omissos se traduz numa fraude à utilização unitária da autorização legislativa, desde que, na primeira utilização, não se tenha ressalvado à hipótese de regulamentação parcelar, como claramente dispõe a parte final do artigo 168.°, n.° 2.
2 — Postas estas notas introdutórias, vamos agora passar à apreciação e análise do Despacho Normativo n.° 135-A/77, publicado no Diário da República, l.3 série, n.° 125, de 30 de Maio de 1977.
II
1 — No trabalho de análise que adiante se fará vamos seguir de perto os pontos assinalados pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local na exposição anexa.
2 — Como se diz no próprio preâmbulo do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, com tal diploma visou-se em síntese pôr termo ao princípio de diferenciação salarial em função dos niveis económicos regionais, corrigir as disparidades e as assimetrias dos quadros de pessoal, aprovados pelo Decreto-Lei n.° 506/75, de 18 de Setembro, e, ainda, evitar a proliferação indiscriminada de categorias, adequando as designações das mesmas ao conteúdo funcional dos cargos respectivos.
3 — Da documentação junta pela entidade peticionária facilmente se infere que o diploma em causa foi bem acolhido pelas estruturas representativas dos trabalhadores, muito embora transpareçam, facilmente, as dúvidas de interpretação resultantes da sua aplicação.
4 — É exactamente na sequência da aplicação do diploma que nasceu o Despacho Normativo n.° 135-A/77, que agora se passa a analisar:
a) N.° 1 do despacho normativo:
No artigo 1.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 76/77, estabelecem-se as categorias do pessoal da administração local e regional.
Por sua vez, no artigo 2.° do mesmo diploma, estabeleceu-se a obrigatoriedade de fazer a adaptação dos lugares e categorias existentes nos quadros de pessoal ao novo elenco de categorias criado pelo diploma.
Através do ponto n.° 1 do despacho normativo veio dizer-se que a adaptação referida poderia abranger o pessoal que na mesma data se encontrava vinculado aos serviços, embora não integrado nos quadros, desde que houvessem sido admitidos até 24 de Novembro de 1973, e exercessem funções que correspondessem, de modo efectivo, a necessidades efectivas dos respectivos serviços.
Página 2024
l076-(48)
II SÉRIE - NÚMERO 47
Visou-se, assim, através do despacho, permitir a integração nos quadros de pessoal que até ali não tinha direito à integração.
Todavia, ao referir-se à integração nos novos quadros (artigo 2.°, n.° 2), nada diz a lei quanto aos contornos do direito à integração. Parece que o legislador, no preceito em análise, não cuidou da definição de novas integrações, exactamente por partir do pressuposto de que só haverá lugar à integração nos novos quadros par; aqueles trabalhadores que, por direito próprio anterior, pertencessem já aos quadros. Aliás, nem será muito de estranhar tal técnica legislativa, se nos lembrarmos do entendimento que ainda prolifera relativamente à concep-tualização dos funcionários públicos ou administrativos: o exercício de um lugar do quadro da administração pública, por um agente administrativo a tempo completo, com submissão ao regime legal da função pública (v. André Lauvadére, 16.a ed., Paris, 1975, pp. 20 e 21, e Marcelo Caetano, t. li, 8." ed., pp. 606 e seguintes).
Mas a ser assim, como nos parece que é, dúvidas não surgiriam, porquanto tratava-se apenas de saber quais os trabalhadores que, à data de entrada em vigor do diploma, já pertenciam aos quadros, o que era bastante fácil tendo em conta a legislação anterior.
A não ser assim entendido, dúvidas só poderia ter quem aceitasse que a integração, que no caso concreto se devia cingir à adaptação dos quadros de pessoal, abrangeria outros trabalhadores.
Parece, pois, só no caso de a letra do preceito em causa suscitar dúvidas quanto ao âmbito dos trabalhadores a integrar haveria lugar a possíveis interpretações para desfazer tal ponto obscuro.
Quanto a nós, porém, a letra do preceito não suscita qualquer dúvida, pois limitou-se a regular o modo de aprovação dos quadros e a transferência automática do pessoal do quadro anterior para o actual, instituído pelo novo diploma.
Quando se vem dizer que o pessoal que tenha sido admitido antes de 24 de Novembro de 1973 poderá ser integrado nos novos quadros, está-se manifestamente a inovar, isto é, a regular ex novo a inclusão, no novo quadro, de pessoal até ai não integrado, inclusão essa que, nem de perto nem de longe, a letra e o espirito permitem considerar. Es-lá-se, numa palavra, a modificar o estatuto do pessoal, ainda não incluído nos quadros, embora exerça efectivamente funções a tempo completo e preencha necessidades permanentes dos serviços.
Repare-se, contudo, que, ao contrário do que possa parecer, até somos adeptos de que o «pessoal permanente» deve ser incluído em quadros, posto que trabalha tempo completo e faça das suas funções a sua actividade profissional principal.
Simplesmv o legislador do diploma em análise jamais pensou na integração desse pessoal. A ter prevista tal hipótese, tê-lo-ia dito de forma expressa.
Mas, a pensar-se e a admitir-se, o que não se concede, que tal integração era possível, face à sua aceitação implícita pelo preceito, porque restringir tal integração ao pessoal admitido até 24 de Novembro de 1973?
Será só este pessoal permanente, a tempo completo, isto é, o pessoal que exerce as suas funções com carácter de profissionalidade, por preencher necessi-
dades permanentes dos serviços? Porquê remeter, um tanto arbitrariamente, para a citada data, e não ter-se como ponto de referência a data de entrada em vigor do diploma a interpretar?
De duas uma: ou se entende que a integração dos novos lugares ocorre automaticamente só para os já integrados nos quadros, ou, então, a integração abrange ainda, e tão-só, todos aqueles que com carácter de profissionalidade desempenhavam as suas funções (deve notar-se que esta ideia, ainda que em campo de estatuição diferente, não deixa de transparecer da letra do artigo 1.°, n.° 1, do citado diploma).
Na primeira hipótese, ao contemplar-se a situação dos não integrados anteriormente, está-se a criar a norma jurídica específica daqueles que estavam afastados da previsão legal — fattispecie — do preceito interpretado. E nem se diga que existe caso omisso merecedor de tutela jurídica, pois, mesmo que tal hipótese se verificasse, nem por isso se deixaria, como não se deixou, de criar uma norma inovadora. A ter de ser entendido o artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 76/77 em termos hábeis, é evidente que, fora do período da autorização legislativa, ao Governe restam apenas os poderes interpretativos.
A não se entender assim, está criado um modus faciendi muito simples de defraudar a extensão das autorizações legislativas, assim se permitindo a invasão ad aeternum das competências legislativas reservadas.
Neste quadro, consequentemente, não se percebe muito bem a possibilidade de, quer por via de interpretação, quer por via de integração de eventuais lacunas, se tenha regulado a situação dos não integrados. Tais métodos utilizados colocam-nos no seio da mais revolucionária de todas as teorias modernas no dominio da interpretação da lei — escola de direito livre (Stammler, Mayer e Adickes, todos eles doutrinadores germânicos, para quem o julgador e 0 intérprete têm a missão especial da realização da ordem jurídica, pese embora o valor dos postulados legais — Noções Fundamentais de Direito Civil, Pires de Lima e Antunes Varela, 1961, 1.° volume, pp. 179 e seguintes).
Na segunda hipótese, perfilhando a tese de que a integração devia aproveitar a outros trabalhadores, hipótese que só em tese peregrina admitimos, nada na lei autoriza a interpretação restritiva feita, e, consequentemente, afastando de tal ;oncessão trabalhadores, em identidade de situações, está-se manifestamente a restringir direitos amplamente concedidos. Numa palavra, derrogam-se princípios legais em vigor, o que só seria de admitir se, através de algum dos métodos de interpretação conhecidos, fosse de considerar, com certeza e segurança, que o legislador tinha ido além do que pretendia, pois só nesse caso seria possível a interpretação restritiva.
Ora, tal derrogação só peia entidade com competência própria [Assembleia da República — artigo 167.°, alínea m)] poderia ser estabelecida, o que envoíve, necessariamente, a inconstitucionalidade orgânica e formal do ponto 1 do despacho normativo.
b) N.° 2 do despacho normativo:
Através deste ponto do despacho excluem-se da integração dos quadros de pessoal os trabalhadores rurais.
Página 2025
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(49)
Para além das razões já apontadas na alinea anterior, no que concerne à delimitação do conceito de integração, outras razões há que mostram a ilegalidade do despacho nesta parte.
Muito embora seja por de mais conhecido o estatuto de menoridade (capitis deminutio) conferido aos trabalhadores rurais, não se vislumbra por que não foram as categorias de trabalhadores rurais, ao serviço das autarquias, adaptadas às novas nomenclaturas do Decreto-Lei n.° 76/77, no caso de prestarem serviço em regime de tempo completo e independentemente da form Je provimento. Ora, impondo o diploma em análise — artigo 1.°, n.° 1 — tal adaptação, ao excluir-se os trabalhadores rurais da eventual integração, cria-se uma norma derrogatória, o que só poderia ser feito por quem detivesse competência legislativa (Assembleia da República).
Assim: t se entende, como anteriormente, que quem não pertencia aos quadros não pode ser integrado, ou se perfilha a outra tese mais ampla, e, nesta hipótese, nada na lei autoriza interpretações restritivas.
Nesta parte, pois, parece também estarmos perante mais um caso de inconstitucionalidade orgânica ou formal.
Já o mesmo não diremos quanto aos trabalhadores a tempo parcial.
Na verdade, parece inequívoco que tais trabalhadores estão mesmo afastados da própria adaptação a que se refere o artigo 1.°, n.° 1. É isto o que resulta da conjugação do disposto no artigo 1.° e nos seus n.os 1 e 2.
Assim, dentro da economia do diploma interpretado, aceita-se perfeitamente o conteúdo do despacho, o que nos leva a perfilhar a opinião de que, nesta parte, o despacho se encontra expurgado de qualquer vício de inconstitucionalidade.
c) N.° 6 do despacho normativo:
Quanto ao disposto no ponto n.° 6 do despacho, parece-nos que o seu conteúdo interpretativo se enquadra perfeitamente dentro do espírito e da letra do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 76/77.
A tese do sindicato peticionário não é de aceitar, porquanto o disposto na parte final do n.° 2 do artigo 7.° deve levar, necessariamente, a entender-se que o tempo necessário para a transição funcional a ter em conta é o tempo de serviço na categoria, uma vez que beneficiários de tal transição são, tão--somente, os trabalhadores que já possuíam a categoria de escriturario-dactilógrafo.
d) N.° 7 do despacho normativo:
O conteúdo deste ponto do despacho, designadamente na sua segunda parte, não tem qualquer razão justificativa.
O problema é em tudo similar às considerações formuladas na análise feita ao ponto n.° 1 do despacho. Numa palavra: tal pessoal ou não è integrado nos novos quadros, porque de tal não cuidou o legislador, ou, sendo-o, o que se nos afigura não autorizado pela letra e espirito do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 76/77, não se vislumbra qualquer razão para se restringir o seu âmbito de modo a contar apenas o tempo de serviço prestado aos organismos e serviço a que se encontra vinculado à data da
entrada em vigor do citado diploma, o que difere substancialmente do pessoal já integrado anteriormente nos quadros.
Parece, pois, que, também nesta parte, o despacho enferma dos vícios de inconstitucionalidade já apontados.
e) N.° 8 do despacho normativo:
Também em nosso entender, esta parte do despacho se encontra ferida do vício de inconstitucionalidade formal e orgânica.
Na verdade, é por de mais inquestionável que, na economia do diploma, os novos quadros de pessoal são resultantes, por um lado, das meras alterações dos lugares e categorias anteriores ao novo elenco criado pelo Decreto-Lei n.° 76/77 e, por outro lado, uma consequência necessária e directa da modificação de situações funcionais operadas por efeito da transição de alguns funcionários (v. artigos 6.°, 7.°, 8.° e 9.°) para outras categorias profissionais.
Todavia, quer a adaptação genérica quer a alteração das situações profissionais de determinados funcionários traduzem-se na alteração unitária do quadro de pessoal. Como corpo único que são, os novos quadros de pessoal verão os efeitos das alterações produzir-se nos termos da regra geral contida no n.° 2 do artigo 2.° Deve, aliás, notar-se que a ratio principal do diploma é a de reparar certas injustiças de que foram vítimas alguns trabalhadores. Grande parte desses trabalhadores inclui-se naqueles que agora foram beneficiados com aumentos de retribuição por efeito das chamadas transições de categorias profissionais. Ora, a reparação das injustiças é tanto maior quanto mais longe no tempo, isto è, mais longe na retroacção se produzirem os seus efeitos, e por aqui se vê a justificação de tais trabalhadores beneficiarem do regime-regra contido na alínea a) do n.° 2 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 76/77.
O conteúdo do despacho, ao modificar a regra geral do artigo 2.°, n.° 2, cerceia direitos amplamente concedidos pelo diploma interpretado, pelo que, mais uma vez, «inovou» contra legem anterior. Tal regulamentação nova só pela Assembleia da República poderia ser criada, pelo que assim se evidencia de novo o vício de inconstitucionalidade de que continua a enfermar o despacho em análise.
5 — Por tudo o exposto somos de parecer que os Secretários de Estado da Administração Regional e Local e da Administração Pública, ao proferirem o despacho em causa, exorbitaram dos seus poderes interpretativos, utilizando os poderes conferidos pelo artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 76/77, e, a pretexto de resolução de dúvidas, criaram, em alguns casos, novas normas jurídicas e, noutros casos, restringiram amplos direitos concedidos pelo diploma interpretado, assim invadindo a esfera da competência reservada da Assembleia da República [artigo 167.°, alínea m)\.
Nestes termos, por entendermos que o citado despacho está ferido, em alguns dos seus aspectos, do vício de inconstitucionalidade, nas modalidades orgânica e formal, parece justificar-se que, ao abrigo do disposto no artigo 281.° da Constituição da República Portuguesa, o Provedor de Justiça solicite ao
Página 2026
1076-(50)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Conselho da Revolução a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do Despacho Normativo n.° 135-A/77.
Até ao momento em que este relatório foi elaborado o Conselho da Revolução ainda não se pronunciou.
5) Processo n." 78/DI-23-B-1
Inconstitucionalidade do I jspacho n.° 63/78, de 23 de Março, e do Despacho Normativo n.° 140-A/78, de 15 de Junho.
O parecer da assessora Dr." Branca Amaral suscitou da parte do coordenador, Dr. Vaz Serra, e do adjunto do Provedor, Dr. Luís Silveira, a sugestão
para que, dada a sua importância, o assunto fosse apreciado em reunião conjunta do' Provedor com o adjunto, os coordenadores e os assessores.
O aludido parecer era do teor seguinte:
1) O Secretariado Nacional das Associações de Pais pede a declaração de inconstitucionalidade do Despacho n.° 63/78, de 23 de Março, publicado no Diário da República, 2." série, de 10 de Abril último, em que o Ministro da Educação e Cultura institui os 10.° e 11.° anos de escolaridade.
A exposição dirigida ao Provedor de Justiça é acompanhada de um comentário comendo críticas que podemos enquadrar nos aspectos técnico, pedagógico, social e jurídico.
Nos dois primeiros aspectos frisam-se o irrealismo, a demagogia, a falta de coerência e a improvisação com que se implantam dois anos de escolaridade sem a preparação correspondente de matérias e de estruturas que se reputa indispensável.
2 — Do ponto de vista legal, refere-se a primeira critica ao desrespeito do dever de cooperação do Estado com os pais na educação dos filhos, consagrado na alínea c) do artigo 67.° da Constituição da República.
Procurou a Lei n.° 7/77, de 1 de Fevereiro, dar forma a essa cooperação, considerando as associações de pais e encarregados de educação os interlocutores do Ministério da Educação em tal matéria. Todavia, cometendo ao Ministro (artigo 2.°) a regulamentação da forma como deveria exercer-se a referida cooperação, deixou ao seu critério a execução do «programa» que, por tal motivo, não tem concretização, nem pode, portanto, ser invocado como ilegal.
Sob este aspecto, parece-nos pertinente uma recomendação do Sr. Provedor para que deixe de ser «morta» a referida Lei n.° 7/77.
3 — A segunda crítica refere-se à ilegalidade do despacho face à lei em que poderia fundamentar-se.
A remodelação visada no despacho traduz-se numa alteração profunda do sistema e programas de ensino que se não coaduna com os limites das experiências pedagógicas que o Decreto-Lei n.° 47 587, de 10 de Março de 1967, permite que sejam desencadeadas pelo Ministro da Educação e Cultura.
Apesar de se prever neste diploma a generalização de experiências, para além dos casos já previstos anteriormente no Decreto-Lei n.° 41 273, de 17 de Setembro de 1957, é bem determinado o limite temporal a que deverão obedecer e o âmbito restrito que as caracteriza, confinando-as a alguns estabelecimentos de ensino (cf. artigo 1.°, n.os 1 e 3). No mesmo sentido, o artigo 2.° é inequívoco no estabelecimento dessas restrições, pois exige que o Ministério fixe, caso a caso, as regras a que deverão obedecer tais experiências, não obstante a possibilidade das adaptações necessárias para que o regime geral possa permiti-las.
4 — Não parece, pois, obedecer aos objectivos legais determinados por uma experiência, a forma generalizada no espaço e no tempo com que o Ministério da Educação e Cultura pretende, por despacho, instituir a nível nacional dois novos anos de escolaridade.
E não pode deixar de se considerar que há um certo «aligeiramento» das responsabilidades com que se improvisam programas, professores, matérias e com que se retarda em dois anos o início da vida activa dos cidadãos mais jovens, com as inerentes consequências para os que os têm a seu cargo.
O despacho n.° 63/78, ao contrário do que preconizam os diplomas em que deveria assentar, generaliza, abruptamente, a sodas as escolas e a todo o país, um regime novo, um novo sistema de ensino, sem qualquer avaliação prévia dos seus resultados, ou ponderação dos seus efeitos.
Parece, pois, ter razão o Secretariado Nacional das Associações de Pais, denunciando a ilegalidade desse diploma.
5 — Mas razão tem igualmente quando o reputa inconstitucional.
Na verdade, ao generalizar tais inovações e tão profundas, é indiscutível que altera as bases do sistema de ensino.
As remodelações, a verificarem-se, reflectir--se-iam na preparação e no acesso dos alunos à vida profissional e aos graus subsequentes de ensino, que, segundo a Constituição, não devem ficar à mercê da vontade ou da inspiração de um único membro do Governo.
Não devem e não podem, pois a alinea n) do artigo 167.° do Conselho da Revolução estabelece que as alterações das bases de ensino são da competência reservada à Assembleia da República.
O Despacho n.° 63/78, além de ilegal, parece--nos, pois, ferido de inconstitucionalidade orgânica e formal.
6 — Atenta a ilegalidade e a inconstitucionalidade que se me afiguram insdiscutiveis, julgo que caberia ao Provedor de Justiça, para além da intervenção já superior no final do n.° 2 deste parecer (para que fosse suspensa a execução do despacho), pedir, nos termos do artigo 281.° da Constituição, a declaração da sua inconstitucionalidade.
Página 2027
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(51)
A este parecer tez o adjunto do Provedor as seguintes observações:
1) O Despacho n.° 63/78 foi revogado pelo Despacho Normativo n.° 140-A/78, de 22 de Junho, a respeito do qual, porém, se podem pôr questões análogas às suscitadas a respeito dele.
2) — a) Afigura-se, com efeito, que o despacho em questão não respeita o Decreto-Lei n.° 47 587, na medida em que ele obriga a que as experiências pedagógicas sejam limitadas no tempo.
b) Já no que toca à afirmada limitação das experiências a «certas escolas», essa vale, segundo a lei, apenas «em principio» — pelo que sob esse aspecto não haverá ilegalidade.
c) Por outro lado, nada nele consta no que se refere à avaliação da experiência, para efeitos de eventual reestruturação nelas baseada.
3) Parece, por outro lado, que ele enferma de inconstitucionalidade orgânica, na medida em que aborda matéria reservada à competência legislativa da Assembleia da República — a definição do objecto e estrutura do curso complementar.
Isso, nomeadamente, no que concerne à implicação desse curso, em substituição da actual estrutura bipartida — curso complementar dos liceus e curso complementar do ensino técnico.
E, também, no que se reporta à integração de uma componente vocacional, hoje praticamente ausente do curso liceal.
4) Importará, contudo, neste âmbito, confrontá-lo com as bases gerais do ensino, em discussão no Conselho de Ministros e cuja apresentação á Assembleia da República se prevê. Cumpre, designadamente, apurar se o despacho em causa não constitui como que antecipação das bases (v. artigos 24.° a 29.°, publicados in O Jornal, n.° 163, 9 a 15 de Junho de 1978). E, mesmo que o seja, isso obstará às alegadas ilegalidades e inconstitucionalidades? À primeira vista, não parece que isso afaste tal vício, mas faz prever a sua posterior cobertura.
5) Não parece que justifique a apreciação da Sr.a Assessora de que retarda em dois anos o acesso na vida activa. O curso complementar substitui os cursos de dois anos, já hoje existentes.
Quando muito, tal retardamento poderá ser de um ano, se nele se integrar o ano hoje chamado propedêutico.
Debatido o assunto, na reunião de trabalho acima referida, foi deliberado suscitar ao Conselho da Revolução a apreciação da constitucionalidade, nos termos do oficio seguinte:
Além de se apresentarem como dificilmente compatíveis com alguns preceitos legais vigentes, os despachos do Sr. Ministro da Educação e Cultura n.°s 63/78 e 140-A/78, de 23 de Março e 15 de Junho, publicados, respectivamente, no Diário da República, 2.» e 1." séries, de 10 de Abril e 22 de Junho de 1978, violam a disposição contida na alínea ri) do artigo 167.° da Constituição da República Portuguesa que reserva à competência da Assembleia da República as alterações das bases do sistema de ensino.
As remodelações contidas nesses despachos alteram relevantemente as estruturas e finalidades do actual curso complementar do ensino secundário.
Assim, e independentemente de qualquer juízo sobre o conteúdo dessas inovações, trata-se de matéria sobre a qual só da Assembleia da República caberá legislar.
Nestas circunstâncias, e ao abrigo do n.° 2 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, venho solicitar ao Conselho da Revolução que seja apreciada e declarada a inconstitucionalidade dos referidos despachos, nos termos do artigo 281.° da Constituição.
O Conselho da Revolução, em sua reunião de 22 de Novembro, resolveu:
1.° Não emitir qualquer juízo sobre a constitucionalidade das normas constantes do Despacho n.° 63/78, de 23 de Março, do Ministro da Educação e Cultura, publicado no Diário da República, 2.a série, de 10 de Abril de 1978, na medida em que o referido despacho foi expressamente revogado antes do início do primeiro ano lectivo em que viria a ser efectivamente aplicado;
2.° Não se pronunciar pela inconstitucionalidade das normas constantes do Despacho Normativo n.° 140-A/78, de 15 de Junho, do Ministro da Educação e Cultura, publicado no Diário da República, 1.a série, de 22 de Junho de 1978, que estrutura os cursos complementares do ensino secundário e fixa o plano de estudos.
6) Processo n." 78/R-552-A-3
Inconstitucionalidade das disposições combinadas do n.° 3 da base x da Lei n.° 2144, de 29 de Maio de 1969, e do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 249/73, de 17 de Maio.
Parecer do assessor Dr. Manuel Marcelino, com
o qual o Provedor concordou:
1 — Considerando a interpretação que a doutrina (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, 1978) dá ao n.° 3 do artigo 46.° da Constituição, no sentido de abranger também as «associações públicas (corporações públicas)», afigura-se inevitável concluir pela inconstitucionalidade da figura dos sócios contribuintes das Casas do Povo, designados pelo n.° 3 da base X da Lei n.° 2144, de 29 de Maio de 1969 (junta com a nossa informação de 1 de Junho de 1978) e pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 249/73, de 17 de Maio (ora junto), mesmo a entender-se, como parece que se impõe, que aqueles organismos corporativos são pessoas colectivas de direito público (v. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20 de Outubro de 1970 e autores ai citados em Acórdãos Doutrinais pp. 1732 e seguintes juntas, e base i da citada Lei n.° 2144). Nesse sentido, embora em nosso entender com âmbito demasiadamente restrito, a afirmação contida a p. 9 da informação da Direcção-Geral da Previdência.
2 — Em face do exposto, afigura-se ser de solicitar ao Conselho da Revolução a declaração de in-
Página 2028
1076-(52)
II SÉRIE — NÚMERO 47
constitucionalidade das normas referidas, ao abrigo das disposições combinadas dos artigos 281.° e 293.° da Constituição (Acórdão da Comissão Constitucional de 5 de Janeiro de 1978, in Boletim do Ministério da Justiça, 273).
3 — Certo que o preceito constitucional violado — artigo 46.°, n.° 3 — integra-se nos «Direitos, liberdades e garantias» que o n.° 1 do artigo 18.° da lei fundamental torna directamente aplicáveis e vinculantes das entidades públi is e privadas (v. parecer da Procuradoria-Geral da República no parecer n.° 26/78, de 27 de Junho de 1978, ih, 3709). Tal, porém, não obstará, em nosso entender, ao procedimento proposto, com reflexos na certeza e segurança do direito.
4 — A não se concordar com a solução proposta, poderia porventura' ouvir-se, ainda, a Junta Central das Casas do Povo, considerando o constante da alínea e) das conclusões da informação de 10 de Maio de 1978 da Direcção-Geral da Previdência. Para tal hipótese, junta-se desde já a respectiva minuta. Junta-se também fotocópia do Decreto n.° 174-B/75, de 1 de Maio, aludido na mesma informação.
Em face deste parecer foi pedida a apreciação de inconstitucionalidade ao Conselho da Revolução, em 16 de Outubro, o qual ainda não se pronunciou.
CAPÍTULO VI
Apreciação sumária, na especialidade, de processos concluídos em 1978
A) Ilustração da aplicação dos critérios de rejeição de queixas
Sendo certo que a competência do Provedor de Justiça se circunscreve à fiscalização de actuação de entidades públicas mas em termos que não envolvam a sua intromissão ou a pretensão de controlar aqueles aspectos que se inserem num âmbito exclusivo ou fundamentalmente político, mereceram rejeição todas aquelas queixas cujo fulcro seria determinante de uma intromissão naqueles domínios.
Assim, entre outros casos, não foram levadas por diante, merecendo despacho de arquivamento, algumas reclamações visando a obtenção de indemnização por bens deixados nas ex-colónias, como aconteceu com os processos n.°s 77/R-1349, 77/R-1862, 77/R-1927 e 78/R-1042, ou pretendendo a efectivação de transferências de importâncias monetárias depositadas em entidades bancárias nas ex-colónias (processo n.° 78/R-187-A-2).
Todos esses mencionados casos se integram numa problemática geral apenas susceptível de resolução por via político-diplomática, sendo, aliás, certo que, para além da razão que possa assistir a cada reclamante em concreto, releva a necessidade de definição de uma disciplina global que abarque todas as incidências e particularidades, definição essa que, como é evidente, não pode deixar de caber na esfera da acção governativa.
Também por se reportarem à actuação de órgãos de soberania foram rejeitadas queixas contra o Conselho da Revolução, relativamente a uma decisão tomada em matéria de saneamento (processo n.° 78/R-2445) c outra em que se protestava pela não
publicação da Lei Orgânica da Direcção-Gcral da Educação Permanente — diploma já então aprovado em Conselho de Ministros mas que não fora ainda publicado (veio a sê-lo, aliás, enquanto Decreto-Lei n.° 478/77, de 15 de Novembro, mas foi-lhe recusada a ratificação pela Assembleia da República).
Não pode o Provedor de Justiça exercer controle sobre os tribunais no tocante à sua actividade especifica: nessa limitação, e no respeito por ela, se inseriram os casos em que se decidiu por rejeição de queixas que visavam a actividade do Tribunal de Contas.
Sendo este Tribunal um Órgão de Soberania, considerou-se (muito embora haja opiniões em contrário) que não tem natureza administrativa a sua actuação no tocante à concessão ou não do aviso (processos n.os 78/R-851 e 78/R-2460).
Igualmente, por se tratar de matéria da competência própria dos órgãos judiciais se recusou intervenção em casos em que se pedia a declaração de invalidade da constituição dum sindicato (processo n.° 78/R-1796), a concessão de perdão de pena e de liberdade condicional (processo n.° 78/R-887), a realização de cúmulo jurídico na aplicação de penas (processo n.° 78/R-223) ou a atribuição de direito de visita a irmãos menores em processo de regulação de poder paternal (processo n.° 78/R-500). Não se deixou, todavia, nestes dois últimos casos, de, respectivamente, os comunicar à Procuradoria-Geral da República e ao curador de menores competente.
Também se rejeitou uma queixa dirigida contra o Conselho Superior da Magistratura, referente a decisão disciplinar por este aplicada a um juiz (processo n.° 77/R-1936). Conquanto o Conselho não seja um tribunal, nem órgão de soberania, continuou a entender-se que a sua exclusiva competência disciplinar sobre os juízes é elemento essencial da independência dos tribunais enquanto órgãos de soberania.
Circunscrito na sua actividade fiscalizadora, como é de lei, às entidades públicas, não poderia o Provedor de Justiça intervir em questões que dizem respeito à função própria das associações sindicais nem exercer funções de prestação de consulta jurídica a entidades particulares (processos n.os 78/R-748 e 78/R-816).
Em numerosos casos, tem sido verificado que os reclamantes solicitam a intervenção do Serviço do Provedor de Justiça antes de se terem dirigido às entidades às quais cabe a competência para tratar dos assuntos, umas vezes por porventura pretenderem uma resolução mais directa e rápida das mesmas, outras por simples ignorância dos departamentos a que deverão dirigir-se.
Não podia o Provedor de Justiça deixar de recusar as reclamações que lhe são apresentadas antes de haver sido suscitada a actuação da;, entidades com alçada sobre as questões, uma vez que, sendo a sua fundamental função a de fiscalizar a actuação das entidades públicas que negligenciam o tratamento dos assuntos, não lhe compete a elas substituir-se ou abordá-las a respeito de matérias que ainda lhe não foram apresentadas.
Contudo e com estas rejeiçõe;;, não deixou, sempre que o considerou como necessário, de elucidar os reclamantes sobre as entidades a quem deveriam apresentar os seus casos, reservando a sua intervenção para as anomalias que porventura viessem
Página 2029
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(53)
a interferir ou a obstacular ao andamento daqueles ou a uma sua decisão ajustada, mas só para depois do decurso de um período de tempo minimamente razoável para aquele andamento ou demonstrada ilegalidade das decisões vindas a proferir (processos n.os 78/R-613, 78/R-1088, 78/R-823, 78/R-585, 78/R-1379 e 78/R-1030).
O Provedor não pode receber queixas de entidades públicas.
Por isso se rejeitaram, por exemplo, reclamações: da Companhia de Seguros Tranquilidade, por o Instituto de Reorganização Agrária lhe não pagar, havia largos meses, a renda do prédio em que estava instalado (processo n.° 78/R-2107), não se deixando, contudo, de dar conhecimento dela ao Ministério da Agricultura e Pescas, atendendo ao desprestígio para a Administração que de situações destas pode resultar; da Junta de Freguesia de Barbudo, protestando contra a apropriação particular de um caminho público (processo n.° 78/R-1625), muito embora se lhe recordasse que podia fazer valer os seus direitos através do privilégio de execução prévia ou, ainda, solicitando ao Ministério Público que defendesse judicialmente os interesses autárquicos em jogo nos termos de Código Administrativo, e da Junta de Freguesia de Mira de Aire, contra a alteração de uma designação postal (processo n.° 78/R-2481).
Não se considerou acertado interferir a propósito de queixas concernentes a matéria de natureza essencialmente técnica. Estiveram neste caso reclamações respeitantes às decisões de júris de exame de condução (processo n.° 78/R-2183), de exame do Ano Propedêutico (processo n.° 78/R-2142) e do concurso para chefes de clínica, na medida em que se apreciava os curricula dos candidatos (processo n.° 78/R-1294), à negação de uma equivalência de habilitação de diploma de curso superior estrangeiro (processo n.° 78/R-208) e ao teor de um parecer de junta médica da Caixa Nacional de Pensões (processo n.° 78/R-212). Por razões similares se não deu seguimento a uma reclamação contra o tipo de concepção arquitectónica de casas de renda económica construídas sob a égide da Câmara Municipal de Lisboa (processo n.° 78/R-18).
Entendeu-se que não teria cabimento analisar queixas em que se discutiam aspectos de orientação da Administração Local, susceptíveis de serem devidamente apreciados pelas assembleias municipais ou de freguesia: desse modo se rejeitou uma. queixa contra a localização do cemitério de certa localidade (processo n.° 78/R-2351), bem como outra em que se critica uma junta de freguesia por causa do trajecto que escolhera para uma nova estrada, bem como das despesas que dai adviriam (processo n.° 78/R-1393).
8) Queixas admitidas para apreciação
Apresenta-se, de seguida, uma síntese dos principais processos que, originados em queixas, foram admitidos para apreciação e concluídos em 1978.
Consideram-se, nomeadamente, processos que culminaram em recomendações ou reparos à Administração, bem como, ainda, outros que revelam interesse pela natureza da matéria tratada ou pela forma como o foi.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — ACESSO AO DIREITO — CUMPRIMENTO DE LEIS FISCAIS
Processo n.» 78/R-79-A-3
Um solicitador suscitou ao Provedor de Justiça a questão da eventual inconstitucionalidade das normas que estabelecem como pressuposto ou condição processual a prova do pagamento de determinados impostos. Referiu, ainda, que se lhe afigurava inadequado que o controle do cumprimento dessas leis fiscais fosse, com frequência, realizado pelas secretarias judiciais, e não pelos juízes.
Estudado o assunto, considerou-se que convinha começar por indagar do Ministro da Justiça qual a posição sobre:
1) A necessidade de serem revistos os preceitos
legais que estabelecem o pressuposto ou condição processual da prova do pagamento de determinado imposto — v. g. contribuição industrial e imposto profissional (artigo 280.°, n.° 1, do Código de Processo Civil, artigo 116.° do Código da Contribuição Industrial e artigo 46.° do Código de Processo do Trabalho) —, os quais, além de contrastarem com disposições que, relativamente a outros impostos (contribuição predial e imposto de capitais), apenas visam assegurar a respectiva colecta — artigos 280.°, n.° 1, e 281.° do Código de Processo Civil e artigo 57.° do Código de Imposto de Capitais —, podem entender-se corno pouco compatíveis, sobretudo com o princípio contido no artigo 20.° da Constituição, nos casos em que a falta de pagamento do imposto resulte da insuficiência de meios económicos, que, aliás, poderiam ser obtidos através da acção;
2) Conveniência de a fiscalização, nos termos
do n.° 2 do artigo 467.° do Código de Processo Civil, da observância dos preceitos mencionados no número anterior, pelo menos nos casos mais duvidosos e, especialmente, quando esteja iminente a prescrição do direito ou a caducidade da acção, não ficar confinada ao funcionário da secretaria, ido antes exercida pelo juiz.
O Ministro da Justiça do II Governo Constitucional respondeu que entendia que às secretarias judiciais só cabe a verificação do cumprimento das leis do selo em relação aos articulados, competindo ao juiz a apreciação da matéria atinente ao artigo 282.° do Código de Processo Civil. Aliás, os artigos 280.° e 281.° do mesmo diploma, não obstando à abertura da instância mas apenas ao seu seguimento, através da respectiva suspensão, não comprometem, pois, o direito de acesso aos tribunais. Por fim, entendia que as regras em causa não tinham necessária correlação com a carência de meios económicos das partes, além de que o princípio da igualdade não poderia ser interpretado em termos tão absolutos que o transformassem numa abstracção utópica.
Não se afigurando completamente satisfatória esta posição, voltou a ponderar-se ao Ministério dá Jus-
Página 2030
1076-(54)
II SÉRIE — NÚMERO 47
tiça, designadamente quanto à matéria dos artigos 280.° e 281.° do Código de Processo Civil, que:
1 — Ainda que os seus efeitos imediatos sejam
apenas a suspensão da instância, esta pode conduzir à deserção e constitui, de qualquer modo, limitação ao direito de acesso aos tribunais, se não formalmente, pelo menos à consecução da apreciação da causa, através d uma decisão de fundo;
2 — Mesmo que se rec nduzam, na teoria, a
matéria a ser apreciada pelo juiz, o que não constitui doutrina pacífica (v. Elias da Costa e outros, Código, de Processo Civil, in, pp. 513 e seguintes), na prática, é muitas vezes a secretaria que dá efectivação aos seus comandos.
Da diversidade de tais soluções e seus reflexos na certeza do direito, afigura-se já resultar razão bastante para serem repensadas, mesmo para quem entenda que não conduzam ao cerceamento do direito de defesa com base no factor económico (artigo 20.° da Constituição).
O Ministro — agora do III Governo Constitucional — repondeu que:
1 — É meu ponto de vista que, na realidade, preceitos legais como os artigos 280.°, n.° 1, e 281.° do Código de Processo Civil prejudicam a plena observância da norma fundamental do artigo 20.°, n.° 1, da Constituição, embora não estejam feridos de inconstitucionalidade.
Como é do conhecimento de V. Ex.a, está este Ministério empenhado em concretizar medidas que libertem o acesso ao direito — no caso, garantam a via judiciária — das restrições dimanadas da insuficiência de meios económicos.
Nesta conformidade, vou recomendar às Comissões de Reforma do Código de Processo Civil e de Acesso ao I reito o exame do problema, embora ele diga essencialmente respeito à primeira dessas comissões.
2 — No que reporta à norma do n.° 2 do artigo 467.° do citado Código, creio que o entendimento já não será inteiramente o mesmo (o que está em causa é a fiscalização da observância das leis do imposto do selo), pois os dispositivos da assistência judiciária acautelarão as dificuldades que dai possam resultar quanto ao ingresso das acções em juizo. Nesta mesma área se deverá incluir o comando do artigo 551.° daquele Código.
Verificando-se que o Ministro da Justiça acabou por reconhecer merecer a questão ser repensada, e estando em curso trabalhos de revisão legislativa em que a mesma passou a ser integrada, entendeu-se poder o processo ser encerrado.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — AMNISTIA — IMPOSTO DE JUSTIÇA
Processo n.º 78/R-530-B-1
Tendo sido amnistiado o crime particular que participou e em cujo processo se constituíra assistente, certo cidadão requereu, em 2 de Outubro de 1975,
que, ao abrigo do n.° 3 do artigo 1.° do Decreto--Lei n.° 727/75, de 22 de Dezembro, lhe fosse restituído o imposto de justiça que pagara.
Visto que, em 27 de Março de 1978, tal quantia ainda não fora devolvida, foi a questão exposta ao Provedor.
Ouvida a Polícia Judiciária, esta respondeu que desde 5 de Fevereiro de 1976 que vinha solicitando, sem êxito, à Direcção de Finanças do Distrito de Lisboa e à Direcção dos Serviços dos Cofres, a restituição das somas a devolver ao interessado.
Contactada a Direcção dos Serviços dos Cofres, esta esclareceu que no quantitativo global de um cheque emitido, em 20 de Março de 1976, em favor da Policia Judiciária, já estava incluída a sua parte na restituição a fazer.
A Direcção de Finanças, igualmente ouvida, referiu que o processo de restituição fora remetido à Direcção-Geral da Contabilidade Pública, cuja autorização era necessária para tal operação se perfazer.
Põe-se, então, a questão à Direcção-Geral da Contabilidade Pública.
Em 18 de Maio de 1978 foi, enfim, possível a Polícia judiciária proceder à restituição ao reclamante do imposto de justiça pago.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — DEPÓSITOS OBRIGATÓRIOS
Processe n." 76/R-1285-A-3
Foram apresentadas algumas reclamações focando a exiguidade dos juros pagos pelos depósitos (obrigatórios) determinados judicialmente a favor de menores.
Reclamação deste tipo originou o processo em epígrafe, no qual se considerou o seguinte:
Que o juro de depósitos a prazo é bem mais favorável que o dos depósitos à ordem;
Que nas situações em causa não há, frequentemente, necessidade de liquidez imediata, eventualidade, aliás, de fácil solução dada a actual mobilidade dos depósitos a prazo.
Nestes termos, entendeu o Provedor de Justiça, para além das eventuais alterações legislativas que fossem tidas por aconselháveis, sugerir à Procurado-ria-Geral da República, e tendo em conta os interesses das pessoas a quem é por lei devida especial protecção, a emanação de directivas aos agentes do Ministério Público no sentido de estes requererem a conversão em depósito a prazo das importâncias obrigatoriamente depositadas, nomeadamente em inventários obrigatórios, em nome de menores, interditos, inabilitados e outras pessoas a quem o Esiado deva protecção, salvo a oposição fundada dos respectivos representantes legais (e essa mesmo a ponderar, dada a mencionada mobilidade dos depósitos a prazo).
A sugestão foi bem acolhida pela Procuradoria--Geral da República, tendo o procurador-geral informado que, sem embargo da prática de promover que os depósitos obrigatórios a favor de menores tenham lugar na modalidade «a prazo» houvesse si-
Página 2031
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(55)
do já acolhida por aquela Procuradoria-Geral e devidamente circulada, se iria dar sequência à aludida sugestão, insistindo no assunto, quer perante os procuradores da República, quer perante os inspectores do Ministério Público.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — INCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL
Processo n." 78/R-218-B-1
Em 26 de Janeiro de 1978, o juiz corregedor da l.a Vara do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa comunicou ao Provedor de Justiça que, no âmbito" de um processo judicial pendente, vinha solicitando, sem êxito, desde 15 de Outubro de 1977, à Direc-ção-Geral do Saneamento Básico, informação sobre o vencimento de um funcionário e eventuais descontos nele operados.
Resolveu-se, dentro da habitual colaboração com os tribunais, abordar o caso por iniciativa do Provedor, já que não seria possível receber queixa de uma entidade pública.
Ouvido o departamento visado, este respondeu que não soubera, senão muito recentemente, da solicitação do tribunal, pois que os ofícios que a continham, embora endereçados à Direcção-Geral, haviam, por lapso, sido remetidos à residência do próprio funcionário, que deles não dera conhecimento no serviço. Acrescentou, contudo, que já dera início ao desconto decretado pelo tribunal, em execução de sentença. E aproveitou para pedir orientação no Provedor sobre a questão de saber se esse desconto poderia ou não incidir também sobre as diuturnidades, além dos vencimentos. De facto, o funcionário teria protestado contra a actuação da Direcção-Geral, ao calcular o desconto sobre o conjunto do vencimento base e das diuturnidades, por entender ser diversa a natureza dessas remunerações.
Entretanto, o próprio funcionário veio escrever ao Provedor, procurando defender a sua posição quanto à amplitude dos descontos, e invocando ainda o facto de a decisão judicial se reportar apenas a vencimentos, e não a diuturnidades.
Considerou-se correcta a actuação da Direcção--Geral, disso a informando, assim como ao funcionário em questão.
De facto, entendeu-se que, nos termos do Código de Processo Civil, o desconto até um terço pode incidir sobre o conjunto dos proventos auferidos pelo funcionário, constituído pelo vencimento base e pelas diuturnidades. E pareceu que, no caso concreto, a isso não obstaria o facto de a sentença se ter referido apenas a vencimentos, pois este termo é susceptível de sentido amplo que inclua as diuturnidades.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PROCESSO JUDICIAL — ATRASO EM EXAME MÉDICO-FORENSE
Processo n.° 78/R-381-B-1
No interesse da autora de uma acção nele pendente, um tribunal cível de Lisboa solicitou que o Provedor de Justiça interferisse no sentido de um servi-
ço da Faculdade de Medicina de Lisboa ultimar o exame médico-forense que há muito lhe fora requisitado.
Ouvida sobre o caso, a Faculdade de Medicina explicou que as suas graves carências humanas e materiais a impediam, apesar de trabalho esforçado, de concluir com a desejada brevidade os exames de que era incumbida.
Tendo-se acompanhado a evolução do assunto, verificou-se que o exame em causa veio a ser rapidamente remetido para o tribunal competente.
O processo deste Serviço foi arquivado, sendo o caso concreto considerado no estudo em curso do problema geral das demoras em exames mèdico--forenses.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PROCESSO JUDICIAL — PENHORA
Processo n.° 78/R-1777-B-1
Os sócios de uma sociedade comercial de Vila Viçosa pediram a interferência do Provedor de Justiça por se estar a estragar uma viatura pesada de que a sua firma era dona e que fora penhorada pelo Tribunal da Comarca de Vila Viçosa, em execução movida contra a empresa.
O veículo achava-se imobilizado e, apesar de valer centenas de contos, fora depositado ao ar livre, num terreno onde existiam sucatas, quando havia, próximo instalações da empresa que poderiam oferecer melhores condições de conservação e resguardo.
Ouvido sobre o caso, o magistrado do Ministério Público em Vila Viçosa informou que a viatura penhorada fora então conduzida para um barracão do fiel depositário, onde ficou arrecadada e devidamente acautelada.
Ficou assim resolvida a questão suscitada.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PROCESSO PENAL — CERTIDÃO DE DECISÕES
Processo n.° 78/R-12S0-B-1
Um recluso da Cadeia Penitenciária de Lisboa pediu a intervenção do Provedor de Justiça por há muito se aguardar no estabelecimento prisional, com prejuízo para ele, a cópia de uma decisão judicial pedida ao tribunal competente.
Tratado o assunto através do Conselho Superior da Magistratura, em breve se conseguiu que fosse satisfeita a pretensão do reclamante.
Porém, para além do caso concreto e tendo em conta que não só diversos reclusos como várias direcções de estabelecimentos prisionais se vinham queixando de atrasos na comunicação de decisões judiciais, o Provedor ponderou ao Conselho Superior da Magistratura a conveniência de, por circular, determinar a todos os tribunais que sejam prontamente remetidos aos estabelecimentos prisionais os documentos por eles pedidos e que são necessários para instrução dos processos individuais dos reclusos (pois a falta dessa documentação prejudica os interessados, designadamente no tocante a concessão de várias regalias — como liberdades condicionais e saí-
Página 2032
1076-(56)
II SÉRIE — NÚMERO 47
das precárias prolongadas —, além de indesejavel-mente os manter na insegurança sobre a sua real situação prisional).
Em resposta, o referido Conselho comunicou que, em face da sugestão recebida, oficiara às presidências das relações a pedir que circulassem a todos os juízes em serviço na área dos respectivos distritos judiciais no sentido de os mesmos atenderem as pretensões em causa.
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PROCESSO PENAL — DIREITO DE DEFESA
Processo n;° 77/R-983-B-1
Queixou-se ao Provedor um recluso da Colónia Penal de Pinheiro da Cruz, alegando que tinha sido condenado a seis anos de prisão maior, sem que lhe houvesse sido nomeado defensor oficioso.
Atenta a estranheza dessa solução, pediu-se o processo para análise.
Verificou-se que no respectivo processo de querela fora nomeado ao interessado um defensor oficioso, advogado, que interviera em diversos actos processuais, designadamente durante a instrução contraditória, mas que no próprio dia do julgamento solicitou ao mbunal escusa do seu patrocínio daquele e de outro co-réu, invocando ser advogado, noutros processos, da mulher deste último, e que essa posição se não compadecia com a defesa neste processo, que teria de ser conjunta.
A escusa foi concedida e aos réus nomeado, para a própria audiência, como defensor oficioso, um funcionário do tribunal, que se limitou a pedir justiça.
Apreciado o caso, considerou-se que o direito de defesa do reclamante fora gravemente comprometido: por um lado, pelo facto de o advogado só na audiência ter vindo pedir escusa; por outro, por — embora sem violação da lei vigente —, lhe ter sido nomeado para a audiência um defensor oficioso, não advogado, sem preparação profissional nem possibilidade prática para organizar capazmente a defesa num processo tão relevante como o de querela.
Quanto ao primeiro aspecto, comunicou-se o caso à Ordem dos Advogados, que decidiu ocupar-se dele. No que ao segundo concerne, foi o mesmo tido em conta no processo de iniciativa do Provedor em que se estudam eventuais alterações legislativas a propor em matéria de acesso ao direito e direito de defesa em processo penal.
ADMINISTRAÇÃO DE JUSTIÇA — PROCESSO PENAL — INSTRUÇÃO — EXAME
Processo n.° 78/R-1384-B-1
Uma habitante do lugar de Azaruja queixou-se ao Provedor de Justiça da demora na elaboração, pelo Instituto de Medicina Legal de Lisboa, do relatório da autópsia do cadáver de uma irmã, falecida em Lisboa em circunstâncias estranhas e que levaram á abertura de processo na Polícia Judiciária.
Ao mesmo tempo, pediu que lhe fossem facultados contactos com uma filha daquela irmã, que vi-
vera com ela durante os primeiros anos de vida e que, depois de passar a residir com o pai, este afastara do contacto com a tia.
Desde logo o Provedor esclareceu a reclamante de que pertencia ao pai, como titular do poder paternal, orientar a convivência da menor, só o tribunal de menores competente podendo decidir, em acção para tal efeito intentada, se deveria ser retirado o poder paternal ao seu actual detentor.
Auscultaram-se depois a Polícia Judiciária e o Instituto de Medicina Legal, no sentido de se saber o estado do processo criminal e de se procurar remover o obstáculo apontado à sua normal tramitação.
O Instituto de Medicina Legal informou que a perícia tanatológica não fora ainda ultimada por se aguardar o resultado de um exame complementar, explicando que o serviço de autópsias estava há mais de um ano reduzido a dois peritos (quando ali trabalhavam antes cinco e diariamente eram executadas oito a dez autópsias) e que essa carência de meios humanos impossibilitava os médicos de concluírem os relatórios com a brevidade que seria de desejar e ocasionava grande acumulação de serviço.
Os concursos para o preenchimento de dez vagas de médicos existentes no quadro do Instituto haviam ficado desertos por falta de concorrentes.
Porque os exames periciais decorriam com a possível normalidade, dentro do atrazo motivado pela falta de técnicos, e não era viável qualquer outra providência do Provedor, o processo deste Serviço foi arquivado.
Pouco tempo depois soube-se que o relatório da autópsia em causa havia sido entregue na Polícia Judiciária.
E o caso concreto foi tomado em conta no estudo, a nível geral, em curso neste Serviço acerca do problema das demoras em exames médico-forenses.
Processo n.° 78/R-2240-B-1
O juiz de um tribunal criminal ria comarca de Lisboa pediu a intervenção do Provedor de Justiça, por o Instituto de Medicina Legal de Lisboa não lhe enviar o relatório da autópsia do cadáver da vítima de um crime de homicídio, sendo certo que já fora adiado, por falta daquele documento, o julgamento do processo relativo ao referido crime e que o respectivo réu se achava preso preventivamente há já mais de nove meses.
O mesmo documento era, como é óbvio, indispensável à descoberta da verdade no processo criminal.
Dada a urgência do caso, este Serviço contactou imediata e telefonicamente o Instituto de Medicina Legal, que mais uma vez se queixou das suas graves carências humanas e prometeu resolver o problema.
Pouco depois, soube-se que o relatório do exame tanatológico fora entregue na Polícia Judiciária (entidade requisitante), para urgente remessa ao tribunal competente.
Assim foi solucionada uma questão que, sendo proveniente de autoridade pública, o Provedor tratou por iniciativa própria, dados os superiores interesses públicos em jogo (boa e pronta administração da justiça) e a sua missão de velar pelos legítimos interesses dos cidadãos postos em perigo por incorrecto funcionamento da Administração Pública.
Página 2033
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(57)
ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA — PROCESSO PENAL — REQUISIÇÃO DE RÉU PRESO
Processo n.° 78/R-2302-B-1
Reclamou para o Provedor um recluso da Colónia Penal de Pinheiro da Cruz, por não ter sido apresentado a julgamento no dia em que para tanto fora requisitado pelo Tribunal da Comarca da Moita. Ignorava se fora condenado à reveiia ou se o julgamento fora adiado.
Auscultado o Tribunal, este informou ter o julgamento sido adiado por ausência do réu.
Por seu turno, a direcção da Colónia Penal, também ouvida sobre o caso — com expressa referência à Resolução do Conselho da Revolução n.° 62/78, de 10 de Maio, que, sobre solicitação do Provedor, declarou inconstitucionais os n.os 1.° e 3.° do artigo 418.° do Código de Processo Penal —, veio comunicar que só dispunha de um carro celular (sem, portanto, poder utilizar um veículo para escolta), o que, com o aumento do número de reclusos, tornava materialmente impossível cumprir todas as requisições para julgamento, cujo número por vezes atinge, agora, cinco por dia. O frequente adiamento das audiências contribuiria para a excessiva acumulação de tais diligências.
Em face desta situação, solicitou-se ao Ministro da Justiça que providenciasse no sentido de para ela encontrar, com urgência, solução adequada, por forma a não compremeter a actuação dos tribunais nem prejudicar indevidamente os reclusos com processos pendentes, que assim se protelam demasiado.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — BOMBEIROS — ACIDENTE
Processo n.° 78/R-502-B-4
O Provedor de Justiça foi alertado para a seguinte situação, descrita por um bombeiro voluntário da corporação de Vila Nova de Ourém, de profissão pintor de construção civil, trabalhador por conta própria.
Em 1972, ao participar no ataque a um fogo, sofreu graves ferimentos, dos quais lhe resultaram trinta e quatro meses de inactividade.
Terminada a incapacidade, não pôde, contudo, devido às lesões sofridas, retomar o exercício da sua profissão, vendo-se forçado a passar a trabalhar como porteiro de hospital, função com reduzidos proventos.
Pelo acidente sofrido recebeu somente 32 000$ da companhia de seguros em que o município o havia segurado.
Estudada a questão, chegou-se à conclusão de que nela não transparecia qualquer ilegalidade.
O corpo administrativo constituíra seguro contra acidentes sofridos por bombeiros voluntários no exercício dessas funções, como lhe impunha o Decreto--Lei n.o 35 746, de 12 de Julho de 1946.
Este diploma não estabelece, contudo, limites mínimos para tais contratos, estando a quantia paga ao interessado de acordo com o contrato que a edilidade celebrara.
Tão-pouco devia o município indemnizá-lo por acidentes em serviço, pois entre tais autarquias e os bombeiros voluntários não se estabelecem vínculos jurídico-laborais.
Arquivou-se, pois, o caso concreto.
Mas ponderou-se que os bombeiros voluntários exercem função socialmente útil, de que a Administração aproveita e que até, de algum modo, é supletiva de actividade abrangida nas finalidades desta. E é patente que na actuação própria dos bombeiros a sujeição ao risco é uma característica quase constante.
Por isso tomou o Provedor a iniciativa de promover o estudo de eventual remodelação legislativa a operar nesta matéria.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — CEMITÉRIO — TRASLADAÇÃO
Processo n." 78/R-2140-B-4
Um grupo de habitantes de Balazar (concelho de Póvoa de Varzim) reclamou ao Provedor por, em seu entender, haver sido ilegalmente efectuada, de noite e às escondidas de parte de população, a trasladação dos restos mortais de certa mulher, com fama de santa, do cemitério da freguesia para a igreja paroquial — o que teria sido promovido pela respectiva comissão fabriqueira.
Mais acusavam o pároco local de se aproveitar para fins pessoais das avultadas somas oferecidas pelos paroquianos para sustentar o culto da falecida.
Quanto a este último aspecto, considerou-se, apreciados os termos em que tais dádivas eram efectuadas, que se estava perante questão entre particulares, na qual o Provedor não devia interferir.
Ouviu-se, contudo, a Câmara Municipal e o delegado de saúde da Póvoa de Varzim, a respeito da regularidade da trasladação levada a cabo.
O corpo administrativo indicou considerar legal a situação, apontando ser interpretação habitual a de que o alvará de trasladação só é necessário quando ela tem lugar para fora do concelho.
O delegado de saúde, por sua vez, comunicou que, não obstante tivesse havido autorização da delegação para a trasladação, a esta não estivera presente, pois não fora avisado da data e hora a que ela iria efectivar-se.
Apreciada a questão, verificou-se que a trasladação fora precedida da portaria exigida pelo artigo 257.°, alínea b), do então vigente Código do Registo Civil.
Mas também se apurou que não houvera alvará da trasladação, em violação da portaria de 7 de Janeiro de 1875.
A este propósito, não colhia a argumentação da Câmara Municipal, pois o artigo 27.° do Decreto--Lei n.° 48 770, de 18 de Dezembro de 1968, revela que não devia estar-se perante trasladação se a remoção de restos mortais já inumados se processa no âmbito do mesmo concelho.
Acresce que a ausência do delegado de saúde — a ele não imputável, mas sim a quem promoveu a trasladação e o não avisou — ofendeu o disposto no artigo 28.° daquele mesmo diploma.
Visto estar-se perante ilícito criminal previsto no artigo 246.° do Código de Processo Penal, do caso se fez a devida participação ao agente do Ministério Público junto do Tribunal da Comarca da Póvoa de Varzim.
Página 2034
1076-(58)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉCTRICA - ATRAVESSAMENTO DE PROPRIEDADE PRIVADA
Processo n.° 78/R-507-B-4
A proprietária de certo terreno em que haviam sido colocados três postes de suporte de linhas aéreas condutoras de energia eléctrica protestou por essa instalação se ter verificado sem sua anuência ou, sequer, conhecimento, e por entender que a mesma poderia melhor ter tido lugar através de um caminho público vizinho.
Foi posto o assunto à Federação dos Municípios do Distrito de Faro, com expresso pedido de indicação do modo por que pensaria ressarcir os prejuízos invocados pela interessada.
A Federação informou que, dado tratar-se de obra urgente, que abrangia muitos pequenos prédios rústicos, e atenta a dificuldade de identificação de todos os respectivos proprietários, se optara pela publicação de editais. A instalação dos postes não poderia ter-se feito no caminho público mencionado pela queixosa, pois a sua configuração o não permitiria facilmente, além de lhe estar próximo um edifício escolar, do qual era necessário afastar qualquer instalação eléctrica.
Terminou por se declarar disposta a pagar à reclamante determinada indemnização, calculada em função dos prejuízos decorrentes para o aproveitamento agrícola do terreno, dado ser esta a sua aptidão.
Pareceu alcançado o objectivo da intervenção do Provedor neste assunto, já que não lhe caberia intervir na fixação da indemnização, a não haver acordo das partes. Isto, não obstante se apresentar equilibrada a posição da Federação.
Teve-se por necessário, não obstante, ponderar à Federação que, independentemente da publicação de éditos, se deveria, em casos destes, ter em conta o preceituado no § 5.° do artigo 16.° do Regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.° 26 852, de 30 de Julho de 1936, a propósito da obtenção de autorização para a ocupação de quaisquer domínios públicos ou particulares, quando a concessão não haja sido conferida com declaração de utilidade pública.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — OBRAS COERCIVAS Processo n.° 78/R-10SI-B-4
Um cidadão residente em Lisboa queixou-se de que era promitente comprador de um andar sito na Estrada da Falagueira, Amadora, e que fora notificado pelo Bairro Administrativo da Amadora, concelho de Oeiras, para proceder a obras de modo a suprimir as infiltrações nos tectos e paredes da referida habitação.
Acontecia, porém, que o citado andar fora adquirido, em propriedade horizontal, ao construtor, que este edificara o prédio clandestinamente e havia prometido vender apenas alguns andares e que as infiltrações se deviam a deficiências de funcionamento do algeroz.
Entendia, assim, o reclamante que a realização das obras competia ao construtor e proprietário.
Estudado o caso, conclui-se que, tratando-se de uma construção clandestina e que se destinava a ser vendida por andares, em regime de propriedade horizontal, enquanto as vendas não fossem tituladas por escritura pública, não tendo o prédio sido ainda entregue à administração do condomínio e sendo verdade que a causa das infiltrações se devia ao mau funcionamento do algeroz, que é parte comum do edifício [artigo 1421.°, n.° 1, alíneas b) e d), do Código Civil], parecia evidente que o encargo com a reparação em causa impendia sobre o construtor, uma vez que não era possível falar em encargo dos condóminos (artigo 1424.° do Código Civil).
Portanto, perguntou-se à Câmara Municipal de Oeiras a sua posição sobre o assunto, dando-lhe nota do entendimento deste Serviço e pedindo que fosse esclarecido se existia naquela autarquia algum regulamento que tornasse os construtores responsáveis pelos defeitos da construção.
Em resposta, a Câmara afirmou que ia notificar o construtor do prédio para efectuar a.s obras, uma vez que não haviam sido constituída a propriedade horizontal e vendidas formalmente as fracções autónomas.
Considerada satisfeita a pretensão do reclamante — pois fora implicitamente declarado sem efeito o mandado de intimação que lhe tinha sido endereçado —, foi arquivado o processo deste Serviço.
Processo n.° 78/R-1301-4
Uma habitante da cidade de Lisboa reclamou por, sendo apenas usufrutuária de um prédio arrendado sito em Algés, haver sido intimada pela Câmara Municipal de Oeiras para executar no referido imóvel as obras consideradas necessárias para se remediarem diversas deficiências que afectavam as suas condições de habitação e salubridade.
Ao auscultar-se a posição da autarquia, perguntou-se se, na deliberação que decidira a notificação da usufrutuária, fora tido em conta o disposto no § 2.° do artigo 10.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, na parte em que estabelece que o destinatário da notificação é o proprietário do imóvel, e se as obras em causa tinham a natureza de reparações ordinárias ou extraordinárias (para os efeitos dos artigos 9.° ou 10.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, não podendo ainda esquecer-se, para os fins do artigo 1472.°, n.° 2, do Código Civil, que a usufrutuária recebia do inquilino a exígua renda mensal de 700S).
Em resposta, a Câmara Municipal informou, reconhecendo a sugerida incorrecção do seu procedimento, que este tivera origem em elementos fornecidos, ao Município pelo arrendatário, não tendo o mesmo esclarecido se se tratava do proprietário ou usufrutuário.
Mais declarou que iriam ser feitas diligências no sentido de se averiguar a identidade do proprietário, para oportunamente ser este notificado a proceder às obras.
Considerando-se, em face da nova posição da Câmara, que a intimação dirigida à reclamante deixara de produzir qualquer efeito jurídico e que, portanto, fora satisfeita a pretensão por esta apresentada, foi arquivado o processo deste Serviço.
Página 2035
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(59)
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — OBRAS — LICENCIAMENTO Processo n.° 78/R-241-B-4
Uma munícipe da Figueira da Foz, inconformada por a respectiva Câmara Municipal não decidir um pedido de licenciamento que apresentara, destinado a uma casa para habitação, patenteou a situação ao Provedor.
Porque havia indícios de se ter operado o deferimento tácito da pretensão, pediu-se o processo, para consulta, à Câmara Municipal.
Através desta diligência se determinou que, na verdade, aquele deferimento tivera lugar, por esgotamento do respectivo prazo, sobretudo em função de atraso na obtenção de parecer da Junta Nacional da Educação, e, depois, da Direcção-Geral do Património Cultural.
Estudado o caso, elaborou-se informação no sentido seguinte:
Estabelece o artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 166/70, de 15 de Abril:
1 — Presume-se que os pedidos de . . . ou licenciamento de obras, estão devidamente instruídos se, no prazo de quinze dias, após a data em que for recebido o requerimento, o requerente não tiver sido notificado de deficiências que porventura se verifiquem.
2 — Se houver lugar a intervenção de entidade estranha ao município, igual presunção só terá lugar decorridos trinta dias após o recebimento do processo.
Este n.° 2 pressupõe, sem dúvida, que intervenção de entidades estranhas ao município seja legalmente necessária.
Mas como resulta do artigo 9.° do mesmo diploma, a necessidade daquela intervenção è determinada pela entidade licenciadora, no prazo marcado no n.° 1 do transcrito artigo 8.°, do que deve ser notificado o requerente, para instruir no prazo de quinze dias o processo, com cópias do projecto e outros elementos indispensáveis, que os serviços municipais deverão, logo em seguida, enviar às entidades destinatárias.
Resulta das finalidades e estrutura do Decreto--Lei n.° 166/70 que qualquer deficiência na instrução do processo só possa ser detectada pela entidade licenciadora para correcção no referido prazo de quinze dias, dentro do qual o requerente terá de ser notificado, pois, se assim não fosse, poderiam os serviços camarários começar a exigir aos requerentes sucessivas e novas pretensões, subvertendo completamente o sistema de que partiu o diploma.
Desrespeitado o prazo (n.° 2 do artigo 9.° e n.° 1 do artigo 8.°) não se interrompe o fixado no artigo 12.° para a entidade licenciadora se pronunciar definitivamente — prazo que começou a correr com a entrada do requerimento para licenciamento nos serviços municipais.
Motivo por que o prazo para resolução pela Câmara Municipal ou pelo seu presidente não se reinicia, nos termos do n.° 6 do artigo 12.° [neste sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 24 de Maio de 1973 e de 7 de Julho de 1977, in Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Admi-
nistrativo, respectivamente n.os 140-141, p. 1180, e 194, p. 125; José Oswaldo Gomes, in Comentários ao Novo Regime de Licenciamento de Obras (Decreto--Lei n.° 166/70, de 15 de Abril), pp. 557 e seguintes].
O prazo para a entidade municipal competente se pronunciar definitivamente sobre o licenciamento de nova edificação é de sessenta dias — alínea b) do n.° 1 do artigo 12.°
E nos termos do n.° 1 do artigo 13.° «a falta de resolução dentro dos prazos presentes no artigo anterior interpreta-se para todos os efeitos como consentimento».
Estamos perante um caso de deferimento tácito.
Compulsando a matéria de facto, constata-se:
a) O requerimento para licenciamento da obra
no município, em 20 de Julho de 1977;
b) Datadas, respectivamente, de 29 de Julho e
26 de Agosto, foram exaradas pelos serviços técnicos informações, no sentido de, por força do disposto no Decreto-Lei n.° 44 075, de 5 de Dezembro de 1961, ser ouvida a Direcção-Geral do Património Cultural, informações essas homologadas pelo presidente da comissão administrativa, em 6 de Setembro, como resulta da cópia do oficio assinado por esta entidade, enviado ao reclamante para apresentar cópia do projecto a fim de ser enviado à entidade referenciada.
O reclamante não foi notificado para apresentar o documento sempre identificado, dentro de quinze dias, contados a partir de 20 de Julho.
Razão pela qual a partir desta data correu continuamente o prazo de sessenta dias para o município resolver a questão do licenciamento, que terminou em 18 de Setembro de 1977.
Em nosso entender encontra-se, desde este dia, deferido tacitamente o pedido de licenciamento da obra, pelo que nos termos do n.° 2 do artigo ¡3.° não pode a entidade licenciadora, recusar a emissão de alvará, a partir da altura em que pelo reclamante sejam pagas as taxas devidas.
Transmitida esta posição à edilidade da Figueira da Foz, esta veio a concordar com ela, concedendo a licença solicitada.
Processo n.° 78/R-2146-B-4
O proprietário do imóvel em que está instalada, há mais de cinquenta anos, a estação dos CTT de Miranda do Douro comunicou ao Provedor que essa entidade pública teria adquirido, doze anos antes, um terreno para construção da sua nova estação nessa localidade, mas que os sucessivos projectos que para tanto apresentara à respectiva Câmara Municipal teriam todos sido por esta rejeitados. Acrescentou que os ex-proprietários desse prédio rústico, um deles presidente da Câmara Municipal, continuariam efectivamente a utilizá-lo e fruí-lo.
Considerou-se que não teria cabimento qualquer intervenção do Provedor atinente à satisfação dos interesses particulares do queixoso — decerto desejoso de poder obter novo arrendatário para o seu prédio.
Página 2036
1076-(60)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Mas, tendo em conta a estranheza da situação descrita por ele, indagou-se das entidades públicas visadas sobre os antecedentes e o estado actual da questão.
Os Correios e Telecomunicações de Portugal esclareceram que as demoras ocorridas na efectivação das obras projectadas se deviam à circunstância de ter havido alteração da política de instalações adoptadas pelos CTP, procurando-se separar as relativas aos correios e as respeitantes às telecomunicações, bem como, ainda, ao facto de a Direcção-Geral do Património Cultural não haver aprovado o projecto elaborado, por a obra se situar na zona de protecção da sé.
Acrescentou, por seu turno, que fora de facto autorizado o feitor do ex-proprietário do terreno a continuar a utilizá-lo, enquanto se não tornasse necessária a sua desocupação, para início das obras.
A Câmara Municipal confirmou o estado do processo, dependente de autorização da Direcção-Geral do Património Cultural e veio solicitar ao Provedor que actuasse no sentido de se obter pronta solução do assunto e lhe remetesse «cópia da justificação» das afirmações do queixoso.
Em aditamento a esta comunicação, este corpo administrativo veio pedir ao Provedor tratamento igual ao que teria sido concedido ao reclamante, já que a sua queixa teria tido seguimento vinte dias após a formulação, o que não sucedera com aquele ofício da Câmara. E acrescentou, ainda, que julgava não ter sido a instituição do Provedor criada para albergar delações sem provas.
Tendo-se obtido, entretanto, confirmação de os Correios e Telecomunicações de Portugal estarem a diligenciar pela aprovação de novo projecto, deu-se o caso por encerrado.
Ao agradecer-se à Câmara Municipal a colaboração prestada, aproveitou-se para a esclarecer de que a actuação do Provedor no sentido de averiguar da procedência ou improcedência das queixas que os cidadãos lhe apresentam, no uso de um direito que a Constituição consagra, não pode confundir-se com a aceitação de quaisquer acusações sem provas.
Mais se explicou ter-se o caso por devidamente esclarecido, sem que se confirmassem as interpretações do queixoso, e que não teria cabimento qualquer intervenção do Provedor na aprovação ou não do projecto pelos serviços da Secretaria de Estado da Cultura, por isso depender de consideração de índole essencialmente técnica.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — PROCESSO ADMINISTRATIVO — REQUERIMENTO
Processo n.° 78/R-2003-B;4
Deu entrada neste Serviço uma reclamação de um cidadão que referiu ser inquilino de uma garagem sita na Rua de Gomes Freire, na Amadora, e que, por terem sido levadas a cabo obras de beneficiação daquela artéria, modificaram o passeio em frente à garagem, pelo que o acesso a esta se tornara extremamente difícil.
Mais afirmou o reclamante que, tendo requerido à* Câmara Municipal de Oeiras a reposição do passeio no seu estado anterior (em petição que dera entrada
no Bairro Administrativo da Amadora), tal requerimento viera a ser arquivado por «não estar de acordo com as normas em vigor», conforme constava de certidão subscrita pelo chefe de secretaria da autarquia.
Ouviu-se a Câmara Municipal, desde logo se anotando que a pretensão do reclamante parecia ser perfeitamente legítima, uma vez que a existência de uma garagem, com utilização normal anterior, deveria ter sido levada em conta na execução das obras e que o teor da certidão passada ao reclamante era por de mais lacónico e inexpressivo (não fornecendo por forma clara as razões do arquivamento do seu requerimento).
O chefe da secretaria da aludida Câmara explicou que o reclamante entregara no Bairro Administrativo da Amadora um requerimento dirigido ao engenheiro chefe dos Serviços de Urbanização e Obras da Amadora, e que, ao ser advertido de que a sua petição devia ser substituída por outra endereçada ao presidente da Câmara Municipal de Oeiras, não quisera fazê-lo, alegando que isso era uma «chinesice».
Perante essa recusa, o reclamante fora informado de que o requerimento ficaria sem efeito (por visar entidade que não existia) e seria arquivado no Bairro.
Assim se justificava o teor da certidão depois dada ao reclamante sobre o destino do que impetrara.
Mas, ao mesmo tempo, o chefe da secretaria comunicou que a intervenção deste Serviço fora levada ao conhecimento do presidente da Câmara Municipal de Oeiras.
Pouco depois, aquele funcionário esclareceu que a Câmara já ordenara aos Serviços Municipais de Urbanização e Obras que procedessem ao rebaixamento do lancil do passeio, em ordem a permitir o acesso fácil de viaturas à garagem do reclamante.
Tendo este ficado, assim, com o seu problema resolvido, foi arquivado o processo deste Serviço.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — RESPONSABILIDADE CIVIL DE AUTARQUIA — INDEMNIZAÇÃO
Processo n.° 78/R-1811-B-4
Quando se encontrava em frente da. residência do seu proprietário, o automóvel de um munícipe de Lisboa foi, na noite de 28 para 29 de Abril de 1978, atingido pela queda de uma árvore, de que lhe resultaram danos no valor de cerca de 40 000$.
Por pensar tratar-se de assunto da responsabilidade do Município lisboeta, visto que a árvore pertencia ao património municipal, o interessado dirigiu petição à respectiva edilidade em início de Maio de 1978, sem que, até finais de Agosto seguinte, tivesse obtido qualquer resposta — motivo por que contactou o Provedor.
Instada para o efeito, a Câmara Municipal retorquiu que não lhe caberia ressarcir os prejuízos sofridos pelo reclamante, pois não houvera na ocorrência dolo ou culpa de qualquer agente seu e a árvore terá caído devido a evento fortuito, traduzido nas desfavoráveis condições meteorológicas que na noite em questão se verificaram.
Do processo consta informaçã' do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, segundo o qual.
Página 2037
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(61)
nessa noite, pelas 20 horas, caira sobre Lisboa uma trovoada, acompanhada de chuva e aguaceiros.
No estudo que se fez, entendeu-se que a guarda e vigilância dos jardins públicos e árvores integrados no património municipal se incluem nos actos de gestão pública das autarquias, estando por isso sujeitos ao regime constante do Decreto-Lei n.° 48 051, de 21 de Novembro de 1967.
Ora, nos termos do artigo 8.° desse diploma, só se gera responsabilidade para os entes públicos com base no risco se os danos resultarem de serviços administrativos excepcionalmente perigosos ou de coisas e actividades da mesma natureza.
Não sendo essa a hipótese, nela só se poderia concluir pela responsabilidade do município se se provasse culpa de agentes seus na vigilância ou tratamento da arvore.
Visto que nada no processo apontava nesse sentido, e que, de qualquer modo, uma tal indagação implicaria desenvolvida apreciação e discussão de matéria de facto, que aos tribunais cabe fazer, arquivou-se a queixa, remetendo-se ^ seu autor para a via judicial.
ADMINISTRAÇÃO LOCAL — VENDA AMBULANTE — CONCURSO
Processo n.° 78/R-88-B-4
Reclamou para o Provedor um cidadão que se considerou indevidamente pretendido em concurso aberto pela Câmara Municipal de Cascais, para atribuição da exploração de um quiosque de venda ambulante junto da estação de caminho de ferro do Estoril.
A Câmara Municipal, ouvida sobre o assunto, começou por responder que o queixoso não tinha qualquer razão para protestar e que iria ser chamado para prestar explicação pessoal.
Como a situação não estava, afinal, esclarecida, procedeu-se à análise do processo de concurso.
Entretanto, o interessado recorrera contenciosamente da decisão que contestam.
A ordem de preferências fixada no regulamento do concurso era a seguinte:
5 — Observar-se-á rigorosamente a seguinte ordem de preferência em relação a todos os interessados:
1.a Residir na área da freguesia onde se localiza o quiosque pretendido;
2.a Ter possibilidade de conseguir meios que lhe permitam construir o quiosque no prazo fixado;
3.a Dispor de posto de venda fixo, embora precário, no local pretendido;
4.a Estar desempregado, ou padecer de doença não contagiosa ou de deficiência física que o impossibilite de exercer outras actividades;
5.a Ter uma capitação do agregado familiar inferior a um terço do salário mínimo nacional;
6.a Estar inscrito há mais tempo na Câmara para atribuição de local para quiosque;
7.a Ser mais idoso.
Da leitura das actas das reuniões da Câmara Municipal, em que se decidira a atribuição dos vários quiosques postos a concurso, pôde extrair-se que a real intenção da edilidade era a de preferir os candidatos mais carenciados economicamente.
Mas de modo algum este propósito se traduzira capazmente no regulamento aprovado, cuja graduação de preferências se revelava, aliás, em si, extremamente imperfeita.
E, ao deliberar, o corpo administrativo não respeitara sequer a ordem de prioridades que fixara.
Embora se decidisse não intervir mais no caso concreto, por convir aguardar sobre ele o veredicto judicial, considerou-se indispensável formular, à Câmara Municipal de Cascais, a seguinte recomendação genérica:
Como resulta da acta da reunião desse corpo administrativo, de 8 de Março de 1978, a preocupação dominante desse corpo administrativo foi a de prosseguir, com a distribuição dos quiosques, uma política municipal de justiça social, atribuindo «os quiosques a quem não tinha onde ganhar o seu pão».
Simplesmente, tal preocupação não corresponde minimamente à ordem de preferências fixada na condição n.° 5 do programa do concurso, onde, na verdade, as condições económicas só aparecem na 4.a e 5.a ordens de preferência.
Daqui resultou, pois, que as regras do concurso não foram respeitadas por esse corpo administrativo, o que é facto gerador de insegurança e falta de confiança por parte dos concorrentes, sujeitando-se essa edilidade, além do desprestígio, à quase certa anulação contenciosa das deliberações em causa, com todos os inconvenientes para os já beneficiados com a atribuição.
Face ao exposto, e considerando que são de louvar as preocupações de justiça social, de futuro deverá haver mais cuidado na elaboração das regras de preferência fazendo-as corresponder aos propósitos a alcançar, sem quaisquer margens para as tergiversações ora verificadas e respeitando, depois, em qualquer caso, essa edilidade, as regras do concurso por si fixadas.
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA — RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO — INDEMNIZAÇÃO
Processo n.° 78/R-711-B-1
Uma cidadã foi, quando passava numa rua de Lisboa, atingida por um tiro, disparado por um soldado do Exército, ao que parece por descuido.
Tendo tentado, por vários modos, mas sem o conseguir, obter que lhe fossem pagas as despesas de tratamento da lesão sofrida, a queixosa acabou por expor o caso ao Provedor.
Verificou-se que o processo crime instaurado a propósito da ocorrência fora arquivado, por amnistia.
Mas perguntou-se ao Estado-Maior do Exército qual a sua posição quanto à indemnização pedida.
O Estado-Maior do Exército respondeu que a interessada poderia, para tanto, propor acção cível de indemnização.
Página 2038
1076-(62)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Ponderou-se, contudo, no Estado-Maior do Exército, que, visto admitir a responsabilidade no pagamento da indemnização, não seria adequado sujeitar a interessada às despesas e delongas duma acção judicial, sugerindo-lhe que encetasse diligências no sentido de procurar chegar a uma solução conciliatória.
O Estado-Maior do Exército, embora esclarecendo que a sua afirmação não pretendia significar a aceitação, sem mais, da obrigação de indemnizar, retorquiu que ficava a aguardar que a queixosa lhe indicasse o montante e fundamentação da reparação pretendida.
Isto se comunicou à reclamante, arquivando-se o processo, por estar em andamento a tentativa de conciliação, sem prejuízo de possível reabertura, se tanto se vier a justificar.
ADVOCACIA — INCOMPATIBILIDADE — CONSERVADORES E NOTÁRIOS
Processo n.° 76/R-S78-A-2
Um advogado enviou ao Serviço do Provedor de Justiça uma exposição na qual formulou diversas observações relacionadas com os inconvenientes resultantes da acumulação de funções por parte dos notários e conservadores de 3.a classe, designadamente com o exercício da advocacia.
Ouvidos sobre a matéria, a Ordem dos Advogados e a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado e, também, o Ministério da Justiça, foram remetidas a este último cópias das tomadas de posição sobre a matéria, definidas por aquelas entidades, acompanhadas da indicação da opinião própria que o Provedor de Justiça entendeu ser de assumir relativamente ao assunto e que se consubstanciou no sentido de que a impossibilidade do exercício da advocacia por parte de conservadores e notários de qualquer classe se afigurava a meta ideal a atingir numa futura reformulação do Estatuto Judiciário como solução que, melhor do que qualquer outra, permitiria dignificar, a um tempo, a função pública e a profissão de advogado.
Mostrou-se o Ministério da Justiça receptivo àim-portância do problema, havendo comunicado que sobre a matéria se tomaria posição em próxima revisão do Estatuto Judiciário.
ÁGUAS
Processo n.° 78/R-1056-B-4
Um agricultor de Fareja, concelho de Castro Daire, comunicou ao Provedor que, em 1976, um grupo de pessoas destruíra um depósito de água do Município que abastecia um chafariz público e, por autorização da edilidade, várias habitações próximas, entre as quais a sua. Protestou por a Câmara Municipal não tomar qualquer atitude quanto ao caso, muito embora reconhecesse a ilegalidade daquela actuação.
Ouvida a Câmara Municipal, esta referiu que já participara a ocorrência a tribunal, mas que o processo fora arquivado a aguardar melhor prova.
Acrescentou que ia mandar elaborar o projecto de abastecimento geral de água à povoação.
Enviou-se novo oficie ao corpo administrativo, indagando se não seria viável proceder já à reparação do depósito, nomeadamente para possibilitar o normal abastecimento do chafariz público.
A Câmara retorquiu que isso não seria conveniente, por parte da população a tanto se opôr, e ainda não ter sido possível, mediante persuasão, fazê-la mudar de atitude.
Acrescentou, contudo, que estava já a ser efectivamente resolvido, através de outra captação, o abastecimento de água a Fareja — com o que o assunto se deu por encerrado.
ÁGUAS — OBRAS ILEGAIS Processo n.» 78/R-1068-B-4
Um reclamante veio impugnar o teor de uma notificação que rebera de um serviço da Direcção--Geral dos Serviços Hidráulicos para proceder à demolição de obras que havia feito numa ribeira.
Alegava o reclamante tratar-se apenas de mera reparação de um açude preexistente desde tempos imemoriais, e que, tendo pago a multa devida pela feitura das obras sem licença, devia estar liberto da obrigação da demolição.
O referido serviço oficial, através de inquérito, apurou que no local jamais existiu qualquer açude, apesar de o reclamante afirmar o contrário.
Independentemente da veracidade do facto alegado, o que não pôde ser confirmado, concluiu-se que, nos termos do artigo 277.°, § único, do Regulamento dos Serviços Hidráulicos, as obras realizadas sem licença serão voluntária ou coercivamente demolidas, pelo que se aconselhou o reclamante a remover a obra feita, sem embargo, porém, de fazer prova de existência do açude desde data recuada, e, consequentemente, requerer licença para a sua reparação.
ASSISTÊNCIA — INSTITUIÇÕES PARTICULARES — DISCRIMINAÇÃO IDEOLÓGICA
Processo n.° 77/R-1701-A-3
Por um jovem, até à altura internado na Casa de Trabalho de Bragança, foi dirigida ao Provedor de Justiça uma exposição na qual referia ter sido ameaçado e intimado a sair daquela instituição por elementos da respectiva mesa administrativa e por motivos meramente ideológicos.
Suscitada indagação pelos serviços competentes do Instituto da Família e Acção Social sobre os factos apontados naquela exposição, foi obtida informação pelos serviços de acção directa daquele instituto na qual se confirmava que o reclamante havia sido ameaçado de expulsão por pertencer ao Partido Comunista.
Chamada embora a atenção por aqueles serviços para a gravidade da situação criada, tanto mais que aquela instituição se destina a assistir a crianças privadas do meio familiar moral, o certo é que o menor se recusou posteriormente a permanecer naque|a
Página 2039
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(63)
Casa de Trabalho apesar de haver sido conseguido que ali permanecesse.
Do contexto da informação fluiu com clara nitidez que os serviços de acção directiva do Instituto da Família e Acção Social agiram com perfeita consciência da sua missão, tendo desenvolvido todos os esforços no sentido de se obter uma solução autenticamente humana e satisfatória.
Isto mesmo foi transmitido ao Instituto da Família e Acção Social, tendo-se acentuado a concordância do Provedor de Justiça com atitudes como a definida e com a necessidade de sempre ter presente a preocupação de orientar as instituições particulares de assistência a fim de obviar que nelas se pratiquem quaisquer formas de discriminação, designadamente ideológicas, por impróprias de uma sociedade democrática.
BALDIOS
Processo n.° 77/R-1913-B-4
A Comissão de Melhoramentos de Balancho e Fa-letia (freguesia de Caxarias, concelho de Vila Nova de Ourém) veio queixar-se do facto de a Junta de Freguesia estar cortando e vendendo pinhais e eucaliptos de um terreno baldio.
Ouvidos, quer a autarquia paroquial, quer a municipal, apurou-se que: ainda não estava criada a assembleia de compartes do baldio; a venda das árvores, tendo em vista a construção de um mercado com o preço obtido, haveria sido feita sem prejuízo da mata e com assentimento da Câmara Municipal.
Apreciado o assunto, em face do Decreto-Lei n.° 39/76 e das Leis n.os 79/77 e 91/77, entendeu-se que a administração dos baldios deve caber às assembleias de compartes; contudo, enquanto estas não forem constituídas, afigurou-se que, embora a lei assim não disponha expressamente, tal administração — neste caso a Junta de Freguesia de Caxarias, pois se tratava de um baldio paroquial; os actos de desbaste e venda praticados não assumiram a natureza de actos de disposição, mas de mera administração, por não haverem diminuído o valor das matas em causa.
Concluiu-se, pois, não ser censurável a actuação da Junta de Freguesia de Caxarias.
Mas elucidou-se esta de que tal conclusão vale apenas para actos de administração, como os presentes, não sendo extensiva a eventuais actos de disposição que afectassem o próprio capital.
E recomendou-se-lhe, ainda, que, atendendo à necessidade de prover, nos termos normais, à administração do baldio enquanto bem comunitário (e não pertencente à freguesia, como ela parecia entender), providenciasse no sentido da imediata constituição da assembleia de compartes.
Semelhantes consideração e recomendação foram remetidas à Câmara Municipal de Vila Nova de Ourém.
CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — CONTRIBUIÇÃO INDUSTRIAL
Processo n.» 77/R-1703-A-3
Num processo originado numa exposição apresentada por um grupo de taxistas por conta própria da
cidade de Coimbra foi o Serviço do Provedor de Justiça alertado para que o montante fixado para a remuneração normal de trabalho dos contribuintes do grupo B sem contabilidade regularmente organizada e dos contribuintes do grupo C, no § 2.° do artigo 66.° do Código da Contribuição Industrial, se deparava demasiado baixo face ao actual custo de vida e injusto quando confrontado com o limite correspondente estabelecido para os demais contribuintes na alínea 6) do artigo 37.° do mesmo Código e ainda que considerando ser mais fácil para os primeiros a evasão fiscal e o facto de aquele montante já ter sido aumentado em 1975 (Decreto-Lei n.° 408-A/75, de 5 de Agosto).
Tendo em conta que tal condicionalismo fora originador de outras reclamações apresentadas a este Serviço e verificada a incapacidade das Repartições de Finanças para o resolverem, face àquele normativo, embora reconhecessem o que ele tinha de injusto, foi julgado conveniente recomendar que fosse aumentado o montante fixado no § 2.° do artigo 66.° do Código da Contribuição Industrial para remuneração normal do trabalho dos contribuintes nele referidos em termos de melhor se atender à realidade do actual custo de vida e de se atender a diferença existente em relação ao correspondente limite estabelecido na alínea b) do artigo 37.° do mesmo Código.
Em resposta, o Ministro das Finanças e do Plano informou que na alínea b) do artigo 9.° da proposta de lei sobre o Orçamento Geral do Estado para 1978 estava incluída a autorização para o Governo elevar para 60000$ o limite de 30000$ estabelecido no § 2.° do artigo 66.° do Código da Contribuição Industrial.
CONTRIBUIÇÕES E IMPOSTOS — IMPOSTO COMPLEMENTAR
Processo n.° 77/R-1201-A-3
Por um reclamante foi colocado à consideração deste Serviço o problema da situação tributária dos funcionários públicos, alegando que, sendo empregado numa empresa nacionalizada e casado com uma funcionária pública, teria de adicionar, para cálculo daquele imposto, os seus rendimentos de trabalho (únicos) aos de sua mulher (nas mesmas condições), daqui resultando que um trabalhador (não funcionário público) casado com uma servidora do Estado (ou vice-versa) poderá ter, no conjunto, um rendimento inferior aos 480 000$ e no entanto estar sujeito ao pagamento do imposto complementar, enquanto dois funcionários públicos, casados entre si, nada pagam.
Colocado o problema à Secretaria de Estado do Orçamento, obteve-se a informação de estar em fase adiantada de estudo a eventual alteração tributária dos funcionários públicos, por forma a evitar as distorções que realmente se verificam em casos deste tipo.
CRIME — IMPORTAÇÃO ILEGAL — COMERCIALIZAÇÃO ILEGAL DE PESCADO
Processo n.° 76/R-Ó55-A-3
Pela Comissão de Trabalhadores da Comissão Reguladora do Comércio de Bacalhau foi aDresr >tada
Página 2040
1076-(64)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ao Ministro das Fianças f do Plano uma exp^ição em que se focavam factos tendentes a inculcar a existência de várias irregularidades, quer relacionadas com a comercialização ilegal de pescado, quer com importação ilícita de peixe congelado sem boletim de importação, ocasionando saída de divisas sem controle.
Transmitida aquela exposição a este Serviço pelo próprio Ministro das Finanças e do Plano, desencadeou o Provedor de Justiça toda a actividade necessária para permitir a adequada investigação dos aludidos factos pelas entidades competentes, apenas tendo dado o processo por findo quando concluiu que essa investigação estava em curso na Polícia Judiciária.
DESCOLONIZAÇÃO — MONTEPIO DE MOÇAMBIQUE — PENSÕES
Processo n.° 77/IP-12-A-2
Algumas dezenas de pensionistas do Montepio de Moçambique expuseram ao Provedor a gravidade da situação em que se encontravam, por não poderem receber em Portugal o pagamento das suas pensões, para as quais haviam regular e obrigatoriamente, aliás, enquanto funcionários das ex-colónias, contribuído.
De facto, em virtude de dificuldades de natureza cambial, aquele Montepio anunciara que ia deixar, a partir de Maio de 1975, de proceder a pagamento de pensões fora de Moçambique.
Como, efectivamente, tal cessação de pagamento teve lugar logo desde Fevereiro de 1975, o Governo português resolvera conceder um adiantamento dessas pensões até Maio do ano em referência e incluir a questão na agenda das negociações a realizar com a República Popular de Moçambique.
Ponderado o assunto, considerou-se que ele apresentava suficiente especificidade para poder ser tratado em separado dos demais problemas atinentes à suspensão de transferências cambiais de Moçambique (e de outras ex-colónias) para Portugal.
Por um lado, estavam envolvidas cerca de 2700 pessoas — muitas delas órfãs e viúvas —, a maioria das quais em situação de grave carência económica.
Por outro lado, bastava uma verba de cerca de 2 000 000$ mensais para cobrir o montante das pensões em causa.
Assim, e ainda porque se teve em consideração o facto de os interessados haverem descontado obrigatoriamente para o Montepio, bem como o de o Governo ter, de início, concedido uma temporária antecipação do pagamento de tais pensões, recomendou-se que se passasse a proceder regularmente a essa antecipação de pagamento aos pensionistas, cabendo ao Estado incluir a consideração de tal operação financeira nas negociações a promover com a República Popular de Moçambique.
O Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, depois de consultado também o Ministério das Finanças (e salientando embora a excepcionalidade da decisão, correspondente às características especiais da situação em vista), aceitou a recomendação do Provedor e mandou que se passasse a proceder de acordo com ela — com o condicionamento de, nos anos seguintes, se assegurar orçamentalmente a atribuição de verba para o mesmo fim.
DIREITO AO AMBIENTE E QUALIDADE DE VIDA Processo m.° 77/R-1211-B-4
Um cidadão residente em Lisboa queixou-se ao Provedor de Justiça por no prédio em que habita estar em laboração uma oficina de confecções, sem qualquer licenciamento, o que provocava os maiores ruídos e trepidações e tornava insuportável a vida dos moradores do edifício.
O problema foi colocado à Direcção-Geral dos Serviços Industriais, do Ministério da Indústria e Tecnologia.
Depois de numerosas e demoradas diligências deste Serviço, obteve-se a informação de que as instalações irregulares da indústria em causa estavam a ser transferidas para outro local, superiormente aprovado.
Satisfeita a pretensão do reclamante e cumpridas as normas legais, foi arquivado o processo deste Serviço.
Processo n.« 78/R-374-B-1
Um grupo de moradores de um prédio situado em Oeiras, junto do quartel da 1.» Companhia Móvel da Polícia de Segurança Pública, trouxe ao provedor o seu protesto por, desde 1973, vir a expor, sem solução, à Polícia de Segurança Pública e ao Ministério de que depende, o problema decorrente dos rui-dos, por vezes quase insuportáveis, causados pelos cães pertencentes àquela unidade.
Posta a questão à Polícia de Segurança Pública, esta informou que o canil já existia quando o prédio em que os reclamantes habitam fora construído. Entretanto, já retirara os cães que causavam maiores incómodos (sete, num total de dezassete). Mas a retirada dos restantes só seria possível com a obtenção de novas instalações para a «secção de cães polícias».
Tendo-se indagado, tempos depois, qual o estado da questão, a Polícia de Segurança Pública referiu que o processo de criação das novas; instalações da corporação, em Cheias, para as quais o canil seria transferido, ainda se encontrava na fase de obtenção de recursos orçamentais.
Em face de nova insistência dos interessados, segundo os quais a situação se mantinha indesejável, embora reconhecessem que algo atenuada, o Provedor aproveitou um dos contactos directos que tem tido com o comandante-geral da Policia de Segurança Pública para indagar da viabilidade de mais rápida resolução do caso. O comandame-geral afirmou ir estudar forma de conseguir solução provisória que pelo menos atenuasse os incómodos causados aos queixosos.
Processo n.° 78/R-877-B-4
Uma habitante do lugar de Famões, freguesia de Odivelas, concelho de Loures, veio protestar contra o facto de dois vizinhos não terem nas devidas condições o sistema de esgotos dos seus prédios, o que provocava que os detritos da casa da queixosa e de uma habitação contígua saíssem para o exterior, originando maus cheiros e pondo em perigo a saúde pública.
Página 2041
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(65)
Colocada a questão à Câmara Municipal de Loures e Subdelegação de Saúde do Concelho de Loures, teve-se pouco depois conhecimento de que os esgotos apontados como deficientes já se encontravam ligados à rede pública e a funcionar em boas condições.
Tinha havido intervenção dos Serviços Municipalizados, depois de a Câmara Municipal determinar a solução do problema da salubridade do local.
Satisfeita a pretensão da reclamante, foi arquivado o processo deste Serviço.
Processo n.° 78/R-2034-B-4
Um cidadão manifestou ao Provedor a sua discordância pela projectada construção da central nuclear de Ferrei, chamando a atenção para os riscos que, em seu entender, e no de diversas entidades ligadas ao problema, dela podem advir para a segurança e saúde das populações e a preservação do ambiente, em geral.
O Serviço do Provedor não tem possibilidade — nem tão-pouco isso lhe caberia — de se ocupar da complicada e discutida análise técnica das vantagens e desvantagens da implantação de centrais nucleares.
Mas pareceu que ao Provedor cumpre velar por que assunto de tão grave importância, não só para as populações mais directamente interessadas, como ainda para o País em geral, não devia deixar de ser submetido a discussão pública e à apreciação da Assembleia da República.
Ouvido o Primeiro-Ministro sobre o que a este respeito estaria previsto, obteve-se a indicação de que o Livro Branco sobre política nuclear teria sido concluído em Dezembro de 1977.
Esperando-se a conclusão da sua impressão para Novembro de 1978, então ele iria ser entregue à Assembleia da República.
Entendeu-se, de qualquer modo, que assunto desta transcendência não deveria apenas ser discutido pelas forças politicas representadas na Assembleia da República.
Nesse sentido se recomendou ao Primeiro-Ministro que o Governo, através dos meios de comunicação social e de colóquios, associações de especialidade e de interesses locais, dê a máxima publicidade às conclusões do Livro Branco, de forma a promover a discussão pública do problema, à semelhança do que em outros países tem sucedido.
DIREITO DE ASILO POLÍTICO Processo n.° 78/R-1947-B-1
Um habitante de Carnaxide veio queixar-se ao Provedor de Justiça por, sendo angolano por naturalidade e nacionalidade e desejando ter a qualidade de cidadão da República Popular de Angola, haver requerido em Portugal a concessão do estatuto de asilado político.
O reclamante deixara Angola por razões políticas, já que fora militante da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA), movimento nacionalista com ideologia diferente da do Movimento Popular
para a Libertação de Angola (MPLA), e que esse facto lhe acarretara constantes perseguições.
Defendendo o seu direito de dispor do estatuto pessoal e de ser angolano e afirmando que o seu pedido de asilo político se inseria nas premissas do artigo 22.° da Constituição da República Portuguesa, em plena consonância coni o artigo 14.° da Declaração dos Direitos do Homem, solicitou ao Provedor que ordenasse a revisão do seu processo e a concessão do almejado asilo.
O reclamante foi logo advertido de que o Provedor de Justiça não constituía uma instância de recurso e de que não lhe assistiam poderes decisórios (podendo apenas recomendar à Administração a actuação que julgar mais conveniente).
Ouvido depois acerca do caso, o Serviço de Estrangeiros do Ministério da Administração Interna informou que, tendo o reclamante requerido a concessão de asilo político, havia sido organizado um processo tendente à sua inscrição como candidato ao asilo político, o qual fora mandado arquivar por se ter concluído, em face dos documentos apresentados pelo interessado, que este conserva a nacionalidade portuguesa ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 308-A/75, de 24 de Junho, com o sentido que a este preceito foi dado pelo despacho ministerial de 8 de Setembro de 1975.
Com efeito, o reclamante nascera no Lubango, Angola, e era filho de pais naturais de Angola e neto paterno de um natural de Lisboa.
Acresce que ele não tinha feito a declaração prevista na parte final do n.° 2 do citado artigo (declaração obrigatoriamente sujeita a registo na Conservatória dos Registos Centrais, conforme estabelece o n.° 1 do artigo 6.° do referido diploma), pelo que conserva a nacionalidade portuguesa.
E a conservação da nacionalidade portuguesa, nos termos do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 308-A/75, «foi automática, uma vez que decorreu imediatamente da lei, sem necessidade de qualquer manifestação de vontade dos interessados», como reconhece a Procuradoria-Geral da República no parecer n.° 27/76, livro n.° 61, publicado no Diário da República, 2.a série, de 17 de Fevereiro de 1977.
Mas, admitindo que o interessado tivesse perdido a nacionalidade portuguesa, o seu pedido de concessão de asilo político teria de aguardar a publicaçio da lei prevista no artigo 22.°, n.° 2, da Constituição, situação que apenas permitia considerar o peticionário como candidato a asilo político.
Reputando-se correcta e legal a posição assumida pela Administração e tendo-se, do mesmo passo, por infundamentada a pretensão do reclamante — já que, sem dúvida, este conserva a nacionalidade portuguesa —, foi arquivado o presente processo.
DIREITO AO BOM NOME E REPUTAÇÃO Processo n.° 76/R-1211-B-1
Um ex-presidente da Comissão Administrativa da (Freguesia de Ribeiros, no concelho de Fafe, considerou que eram inverídicas várias acusações que elementos desse organismo afectos a partido diferente do seu contra ele começaram a apresentar. Pediu, por isso, ao então presidente da Comissão Adminis-
Página 2042
1076-(66)
II SÉRIE — NÚMERO 47
trativa do Concelho de Fafe, em inícios de 1975, um inquérito aos seus actos. Tal pedido não teve seguimento, mas o presidente da Comissão Administrativa do Concelho propôs a substituição dele por outro elemento, afecto ao seu partido, o que veio a suceder.
Tempos depois, os CTT comunicavam-lhe que ia ser transferido o posto público telefónico que em sua casa funcionava — isto a solicitação da ora Junta de freguesia de Ribeiros confirmada pela Câmara Municipal de Fafe e pelo governador civil de Braga (que era a mesma pessoa que, enquanto na presidência da Comissão Administrativa do Concelho de Fafe, propusera o seu afastamento). Alegaram-se para tanto diversas negligências e irregularidades na manutenção do Posto, que veio a ser atribuído a um família do então presidente da Junta de Freguesia.
Interpelados sobre o assunto, os CTT comunicaram que a sua decisão se fundamentara no pedido daquelas entidades. Visto que o queixoso discutia a existência das irregularidades que lhe imputavam, resolveu fazer um inquérito à população sobre o caso, e manter em casa daquele o posto público, durante um período de observação de seis meses.
Quer o inquérito realizado, quer o acompanhamento da situação no período de observação conduziram à conclusão de que eram infundadas as acusações feitas — pelo que o posto público continuou a cargo do reclamante.
Por outro lado, considerou-se indispensável a realização do inquérito pedido pelo queixoso à sua actuação na presidência da Comissão Administrativa da Freguesia, dado que algumas das acusações que foram feitas se reportavam a alegados actos de má aplicação dos dinheiros públicos, nomeadamente a propósito da realização de várias obras públicas.
O presidente da Câmara Municipal de Fafe, instado para o efeito, considerou — aliás acertadamente — que seria preferível que o mesmo fosse levado a cabo por entidade alheia à administração local da área.
Veio ele a ser realizado pelo adjunto do procurador da República no Círculo Judicial de Braga.
Nesse exaustivo, aprofundado e ponderado inquérito se concluiu que não se provava qualquer das irregularidades imputadas ao queixoso pelos outros ex-membros da Comissão Administrativa da Freguesia. Pelo contrário, verificou-se ter a sua actuação, nessas funções, sido em geral correcta e acertada.
Mais se considerou no respectivo relatório «muito provável» terem-se ficado a dever a razões de ordem politica quer as acusações a ele feitas, quer o seu afastamento da Comissão Administrativa, quer a posterior proposta de transferência do posto público telefónico.
No inquérito se colheram, contudo, indícios da possivel prática de crime de falsificação de acta da Comissão Administrativa e outro de falsificação de facturas, em que teriam intervindo, a confirmarem--se estes factos, o reclamante e os elementos que depois o vieram a acusar de mau aproveitamento do erário paroquial.
Enfim, foi apurado que, à data do inquérito, a Junta de Freguesia de Ribeiros actuava menos regularmente, não escriturando livro de receitas e despesas e deixando actas incompletamente assinadas.
Aliás, a localidade apresentava-se dividida entre duas facções politicas, não tendo sequer sido possível fazer funcionar a assembleia de freguesia.
Das conclusões do inquérito se deu conhecimento ao agente do Ministério Público no Tribunal da Comarca de Fafe, para consideração da eventual matéria criminal indiciada.'
A situação detectada na Junta de Freguesia de Ribeiros foi comunicada ao Ministério da Administração Interna, para que pudesse a esse respeito exercer a sua acção tutelar.
E deu-se conhecimento ao queixoso das conclusões do inquérito, que oportunamente pedira, para defesa do seu bom nome, mas que o então presidente da Comissão Administrativa do Concelho de Fafe não mandara organizar.
DIREITO À SAÚDE — SERVIÇO NACIONAL DE AMBULÂNCIAS
Processo n." 78/R-1234-B-1
Deu entrada neste Serviço uma reclamação em que se invocou a ineficácia do serviço «115» num caso em que um cidadão teria sido vítima da falta de pronta assistência.
Salientou-se na reclamação que a recusa do «115» em actuar foi fundamentada no facto de aquele serviço ser reservado para os casos de «rua».
Ouvido acerca do caso, o Serviço Nacional de Ambulâncias informou o seguinte:
a) As entidades que asseguram os primeiros so-
corros e o transporte de vitimas para o respectivo hospital de evacuação, quando se trata de ocorrências verificadas em locais públicos, e em certos casos no domicílio, são, em Lisboa, Porto, Coimbra e Setúbal, equipas da Polícia de Segurança Pública, e, nas restantes localidades do País, os bombeiros;
b) No domicilio, quando não se trata de situa-
ções de urgência resultantes de intoxicação, quedas ou agressões, o transporte de doentes para os hospitais é assegurado pelas entidades que dispõem de ambulâncias, na maioria dos casos, as corporações de bombeiros;
c) O transporte de doentes em si não é, na
nossa lei, objecto de legislação especial. Qualquer entidade pública ou privada pode ter como objecto o transporte de doentes. Tradicionalmente sâo, entre nós, as associações de bombeiros que mais se dedicam a esta actividade e isto, naturalmente, por força do imperativo legal que considera como um dos objectos da sua competência os serviços de saúde (Decreto n.° 38 439, de 27 de Setembro de 1951);
d) O Serviço Nacional de Ambulâncias não è
uma entidade transportadora de doentes, compete-lhe, sim, coordenar tais actividades (cf. Decretos-Leis n.os 511/71, de 22 de Novembro, 447/74, de 17 de Setembro, 79/75, de 22 de Fevereiro, e Decreto n.° 494-A/75, de 10 de Setembro). Dentro da sua competência e com o apoio e
Página 2043
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(67)
colaboração da Policia de Segurança Pública, Guarda Nacional Republicana e bombeiros, implantou um sistema a nível nacional de socorros de emergência pré--hospitalar cujo âmbito de actuação abrange, por enquanto, socorro a vítimas de acidentes na vila ou locais públicos e no domicilio só os casos de intoxicação, quedas e agressões. Mas se o Serviço Nacional de Ambulâncias é o responsável pela coordenação, já o não é pela execução dos serviços concretos que integram a prestação de socorros e transporte das vitimas que, como é óbvio, são da responsabilidade das entidades que os asseguram;
e) O «115», é um número nacional de emergência e por conseguinte, teoricamente, deve dar seguimento a todas as chamadas de socorro, seja qual for a sua natureza. A par, portanto, de todas as demais situações, o «115» responde também quando lhe é solicitado auxílio para assuntos que envolvem problemas de saúde.
Conforme o caso específico, o «115» desencadeia as acções conducentes a prestação dos cuidados que através dele são reclamados — pode accionar a saída de um car-ro-patrulha da polícia, de uma ambulância etc, etc. Neste último caso, saída de uma ambulância, o «115», e em face da situação que lhe é exposta, fará dirigir para o local onde se encontra a vítima, ou uma ambulância e respectiva equipa de primeiros socorros, integrada no esquema de emergência pré-hospitalar (caso de acidentes de via pública e locais públicos ou para o domicílio nas situações acima descritas) ou uma ambulância das entidades que têm a seu cago o transporte de doentes que são normalmente, como se disse já, os bombeiros.
No caso da reclamação foi feito novo pedido ao «115» de uma ambulância urgente para o domicílio.
Aquela central transferiu o pedido para a central do Batalhão de Sapadores Bombeiros.
Esta accionou a ambulância de uma corporação de bombeiros voluntários, que demorou a chegar a casa do doente cerca de quarenta minutos depois da chamada, prazo considerado pelos familiares da vítima como exagerado.
Perante os factos apurados, o Provedor entendeu que no caso concreto não houve, face às normas em vigor, conduta irregular ou inadequada das entidades públicas envolvidas.
Mas formulou aos Srs. Ministros da Defesa Nacional e dos Assuntos Sociais uma recomendação do seguinte teor:
Foi solicitado, em reclamação dirigida a este Serviço, que o Provedor de Justiça interviesse no sentido de serem tomadas providências para que passe a existir um sistema eficaz de transporte de doentes do domicílio para os hospitais em casos de emergência.
Tendo em vista a função do Serviço Nacional de Ambulâncias, que tem por objecto assegurar a orientação, coordenação e eficiência das actividades respeitantes à prestação dos primeiros socorros a sinistrados e doentes e ao respectivo transporte para os estabelecimentos hospitalares, ouviu-se sobre o assunto esse sector do Ministério da Defesa Nacional.
Da resposta volvida, concluiu-se que não existe um sistema nacional de socorros de emergência pré-hospitalar e transporte de doentes do domicílio para os hospitais em casos que não resultem de agressão, intoxicação ou queda.
Ora atentas as atribuições do Serviço Nacional de Ambulâncias, formulo a V. Ex.a a seguinte
Recomendação
Que o Ministério da Defesa Nacional, em articulação com o Ministério dos Assuntos Sociais, diligencie com urgência para que venha a ser posto em funcionamento um sistema nacional de primeiros socorros e transporte de doentes do domicílio para os estabelecimentos hospitalares, em todos os casos de emergência.
Em resposta, o Ministério dos Assuntos Sociais informou que o assunto exposto já estava em estudo na Secretaria de Estado da Saúde.
Por sua vez, o Sr. Ministro da Defesa Nacional enviou os seguintes esclarecimentos:
O problema em causa já constitui objecto de um plano cujo estudo se acha em curso.
No momento actual, os casos de transporte para os hospitais de vítimas de acidentes ou doenças domiciliárias, estão todos assegurados, os primeiros, através do esquema Serviço Nacional de Ambulâncias, e os segundos, através de corporações de bombeiros que podem ser accionadas pelo recurso ao «115», conforme determinado, embora deva reconhecer-se que, por razões técnicas, existe uma diferença de actuação no domicilio perante uma doença súbita, agravamento de situação mórbida pré-existente, e a seguida nas emergências ocorridas na via ou lugares públicos, ou, em caso de acidente, no domicílio.
Dado que não foi ainda possível conseguir a medicalização dos socorros de emergência, que só será efectivada desde que possa contar-se com a participação activa dos serviços hospitalares, tem evitado o Serviço Nacional de Ambulâncias tomar responsabilidade directa em acções domiciliárias que normalmente exigem intervenções médicas imediatas, o que não significa que o Serviço Nacional de Ambulâncias tenha descurado o problema, que considera neste momento como prioritário, como o provam os esforços feitos para a instalação, no Porto, de um serviço desta natureza — o SAMUR.
Resumindo, o assunto está a ser objecto de estudo entre o Serviço Nacional de Ambulâncias e a Secretaria de Estado da Saúde (caso do SAMUR, do Porto) e, em termos mais amplos, dele se ocupará a Comissão de Emergência Médica já criada para o efeito.
Página 2044
1076-(68)
II SÉRIE — NÚMERO 47
No entanto, enquanto se não conseguirem alcançar os objectivos em mente, vai tentar-se melhorar a assistência domiciliária de emergência até agora assegurada através das centrais «115» e das corporações de bombeiros, pela intensificação do ensino do socorrismo junto destas e pelo aumento da cobertura geográfica do sistema Serviço Nacional de Ambulâncias.
EMPRESAS INTERVENCIONADAS E AUTOGERIDAS — DESINTERVENÇÕES
Processo n.° 77/R-1698-A-3
Uma reclamação apresentada ao Serviço do Provedor de Justiça permitiu, de novo, que se voltasse a encarar, com preocupação, o problema das graves anomalias na publicação da legislação relativa à intervenção do Estado nas empresas, designadamente no tocante à prorrogação dos prazos-limite para a desintervenção.
A título de exemplo, anotou-se que o prazo fixado no n.° 7 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 907/76, de 31 de Dezembro, e que terminando em 15 de Fevereiro de 1977 foi prorrogado, após o seu termo, pelo Decreto-Lei n.° 116/77, de 30 de Março, por mais sessenta dias, e em 15 de Junho, após, de novo, ter expirado esse prazo, outro Decreto-Lei — o n.° 252/77 — prorrogou-o por mais sessenta dias.
Casos similares já se haviam verificado no respeitante às resoluções do Conselho de Ministros, através das quais se tinha operado a prorrogação da intervenção estatal das empresas.
Verificado foi também que tal condicionalismo — que se reputou de anormal — não era exclusivo da legislação sobre empresas intervencionadas porque também no que respeita às empresas autogeridas — cuja situação originara igualmente várias reclamações — se observaram as mesmas deficiências legislativas: assim, por exemplo, o prazo fixado no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 821/76, de 12 de Novembro, foi prorrogado em 17 de Março de 1977, através do Decreto-Lei n.° 98/77, por mais trinta dias, já depois de expirado, e o Decreto-Lei n.° 229/77, de 1 de Junho, procedera pela mesma forma originando uma prorrogação de mais seis meses.
Concluindo-se que situações deste tipo eram — ou são — susceptíveis de afectar o prestigio da democracia portuguesa, entendeu-se que, de futuro, deviam elas ser evitadas a todo o custo.
Daí a recomendação que se considerou necessário formular ao Sr. Primeiro-Ministro a respeito desta matéria.
EMPRESA_S_ PÚBLICAS — AUMENTO DE TARIFA DE CÃS — RETROACTIVIDADE DA RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS
Processo n.° 76/R-868-B-4
Um cidadão residente em Lisboa queixou-se de as Companhias Reunidas Gás e Electricidade haverem indevidamente aplicado as novas tarifas de gás estabelecidas pela Resolução do Conselho de Ministros de 30 de Junho de 1976 a consumos feitos antes da publicação desta.
Estudado o assunto, este Serviço auscultou a posição do Governo nos termos seguintes:
1 — Pela resolução do Conselho de Ministros de 30 de Junho de 1976, publicada no Diário da República, 1." série, de 6 de Julho de 1976, foi aumentado o preço de venda ao público do gás de cidade pelas Companhias Reunidas de Gás e Electricidade, sendo o novo preço «já aplicado ao gás contado na primeira leitura feita após a data da publicação da presente resolução no Diário da República» [alinea b) do n.° 9, 2.2, da mesma resolução].
2 — Aplica-se, assim, a nova tarifa a consumos anteriores à data da publicação da referida resolução, consumos esses que no momento da sua ocorrência deveriam ser pagos aos preços então em vigor.
3 — Sendo a resolução do Conselho de Ministros um acto administrativo, a sua aplicação retroactiva seria excepcional e apenas admissível se permitida por lei, o que parece não suceder no caso em apreço.
4 — Tem-se entendido que o «princípio da não retroactividade dos efeitos dos actos administrativos visa evitar que situações e actos anteriores sejam avaliados, não em função dos poderes e deveres jurídicos efectivamente existentes no momento em que tiveram lugar, mas em função de poderes e deveres jurídicos criados posteriormente e artificialmente reportados a um momento anterior».
Aquele principio, ditado por razões prementes de segurança jurídica, seria uma emanação do «princípio da não retroactividade da lei civil» (artigo 12.° do Código Civil).
5 — Parece, portanto, ilegal a parte da citada resolução que mandou aplicar a nova tarifa ao gás contado na primeira leitura efectuada após a data da publicação do acio administrativo no jornal oficial.
6 — Face ao que antecede, solicito a V. Ex.a que se digne informar sobre a posição do Governo acerca da opinião manifestada em 5 e que, na hipótese de com esta se concordar, transmita esclarecimentos acerca da viabilidade da compensação dos prejuízos sofridos pelos particulares.
Decorrido nuito tempo, apesar das numerosas insistências, por resposta veio a ser recebido da Secretaria de Estado da Energia e Indústrias de Base um ofício deste teor:
Com referência aos ofícios de V. Ex.a relativos à matéria em epígrafe, encarrega-me o Sr. Secretário de Estado da Energia e Indústrias de Base de comunicar que foi dada concordância à doutrina expendida por essa Provedoria quanto à fórmula usada nas disposições citadas da referida resolução.
Mais me encarrega o Sr. Secretário de Estado de informar que na Resolução n.° 46/78, de 29 de Março de 1978 (Diário da República, n.° 73) já foram tomadas medidas pertinentes aos aumentos tarifários de gás da cidade que evitam a sua aplicação retroactiva.
Página 2045
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(69)
Quanto aos prejuízos eventualmente sofridos pelos consumidores em resultado das aplicações das anteriores resoluções do Conselho de Ministros, na impossibilidade prática de poderem ser ressarcidos genericamente em face do seu elevado número, os mesmos terão de ser invocados casuisticamente perante a empresa pública Electricidade de Portugal — EDP, única forma que parece possível no momento.
Nesta conformidade, vai esta Secretaria de Estado diligenciar, nesta data, junto daquela empresa, no sentido de atender às reclamações dos consumidores, devidamente justificadas, que lhe foram presentes.
Este Serviço, levando em consideração que uma questão apresentada ao Provedor em relação à aplicação retroactiva, por portarias, de novas tarifas de electricidade foi resolvida mediante o despacho normativo de 30 de Setembro de 1977 do Sr. Secretário de Estado da Energia e Minas, publicado no Diário da República, 1." série, n.° 241, de 18 de Outubro de 1977, perguntou à Secretaria de Estado da Energia e Indústrias de Base se não admitia a hipótese de vir a utilizar o mesmo meio de solução para o caso presente, solicitando que, na negativa, fossem esclarecidos os motivos de tal posição.
A referida Secretaria de Estado respondeu por esta forma:
O problema resultante do aumento das tarifas de gás da cidade não pode ser encarado da mesma forma que foi relativamente ao aumento das tarifas eléctricas estabelecido pela Portaria n.° 31-A/77. Neste último caso, o Despacho Normativo do Sr. Secretário de Estado da Energia e Minas foi proferido ao abrigo do artigo 9.° do Sistema Tarifário do sector eléctrico anexo à portaria acima citada, que se transcreve:
As dúvidas que se suscitarem na execução deste diploma serão resolvidas por despacho do Secretário de Estado da Energia e Minas.
Ora uma disposição deste tipo não foi prevista na resolução do Conselho de Ministros de 30 de Junho de 1976, pelo que a redacção do n.° 9, 2.2, alínea b), só poderia ser objecto de interpretação ou alteração por parte do Conselho de Ministros.
Acresce que, conforme informou a EDP, os registos informáticos que permitissem eventuais correcções já não existem, o que não obstou a que esta Secretaria tenha recomendado à EDP que fossem atendidas as reclamações presentes pelos consumidores quando justificadas, conforme oficio n.° 2040, de 15 de Abril, de que juntamos cópia.
Tenha-se em atenção que, conforme a resolução ae Conselho de Ministros n.° 46/78, de 29 de Março (Diário da República, n.° 73), já foram consideradas as medidas necessárias a evitar uma aplicação retroactiva das tarifas de gás da cidade.
Considerando adequada a conduta da Administração e satisfeita, por via desta, a pretensão do recla-
mante e os interesses dos consumidores em geral, o Provedor mandou arquivar o processo deste Serviço.
Mas providenciou para que na imprensa nacional fosse publicado o seguinte aviso:
Dada a concordância da Secretaria de Estado da Energia e Indústrias de Base com a recomendação que oportunamente lhe foi feita pelo Provedor de Justiça, informa-se o público em geral de que podem ser apresentadas reclamações, devidamente justificadas, na empresa pública Electricidade de Portugal — EDP, pelos consumidores de gás da cidade que tenham sido prejudicados pela aplicação de novas tarifas fixadas na Resolução do Conselho de Ministros, de 30 de Junho de 1976, publicada no Diário da República, 1.» série, n.° 156, de 6 de Julho, a consumos anteriores a esta última data.
ENSINO — ENSINO SECUNDÁRIO — EXAMES Processo n.° 77/R-1693-B-1
O pai de um aluno do curso complementar do Liceu de Rodrigues de Freitas, no Porto, dirigiu-se ao Provedor por não concordar com a posição assumida pelo estabelecimento quanto à situação escolar do seu filho.
Com efeito, este concluirá o 1.° ano do curso complementar em Angola, tendo, ao ingressar no 2.° ano, no referido Liceu — e na impossibilidade de exibir a caderneta escolar — indicado sob compromisso de honra, nos termos de despachos regulamentares aplicáveis, as classificações obtidas em Angola. Apresentara, também, declarações do ex-reitor e da sua directora de ciclo do Liceu de Silva Porto confirmativas das classificações que alegava.
O Liceu de Rodrigues de Freitas, porém, não reconheceu valor às declarações em causa, considerando o aluno aprovado no 1.° ano do curso complementar com 10 valores. Em consequência, não o ter por dispensado do exame final do curso — dispensa a que teria direito se lhe houvesse sido tida em conta a média das classificações que declarara ter alcançado em Angola e das que obteve na frequência do 2.° ano do curso, no Liceu de Rodrigues de Freitas.
Ora, tendo o aluno efectuado tal exame, obteve classificações inferiores às que resultariam da conjugação das classificações de frequência dos 1.° e 2.° anos do curso.
O aluno conseguiu, já depois da realização do exame, exibir certidão, devidamente legalizada, das classificações que tivera em Angola. Mas o Liceu entendeu que elas já não podiam relevar, em face da regra legal, segundo a qual, se um aluno dispensado de exame resolve mesmo assim realizá-lo, valem as classificações nessa prova obtidas, mesmo inferiores às da média de frequência.
Esta doutrina prejudicaria o aluno, designadamente em termos de graduçâo para o acesso ao ensino superior.
Analisado todo o processo, entretanto pedido ao Liceu, e sopesada a argumentação dessa escola, entendeu-se não merecer ela acolhimento.
Página 2046
1076-(70)
II SÉRIE — NÚMERO 47
De facto, concluiu-se que a regra em que o Liceu se fundamentava pressupõe que o aluno haja tido a possibilidade de optar entre a realização ou não do exame.
Mas já não deverá aplicar-se sempre que — como no caso presente — o aluno afinal se encontre em situação de não poder deixar de submeter-se ao exame.
Isto se ponderou ao Liceu e, concomitantemente, dada a urgência do assunto, à Secretaria de Estado do Ensino Básico e Secundário.
A escola manteve a sua posição, respondendo que qualquer decisão do caso agora a transcenderia.
A Secretaria de Estado, porém, concordou com a interpretação defendida pelo Provedor, pelo que considerou relevantes as classificações obtidas em Angola e mandou proceder à rectificação da média de curso atribuída ao interessado.
ENSINO — ENSINO SECUNDÁRIO — FALTAS
Processo n." 78/R-1611-B-1
O encarregado de educação de um aluno que frequentou no ano lectivo de 1977-1978 o 8.° ano de escolaridade do Liceu da Rainha D. Leonor, em Lisboa, enviou a este Serviço uma exposição relatando as condições em que, por duvidoso excesso de faltas na disciplina de Educação Visual, o Liceu teria considerado que o referido aluno havia perdido o ano.
O reclamante dirigira já à Direcção-Geral do Ensino Secundário, sem resposta, uma exposição acerca do caso.
Ouvida sobre este, aquela Direcção-Geral informou que deviam ser marcadas ao filho do reclamante cinco faltas na disciplina de Educação Visual, não atingindo portanto o limite previsto no ponto 5.11 da circular L/T/ES/28/78, de 6 de Junho (seis faltas).
Embora se tivesse considerado que era conveniente que as duas aulas semanais de Educação Visual fossem dadas em tempos consecutivos, não se entende que essas aulas constituam uma sessão de cento e dez minutos.
Tratava-se de duas aulas de cinquenta e cinco minutos, e não de uma sessão de cento e dez minutos.
Assim, o filho do reclamante não reprovava com cinco faltas dadas, dado que o limite autorizado era de seis.
Se se reputassem existentes sessões de cento e dez minutos, estaria certa a reprovação por faltas (já que o máximo destas, para aquelas sessões, era de três).
A posição da Direcção-Geral do Ensino Secundário, coincidente com a do Serviço do Provedor de Justiça, foi contestada pelo Liceu da Rainha D. Leonor.
Mas o Sr. Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário manteve a decisão da Direcção-Geral, determinando também que fossem superiormente expostos e apreciados os casos de outros alunos do mesmo Liceu em situações análogas.
Tendo sido satisfeita a pretensão do reclamante, foi arquivado o respectivo processo.
Processo n.° 78/R-1910-B-1
O pai de um aluno da Escola Técnica de Gama Barros, no Cacém, disse ter sido surpreendido por aquele haver sido reprovado, no ano lectivo de 1977-1978, por haver excedido o limite legal máximo de faltas na disciplina de Português do 7.° ano unificado — isto, sem que a ele, encarregado de educação, houvesse sido previamente feita qualquer comunicação do facto de o filho ter ultrapassado metade daquele número de faitas.
Tendo' reclamado para a Direcção-Geral do Ensino Secundário, esta respondera que o mapa de faltas havia sido mandado afixar pela directora de turma e que há um dia por esta semanalmente destinado a receber os encarregados de educação que o pretendam. E acrescentava ainda que o aluno de qualquer modo teria sido reprovado por falta de aproveitamento, além de que a ausência de comunicação das faltas ao reclamante não obstaria à sua marcação e consequente perda de ano.
Analisada a questão, chegou-se à conclusão de que o Despacho n.° 58/78 do Secretário de Estado da Orientação Pedagógica (Diário da República, 2.a série, de 23 de Maio de 1978) prevê, no seu n.° 3.1, que sempre que os alunos do ensino secundário menores de 18 anos atinjam número de faltas igual a metade do número máximo possível, deve o encarregado de educação ser convocado pelo director de turma para tomar conhecimento da situação e procurarem, em conjunto, uma solução para ela.
A omissão desta actuação, por parte da Escola, não impede, contudo, a subsequente marcação de novas faltas e a aplicação da consequência da perda do ano, se elas excederam o limite estabelecido.
Disto se informou o queixoso.
Mas entendeu-se dever fazer repare à Escola Técnica de Gama Barros pelo facto de não ter cumprido a norma citada, recomendando-se-lhe que, para o futuro, não deixasse de sempre a respeitar.
ENSINO — ENSINO SUPERIOR — DIPLOMA — CLASSIFICAÇÃO FINAL
Processo n.° 76/R-1465-A-2
Por um licenciado em Economia pela Faculdade de Economia do Porto e que havia concluído o seu curso em Julho de 1975, foi apresentada ao Serviço do Provedor de Justiça uma exposição onde fundamentalmente apontava o seguinte:
Por decisão ministerial, a partir do ano lectivo de 1974-1975 todas as certidões de licenciatura não poderiam indicar a média final do curso mas apenas as cadeiras do curso e respectivas classificações.
No corrente ano (1976, por reporte ao caso concreto) concorrera o reclamante a estágio pedagógico para o ensino técnico, tendo aparecido na lista com a classificação final (de curso) de 10 valores.
Veio depois a ser informado que tal critério não foi utilizado para todos os concorrentes, pois que pelo n enos uma outra concorrente apareceu na lista graduada com a classificação de ¡3,1 valores, sendo certo que tal con-
Página 2047
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(71)
corrente terminara o seu curso no mesmo ano que o reclamante. Apontava finalmente que a Faculdade de Economia se recusou a passar-lhe certidão com a média final do curso, tendo-o remetido para a Secretaria-Geral, quando relativamente a outras pessoas não havia adoptado critério semelhante.
Ouvido o Conselho de Gestão da Faculdade de Economia da Universidade do Porto, informou este:
Nos termos do n.° 5 da Resolução do Conselho de Ministros de 9 de Agosto de 1975 as certidões de licenciatura deveriam conter obrigatoriamente a indicação das classificações obtidas pelos diplomados em todas as disciplinas, devendo indicar a classificação final do curso apenas nos casos em que os alunos tivessem sido classificados em todas as disciplinas dentro da escala numérica de 0 a 20 valores, o que não era o caso do requerente.
A pedido de vários alunos e por se saber que ex-licenciados pela faculdade de Economia estavam a ser prejudicados, começou-se, a partir de Outubro de 1976, a passar declarações da forma como eram determinadas pela escola as classificações finais nos termos do n.° 4 da referida resolução do Conselho de Ministros, declarações essas, contudo, que não tinham o carácter de certidões.
Dai a passagem de declaração desse tipo à pessoa referida pelo reclamante, ao qual não foi passada declaração idêntica por este não a haver requerido.
Finalmente aduziu não ter passado qualquer certidão de classificação final, visto que a respectiva competência è da Secretaria-Geral da Universidade, não sendo do seu conhecimento se o Serviço de Colocações do MEIC aceitava ou não as declarações antes aludidas.
Apesar das explicações contidas nesta informação, considerou-se que a actuação da Faculdade de Economia do Porto não era isenta de críticas.
Na verdade, a aludida resolução do Conselho de Ministros era clara em determinar que, havendo alguma nota de apto não convertível na escala de 0 a 20, as escolas não poderiam passar certidão de diploma.
Ora aquela Faculdade, embora afirmasse respeitar o espírito da resolução, passou com efeito documentos em que indica uma nota final, sem consideração daqueles «aptos».
Na verdade, seria óbvio que tais documentos iriam ser utilizados em concursos, dando origem a eventuais situações de injustiça.
Em tais termos entendeu-se formular a correspondente censura ao Conselho de Gestão da Faculdade em causa por, ao passarem-se a alguns diplomados declarações do tipo apontado e em que se referiam as classificações numéricas que teriam, independentemente das cadeiras em que não era possível a conversão de notas de «apto», não ter obedecido nem à determinação nem ao espírito da citada resolução do Conselho de Ministros, com a agravante de, por
essa forma, se terem originado situações de desigualdade, nomeadamente em concursos para docentes e outras formas de recrutamento de trabalhadores da função pública, cuja sanção se tornou depois inviável.
ENSINO — LIBERDADE DE ENSINO — ENSINO PARTICULAR
Processo n.° 77/R-917-B-1
Dois co-proprietários (um deles também professor e o outro director pedagógico) de uma escola particular não se conformaram com a tramitação utilizada num processo disciplinar que lhes fora instaurado pelo Ministério da Educação e Investigação Científica, através da Inspecção-Geral do Ensino Particular, bem como com as punições que lhes haviam sido aplicadas, acrescidas da proibição de no estabelecimento, sujeito ao regime de paralelismo pedagógico, se efectuarem no ano de 1977 exames finais dos respectivos alunos.
Os arguidos eram acusados, respectivamente, o primeiro de ter praticado, e o segundo de ter autorizado castigos corporais e o fornecimento de alimentação em mau estado aos alunos.
Analisado o processo, constatou-se que ele padecia, com efeito, das seguintes deficiências:
1 — A nota de culpa não indica as normas que
foram violadas pelas faltas de que os arguidos são acusados, não tendo assim sido dada execução ao disposto no artigo 48.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis, aplicável ao caso por força do artigo 32.°, n.° 7, do Estatuto do Ensino Particular;
2 — O mesmo se verifica nas conclusões do
relatório do instrutor (artigo 55.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado;
3 — O processo não contém as declarações
das testemunhas de acusação. Por outro lado, também se não pode entender que o processo de inquérito constitui a fase acusatória do processo disciplinar, porquanto o instrutor não deduziu a acusação no prazo de cinco dias, conforme o impõe, para tal efeito, o § 3.° do artigo 63.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado;
4 — O despacho final proferido no processo,
divergindo da proposta do instrutor, não se encontra fundamentado (artigo 56.°, § 1.°, do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, contrariando, assim, jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo);
5 — A recusa da consulta do processo pelo ad-
vogado dos arguidos viola os artigos 29.° e 52.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado;
6 — Não se encontrou justificação para a proi-
bição decretada, quanto aos exames, misturando, assim, sem fundamento, sanções de ordem pedagógica com outras estranhas a tal matéria.
Página 2048
1076-(72)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Em consequência, e tendo sobretudo em conta que o exposto em 5 constitui diminuição das garantias de defesa dos arguidos e poderia conduzir à anulação da decisão proferida no processo, recomendou-se ao Secretário de Estado da Orientação Pedagógica que promovesse a revisão do processo, expur-gando-o das irregularidades detectadas.
A Inspecção-Geral informou, tempos depois, que, operada a revisão do processo, o agora Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário decidira manter as penas aplicadas.
Dada a insuficiência desta comunicação, voltou a proceder-se à consulta do processo, ora reformulado.
Verificou-se que os arguidos se haviam desinteressado do processo, nem sequer havendo respondido à nota de culpa que, remodelada, lhes fora de novo remetida.
Por isso se arquivou o caso — não sem que se tivesse chamado a atenção da Inspecção-Geral, com vista à elaboração de processos futuros, de que tão--pouco a nova nota de culpa respeitava ainda as exigências legais no tocante à especificação dos factos dela constantes (discriminação das respectivas datas, das pessoas ofendidas e das demais circunstâncias identificadoras).
EXPROPRIAÇÕES Processo n.° 76/R-282-B-4
A Associação de Moradores da Zona da Póvoa, no Porto, expôs ao Provedor uma situação que prejudicava as condições de habitação da generalidade da população residente na área.
Por um lado, apesar de já estar declarada a utilidade pública urgente da expropriação de terrenos destinados à construção de casas para os moradores de zona, bem como autorizada a respectiva posse administrativa, a Câmara Municipal do Porto não praticara os actos necessários para efectivar esta última.
Por outro lado, não teria sido feita pela Câmara a competente comunicação à Secretaria de Estado da Habitação e Urbanismo, para efeitos de declaração de zona degradada.
Enfim, existiriam na zona da Póvoa instalações de três empresas que laboravam com produtos tóxicos. Apesar de uma delas ter já sido mandada, por despacho do presidente da Câmara, deslocar tais instalações para zona da cidade reservada para o efeito, não só tal injunção não teria sido cumprida, como ainda essa e outra das referidas empresas haveriam, entretanto, efectuado novas obras nas instalações em causa. \
Tendo-se detectado certa falta de coordenação entre as várias entidades competentes para a apreciação da situação, procedeu-se j a um exaustivo estudo da mesma, através da audição da Câmara Municipal, da Direcção de Saúde do Porto e da Secretaria de Estado da Habitação, Urbanismo e Construção, bem como da análise dos processos pendentes nestes organismos sobre o caso.
Verificou-se que a posse administrativa dos terrenos se não efectivara por atraso na declaração de
zona degradada. Como, porém, esta veio, entretanto, a ter lugar, o processo de expropriação retomara o seu curso — muito embora sujeito a remodelações a que as entidades competentes consideraram ter de sujeitar o plano de construção inicial.
A deslocação das instalações tóxicas não tivera ainda lugar por dificuldade na escolha do terreno adequado para o efeito. Tendo-se, posteriormente, demarcado zona própria para tanto, começou a promover-se a referida operação. Entretanto, a Comissão Municipal de Higiene pronunciou-se no sentido de a manutenção de uma das outras instalações ser prejudicial para a saúde dos habitantes, pelo que a proibiu de continuar a armazenar certas matérias tóxicas e de efectuar quaisquer trasvasamentos de produtos poluentes. E tanto a Câmara como a Direcção de Saúde do Porto passaram a assegurar a fiscalização da legalidade de laboração das duas empresas cujas instalações permanecem na zona.
Confirmadas, aliás, pela Câmara Municipal, em vistoria que ordenou, as obras irregulares denunciadas, mandou a edilidade organizar os respectivos processos de demolição.
Verificando-se estarem agora as várias entidades públicas interessadas a acompanhar devidamente os vários aspectos da situação que constituirá objecto da queixa, procedeu-se ao arquivamento desta.
Processo n.° 76/R-1074-B-4
O presente processo teve origem numa exposição apresentada por um herdeiro de uma senhora que, em vida, havia outorgado num contrato de promessa de venda com pagamento integral com a Hidro--Eléctrica do Douro relativamente a uma sua casa de habitação que mais tarde ficou submersa pelas águas da Barragerp do Carrapatelo.
Compulsados os elementos fornecidos tardiamente pelo reclamante veio a apurar-se que o preço recebido pela mãe do reclamante fora no valor de 33 000$, que aquela era uma senhora de 88 anos de idade e era à altura portadora de várias doenças (icto cerebral, surdez quase completa, com total impossibilidade de locomoção), surgindo ainda a intervir na celebração do negócio, a rogo da referida senhora, um indivíduo ao tempo trabalhador da empresa outorgante.
Mais se pôde apurar que o valor atribuído à casa de habitação era, além de insignificante, manifestamente inferior ao valor com que tinham sido indemnizados outros proprietários, ou mesmo simples inquilinos.
Concluiu-se, assim, ser perfeitamente estranho o circunstancialismo que rodeou o referido negócio jurídico, havendo sérios indícios de a declaração de vontade da referida outorgante ter sido despida de qualquer consciência negocial, o que levaria a possível declaração de nulidade do mesmo negócio.
Ouvida a empresa Electricidade de Portugal — EDP, empresa pública que aglutinou a empresa outorgante, pronunciou-se a mesma, numa primeira fase, no sentido de não poder tomat outra posição que não fosse aquela que decorresse da decisão judicial, dado o litígio estar a correr seus termos pela via judicial.
Página 2049
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(73)
Atendendo, porém, ao grau de injustiça de que se rodeava o presente caso, encetou o Provedor de Justiça demoradas diligências junto de ambas as partes, conseguindo obter total colaboração do órgão de gestão da EDP para um acordo, o qual se traduziu em aquisição de um prédio urbano com boas condições de habitabilidade, pertença da EDP, e que o reclamante recebeu, deduzido que foi o montante já arrecadado por sua mãe e compensando o reclamante a EDP no valor que presumivelmente excedia o da casa ao tempo em que esta fora submersa.
Processo n.° 78/R-230-B-4
Um habitante do lugar de Cercal, freguesia de Gesteira, concelho de Soure, protestou contra a escolha de terreno para a implantação da nova escola da povoação, pois se propunham expropriar-lhe uma parte da sua propriedade que iria afectar a sua exploração agrícola e havia, para o efeito em causa, terrenos melhores do que o seu e que permitiam respeitar a norma que impunha a existência de doze metros disponíveis entre a escola e quaisquer construções existentes.
Auscultadas as posições da Câmara Municipal de Soure e da Direcção-Geral das Construções Escolares acerca do caso, verificou-se que não havia qualquer irregularidade na escolha do local para a escola.
Tratando-se de uma localidade consideravelmente acidentada, onde se tornava extremamente difícil encontrar terrenos com as características apropriadas e exigidas para a construção do edifício e para as actividades gimnodesportivas dos alunos, não era viável resolver o problema por esta forma satisfatoriamente.
Por outro lado, não há qualquer norma legal que impeça a construção de escolas a menos de 12 metros de edificações já existentes.
O Decreto-Lei n.° 37 575, de 8 de Outubro de 1949, veio apenas proibir o futuro levantamento de construções «cuja distância a um edifício escolar previsto, em execução, ou já construído, ou a qualquer das suas dependências urbanas ou rurais seja inferior a uma vez e meia a altura da referida construção, com um mínimo de 12 m».
As entidades públicas mantinham a sua posição quanto à inserção da escola e propunham iniciar a pertinente expropriação por utilidade pública.
Não havendo conduta inadequada da Administração, o processo deste Serviço foi arquivado.
Processo n.» 78/R-220-B-4
Em 1958, foram expropriadas várias casas situadas junto das muralhas de Trancoso, com vista a preservar o valor histórico que estas representavam.
Um dos ex-proprietários dirigiu-se ao Provedor, referindo que, sem explicação, se suspendera o processo de protecção das muralhas de Trancoso, tendo ficado por expropriar várias casas, situadas a sul, cujos proprietários continuariam fazendo nelas obras não legalmente autorizadas. Acrescentava que, se a Administração não estava interessada na prossecução do empreendimento, pretendia que se operasse a reversão do prédio que fora seu.
Perguntou-se à Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais qual o estado das providências relativas à protecção do monumento nacional em questão, bem como a razão por que se haviam suspendido as expropriações. A Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais referiu que o plano de protecção da muralha se mantinha, mas que as expropriações não haviam prosseguido por as verbas para tanto necessárias terem tido de ser aplicadas em obras mais urgentes. Estava, porém, prevista a sua continuação.
Ouvida, por seu turno, a Direcção-Geral do Património Cultural sobre as alegadas obras ilegais, esta respondeu que nem ela, nem' a Câmara Municipal de Trancoso, após averiguações levadas a cabo, detectaram qualquer violação ao disposto na legislação aplicável — artigo 33.° do Décreto-Lei n.° 20 985, de 7 de Março de 1932.
Face ao exposto, arquivou-se a queixa, informan-do-se da situação o reclamante. Comunicou-se-lhe, nomeadamente, que, dado persistir o objectivo de protecção do monumento nacional, não podia ter lugar a reversão que desejava, e que, se viesse a ter conhecimento de quaisquer obras indevidas em prédios da zona de protecção, cumpriria participar o facto ao competente agente do Ministério Público.
Processo n.° 77/R-1526-B-4
Um grupo de proprietários de terrenos a expropriar para construção de auto-estradas, nos troços Carvalhos-Lourosa e Lourosa-Vila da Feira, insurgiu-se por a Brisa — Auto-Estradas de Portugal, S. A. R. L., estar, em seu entender, a propor-lhes valores irrisórios, para indemnizar a perda daqueles prédios. Protestaram, ainda, por as propostas daquela empresa lhes serem feitas muitas vezes telefonicamente, sem, portanto, a necessária garantia de firmeza e não levarem em conta diversos elementos dos imóveis ou neles integrados que forçosamente deveriam contemplar.
Da análise do processo pedido à Brisa, relativo à tramitação geral das expropriações em causa, não resultou a detecção de qualquer ilegalidade.
Tão-pouco se colheram elementos suficientes para permitir um juízo seguro sobre se os valores das indemnizações propostas eram ou não adequadas.
Portanto, aconselharam-se os reclamantes, se se mantivesse a sua discordância, a recorrer, sob este aspecto, à arbitragem, e, depois, se necessário, à via judicial.
Sugeriu-se à Brisa, não obstante, que passasse a reduzir a escrito as propostas de expropriação amigável, devendo delas constar, devidamente discriminadas (exigência que a análise do processo revelou nem sempre ser adequadamente satisfeita), os vários factores a levar em conta para a fixação das indemnizações.
Ponderou-se que, embora a lei não imponha tal comunicação escrita, também não a proíbe, e que esse procedimento será susceptível de evitar os mal--entendidos a reclamações verificadas.
Esclareceu-se, enfim, que nessas propostas deveria ficar bem expresso não serem elas vinculativas, mas constituírem apenas base de negociação.
Página 2050
1076-(74)
II SÉRIE - NÚMERO 47
HABITAÇÃO — CASAS DE PATRIMÓNIO MUNICIPAL — CONCURSO PARA ATRIBUIÇÃO
Processo n.° 78/R-216S-B-4
Uma cidadã queixou-se contra o presidente da Câmara Municipal do seu concelho por este haver vendido à companheira do seu marido, do qual se achava separada hà mais de vinte anos, a casa em que este vivera até falecer e que a ele estivera arrendada por longos anos.
Aquela venda contrariaria a deliberação camarária anterior que, relativamente às casas de certo bairro, estabelecera o princípio de que as casas deviam ser vendidas «aos reais e efectivos moradores».
Estudado o caso, conclui-se que a conduta da autarquia, ao outorgar a venda em causa, foi legalmente correcta, e foi até a mais justa.
Na verdade, a deliberação invocada pela reclamante previa como compradores os efectivos moradores e não os titulares do direito ao arrendamento.
Ora, sendo o adquirente a companheira do inquilino e, portanto, uma pessoa que há longo tempo residia no fogo alienado, não houve errada execução da deliberação que fixara as condições de cedência das casas do bairro.
Por outro lado, a venda impugnada pela reclamante salvaguardou o direito à habitação da pessoa que estava a fruir a casa e prosseguiu o fim social que presidiu à mencionada deliberação camarária.
O processo deste Serviço foi, portanto, arquivado.
HABITAÇÃO — ELEVADOR Processo n.° 77/R-1104-B-4
Um cidadão residente em Lisboa pediu a intervenção do Provedor de Justiça por se acharem avariados (simultânea e alternadamente), há cerca de dois anos, os dois elevadores do prédio que habita como arrendatário e que é propriedade da Caixa Nacional de Pensões.
O prédio em causa tem sete andares e as deficiências dos elevadores estavam a causar diversos incómodos e prejuízos.
Na altura da queixa os elevadores estavam parados há já quarenta dias ininterruptos.
Colocado o problema à Caixa Nacional de Pensões, esta veio informar, passado algum tempo, que já estavam em execução os trabalhos de reparação e renovação dos elevadores, procedendo-se às obras por forma a que se conservasse sempre um dos ascensores em funcionamento.
HABITAÇÃO — CONTRATO-PROMESSA — INCUMPRIMENTO
Processo n.» 78/R-477-B-4
Queixou-se ao Provedor um indivíduo que celebrara contrato-promessa de compra e venda com a TAU — Propriedades e Empreendimentos Turísticos, L.da, tendo pago integralmente o correspondente ao respectivo preço. Ora a empresa, entretanto intervencionada, não tomava a iniciativa de celebrar a escritura de venda, deixou de pagar ao queixoso a renda da casa, que, segundo acordado, fora dada de
arrendamento, e até nem lhe proporcionava a. sua utilização no período de férias, conforme convencionado.
Ouvida a comissão administrativa da TAU, esta referiu que, estando em situação de falência técnica, não podia cumprir os compromissos a que se obrigara. Os contratos-promessa haviam sido celebrados em nome da empresa pela anterior sócia gerente, mas esta é que surgia como proprietária das casas registadas em seu nome.
Perante a resposta da comissão administrativa da empresa intervencionada, entendeu-se não caber qualquer interferência no caso.
Tempos depois, todavia, o queixoso voltou a dirigir-se ao Provedor, informando que recebera oficio da TAU a indicar-lhe que a casa que prometera comprar iria ser entregue à sócia gerente, por efeito de decisão judicial que decretava a cessação do arrolamento dos seus bens, devendo ele por isso passar a contactá-la para prosseguimento do seu assunto.
Perante esta situação, o Provedor dirigiu-se ao Ministro do Comércio e Turismo, chamando a atenção para que, tendo os contratos-promessa deste tipo sido celebrados pela sócia gerente em nome da TAU, era a esta que cabia dar-lhes cumprimento. Por outro lado, deveria ele diligenciar para que a sócia gerente transferisse para a sua titularidade os bens em questão, por forma a poderem-se executar as promessas.
Ó Ministério respondeu que a situação actual resultava do facto de, ao contrário do que a comissão administrativa das empresas de turismo do Algarve afirmava, não haver sido intentada acção judicial contra a sócia gerente da TAU, razão pela qual acabou por caducar a providência cautelar de arrolamento dos seus bens.
Informou, todavia, que se estava agora a tentar conseguir uma solução conciliatória entre todas as partes interessadas.
Em face desta indicação, arquivou-se o processo (por se crer poder ser uma intervenção mais drástica desvantajosa para a tentativa de conciliação), sem prejuízo de futura reabertura, se esta se vier a justificar.
HABITAÇÃO — DESPEJO — DEMOLIÇÃO Processo n.° 78/R-402-B-4
Em Março de 1978, apresentaram-se no Serviço do Provedor de Justiça alguns habitantes de casas clandestinas erigidas em Camarate (pelo menos um deles eram também proprietário ainda de outra casa nas mesmas condições), num local em que, em virtude de infiltrações de chuvas, a rua abatera numa extensão de cerca de 40 m.
Referiram que, inicialmente, a Câmara Municipal de Loures projectara construir uma muralha para defender as casas próximas, em risco de abatimento, e nas quais habitavam cerca de trezentas pessoas pertencentes a famílias de parcos recursos.
Como, porém, a obra orçasse em valor superior àquele de que a edilidade poderia dispor, ela teria decidido demolir as casas, alojando os seus habitantes em pavilhões pré-fabricados — atitude com que estes não concordariam pelos prejuízos que isso
Página 2051
3 he ABRIL DE 1979
1076-(75)
lhes causava, estando dispostos a colaborar na construção da muralha.
Como a questão era urgente, pois já se encontrava em curso a evacuação das habitações em causa, e tendo em conta a importância do caso, traduzido no número de pessoas nele envolvidas, o Provedor contactou logo, pessoalmente, o presidente da Câmara Municipal de Loures.
Este esclareceu que, de facto, a situação era grave, estando as casas em risco de abater como perigo iminente para a população. Por isso, os serviços da Câmara e parte da edilidade haviam, não sem esforço, conseguido convencer os seus ocupantes a evacuá-las, operação que se processou por vários dias. A construção da muralha seria, na altura, incomportável para a Câmara, mas a situação não admitia delongas, tendo várias casas de ser demolidas, por porem em perigo a segurança da zona. Acrescentou que a principal oposição se tinha dado, não propriamente à evacuação, mas sim à demolição das casas (todas clandestinas), e isto por parte dos seus senhorios, alguns deles também habitantes da área, que receberiam rendas que chegavam por vezes a atingir os 1200S mensais.
De novo contactada a Câmara, algum tempo depois, para indicação do estado da questão, esta informou que o problema habitacional tinha sido resolvido com o realojamento de vinte e quatro fogos no Bairro CAR — Camarate I e que o problema de estabilidade do local do sinistro estava a ser estudado pelos seus serviços e pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, tendo de facto sido necessário demolir várias construções em perigo de derrocada.
Apreciada toda a situação, teve-se por acertada e correcta a actuação da Câmara, aliás, legalmente apoiada nos artigos 10.°, § 1.°, e 165.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas. Registou-se, mesmo, com agrado, a celeridade com que o município conseguiu resolver, satisfatoriamente, o problema dos desalojados do temporal de Março de 1978.
HABITAÇÃO — DESPEJO — OCUPAÇÃO ILEGAL Processo n.° 76/R-1489-B-4
Um cidadão pediu providências ao Provedor de Justiça por, tendo caducado por morte do inquilino o arrendamento de um seu prédio urbano e tendo o reclamante autorizado a governanta do falecido arrendatário a permanecer algum tempo na casa locada, a junta de freguesia da área de situação desta haver celebrado, por delegação da câmara municipal do respectivo concelho e em substituição do proprietário, contrato de arrendamento com a referida governanta.
Foram exaustivamente averiguadas as circunstâncias de facto que levaram à questão suscitada.
Acerca desta foi depois elaborado neste Serviço o seguinte parecer:
1 — O fogo habitacional sito na Rua de Pedro Álvares Cabral, no Barreiro, pertencente ao reclamante, encontrava-se arrendado a pessoa que veio a falecer em 15 de Janeiro de 1976.
2 — O proprietário teria autorizado a governanta do inquilino a manter-se no fogo até 31 de Março.
3 — Porém, em 26 de Março do mesmo ano, a Junta de Freguesia do Barreiro, com base em competência que lhe havia sido delegada pela Câmara Municipal, por delegação deste órgão, de 15 de Julho de 1975 (ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.° 198-A/75, de 14 de Abril), celebrou com a dita governanta contrato de arrendamento, em substituição do proprietário.
4 — Com fundamento em falta imputável a este último de não declaração de cessação de contrato de arrendamento anterior, nos termos do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 445/74, de 11 de Setembro.
5 — A deliberação do órgão paroquial de celebrar contrato de arrendamento, a ter existido, não consta de acta.
Face ao exposto, cumpre-nos apreciar:
De acordo com a primeira parte da alinea e) do artigo 1051.° do Código Civil, o arrendamento caducou por morte do inquilino em 15 de Janeiro de 1976.
Não pomos em causa que o senhorio deveria ter dado a partir dessa data cumprimento ao disposto no artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 445/74, o que não fez.
Poderia, porém, a junta de freguesia, com base nesse incumprimento, substituir-se, como fez, ao proprietário na celebração de contrato de arrendamento?
Visa o Decreto-Lei n.° 198-A/75 conferir às câmaras municipais ou por delegação destas às juntas de freguesia competência para a prossecução de fins de fomento habitacional, não da modalidade de criação de novos fogos, mas na de efectiva utilização dos já existentes.
É assim que os órgãos autárquicos referenciados devem deliberar substituir-se aos proprietários de celebração de contratos de arrendamento, verificados que sejam os pressupostos previstos no diploma.
A deliberação da câmara municipal ou da junta de freguesia, com o conteúdo atrás referido, por praticada no exercício de poderes que visam a satisfação de interesses colectivos, constitui um acto de gestão pública que não pode deixar de ser considerado como administrativo. Acto com susceptibilidade de estar inquinado de invalidade.
Lê-se no n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n." 198-A/75, de 14 de Abril:
As ocupações de fogos devolutos levadas a efeito para fins habitacionais, antes, da entrada em vigor deste diploma, em prédios pertencentes a entidades públicas ou privadas, serão imediatamente legalizadas através da celebração de contrato de arrendamento.
Desde logo se nos afigura não ter havido ocupação do fogo por parte da governante com quem a Junta viria a celebrar contrato, uma vez que, como o próprio reclamante reconhece, ela estava autorizada a habitá-lo — acto de mera tolerância — até 31 de Março de 1976 e o contrato teve lugar em 26 do mesmo mês.
Página 2052
1076-(76)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Mas ainda que de ocupação se tratasse, o diploma somente atribui poderes para legalização de ocupações através de substituição do proprietário na outorga do negócio jurídico se aquelas se tivessem verificado até 14 de Abril de 1975, data da entrada em vigor do diploma, e até 25 de Janeiro de 1976 existiu na ordem jurídica um contrato de arrendamento, pelo que até esta data não se poderá, de modo algum, falar em ocupação.
Do exposto ressalta que o contrato de arrendamento em causa não podia ser celebrado.
A ter havido deliberação da Junta previamente à outorga no negócio jurídico bilateral, seria ilegal na modalidade de violação de lei ou incompetência.
De qualquer modo, não constando de acta, a deliberação, a ter ocorrido, seria nula ou inexistente, por falta absoluta de forma legal, dado que as deliberações dos corpos administrativos só podiam provar-se, em regra, em face das actas donde constassem — aplicação conjunta do artigo 355.° (hoje n.° 2 do artigo 106.° da Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro) e n.° 5 do artigo 363.°, ambos do Código Administrativo (Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 30 de Outubro de 1974, in Boletim do Ministério da Justiça, n.° 240, pp. 178 e seguintes; sentença do auditor administrativo do Porto de 17 de Janeiro de 1963, in Revista de Direito Administrativo, 8/237).
Há, porém, que proceder à distinção entre as deliberações de contratar — actos administrativos — e as manifestações de vontade da pessoa colectiva pública ao outorgar nos arrendamentos — simples declarações negociais respeitantes a contratos civis.
Entendemos que os contratos de arrendamento têm existência autónoma dos actos administrativos que executaram (a terem existido). Os vícios destes não têm qualquer repercussão na validade daqueles, sendo assim ineficaz em relação aos contratos de arrendamento uma eventual anulação contenciosa ou graciosa dos actos administrativos ou a declaração de nulidade dos mesmos.
Tais contratos só poderão ser atacados por vícios próprios perante os tribunais.
Com efeito, pertence a estes órgãos a competência para apreciar a validade dos contratos: tribunais do contencioso administrativo, se o contrato for qualificado como administrativo — alínea a) do § 1.° do artigo 815.° do Código Administrativo; tribunais comuns, se o contrato for civil — artigo 816.° do Código Administrativo e 66.° do Código de Processo Civil.
Se a administração viesse a anular ou declarar nulos por acto administrativo próprio contratos de arrendamento celebrados, estaria a usurpar a competência dos tribunais, pelo que tal acto seria nulo e de nenhum efeito, nos termos do n.° 1 do artigo 363.° do Código Administrativo — Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Fevereiro de 1972, in Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, 126, pp. 814 e seguintes, e Boletim do Ministério da Justiça, 217, p. 165 (só o sumário).
Analisemos os meios ao alcance do reclamante para reagir contra a situação que lhe foi criada pelo arrendamento outorgado pela junta de freguesia.
Consagrará o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 198-A/ 75 um caso de representação legal?
Lê-se no n.° 3 do artigo 1.°:
O contrato de arrendamento previsto no n.° I será obrigatoriamente celebrado pelo senhorio no prazo de trinta dias a contar da data da entrada em vigor do presente decreto-lei.
No n.° 4:
Se o senhorio não cumprir o que se dispõe no número precedente:
a) O contrato de arrendamento será imediatamente celebrado, em nome dele, pela respectiva câmara municipal ou, mediante delegação desta, pela junta de freguesia da localização do fogo.
E no n.° 5:
O disposto na alínea a) do número anterior será igualmente aplicável sempre que se verifique ausência do senhorio ou desconhecimento da sua identidade.
De acordo com Mota Pinto, «Notas sobre alguns temas da doutrina gera) do negócio jurídico», in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.° 55, pp. 1630 e seguintes: «A representação, tal como se infere do artigo 258.° do Código Civil, traduz-se na prática de um acto jurídico em nome de outrem, para na esfera jurídica desse outrem se produzirem os respectivos efeitos. Nada mais é necessário para existir a representação.»
Considerando dispensável, ao contrário de certa doutrina, que o acto seja praticado no interesse do representado, vem o autor a reconhecer que nos casos de representação legal previstos no Código Civil esta aparece sempre em benefício dos representantes.
Quanto a nós, isso não impede que o Decreto-Lei n.° 198-A/75 consagre um caso de representação legal que não tome em consideração o interesse do representado.
Admitindo que de representação legal se trata, a celebração pelos órgãos autárquicos de contratos de arrendamento, fora dos pressupostos fixados por lei, acarreta a ineficácia dos negócios jurídicos, face ao proprietário.
Com efeito, o acto realizado não cabe dentro do limite dos poderes conferidos ao representai e (artigo 258.° do Código Civil).
Assim, poderá ser interposta acção de reivindicação contra aqueles que para o proprietário não passariam de meros ocupantes do imóvel.
Uma outra via se abre ao reclamante, com fundamento em falta de legitimidade substantiva da junta de freguesia para celebração do contrato de arrendamento em causa.
Escreve Mota Pinto in ob. cit., a p. 75:
A capacidade é um modo de ser, ou qualidade do sujeito em si. A legitimidade supõe uma relação entre o sujeito e o conteúdo do acto e por isso é antes uma posição, um modo de ser para com os outros.
Em principio terão legitimidade para um certo negócio os sujeitos dos interesses cuja modelação é visada pelo negócio e haverá carência a legitimidade sempre que se pretenda derivar de um negócio efeitos que vinculam outras pessoas que não os intervenientes no negócio.
Página 2053
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(77)
Sobre esta figura lê-se nas Lições de Teoría Geral da Relação Jurídica, dadas ao 2.° jurídico de 1967--1968, pelo Dr. João de Castro Mendes, vol III, pp. 416 e seguintes:
O código Civil de 1867 não tratou desta figura. Mas focava um caso nítido de ilegitimidade: a venda de coisa alheia. Tal venda era nula; mas a nulidade, embora absoluta, excepcionalmente sanava-se pela aquisição posterior pelo vendedor do objecto vendido. O que já pode oferecer motivo de estranheza é que o Código Civil actual, de 1966, não trate a legitimidade ou ilegitimidade no capítulo referente ao negócio jurídico e que os limites gerais da figura sejam de buscar-se na secção n do capítulo referente ao contrato de compra e venda, «venda de bens alheios», artigos 892.° e seguintes. O regime hoje é mais elaborado que o que se extraía do Código de Seabra, mas assenta nas mesmas linhas gerais:
Nulidade absoluta da venda — artigo 892.° Convalidação do contrato por legitimação (aquisição de legitimidade) superveniente do vendedor (artigo 895.°), excepto nos casos do artigo 896.°
E mais adiante:
No regime da ilegitimidade no negócio jurídico é, pois, este: conduz á nulidade (absoluta) do negócio, mas esta nulidade resolve-se pela aquisição superveniente da legitimidade.
Pode, em nosso entender, o contrato de arrendamento vir a ser declarado nulo pelo tribunal comum por falta de legitimidade substantiva da junta de freguesia para nela outorgar.
As questões relacionadas com as rendas e efectivação de eventual direito a indemnização deverão ser tratadas por «via contenciosa».
Assim, verificando-se que os problemas do reclamante só por via judicial poderiam ser resolvidos, foi arquivado o presente processo.
HABITAÇÃO -r- OCUPAÇÃO DE PRÉDIO URBANO Processo n.° 76/R-245-B-1
Uma cidadã residente no distrito de Braga pediu a intervenção do Provedor de Justiça por a casa de que é proprietária haver sido ocupada em 23 de Maio de 1975, com todo o seu recheio, por meio de arrombamento, enquanto decorria a operação militar Maio-Nordeste.
Desde então a casa mantinha-se em regime de ocupação ilegal, tendo nela sido instalada em I de Novembro de 1978 uma escola preparatória.
Averiguado o caso, apurou-se que a casa da reclamante — um dos solares mais conhecidos de Trás--os-Montes — havia sido ocupada violentamente, com a concordância dos militares, durante a operação Maio-Nordeste.
O Provedor efectuou numerosas diligências para resolver o problema suscitado e, passado bastante tempo, conseguiu que o Governo decidisse arrendar o palácio em causa para nele manter em funcionamento a escola preparatória da localidade.
Esse arrendamento foi autorizado pela renda mensal de 12 000$, com efeitos a partir de 1 de Junho de 1975.
Estando satisfeita a pretensão da reclamante (e não cabendo ao Provedor intervir na fixação das cláusulas acessórias do arrendamento, em negociação entre as partes), foi arquivado o presente processo.
HABITAÇÃO — OCUPAÇÃO DE PRÉDIO URBANO — CONTRIBUIÇÕES
Processo n.° 77/R-981-B-4
Veio um cidadão reclamar do facto de uma autarquia local não ter deferido atempadamente um seu requerimento que visava o despejo administrativo dos ocupantes abusivos (membros de um partido político) de um imóvel de sua propriedade.
No decorrer do processo veio-se a apurar que só por negligência da Câmara Municipal de Guimarães não tinham sido exercidos os poderes que o Decre-to-Lei n.° 198-A/75, de 14 de Abril, concedia a tais corpos administrativos.
Todavia, quando se dá a intervenção do Serviço do Provedor de Justiça, nada há a fazer por, entretanto, tal diploma ter sido revogado pelo Decreto--Lei n.° 294/77, de 20 de Junho.
Face à actuação omissiva da Câmara Municipal em causa, foi esta alvo de censura.
Paralelamente, defendeu-se junto da repartição de finanças respectiva a tese de que o reclamante deveria ficar isento de tributação na parte que respeita à contribuição predial urbana e imposto complementar no período respeitante à ocupação abusiva, por se entender que durante tal lapso de tempo o mesmo ter estado impedido, por facto de terceiro, de tirar ou poder tirar qualquer rendimento útil do imóvel.
Formulada a recomendação, nesta parte, foi a mesma inteiramente aceite.
O Serviço acompanhou ainda o desenvolver do processo-crime que, pela ocupação abusiva, correu seus termos no tribunal competente, diligenciando pela sua conclusão junto da hierarquia da magistratura do Ministério Público. Apesar de o processo ter ficado a aguardar melhor prova, viu finalmente o reclamante realizado o seu desiderato principal, que foi o da recuperação do edifício.
HABITAÇÃO — SOBREOCUPAÇÃO Processo n.° 78/R-H60-B-4
O presente processo nasce de uma reclamação onde é atacada uma deliberação de uma câmara municipal que revogara uma sua deliberação anterior que havia declarado um regime de sobreocupação um prédio urbano, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 232/ 75, de 16 de Maio.
Nos termos do diploma citado, os ocupantes do prédio sobreocupado passariam a arrendatários directos e daí a reclamante sentir-se prejudicada com a revogação da deliberação de sobreocupação.
Realizada a instrução do processo, veio a averiguar-se que a deliberação de sobreocupação havia
Página 2054
1076-(78)
II SÉRIE — NÚMERO 47
sido baseada em errado pressuposto de facto, resultante de se ter considerado o prédio urbano destinado a habitação quando, na verdade, ali se desenvolvia legalmente uma actividade industrial de albergaria, situação essa que não preenchia o condicionalismo da declaração de sobreocupação.
Entendeu-se, assim, que a deliberação revogada era ilegal por violação da lei e, como a deliberação revogatória foi tomada dentro do prazo legal de interposição do recurso (artigo 828.° do Código Administrativo), conclui-se, a final, ser absolutamente correcta a posição da autarquia, pelo que se determinou o arquivamento do processo.
LICENCIAMENTO DE FARMÁCIA Processo n.º 76-R-993-A-3
Foi apresentada reclamação contra um acto do Secretário de Estado da Saúde que deferira um requerimento de instalação de farmácia. A reclamante sentia-se prejudicada por ter visto indeferido um requerimento seu para os mesmos fins apresentado anteriormente.
Após sucessivos indeferimentos de pedidos da reclamante e da outra interessada — por entender não haver prova bastante dos condicionalismos definidos no n.° 1, § 1.°, alínea b), da Portaria n.° 413/73, de 9 de Junho, relativos a dados estatísticos das populações da localidade em causa —, a Secretaria de Estado acabara, com efeito, por deferir um requerimento da segunda, considerando ter ela passado a fundamentar-se no § 2.° do n.° 3 do mesmo diploma, que permite ao Ministro dispensar, em certas condições, a comprovação daqueles requisitos.
Analisada a reclamação e efectuadas diligências junto da Secretaria de Estado da Saúde, concluiu-se que assistia razão à reclamante, pois não existiam motivos para ter sido indeferido o seu requerimento, deferindo-se o da requerente que formulara idêntico pedido em momento posterior.
O despacho do Secretário de Estado da Saúde em causa baseara-se num parecer, no mínimo inaceitável, do Contencioso da Secretaria-Geral do Ministério dos Assuntos Sociais.
Com efeito, a verdade è que a reclamante, embora houvesse tentado — sem êxito, por nem a Câmara Municipal nem o Instituto Nacional de Estatística poderem fornecer números capazes —, no seu originário requerimento, fazer prova dos mencionados dados populacionais, também não deixara de invocar em seu favor a norma com base na qual a outra candidata acabara por ser beneficiada.
O mesmo parecer se fundamentava ainda no facto de a ora queixosa ter deixado de dispor das instalações com que contava para instalar a farmácia — circunstância essa irrelevante, por si só, para efeitos de atribuição de licença, e que de qualquer modo não abonava em favor da outra interessada, pois pelo processo se provava que seu pai conseguira (o que a Secretaria de Estado bem conhecia) demover o indivíduo que prometera vender o prédio à reclamante, convocando-o a aliená-lo antes à sua filha.
Para as irregularidades do processo de licenciamento, chamou-se a atenção do Secretário de Esta-
do da Saúde, recomendando que se estudassem as possibilidades de licenciar uma farmácia para a reclamante no mesmo concelho — isto, para se evitar à outra interessada e à colectividade os prejuízos decorrentes do encerramento da sua farmácia. Apesar de existir, em sentido favorável a tal possibilidade, um parecer de um técnico de saúde pública da Direcção dos Serviços de Farmácia e Medicamentos, a Secretaria de Estado recusou encará-la.
Não restou assim outra alternativa que não fosse solicitar ao agente do Ministério Público junto da 1." secção do Supremo Tribunal Administrativo a interposição de recurso contencioso do despacho do Secretário de Estado da Saúde que licenciara a farmácia em causa. O que este, certamente ponderados os factos, fez prontamente.
Teria sido possível obstar a este último recurso se a Secretaria de Estado da Saúde, reconhecendo e assumindo as suas responsabilidades nas irregularidades do processo, tivesse aceitado uma solução pragmática como a que foi proposta, evitando o contencioso que inevitavelmente surgirá de uma anulação do despacho impugnado.
LICENCIAMENTO DE INSTALAÇÕES FABRIS PERIGOSAS — EXPLOSIVOS
Processo n.° 78-R-178-B-4
O presente processo tem origem numa queixa apresentada por um cidadão contra as irregulares condições de funcionamento de uma oficina de pirotecnia (designadamente os seus requisitos de segurança que punham em sério risco os habitantes residentes no raio da acção da citada oficina), sendo certo que a reclamação viria acompanhada de exposições dirigidas à câmara municipal do respectivo concelho sem que até ao momento se tivesse obviado à situação.
Recebida a queixa, de imediato se solicitou à Comissão de Explosivos, entidade competente para o efeito, que diligenciasse pela realização de uma vistoria ao local, em ordem a verificar se a referida indústria vinha funcionando de acordo com as normas de segurança previstas no Regulamento sobre Substância Explosivas (Decreto-Lei n.° 37 925, de 1 de Agosto de 1950).
Decorridos escassos dias após a sua auscultação, a Comissão de Explosivos remeteu a este Serviço um exaustivo relatório sobre o funcionamento da oficina em causa, através do qual se pôde concluir que a sua laboração respeitava integralmente o disposto no Regulamento sobre Substâncias Explosivas e que além disso na concessão do alvará tinham sido observados todos os comandos legais, designadamente o aviso por editais da instalação em causa.
Face ao resultado do inquérito ordenou o Provedor de Justiça o arquivamento do processo.
Solicitou, porém, de novo o reclamante a reabertura do mesmo, com o argumento ce que a vistoria não tinha sido acompanhada nem do reclamante, nem de nenhum dos habitantes lesados.
De novo, e atendendo à necessidade de resolver de forma definitiva o problema, recomendou-se à Comissão de Explosivos que procedesse a nova inspecção, devendo o técnico dela encarregado convocar o reclamante para o dia da diligência.
Página 2055
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(79)
Assim aconteceu efectivamente e, depois de esclarecido o reclamante de que nenhuma das suas queixas tinha fundamento legal, acabou o mesmo por aceitar o resultado da diligência, com o que se determinou o arquivamento definitivo do processo.
NACIONALIDADE — ESTRANGEIROS — TAXA Processo n." 78/R-S77-B-1
Um cidadão brasileiro expôs a este Serviço que, desejando em 1968 passar a viver em Portugal, solicitou a competente autorização de residência.
Depois de esta lhe ter sido concedida, fixou domicilio em Lisboa.
Tendo alcançado posteriormente a igualdade de direitos e deveres — estatuto geral de igualdade — ao abrigo da Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses (Convenção Luso-Brasileira de 8 de Setembro de 1971), reclamou da orientação legislativa que impõe o pagamento de emolumentos pela aquisição dos títulos de residência.
Salientou o interessado que se lhe afigurava incorrecto que o referido estatuto de igualdade não isente os seus titulares do aludido pagamento.
Estudado o problema, concluiu-se que não havia conduta irregular da Administração ou lei inadequada.
Na verdade, compulsando a Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses, bem como o Decreto-Lei n.° 126/72, de 22 de Abril, que regulou a sua execução, verifica-se que um dos requisitos necessários à atribuição do estatuto de igualdade consiste na residência permanente em território português, situação esta só possível mediante um título de residência, cuja aquisição depende do pagamento de determinados emolumentos.
Por outro lado, segundo o artigo 13.° do citado Decreto-Lei n.° 126/72, considera-se que há cessação de autorização de permanência em território português quando a autorização de residência não seja renovada. Logo, tem necessariamente de concluir-se que o pagamento de emolumentos inerente a essa autorização de residência é uma condição da atribuição e renovação do estatuto de igualdade, não podendo logicamente basear-se a falta daquele pagamento na existência deste estatuto.
Para os estrangeiros o. estatuto de igualdade só existe se houver autorização de residência e enquanto esta durar.
Assim, não se deparando motivos justificativos para uma intervenção do Provedor de Justiça, o processo foi arquivado.
POLÍCIA — POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA — CONDUTA DE AGENTE
Processo n.° 77/R-I275-B-I
Uma cidadã queixou-se ao Provedor de Justiça de ter sido mal autuada por um agente da Polícia de Segurança Pública e de este a ter conduzido sem 'necessidade para a esquadra.
Apreciado o caso — designadamente através de processo de inquérito organizado no Comando da Polícia de Segurança Pública de Lisboa —, verificou-se que a reclamante foi multada por contravenção ao Código da Estrada e que o agente autuante alegou ter-lhe pedido para o acompanhar à esquadra por esta se localizar próximo do lugar da intervenção policial e por não ter com ela os documentos necessários para formalização da transgressão presenciada.
Não se tendo provado no caso concreto actuação irregular ou inadequada do agente, o Provedor determinou o arquivamento do processo deste Serviço.
No entanto, tendo em conta diversas alusões a tal respeito nesta e em outras reclamações que lhe foram dirigidas, formulou ao Sr. Comandante-Geral da Policia de Segurança Pública uma recomendação do seguinte teor:
Têm-me sido apresentadas várias reclamações relativas à Policia de Segurança Pública, algumas das quais têm como motivo fundamental a actuação de agentes dessa corporação no que respeita a recusa de identificação e à prática, nem sempre justificável, de condução de cidadãos à esquadra mais próxima, para alegada identificação e declarações, após interpelação por contravenção estradai.
Atendendo a que consta do Regulamento da Polícia de Segurança Pública a obrigação de identificação dos agentes e que a condução à esquadra se afigura normalmente dispensável se o transgressor se identificar in loco, recomendo que V. Ex.a chame a atenção dos elementos dessa Policia, pelos meios que considere mais idóneos, para a necessidade de naquele ponto darem cumprimento aos regulamentos e para tornarem a sua actuação consentânea com os direitos dos cidadãos, no que se refere ao bom nome e consideração que lhes é devida.
Há que não esquecer, na verdade, que a deslocação à esquadra em companhia de um guarda da Polícia de Segurança Pública envolve um certo grau de desconsideração social, que é com frequência sentida pelos que são sujeitos a essa prática.
PROCESSO ADMINISTRATIVO — CERTIDÃO Processo n.° 78/R-5S6-B-I
, Uma reclamante residente em Lisboa solicitou a intervenção do Provedor de Justiça por, apesar de inúmeras diligências, não conseguir que lhe fosse passada pela Secretaria da Universidade de Lisboa uma certidão comprovativa de haverem sido pagas a certo indivíduo, no período compreendido entre 15 de Dezembro de 1969 e Fevereiro de 1976, as rendas relativas a um prédio de que é comproprietário e que tem estado ocupado por instalações da Faculdade de Ciências, bem como uma indemnização de 912 000$.
A referida certidão era necessária para instrução ,de uma acção judicial de prestação de contas.
Ouvida sobre o caso, a Universidade afirmou que 'a certidão não fora entregue por a interessada não
Página 2056
1076-(80)
II SÉRIE - NUMERO 47
ter esclarecido, como lhe tinha sido pedido, o que realmente pretendia.
Transmitida à reclamante a posição da entidade pública visada, veio ela determinar por documentos que elucidara o que desejava e asseverar de novo que lhe levantaram os mais variados obstáculos para passagem da certidão em causa.
A Universidade voltou a ser inquirida e o tempo passou-se até que, após diligência directa e firme do Provedor, a secretaria daquela instituição forneceu ao advogado da reclamante a almejada certidão.
REFORMA AGRÁRIA — EXPROPRIAÇÕES
Processo n.° 76/R-1054-A-3
Determinados reclamantes expuseram ao Serviço do Provedor de Justiça a sua estranheza pelo facto de certos prédios rústicos de sua propriedade haverem sido expropriados em sequência da Portaria n.° 493/76, de 6 de Agosto, tanto mais que alegavam terem sido aqueles aludidos prédios identificados como possuindo uma área que efectivamente não tinham.
Foi solicitada pelo Provedor de Justiça ao Ministério da Agricultura e Pescas informação sobre o caso apresentado — e que, aliás, já lhe tinha sido exposto, sem que houvesse sido obtida qualquer informação, pelos próprios reclamantes —, havendo-se aproveitado a oportunidade para se obter confirmação sobre a manutenção em vigor e observância prática da limitação constante do seu artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 489/76, de 22 de Junho.
Após variadas insistências junto do referido Ministério em ordem à obtenção da informação pedida, veio a responder a Secretaria de Estado da Estruturação Agrária, comunicando haver sido indeferida a pretensão oportunamente exposta pelos reclamantes e juntando um parecer relativo ao caso.
Analisado aquele parecer, foi entendido que a posição daquela Secretaria de Estado se fundamentava numa interpretação do regime legal vigente que se considerou não ser de acolher.
Com efeito:
É certo que, literalmente, o artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 406-A/75, de 29 de Julho (e, em sua aplicação, a Portaria n.° 493/76, de 6 de Agosto), fala, genericamente, de ineficácia de «actos», sem entre estes fazer qualquer distinção.
Mas seria indispensável atentar no espírito e finalidade de tais disposições.
A posição referida teria, porventura, fundamento, abrangendo inclusivamente os actos públicos como o de expropriação, se a expropriação no âmbito da Reforma Agrária se reportasse, juridicamente, à data de 25 de Abril de 1974 e à situação então existente — aplicando-se automaticamente a todos os terrenos que então excedessem os limites fixados.
Mas entendeu-se não ser assim:
o) A expropriação no âmbito da Reforma Agrária não è vinculativa, constituindo antes objecto de um poder discricionário da Administração;
b) Por isso é que a situação que há-de Jus-
tificar cada medida de expropriação se reporta à data em que esta opera;
c) Então, qual o objectivo e finalidade do
artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 406-A/75?
Entendeu-se que seria o de evitar que actos posteriores a 25 de Abril de 1974, actos de particulares, tivessem como resultado, diminuindo a área de certo terreno, fugir à aplicação da legislação da Reforma Agrária.
A data de 25 de Abril de 1974 tem por base a consideração de que, logo após o Movimento de 25 de Abril e a publicação do Programa do Movimento das Forças Armadas, os interessados se terão apercebido de que o novo regime não deixaria de tomar medidas contra os monopólios e latifundiários.
Essa finalidade é patente na primeira parte do artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 406-A/75, ao falar de actos que beneficiem ou aproveitem a parentes ou afins, revelando-se que se quis atingir actos que, representando, formalmente, uma divisão da propriedade, na prática a deixariam concentrados numa mesma família.
Como o engenho dos homens não ê pequeno, não deixou a mesma disposição de prever, na sua segunda parte, a possibilidade de uma declaração de ineficácia, esta não automática, relativa a outros quaisquer actos que causassem a redução da área dos terrenos — mas sempre dentro da mesma linha de consideração e propósitos que norteou toda a norma em questão.
Aliás, mal se entenderia, afinal, qual o fim da lei, se pelo termo «actos» quisesse abranger também os de natureza pública que, como a expropriação (esta fora do âmbito da Reforma Agrária), se impõem aos particulares.
Acresceu que a opinião discutida poderia conduzir a resultados menos lógicos no que se refere à posterior atribuição de reserva ao expropriado.
Tal critério, com efeito, poderia levar (como pareceu acontecer no caso presente) à expropriação de terreno que, nessa data, tivesse pontuação inferior a 50 000 pontos.
Ora, como a lei confere aos expropriados, sob certas concições, o direito a uma reserva de 50 000 pontos, de duas uma:
a) Ou se lhes vinha a atribuir uma reserva
inferior, contra o que a lei determina;
b) Ou, para se atribuir terreno a que cor-
respondam 50 000 pontos, se lhes conferia mais terreno do que o que era seu na data da expropriação.
Por outro lado, a tese sustentada na informação n.° 20 dessa Secretaria de Estado conduziria a que, em parte, a expropriação não viesse a operar-se para consecução dos fins da Reforma Agrária. (
De facto, a declaração de ineficácia prevista no artigo 15.° do Decreto-Lei ra.0 406-A/75 tem em vista a realização dos objectivos da Refor-
Página 2057
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(81)
ma Agrária — expropriação para posterior aproveitamento agrícola, silvícola ou pecuario.:
Ora a expropriação já operada por iniciativa da Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos, e tornada inelutável por decisão judicial, tinha objectivos próprios e diversos daqueles.
Enfim, não foi tido por convincente o argumento, também constante da citada informação n.° 20, de que outro não poderia ser, no caso presente, o sentido da declaração, contida na Portaria n.° 493/76, de ineficácia dos actos praticados após 25 de Abril de 1974 e de que resultasse a diminuição da área dos terrenos por ela expropriados senão o de se ter pretendido abranger a expropriação pela Direcção--Geral dos Serviços Hidráulicos, único acto desse tipo que sobre os prédios da reclamante incidira.
É que a declaração de ineficácia constante da Portaria n.° 493/76 não era individualizada para os terrenos da reclamante, antes se reportava genericamente a todos os prédios — várias de-, zenas, de diversos titulares — que por ela foram expropriados. Aliás, a portaria nem curou; de se referir, concretamente, a este ou àquele acto, latamente abrangendo «todos» os que, com as características apontadas, houvessem sido praticados, tendo por objecto os prédios nela contemplados.
Assim se recomendou a derrogação da Portaria n.° 493/76, de 6 de Agosto, na parte referente aos prédios dos reclamantes.
E efectivamente foi derrogada a aludida portaria, havendo finalmente os prédios em causa sido devolvidos aos seus proprietários.
REFORMA AGRÁRIA — NACIONALIZAÇÕES Processo n.» 78/R-321-A-3
Determinado reclamante apresentou à consideração do Serviço do Provedor de Justiça uma exposição na qual alegava que teria ocorrido a favor da nacionalizada Companhia das Lezírias do Tejo e Sado, pór virtude de uma subavaliação dos gados, alfaias, equipamentos e crédito por benfeitorias que lhe pertenciam e que àquela foram atribuídas por conta do seu crédito para com ele, reclamante, um verdadeiro locupletamento.
Perante a gravidade da questão posta não poderia o Serviço do Provedor de Justiça deixar de proceder a uma indagação aprofundada da factualidade em causa, não somente baseando conhecer a posição da Secretaria de Estado da Estruturação Agrária sobre o caso como apurar do seguimento que teria sido dado a uma exposição apresentada pelo reclamante àquela mesma Secretaria de Estado.
Depois de diversas diligências transmitiu a Secretaria de Estado da Estruturação Agrária ao Provedor de Justiça uma extensa informação fornecida pela aludida Companhia e que contrariava a posição defendida pelo reclamante.
Face ao condicionalismo em causa, ponderou o Provedor de Justiça que o antagonismo das posições não poderia ser por ele dirimido, por exigir o recur-
so a meios de que não dispunha, em especial no concernente a focados aspectos de impugnações de valores.
Cabe todavia referir — e será este o aspecto que convém fazer ressaltar— que esta conclusão só se firmou após exaustivas diligências tendentes a apreender toda a essência da questão, designadamente por estar em causa eventual comportamento incorrecto de uma empresa nacionalizada para com um particular e um possível enriquecimento à sua custa.
REGIME PRISIONAL — LIBERDADE CONDICIONAL Processo n.° 78/R-4S9-B-1
Um recluso da Cadeia Penitenciária de Lisboa (Vale de Judeus), comunicou ao Provedor que estaria a ser vítima, nesse estabelecimento, de discriminação racial — atitude que seria aí generalizada — motivo por que lhe não seria concedida liberdade condicional.
Considerou-se que não cabe ao Provedor influir no sentido da concessão ou não de liberdade condicional, decisão da competência do juiz de execução das penas.
Aliás, pode confirmar-se que os serviços da Cadeia não haviam deixado de realizar a perações administrativas que devem preceder tal c ão judicial.
Por seu turno, obteve-se extenso relatório da orientadora social da Cadeia, elucidativa da falta de razão do queixoso sobre a alegada discriminação racial.
Deste modo se deu o caso por encerrado.
Processo n.° 78/R-1062-B-I
Um recluso da Cadeia Penitenciária de Lisboa expôs ao Provedor que, apesar de já ter ultrapassado a metade da pena que lhe fora imposta, eram sucessivamente levantados obstáculos administrativos ao seguimento do seu processo de concessão de liberdade condicional.
Quanto à decisão sobre tal medida, não caberia, claro, intervir, por ela competir ao juiz de execução das penas.
Mas procurou-se averiguar se se confirmavam os alegados obstáculos administrativos ao normal seguimento do processo.
Dois meses depois de se solicitar a indicação do estabelecimento prisional sobre o assunto, e aproveitando uma saída precária, o queixoso veio ao Serviço do Provedor pedir que o assunto não fosse abandonado, pois considerava ter havido erro na pena comunicada à Cadeia como devendo ser cumprida.
De novo se insistiu, pois.
A direcção da Cadeia só respondeu passados cerca de quatro meses, justificando-se com a aglomeração e, mesmo, descontrole de serviço causado pela fuga de mais de cem reclusos entretanto verificada.
Através dos contactos estabelecidos entre a Cadeia e o 4.° Juízo Condicional da Comarca de Lisboa, veio a apurar-se que este, por lapso comunicara àquela ter o queixoso sido condenado em pena de
Página 2058
1076-(82)
II SÉRIE — NÚMERO 47
três anos, dez meses e oito dias, quando na verdade a condenação fora de dois anos e sete dias.
Em face desta verificação, o estabelecimento prisional deu início ao processo de concessão de liberdade condicinal do interessado.
REGIME PRISIONAL — SITUAÇÃO PRISIONAL — INFORMAÇÃO
Processo n.° 78/R-1955-B-1
Um recluso da Cadeia de Monsanto queixou-se de estar há vários dias detido sem saber porquê, depois de ter sido capturado pela Polícia de Segurança Pública em virtude de mandado proveniente do Tribunal Judicial do Funchal.
Averiguado o assunto, apurou-se que o reclama-fora pronunciado na comarca do Funchal por plantação e tráfego de droga (liamba), faltara a julgamento e tinha-se ausentado a seguir para parte incerta do continente.
Era julgado à revelia e condenado, por prática do crime previsto e punido pelos artigos 2.°, n.os 1 e 2, e n.° 1, do Decreto-Lei n.° 420/70, de 3 de Setembro, na pena de seis meses de prisão e 5000$ de multa.
Entretanto, já depois de preso, foi notificado da: sentença e teve, portanto, ocasião de recorrer dela.
Assim, verificou-se que a queixa não tinha fundamento, pelo que o processo deste Serviço foi arquivado.
Não deixou, porém, de se fazer o devido reparo à conduta do reclamante, o qual não podia desconhe-i cer a notificação pessoal do despacho de pronúncia1 e a do julgamento designado e não podia igualmente ignorar que faltou a este julgamento, ausentando--se para o continente sem justificar sequer aquela falta.
REGBME PRISIONAL — TRANSFERÊNCIA
Processo n.« 78/R-1260-B-1
Uma reclusa da Cadeia Regional do Montijo pediu a intervenção do Provedor de Justiça por se aproximar a data da sua transferência para outro estabelecimento prisional e por, a consumar-se essa transferência, não poder ter na sua companhia, como então sucedia, uma filha de dois anos de idade, cega e paralítica.
Dois outros filhos da reclamante estavam a cargo de familiares, residentes em localidade próxima da, Cadeia.
Colocado o problema, por diligência pessoal e: imediata do Provedor, ao Sr. Director-Geral dos Serviços Prisionais, este decidiu que a interessada em causa permanecesse na Cadeia Regional do Montijo, ficando com ela a filha de dois anos de idade.
A reclusa deveria ser ocupada em serviço de utilidade comum ou em seu beneficio, mas sempre com o devido resguardo e apoio.
Foi assi n solucionada, por forma legal e humana, a dramátic. questão suscitada.
REGISTOS E NOTARIADO — REGISTO PREDIAL — PRAZOS
Processo n.» 78/R-932-B-I
Um cidadão reclamou para este Serviço do facto de uma conservatória do Registo Predial de Lisboa ter aplicado a tabela emolumentar aprovada pelo
Decreto-Lei n.° 31/78, de 9 de Fevereiro, m, cálculo do preparo que lhe exigiu relativamente ao registo respeitante à aprovação n.° 63, de 24 daquele mesmo mês.
Atendendo a que, segundo o artigo 3.° do tado diploma legal, este só entrou em vigor quinze dias após a data da sua publicação, parecia-lhe que não era legalmente possível aplicar aos registos referidos anteriormente ao dia 25 de Fevereiro a actual tabela emolumentar.
Ouvidas a conservatória visada e a Direcção--Geral dos Registos e do Notariado, concluiu-se que o procedimento adoptado pela primeira era o correcto.
Com efeito, de harmonia com a alínea d) do artigo 279.° do Código Civil — aplicável por força do disposto no artigo 296.° daquele diploma —, o prazo de quinze dias deverá ser havido como prazo de duas semanas e o prazo fixado em semanas a contar de certa data, de acordo com a alinea c) do mesmo preceito, termina às 24 horas do dia que corresponda a essa data dentro da última semana..
Assim, e tendo o dia da publicação do Decreto--Lei n.° 31/78 sido numa quinta-feira, o prazo de quinze dias terminou às 24 horas de quinta feira da segunda semana, dia 23, pelo que aquele diploma entrou em vigor às 0 horas de sexta-feira, dia 24.
Não tendo havido, portanto, conduta irregular da Administração, foi arquivado o processo.
SEGURANÇA SOCIAL — APOSENTAÇÃO — CONTAGEM DE TEMPO
Processo n." 78/R-Í77-A-3
Um funcionário aposentado manifestou ao Provedor a sua discordância por, ao invés do que sucede no âmbito da Previdência, o tempo de serviço para aposentação só se contar, por força do n.° 1 do artigo 33.° do Estatuto da Aposentação, por anos completos.
Parecendo justa a pretensão, designadamente porque os descontos nas remunerações para efeitos de aposentação se fazem de mês a mês — daí decorrendo que pode acabar por não ser computado para tal efeito tempo relativamente ao qual se descontou —, ponderou-se o problema à Caixa Geral de Aposentações e ao Ministério das Finanças.
A Caixa respondeu que no projecto de reformulação do Estatuto da Aposentação se passa a prever a contagem de tempo referido não só a anos, mas também a meses completos.
SEGURANÇA SOCIAL — APOSENTAÇÃO — PENSÃO Processo n.° 78/R-89-A-3
Um piloto aviador-chefe do quadro comum dos Serviços Geográficos e Cadastrais c.e Angola foi aposentado em 1975.
Página 2059
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(83)
Tendo, entretanto, tomado conhecimento de orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Administrativo, no sentido de ser computável, para efeitos de cálculo da pensão de aposentação, nos termos do Decreto-Lei n.° 52/75, de 8 de Fevereiro, o subsídio de voo, pediu a correspondente rectificação à pensão que lhe fora atribuída.
Esse pedido foi indeferido, com o fundamente le que «o acto (de fixação da pensão definitiva) publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 108, de 11 de Maio último, tornou-se a partir dos trinta, dias num acto definitivo e executório».
O interessado queixou-se ao Provedor, alegando, além do mais, não ter sido notificado do acto de fixação da pensão definitiva.
Não se tomou em conta este último argumento, pois a publicação do acto contestado se fizera através do Diário da República.
Realçou-se, porém, à Direcção-Geral de Administração Civil que o fundamento do indeferimento da rectificação não merecia acolhimento.
Com efeito, segundo a melhor doutrina, os actos definitivos e executórios, mesmo que, como este, constitutivos de direitos, podem ser revogados, total ou parcialmente, desde que haja anuência do interessado — neste caso óbvia.
A Administração aceitou este ponto de vista, tendo a pensão do reclamante sido revista, por despacho de 20 de Janeiro de 1978, ficando ele obrigado a satisfazer os correspondentes descontos para compensação de aposentação.
Processo n.° 78/R-21S7-A-3
Dirigiu-se ao Provedor de Justiça uma ex--telefonista-chefe de 2.a classe, interina, dos Serviços de CTT de Moçambique, agora aposentada, protestando por não lhe ter sido atribuída, como requerera, pensão correspondente ao vencimento da letra O, aquela por que vencia antes de lhe ser feita rectificação para a letra Q, por ocasião de ingresso no quadro geral de adidos.
Apontava outro caso paralelo em que pretensão similar fora aceite.
Ouvido o Serviço Central de Pessoal e analisado o caso, apurou-se que a queixa não tinha razão.
Com efeito, ela não poderia valer-se, como alegara, do disposto no n.° 2 do artigo 7.° do Decreto--Lei n.° 175/76, de 24 de Abril, já que ela estivera provida apenas como interina na letra O, sendo correspondente à letra Q o seu lugar de base.
O Serviço Central de Pessoal, detectando o lapso cometido em relação à outra funcionária, corrigiu-o espontaneamente.
A queixosa, por seu turno, aceitou expressamente a argumentação expendida e a justeza da sua situação.
SEGURANÇA SOCIAL — CASAS DO ESTADO — DESPEJO Processo n.° 78/R-10S2-B-1
A Comissão Nacional de Inquérito emitiu parecer no sentido de ter sido abusiva, e merecer por isso ser reparada, a actuação do Comando da Guarda
Nacional Republicana que, em 1966, despejara de uma casa arrendada, através dos seus serviços de assistência, um cabo dessa corporação — isto pelo facto de ele entretanto ter sido reformado.
Visto que, entretanto, o inquilino falecera, a sua ex-mulher queixou-se ao Provedor por a GNR não haver correspondido à posição definida pela Comissão Nacional de Inquérito.
Ouvida a GNR, esta alegou, fundamentalmente, que as casas em questão, a construir (o preceito aplicável do Estatuto da Assistência das Praças da GNR, artigo 21.°, n.° 1, dispunha que a tais serviços caberia «promover a construção de moradias para habitação das praças nas áreas dos seus aquar-telamentos»), se destinavam a pessoal no activo e que, no caso concreto, o falecido cabo até era proprietário de uma casa, cujo arrendatário poderia ter despejado para nela ir morar após a reforma.
Ponderada a situação e a argumentação da Guarda Nacional Republicana, o Provedor emitiu sobre ela a seguinte recomendação:
O argumento alicerçado no citado n.° 1 do artigo 21.° do Estatuto, a meu ver, não colhe, pois dele não decorre necessariamente a conclusão extraída.
Com efeito, essa disposição tem como único objectivo vincular a assistência à construção de moradias para a habitação das praças, definindo simultaneamente o local onde as mesmas se devem erguer.
Assim, considero que esse preceito é perfeitamente compatível com a manutenção dos arrendatários nas casas para além da sua passagem à situação de reforma.
Por outro lado, também os artigos 6.° e 12.° do Decreto-Lei n.° 42 793, de 31 de Dezembro de 1959, que convertem os serviços de assistência nos Serviços Sociais da Guarda Nacional Republicana, me levam a entender que o despejo em causa traduziu uma exorbitação do respectivo regime legal.
Estabelece, pois, o artigo ó.° que os Serviços Sociais terão em vista proporcionar alojamento aos agregados familiares dos beneficiários mediante, designadamente, arrendamento simples.
Por seu turno, o artigo 12.° define como beneficiários dos Serviços Sociais os sargentos e praças.
Ora, parece-me que os sargentos e praças, ao atingirem a situação de reforma, não deixam de como tais ser considerados, antes passando de sargentos e praças no activo a sargentos e praças reformados.
Pelo que respeita à circunstância de o beneficiário em causa dispor ao tempo de uma moradia própria, também ela não releva, visto que a mesma se encontrava arrendada, não se preenchendo assim o óbice a que se refere o § 1.° do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 42 793 — dispor de habitação permanente em casa própria.
Neste contexto, conclui-se pela ilegalidade e injustiça da solução reclamada e, consequentemente, pela necessidade de ser reparada a irregularidade cometida, nos termos propostos pela Comissão Nacional de Inquérito.
Página 2060
1076-(84)
II SÉRIE — NÚMERO 47
SEGURANÇA SOCIAL — PENSÃO — SUSPENSÃO Processo n.º 76/R-1115-A-2
Pela viúva de um administrador da companhia
dos Transportes Aéreos Portugueses foi apresentada ao Serviço do Provedor de Justiça uma reclamação pelo facto de lhe ter sido suspensa, por forma que considerou arbitrária, a pensão que lhe havia sido atribuída em razão de o seu falecido marido haver exercido aquele cargo desde 1953 até à data da sua morte, ocorrida em 1970.
A companhia visada argumentou na seguinte forma, argumentos esses transmitidos pelo Gabinete do Ministro dos Transportes e Comunicações:
Dada a situação actual da empresa, no plano económico-financeiro, a reanimação da pensão suspensa acarretaria previsível desestabilização de natureza social, dada a posição já então assumida pelos trabalhadores da mesma empresa em relação ao pagamento de pensões aos ex--membros dos corpos gerentes anteriores ao 25 de Abril de 1974.
Por outro lado, a concessão do subsidio não constituiria uma obrigação mas, antes, uma simples faculdade e, assim sendo, poderia a empresa condicionar a sua atribuição tanto mais que tal subsidio integrava um acto jurídico unilateral, de natureza voluntária, sujeita a condição resolutiva em termo incerto — isto é, a sua eficácia apenas se manteria enquanto a empresa o entendesse conveniente.
Desse modo, havendo entendido e assim deliberado que não era conveniente continuar a efectivar-se o pagamento do subsídio, tal decisão teria resolvido o aludido acto jurídico fazendo cessar os seus efeitos sem prejuízo, contudo, das prestações já liquidadas.
Porém, mais tarde e ainda a propósito do mesmo problema, veio a comunicar que, na sequência de deliberação tomada, decidira mandar pagar as pensões de reformados ex-membros dos corpos gerentes da TAP.
Face ao condicionalismo exposto e apurado, considerou o Serviço do Provedor de Justiça que:
O carácter facultativo da atribuição das pensões em causa — porventura justificado pela necessidade de apreciação concreta dos meios de subsistência dos interessados, bem como das possibilidades económicas das empresas — esgota-se no momento em que se delibera a sua atribuição.
Em matéria de direito do trabalho e segurança social os benefícios reconhecidos aos trabalhadores e seus familiares não são regidos por puros princípios de direito privado e, assim, só uma alteração da situação económica de pensionista ou a total impossibilidade da empresa em saldar os compromissos assumidos poderia eventualmente justificar a diminuição ou suspensão das pensões concedidas.
Tendo já sido decidido pelo conselho de gerência da TAP pagar as pensões devidas a membros dos corpos gerentes da empresa e que haviam desempenhado esses cargos antes do 25 de Abril de 1974 (apesar de, antes, se ter afir
mado que tal pagamento causaria «previsível desestabilização de carácter social»), não se encontraria razão para' que os familiares daqueles
gozassem ou merecessem tratamento menos favorável.
Tende em conta estas conclusões, recomendou-se então ao conselho dos Transportes Aéreos Portugueses a continuação do pagamento da pensão antes concedida à reclamante e bem assim a outras beneficiárias que estivessem nas mesmas condições.
Não é conhecida qualquer sequência desta recomendação até ao momento.
SEGURANÇA SOCIAL — REFORMA — EX-COLÓNIAS Processo n." 77/R-I046-A-2
Um reclamante dirigiu-se a este Serviço, insurgin-do-se acerca da suspensão do recebimento de uma pensão de reforma que lhe vinha sendo paga pela Companhia Ilha do Príncipe.
Efectuadas várias diligências, o Ministério dos Negócios Estrangeiros informou ter sido assinada em 23 de Março de 1977 com a República Democrática de S. Tomé e Príncipe uma declaração de intenções «acerca dos problemas decorrentes da nacionalização da propriedade agrícola, pelo que se presume que a questão da suspensão das pensões pagas pelas ex--companhias agrícolas poderá ser encerrada, naquele âmbito, em futuro próximo».
Não obstante tratar-se de questão apenas susceptível de vir a encontrar solução em âmbito diplomático, face à manifesta situação de carência do reclamante foi solicitada ao Comissariado para os Desalojados informação sobre a possibilidade de o mesme reclamante vir a ser considerado desalojado e inscrito no IARN, com o benefício, portanto, das inerentes regalias.
Manifestada, por aquela entidade, a opinião de que o reclamante poderia efectivamente vir a ser considerado como desalojado, face ao disposto na Lei n.° 73/77, de 27 de Setembro, embora aquela condição houvesse de ser apreciada casuisticamente pelo Alto-Comissàrio, segundo o n.° 2 da citada lei, aconselhou-se aquele a expor a sua situação ao aludido Comissariado, havendo-se, depois, arquivado o processo.
SEGURANÇA SOCIAL — REFORMA — PENSÃO Processo n.° 76/R-110-A-2
Determinado reclamante dirigiu-se a este Serviço, alegando que, tendo exercido ininterruptamente por mais de catorze anos, o cargo de administrador do Banco de Angola, se julgava com direito à obtenção de uma pensão.
Ao cabo de demoradas diligências que se estenderam por mais de dois anos, no sentido de se procurar obter a satisfação da pretensão do reclamante, diligências essas que designadamente incluíram a reforma de um processo existente no Ministério das Finanças, foi finalmente obtido despacho do Secretário de Estado do Tesouro autorizando a União dos Bancos Portugueses a atribuir-lhe a reforma correspondente ao tempo de serviço prestado no extinto Banco de Angola.
Página 2061
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(85)
O que sobretudo cabe realçar em todo este processo será a persistência com que se procurou obter a solução adequada para uma pretensão que desde logo se afigurou justa.
Só por isso, e a titulo exemplificativo, se justificará, embora sumariamente, fazer-lhe referência neste relatório.
SEGURANÇA SOCIAL — SUBSÍDIO DE DESEMPREGO Processo n.° 78/R-700-A-3
Uma cidadã, desempregada, desalojada das ex--colónias, trouxe ao Provedor o seu protesto pelo facto de, tendo dado uma falta injustificada ao controle previsto no n.° 1 do artigo 15.° do Decre-to-Lei n.° 183/77, de 5 de Maio, lhe haver sido descontado o equivalente a quinze dias de subsídio de desemprego.
Verificou-se que a actuação dos serviços fora legal, nos termos do n.° 4 do artigo 14.° daquele diploma.
Mas opinou-se que é bastante gravoso retirar a um desempregado metade do seu já de si reduzido subsídio de desemprego, apenas por ter negligenciado, num dia, apresentar-se ao controle.
E observação análoga pode fazer-se a respeito da sanção considerada para a segunda falta injustificada ao controle — a extinção do subsídio (alínea e) do n.° 1 do artigo 13.° do mesmo decreto-lei].
Estas as considerações que foram feitas ao Secretário de Estado do Emprego, perguntando-se qual a sua posição sobre possível alteração do regime indicado.
Embora reconhecendo a dureza do sistema, o Secretário de Estado manifestou-se no sentido de ele se dever manter, atendendo sobretudo a que estão em causa dinheiros públicos e a que se têm neste campo multiplicado as fraudes, sobretudo por acumulação de subsídio de desemprego com outras prestações de segurança social ou por prestação de falsas declarações quanto à situação de desempregado.
Mais comunicou que, embora o diploma ...i causa estivesse a ser revisto, nenhum centro de emprego sugerira a alteração das normas em discussão, salientando aliás que estes organismos costumam utilizar critérios bastante latos para justificação das faltas ao controle.
Conquanto se continuasse a ter por severos os preceitos em discussão, admitiu-se que as razões expendidas pelo SEPE podiam aconselhar, na realidade, a sua não modificação.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — CONCURSOS Processo n.° 78/R-918-B-4
Um candidato preterido num concurso para aferidor de pesos e medidas da Câmara Municipal do Sabugal considerou-se indevidamente prejudicado por este corpo administrativo haver, em escrutínio secreto, escolhido outro concorrente, ao passo que ele teria em seu favor a melhor classificação no exame de habilitação para aferidor, exame aliás feito há mais tempo que o do designado, o maior tempo
de serviço prestado como aferidor noutro município e a preferência geral e absoluta constante do artigo 53.° da Lei n.° 2135, relativamente à prestação de serviço militar.
Ouvida a Câmara Municipal, esta respondeu que, não existindo, legalmente fixados, quaisquer critérios de prioridade para o concurso em causa, considerou dispor a tal respeito de um poder discricionário, que teria exercido através do processo, que teve por mais adequado, da votação em escrutínio secreto. Acrescentou que a preferência relativa à prestação do serviço militar apenas deve valer para o acesso à função pública, e não já, depois, a propósito das vicissitudes da carreira dos funcionários.
Estudado o assunto, verificou-se que, de facto — e aliás de acordo com entendimento já sustentado em vários acórdãos pelo Supremo Tribunal Administrativo —, a lei não fixa regras de graduação para os concursos de aferidores de pesos e medidas dos municípios.
Não obstante disporem assim as câmaras municipais de um poder discricionário no tocante à escolha desses critérios de graduação, considerou-se que não foi legal a actuação da do Sabugal, ao utilizar, para o efeito, o escrutínio secreto.
A expressa exigência legal de concurso para recrutamento de todo o pessoal maior dos serviços especiais dos municípios (artigo 620.° do Código Administrativo) impõe que para o efeito se apliquem critérios objectivos de escalonamento dos candidatos, susceptíveis de proporcionar a designação dos que efectivamente apresentem melhores condições para o bom desempenho dos lugares em questão.
Ora, no caso presente, os vários elementos objectivos em que a edilidade teria podido assentar o critério de escolha — e, sobretudo, o da prestação de serviço bem qualificado como aferidor, no âmbito de outra autarquia — apontavam todos no sentido da escolha do concorrente preterido.
Isto já sem se tomar ainda posição quanto à alegada preferência da prestação do serviço militar, questão já suscitada noutros processos e cuja apreciação geral se está fazendo, com vista a ajuizar da constitucionalidade da regra que a consagra.
Isto se comunicou à Câmara Municipal, recomen-dando-lhe que revogasse a contestada deliberação.
O corpo administrativo respondeu que, entretanto, o interessado interpusera também recurso contencioso para a auditoria administrativa, pelo que, estando em causa um acto constitutivo de direitos, se tinha esgotado a possibilidade da sua revogação.
Não se proporcionou, assim, mais qualquer intervenção neste caso concreto, muito embora o estudo que do problema se fez tenha passado a servir de base à apreciação de futuros casos similares, aliás já surgidos.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — EXONERAÇÃO
Processo n.º 78/R-768-B-4
Um reclamante veio queixar-se da forma irregular como havia sido desligado de um dos gabinetes de apoio técnico do Ministério da Administração Interna.
Analisado o tipo de vínculo de que era titular o reclamante, concluiu-se assistir-lhe, em parte, razão,
Página 2062
1076-(86)
II SÉRIE — NÚMERO 47
o que levou o Provedor a formular a seguinte recomendação:
Após análise da reclamação apresentada e tendo em conta os elementos fornecidos, cheguei às seguintes conclusões:
Como resulta do oficio n.° 289, de 28 de Outubro de 1977, do Gabinete de Apoio Técnico de Arganil, junto ao processo apresentado por V. Ex.a neste Serviço, o reclamante foi admitido ao serviço do Gabinete de Apoio Técnico de Arganil em 10 de Outubro de 1977, como topógrafo de 2.ª classe, a que correspondia o vencimento equivalente à letra P da tabela geral de remunerações dos funcionários públicos.
Assim, pelos próprios termos do vinculo firmado entre esse departamento e o reclamante, não há que falar em contrato de prestação de serviços, designadamente o contrato de «tarefa», como propende a admitir o auditor jurídico do Ministério da Administração Interna.
É que o vínculo estabelecido não tem por base a realização de um trabalho determinado, como aconteceu com a Câmara Municipal do Cartaxo. Não: como resulta da prórpia categoria profissional — topógrafo de 2." — e da atribuição da letra de remuneração, o reclamante foi contratado para desempenhar as tarefas e serviços de que for encarregado pela entidade de que dependia.
Assim, tendo-se colocado à disposição da entidade contratante — Gabinete de Apoio Técnico de Arganil — para desempenhar, sob a sua direcção, as tarefas que competiam à mesma entidade, não pode considerar-se o mesmo sujeito de uma relação jurídica de prestação de serviços, exactamente por escassear em tal relação jurídica o elemento de autonomia que caracteriza tal tipo de contrato, em antinomia com os elementos de subordinação jurídica e económica que no caso concreto se verificaram.
Ora, no caso concreto o vínculo estabelecido não pode ser outro que não seja o contrato a prazo de seis meses previsto no artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 58/76, de 23 de Janeiro, e isto sem embargo de não estar publicada a portaria a que se refere o artigo 3.° do citado diploma.
E na falta da regulamentação de tal diploma é perfeitamente legítimo socorrer-mo-nos dos normativos que regulam os contratos a prazo, quer em direito público, quer em direito privado, isto com base no principio da «plenitude lógica do ordenamento jurídico».
Ora, no regime de direito público vigora o Decreto-Lei n.° 49 397, de 29 de Novembro de 1969, cujo âmbito nos parece não poder ser aplicável nos contratos a prazo de pequena duração, atendendo à economia do diploma.
Fica-nos, pois, a possibilidade de nos socorrermos por analogia dos princípios de direito privado — artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 78/76, de 28 de Setembro —, donde resulta que a extinção do contrato antes de decorrido o prazo, por denúncia de uma das partes, confere à outra o direito a uma indemnização equivalente ao total das retribuições vincendas.
E tendo como certo que o reclamante foi contratado em 10 de Outubro de 1977, parece poder afirmar-se com segurança que o contrato terminaria a 10 de Abril de; 1978.
Ora, sendo certo que a comunicação de «desligamento» do reclamante ocorreu emi 9 de Janeiro de 1978, e tendo o mesmo sido pago dos seus vencimentos até 15 de Janeiro do mesmo ano, é óbvio que se encontram em dívida as retribuições vincendas, ou seja o período compreendido entre 15 de Janeiro e 10 de Abril de 1978.
E esta última conclusão alicerça-se na convicção de que o «desligamento» operado equivale a denúncia do contrato, quando é certo que bem se poderia ter concretizado o afastamento do reclamante com base em infracção disciplinar, atenta a existência de matéria para tal.
Face ao exposto, tenho por bem recomendar o pagamento dos vencimentos respeitantes ao período de 15 de Janeiro a 10 de Abril de 1978 por ser esta a solução que decorre do factualismo em análise.
Tal recomendação foi integralmente aceite, pelo que foi arquivado o presente processo.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — REMUNERAÇÕES
Processo n.° 76/R-404-B-4
Um maquinista de 2.a classe dos serviços municipalizados haver deliberado, oportunamente, conce-concelho apresentou reclamação contra o facto de o conselho de administração daqueles serviços municipalizados haver deliberado, oportunamente, conceder aos seus servidores os aumentos de vencimentos e outras regalias a que aludiam os Decretos-Leis n.os 372/74 e 417/74, respectivamente de 20 de Agosto e 7 de Setembro, tendo excluído, no entanto, da atribuição daqueles aumentos os serventuários reformados da Previdência.
Assim, encontrava-se o reclamante sem receber a totalidade do vencimento a que se julgava com direito, o mesmo não sucedendo, porém, com outro trabalhador seu colega, que, não obstante se achar em situação idêntica à sua, teria sido abrangido na concessão dos benefícios previstos nos diplomas legais acima citados.
Da deliberação do conselho de administração dos serviços municipalizados que lhe recusara a atribuição do aumento da remuneração em apreço interpusera o exponente recurso hierárquico para a câmara municipal do respectivo concelho.
Página 2063
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(87)
Apreciado o assunto neste Serviço, apurou-se que o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 417/74, de 7 de Setembro, autorizara — mas não impusera — os corpos administrativos e os conselhos de administração dos serviços municipalizados e federações de municípios a conceder aos seus servidores, a partir de 1 de Julho de 1974, os aumentos de vencimentos e outras regalias que o Decreto n.° 372/74, de 20 de Agosto, atribuirá aos servidores civis do Estado.
Todavia, uma vez que o referido conselho de administração resolvera usar da faculdade que lhe fora conferida, entendeu-se que não deveria deixar de atribuir os indicados aumentos a todos os seus serventuários que se achassem em situação da qual decorresse o direito à percepção de tal beneficio; isto é, preenchidas pelos serventuários as condições legalmente exigidas, não seria legitimo que o conselho de administração recusasse a algum ou alguns deles a concessão dos aumentos a que tivessem direito, apoiando-se para o efeito em circunstâncias que a lei não considerasse releventes.
Assim, solicitaram-se ao Sr. Presidente da Comissão Administrativa do concelho em referência esclarecimentos acerca do problema em causa, designadamente sobre o teor da deliberação que tivesse sido ou viesse a ser tomada a propósito do assunto, bem como sobre se o conselho de administração dos serviços municipalizados não entendia modificar a posição anteriormente assumida acerca de tal .problema — sendo caso disso —, ainda que precedendo ao Ministério da Administração Interna, ao abrigo do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 417/74, caso se lhe suscitassem dúvidas a respeito da questão pendente.
Em resposta veio a ser comunicado a este Serviço que, em plenário de trabalhadores de 24 de Outubro de 1975, fora decidido que aos trabalhadores reformados da Previdência nto seria aplicado o aumento baseado no artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 372/74, decisão essa que fora ratificada pelo conselho de administração dos serviços municipalizados em reunião de 25 de Outubro de 1975; tomou-se conhecimento, igualmente, de que a comissão administrativa do respectivo concelho indeferira o recurso hierárquico interposto pelo reclamante, considerando as razões em que se fundamentara a deliberação tomada pelo conselho de administração dos serviços municipalizados e o parecer emitido pela consultora jurídica,, parecer esse no qual se concluía que nada impedia o aludido conselho de administração de limitar a aplicação do invocado diploma legal aos assalariados que não recebessem pensão de reforma, dentro do critério seguido pela comissão de trabalhadores.
Face ao exposto, e tendo em linha de conta o resultado da apreciação inicial feita neste Serviço a respeito do aumento em causa, solicitou-se ao Ministério da Administração Interna esclarecimento acerca da sua posição relativamente ao problema pendente (em vista do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 417/ 74), por se entender que a posição anunciada pelo conselho de administração dos serviços municipalizados e pela comissão administrativa do município em referência carecia de apoio legal. Sobre o assunto veio a pronunciar-se a Direcção-Geral da Acção Regional e Local em informação na qual concluía, igualmente, que não resultara dos Decretos-Leis n.os 372/74 e 417/74 que houvesse de restringir benefícios aos servidores das autarquias locais refor-
mados da Previdência, pelo que lhe parecia atendível a reclamação formulada pelo serventuário interessado.
Assim, recomendou-se ao conselho de administração dos serviços municipalizados que fosse reformada a deliberação anteriormente tomada em 25 de Outubro de 1975, na pprte em que excluirá do aumento de vencimentos previsto nos citados diplomas legais os seus trabalhadores reformados da Previdência, por forma a que fosse concedida ao impetrante a melhoria de vencimentos de que fora privado e a que tinha direito, nos termos expendidos por este mesmo Serviço e pela Direcção-Geral da Acção Regional e Local.
Tal recomendação foi acatada pelo aludido conselho de administração, que, por deliberação ulteriormente tomada, resolveu tornar extensiva aos seus trabalhadores reformados da Previdência a melhoria de vencimentos a que se reportavam os Decretos-Leis n.os 372/74 e 417/74.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — REMUNERAÇÃO — DIUTURNIDADES
Processo n.° 78/R-24-B-4
Apresentou reclamação neste Serviço uma auxiliar de visitadora de uma assembleia distrital, que exerce funções nos serviços materno-infantis, a qual referiu que lhe eram recusados os complementos de remunerações relativas a diuturnidades e o subsidio de almoço, nos termos dos Decretos-Leis n.° 330/76, de 7 de Março, e n.° 305/77, de 29 de Julho, com o fundamento de que não prestava serviço a tempo completo.
Acontecia que o governo civil determinara que o
horário de trabalho semanal a observar nos centros materno-infantis seria o de trinta horas e que a reclamante cumpria o horário fixado.
Ouviu-se a entidade visada acerca do caso, dizendo-se logo que, se efectivamente a reclamante prestava normal e permanentemente o horário em vigor para os centros, nada havia que levasse a concluir que a mesma não prestava o horário completo exigível para as funções exercidas, como aliás è entendido pelos pontos 3.5 e 3.5.1 da circular, série A, n.° 820, da Direcção-Geral da Contabilidade Pública.
Sugeriu-se que, sendo assim, deviam outorgar-se os direitos reclamados.
Em resposta, o presidente da assembleia distrital transmitiu a posição seguinte:
Cumpre-me informar que o horário normal de trabalho de todo o pessoal dos serviços distritais, com excepção do de secretaria, é de quarenta e cinco horas semanais.
Sucede, no entanto, que de entre esses servi-, ços se destacam os centros materno-infantis, que, pelo o seu movimento e funções específicas, não justificam um funcionamento permanente, pelo que houve necessidade de se criarem regras de uniformização a fim de que o pessoal de todos eles tivesse a obrigação de prestar o mesmo número de horas e, assim, ser todo remunerado por igual.
Para esse efeito, embora se saiba que em alguns deles tal horário é excessivamente longo
Página 2064
1076-(88)
II SÉRIE — NÚMERO 47
para as prestações sociais que realiza, se determinou que todos deveriam funcionar 30 horas semanais, incluindo o serviço interno e externo.
Deste modo o pagamento às auxiliares de visitadora corresponde ao horário fixado, que é igual para todas, tendo-se, simultaneamente, determinado que as criadas (pessoal encarregado da limpeza dos centros) teriam de prestar dezoito horas semanais de serviço, ficando, assim, também estas com um horário uniforme.
Foi, assim, com uma finalidade de uniformização e controle — visto que são diversos e se encontram distribuidos pelo distrito — que se estabeleceu um período uniforme de funcionamento para esses centros sem que isso significasse, como é lógico, que esse período não fosse a tempo parcial.
O que a circular, série A, n.° 820, da Direc-ção-Geral da Contabilidade Pública quis dizer, segundo nos parece, foi que o horário a cumprir é o estabelecido na lei geral ou legislação específica do respectivo serviço ou organismo.
Ora, sendo os centros materno-infantis um serviço especial do distrito, o horário de trabalho, a tempo completo, a cumprir pelos seus servidores é o estabelecido na respectiva legislação específica, neste caso o artigo 657.° do Código Administrativo, ainda em vigor, tendo, no! entanto, o número de horas sido reduzido para quarenta e cinco, nos termos do despacho de S. Ex.a o Ministro da Administração Interna, de 2 de Julho de 1975, publicado no Diário do Governo, n.° 187, de 14 de Agosto seguinte, sendo o despacho proferido pelo signatário a fixar em trinta horas semanais o período de funcionamento daqueles serviços apenas regulador da extensão desse tempo parcial.
E a razão de ser desse despacho filia-se no facto de se não justificar o funcionamento a tempo completo, pelo que, ao regular-se esse tempo parcial, que, aliás, já era um facto, tais serviços não deixaram por isso de ser serviços especiais do distrito e o seu pessoal sujeito, co-: mo já se referiu, em caso de funcionamento normal que se não justifica, a quarenta e cinco horas semanais.
Aliás, a não se entender assim, também as criadas, a quem se fixou um horário a cumprir de dezoito horas semanais — a maior parte das vezes para limpar uma simples sala —, teriam direito ao subsídio de almoço e a diuturnidades. Igual critério se deveria ainda aplicar ao pessoal do serviço de limpeza de instalações e outro que seja remunerado por um reduzido número de horas fixo por dia ou por semana.
Tal entendimento viria estabelecer o absurdo de se considerarem inúteis as partes finais do n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 330/76, de 7 de Maio, e do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-lei n.° 305/77, de 29 de Julho, e possibilitar que o mesmo individuo, exercendo funções em dois ou três serviços com um número de horas fixo, viesse a auferir em cada um deles diuturnidades e abono de refeição.
Em face da atitude da assembleia distrital, depois de valoração jurídica da situação, o Provedor for-
mulou àquela entidade a seguinte recomendação:
Após apreciação feita neste Serviço à reclamação apresentada pela auxiliar de visitadora dessa assembleia distrital, conclui assistir-lhe razão, pelas razões que a seguir se expõem.
Como resulta dos Decretos-Leis n.os 330/76, de 7 de Maio, e 305/77, de 29 de Julho, a concessão das diuturnidades e do subsidio de almoço está condicionada ao facto de os eventuais beneficiários prestarem serviço em tempo completo e com carácter de permanência.
A questão essencial prende-se, consequentemente, com a interpretação do sentido e alcance da expressão «tempo completo».
Diz V. Ex.a que a reclamante, prestando apenas trinta horas de serviço por semana, não cumpre a totalidade do horário fixado no artigo 657.° do Código Administrativo, ou mesmo, o horário fixado no despacho do Ministro da. Administração Interna de 2 de Julho de 1975, e, nessa medida, a mesma trabalharia a tempo, parcial e, consequentemente, era afastada das regalias instituídas pelos diplomas legais, acima referidas.
Em primeiro lugar, não há qualquer legitimidade para fazer apelo ao artigo 657.° do Código Administrativo para aquilatar do horário em vigor para os serviços do distrito.
É que o citado preceito tem aplicação, tão--somente, relativamente ao pessoal, auxiliar, especializado e operário, onde é predominante o esforço físico e escasseiam os trabalhos de natureza intelectual.
Na verdade, não faz sentiuo a referência feita a tal tipo de horário, se tivermos presente que, pelo Decreto n.° 37 118, de 27 de Outubro de 1948, o horário de serviço das. secretarias e repartições em geral passou a ser de trinta e seis horas por semana, sendo certo, ainda, que tal horário foi tornado aplicável aos serviços dos corpos administrativos (artigo 2.° do mesmo! diploma).
Por outro lado, também nos parece não merecer melhor sorte a argumentação que se extrai do facto de a reclamante não cumprir o horário fixado pelo despacho do Ministro da Administração Interna de 2 de Julho d<: 1975.
É que,' conforme flui claramente do citado despacho, através do conteúdo do mesmo visou-se, tão-somente, permitir a redução, até ao limite das quarenta e cinco horas semanais, dosj horários fixados acima de tal limite, sendo es-: tranha ao escopo do diploma. a fixação de qualquer horário para os serviços da Administração Pública.
V. Ex.a, ao fixar o horário de trinta horas para os centros materno-infantis, certamente teve em conta o grau de especialização e a gama de tarefas cometidas ao pessoal que ali desem-, penha funções.
Ora, se qualquer trabalhador executa o trabalho global exigido pelos superiores hierárquicos nesse serviço especial, dúvidas não devem existir de que o mesmo trabalhador desempenha as suas funções em regime de tempo completo.
Página 2065
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(89)
Ninguém, certamente, poderá defender a tese propugnada por V. Ex.a, relativamente aos professores do ensino secundário, só porque estes prestam o horário completo de vinte e duas ho-tas semanais.
Ainda que se pudesse entender que V. Ex.a não tivesse competência para fixar o horário nas trinta horas semanais, jamais se poderia concluir que, por tal facto, os trabalhadores que prestassem a globalidade do horário praticado se deviam considerar a tempo parcial.
Na verdade, se o horário é ilegal, o que há a fazer é colocá-lo de acordo com as normas em vigor para a fixação de horários na função pública, mas jamais, por esse facto, se pode restringir direitos a trabalhadores, que, naturalmente, são estranhos a tal circunstancialismo.
Nestes termos, dentro do espírito que presidiu à elaboração das instruções sobre a matéria pela Direcção-Geral da Contabilidade Pública (circular, série A, n.° 820, ponto 3.5.1), e considerando que a reclamante cumpre na totalidade o horário fixado para as funções que desempenha, tenho por bem recomendar a V. Ex.a que à reclamante sejam atribuídas as regalias a que tem direito — diuturnidades e subsídio de almoço —, dado que preenche os requisitos exigidos pelos diplomas que as instituíram.
A assembleia distrital retorquiu nestes termos:
Cumpre-me informar que, embora estando em oposição de pontos de vista, havia todo o interesse em dar satisfação ao que nele se recomenda.
No entanto, não é fácil, de momento, satisfazer o ponto de vista expendido por esse Serviço, porquanto não é só um caso isolado que existe nestas condições, mas vários.
Contrariamente ao que se deduz do ofício de V. Ex.a acima indicado, o pessoal dos centros materno-infantis a cargo desta autarquia não possui qualquer grau de especialização, o que torna estes serviços totalmente obsoletos, sendo esta uma das razões pela qual se está a tentar, há muito, a sua extinção ou integração nos serviços de saúde locais, dos quais são um serviço paralelo.'
Assim, não foi em razão da especialização do respectivo pessoal que se lhe fixou, e sempre assim foi, um horário reduzido, mas apenas porque o seu movimento e tarefas a desempenhar nunca justificaram um horário completo.
Além disso, há ainda as criadas, que, em face do critério proposto por V. Ex.a, igualmente teriam de passar a tempo inteiro, o que mais agravaria a situação, pois o seu trabalho re-duz-se à simples limpeza de uma ou duas salas de vez em quando.
Pelo exposto, embora haja todo o interesse em dar satisfação ao proposto por V. Ex.a, parece não ser fácil de imediato, pois o problema terá de ser resolvido na sua globalidade.
Perante a recusa da entidade visada, o Provedor insistiu assim:
O facto de os centros materno-infantis carecerem de reestruturação, ou até de extinção, não pode contender com os direitos dos funcionários que desempenhem as suas funções a tempo completo, ou seja, que executem o trabalho global exigido pelos superiores hierárquicos.
Na verdade, se os funcionários têm um regime de provimento, que lhes garante estabilidade do vínculo, isto é, se são trabalhadores permanentes, se são remunerados pela letra correspondente à sua categoria profissional e se recebem as remunerações por inteiro, não há razões válidas para os considerar a tempo parcial para efeitos da concessão do subsidio de almoço e diuturnidades.
Diferente, como é óbvio, será a situação das pessoas que se encontrem contratadas para cumprir certas tarefas ou certos serviços, que executem trabalho a tempo parcial, considerado o horário praticado.
Isto para dizer que o exemplo apontado das criadas nada justifica, em meu entender, por se tratar, segundo as circunstâncias invocadas por V. Ex.a, de pessoas que não desempenham — ao invés da reclamante — a totalidade do horário praticado no serviço.
Face ao exposto, de novo tenho por bem recomendar a V. Ex.a que à reclamante sejam concedidas as regalias a que tem direito (diuturnidades e subsídio de almoço).
Decorrido algum tempo depois da insistência do Provedor, a assembleia distrital comunicou que o problema em causa estava resolvido, tendo a reclamante passado a perceber diuturnidades e subsídio de almoço.
Pelo que, tendo sido satisfeita a pretensão da reclamante, foi arquivado o respectivo processo deste Serviço.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — REMUNERAÇÕES
Processo n.» 78/R-433-B-4
O maquinista da central eléctrica de abastecimento de água de Freixo de Espada à Cinta estava, por força do contrato que o vinculava ao respectivo Município, obrigado a prestar oito horas diárias de serviço.
Atendendo, porém, ao acréscimo de trabalho decorrente do aumento populacional verificado, exigindo o mínimo de catorze horas diárias de trabalho, a Câmara Municipal de Freixo de Espada à Cinta deliberou, em 24 de Maio de 1977, passar a pagar--lhe os sábados de tarde, domingos e feriados e ainda um subsídio de transportes.
Em 20 de Janeiro de 1978, porém, o mesmo corpo administrativo resolveu deixar dè pagar esses abonos ao queixoso, entendendo que a obrigação dele seria a de assegurar o fornecimento de água à vila, o que poderia fazer em oito horas por dia.
Página 2066
l076-(90)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Acrescentava que nunca lhe fora estipulado qualquer horário de trabalho e que de 1963 a 1976 jamais ele pedira pagamento por horas extraordinárias.
Estudado o assunto, concluiu-se que a razão estava do lado do trabalhador.
Por isso, ponderou-se à câmara municipal, por um lado, que não só o contrato de provimento do interessado fixava como período normal de trabalho o de oito horas diárias, como, ainda que assim não fosse, tal limite decorreria de aplicação do artigo 657.° do Código Administrativo.
Esclareceu-se, por outro lado, que como período de trabalho não poderia entender-se apenas o tempo em que o maquinista procedia efectivamente à bombagem da água, mas sim, ainda, nos termos gerais, todo aquele em que ele estava à disposição do Município no seu local de trabalho.
Deste modo, todo o trabalho prestado para além do normal dever-lhe-ia ser pago como serviço extraordinário (e nocturno, sendo caso disso), cabendo também abonar-lhe remuneração em relação aos domingos e feriados em que estivesse ao serviço.
Isto com base no artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 372/74, de 20 de Agosto, tornado aplicável as autarquias locais por força do Decreto-Lei n.° 417/74, de 7 de Setembro. Enfim, ser-lhe-ia também devido subsídio de transporte, ao abrigo da Portaria n.° 568/74, de 5 de Setembro.
A Câmara Municipal, por deliberação de 20 de Junho de 1978, aceitou integralmente a recomendação do Provedor, tendo depois acordado com o trabalhador numa adenda ao seu contrato em que foram explicitadas as normas por que a sua actividade se passaria a reger.
TRABALHO — ADMINISTRAÇÃO LOCAL — SANEAMENTO Processo n." 76/R-1099-B-4
Uma funcionária do Município de Olhão foi, no âmbito de um processo de saneamento, suspensa preventivamente de funções ao abrigo do n.° 1 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março, com manutenção, pois, apenas do vencimento de categoria.
Findo o prazo máximo de vigência dessa suspensão, a comissão administrativa então em funções deliberou, por recomendação da Inspecção-Geral da Administração Interna, suspendê-la de novo, agora ao a. go do artigo 594.° do Código Administrativo.
A funcionária foi mantida afastada do serviço mesmo após a cessação da vigência desta última suspensão e apesar de antes disso já um despacho do Secretário de Estado da Administração Regional e Local se ter pronunciado no sentido do levantamento da suspensão — o que a comissão administrativa explicava pelo facto de grande parte dos trabalhadores da autarquia se opor à sua reentrada em funções.
A actuação da funcionária — bem como a de outros elementos da autarquia — dera entretanto origem a um processo disciplinar, em conclusão do qual lhe foi aplicada a pena de suspensão de exercício e vencimento por cento e vinte dias.
Analisados os processos de saneamento, de inquérito e disciplinar respeitantes ao caso, formulou o
Provedor à autarquia municipal de Olhão as seguintes recomendações e censura:
Foi ilegal a medida imposta pelos órgãos autárquicos. Com efeito, o inquérito que a justificaria fazia parte de um processo de saneamento a correr no âmbito da Comissão de Saneamento e Reclassificação do Ministério da Administração Interna, surgindo, pois, sem autonomia face ao processo de saneamento. E neste a única medida de suspensão preventiva possível é a prevista no n.° 1 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março — por um período nunca superior a noventa dias —, a qual já havia sido imposta à funcionária, aliás ilegalmente prorrogada.
Face ao exposto, recomendo a V. Ex.a que se digne providenciar no sentido da revogação da deliberação do corpo administrativo que, ao rectificar o despacho do seu presidente, aplicou à ora reclamante a suspensão referida, por ilegal — incompetência dos órgãos municipais para suspender preventivamente no âmbito de processo de saneamento — e não constitutiva de direitos.
Mais recomendo que, em consequência da revogação, seja paga à reclamante a quantia respeitante ao vencimento de exercício do período fixado no artigo 594.° como máximo para a suspensão — bem como a relativa ao período iniciado com o decurso do anterior e por caducidade — e terminado na data etn que produziu efeitos a sanção disciplinar imposta.
Entendo dever censurar essa autarquia por não ter chamado a funcionária a exercer funções, bem como por a ter privado de uma parte do vencimento, a que tinha direito.
Também fez reparo à Secretaria de Estado da Administração Regional e Local por a lnspecção-Geral da Administração Interna ter recomendado à autarquia a segunda suspensão da queixosa, bem como por a comunicação a esta da pena disciplinar sofrida ter sido feita com cerca de seis meses de atraso.
A recomendação formulada veio a ser aceite.
O reparo pela actuação da Inspecção-Geral da Administração Interna foi, mais tarde, considerado sem efeito — visto que, por um lado, a Inspecção apresentou novos documentos que revelavam ter o atraso na comunicação da pena sido imputável à autarquia, e não a ela, e, por outro, o Provedor, embora continuando a considerar legalmente fundamentada a posição que assumira no tocante à segunda suspensão, admitiu tratar-se de matéria sujeita a discussão, não se revelando insustentável a actuação do referido organismo.
TRABALHO — EMPRESAS PÚBLICAS — CONCURSOS Processo n.« 76/R-1267-A-2
Por um grupo de candidatas a auxiliares de limpeza foi apresentada uma reclamação na qual alegavam que, tendo sido aberto concurso a nível interno e externo pelos Correios e Telecomunicações de Portugal, fora o mesmo concurso posteriormente anulado a nível externo, o que lhes teria causado
Página 2067
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(91)
prejuízos, quer monetários, quer morais, pois que as concorrentes tinham tido, previamente, que obter os documentos necessários para poderem concorrer.
Ouvidos os Correios e Telecomunicações de Portugal, explicitou esta empresa que o concurso externo, apesar deste qualificativo, se destinava apenas ao pessoal assalariado eventual abrangido pelo direito comum do trabalho, que, para ingressar em lugares do quadro, só o poderia fazer no âmbito desse concurso externo, uma vez que não pertencia aos quadros formais da empresa.
Admitia, porém, que este pormenor era realmente pouco explicito, pelo que o mesmo havia sido objecto de um esclarecimento publicado quatro dias após o da abertura do concurso, no Noticiário Oficial.
Não teria havido assim qualquer anulação do concurso, mas simplesmente um esclarecimento, que se tornou necessário para as pessoas que se limitaram a ler o aviso do concurso externo sem o correlacionarem com o texto do anúncio do concurso interno, onde se especificava o respectivo âmbito.
Obtida seguidamente uma melhor e mais completa informação sobre a legislação ao abrigo da qual fora aberto o aludido concurso (nomeadamente a que fundamentasse a abertura de concursos de âmbito restrito só a pessoal que a qualquer título exercesse funções dentro da empresa), sobre o número de vagas e de concorrentes ao concurso para auxiliares de limpeza em referência e sobre se ao concurso em questão teriam sido admitidas e em que número as auxiliares de limpeza que, conforme era referido pelas reclamantes, o tinham sido mediante autorização da Administração, pelo tempo de sessenta dias, sem qualquer concurso ou inscrição, para que estas unidades de trabalho ocupassem os lugares de outras efectivas nas situações de férias, doença, etc, consideraram-se pertinentes as explicações fornecidas, havendo-se mandado arquivar o processo.
De todo o modo, deu-se conta de que subsistiam dois aspectos em que, para o futuro, se justificava atentar. Assim:
a) A questão da «preferência familiar» nas ad-
missões, por ser indesejável num organismo oficial;
b) O facto de que, pelo sistema que foi utiliza-
do no concurso em causa, embora formalmente regular, se poderiam, na prática, prestar os objectivos de concursos similares, admitindo-se primeiro como assalariadas umas tantas pessoas para suprir faltas ou impedimentos temporários, sendo depois essas pessoas admitidas ao concurso restrito ao pessoal já ao serviço dos Correios e Telecomunicações de Portugal, com exclusão de outras possíveis interessadas que não trabalhassem a qualquer título na empresa, assim se comprometendo, em parte, as finalidades deste próprio segundo concurso.
Em tais termos, recomendou-se aos Correios e Telecomunicações de Portugal que estes aspectos fossem devidamente ponderados, de forma a que fosse abolida a citada condição preferencial e que o sistema vigente fosse revisto em ordem a que ou as assalariadas admitidas nas mencionadas condições não
se pudessem candidatar aos concursos internos, ou então que a sua admissão a título precário se fizesse já segundo critérios rigorosos de graduação, porventura equivalentes aos dos concursos normais.
Os Correios e Telecomunicações de Portugal vieram a informar, depois, que tal recomendação havia sido feita em conta e transmitida aos serviços competentes.
TRABALHO — EMPRESAS PÚBLICAS — REINTEGRAÇÃO Processo n.° 77/R-901-A-3
Determinado reclamante apresentou ao Provedor de Justiça, por intermédio do seu advogado, uma exposição alegando que em Dezembro de 1972 havia sido compelido a retirar-se do exercício activo de funções, passando à situação de reforma apenas com 58 anos de idade por decisão prepotente da administração da empresa (Petrogal) onde as exercia.
Mais acentuava que tal atitude determinante do seu afastamento se filiava em motivação exclusivamente política, por virtude de não esconder e antes publicamente sempre ter afirmado o seu ideário antifascista, com a agravante de ela mascarar um acto de verdadeira coacção, uma vez que a alternativa para a aceitação daquela passagem à reforma seria a do despedimento puro e simples.
O Serviço do Provedor de Justiça, perante a sugerida gravidade do condicionalismo exposto, que, a ser comprovado, exigiria reposição da justiça violada, desenvolveu imediata indagação visando o apuramento integral dos factos, o que se lhe permitiu, por a empresa em causa ser já empresa pública.
Procedeu assim a exaustivas diligências, que não somente incluíram a consulta do respectivo processo pessoal do reclamante — para o efeito pedido à Petrogal —, como a própria audição de testemunhas.
Veio, finalmente, a concluir-se, e com um grau de inequivocidade que não deixava margem a hesitações relevantes, que o afastamento do reclamante do serviço activo da empresa se não devera a qualquer pressão, preconceito ou reserva de carácter político, mas antes se inserira na necessidade sentida a determinada altura de eliminar excedentes de pessoal, ha-vendo-se utilizado como base influenciadora do critério que presidira a tal eliminação factores vários desde a deficiência de capacidade física e idade até ao menor rendimento ou competência profissionais.
Assim, dos elementos recolhidos e obtidos não resultou apurado que qualquer outro factor, para além dos que pautam usualmente a eficiência e produtividade dos quadros funcionais de uma empresa, pudesse ter determinado ou sequer influído no verificado afastamento do reclamante.
Desta sorte, e naturalmente, veio o processo a ser arquivado.
De todo o modo, ele poderá ilustrar a forma como têm sido encaradas hipóteses desta natureza, com a natural preocupação de detectar e, se caso disso, obviar a eventuais injustiças passadas e presentes.
TRABALHO — EMPRESA PÚBLICA — TRANSFERÊNCIAS Processo n.° 78/R-14S6-A-3
Um reclamante, funcionário da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses como chefe de esta-
Página 2068
1076-(92)
II SÉRIE — NÚMERO 47
ção e exercendo estas funções há cerca de sete anos num determinado posto, veio pessoalmente ao Serviço do Provedor de Justiça referir que, tendo-lhe sido inicialmente dada por aquela Companhia a garantia de permanecer naquele aludido posto, desistira de um pedido de transferência que então tinha formulado para outros lugares vagos, havendo-se fixado com o seu agregado familiar numeroso na casa que na mesma estação lhe fora destinada.
Recebera, porém, uma imposição de transferência por parte da Companhia, transferência essa a efectivar a curto prazo, o que, obviamente, lhe iria causar os maiores prejuízos, quer pelo escasso tempo concedido para a consumar, quer pela dificuldade em lograr habitação economicamente viável no novo local de exercício de funções, pois que as rendas das que procurou consumiriam praticamente o seu pouco vencimento.
Solicitava assim a intervenção do Provedor de Justiça, que pessoalmente o recebeu e pessoalmente diligenciou, de seguida, junto da administração da Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses por uma solução satisfatória, dentro do possível, para o aludido reclamante.
Em resultado dessa diligência, veio a ser obtida a informação de que o reclamante continuaria a exercer as suas funções no mesmo posto onde as vinha exercendo, não se efectivando, para já, a perspectivada transferência.
Em face da sequência dada ao caso e que se mostrava favorável à pretensão formulada pelo reclamante, veio a determinar-se o arquivamento do processo, sem se deixar, contudo, de chamar a atenção do mesmo reclamante para que o problema geral das transferências não pode deixar de ter em conta as necessidades da empresa para acudir ao preenchimento dos sectores onde eventualmente se verifique ocorrer falta de pessoal, o que, por vezes, será susceptível de colidir com as situações e os interesses individuais.
Este caso ilustrará, cré-se, com veemência, a função a um tempo solucionadora e pedagógica do Provedor de Justiça e, bem assim, o interesse que sempre concede a certos casos individuais aparentemente sem importância, mas que, talvez por isso, merecem e continuarão a merecer a sua melhor atenção, designadamente porque estas «pequenas--grandes causas» são afinal indissociáveis do quotidiano e da finalidade do seu serviço.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — ACIDENTE «IN ITINERE»
Processo n.° 76/R-13Z3-A-2
Tendo uma professora do ensino primário sofrido, quando se deslocava para a escola, um acidente de que lhe resultaram graves lesões e incapacidade para o exercício das suas funções, foi o mesmo considerado acidente em serviço, por despacho do Secretário de Estado da Instrução e Cultura de 21 de Novembro de 1973.
No decorrer do respectivo processo, porém, o então Ministério das Finanças veio a assumir entendimento diverso, entendendo que à interessada caberia o pagamento de todas as despesas que o tratamento das lesões sofridas provocara.
Em seguimento desta posição, o Secretário de Estado da Administração e do Equipamento Escolar veio, em 27 de Fevereiro de 1975, a considerar descaracterizado o acidente, revogando, pois, a inicial decisão tomada.
Tal entendimento pretendeu fundamentar-se em pareceres da Procuradoria-Geral da República de 12 de Novembro de 1969 (Diário do Governo, 2." série, de 22 de Janeiro de 1970) e de 9 de Julho de 1974 (Diário do Governo, 2." série, de 16 do mesmo mês), que a Administração interpretou no sentido de só ser de considerar acidente in itinere aquele em que se verifique um risco específico, e não apenas um risco genérico.
Apreciado o processo existente nos Ministérios em questão sobre o caso concreto, bem como a interpretação por eles feita, a propósito do mesmo, da legislação aplicável, concluiu-se não se apresentar correcta a visão da Administração.
Por um lado, já pode ter-se por dominante na jurisprudência e na própria doutrina da Procuradoria--Geral da República a ideia de que cabem na acção de acidente in itinere as situações em que se observe um risco genérico agravado.
Por outro, afigurou-se ser precisamente esse o caso da hipótese presente.
Por isso, o Provedor formulou a seguinte recomendação:
Recomendo a revogação do despacho de 13 de Fevereiro de 1975, que, sobre parecer da Di-recção-Geral da Contabilidade Pública, considerou descaracterizado o acidente in itinere sofrido pela professora Glória Pereira da Cunha Rodrigues.
O mencionado despacho apoia-se nas conclusões de um parecer da Procuradoria-Geral. da República, dado a propósito de um caso que, com o que nos ocupa, tem de comum tão-somente ser um acidente de viação, pois que nele se constata uma situação de mero risco genérico.
Pelo contrário, o acidente que vitimou a reclamante foi obviamente provocado por risco genérico agravado, subsistindo pois todos os requisitos necessários à configuração jurídica do acidente in itinere. Efectivamente:
O desastre ocorreu no percurso habitual para a escola onde a sinistrada leccionava e a tempo de iniciar as aulas da tarde;
O local onde foi atingida oferecia àquela hora e naquele dia (o da feira semanal) particular periculosidade, devido à intensidade de tráfego e à insuficiência da visibilidade provocada pelo estacionamento de veículos de transporte colectivo;
Por ter o ângulo de visibilidade diminuído por um autocarro parado, a reclamante não conseguiu evitar o atropelamento por um veículo, cujo condutor, aliás, também a não conseguiu ver antes de iniciar a ultrapassagem do referido autocarro (v. sentença do 2.° Juízo, 1.» Secção, Braga);
O atropelante, réu em processo judicial, foi absolvido, sendo a atitude da Vitima classificada como «imprudente». Contudo, a mera negligência, ou mesmo actuação culposa, da sinis-
Página 2069
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(93)
trada não prejudicou a qualificação do acidente como sendo de trabalho; Aliás, a sua atitude imprudente terá ficado a dever-se ao natural cansaço provocado pela própria natureza das funções desempenhadas no final de um extenuante ano lectivo que implicou uma diminuição das suas faculdades de atenção.
Em favor da tese de que «a nossa jurisprudência dispensa hoje o risco específico e se contenta com o risco genérico agravado» (v. parecer da Procurado-ria-Geral da República de 16 de Junho de 1976, in Boletim do Ministério da Justiça, n.° 262, Janeiro de 1977, pp. 77 e seguintes).
E, resumindo o que deixei dito, julgo que se pode no caso concreto apontar como factores de agravamento do risco do percurso:
A circunstância de o tráfego ser anormalmente intenso no local em que ocorreu o acidente, por se realizar nesse dia a feira semanal de Braga;
A habituação ao perigo que oferecia a travessia da rua naquele preciso local, dado que era ponto de passagem necessário no acesso ao estabelecimento de ensino;
A fadiga, de origem profissional, que contribuiu para o acidente, na medida em que diminuiu os reflexos da sinistrada.
Como, entretanto, a interessada recorrera, contenciosamente, para o Supremo Tribunal Administrativo, os Ministérios envolvidos preferiram aguardar o veredicto deste.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — ADIDOS Processo n.» 77/R-897-A-2
Um antigo adjunto técnico principal do quadro dos Serviços de Obras Públicas e Transportes da ex--colónia de Moçambique foi admitido no quadro geral de adidos por despacho ministerial conjunto publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 71, de 25 de Março próximo passado, com a categoria de engenheiro técnico electrotécnico de 1." classe, letra J.
Contra a atribuição desta categoria reagiu, oportunamente, o interessado, argumentando no sentido de que, não obstante ter sido promovido por escolha à categoria de adjunto técnico principal, letra H, ulteriormente ao início de funções do Governo Provisório da ex-colónia de Moçambique, a verdade é que tal promoção se processou de inteira harmonia com o disposto nas pertinentes normas do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, aprovado pelo Decreto n.° 46 982, de 27 de Abril de 1966, e do diploma orgânico dos Serviços de Obras Públicas e Transportes do Ultramar, aprovado pelo Decreto n.° 470/72, de 23 de Novembro, designadamente no artigo 67.°, n.os 1 e 2, e nos artigos 26.° e 27.°, respectivamente, pelo que correspondeu ela a uma normal expectativa de promoção, ressalvada, portanto, pelo disposto na parte final da alínea a) do n.° 1 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24
de Abril, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 819/76, de 12 de Novembro.
Não foi, porém, esse o entendimento do Ministro da Reforma Administrativa e do Secretário de Estado da Administração Pública, pois aquela reclamação acabou por ser indeferida por despacho conjunto de 16 de Setembro de 1977.
2 — Da informação do Serviço Central de Pessoal e parecer do Sr. Director do mesmo Serviço, preparatórios deste despacho, pôde concluir-se terem sido determinantes da decisão os seguintes considerandos:
2.1 — O provimento no cargo de adjunto técnico principal ocorreu na vigência do Governo de Transição de Moçambique;
2.2 — Não obedeceu ele às formalidades de prévio concurso, e
2.3 — Fundamentou-se em legislação promulgada pelo mesmo Governo de Transição — Decreto n.° 4/75, de 3 de Junho. Ponderou-se, ainda, que, em face do disposto no Decreto-Lei n.° 49 410, de 24 de Novembro de 1964, não poderia ter sido atribuída ao reclamante outra categoria que não fosse a correspondente à letra J, uma vez que ao cargo de adjunto técnico de 1.a classe, no qual fora provido em plena vigência da administração portuguesa e antes de ter sido promovido, por escolha, a adjunto técnico principal, corresponde, directamente, a actual designação de engenheiro técnico de 1.a classe, segundo as designações e letras constantes do Decreto-Lei n.° 49 410.
3 — Esta argumentação parece, todavia, de duvidosa validade, porquanto:
3.1 — As promoções dentro de cada quadro dos serviços públicos das ex-colónias eram reguladas pelos diplomas orgânicos de cada um desses serviços, sem prejuízo do disposto na secção vi do capítulo li do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino — § 3.° do artigo 67.° do mesmo Estatuto —, considerándole como promoção o provimento de funcionário em lugar de classe ou categoria superior do quadro a que pertencesse — corpo do mesmo artigo.
3.2 — O provimento dos lugares de adjunto técnico principal do quadro do pessoal técnico dos serviços de obras públicas e transportes do antigo ultramar, contrariamente ao que sucedia quanto ao provimento dos lugares de adjunto técnico de 1.a e 2.a classes, não obedecia à formalidade de concurso prévio, pois era efectuado por escolha, em função do tempo de serviço e das informações anuais — artigos 26.° e 27.° do Decreto n.° 470/72, de 23 de Novembro —, normas estas que não contrariavam qualquer das disposições legais insertas na referida secção vi do capítulo li do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino.
3.3 — Em 8 de Abril de 1975, o reclamante completou três anos de serviço como adjunto de 1.a classe, letra I.
3.4 — Vinha desempenhando, desde 2 de Janeiro de 1973, em regime de substituição e sempre com informação anual de Muito bom, o cargo de técnico de 1.a classe, letra F, na chefia do departamento do parque, armazéns e oficinas dos serviços, cargo este que, de harmonia com o preceituado no n.° 3 do artigo 22.° daquele Decreto n.° 470/72, deveria ser normalmente ocupado por funcionário habilitado com o curso superior de engenharia mecânica.
Página 2070
l076-(94)
II SÉRIE — NÚMERO 47
3.5 — Por via disso e do disposto no artigo 27.° do diploma orgânico dos seus serviços, terá ele de ser considerado em normal expectativa de promoção a partir de 8 de Abril de 1975.
3.6 — A promoção do reclamante à categoria de adjunto técnico principal, em 21 de Junho de 1975, obedeceu aos imperativos legais do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino e do Decreto n.° 470/72, sendo, portanto, menos correcto afirmar-se que ela só foi possível por força do Decreto n.° 4/75, de 3 de Junho, do Governo de Transição de Moçambique.
Deve acentuar-se que o artigo 1.°, n.° 1, desse decreto em nada veio alterar a situação do reclamante, uma vez que, como acima se salientou, o provimento dos lugares de adjunto técnico principal era já anteriormente feito por escolha, nos termos do artigo 27.° do Decreto n.° 470/72, sendo inteiramente irrelevante o facto de a promoção do mesmo reclamante se ter efectuado pouco tempo antes da data marcada para a independência de Moçambique.
3.7 — Dai que esse provimento tivesse correspondido a uma normal expectativa de promoção e tivesse resultado de um acto administrativo conforme com as normas do Decreto n.° 46 982, de 27 de Abril de 1966, e do diploma orgânico dos serviços de obras públicas e transportes do ex-ultramar português; daí que, por lei — alínea a) do n.° 1 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, na sua actual redacção —, tenha de ser salvaguardado.
3.8 — A categoria de adjunto técnico principal encontrava-se prevista para os quadros de pessoal do Ministério das Obras Públicas e do Ministério das Comunicações, como pode ver-se do mapa anexo ao Decreto-Lei n.° 49 410, de 4 de Novembro de 1969.
Actualmente existe ainda nos quadros de pessoal afectos à Secretaria de Estado das Obras Públicas.
Nos serviços dependentes da Secretaria de Estado dos Recursos Hídricos e Saneamento Básico é que a antiga designação de adjunto técnico principal foi substituída pela de engenheiro técnico principal, mas a categoria a ela correspondente conservou-se, e é a mesma, letra H.
Nestes termos, e tendo em conta o disposto no n.° 1 do Decreto-Lei n.° 356/77, de 31 de Agosto, em matéria de competência para rectificação das categorias dos adidos, recomendou-se ao Ministério da Reforma Administrativa que se dignasse ordenar que o assunto fosse revisto, em ordem a assegurar-se uma aplicação correcta e justa da lei ao caso do reclamante.
Aquele Ministério aceitou a recomendação formulada, assim se satisfazendo a pretensão que dera origem ao processo.
Processo n.° 78/R-138-A-2
Determinada reclamante havia sido admitida como empregada, assalariada eventual, do departamento de lotarias da Comissão Provincial de Assistência Pública da ex-colónia de Moçambique, com o vencimento mensal correspondente à letra L do § 1.° do artigo 91.° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, por despacho de 30 de Setembro de 1972 do respectivo Provedor-Geral.
Naquele departamento prestou serviço e com a referida categoria de 2 de Outubro de 1972 a 31 de Dezembro de 1974, tendo, a partir de 1 de Janeiro de 1975, passado a exercer as funções de operadora--chefe — ietra I — do mesmo departamento, no exercício delas se havendo mantido, após a independência daquele território, até 31 de Março de 1976, em cumprimento de um contrato de prestação de serviços celebrado ao abrigo do acordo assinado em 7 de Maio de 1975 pelo Estado Português com a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo).
Em Í9 de Setembro de 1975, porém, requerera, por intermédio dos serviços da Embaixada de Portugal na cidade de Lourenço Marques (hoje Maputo), o seu ingresso no quadro geral de adidos.
Tal pretensão veio, porém, a ser indeferida, por despacho conjunto de 3 de Março de 1977 dos Secretários de Estado da Integração Administrativa e da Administração Pública, com o fundamento de que, como funcionária da Empresa de Lotaria de Moçambique, não ter qualquer vínculo que a ligasse à função pública.
Exposto que foi o caso ao Serviço do Provedor de Justiça, e indagado e averiguado que foi nas suas incidências, foi apurado que:
A Comissão Central de Beneficiência Pública da ex-colónia de Moçambique fora autorizada pela Portaria n.° 2105, de 8 de Outubro de 1914, a emitir até seis lotarias em cada ano, de harmonia com os planos que fossem efectivamente aprovados pelo Governador Geral, sendo o produto líquido das comissões destinado a repartições e à assistência pública.
Pelo artigo 1.° da Portaria n.° 367, de 5 de Fevereiro de 1917, fora autorizada essa mesma Comissão Central a transferir para outrem, durante dez anos, a concessão de emissão de lotarias em Moçambique, o que veio a concretizar-se com a celebração ce um contrato com a Sociedade Moçambicana de Lotarias, S. A. R. L., com sede em Lourenço Marques.
O prazo de concessão foi vindo sucessivamente a ser renovado, até que em 3972 o respectivo contrato foi rescindido, passando a Comissão Central de Beneficência a explorar directamente a sua lotaria, como, aliás, sucedera já no período de 1914 a 1917.
Foi em consequência disso que houve necessidade de admitir mais pessoal e daí o recrutamento da reclamante.
Perante o contexto assim tracejado pôde este Serviço firmar entendimento no sentido de que:
O facto de a reclamante ter sido empregada da Sociedade Moçambicana de Lotarias — o que aliás não logrou ser apurado — seria totalmente irrelevante para a caracterização do vínculo que a partir de 2 de Outubro de 1972 passou a ligá-la à Comissão Provincial de Assistência Pública de Moçambique.
O que antes se permitiria concluir é que a reclamante teria de ser considerada como agente vinculada ao Estado em 22 de Janeiro de 1975, contando, como contava, nessa data mais de um ano de serviço efectivo e ininter-
Página 2071
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(95)
rupto, reunindo assim todas as condições legais para poder ingressar no quadro geral de adidos [alínea a) do n.° 1 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril]. " Assim, o despacho ministerial conjunto que indeferira a pretensão da reclamante enfermaria do vício de evolução da lei.
Nestes termos se recomendou ao Sr. Ministro da Reforma Administrativa que determinasse a revisão do caso, por forma a repor-se a legalidade que se considerava violada.
Tal recomendação foi integralmente aceite, havendo, em consequência, sido autorizado o ingresso da reclamante no quadro geral de adidos, na categoria de primeiro-oficial e com efeitos a partir de 1 de Abril de 1976, tendo-se, de seguida, arquivado o processo por integral satisfação da pretensão formulada.
Processo n.° 78/R-1240-A-2
Uma ex-funcionária da Câmara Municipal de Bile-ne-Maria (Moçambique) apresentou queixa por não ter sido integrada no quadro geral de adidos, com o fundamento de não o haver requerido até 24 de Junho de 1977. Instada pelos serviços a explicar por que razão não respeitara esse prazo, a interessada declarara, juntando documentos comprovativos, que após aquela data obtivera, devidamente legalizados pelas autoridades da República Popular de Moçambique, os elementos indispensáveis para demonstrar a sua efectividade de serviço nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, factor sem o qual a sua pretensão seria liminarmente rejeitada. Esta justificação não fora, contudo, aceite pela Administração.
Analisado o processo do Serviço Central de Pessoal relativo à interessada, recomendou-se ao Ministro da Reforma Administrativa que reapreciasse a decisão sobre o assunto tomada.
Na verdade, por um lado, a requerente provava que fora forçada, por seu marido haver sido ameaçado de morte, a abandonar precipitadamente Moçambique, tendo desde a chegada a Portugal diligenciado pela obtenção da documentação necessária para comprovação da efectividade, a qual só lhe veio a ser passada em 20 de Junho de 1977 — esgotado já, portanto, o prazo de apresentação dos pedidos de ingresso no quadro geral de adidos. Entendeu-se estar suficientemente caracterizado, assim, nos termos da lei geral, um justo impedimento para apresentação do requerimento, o qual, desacompanhado daquela prova, não teria qualquer viabilidade.
Mas mais: considerou-se mesmo que não teria apoio legal a invocada cessação do prazo de apresentação do requerimento. É que este dera entrada em 20 de Outubro de 1978, data em que vigorava o Decreto-Lei n.° 356/77, de 31 de Agosto, em cujo artigo 1.°, n.° 2, alínea d), se permitia aos interessados nas condições da queixosa a apresentação de requerimento até noventa dias após o início da vigência desse diploma.
É certo que o Decreto-Lei n.° 497/77, de 26 de Novembro, viera, posteriormente, e com efeitos retroactivos em relação à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 356/77, dispor que aquele prazo de
noventa dias valeria «quando for justificada e comprovada documentalmente a impossibilidade de apresentação de requerimento dentro dos prazos anteriormente fixados».
Contudo, afigurou-se que, por aplicação das normas gerais constantes do n.° 1 do artigo 12.° do Código Civil, o facto de apresentação do requerimento no domínio da primitiva redacção do preceito em causa provocara, desde logo, que o interessado ficasse subtraído ao ónus de prova imposto pela lei posterior, ainda que retroactiva.
Este entendimento do Provedor de Justiça veio a ser aceite pelo Secretário de Estado da Administração Pública.
Contudo, não foi deferido o pedido da interessada, por afinal se verificar que o documento comprovativo da efectividade não estava devidamente legalizado pela autoridade consular portuguesa.
Em vista disso, comunicou-se à queixosa que deveria diligenciar obter essa legalização, arquivando-se o processo, sem prejuízo da possibilidade de posterior reabertura.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — CAPACIDADE FÍSICA Processo n.° 78/R-462-B-1
Um funcionário do actual Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica queixou-se de, por altura da mudança de instalações daquele departamento, haver sido deslocado para serviço diferente das suas anteriores funções, ficando com trabalhos pesados para a sua idade e saúde.
Ouvido sobre o caso, o referido Instituto informou que o reclamante é auxiliar do seu quadro do pessoal auxiliar, lugar em que foi provido ao abrigo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 131.° do Decreto-Lei n.° 633/76, de 28 de Julho (lei orgânica do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica).
Não estando definidas naquele diploma ,as funções que competem à mencionada categoria, as tarefas que hoje estão distribuídas aos auxiliares do Instituto são as seguintes:
a) Prestar serviço no refeitório e no bar, onde
executam tarefas de descascar batatas, escamar peixe, empratar refeições, fazer sanduíches, servir cafés e outros trabalhos análogos;
b) Um auxiliar, colocado nas Penhas Douradas,
executa tarefas de contínuo.
Sendo solicitado para precisar melhor os trabalhos do que o reclamante- se acha incumbido, o Instituto respondeu que a tarefa diária àquele atribuída consiste no seguinte:
Dobragem de vinte e cinco boletins diários (com o peso de 30 g cada um) e colocação das respectivas cintas;
Colagem de oitenta cintas iguais; Transporte, em carrinho de rodas ou em mão, utilizando em qualquer dos casos os elevadores, de rolos dos citados boletins para a portaria do edifício;
Ocasionalmente, colecciona publicações (formato A4) executadas nas oficinas do Instituto.
Página 2072
1076-(96)
II SÉRIE - NÚMERO 47
Ao serem distribuídas ao reclamante estas tarefas, teve-se em conta a sua condição física e a sua idade, pelo que, além de leve, a maior parte do trabalho é realizado na posição de sentado.
Perante a exposição do Instituto e a evidente ausência de conduta incorrecta da sua parte, arquivou--se o processo deste Serviço e ponderou-se ao queixoso que, se as suas condições físicas não suportam realmente o seu trabalho, o caso só poderá ser resolvido mediante o regime da situação de invalidez.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — CARREIRAS Processo n.» 77/R-963-A-2
Determinado reclamante, operador de telecomunicações aeronáuticas sénior, queixou-se a este Serviço por ter sido incluído na lista nominativa publicada no Diário da República, 2." série, de 7 de Agosto de 1978, com esta categoria (letra H), enquanto um seu colega, que se encontrava em situação semelhante, havia sido incluído como operador de estação aeronáutica (letra C).
Havendo sido noticiado que tinha sido instaurado um inquérito para a averiguação deste condicionalismo, foi solicitada informação à Direcção-Geral da Aeronáutica Civil.
Esta reconheceu que, por erro da administração, havia sido reconhecida ao funcionário incluído como operador de estação aeronáutica a validade da sua licença de operador de estação aeronáutica, contrariando o disposto no anexo da organização da Aviação Civil Internacional, que exige a experiência recente (nos últimos seis meses) em estação de serviço fixo, requisito que aquele funcionário não satisfazia; todavia, havendo decorrido os prazos legais da revogação do acto e do recurso contencioso, a situação tornou-se difinitiva e inatacável, vindo o aludido funcionário a beneficiar desse erro.
Disso não aproveitou o reclamante, ao qual não sendo reconhecida a validade da respectiva licença, por falta do requisito «experiência recente», foi incluído na sua categoria própria.
Com efeito, e sob um prisma legal, concluiu-se que havia sido correcta a exclusão do reclamante da categoria em que o seu colega havia sido incluído.
De todo o modo, não deixou de se considerar lamentável que, com base em erro deste tipo, tenha ocorrido uma nomeação ilegal (porventura até não constituindo caso isolado), havendo, por isso, o Provedor de Justiça formulado à Direcção-Geral da Aeronáutica Civil reparo em conformidade, designadamente para prevenir futuramente situações desta natureza.
Processo n." 77/R-1368-A-2
Por determinada interessada, funcionária do IARN, foi exposta a situação seguinte:
Exercendo desde 17 de Setembro de 1975 funções naquela entidade para a qual havia entrado como estagiária finalista do curso de serviço social, foi-lhe atribuída, na falta de categoria própria, a de catalogadora.
Em Julho de 1976, havendo finalizado o respectivo curso, entregou o correspondente certificado de habilitações, solicitando que lhe fosse atribuída a categoria de técnica de serviço social, já que vinha desempenhando tais funções e possuía os requisitos necessários para preencher tal categoria.
O pedido não foi satisfeito.
Ouvido o IARN sobre o assunto, entendeu esta entidade informar que:
Dispõe de um quadro extremamente limitado, tendo a grande maioria do seu pessoal sido admitido na qualidade de tarefeiros ou assalariados eventuais e sem que as suas habilitações fossem factor determinante da sua colocação;
Foram, é certo, surgindo problemas com as reclassificações solicitadas em função das habilitações possuídas pelos interessados; todavia, e em face da perspectivada reestruturação dos serviços que irá ocorrer com a aprovação da lei orgânica do Comissariado, decidira o Alto-Comissário só efectivar as reclassificações quando se concretizasse a referida reestruturação, a qual envolverá, aliás, substancial redução de pessoal;
Essa a razão de não haver sido despachado nenhum dos pedidos nas condições do formulado pela reclamante.
Foi este condicionalismo transmitido à reclamante, arquivando-se o processo.
De todo o modo e tendo em atenção o carácter genérico da questão focada — da qual o caso concreto constituía um exemplo significativo —, aproveitou-se a oportunidade para recomendar ao Alto--Comissário para os Desalojados que na noticiada restruturação fosse tido em conta que a designação das categorias deveria corresponder às funções desempenhadas e aos respectivos vencimentos, quer se tratasse de pessoal pertencente aos quadros, quer não, nos termos da regulamentação vigente, designadamente o artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 49 410, de 24 de Outubro de 1969.
Processo n.° 78/R-43-A-2
Um grupo de funcionários da então Secretaria de Estado da Integração Administrativa protestou contra o teor do Decreto-Lei n.° 442/77, de 26 de Outubro, regulador de reclassificação nos respectivos quadros, bem como da forma por que o mesmo estava sendo aplicado.
Discutiam, nomeadamente, que nesse diploma se tivesse estabelecido o mérito como primeiro factor a ter em conta na reclassificação, o que seria contrário à vontade da maioria dos trabalhadores, que se haveria manifestado pelo critério da antiguidade.
Quanto à aplicação do diploma, referiam que, na apreciação do mérito, se não teria atendido às informações dos superiores, e que, em caso de igualdade relativamente ao mérito, não teriam sido levados em conta, em violação da lei, nem a antiguidade nem as habilitações.
Página 2073
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(97)
Ouvido o Ministério da Reforma Administrativa, recebeu-se deste extenso relatório relativo à génese e à aplicação do Decreto-Lei n.° 442/77.
Através da sua apreciação se pôde verificar que, por meio de operações por vezes laboriosas e demoradas, se haviam genericamente rejeitado as normas de reclassificação legalmente previstas.
Entendeu-se, pois, que não caberia qualquer intervenção relativa às listas de provimento de pessoal, entretanto já publicadas, visto se afigurar que na sua elaboração se havia obedecido aos critérios gerais constantes do diploma em causa.
Comunicou-se, pois, aos reclamantes que, se algum ou alguns deles se tivessem por ilegalmente prejudicados, lhes restaria apresentar recurso individual do respectivo acto de provimento.
Mas ponderou-se ao Ministério que o sistema de livre escolha, em que fundamentalmente assentava o processo de reclassificação do Decreto-Lei n.° 442/77, não é o mais adequado, por não se apresentar suficientemente objectivo, pelo que se recomendou a reformulação do mesmo, se, porventura, se interpretasse o diploma (o que não era líquido) no sentido de ter eficácia duradoura, e não apenas transitória.
O Ministério retorquiu que, de facto, a eficácia do diploma se esgotara com a reclassificação operada, pelo que a sua eventual aplicação futura estaria fora de causa.
Processo n.° 78/R-287-A-2
Um trabalhador do Solar do Vinho do Porto insurgiu-se pelo facto de haver sido reclassificado, ao operar-se o provimento do quadro privativo daquela instituição, como escriturário de 1." classe, enquanto outro elemento, que teria inferiores habilitações e menor tempo de serviço, o fora como chefe de secção. Mais referiu que, tendo apresentado duas exposições sobre o assunto, a primeira fora indeferida e a segunda, dirigida ao Secretário de Estado do Comércio Externo, não obtivera qualquer resposta.
Auscultado sobre o assunto o Instituto do Vinho do Porto, e analisado o processo de reclassificação do pessoal utilizado para preenchimento do quadro do Solar do Vinho do Porto, verificou-se que as regras aplicadas constavam de meros despachos internos, tendo-se sobretudo tido em conta a antiguidade no próprio serviço do Solar.
Ora, o queixoso só em 1974 passara a fazer parte do quadro privativo do Solar, já que anteriormente nele se encontrava a trabalhar, sim, mas em regime de comissão, pois pertencia ao quadro do Instituto do Vinho do Porto, cuja reclassificação de pessoal fora independente da do referente ao Solar.
O outro elemento encontrava-se integrado no quadro privativo do Solar desde 1966.
Afigurou-se, pois, que a actuação da Administração não era passível de censura, pois se aplicara um critério objectivo e aceitável para a reclassificação do pessoal.
Quanto ao seguimento do recurso apresentado ao Secretário de Estado do Comércio Extermo, o Instituto respondeu que não lhe dera seguimento, por a primeira exposição ter sido objecto de indeferimento.
Recomendou-se, a este respeito, ao Secretário de Estado que proferisse despacho sobre o recurso,
fundamentando-o nos termos da lei, para permitir que o interessado dele pudesse recorrer, querendo.
De facto, a circunstância de a primeira exposição, dirigida ao Instituto, ter sido indeferida, não podia justificar a falta de decisão (e devida comunicação 1 ao funcionário) sobre a sua segunda exposição, dirigida ao Secretário de Estado.
Processo n.° 78/R-621-A-2
Um contínuo, encarregado de cuidar dos jardins do Instituto Nacional de Estatística, reclamou por se considerar prejudicado em virtude de não ter sido provido como escriturario-dactilógrafo, ao contrário de quatro outros colegas seus, com menos tempo de serviço que ele.
Acrescentou que lhe era sistematicamente recusado o pagamento de hotas extraordinárias, embora preste habitualmente mais serviço que o normal, atendendo à natureza do trabalho de que é incumbido.
Contactado o Instituto, pôde apurar-se que a passagem dos contínuos a escriturarios-dactilógrafos se dera em 1975, no âmbito da reestruturação desse organismo, e se fizera sobre proposta dos trabalhadores daquela categoria, com a qual a comissão directiva concordara.
Não houve, pois, qualquer concurso, pois a lei não o exigira.
Embora não fosse indiscutível o sistema utilizado, entendeu-se nada mais se poder fazer, dado estar-se perante actos constitutivos de direitos, aliás conformes às disposições legais transitórias aplicáveis.
Quanto ao pagamento do serviço extraordinário, o Instituto respondeu tratar-se de questão que de facto se vinha arrastando, por ser difícil fazer o cômputo das horas nesses termos prestadas pelo interessado.
Existia mesmo declaração dos respectivos serviços de contabilidade e património, afirmando que, desde Novembro de 1974, e com excepção do mês de Agosto de 1975, o queixoso não constava da lista do pessoal a abonar por serviço extraordinário.
Agora, porém, o Instituto terminou por informar que já tinha sido dado inicio ao processamento das horas extraordinárias devidas.
Em face desta última indicação, o processo foi arquivado, sem prejuízo de eventual reabertura, se o abono do serviço extraordinário não viesse a efecti-var-se.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — CESSAÇÃO DE FUNÇÕES
Processo n.° 76/R-1313-A-5
1 — Uma enfermeira de nacionalidade francesa, diplomada pela École d'Infirmières du Centre Hospitalier Universitaire de Nancy, para poder exercer a sua profissão em Portugal, obteve uma autorização provisória, emitida pela Direcção-Geral dos Hospitais. Ao abrigo dessa autorização foi admitida, com a categoria de enfermeira de 2.a classe, ao serviço do Hospital de Santo António, então integrado na Santa Casa da Misericórdia do Porto.
2 — Em 14 de Outubro de 1974 foi-lhe concedida autorização para trabalhar como enfermeira em Por-
Página 2074
1076-(98)
II SÉRIE — NÚMERO 47
tugal pelo período de dois anos, nos termos do Decreto-Lei n.° 49 173, de 5 de Agosto de 1969.
Essa autorização era válida até 14 de Outubro de 1976.
Por despacho de 15 de Outubro de 1975 do então Secretário de Estado da Saúde, nos termos do artigo 5.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 49/73, foi aquela autorização prorrogada por dois anos.
3 — No termo da primeira autorização concedida (14 de Outubro de 1976) foi comunicado verbalmente à enfermeira em questão pela Comissão Instaladora do Hospital que seria desligada do serviço a partir dessa data, com o fundamento de que a sua admissão fora autorizada nos termos da autorização da Direcção-Geral dos Hospitais — a titulo condicional e pelo prazo de dois anos para exercer a profissão de enfermeira em Portugal, não se podendo assim falar de despedimento, como a referida enfermeira alegava na queixa apresentada ao Provedor de Justiça, mas de «resolução por cumprimento integral do contrato feito com aquele Hospital».
Averiguou-se, porém, que a citada autorização da Direcção-Gcral dos Hospitais estava unicamente condicionada à prova de que a enfermeira em causa se encontrava habilitada com diplomas de escolas oficialmente reconhecidas no respectivo país.
Mais se averiguou terem sido os referidos diplomas oportunamente apresentados, ficando assim perfeita a condição e válida por dois anos a citada autorização (aliás, a admissão da reclamante fora posteriormente à apresentação daqueles documentos, pelo que não podia ficar sujeita à condição).
Considerou-se, assim, que a enfermeira em causa fora admitida para prestar serviço no Hospital Geral de Santo António nos termos da autorização que lhe fora concedida para r rcer a sua profissão em Portugal e que esta, eii.^ora por dois anos, fora posteriormente prorrogada, pelo que se recomendou a anulação da dispensa de serviço da reclamante.
Aceitando a recomendação, foi por despacho de 30 de Maio de 1978 do Secretário de Estado da Saúde anulada, por vício de violação de lei, a dispensa de serviço da reclamante, e esta reintegrada no serviço.
Ainda de acordo com a recomendação do Provedor de Justiça, por despacho de 25 de Agosto de 1978 do mesmo Secretário de Estado, foi mandado pagar àquela enfermeira, a titulo de indemnização, os vencimentos correspondentes ao período em que, por ter sido indevidamente afastada do Hospital, estivera desempregada.
trabalho — FUNÇÃO PÚBLICA — COLOCAÇÕES Processo n." 77/R-l I86-A-2
Por um reclamante foi exposto ao Provedor de Justiça o condicionalismo seguinte:
Em Abril de 1976 havia concorrido para o lugar de aspirante de finanças, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 48 405, de 29 de Maio de 1968, tendo tomado conhecimento, através do Diário da República, de ter sido aprovado para colocação.
Decorrido um ano e respondendo a ofício da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos,
declarou estar interessado no lugar a que havia concorrido, tendo nessa altura preenchido os requisitos inerentes, nomeadamente a indicação dos locais onde desejaria prioritariamente ser colocado. Acabou, porém, por ser informado de que havia sido colocado em Alenquer, local que não havia indicado no seu pedido de colocação. Na tentativa de esclarecer as causas que haviam determinado tal colocação, ter-lhe-ia sido explicado por um funcionário dos serviços de administração da Direcção-Gerai das Contribuições e Impostos que nas duas primeiras localidades das cinco que havia indicado haviam sido colocados concorrentes com classificações mais altas, o mesmo porém não tendo acontecido no tocante à terceira, onde só por lapso havia sido colocado outro candidato.
Obtida da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos informação a respeito do caso, veio a verificar-se que a não colocação do reclamante numa das localidades que indicara e a colocação de um outro se devera efectivamente a lapso dos serviços, não existindo porém solução imediata, dado que as nomeações já haviam sido visadas pelo Tribunal de Contas, Ficando todavia de pé a hipótese de após o início de funções vir a promover-se a transferência do interessado para um dos concelhos da sua região.
Em face deste condicionalismo e tendo em conta o disposto no artigo 65.° do Decreto n.° 45 095, de 29 de Junho de 1963, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 578/71, de 22 de Dezembro, e sendo certo que os próprios serviços reconheceram ter havido lapso na colocação do interessado, tendo contudo o reconhecimento desse lapso tido lugar antes da publicação da lista de nomeações — pelo que o acto de nomeação podia e devia ter sido corrigido, através da adaptação da lista de colocações ou até, se necessário, da sua revogação —, recomendou-se ao director-geral das Contribuições e Impostos, com conhecimento ao Gabinete do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, que, sempre que se verifiquem lapsos da natureza do ocorrido, devem ser corrigidos os respectivos actos que os consubstanciam, recorrendo-se, inclusive, à sua revogação nos termos legais.
Contudo, no tocante ao caso concreto e uma vez que o próprio reclamante se declarou razoavelmente satisfeito com a hipótese de transferência, não foi tido como oportuno fazer recomendação no sentido da revogação da nomeação, o que, aliás, poderia determinar uma série de transferências em cadeia, com os óbvios inconvenientes.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — CONCURSOS
Concurso de professores eventuais e provisórios dos ensinos preparatório e secundário de 1977-1978
O Serviço do Provedor de Justiça recebeu, até 7 de Março de 1978, setenta e três queixas relativas ao concurso de 1977-1978, de professores eventuais e provisórios dos ensinos preparatório e secundário.
Página 2075
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(99)
Dada a urgência do assunto, e atendendo a que as primeiras respostas recebidas da Direcção-Geral (de Pessoal se não afiguraram suficientemente elucidativas, o Provedor de Justiça promoveu, em conjunto com o Secretário de Estado da Administração Escolar, a análise directa de cada um dos processos em questão, no Serviço Permanente de Concursos (algumas queixas chegadas depois da data mencionada vieram a ser tratadas individualmente).
Nessa diligência, que teve lugar nos dias 7 a 10 e 17 de Março de 1978, tomaram parte o adjunto do Secretário de Estado e dois elementos do Serviço do 'Provedor de Justiça.
Embora ainda em fase de instalação, decorrente de recente mudança, afigurou-se, na breve visita geral efectuada, que o Serviço Permanente de Concursos se encontrava então aceitavelmente organizado, por forma a poder preencher as finalidades a que se destina.
Isto se confirmou, aliás, no âmbito da apreciação dos processos relativos às queixas apresentadas ao Provedor de Justiça.
Com efeito, a respectiva documentação encontrava-se ordenada em termos de ser facilmente encontrada, proporcionando, através da análise dos elementos que a compõem (fichas, boletins de inscrição, listas provisórias e definitivas de admissões e processos das escolas), uma visão clara e objectiva de cada caso.
Note-se, a propósito, que foi possível detectar e compulsar os processos de todos os reclamantes — o que infelizmente não sucedera em relação ao concurso de 1976-1977.
Das setenta e três queixas recebidas, seis tinham já, à data da visita, sido apreciadas e decididas pelo Serviço Permanente de Concursos, havendo-se apurado que não eram fundamentadas.
Foi possível, no decurso da diligência, detectar outros seis casos de indevida colocação ou exclusão do concurso — situações essas que o Serviço Permanente de Concursos se prontificou a reparar imediatamente. Observe-se, aliás, que não se tratava de irregularidades resultantes de qualquer actuação censurável daquele departamento, mas sim de lapsos na apreciação dos processos ou na graduação dos interessados.
As restantes sessenta e uma queixas não mereciam provimento à face da lei vigente ou exigiam a obtenção de esclarecimentos de outras entidades que não o Serviço Permanente de Concursos.
Assim, em dezasseis casos os candidatos haviam correctamente sido excluídos do concurso, dez deles por não terem preenchido devidamente o boletim e os outros seis por não perfazerem os requisitos de admissão.
Em relação aos restantes quarenta e cinco que não obtiveram colocação, ou não a conseguiram na(s) escola(s) pretendida(s), pôde verificar-se que trinta e nove casos haviam sido correctamente tratados pelos Serviço Permanente de Concursos, quatro deles exigiam o pedido de esclarecimentos suplementares das escolas — nomeadamente quanto a alegado envio não atempado de vagas — e os outros dois só poderiam ser cabalmente considerados após consulta à Direcção-Geral do Ensino Secundário, por apresentarem incidências também com o concurso para estágio.
Parece legítimo afirmar que se deveu a falta de informação dos interessados e dos conselhos directivos, não só parte apreciável das exclusões do concurso e da não colocação nas escolas, distritos ou zonas pretendidos, como ainda grande número das reclamações infundadamente apresentadas.
De qualquer modo, é desejável que se proceda ¡sempre a uma acção de esclarecimento dos candidatos e dos conselhos directivos, porventura através dos órgãos de comunicação social, quanto àqueles, e em reuniões suscitadas pelo Ministério, no tocante a estes últimos.
Para o concurso seguinte, o Ministério preparara já, em ordem a obviar a casos destes, folheto informativo sobre a legislação e normas regulamentares aplicáveis.
Grande número dos concorrentes que se queixaram ao Provedor de Justiça alegaram que haviam, nos termos legais, apresentado várias reclamações ao Ministério, umas dirigidas ao Director-Geral de Pessoal, outras ao Ministro ou ao Secretário de Estado da Administração Escolar, não havendo recebido qualquer resposta.
Tendo-se feito uma indagação por amostragem no Serviço Permanente de Concursos, pôde apurar-se que tais afirmações em parte se confirmavam.
Concretamente, terá sido dada resposta (embora por vezes não suficientemente elucidativa) à generalidade das reclamações respeitantes à chamada primeira fase do concurso. No que concerne às relativas à 2.a fase, havia bastantes casos de falta de resposta.
Esta situação — sem dúvida indesejável — ter-se-á ficado a dever, em larga medida, ao elevadíssimo número de reclamações recebidas, a que o Serviço Permanente de Concursos terá tido de fazer face com um contingente relativamente limitado de pessoal, ao mesmo tempo que se continuavam a processar os normais trâmites do concurso.
Chamou-se a atenção do Ministério para a necessidade de todas as reclamações passarem a ser respondidas. O departamento indicou que para 1978-1979 estava prevista, para conseguir esse objectivo, publicação de modelo tipificado de reclamação.
Basta dizer que à data da diligência efectuada ainda o Serviço Permanente de Concursos continuava ocupado com a resposta a numeroso grupo de reclamações, enquanto preparava já o lançamento do concurso de 1978-1979.
Concurso para professores eventuais e provisórios dos ensinos preparatórios e secundário de 1978-1979
Ascendem a algumas dezenas — embora sem atingir o quantitativo dos processos análogos relativos a 1977-1978 — o total das queixas relativas ao concurso de professores eventuais e provisórios dos ensinos preparatório e secundário de 1978-1979.
Atendendo à urgência inerente à maioria destes casos — da sua resolução dependendo não só o emprego ou colocação dos candidatos, como o normal funcionamento das aulas de várias disciplinas —, utilizou-se em regra o sistema de, à medida que as reclamações deste tipo fossem sendo recebidas, se efectuar, em diligência pessoal junto do Serviço Permanente de Concursos do Ministério da Educação e Investigação Cientifica, a análise dos respectivos processos.
Página 2076
II SÉRIE — NÚMERO 47
Deve realçar-se, aliás, que nestas diligências se pôde sempre contar com a melhor colaboração do pessoal daquele Serviço.
A apreciação destas várias queixas proporcionou a identificação de um certo número de questões gerais relativas ao processamento do concurso de 1978-1979, sobre as quais o Provedor emitiu, dirigida ao Ministro da Educação e Investigação Científica, a seguinte
Recomendação
A análise de considerável número de queixas — inferior, é certo, ao das do ano escolar passado, mas, mesmo assim, ainda relevante — respeitantes ao concurso de professores eventuais e provisórios dos ensinos preparatório e secundário para o ano escolar de 1978-1979 convenceu-me da necessidade de expor a V. Ex.a, para efeitos de poderem ser reparadas, na medida do possível, as principais deficiências gerais de procedimento por parte desse Ministério que naquele pude detectar.
Esta tomada de posição não prejudica, por um lado, o prosseguimento normal dos processos específicos que sobre esse concurso correm termos no Serviço do Provedor de Justiça, nem, por outro, a eventual formulação de recomendações de alteração legislativa que a propósito do regime destes concursos possa vir ainda a formular.
A) Exclusão do concurso:
1) Exclusão por falta de carimbo ou selo branco da escola na confirmação dos boletins pelos conselhos directivos:
Das listas publicadas no Diário da República, 2.a série (suplemento), de 11 de Agosto de 1978, extrai-se que foram excluídos do concurso em questão duzentos e oitenta e três candidatos por no respectivo boletim de inscrição não figurar, sobre a confirmação das declarações dele constantes, subscrita pelo presidente do conselho directivo ou encarregado de direcção, o selo branco ou carimbo da escola.
Não encontro, na legislação aplicável — designadamente no artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 262/77, de 23 de Junho —, qualquer norma ou princípio que consagre tal motivo de exclusão de concurso.
O n.° 3 desse preceito, ao indicar a exigência da aposição dos citados carimbo ou selo branco, de modo algum prescreve que a sua falta importe a exclusão do candidato.
E, mais, o subsequente n.° 4 reporta-se, sim, a tal exclusão — mas para o caso de os candidatos não apresentarem os documentos indicados nos números anteriores (documentos probatórios das declarações constantes do boletim). Seria natural que, a querer estabelecer como motivo de exclusão a falta de carimbo ou de selo branco, o legislador o tivesse feito no âmbito deste artigo 8.°
Tão-pouco encontro a razão de exclusão em referência nas normas regulamentares contidas
no aviso de abertura do concurso, publicado no Diário da República, 2.a série, de 3 de Abril de 1978.
Essas normas, de resto, nunca poderiam contrariar o disposto na legislação que vieram regulamentar.
Dos fundamentos de exclusão indicados no n.° 34 desse aviso, o único que porventura poderia ter qualquer conexão com o problema seria o da respectiva alínea a).
Mas a sua redacção — «apresentação do boletim deficiente ou incompletamente preenchido» — revela que ele tem em vista imperfeições na elaboração do boletim imputáveis aos próprios candidatos.
Aliás, já antes o n.° 22 do mesmo aviso estabelecera que a confirmação de todos os elementos declarados «é da responsabilidade dos conselhos directivos», que deverão fazer declaração expressa de conformidade, a qual implica a assinatura e a aposição, sobre ela, do carimbo ou selo branco da escola.
Para além destes argumentos de legalidade, entendo que inquestionáveis razões de justiça e de simples razoabilidade contrariam a exclusão dos concorrentes em questão.
De facto, eles foram afastados, do concurso com base em circunstâncias que de modo algum lhes são imputáveis — e que só aos conselhos directivos ou encarregados de direcção o podem ser.
E mais: tratar.do-se de factos posteriores à intervenção dos candidatos, através do preenchimento dos boletins e sua entrega nas escolas, eles de modo algum tiveram possibilidade de controlar a verificação da questionada aposição de carimbo ou selo branco.
Enfim, essa falta nem significará, na maior parte dos casos, ausência de confirmação por parte do presidente do conselho directivo ou encarregado de direcção que assinou o boletim, mas apenas lapso posterior dele, ou dos serviços de secretaria. Isto não valera, apenas, para os casos de assinaturas fraudulentas — mas também esses de modo algum podem redundar em prejuízo dos candidatos, por lhes não serem sem mais imputáveis.
2) Exclusão por falta de carimbo ou selo branco e da própria assinatura do presidente do conselho directivo ou encarregado de direcção:
Segundo a lista publicada em 11 de Agosto passado, não foram admitidos a concurso cento e trinta e sete candidatos por os respectivos boletins não ostentarem nem o carimbo ou selo branco da escola, nem a assinatura do presidente do conselho directivo ou encarregado de direcção.
Entendo que vale, a este respeito, a generalidade das considerações que apresentei no anterior n.° 1.
Reconheço, todavia — e é sabido que assim sucedeu na realidade —, que a falta de assinatura em questão pode ter-se devido, umas vezes, a lapso ou negligência das direcções das escolas, mas, outras ainda, a uma atitude deliberada por parte delas.
Página 2077
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(101)
É que não foram poucos os casos em que as escolas tiveram dúvidas sobre determinados elementos — designadamente respeitantes a habilitações e a vínculo até ao termo do ano escolar — constantes dos boletins.
Não querendo impedir o acesso ao concurso a candidatos que porventura estivessem em condições de nele participar, mas ponderando também as consequências disciplinares cominadas para a confirmação inexacta, tais direcções optaram por dar seguimento aos boletins — sem, contudo, os confirmarem.
Também aqui, de qualquer modo, se está sempre perante actuação não atribuível aos candidatos e posterior à apresentação dos boletins por parte deles.
O que cumpriria era indagar-se das razões da ausência de confirmação, distinguindo-se depois os casos de que ela se justificou daqueles em que, afinal, os candidatos estavam em condições de serem admitidos a concorrer.
3) Exclusão por discrepância entre a classificação académica constante do boletim e a certificada pelas escolas em que a habilitação foi obtida:
Foi-me apresentada uma queixa por uma candidata excluída pelo facto de ter indicado no boletim de inscrição, tal como a lei exige, a classificação aproximada às décimas, de 14,5 valores, enquanto que da certidão de habilitação que juntara constava a classificação, arredondada, de 15 valores.
Admiti tratar-se de caso isolado, que o Ministério não teria dúvida em reparar.
Obtive, porém, da Direcção-Geral de Pessoal a resposta de que considerava ter sido correcta a exclusão, por prestação de falsas declarações, e, mais ainda, a de que esse departamento seguiu o mesmo critério em todos os casos análogos surgidos no concurso (ofício n.° 6593, de 15 de Novembro de 1978).
Considero que um tal procedimento é abertamente ilegal, além de pouco razoável.
Ilegal, desde logo, e uma vez mais, porque um tal motivo de exclusão não vem previsto no Decreto-Lei n.° 262/77.
A tal propósito, o n.° 4 do seu artigo 8.° estabelece a sanção de exclusão para a falta de apresentação da documentação destinada a instruir as declarações constantes do boletim — o que é bem dife e.
É certo que viso de abertura do concurso prevê, na alínea c) do seu n.° 34, a prestação de falsas declarações como motivo de exclusão.
Mas a invocação desse fundamento em casos como os presentes afigura-se completamente descabida.
Neles não transparece de modo algum o propósito fraudulento necessário para que se perfaça o tipo — criminal, aliás — das falsas declarações: ou, de outro moüo, a arrogação de qualidade não possuída com a intenção de falsear a verdade.
Aliás, à candidata em causa (e aos demais na mesma situação) não seria exigível outra
conduta, já que o n.° 6.1 do boletim lhe ordenava a indicação da classificação académica com aproximação às décimas.
E é sabido, por seu turno, que muitas escolas não passam — de resto segundo a lei geral — senão certidões de habilitação arredondadas às unidades.
Não parece admissível, pois, a exclusão de concorrentes nestas condições.
De resto, o mero confronto do boletim com as certidões anexas, feito em termos de ñor nal razoabilidade, seria bastante para revelar a boa fé de quem preencheu aquele (no caso concreto analisado, a candidata até se prejudicara na declaração que fez), bem como para indicar a solução adequada a tomar — admissâu ao concurso com base na nota aproximada às décimas.
4) Exclusão por falta de indicação da classificação académica, embora se comprove a titularidade de certo curso:
O Ministério começou por excluir os candidatos que, embora comprovassem a posse de certo curso, não indicaram no boletim a respectiva classificação académica.
É de reconhecer que tal exclusão se pode justificar, por incompleto preenchimento do boletim.
Sucede, porém, que, posteriormente, o Ministério veio, afinal, a repescar esses concorrentes, em termos de considerar estar-lhes fazendo uma concessão. Atribuiu-lhes, para efeitos de concurso, a classificação de 10 valores.
Penso, de facto, que esta última solução é a correcta.
Se o candidato prova a titularidade de certo curso, mesmo sem indicar ou provar a respectiva classificação, é lógico que não seja excluído, mas considerado como tendo a classificação mínima possível — e isto logo desde o início do concurso, e não, porventura, apenas no âmbito da sua chamada 2.a fase.
B) Alterações de regime na vigência do concurso:
Tive oportunidade de apreciar um conjunto assinalável de queixas provocadas pelo facto de o Ministério haver alterado, em certos aspectos, o regime de concurso, mesmo já depois da abertura deste.
Tais situações, pelas oscilações de critérios que denotam, de modo algum prestigiam a Administração.
E, pior do que isso, geram grave insegurança nos administrados, cujas legítimas expectativas vêm a ser, assim frustradas.
Trata-se, fundamentalmente^ das seguintes questões:
1) Situação dos diplomados dos cursos de instrutores de Educação Física não equiparados a bacharéis:
Os diplomados dos cursos de intrutores de Educação Física não equiparados a bacharéis (por não possuírem, após o curso, três anos de
Página 2078
1076-(102)
II SÉRIE — NÚMERO 47
serviço docente, ou, de qualquer modo, prestado na especialidade) não possuíam habilitação própria, segundo o despacho genérico aplicável, publicado em 2 de Março de 1978.
Através do Despacho n.° 86/78, de 1 de Abril, mas publicado apenas a 18 desse mês (já após a abertura do concurso, pois), o então Ministro da Educação e Cultura veio reconhecer-lhes habilitação própria, permitindo-lhes o acesso ao concurso
Em face do disposto no Decreto-Lei n.° 472/76, de 15 de Junho, os despachos definidores de habilitações próprias não poderiam provir apenas do Ministro da Educação e Investigação Científica, devendo ser também assinados pelo Primeiro .vlinistro e pelo Ministro das Finanças e do Plano.
Pelo Despacho n.° 182/78, porém, do mesmo Ministro, publicado em 26 de Julho seguinte — já, portanto, após encerramento do prazo de concurso, e no decorrer das operações deste —, foi, sem apresentação de qualquer fundamentação, revogado o Despacho n.° 86/78.
2) Situação dos titulares de habilitação suficiente, com o curso especial de Educação Física:
Em 1977-1978, foram organizados, n; < Direc-çÕes-Gerais do Ensino Básico e Secundário e dos Desportos, cursos especiais para candidatos à docência de Educação Física habilitados com o curso complementar do ensino secundário.
Embora o despacho regulador das habilitações suficientes para o concurso de 1977-1978 previsse a habilitação desse curso especial, a verdade é que, por atraso dos serviços, tais acções de formação não puderam ser concluídas a tempo de os que as frequentaram se poderem apresenta a concurso com tal habilitação.
Assim, esses docentes também não se podiam candidatar ao concurso de 1978-1979, por não serem considerados vinculados, enquanto titulares de habilitações suficientes, até 30 de Setembro.
Reconhecendo, parece, a injustiça da situação, propiciada por demoras da própria Administração, o então Ministro da Educação e Investigação Científica despachou no sentido de as pessoas nessas condições se terem por vinculadas até 30 de Setembro, podendo por isso concorrer para 1978-1979. Este despacho foi comunicado às escolas pela circular n.° 14/78, recebida nas escolas já após a abertura do concurso.
Sucede, porém, que aqueles que, confiados nesses despacho e circular, concorreram acabaram, afinal, por ser excluídos do concurso, com
o argumento de que tais diplomas não leriam cobertura legal.
3) Situação dos diplomados com o curso teológico dos seminários:
Este assunto desenvolveu-se no âmbito do concurso de 1977-1978, mas as suas consequências vieram reflectir-se ainda no de 1978-1979.
Os diplomados do curso teológico dos seminários habilitados com determinadas cadeiras das Faculdades de Letras possuíam habilitação própria para a docência — designadamente o 1.° grupo do ensino preparatório.
O Despacho n.° 113/77, publicado em 28 de Abril, veio recusar-lhes tal habilitação para o concurso de 1977-1978.
Contudo, já no decorrer do concurso, a Direcção-Geral do Ensino Básico fez distribuir a circular n.° 40/77, indicando que eram considerados titulares de habilitação própria os diplomados dos cursos teológicos que, à data do Despacho n.° 113/77, já a possuíam.
Tal circular foi corroborada pelo Despacho n.° 158/77, de 22 de Novembro, do Secretário de Estado da Orientação Pedagógica.
Nem aquela circular nem este despacho, porém, assumiram a forma exigida, para o efeito, pelo Decreto-Lei n.° 472/76.
Por isso, os candidatos que, corn base neles, concorreram vieram, afinal, a ser considerados como possuindo mera habilitação suficiente.
A verdade, porém, é que, para o concurso de 1978-1979, o Ministério mudou de orientação, voltando a reconhecer a habilitação própria — despacho publicado a 2 de Março de 1978 — a tais candidatos.
Atendendo à oscilação de critérios manifestada pelo Ministério — os concorrentes em causa apenas ficaram, afinal, desprovidos de habilitação própria para 1977-1978 — e considerando os prejuízos que para os interessados dai decorreram em matéria de colocações em 1978-1979 (quebra de vinculo até 30 de Setembro, impossibilidade de recondução menor graduação no concurso), recomendei que, se necessário através de medida legislativa apropriada, o Ministério os considerasse, no concurso para o presente ano escolar, como vinculados até final do ano escolar transacto.
O Ministério respondeu que dificuldades de ordem prática obstariam a tal solução.
q Fundamentação de despachos de indeferimento:
Os modelos tíe oficio utilizados pelo Ministério para notificar aos concorrentes o indeferimento, total ou parcial, das reclamações ou recursos hierárquicos que apresentaram, não se apresentam fundamentados.
Violam, assim, claramente, o disposto no artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Julho.
Este desrespeito da lei não permite que os interessados possam, com um mínimo de conhecimento de causa, recorrer, graciosa ou contenciosamente, desses despachos de indeferimento.
A agravar esta situação, tem-se verificado, por vezes, que o real fundamento do indeferimento de um recurso hierárquico ou reclamação é diverso daquele que, por exemplo, constava expressamente das listas de exclusão de candidatos publicadas no Diário da República.
Página 2079
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(103)
D) Conclusões:
Em vista do que acima exponho, considero dever recomendar a V. Ex.ª:
a) Que sejam admitidos ao concurso de
1978-1979 os candidatos dele escluídos apenas por falta de carimbo ou selo branco aposto na assinatura do presidente do conselho directivo ou encarregado de direcção;
b) Que o Ministério indague das escolas
sobre as razões da falta de assinatura das direcções em boletins enviados a concurso, e, em consequência, admita a concurso aqueles de entre os candidatos cujos boletins estejam nessas condições e que revele preencherem, afinal, os requisitos para tanto exigidos;
c) Que estejam admitidos a concurso os
candidatos apenas excluidos por discrepância entre as notas constantes dos boletins e das certidões anexas, se essa disparidade se resolver na diferença entre a nota aproximada às décimas e a arredondada;
d) Que sejam admitidos a concurso os can-
didatos de cujo boletim não conste classificação académica, mas de cujos documentos anexos se comprove a titularidade de certo curso — admissão essa a operar com a classificação mínima, que tal documentação possa comprovar;
e) Que o Ministério procure reparar, se
ainda possível, as situações descritas em B) — se necessário através de adequadas medidas legislativas; /) Que, para o futuro, o Ministério se abstenha de alterar o regime dos concursos no próprio decurso destes;
g) Que, na emanação e notificação dos despachos de indeferimento, total ou parcial, das reclamações ou recursos hierárquicos no âmbito dos concursos em causa, se dê sempre rigoroso cumprimento ao estabelecido no De-creto-Lei n.° 256-A/77.
Processo n.° 76/R-1293-A-2
Foi recebida no Serviço do Provedor de Justiça uma reclamação na qual o interessado afirmava que estando inscrito no Serviço Nacional de Emprego e havendo-se dado uma vaga de cobrador de quotas em determinada Casa do Povo, tal lugar viera a ser preenchido por outra pessoa que nem sequer estaria desempregada.
Das averiguações que, de seguida, tiveram lugar, veio a apurar-se segundo o que elucidou o Serviço Nacional de Emprego que a lista de prioridades a que obedeceu o concurso para a aludida vaga se aferiam pela capacidade profissional, pelas condições sócio--económicas e pelas habilitações literárias, estando o
elemento que veio a ser recrutado em 9.° lugar na lista elaborada por aquele Serviço.
De notar, porém, que se verificou também que o concurso foi limitado a indivíduos do sexo masculino, pelo que se solicitou ao presidente da comissão administrativa da Casa do Povo em referência, a indicação dos critérios utilizados para o recrutamento em ordem a preencher-se a mencionada vaga, a razão porque não foi respeitada a lista classificativa elaborada pelo Serviço Nacional de Emprego e ainda, sobre o fundamento daquela apontada limitação.
A resposta da Casa do Povo aos aspectos apontados, resumiu-se a exprimir que, havendo recebido a lista classificativa do Serviço Nacional de Emprego e havendo entendido que qualquer dos indivíduos que nela figurava serviria para o desempenho do cargo, tinha convocado uma assembleia geral onde a massa associativa se tinha pronunciado, por meio de voto, para a escolha do candidato, tendo-se preferido o mais votado; e que, quanto à preferência manifestada por um indivíduo do sexo masculino, ela tinha sido determinada pela circunstância de o lugar de cobrador exigir deslocações constantes exteriores e entrada em cafés e tabernas, o que seria menos próprio para mulheres.
Obtido finalmente parecer da Auditoria Jurídica do Ministério dos Assuntos Sociais no sentido de que o acto da admissão de um funcionário é da competência exclusiva das comissões administrativas das Casas do Povo, acto esse constitutivo de direitos pelo que só com fundamento em ilegalidade pode ser revogado, mesmo pela entidade que o praticou, decidiu-se pelo arquivamento do processo.
De todo o modo, julgou-se conveniente recomendar ao Secretário de Estado da Segurança Social que se procedesse ao estudo de reformulação legislativa garante da adopção de critérios objectivos na admissão de trabalhadores nas Casas do Povo (eventualmente tornando vinculativos os critérios e listas classificativas elaboradas pela Serviço Nacional de Emprego).
Processo n.° 76/R-1399-A-5
1 — A 10 de Dezembro de 1976 deu entrada neste Serviço uma reclamação em que fundamentalmente se expunha, que em Agosto daquele ano o Hospital da Guarda abrira concurso público para escriturários, tendo sido os processos dos candidatos por aquele Hospital remetidos ao Serviço Nacional de Emprego com vista a este proceder à selecção de nove, a admitir. O Serviço Nacional de Emprego seleccionou e apresentou os candidatos ao Hospital, que mandou apresentar os seleccionados. Aconteceu, porém, que o director do Hospital foi transferido para Castelo Branco e a partir dessa data a comissão de gestão recusou-se a admitir o pessoal.
Os candidatos seleccionados viram-se assim altamente prejudicados, pois, além de despesas e deslocações, deixaram de concorrer a outros empregos, a que poderiam ter acesso, mantendo-se em desesperada situação de desemprego.
2 — Solicitados os esclarecimentos necessários, averiguou-se que a Comissão Instaladora do Hospi-
Página 2080
1076-(104)
II SÉRIE — NÚMERO 47
tal Distrital da Guarda fora no entretanto substituida, tendo tomado posse a 2 de Fevereiro de 1977, pelo que considerava que a responsabilidade dos factos cabia inteiramente à Comissão Instaladora cessante, bem como ao então administrador, que também já não exercia naquela data funções naquele Hospital. Considerando, assim, não ser o assunto da sua responsabilidade e que transcendia a sua competência e capacidade, oficiara já à Comissão Inter-Hospitalar de Coimbra, no sentido de tomar com a maior urgência as medidas convenientes.
Por sua vez, a Comissão Inter-Hospitalar de Coimbra informou que só teve conhecimento dos factos pelo ofício que lhe fora remetido pela Comissão Instaladora do Hospital Distrital da Guarda tendo determinado, face ao que se passara, que esta Comissão Instaladora promovesse inquérito onde se apurasse de quem, objectivamente, partira a ordem de admissão e consequentes contactos com o Serviço Nacional de Emprego, bem como que condições tinham sido oferecidas aos candidatos.
Por sua vez, o mesmo Hospital deveria, v. g., do seu serviço social, procurar indagar, caso a caso, e muito objectivamente, qual a situação em que tinham ficado os concorrentes escolhidos pelo Serviço Nacional de Emprego em termos de ver que solução se poderia encontrar para a resolução de tal situação.
3 — Em resultado das diligências assim determinadas, foi em 16 de Novembro de 1977 a Comissão Inter-Hospitalar de Coimbra informada pela Comissão Instaladora do Hospital Distrital da Guarda que dos nove candidatos seleccionados, se tinha apurado estarem já alguns empregados e que se aguardava autorização da Direcção-Geral dos Hospitais para abertura de vagas para o preenchimento de lugares de escriturarios-dactilógrafos, devendo para o efeito ser admitidos prioritariamente os três candidatos em causa, ainda não empregados, para o que já fora feita a respectiva proposta..
4 — A 31 de Janeiro de 1978, o Provedor de Justiça oficiou ao presidente da Comissão Inter--Hospitalar de Coimbra, congratulando-se com a solução satisfatória dada a situação dos reclamantes, e recomendando que, com o mesmo espírito de justiça, face ao resultado do inquérito que por aquela Comissão fora determinado pela actual Comissão Instaladora do Hospital Distrital da Guarda fosse promovido quanto ao apuramento dos responsáveis por toda a ilegal actuação havida, estes viessem a ser devidamente responsabilizados e punidos de forma a que não se tornem a repetir atitudes semelhantes, causadoras de graves injustiças e prejuízos morais e económicos.
Processo n.° 77/R-1162-A-2
Uma professora efectiva do ensino preparatório, que no último concurso fora provida no quadro da Escola de Luísa Todi, em Setúbal, protestou pelo facto de, posteriormente, haver recebido um ofício, totalmente manuscrito, sem referência, com uma assinatura, ilegível, feita «pelo director-geral», em que era informada de que, por lapso dos serviços, ficava sem efeito aquela sua colocação, cabendo-lhe antes um lugar na Escola Preparatória de Palmela.
Analisando o caso, verificou-se que a actuação do Ministério, ao revogar o provimento da queixosa, fora legítimo.
Com efeito, não existia na realidade, em certa escola, uma vaga que fora considerada no concurso, pelo que houvera que proceder à recolocação da candidata a ela destinada, o que conduziu a uma deslocação, em cadeira, segundo a respectiva graduação, de outras várias concorrentes, entre as quais a reclamante.
Tendo, assim, a originária nomeação desta resultado ilegal, a Administração podia, como o fez, revogá-la, dentro do prazo de um ano.
Recomendou-se, no entanto, ao director-geral de Pessoal do Ministério da Educação e Investigação Científica que comunicações do tipo feito à reclamante neste processo (aliás análogo a outras que depois, em casos semelhantes, também surgiram) passassem a ser devidamente numeradas e referenciadas, se possível dactilografadas e com indicação da justificação da deslocação operada.
Processo n.° 7« 'R-22-A-2
Por uma professora do ensino primário foi apresentada ao Provedor de Justiça uma reclamação em. que se queixava de haver sido preterida na sua colocação por um professor desalojado.
Averiguados os factos, veio a apurar-se não ter ocorrido qualquer ilegalidade, uma vez que o professor efectivamente colocado era o n.° 79 da lista do concurso enquanto que a professora reclamante nela ocupava o n.° 158.
De todo o modo, a indagação feita permitiu que se detectassem dois aspectos que se entenderam merecedores de reparo.
Na verdade, a professora reclamante havia sido convocada pela respectiva direcção do distrito escolar, mediante ofício, para ali comparecer «afim de ser colocada».
Por outro lado, constatou-se que o ofício que à dita reclamante foi enviado pela mesma direcção do distrito escolar, comumcando-lhe que a reclamação por ela apresentada fora considerada improcedente, não continha os fundamentos que haviam determinado tal indeferimento.
Deste modo, considerou-se necessário recomendar que, quanto ao primeiro aspecto, se evitassem situações como a que ocorreu, na medida em que são susceptíveis de criarem falsas expectativas e que, quanto ao segundo, se deveria sempre dar cumprimento ao disposto na alínea a) do n.° 1 do Decreto--Lei n.° 265-A/77, de 17 de Junho, dando conhecimento aos interessados dos fundamentos dos indeferimentos.
Processo n.° 78/R-513-A-2
Por um reclamante, arquitecto-chefe do quadro da Direcção-Geral do Planeamento Urbanístico, foi apresentada queixa neste serviço na qual fundamentalmente se alegava não haver sido dada qualquer solução a uma reclamação que apresentara ao presidente do Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes e ao director-geral do Planeamento Ur-
Página 2081
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(105)
banístico relativamente à sua inclusão na relação de opositores ao concurso documental para promoção a arquitecto inspector superior de obras públicas.
Considerava-se ainda com direito à contagem do tempo em que estivera em comissão de serviço fora do seu quadro de origem e na categoria desempenhada e não na que possuía naquele quadro.
Ouvida a Direoção-Geral do Planeamento Urbanístico e também a Direcção-Geral da Função Pública, concluiu-se pela não razão da pretensão do reclamante, designadamente em face do artigo 1.°, n.° 2, do Decreto-Leí n.° 146/75, de 21 de Março, uma vez não possuir efectivamente aquele os requisitos legais exigidos pará o concurso a arquitecto inspector superior.
De todo o modo e para além da conclusão a que se chegou sobre a não razoabilidade da reclamação apresentada, as diligências feitas permitiram detectar que o ofício dirigido pelo Conselho Superior de Obras Públicas e Transportes ao interessado, comu-nicando-lhe que o requerimento por este feito havia sido indeferido, se limitava a informá-lo de que tal indeferimento ocorrera com base «na legislação em vigor».
Desta forma, achou-se indispensável chamar a atenção daquele mencionado Conselho para que, nos termos do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho, devem ser devidamente fundamentados os actos administrativos que deneguem direitos, o que visivelmente não tinha acontecido, face ao laconismo com que fora redigido aquele oficio.
Processo n.° 78/R-628-A-2
Teve o piocesso origem numa reclamação apresentada a este Serviço e em que a interessada referia que se havia inscrito no concurso para monitoras para o infantário de Pevidém, alegando, porém, que, após haver sido escolhida entre outras para figurar no conjunto das futuras monitoras, fora posteriormente excluída.
Solicitada à direcção do Infantário esclarecimento sobre quais os critérios utilizados para a escolha das monitoras, designadamente se na selecção operada no concurso organizado pelo Serviço Nacional de Emprego havia sido feita uma graduação das candidatas, foi informado que os critérios assentaram na aptidão para o serviço que iam desempenhar, na situação sócio-económica, na residência e que, quanto à selecção feita pelo Serviço Nacional de Emprego, não havia qualquer graduação das candidatas, sendo a sua ordem estabelecida por critério meramente alfabético.
Decidiu-se finalmente que no concurso realizado não houve qualquer ofensa de preceitos legais, motivo pelo qual a reclamação foi mandada arquivar.
De todo o modo, das diligências e averiguações feitas ressaltou a impressão de que o concurso em causa se teria caracterizado por uma aleatória indefinição propiciadora de situações susceptíveis de colocarem aos interessados a ideia de que teriam sido individualmente afectados.
Assim, aproveitou-se a oportunidade para recomendar à comissão administrativa do Sector Único da 1.a e 2.a Infância a conveniência de fixação pré-
via de regras mais precisas e objectivas para a graduação dos candidatos, bem como a devida publicidade do exacto número de vagas e das normas aplicáveis ao recrutamento, de modo a evitarem-se, tanto quanto possível, dúvidas deste tipo.
Processo n.° 78/R-742-A-2
Por uma funcionária do Ministério da Habitação e Obras Públicas foi apresentada ao Serviço do Provedor de Justiça uma queixa relativa ao despacho de 5 de Janeiro de 1978 proferido pelo Sr. Ministro, o qual, considerando que a reclamante — e outros interessados — não preenchia os requisitos exigidos pelo Decreto Regulamentar n.° 75/77, de 12 de Novembro (mais de três anos de serviço na categoria), que aquele diploma visou obviar os inconvenientes da não movimentação de pessoal dos quadros do Ministério da Habitação e Obras Públicas, que decorridos três anos ainda aguardava a definição de novos modos de promoção, que o alargamento do seu âmbito a pessoal proveniente de outros Ministérios ou que há menos de três anos foi integrado nos quadros do Ministério da Habitação e Obras Públicas iria contrariar frontalmente o espírito do diploma e os objectivos que naquele momento visou e se encontram expressos no preâmbulo e que, enfim, o Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril [alínea a) do n.° 1 do artigo 26.°], invocado só se aplica aos adidos, o que não é o caso da reclamante, já ingressada no quadro da Secretaria-Geral, indeferira um seu requerimento.
O condicionalismo exposto e a bondade do despacho ministerial referido foram objecto de estudo neste Serviço, havendo-se concluído:
Que aquele despacho violava o artigo único de Decreto Regulamentar n.° 75/77, de 10 de Novembro, que estabelece:
Até que seja efectuada a reestruturação das carreiras do pessoal administrativo da função pública, o preenchimento das vagas existentes nos organismos do Ministério das Obras Públicas em cada uma das categorias de oficiais de secretaria será feito por concurso documental a que serão admitidos candidatos de categoria imediatamente inferior com mais de três anos de serviço na categoria.
Que nada, naquele diploma, justificava a interpretação dada de que só se abrangia o tempo de serviço de pessoal do Ministério da Habitação e Obras Públicas, pois o preâmbulo reconhece apenas que «urge reparar de modo transitório os graves inconvenientes» que resultam da não movimentação dos quadros de pessoal dos organismos do Ministério das Obras Públicas: abrangeria portanto todo o pessoal pertencente aos quadros do Ministério, independentemente da data de admissão dos mesmos.
De acordo com o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 49 410 e com muitos diplomas que se lhe seguiram «o pessoal civil inscrito no Orçamento
Página 2082
1076-(106)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Geral do Estado é distribuído por categorias ...»; assim, conquanto que não exista uma definição de categoria, esta é um grau dentro de uma escala de funcionalismo e o funcionário possui esse grau desde a data em que nele foi definitivamente provido.
E, conformemente ao estabelecido no artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, os adidos manterão no quadro geral de adidos a natureza da investidura que possuíam nos quadros de origem e ainda que em disponibilidade era-lhes contado o tempo de serviço para todos os efeitos (artigo 26.°), pelo que, na perspectiva da sua carreira na função pública, a interessada possui a categoria de segundo-oficial desde que nela foi definitivamente provida, em 1970.
O Decreto-Lei n.° 103/76, de 4 de Fevereiro, ao delinear os termos gerais do recrutamento de terceiros-oficiais, determinou que serão admitidos ao concurso «escriturários--dactilògrafos de respectivo quadro . . . desde que tenham, pelo menos, três anos de bom e efectivo serviço nessa categoria», fazendo-se portanto, uma distinção nítida entre pertença a um quadro e categoria funcional.
Deste modo e em face dos aspectos referidos, foi
decidido ouvir o Ministro visado.
Em resposta, limitou-se o Gabinete a explicitar que sobre o despacho proferido pelo Sr. Ministro estava correndo seus trâmites no Supremo Tribunal Administrativo, por via de recurso interposto pela reclamante (e outros interessados), o respectivo processo.
Perante este ofício, reafirmou-se ao Sr. Ministro o entendimento atrás exposto, recomendando-se a revogação do seu citado despacho por contrariar o Decreto Regulamentar n.° 75/77, de 10 de Novembro, que apenas refere deverem ser admitidos ao concurso documental os funcionários de categoria imediatamente inferior, não distinguindo se pertenciam ou não aos quadros do Ministério e porque seria injusto que os funcionários do Ministério da Habitação e Obras Públicas fossem privilegiados, em absoluto, por esse facto, quando todos os outros funcionários são como eles agentes do Estado (se bem que se concedesse na regulamentação do concurso e em igualdade de circunstâncias, fosse dada preferência aos antigos funcionários do Ministério).
E acentuou-se que à revogação recomendada não obstaria, como se vem entendendo, a pendência do processo de recurso no Supremo Tribunal Administrativo e que de todo o modo se justificaria justar a execução do despacho, de forma a não haver lugar à criação de situações de direitos adquiridos, sempre difíceis de superar.
Como tal recomendação não tivesse sido aceite, outra solução não se possibilitou senão a do arquivamento do processo, esgotada que foi a possibilidade de intervenção do Provedor de Justiça nos termos dos artigos 2.° e 20.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, uma vez que não possui competência para anular ou revogar os actos dos poderes públicos.
Processo n.° 78/R-1053-A-2
Uma reclamante çueixou-se a este Serviço de que, havendo prestado provas para guarda-estagiária da carreira do pessoal de vigilância da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e tendo sido classificada com a nota de Bom, foi afinal preterida, para efeitos de estágio, por outras concorrentes com classificação inferior à sua.
Havendo solicitado explicação para tal facto àquela Direcção-Geral, fora-ihe respondido que ele se devera à circunstância de não possuir a maioridade à data da abertura do referido concurso.
Perante tal explicação, alegou a reclamante que o documento comprovativo da sua emancipação não lhe fora pedido aquando da apresentação de demais documentação exigida e se a sua apresentação se devesse reportar à data da abertura do concurso e não à data do provimento do lugar, nem sequer deveria ter sido admitida à prestação de provas.
Ouvida sobre o caso, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais não invalidou as afirmações da reclamante, iimitando-se a acentuar que, dado o elevado número de requerimentos entrados com vista ao concurso, só depois se verificara que nem todos os concorrentes eram maiores, sendo ainda certo que não obstante ter ainda procurado conseguir que fossem nomeados todos os que tinham obtido aprovação, isso não fora logrado, pois que o Tribunal de Contas visara apenas diplomas relativos aos candidatos que tinham atingido a maioridade dentro do prazo do concurso ou apresentado documento comprovativo de emancipação dentro do mesmo prazo.
Face ao condicionalismo apurado houve que determinar o arquivamento do processo.
Todavia, entendeu-se como conveniente uma chamada de atenção à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais em ordem a evitarem-se situações da natureza referida, mediante uma mais cuidada e rigorosa apreciação dos requerimentos e demais documentação apresentados pelos concorrentes.
E julgou-se igualmente necessário acentuar, relativamente à prática futura, que pareceria curial atender exclusivamente à idade real das candidatas que foi considerada adequada à natureza das funções que vão exercer e não propriamente ao aspecto de serem ou não capazes de exercício (em função, por exemplo, de eventual emancipação).
Processo n.» 78/R-ll%-A-3
Uma professora efectiva do Liceu do Barreiro apresentou ao Serviço do Provedor de Justiça uma reclamação contra a exclusão do concurso de professores efectivos por alegadas falsas declarações da classificação profissional que íhe havia sido atribuída.
Afirmava a reclamante que procedera ao preenchimento dos respectivos formulários com boa fé e havia sido induzida em erro por informações de um funcionário do Ministério da Educação e Investigação Cientifica, assim como pela redacção das instruções para o preenchimento dos impressos.
Solicitados esclarecimentos à Secretaria de Estado da Admnistração e do Equipamento Escolar, foi por este departamento informado que o funcionário referido pela reclamante nunca fora por ela contacta-
Página 2083
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(107)
do para elucidação sobre o modo de preenchimento do boletim de concurso e que a Direcção-Geral de Pessoal considerara suficientemente explícitas as instruções inseridas nos aludidos boletins e também as normas vigentes a respeito do preenchimento dos mesmos.
Face às explicações fornecidas, determinou-se o arquivamento do processo.
Todavia e tendo-se verificado no decurso das diligências feitas que a Direcção-Geral de Pessoal em ofício dirigido à reclamante-se limitara a comunicar--lhe que ela fora excluída do concurso «por falsas declarações da classificação profissional», julgou-se necessário formular reparo no sentido de que tal expressão («falsas declarações») não deveria nunca ser usada de ânimo leve, reservando-se apenas a sua utilização para os casos em que realmente se constate falsificação de documentos ou dolosa indicação de dados falseados.
Com efeito, a reclamante — segundo se apurou — fizera a entrega da documentação correcta, apenas com um mero erro de cálculo da classificação profissional.
E, assim, igualmente se recomendou que fosse oficiado à aludida reciamente em termos que se harmonizassem com o critério apurado, elucidando-se a mesma de que tinha sido excluída do concurso «por prestação de declarações incorrectas» ou com fórmula semelhante.
Enfim, aconseihou-se a adopção genérica, em casos futuros, do critério recomendado.
Processo n.» 77/R-1784-A-2
Recorreu ao Provedor um candidato à admissão como ajudante de cozinha da Escola Preparatória de Viriato (Manteigas) que referiu que, depois de lhe ter sido dito que iria ser admitido, viria esse provimento suspenso, sem que lhe fosse dada qualquer explicação, apesar dos seus pedidos nesse sentido.
A Direcção-Geral de Pessoal do Ministério da Educação e Investigação Científica, instada a pronunciar-se, indicou que a Escola pedira, inicialmente autorização para admissão de uma cozinheira e dois ajudantes de cozinha, havendo para um destes últimos cargos sido seleccionado o reclamante.
Posteriormente, todavia, a Escola haveria resolvido não instalar um refeitório, mas apenas um bufete, pelo que prescindiu de um dos ajudantes.
Decidira-se, em função disso, reservar para o queixoso a primeira vaga que, depois, viesse a surgir.
Analisado todo o processo, verificou-se que, de entre dezasseis candidatos do sexo feminino e dois do sexo masculino, os serviços haviam proposto três melhores, fundamentalmente em função da apreciação das respectivas habilitações e situação económica (ainda não vigoravam, então, regras precisas de graduação de concorrentes a pessoal auxiliar das escolas).
Sobre esta informação lia-se, contudo, a seguinte nota, que viera a obter concordância superior: «Em ves desta candidata proponho que seja admitido . . . (o queixoso), por ser um elemento masculino.»
Analisada a situação, considerou-se não haver fundamento bastante para se ter por ilegal a decisão final tomada.
Contudo, teve-se por necessário chamar a atenção da Direcção-Geral para o facto de a substituição, pelo queixoso da candidata inicialmente proposta, apenas por aquele ser do sexo masculino colidia frontalmente com o artigo 13.° da Constituição. Recomendou-se, em consequência, que para o futuro se prescindisse de actuações dessa índole.
A Escola se fez ver, por seu turno, que a sua mudança de critério contribuirá para frustrar a natural expectativa de admissão do reclamante.
Por isso se lhe recomendou que, daí em diante, as propostas de admissão de pessoal só fossem formuladas quando houvesse certeza sobre a efectiva necessidade do pessoal a recrutar.
Processo n.° 78/R-I400--2
Uma candidata ao concurso de professores efectivos dos ensinos preparatório e secundário veio reclamar do facto de outra concorrente se encontar na respectiva lista de graduação em posição superior à sua, quando a mesma teria classificação inferior à dela e haveria concluido a licenciatura do ramo educacional no ano escolar de 1974-1975 tal como ela (possuindo, por isso, o mesmo tempo de serviço).
Na sua queixa verbal, a interessada atribuiu expressamente a alegada irregular graduação da concorrente a falsas declarações por esta prestadas no boletim do concurso.
Dada a gravidade das imputações feitas, analisou--se toda a documentação constante dos processos de concurso das duas concorrentes e pediu-se informação à Universidade de Lisboa sobre o ano em que a candidata visada pela queixosa concluíra a sua habilitação profissional.
Verificou-se que isso sucedera, afinal, em 1973, estando pois correctas, quer as declarações por ela feitas no concurso, quer a graduação que lhe fora atribuída, em função do tempo de serviço.
Não se deixou de censurar veementemente a queixosa, pela grave acusação que, intencionalmente ou com grave negligência, fizera à outra candidata, originando diligências, do Serviço do Provedor de Justiça e dos departamentos oficiais, sem qualquer razão.
Processo n.» 78/R-1440-A-2
Alguns médicos de hospitais distritais que não foram aprovados nos concursos para chefe de clínica insurgiram-sc pelo facto de o Ministro dos Assuntos Sociais não haver lançado mão da faculdade prevista no artigo 24.° da Portaria n.° 79/77, de ¡7 de Fevereiro (reguladora desses concursos), com vista a dispensar os candidatos nas suas condições do preenchimento do requisito previsto no n.° 7 do artigo 22.° do mesmo diploma — obtenção da classificação mínima de 14 valores.
Alegavam, para tanto, que os médicos dos hospitais distritais têm tido menos possibilidades de preparação que os dos hospitais centrais.
E discutiam, ademais, o critério restritivo que teria sido utilizado por vários júris desses concursos, tendo chegado o daquele que se efectuara no Centro Hospitalar de Coimbra (Covões) a sugerir a todos os
Página 2084
1076-(108)
II SÉRIE — NÚMERO 47
concorrentes que desistissem do concurso para não ficar registada a sua não obtenção de classificação mínima.
Analisada a matéria, optou-se por não interferir nela directamente.
De facto, não teria cabimento nem viabilidade qualquer apreciação do critério classificativo do júri.
Por seu turno, a regra do n.° 7 do artigo 22.° da Portaria n.° 79/77 não admitia derrogação, nem se encontraram razões bastantes para recomendar a sua alteração.
A invocação do artigo 24.° desse diploma não tinha sentido, pois apenas respeitava à resolução, por despacho, das dúvidas surgidas na sua aplicação.
Registou-se, porém, que vêm surgindo com alguma frequência indicações de que, em concursos para lugares de médicos dos hospitais, os júris sugerem a alguns dos candidatos que deles desistam, por não irem ser aprovados.
Por se ter por incorrecta esta actuação, recomendou-se à Direcção-Geral dos Hospitais que emanasse orientação para tais júris, no sentido de se absterem de sugerir a desistência dos concorrentes, deixando--lhes a liberdade de decisão e actuação a que, nesse dominio, têm direito.
Processo n.º 78/R-2409-B-1
Uma professora queixou-se de, no concurso para professores eventuais e provisórios para o ano lectivo de 1978-1979, haver sido preterida, na colocação de uma das escolas que escolhera, por outro professor com menor classificação.
Reclamara do facto, mas nada lhe fora respondido até então.
Em diligência directa no Serviço Permanente de Concursos do Ministério da Educação e Investigação Científica, este Serviço apurou que a reclamante tinha razão e que a sua colocação iria ser corrigida, com notificação para a escola a que tinha direito.
Solucionado o problema em causa, foi arquivado o processo deste Serviço.
Passado algum tempo, a reclamante veio comunicar que a decisão do Ministério da Educação e Investigação Cientifica ainda não fora publicada e solicitar as providências adequadas.
Em nova diligência directa no Serviço Permanente de Concursos, verificou-se que o expediente relativo ao caso da reclamante ainda não tivera seguimento.
Foi nessa altura prometida urgência na tramitação do assunto.
E, pouco depois, a reclamante esclareceu que a sua colocação se achava finalmente em ordem.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — DISCIPLINA
Processo n.° 76/R-358-A-2
Por determinado reclamante, antigo funcionário dos Hospitais da Universidade de Coimbra foi apresentada a este Serviço uma exposição, insurgindo-se contra a forma como fora demitido da função pública, em Novembro de 1961, por despacho do então Ministro da Saúde e Assistência, em sequência de processo disciplinar.
Pedidos e analisados os correspondentes autos de inquérito e de processo disciplinar, afiguraram-se pertinentes as razões do reclamante.
Com efeito, após o estudo do assunto, puderam ficar assentes o seguinte condicionalismo de facto e as conclusões que esse condicionalismo mereceu:
O reclamante fora sujeito a processo de inquérito e disciplinar, seguido de diligências complementares (em 1961) e de revisão (em 1963-1964), tendo igualmente sido julgado em tribunal pelos factos de que foi acusado naqueles processos.
a) No processo de inquérito relativo ao desaparecimento de 716 laranjas do Hospital da Universidade de Coimbra, o inquiridor propusera que ele fosse «julgado inconcludente no que se refere à responsabilidade do ..., devendo por isso e neste particular ficar a aguardar melhor prova». Pelo extravio das laranjas deveriam ser julgados solidariamente responsáveis todos os serventes ocupados na despensa;
b) Nos relatórios das diligências complementares aos processos de inquérito e disciplinar, o inquiridor declarara ter ficado convencido da sinceridade dos depoimentos das duas testemunhas principais do acusador (que estava de relações cortadas com o arguido, depois de terem ambos chegado à agressão física) e que achou o arguido «pouco à vontade».
Escreveu o subinspector depois de se afirmar convencido da culpabilidade do reclamante:
Admitindo, no entanto, a hipótese de o . . . poder ter sido ludibriado pelos fornecedores e tendo em consideração o mau funcionamento dos serviços da despensa e, especialmente os vinte e oito anos de serviço do arguido nos Hospitais da Universidade de Coimbra, somos de parecer que lhe deve ser aplicada uma pena mais leve do que a proposta nos artigos de acusação que lhe foram entregues no processo disciplinar (a pena do n.° 7 do artigo 11.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado e não a do seu n.° 9).
As acusações eram nesta altura o roubo das laranjas, o roubo de 9 kg de pão em 1955 e uma tentativa de roubo no peso do pão em 1958.
O Ministro da Saúde e Assistência não aceitou a proposta no que respeita à pena, mandando aplicar o artigo 23.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, pelas seguintes razões:
Através de uma jurisprudência inflexivelmente mantida, têm sido punidos sempre com a pena de demissão todos os servidores, do Ministério que praticam desvios de géneros ou artigos em seu proveito.
Não vejo razão para agora alterar esse critério: se o arguido merecia um certo conceito favorável à administração dos hospitais, isso, a meu ver, mais faz avultar a gravidade das faltas cometidas.
Que seria, com efeito, dos serviçcs se os funcionários merecedores de confiança se permitem servir-se dela para precisamente melhor a atraiçoarem?
c) O réu foi julgado no 1.° Juízo de Direito da Comarca de Coimbra e absolvido por sentença de 8 de Novembro de 1962.
Página 2085
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(109)
O referido tribunal certificou o seguinte:
Procedeu-se ao julgamento com a observância das formalidades legais e da discussão da causa provou-se que várias pessoas mexiam nas laranjas, pelo menos cinco, que a contagem não foi feita na presença do réu e que uma das pessoas que mexeu nas laranjas foi um tal ... que andava de relações cortadas com o réu. Nenhuma testemunha garantiu que o réu se tivesse locupletado com o dinheiro das 741 laranjas. Nestes termos, julgo improcedente a acusação e consequentemente absolvo o réu e mando-o em paz e liberdade.
d) A pedido do arguido foi autorizada a revisão do processo disciplinar por despacho ministerial de 1 de Fevereiro de 1963.
Afirmou no relatório respectivo o instrutor que os factos em que o tribunal baseou a absolvição eram conhecidos dos processos de inquérito e disciplinar a que aquele fora sujeito, mas não fora dada a essas «circunstâncias a valoração adequada e merecida». E conclui:
Dando-se como não provadas e improcedentes as acusações formuladas contra o reclamante e relacionadas com a pesagem do pão em 1955 e 1958 e com a falta de laranjas, convém julgar procedente a revisão e assim revogar o despacho de S. Ex.a o Ministro da Saúde e Assistência, datado de 27 de Novembro de 1961, na parte em que aplicou ao ... a pena de demissão do cargo de servente dos Hospitais da Universidade.
Não deixou de ser estranhâvel que um mesmo quadro factual servisse tão desencontradas conclusões, variáveis de processo para processo, de instrutor para instrutor. Se havia legítimas dúvidas quanto à reconstituição do que efectivamente aconteceu, se se constatou a impossibilidade de as desfazer (face a «blocos» antagónicos que se atêm coerentemente à sua versão dos acontecimentos), poderia haver ainda assim fundamento para condenação disciplinar do arguido, mas já não seria justo que se lhe aplicasse, de ânimo leve, a mais pesada das sanções.
Na verdade, o não apuramento do que na realidade se passou não pode, por exemplo no caso das decisões judiciais, obstar a que se julgue.
A tal servem as regras do ónus da prova. Regras que levaram, no caso concreto, à absolvição do réu em tribunal. Melhor prova não se fez no processo disciplinar (note-se que para o primeiro instrutor qualquer dos funcionários que trabalhavam na despensa pode ter feito o desvio da fruta; para o segundo, guiado por mera convicção subjectiva, o reclamante é culpado e o participante e as suas testemunhas são merecedoras de confiança em função de uma actuação psicologicamente mais adequada no processo; para o último, subsistem as maiores dúvidas quanto aos responsáveis e aos motivos do desaparecimento das laranjas).
Não obstante, sendo o estatuto disciplinar regido por outras linhas mestras, ao arguido poderia talvez ser assacada responsabilidade por negligência (ele não conferiu a fruta comprada, procedimento, aliás, habitual, pois os vendedores costumavam mandar
sempre unidades a mais; assim havia sempre um saldo real superior ao número escriturado, só estando em causa no processo aquele, pois este último estava certo).
De jure constituendo várias considerações pareceram oportunas, desde logo, quanto ao desrespeito aqui verificado do princípio in dúbio pro reo. Igualmente condenável pareceu o facto de tirar da aplicação de penas disciplinares consequências mais ou menos gravosas em matéria de segurança social, que àquela è, ou deve ser, totalmente alheia. Os direitos que os indivíduos adquirem no campo de segurança social devem ser considerados invioláveis, em caso algum podendo ser postos na disponibilidade de quaisquer entidades públicas, pois correspondem a deveres estaduais (ou paraestaduais) que cobrem necessidades básicas e não a favores, discricionaria-mente retirados. De resto, numa sociedade empenhada na via socialista qual pode ser o significado da perda do direito à aposentação ou do direito à saúde.
Não pareceu mesmo que fosse despiciendo que com carácter de urgência fosse feita à Administração Pública uma recomendação no sentido de rever imediatamente os Estatutos Disciplinares e de Aposentação na parte em que admitem a repercussão jurídica de sanções disciplinares nos aspectos caracteristicamente de segurança social, por forma que a aplicação daquelas sanções deixe imprejudicados a contagem de tempo e o direito à aposentação [v. disposto nos artigos 13.°, §§ 1.°, 2.°, 3.°, alínea 6), e 5.°, alínea a), do Estatuto Disciplinar e 76.° do Estatuto de Aposentação].
Esta alteração legislativa, retroactivamente aplicada a fim de restituir a todos os funcionários vitimas de tais normas a plenitude dos seus direitos à segurança social, satisfaria, em parte, a pretensão do reclamante.
Mas igualmente se entendeu que seria de ir mais longe e propor mesmo ao Ministério dos Assuntos Sociais a concessão de nova revisão do processo, a fim de fazer justiça.
Não se encontrou realmente qualquer facto constitutivo de direitos que a tal possa obstar e em favor de tal atitude pode argumentar-se com a aludida apreciação contraditória dos mesmos factos e com a desproporção da pena aplicada por um ministro salazarista e mantida por outro, contra o parecer do instrutor do processo de revisão.
A graduação de pena será uma faculdade discricionária da Administração, mas nem por isso estaria o Provedor de Justiça impedido de intervir e de recomendar um uso mais justo do poder punitivo.
Tanto mais que se detectou flagrante anomalia na fundamentação em que o então Ministro da Saúde e Assistência apoiou a decisão de demitir o ora reclamante da função pública: a de transformar uma alegada circunstância atenuante (vinte e seis anos de leal serviço) em circunstância agravante, em singular oposição ao espirito do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, que prescreve no seu artigo 25.°:
São circunstâncias atenuantes especiais da infracção disciplinar:
1 — A prestação de mais de dez anos de serviço com exemplar comportamento e zelo.
Página 2086
1076-(110)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Se o mero «bom comportamento» era uma circunstância agravante para o ministro salazarista, o que não seria para ele, por maioria de razão, «o exemplar comportamento e zelo»? Mostrou-se assim, pelo menos, incapaz de aplicar o artigo 25.° Afigurou-se, por isso:
Que, por um lado, a punição era em parte ilegal por considerar como agravante uma circunstância atenuante; Que, por outro lado, atendendo à insuficiência da prova feita, à oscilação dos juízos sobre ela proferidos, aos ingredientes subjectivos dos pareceres dos inquiridores no processo disciplinar, ao «saldo lógico» que de algum modo se obtém do parecer do inquiridor para o teor e fundamentação da pena aplicada, o reclamante deveria quando muito ter sido punido por negligência mas que, mesmo nesse caso, já teria sido mais do que suficiente o afastamento do serviço.
Nestes termos, entendeu-se recomendar ao Ministro dos Assuntos Sociais a revogação da decisão tomada por aquele Ministro do antigo regime, uma vez que não sendo o acto constitutivo de direitos poderia, por iniciativa dos Poderes Públicos, ser revogada a todo o tempo.
Respondeu o Sr. Ministro que entendia tratar-se «de um acto definitivo e executório há muito executado, que podia ter sido objecto de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, mas não o foi nem da primeira nem da segunda vez. Há assim uma espécie de trânsito da decisão que determinou a sua estabilidade».
E acrescentou:
«Pela doutrina apresentada, desnecessário teria sido o Decreto-Lei de 26 de Abril de 1974 que permitiu a reintegração de funcionários por motivos políticos».
Mais apontou:
«De resto é mais que discutível a afirmação de que o acto não é constitutivo de direitos pois esta expressão pode abranger tanto actos que atribuem como os que retiram direitos e, por reflexo, permitam a constituição de direitos alheios, desde que abram vagas que terceiros possam ocupar, como decerto é o caso.»
E, terminando, afirmava não alterar a decisão, para o que, explicitava, «o meio usado não tinha idoneidade processual».
Em face desta posição, entendeu o Provedor de Justiça ser caso de insistir pela justiça do que recomendara, realçando os argumentos que lhe pareceram decisivos para uma vez mais atestar a indispensabilidade dessa justiça, designadamente relevando a manifesta desproporcionalidade da pena aplicada.
Essa insistência veio a ter afinal o melhor efeito, uma vez que foi ministerialmente decidido reintegrar no quadro de pessoal dos Hospitais da Universidade de Coimbra o reclamante e com a mesma categoria profissional que detinha à data do despacho que o demitiu da função pública.
E então se arquivou o processo.
Processo n.° 76/R-635-A-2
Alguns trabalhadores da Direcção dos Serviços de Formação Profissional dirigiram ao Provedor de
Justiça uma reclamação contra o Ministro do Trabalho, cujo fundamento consistia na instauração de processos disciplinares aos reclamantes com base no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, por alegada participação numa reunião não autorizada no local de trabalho no dia 12 de Novembro de 1976.
Contactados o Ministério do Trabalho e a Secretaria de Estado da População e Emprego a fim de esclarecerem a factualidade exposta, só em Janeiro de 1978 logrou o Serviço dò Provedor de Justiça fazer o ponto da situação dos trabalhadores processados e, ainda assim, incompletamente: três trabalhadores eventuais haviam sido dispensados do serviço, outra teria estado suspensa preventivamente mais de trezentos dias e, ainda, de outro nada se sabia.
Em Julho de 1978 foi obtida da Secretaria de Estado da População e Emprego informação de que os reclamantes já estariam a exercer funções na sua Direcção de Serviços, encontrando-se a situação normalizada.
De todo o modo, não poderia deixar o Provedor de Justiça de formular justo reparo a todo este caso: o arrastamento dos processos disciplinares — a notar qje entre 10 de Janeiro de 1977 e 19 de Dezembro de 1977 os processos estiveram totalmente parados — sem razão que isso justificasse, a demora em atender as sucessivas interpelações do Provedor de Justiça, o reciproco reenvio de competências entre a Secretaria de Estado da População e Emprego e o Ministério do Trabalho, seriam motivos mais do que justificativos para fornecerem uma imagem nada abonatória da Administração Pública e que muito se afasta dos princípios constitucionais (artigo 267.°), lesando gravemente os direitos do cidadão funcionário.
Foi ta! reparo transmitido ao Secretário de Estado da População e Emprego, expressando-se o desejo de que casos desta natureza não voltassem a repetir--se, até pelo prejuízo que deles decorre para a imagem da justiça disciplinar do Estado.
Processo n.° 76/R-881-B-1
Em 5 de Abril de 1976, foi levantado processo disciplinar a uma servente eventual da Escola Preparatória ce Ramaiho Ortigão, no Porto, com fundamento em alegadas injúrias a dois professores de uma escola do ensino primário.
Pelo mesmo despacho foi suspensa do exercício de funções e de remuneração.
Em Setembro do mesmo ano, o marido da servente queixou-se ao Provedor por o processo ainda pender e ela continuar sem trabalhar nem auferir remuneração.
Auscultado o Ministério, veio a apurar-se que o instrutor do processo resolvera aguardar a sentença a proferir em processo crime pendente sobre os mesmos factos.
Por outro lado, a suspensão da arguida não fora prorrogada nos termos legais.
Em Dezembro de 1976, o Secretário de Estado da Administração e do Equipamento Escolar despachara no sentido de a trabalhadora dever regressar ao serviço, mas, por deficiências burocráticas, essa decisão só veio a ser executada em Junho de 1977 — já depois da intervenção do Provedor no caso.
Página 2087
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(111)
Em consequência, foi ordenado o pagamento à interessada das remunerações que ilegalmente deixara de receber.
O processo disciplinar, depois de reformulado por iniciativa do Ministério (depois revelava várias deficiências), culminou com a aplicação à arguida de uma pena que se teve por legal.
Todavia, o Provedor chamou a atenção do Secretário de Estado para:
a) A independência dos processos disciplinar e
criminal, pelo que se não revelara adequado o procedimento seguido pela Administração de se aguardar, por largo período, a conclusão do segundo;
b) A necessidade de sucessiva prorrogação — se
indispensável — da suspensão preventiva.
Processo n." 76/R-1344-A-2
Determinado funcionário, escriturário-dactilógrafo do quadro de pessoal administrativo de uma escola preparatória, foi notificado de que, no processo disciplinar que tinha pendente, lhe havia sido aplicada a pena do n.° 7 do artigo 11.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, graduada em um ano de inactividade sem vencimento algum mas nela se descontando o tempo em que estivera suspenso.
Na sequência dessa notificação o aludido funcionário requereu ao director-geral de Pessoal do Ministério da Educação e Investigação Cientifica que lhe fosse paga, por despesas de anos findos, a importância correspondente ao tempo de suspensão sem vencimento que tinha sofrido, descontado o ano com que fora punido.
Todavia tal requerimento foi indeferido, o que, do ponto de vista deste Serviço, foi tido como menos correcto uma vez que se teve por inequívoco o direito daquele aos vencimentos relativos ao período de suspensão que excedeu o ano.
Nestes termos foi solicitado ao Ministro da Educação e Investigação Cientifica que providenciasse no sentido de ser dada ao requerimento e com a urgência que a precária situação financeira do reclamante impunha, a única sequência que legal e humanamente se justificava.
Posteriormente, o Gabinete do Sr. Ministro informou que o funcionário em questão, tendo estado na realidade suspenso sem vencimento por tempo superior ao determinado, iria ser correspondentemente indemnizado.
Processo n." 77/R-116-A-2
Para apreciação de uma reclamação apresentada por uma funcionária contratada do antigo Arquivo Geral do Registo Criminal e Policial, a quem fora aplicada a pena de demissão, nos termos do n.° 10 do artigo 6.° do Regulamento Disciplinar dos Funcionários de 22 -de Fevereiro de 1913, mediante despacho publicado no Diário do Governo, de 9 de Novembro de 1942, solicitou-se a remessa do respectivo processo disciplinar, imprescindível para ajuizar da bondade daquela reclamação.
Porém, esse processo nunca foi encontrado e não se possibilitou ao Provedor de Justiça outra solução que não fosse a do arquivamento do caso.
Será de interesse realçar que tal decisão apenas foi tomada depois das mais diversas e exaustivas diligências, designadamente junto do Ministério da Justiça e da Procuradoria-Geral da República junto da Relação de Lisboa, com vista a localizarem-se aqueles autos e esgotados todos os meios visando tal finalidade e a reconstituição dos mesmos autos.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — ESTÁGIOS Processo ii.° 77/R-1878-B-1
Um grupo de estagiários da licenciatura do ramo de Formação Educacional das Faculdades de Ciências veio protestar contra a Portaria n.° 751/77, de 13 de Dezembro, do Ministro da Educação e Investigação Científica, a qual, declarando-se publicada nos termos do artigo 7.° do Decreto n.° 925/76, de 31 de Dezembro, concedeu quinze dias para os alunos do 5.° ano do curso em questão que estivessem a leccionar como professores eventuais ou provisórios optarem entre a docência ou a continuação dos estudos. O mesmo diploma vedava ainda aos alunos do ramo de Formação Educacional a admissão aos concursos de professores provisórios e eventuais.
Analisada a questão, entendeu-se que não competiria ao Provedor intervir nas suas incidências pedagógicas, sobretudo no tocante à segunda das normas constantes da portaria.
Ponderou-se, contudo, que a preterida proibição de admissão aos concursos não poderia ser legalmente consignada numa simples portaria, visto estar o regime aplicável àqueles fixado no Decreto-Lei n.° 262/77, de 23 de Junho. E muito menos deveria tal matéria poder constar de diploma que pretendia regulamentar um preceito relativo aos direitos e deveres dos estagiários do ramo de Formação Educacional.
Quanto à legalidade de opção prevista no n.° 1 da Portaria n.° 751/77, entendeu-se que:
1 — á) Nem o Decreto-Lei n.° 262/77, regulador dos concursos e provimento dos professores eventuais e provisórios, veda que a eles se candidatem alunos dos ramos educacionais, nem o Decreto n.° 925/76, regulador dos estágios destes ramos, proíbe a respectiva frequência aos professores eventuais e provisórios;
b) Os actuais professores eventuais ou provisórios que também sejam estagiários foram, pois, investidos nessas situações com base, respectivamente, num decreto-lei e num decreto regulamentar;
c) E parece que dessa investidura para eles decorrem certos direitos — no primeiro caso, o de exercer a docência, com a devida remuneração e mais regalias, em princípio pelo prazo de um ano, no segundo, o de frequentar o estágio;
d) No caso especial dos professores providos após concurso (não o dos reconduzidos), é de atentar, até, em que esse provimento tem hoje lugar mediante contrato — artigos 4.° e 14.° do Decreto-Lei n.o 262/77;
Página 2088
1076-(112)
II SÉRIE — NÚMERO 47
é) Não se afigura, pois, que um diploma com força apenas de portaria possa impor aos reclamantes uma opção, da qual necessariamente decorreria a cessação de uma das duas situações apontadas, qualquer delas adquirida com fundamento em diploma de superior grau hierárquico.
2 — Acresce que, não definindo a Portaria n.° 751/77 qual o sentido que possa atribuir-se ao silêncio daqueles que porventura não façam a opção prevista no seu n.° 1, nem cominando qualquer sanção específica para o efeito, se parece ser reconduzido a que:
a) A eventual não realização da opção não poderá afectar a situação dos interessados enquanto professores.
No respectivo estatuto não consta qualquer dever deste tipo nem sanção para seu incumprimento.
Aliás, a Portaria n.° 751/77, ao declarar-se emanada ao abrigo do artigo 7.° do Decreto n.° 925/76, deixa expresso que tem em vista regulamentar direitos e deveres dos estagiários;
b) Apenas se poderia vir a entender, pois, que, ao não realizar a opção, os interessados estariam a violar um dever enquanto estagiários — como alunos do ensino superior, portanto.
Não existindo no Decreto n.° 925/76, nem nas Portarias n.os 786/76 e 751/77, quaisquer regras especiais a este respeito, será de entender que a competência disciplinar sobre eles cabe à respectiva Universidade, a qual ajuizaria da oportunidade ou da não instauração de processos disciplinares — os quais, aliás, até poderiam vir a culminar na aplicação de sanção inferior à da suspensão ou exclusão da frequência da escola;
c) Não pode esquecer-se, é certo, que os contratos celebrados por mais de um ano ou por tempo indeterminado — e os dos professores eventuais ou provisórios são-no, sob condição de terem vaga no ano seguinte, ou, em qualquer caso, se aqueles aceitarem colocação em qualquer escola — podem, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, alínea é), do Decreto-Lei n.° 49 397, ser rescindidos antes do prazo normal, por conveniência de serviço, mediante aviso prévio de dois meses ou correspondente indemnização.
E tâo-pouco pode ignorar-se que os professores eventuais ou provisórios nomeados podem ser exonerados:
No ensino liceal, «livremente» (Estatuto do Ensino Liceal, aprovado pelo Decreto n.° 36 508, de 17 de Setembro de 1947, artigo 112.°);
No ensino técnico, se a «conveniência do ensino o exigir» (Decreto n.° 37 029, de 25 de Agosto de 1948, artigo 357.°, n.° 3);
No ensino preparatório, «logo que as condições do serviço os tornem dispensáveis» (Estatuto do Ciclo Preparatório, aprovado pelo Decreto n.° 48 572, de 9 de Setembro de 1968, artigo 222.°). Só que será de ponderar que:
Especificamente, a regra relativa ao ensino liceal deverá entender-se limitada também, como nos outros ramos, à conveniência de serviço;
De qualquer modo, e em geral, uma eventual exoneração subsequente à não efectivação da
opção em causa enfermaria de desvio de poder, por assumir a função de sanção por essa omissão.
3 — Enfim, parece menos justo o teor do n.° 1 da Portaria n.° 751/77, na medida em que, pela retroactividade que implica — efeito que, pela sua gravidade, só em casos muito excepcionais é de admitir —, é susceptível de causar prejuízos apreciáveis aos que, já nomeados como professores e auferindo os respectivos vencimentos, e, por outro lado, já a frequentarem os estágios, tenham organizado a sua vida, neste ano escolar, sobre tal base.
Dada a urgência do assunto, resultante do curto prazo de opção concedido e da indefinição da situação em que os interessados, após ele, poderiam vir a ficar, teve lugar um contacto directo com o Secretário de Estado da Orientação Pedagógica em que se expôs a posição do Provedor de Justiça.
Em resultado desta diligência, o Ministério anunciou, no próprio dia, que iria suspender a aplicação da norma contestada.
Formulou-se, depois, recomendação no sentido da revogação, por ilegal, dessa norma.
Entretanto, o Ministro da Educação e Investigação Científica, admitindo o acerto da argumentação jurídica apresentada pelo Provedor — embora considerasse persistirem as razões pedagógicas que haviam dado origem ao diploma —, publicou a Portaria n.° 11/78, revogando o n.° 1 da Portaria n.° 751/77. E prescreveu nesta nova portaria que passaria, contudo, a ser contado como docente o tempo de serviço dos alunos do ramo de Formação Educacional que contudo optassem pela frequência deste.
Só que, deste modo, se introduziu um factor de injustiça relativa, em desfavor daqueles alunos do ramo de Formação Educacional que, logo de início — e não, portanto, por via da opção agora facultada, embora não imposta —, houvessem decidido prescindir da docência, aliás segundo o procedimento tido pelo Ministério como pedagogicamente mais recomendável.
Também este aspecto se suscitou ao departamento visado.
A matéria veio, por fim, a ser de novo totalmente regulada, em termos aceitáveis, quanto aos aspectos analisados neste processo, pela Portaria n.° 649/78, de 8 de Novembro.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — PROVIMENTO Processo r..° 73/R-;725-A-2
Um conjunto de professores do Conservatório Nacional e, depois, o Sindicato dos Professores reclamaram da decisão do então Ministro da Educação e Cultura, no sentido de serem denunciados os contratos dos professores do Conservatório Nacional, seguida da publicação do Despacho Ministerial n.° 172/ 78 (Diário da República, 2.° série, de 19 de Julho de 1978) abrindo concurso geral para professores daquele estabelecimento de ensino.
Os reclamantes contestavam, por um lado, a justiça da providência consistente em se denunciarem os contratos de muitos docentes vinculados ao Conser-
Página 2089
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(113)
vatório há já largos anos e, por outro, o acerto de se submeter a sua eventual readmissão a um concurso cujas regras não estavam suficientemente definidas.
Auscultado o Ministério sobre o caso, este respondeu que, não estando ainda em causa o preenchimento dos quadros do Conservatório, dependente da sua reestruturação, ainda em estudo, mas apenas a admissão de pessoal além do quadro, o Decreto-Lei n.° 31 890, de 24 de Fevereiro de 1942, não estabeleceria quaisquer regras especiais para o efeito, nada obstando, pois, à utilização do sistema de concurso que fora adoptado. Os que viessem a ser nesses termos escolhidos ficariam vinculados nos termos dos contratos a celebrar e, na falta de estipulações especiais, nos da lei geral aplicável — Decreto-Lei n.° 49 397, de 24 de Novembro de 1969.
Apreciado o caso, entendeu-se que, embora a denúncia de contratos operada tivesse apoio legal, ela não se apresenta justa nem corresponde à prática normal na função pública, em situações similares.
Isto se ponderou ao Ministério da Educação e Cultura, acrescentando que, na medida do possível, se deveria proceder à renovação dos contratos, esta-belecendo-se uma escala de prioridades que tivesse em conta o tempo de serviço.
E, uma vez que a reforma do Conservatório estava em preparação há longos anos, indicou-se que os respectivos quadros deveriam ser actualizados o mais rapidamente possível, de acordo com as necessidades actuais.
Na reestruturação em causa dever-se-ia ter em conta a situação dos professores cujos contratos foram denunciados, encarando-se, para aqueles cuja formação se considerasse insuficiente para leccionar no Conservatório, a possibilidade da sua reconversão para outros tipos de ensino, e, em último caso, a sua sujeição ao regime geral dos excedentes de pessoal.
O Ministro retorquiu que o procedimento utilizado em relação ao Conservatório tê-lo-ia antes }. '• também sido, com excelentes resultados, em relação à Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Por seu turno, a actualização do quadro da escola não deveria fazer-se antes da respectiva reestruturação.
Quanto à situação dos ex-professores do Conservatório, o Ministro referiu que, dos noventa professores colocados em 1977-1978, só seis, aliás com reduzido tempo de serviço, haviam sido excluídos do concurso. Dos professores cujos contratos foram denunciados, vinte e três não concorreram, incluindo--se nesse grupo alguns dos considerados menos habilitados. Enfim, cerca de 50 °7o dos concorrentes eram estranhos à escola, o que, além de revelar que o anterior recrutamento de professores se fazia em termos muito restritos, viria permitir uma salutar renovação do corpo docente.
Em face da posição do Ministério, e não se detectando a existência de ilegalidades, considerou-se esgotada qualquer outra possibilidade de intervenção do Provedor neste caso.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — REMUNERAÇÕES Processo n.° 77/R-471-A-2
1 — Um administrador de concelho do quadro administrativo dos Serviços de Administração Civil de
Angola foi desligado do serviço, para efeitos de aposentação, por despacho de 2 de Junho de 1975 do, ao tempo, Ministro do Interior do Governo de Transição daquela ex-colónia.
Por despacho do mesmo Ministro foi, posteriormente, autorizado a fixar residência definitiva em Portugal.
Requereu, de seguida, ao Ministro do Planeamento e Finanças daquele Governo, lhe fossem abonadas por conta do Estado, nos termos do n.° 2 do artigo 259.° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, passagens por via aérea, de Nova Lisboa para Lisboa e transporte de bagagem, dentro dos limites legais, para ele e seus familiares, e, ainda, lhe fosse paga a ajuda de custo de embarque a que tinha direito por força do disposto no artigT 286.° do mesmo Estatuto.
Estes pedidos foram indeferidos com o fundamento de que, por ser funcionário natural de Angola, não tinha direito a abonos desse género.
Em face da atitude da Administração de Angola, tentou beneficiar das facilidades de transp< e concedidas aos «adidos» mas até isso lhe foi negado por se encontrar já desligado do serviço para efeitos de aposentação.
Porque não funcionava ainda, nem, tão-pouco, estava garantida a efectivação da «ponte aérea» e, pressionado, também, por motivos de saúde e de segurança pessoal, adquiriu, à sua custa, passagens, por via aérea, de Nova Lisboa para Lisboa, para si e seus familiares (esposa e um filho estudante, de menor idade) e pagou, de seu bolso, o frete da sua bagagem, por via marítima, de Moçâmedes para Lisboa.
Chegado a esta última cidade requereu ao então Sr. Ministro da Cooperação das aludidas passagens e transporte de bagagem e, ainda, o pagamento da ajuda de custo de embarque.
Por despacho do, ao tempo, Secretário de Estado da Descolonização foram esses pedidos indeferidos.
2 — Não se conformou o interessado e, na impossibilidade de interpor recurso contencioso desse despacho para o Supremo Tribunal Administrativo, por carência dos meios económicos para isso necessários, reclamou para o Provedor de Justiça.
Depois de estudo cuidadoso do problema, chegou--se, neste Serviço, às conclusões seguintes:
3.1 — O despacho do Ministro do Planeamento e Finanças do Governo de Transição de Angola, violou flagrantemente o disposto no artigo 259.° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino aprovado pelo Decreto n.° 46 982, de 27 de Abril de 1966, que acabou, de vez e bem, com a discriminação e diferença de tratamento decorrentes da naturalidade, a que o antigo texto daquele artigo, na versão aprovada pelo Decreto n.° 40 708, de 31 de Julho de 1956, dava lugar.
3.2 — O caso do reclamante não está abrangido na previsão dos despachos genéricos de 4 e 13 de Abril de 1976 do, ao tempo? Secretário de Estado da Integração Administrativa, através dos quais a Administração pretendera concretizar os «casos absolutamente excepcionais» a que se refere o artigo 260.°, § 1.°, daquele Estatuto, e em que seria permitido o reembolso de passagens. Mesmo que assim se não entendesse.
Página 2090
1076-(114)
II SÉRIE — NÚMERO 47
3.3 — A Administração, no exercício de um poder discricionário, pode, é certo, através de directivas genéricas daquele tipo, autovincular-se. Mas é de entender que tal vinculação só valerá no sentido em que as ditas directivas criaram direitos ou expectativas aos cidadãos.
Porém, não deverão elas ter-se por vinculantes no sentido negativo, sob pena de a mesma Administração frustrar, por via regulamentar, o que uma norma superior pretendeu conseguir ao conceder-lhe um poder discricionário.
É que na base da concessão de um poder discricionário está, precisamente, o intuito de propiciar, para melhor adequação de certo tipo de decisões à realidade, uma prévia apreciação individual e concreta de cada caso.
3.4 — O encargo com o reembolso das passagens e frete de bagagem e com o pagamento da ajuda de custo de embarque deve, agora, ser suportado pelo Estado Português.
4 — Transmitidas estas conclusões e as razões de facto e de direito que as fundamentavam ao Sr. Secretario de Estado da Integração Administrativa, foi dirigida à mesma entidade uma recomendação no sentido de serem reapreciados, não só o caso do reclamante, como todos os outros idênticos ao dele, em ordem a ser feita justiça a que todos, sem discriminação, têm igualmente direito.
A recomendação não foi, porém, acatada sob a invocação de que «os casos absolutamente excepcionais» em que, legalmente, é permitido o reembolso do custo de passagens são, tão-só e apenas, aqueles que foram definidos pelos despachos de 4 e 13 de Abril de 1976. Se é certo que se poderia alargar o âmbito desses despachos por forma a incluir neles a situação do reclamante, não é menos verdade que correr-se-ia sempre o risco de muitos outros casos não serem abrangidos. O pagamento da ajuda de custo de embarque foi negado, genericamente, por despacho ministerial de 19 de Fevereiro de 1976, a todos os funcionários que o requereram e haviam regressado a Portugal em consequência do processo de descolonização. A alteração dessa directiva, implicaria, agora, que o Estado Português teria de pagar ajudas de custo de embarque a cerca de 50000 funcionários afectos à antiga administração ultramarina, o que seria, de todo em todo, incomportável.
5 — Estas razões não eram, obviamente, convincentes, pelo que o caso acabou por ser levado ao conhecimento do Sr. Ministro da Reforma Administrativa, ao tempo o competente, por ter sido extinta a Secretaria de Estado da Integração Administrativa.
Esta entidade, após estudo do problema por parte do Gabinete de Apoio Jurídico ao seu Ministério, acabou por perfilhar as conclusões a que havia chegado o Serviço do Provedor de Justiça e ordenou o reembolso e pagamento da ajuda de custo de embarque requeridos.
Não ordenou, porém, a revisão dos casos similares anteriores, não só por lhe parecer dificílima, como, também, porque da posição assumida quanto ao caso em apreço não decorre o dever legal de rever, motu próprio, os casos já resolvidos ao abrigo dos citados despachos de 4 e 13 de Abril de 1976, ou do § 1.° do artigo 260.° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, uma vez que a qualificação do caso como excepcional é ainda um poder discricio-
nário da Administração, não tendo merecido crítica do Supremo Tribunal Administrativo os critérios utilizados.
Processo n.° 77/R-1441-A-2
Uma funcionária, antiga segundo-oficial dos CTT da ex-colónia de Angola, actualmente integrada no quadro geral de adidos, reclamou para o Provedor de Justiça contra a actuação da Direcção-Geral da Fazenda da extinta Secretaria de Estado da Integração Administrativa no tocante à falta de liquidação dos vencimentos de Setembro a Dezembro de 1975 e subsídio de Natal do mesmo ano que, segundo ela, há muito lhe deveriam ter sido pagos.
Ouvida a entidade visada, informou ela encontrarem-se já sanadas as deficiências apontadas pela reclamante no tocante ao pagamento das quantias a que tinha direito e apresentou para aquelas justificação consubstanciada nas precaríssimas condições em que o pessoal daquele serviço era obrigado a trabalhar.
Foi considerada aceitável a explicação dada, mas para a grave situação de insuficiência detectada foi chamada a atenção do então Ministro da Reforma Administrativa com vista à adopção de medidas adequadas e uma rápida melhoria dos serviços em causa, o que obteve imediata receptividade, tendo aquele Sr. Ministro transmitido ao Provedor de Justiça o despacho que, com tal finalidade proferiu.
Processo n.« 77/R-1447-B-!
Um tesoureiro da Fazenda Pública dos Açores e sócio do Cofre de Previdência do Ministério das Finanças pediu a intervenção do Provedor de Justiça por se considerar lesado nos seus direitos pela recusa de recebimento de um seu pedido com fundamento no incumprimento do prazo estabelecido pelo artigo 69.° dos Estatutos.
O caso, depois de estudado, foi colocado ao aludido Cofre de Previdência, perguntando-se a sua posição e sugerindo-se logo o entendimento que parecia correcto.
A opinião deste Serviço foi exposta nos seguintes termos:
Segundo o artigo 69.° dos Estatutos do Cofre de Previdência do Ministério das Finanças, o sócio poderá requerer no prazo de trinta dias, a contar do último dia do período da doença, a comparticipação que lhe é atribuível.
Ora, sendo o dia 28 de Julho de 1977 o último dia da doença, o prazo, nos termos da alínea b) do artigo 279.° do Código Civil, começaria a contar-se desde 29 e terminaria, portanto, a 27 de Agosto (inclusive).
A recusa comunicada pelo oficio desses serviços fundamentava-se no decurso de trinta e dois dias na data do registo de recepção do respectivo pedido.
Parece, porém, que a posição do Cofre poderá não ser a adequada, se forem atendidos os factos seguintes, para os quais se chama a atenção de VV. Ex."
Página 2091
3 D2 ABRIL DE 1979
1076-(115)
1 — O termo do prazo (27 de Agosto) recaiu num sábado.
2 — Neste dia não funcionam os serviços destinatários, nem há distribuição de correio.
Estes factos notórios justificam não só o impedimento do requerente, como deverão intervir, nos termos das leis aplicáveis, como motivo de transferência do fim do prazo para o dia útil que se lhe seguir.
Assim, a recepção do requerimento na segunda-feira, 29 de Agosto, deu-se atempadamente e não pode fundamentar a recusa em considerar o pedido, negando os efeitos decorrentes da lei.
Em resposta, o Cofre informou que, muito embora o associado não tivesse usado do meio legal de que dispunha — recorrer da decisão para a assembleia geral, nos termos do artigo 102.° dos Estatutos, aprovados pelo Decreto-Lei n.° 465/76, de 11 de Junho —, a direcção resolvera reabrir o processo, uma vez que a aplicação do preceito já se vinha seguindo desde há tempos.
Assim, o Cofre ia oficiar ao associado no sentido de enviar novo requerimento em papel selado.
O presente processo foi, portanto, arquivado com resolução do problema suscitado.
Processo n.° 78/R-2410-A-2
O reclamante, ajudante de tesoureiro da Tesouraria da Fazenda Pública de Coimbra, foi nomeado, interinamente, como tesoureiro da Fazenda Pública de Penela, devido a impedimento do então titular desse lugar.
Tal nomeação foi, naturalmente, feita por conveniência de serviço — corroborada pelo facto de no departamento em questão funcionar, por acumulação, a tesouraria da Câmara Municipal e da Delegação da Caixa Geral de Depósitos.
Tendo o interessado requerido a concessão de ajudas de custo por essa deslocação, que não pudera deixar de aceitar, foi-lhe esse abono recusado, por falta de apoio legal.
Estudado o assunto, pôde confirmar-se que, de facto, o Decreto-Lei n.° 33 834, de 4 de Agosto de 1944, só permite o abono de tais ajudas de custo em caso de deslocação do funcionário no exercício das funções de certo cargo, e não já para efeitos de ir desempenhar cargo diverso.
Considerando-se, contudo, ser claramente injusta esta situação, foi feita recomendação no sentido de se formular alteração legislativa a autorizar o abono de ajudas de custo na hipótese de o trabalhador da função pública ser deslocado, por conveniência de serviço, por transferência ou para ocupar cargo diverso do originário.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — SANEAMENTO Processo n.« 76/R-29-A-5
1 — Uma reclamante, engenheira química industrial, apresentou neste Serviço uma reclamação re-
portada a uma transferência que lhe fora imposta por despacho de 22 de Novembro de 1974 do então Secretário de Estado da Indústria e Energia, do cargo que, desde 1961, ocupava na Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais (chefe da Repartição de Normalização) para o de técnico de 1." classe da Direcção-Geral da Qualidade e Segurança Industriais.
2 — Em 30 de Junho 1976, a reclamante voltou a este Serviço esclarecendo que, tendo recorrido, para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos dos n.05 1 e 2 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março, do despacho ministerial que lhe impusera a citada transferência, aguardaria a decisão que aquele recurso viesse a merecer, e conforme o seu teor ajuizaria da conveniência de manter a queixa apresentada.
3 — Só em 15 de Dezembro de 1976 a reclamante voltou a dirigir-se ao Provedor de Justiça, referindo que o processo de recurso que interpusera transitara, de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.° 41/ 76, de 20 de Janeiro, para o Conselho da Revolução, e que este Conselho em despacho de 24 de Maio de 1976 (publicado no Diário da República, 2." série, de 10 de Agosto de 1976) determinara a anulação da transferência.
Conforme alegava, apesar de numerosas exposições dirigidas às entidades competentes, não fora ainda reconduzida ao seu lugar de chefe da Repartição de Normalização da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais nem tinha conhecimento de ter aquele lugar sido desocupado pelo seu actual titular, que para o mesmo fora nomeado logo após a sua transferência, e embora estivesse a correr seus trâmites no Supremo Tribunal Administrativo o recurso que contra a mesma havia sido interposto.
Queixava-se ainda de que, como consequência da sua transferência, não fora considerada a sua candidatura no preenchimento de uma das vagas de engenheiro inspector superior da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais entretanto ocupada por outro chefe da Repartição daquela Inspecção--Geral, mais novo na categoria do que a reclamante, embora, já antes da sua transferência da Inspecção--Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais e mesmo posteriormente à anulação da mesma, a reclamante tivesse solicitado, em numerosos requerimentos, que a sua candidatura fosse, nos termos da lei, tida na devida conta.
4 — No seguimento de diligências feitas por este Serviço para esclarecimento do assunto, veio a averiguar-se que, tendo o estudo do mesmo sido cometido à Secretaria-Geral do Ministério da Indústria e Tecnologia, só em 21 de Janeiro de 1978 este foi dado por findo, com a conclusão de que, tendo já passado mais de um ano sobre a nomeação definitiva do funcionário que logo após a transferência da reclamante fora nomeado para o seu lugar, o regresso da reclamante ao mesmo, por efeito da anulação da transferência, era legalmente inviável. Quanto à candidatura da reclamante para o lugar de inspector superior da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, era ainda parecer da referida Secretaria--Geral que tal era igualmente impossível, visto ela «continuar, assim, a ser técnica da Direcção-Geral da Qualidade e Segurança Industriais».
Página 2092
II SÉRIE — NÚMERO 47
5 — A 17 de Março de 1978, pelo Provedor de Justiça foi recomendado ao Ministro da Indústria e Tecnologia que:
a) A reclamante, por efeito da anulação da
transferência pelo despacho de 24 de Maio de 1976 do Conselho da Revolução, fosse, para todos os efeitos, considerada como se nunca tivesse sido afastada da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, devendo, assim, retomar o seu lugar de chefe da Repartição de Normalização;
b) Dada a inviabilidade, por exclusiva culpa da
Administração, de retomar o seu lugar (já ocupado definitivamente há mais de um ano), se ainda possível (face ao Decreto--Lei n.° 548/77, de 31 de Dezembro), lhe fosse então conferida a categoria de engenheiro inspector superior da Inspecção--Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais, lugar que a reclamante estaria eventualmente a ocupar se não tivesse sido ilegalmente transferida;
c) Caso o recomendado na alínea anterior já
não fosse viável, que na lista dos novos serviços a ingressar no Ministério da Indústria e Tecnologia, de acordo com o n.° 3 do artigo 55.° do Decreto-Lei n.° 548/77, de 31 de Dezembro, a reclamante fosse incluída com a categoria de inspector superior ou equivalente.
6 — Pelo Despacho n.° 65/78, de 2 de Maio de 1978, do então Ministro da Indústria e Tecnologia (publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 113, de 17 de Maio de 1978, com nova redacção no Diário da República, 2." série, n.° 132, de 9 de Junho de 1978), foram determinadas as medidas constantes das alíneas a) e b) da recomendação do Provedor de Justiça, transcritas no número anterior. E por despacho de 28 de Junho de 1978 do mesmo Ministro (publicado no Diário da República, 2.a série, de 8 de Agosto de 1978), foi a reclamante nomeada interinamente engenheiro inspector superior do quadro da Inspecção-Geral dos Produtos Agrícolas e Industriais.
Processo n.° 76/R-101I-A-2
Recorreu ao Provedor um professor do quadro geral de ensino primário que, em Dezembro de 1975, fora aposentado por conveniência de serviço, depois de, a partir de Junho do mesmo ano, haver sido suspenso da sua actividade e de lhe haver sido instaurado um processo que não teria tido seguimento.
Consultado o processo existente no Ministério da Educação e investigação Científica, verificou-se que a suspensão do queixoso tivera lugar por despacho de 18 de Junho de 1975, proferido ao abrigo do n.° 1 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março (saneamento de trabalhadores da função pública).
Da restante documentação constavam acusações várias feitas ao professor, que, contudo, não fora sequer ouvido.
A aposentação dele viera a ser decretada pòr conveniência de serviço, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 152/75, de 25 de Março.
O professor recorrera para o Conselho da Revolução, mas essa diligência estava destinada ao fracasso, pois a medida aplicada não fora ao abrigo da legislação do saneamento.
Considerou, não obstante, estar-se perante um caso flagrante de desvio de poder.
Com efeito, a aposentação por conveniência de serviço fora aplicada com base em motivação atinente a razões de saneamento.
Deste modo, e mesmo que assim se tivesse pretendido não atingir o professor com uma medida de saneamento, a verdade é que se lhe cercearam as possibilidades de defesa, designadamente eventual recurso para o Conselho da Revolução.
Ademais, a documentação que dera azo à aposentação nem constituía, sequer, um verdadeiro processo.
E dela não constava prova suficiente de haver objectiva conveniência de serviço na aposentação do reclamante, nem, ao invés, razões bastantes que obstassem ao seu eventual regresso à actividade.
Por isso, recomendou-se ao Ministro que revogasse o despacho que mandara aposentar o professor. Na realidade, apesar de se estar perante acto constitutivo de direitos e de haver já decorrido sobre ele mais de um ano, é mesmo assim de considerar legal a sua revogação, desde que nisso o interessado concorde. Neste sentido se exprime a melhor doutrina, de resto corroborada pelo parecer da Procuradoria--Geral da República n.° 91/77 (Diário da República, 2.a série, de 1 de Março de 1978).
O Ministro veio a seguir a recomendação formulada, revogando, com efeitos a partir da sua publicação, o acto discutido — isto por despacho de 25 de Julho de 1978 (publicado no Diário da República, 2.c série, de 4 de Agosto seguinte).
Processo n." 76/R-1092-A-2
1 — Em 20 de Outubro de 1976, um funcionário do Ministério do Trabalho reclamou junto do Provedor de Justiça alegando que, apesar de a Comissão de Análise de Recursos de Saneamento e Reclassificação, ao abrigo ca resolução do Conselho da Revolução de 23 de Março de 1976 (publicada no Diário da República, 2.° série, n.° 77, de 31 de Março de 1976), nos autos de recurso interposto pelo reclamante, ter determinado em 7 de Janeiro de 1977 a anulação da pena de demissão por ser acusado de pertencer à PIDE/DGS, anteriormente ihe fora pelo respectivo serviço aplicada a pena de suspensão sem vencimentos pelo período de dezoito meses (nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 5." do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março, com todas as consequências legais e efeitos a partir da data da demissão) e por despacho de 6 de Maio de 1977 (publicado no Diário da República, 2.° série, n.° 144, de 24 de Junho de 1977) do Secretário de Estado da População e Emprego fora determinado que a mesma suspensão de vencimentos fosse re-troagida a 15 de Novembro de 1974 e o funcionário continuasse suspenso das suas funções e respectivos vencimentos «até final da suspensão dos direitos políticos pler.os, nos termos constitucionais».
Página 2093
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(117)
2 — Em processos semelhantes o mesmo membro do Governo exarou, a 6 de Maio de 1977 e a 18 de Outubro de 1977, idênticos despachos (publicados no Diário da República, 2.a série, respectivamente n.° 144, de 24 de Junho de 1977, e n.° 253, de 2 de Novembro de 1977).
3 — Baseado no citado despacho ministerial publicado no Diário da República, 2.' série, n.° 253, de 2 de Novembro de 1977, o conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Água da Câmara Municipal de Guimarães assumiu posição semelhante em relação a um seu funcionário, que veio a ser anulada, por recomendação do Provedor de Justiça.
4 — Sobre o assunto exposto nos n.os 1 e 2 pronunciou-se a Procuradoria-Geral da República — parecer n.° 298/77, § 61, votado na sessão do Conselho Consultivo daquela Procuradoria-Geral a 6 de Abril de 1978, cujas conclusões se identificavam com a posição assumida pelo Provedor de Justiça na recomendação que, como citado, dirigira — e fora atendida — aos Serviços Municipalizados de Água da Câmara Municipal de Guimarães.
5 — Em 16 de Agosto de 1978, o Provedor de Justiça recomendou ao Secretário de Estado da População e Emprego que revogasse (anulação graciosa) os seus despachos referidos, e outros idênticos eventualmente exarados por essa Secretaria de Estado, por ilegais, porque inquinados de vício de violação de lei, devendo os funcionários pelos mesmos atingidos reassumir as suas funções nos termos da respectiva decisão reabilitadora da Comissão de Análise de Recursos de Saneamento e Reclassificação e ser indemnizados por o que tivessem sofrido pela indevida aplicação daqueles despachos ministeriais.
6 — Conforme em 31 de Outubro de 1978 comunica o reclamante, foi, em Agosto do mesmo ano, por despacho do Ministro do Trabalho reintegrado no serviço, acrescentando que «a justiça feita criteriosamente é sem dúvida alguma o melhor tónico para a boa compreensão entre os homens honestos e dignos».
Processo n.° 77/R-118-A-2
Um reclamante, funcionário do Instituto Nacional de Estatística, expôs a seguinte situação ao Serviço do Provedor de Justiça:
Pelo chefe de Divisão de Pessoal da Direcção dos Serviços de Coordenação e Administração--Geral do Instituto Nacional de Estatística foi--lhe comunicado em Outubro de 1974 e mediante oficio que, de acordo com despacho da comissão directiva daquele Instituto baseado numa exposição que lhe apresentara o grupo de saneamento que ali funcionava, ficara desligado dos Serviços com efeitos a partir da data daquele despacho.
Por oficio de Novembro de 1976, dirigido ao chefe de Gabinete do Primeiro-Ministro (e igualmente transmitido ao reclamante) pelo presidente da Subcomissão Interministerial de Saneamento e Reclassificação explicitava-se que, por deliberação tomada por aquela Subcomissão, fora mandado arquivar o processo em que o mesmo reclamante era visado.
Contudo, e apesar das diligências por aquele feitas, quer junto da Presidência do Conselho, que o teria remetido para a Secretaria de Estado do Planeamento, quer junto desta, que o teria enviado para o Instituto Nacional de Estatística (que por sua vez teria devolvido o assunto àquela Secretaria de Estado), nunca mais o reclamante obtivera qualquer conhecimento a respeito da alteração da sua situação.
Perante o exposto desenvolveu o Serviço do Provedor de Justiça as diligências tidas por necessárias ao apuramento da veracidade dos factos em causa, havendo finalmente tido por assente que:
Efectivamente a Comissão Interministerial de Saneamento e Reclassificação concluirá que, não havendo no processo respeitante ao reclamante qualquer matéria justificativa da aplicação de qualquer das medidas previstas no Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março, o mesmo processo deveria ser arquivado.
A recusa da comissão directiva do Instituto Nacional de Estatística em reintegrar o reclamante, apoiava-se num pressuposto legal inexacto — a já não possível revogação do despacho que o afastara —, pelo que, revestindo o regresso do reclamante a forma de uma nova admissão, teria ela de obedecer aos condicionalismos legais para o recrutamento da função pública, inclusivamente a prévia consulta ao quadro geral de adidos.
Tal argumentação era evidentemente irrazoável, acontecendo, isso sim, que o reclamante fora vítima de um acto ilegal e verdadeiramente infundado — só tornado possível pelo clima emocional existente na altura em que o seu afastamento ocorrera — e que moral e profissionalmente o lesara, colocando-o e à família em situação económica aflitiva.
Obtidas tais conclusões, recomendou, pois, o Provedor de Justiça ao Secretário de Estado do Planeamento a revogação do despacho da então comissão directiva do Instituto Nacional de Estatística pelo qual fora indevida e ilegalmente rescindido o contrato que à data ligava o reclamante àquele Instituto, explicitando que lhe deveriam ser pagos todos os vencimentos e demais abonos que lhe seriam processados desde aquela data até ao seu reingresso (a titulo de indemnização, que por lei lhe era devida) e considerando o mesmo período de tempo, para todos os efeitos legais, como se não tivesse deixado de estar em efectivo serviço, tendo ainda sido transmitido o contexto da aludida recomendação ao Presidente do conselho directivo do Instituto Nacional de Estatística.
A recomendação foi aceite e a situação do reclamante resolvida por despacho do Sr. Secretário de Estado no sentido da revogação da decisão da comissão directiva do Instituto Nacional de Estatística atrás referida.
Então se determinou o arquivamento do processo não sem que antes se tivesse esclarecido o reclamante de que, caso aquele despacho não viesse a ser cumprido, poderia, e de novo, recorrer ao Serviço do Provedor de Justiça.
Página 2094
1076-(118)
II SÉRIE — NÚMERO 47
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO — RECURSO CONTENCIOSO
Processo n.º 77/R-501-A-2
Um funcionário da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos reclamou da injustiça de que teria sido alvo por não terem sido integralmente reparados os prejuízos causados à sua carreira profissional pela circunstância de ter estado a cumprir serviço militar obrigatório.
Analisada a reclamação entendeu-se que desta (artigo 276.°, n.° 6, da Constituição da República e artigo 53.° da Lei n.° 2135) se podia extrair o princípio, que já havia recebido consagração no parecer n.° 147/76 do Conselho Consultivo da Procuradoria--Geral da República, de que o funcionário que vê a sua carreira afectada pela prestação de serviço militar obrigatório tem direito à sua reconstituição exactamente como se nunca tivesse interrompido a referida carreira.
Considerando que, no caso, tal princípio não fora respeitado, solicitou-se à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos que se pronunciasse sobre ele. Apesar de muito instada, esta Direcção-Geral não o fez em substância, limitando-se antes a manter a sua posição, lesiva dos direitos do reclamante.
Em face da situação criada, não restou outra via de solução que não fosse solicitar ao Digno Agente do Ministério Público a interposição do recurso contencioso do despacho do Sr. Ministro das Finanças que recusara a admissão do reclamante ao concurso para secretário de finanças de 2.a classe por, alegadamente, não possuir três anos de serviço na categoria de secretário de finanças de 3.8 classe.
Concordando com a bondade da argumentação deduzida, aquele magistrado impugnou contenciosamente o despacho em causa.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — TEMPO DE SERVIÇO Processo n.° 77/R-1778-A-2
1 — Em 29 de Novembro de 1977 deu entrada neste Serviço uma reclamação em que uma engenheira geógrafa, investigadora da Junta de Investigação Científica do Ultramar, fundamentalmente se queixava que, tendo em 13 de Julho de 1976 requerido a S. Ex.a o Ministro das Finanças um inquérito ao tempo de serviço que prestara no Instituto Geográfico e Cadastral, em virtude de a contagem de tempo de serviço que lhe tinha sido feita por esse Instituto, em seu entender, não estar de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.° 656/74, de 23 de Novembro, bem como que lhe fosse mandada passar certidão da contagem do respectivo tempo de serviço, efectuado o inquérito, pelo Instituto Geográfico e Cadastral, ainda não lhe fora passada a certidão requerida, pelo que, dentro de poucos meses, teria de repor os abonos relativos à 5.8 diuturnidade e aquando da sua aposentação seria defraudada em cerca de quatro anos de tempo de serviço.
2 — Solicitados os esclarecimentos necessários, pelo Instituto Geográfico e Cadastral foi informado que por aquele serviço tinha sido elaborada uma informação em que se tinha exposto a S. Ex.a o Secretá-
rio de Estado do Orçamento uma análise relativa à situação da reclamante e de outras ex-servidoras daquele Instituto em idêntica situação, que igualmente têm solicitado certidões de contagem de tempo de serviço para efeitos de aposentação e diuturnidades, esclarecendo-se dos precedentes quanto a contagem de tempo de serviço (tratava-se de situações de prestação de serviço sem provimento) e de possíveis consequências de adopção dos critérios propostos nos resultados do inquérito realizado relativamente aos referidos engenheiros geógrafos.
3 — Em diligência pessoal do Provedor de Justiça junto do então Secretário de Estado da Saúde, foi--lhe por este informado que a solução do assunto estava aguardando parecer que solicitara à Procurado-ria-Geral da República, sendo no entanto, com vista a obviar os prejuízos referidos pela reclamante quanto a ter de repor o abono relativo à 5.ª diuturnidade, passada pelo Gabinete daquele membro do Governo justificação da impossibilidade de rápida apresentação, à Junta de Investigação Científica do Ultramar, pela reclamante, da certidão de tempo de serviço no Instituto Geográfico e Cadastral.
4 — Em harmonia com o solicitado parecer da Procuradoria-Geral da República — parecer n.° 32/78, homologado pelo Secretário de Estado do Orçamento — foram enfim accionados todos os processos em causa e passada a requerida certidão.
TRABALHO — FUNÇÃO PÚBLICA — TRANSFERÊNCIAS Processo n.° 77/R-888-A-3
Vários funcionários da Circunscrição de Urbanização do Norte e do Gabinete do Plano da Região do Porto apresentaram reclamação a este serviço por, sem conhecimento dos respectivos motivos e critérios, haverem sido transferidos.
Pelo Gabinete do Secretário de Estado do Ordenamento Físico e Ambiente foi comunicado o despacho do Sr. Ministro das Obras Públicas, no qual se esclarecia que os motivos da mencionada transferência haviam sido a urgente conveniência de serviço, compatibilizando o número de técnicos em excesso em algumas circunscrições e gabinetes e a falta de outros, mais se informando que os processos respeitantes aos reclamantes haviam sido enviados ao Supremo Tribunal Administrativo.
Por não se haver tornado possível analisar os processos graciosos que antecederam tais transferências, foi determinado o arquivamento do processo.
De todo o modo, achou-se conveniente recomen-d' - ao Sr. Ministro da Habitação e Obras Públicas ) ;er toda a vantagem em usar do maior cuidado, obedecendo-se a rigorosos critérios de objectividade sempre que tenham de adoptar-se procedimentos de tal natureza, designadamente:
Fundamentar-se concreta e especificamente a necessidade das transferências;
Efectivá-las segundo uma escala de prioridades em graduação, previamente definida e publicada, de entre os trabalhadores susceptíveis de serem abrangidos;
Proceder-se-á sempre à audição prévia do trabalhador (não porque a transferência deva
Página 2095
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(119)
necessariamente ser condicionada pela aceitação, mas porque a prévia consulta des interessados poderá, em muitos casos fazer surgir soluções alternativas ou procedimentos que minorem os efeitos prejudiciais das transferências).
Igualmente se chamou a atenção do Sr. Ministro da Reforma Administrativa para a eventual necessidade de revisão do regime constante do Decreto-Lei n.° 152/75, de 25 de Março, no que se refere a transferências, tanto mais que não pareceu que a regulamentação de tal matéria constasse, em termos suficientes, do projecto de lei de bases da função pública, tendo sido respondido que o aludido diploma deveria ser objecto de revisão legal, de molde a que, afastando-se eventuais injustiças (para o que haverá previamente que definir certos critérios), mantenha, ainda assim, o princípio da mobilidade do pessoal no âmbito da administração.
TRABALHO — PREVIDÊNCIA Processo n.° 76/R-666-A-2
Por um grupo de médicos que faziam parte da direcção clínica da Caixa de Previdência do Pessoal da CUF foi apresentada uma reclamação contra a deliberação de uma comissão administrativa provisória para gerir aquela direcção que, em Agosto de 1974 e, posteriormente, em Fevereiro de 1975, suspendeu respectiva e sucessivamente a actividade do director clínico e dos seus adjuntos, havendo ainda, e de seguida, suspendido igualmente os vencimentos dos aludidos médicos.
Após várias diligências, foi concluído no sentido da manifesta prepotência daquela deliberação, motivo pelo qual se formulou recomendação à referenciada comissão administrativa onde, depois de ser acentuado que mesmo em caso de eventual infracção os reclamantes apenas teriam podido ser afastados das suas funções através de processo disciplinar (e não assim em consequência de uma mera deliberação), se explicitou que deveriam ser pagos aos mesmos reclamantes os vencimentos que lhes eram devidos a partir da data em que tal pagamento fora suspenso, mantendo-se eles nos cargos de que haviam sido afastados.
Desta recomendação foi enviada cópia ao Sr. Secretário de Estado da Segurança Social.
Embora alguma demora tivesse ocorrido, motivada fundamentalmente por aspectos burocráticos, o certo é que a aludida recomendação foi integralmente aceite, tendo-se então determinado o arquivamento do processo.
TRABALHO — PREVIDÊNCIA — DISCIPLINA Processo n.» 78/R-897-A-3
Um chefe de secção da Caixa de Previdência e Abono de Família do Distrito do Porto insurgiu-se por, havendo pedido, em 1974, um inquérito à s- . actuação, posto em causa por alguns elementos, esse processo haver sido arquivado sem lhe ter sido dado
conhecimento do teor da conclusão, temendo ele que a mesma estivesse eivada de preconceitos políticos em seu desfavor.
Mais protestava por, tendo pedido, meses antes, para ser transferido de secção, este seu pedido não ter obtido até então provimento.
Compulsado o processo, pode apurar-se que ele se mostrava devidamente organizado, tendo sido mandado arquivar, por nada se provar em desabono do visado.
Disso se fez ciente o interessado.
Quanto ao pedido de transferência, a Caixa respondeu que não pretendia satisfazê-lo, pois a secção de organização de processos, que o reclamante chefiava, era das de maior responsabilidade, convindo por isso que à sua cabeça estivesse um profissional capaz e experiente como ele é.
Visto que o trabalhador não dispõe, em casos tais, de um direito à transferência ou mudança de serviço, arquivou-se a queixa, com menção ao seu autor de que as razões da Caixa — aliás para ele lisonjeiras — apareciam aceitáveis.
TRABALHO — PREVIDÊNCIA - PROVIMENTO Processo n.° 77/R-1242-A-3
Um reclamante, trabalhador de uma caixa de previdência e abono de família, entendeu expor ao Serviço do Provedor de Justiça um conjunto de factos que, segundo ele, inculcariam graves irregularidades no preenchimento de determinadas vagas de coordenadores naquela instituição de previdência.
Por outro lado, referia ainda que, havendo exposto igualmente tais factos ao Sr. Ministro dos Assuntos Sociais, não chegara a ter conhecimento de qualquer sequência de tal exposição.
Procedeu o Serviço do Provedor de Justiça a averiguações sobre o caso, quer solicitando informação ao Ministério dos Assuntos Sociais sobre o destino concedido à exposição do reclamante, quer providenciando por que a comissão administrativa da caixa de previdência em causa o esclarecesse se, a terem ocorrido as apontadas nomeações de coordenadores e a terem elas sido operadas por promoção, teriam sido respeitados os critérios referidos no n.° 2, alínea b), do artigo 10.° da convenção colectiva de trabalho aplicável aos trabalhadores da Previdência bem como qual seria, a ter-se antes tratado de exercício temporário de funções, nos termos do artigo 114.° da mesma convenção colectiva, a natureza dos impedimentos que haveriam atingido os titulares dos cargos.
Para comprovação segura de todas as questões pediu-se também uma acta da reunião em que aquelas nomeações teriam sido decididas.
A resposta da caixa em questão não foi isenta de dúvidas e sobre estas o Serviço do Provedor de Justiça se debruçou.
Com efeito, e analisada que foi em pormenor a articulação de determinadas cláusulas da contratação colectiva de trabalho, pôde chegar-se à conclusão de que os lugares de coordenador deveriam ser providos por concurso, de entre os escriturários com, pelo menos, seis anos de antiguidade de categoria.
Página 2096
1076-(120)
II SÉRIE — NÚMERO 47
E, nos termos da circular n.° 24/77 da Direcção--Geral da Previdência, tal concurso poderia ter duas fases distintas: a do concurso interno (inter caixas de previdência) e a do concurso externo [só no caso de os lugares vagos não terem sido todos preenchidos no concurso interno e somente destinado a antigos trabalhadores da Previdência (readmissão)].
À apreciação dos resultados do concurso seria inaplicável o disposto no artigo 10.° da contratação colectiva de trabalho, sendo a selecção feita por escolha da comissão administrativa, mediante parecer favorável da comissão de trabalhadores.
O que se apurou, porém, foi que no caso específico da reclamação, nem por concurso externo havia sido possível preencher as vagas de coordenadores que efectivamente existiam; como a contratação colectiva de trabalho não oferecia solução para tal hipótese, igualmente as não fornecendo a citada circular, a comissão administrativa da referida caixa de previdência resolvera optar por uma nomeação provisória, como coordenadores, de alguns escriturários, invocando o artigo 114.° da contratação colectiva de trabalho, porém inaplicável à hipótese em apreço, segundo o entendimento do Serviço do Provedor de Justiça.
Esta tese foi afinal coincidir com a definida pela Direcção-Geral da Previdência, tendo tal posição sido transmitida ao Provedor de Justiça pelo Ministério dos Assuntos Sociais (Secretaria de Estado da Segurança Social), mais se comunicando que a nomeação de coordenadores na instituição em causa iria ser devidamente apreciada por aquela Direcção--Geral, e informando-se ainda que a comissão administrativa visada tinha sido responsabilizada pela sua irregular actuação no que se referia à situação dos empregados a quem tinha cometido funções de chefia.
Por preenchida a sua finalidade se determinou, e só então, o arquivamento do processo.
TRABALHO — SECTOR PRIVADO — CONTRATAÇÃO COLECTIVA — DÚVIDAS
Processo n." 78/R-182-A-3
O Boletim do Trabalho e Emprego, l.a série, n.° 1, de 8 de Janeiro de 1978, inseriu, na p. 154, uma anotação ao contrato colectivo de trabalho vertical para as indústrias gráficas e de transformações, anotação essa da qual reclamou para o Serviço do Provedor de Justiça o Sindicato dos Trabalhadores Gráficos do Sul e Ilhas Adjacentes, por a considerar estranha, ilegal e desrespeitadora dos trabalhadores e dos seus interesses.
Solicitou então o Serviço do Provedor de Justiça directamente ao Sr. Ministro do Trabalho indicação sobre a natureza de valor jurídico de tal anotação, esclarecimento sobre a forma de se compreender como é que uma disposição depositada se tenha de entender por não depositada, não sendo o depósito um acto jurídico mas sim um acto material produtor de efeitos jurídicos, e explicação sobre como conciliar aquela referida anotação com o disposto no artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 164-A/76, de 28 de Fevereiro, na redacção dada pelo Decreto-Lei
n.° 887/76, de 29 de Dezembro, que confere aos tribunais do trabalho competência exclusiva para anular as cláusulas ilegais das convenções colectivas.
Obtida resposta daquele Ministério, pode este Serviço firmar as conclusões seguintes:
Do resto do texto da convenção remetida para depósito constava despacho pelo qual se considerava «igualmente excepcionada do depósito a tabela salarial B constante do anexo iv para que remete a cláusula 39.a, n.° 1, por violar o disposto no artigo 5.° do Decreto--Lei n.° 49-A/77, de 12 de Fevereiro, e nos termos do n.° 2 do artigo 9.° do mesmo diploma».
Isto significava que não era intuito da controversa anotação revogar uma parte do depósito da convenção colectiva, mas sim dar a conhecer que o depósito da convenção havia sido parcial.
O que, por seu ver, implicaria que a tabela salarial B não pudesse entrar em vigor.
Desta forma, a «anotação» em causa melhor justificaria o nome de rectificação.
Não pôde entretanto o Provedor de Justiça apurar as causas do lapso que a anotação pretendeu corrigir e as razões pelas quais a irregularidade da tabela salarial B não foi levada ao conhecimento dos sindicatos, igualmente lhe havendo ficado a subsistir dúvida sobre se existiria efectivamente violação do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 49-A/77 ou se será legal a recusa parcial do depósito de uma convenção colectiva.
De todo o modo, considerou que só um tribunal, órgão da aplicação do direito por excelência, poderia aclarar essas mesmas dúvidas, assim se arquivando este caso exemplificativo das reservas que o Provedor de Justiça sempre entende coloca:: quando, indagados os aspectos fulcrais das questões expostas, se verifique que a essência e solução das mesmas excedem as suas funções, por exigirem a força de uma decisão judicial.
TRABALHO — SECTOR PRIVADO — DESPEDIMENTO Processo n.° 77/R-811-A-3
Dois trabalhadores de O Lar do Comércio, instituição particular de assistência dos arredores do Porto, reciamaram contra o seu despedimento, sem justa causa e sem processo disciplinar, por terem passado a praticar o horário de trabalho que lhes era garantido como trabalhadores ao serviço de uma pessoa colectiva de utilidade pública administrativa — quarenta e cinco horas — em vez das dez horas diárias (Inverno) ou doze (Verão) que vinham praticando, ter.do-se, por outro lado, recusado a aceitar a redução do vencimento mensal de 5300$, para 3500$, como pretend^ a direcção da instituição.
Tratando-se de instituição particular sujeita a tutela administrativa a intervenção possível do Provedor de Justiça restringia-se à actuação da entidade tutelar — Direcção-Geral da Assistência Social. Entretanto, através de comunicação do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde da Região Norte, tomou-se
Página 2097
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(121)
conhecimento do envolvimento do Governo Civil do Porto e da delegação da Secretaria de Estado do Trabalho do Porto no despedimento dos reclamantes.
Estabeleceram-se então contactos com aquelas entidades, tendo-se apurado que a Direcção-Geral da Assistência Social informou em devido tempo a direcção de O Lar do Comércio da ilegalidade da alternativa colocada aos reclamantes — horário de trabalho muito além do limite máximo ou redução de salário. A mesma Direcção-Geral esclareceu considerar ilegais os despedimentos, pois, embora se não aplicasse aos trabalhadores rurais a legislação ordinária em matéria de despedimento, por força do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969, eles infringiam o disposto na alínea b) do artigo 52.° da Constituição da República, aplicável directamente por força dos artigos 17.° e 18.°, n.° 1, da lei fundamental. O Provedor de Justiça concordou inteiramente com a posição da Direcção--Geral de Assistência Social.
Quanto às restantes entidades públicas envolvidas, pôde apurar-se que o delegado da Secretaria de Estado do Trabalho havia exarado em papel timbrado do ministério uma «declaração» do director de O Lar do Comércio segundo a qual os reclamantes não estariam abrangidos pela legislação sobre despedimentos, sem que pudesse apresentar para tão estranha actuação melhor fundamento que um «pedido do Sr. Governador Civil».
O Governo Civil do Porto pretendeu explicar as razões pelas quais ordenara a um destacamento da Guarda Nacional Republicana que desalojasse os reclamantes do seu local de trabalho, sem sequer se preocupar em apurar a posição da entidade tutelar quanto à legalidade do despedimento, invocando a «manutenção da ordem e tranquilidade pública», n.° 1.° do artigo 408.° do Código Administrativo, uma interpretação muito pessoal e latíssima de tais conceitos. E manteve tal posição, mesmo depois de lhe ter sido dito que a decisão de fazer intervir a força pública no despedimento se afigurava imponderada.
Note-se que, quer o Governo Civil do Porto, quer o delegado da Secretaria de Estado do Trabalho, obrigaram, pela forma incompleta e imperfeita como esclareciam as questões levantadas, a prolongada troca de correspondência.
Tendo os reclamantes, entretanto, recorrido aos tribunais para fazer valer os seus direitos, o processo encerrou-se com uma censura ao delegado da Secretaria de Estado do Trabalho do Porto e a elucidação dos reclamantes e de um delegado sindical dos trabalhadores de O Lar do Comércio que havia manifestado interesse em acompanhar o desenrolar do processo.
TRABALHO — SECTOR PRIVADO — REMUNERAÇÕES Processo n.° 78/R-1228-A-3
O Sindicato dos Ajudantes de Farmácia do Sul e Ilhas referiu ao Provedor o facto de certa entidade patronal ter, a partir de determinada altura, passado a pagar a dois trabalhadores remuneração inferior à que antes vinham auferindo, por estarem in-
tegrados no mais alto escalão de salários constante do anexo à convenção colectiva de trabalho aplicável.
Esses escalões estão fixados em função do montante da contribuição industrial paga pelas entidades patronais.
Denunciado, pelos interessados, o facto à Inspecção do Trabalho, o chefe de brigada da Inspeção do Trabalho encarregado do caso informou considerar que a empresa estaria agindo legalmente, ao pagar agora aos aludidos trabalhadores pelo escalão mais baixo, pois que a empresa desde 1974 não pagava contribuição industrial.
Apreciado o assunto, concluíu-se que a posição da Inspecção do Trabalho não seria aceitável e se traduzia num indevido benefício concedido à empresa, a acrescer ao facto de ainda não ter pago as contribuições dos . ois últimos anos.
Na verdade, o n.° 3 da cláusula 22." do contrato colectivo de trabalho aplicável estabelece os escalões salariais em função da «média das contribuições industriais referentes aos dois últimos anos pagos».
Ora, no caso presente, a empresa pagara, em 1972 e 1973, muito mais (cerca de 100 000$ em média) que o limite mínimo de 25 000S estabelecido no contrato colectivo de trabalho para a aplicação do mais alto escalão salarial.
Aliás, apurou-se que o não pagamento de contribuições a partir de 1974 se deveu apenas ao facto de, por atraso da Repartição de Finanças, 6.° Bairro Fiscal, não estar ainda apurada a respectiva matéria colectável. E não será de presumir que os lucros da actividade farmacêutica, de concorrência fortemente condicionada, decresçam, de um ano para outro, como a Inspecção do Trabalho parecia admitir.
É decerto por ter tido em conta situações deste tipo que a norma convencional em questão se refere aos dois últimos anos de contribuição efectivamente pagos.
Depois de uma diligência directa efectuada por um assessor junto da Inspecção-Geral, procurando convencê-la das aludidas razões, formulou-se recomendação ao Ministro do Trabalho, no sentido de aquele organismo dever, nos termos da lei, autuar a empresa transgressora.
O Ministério aceitou — aliás muito prontamente, o que com agrado se registou — a recomendação feita.
TRABALHO — TERMAS — EXONERAÇÃO de UM epirec-TOR CLÍNICO
Processo n.° 77/R-S86-B-4
Um director clínico de umas termas de que é concessionária uma câmara municipal, veio queixar-se do facto de estar impedido de exercer as suas funções desde 15 de Junho de 1975, mais reclamando do facto de ter sido aberto concurso para o respectivo lugar e da conseguinte nomeação do novo titular sem que aquele lugar fosse declarado vago.
Ouvidas a entidade reclamada e a Direcção-Geral de Saúde, veio a concluir-se que a actuação da autarquia em causa era ilegal por violar o disposto no
Página 2098
I076-(122)
II SÉRIE — NÚMERO 47
artigo 57.° do Decreto n.° 15 401, de 5 de Junho de 1928, e isto poique à conduta da edilidade não tinha sido dada a necessária cobertura.
Face à ilegalidade detectada, recomendou o Provedor de Justiça àquela autarquia a revogação da deliberação de abertura do concurso e, bem assim, da deliberação que decidiu da nomeação do novo director clínico, enquanto, ao mesmo tempo, se alertava a Direcção-Geral de Saúde para a irregularidade da situação.
A entidade reclamada não acatou a recomendação argumentando que herdara a situação dos anteriores gestores do município.
Face à injustiça praticada e dado que as deliberações em apreço foram tomadas sem a intervenção tutelar do Governo, como o exige o citado preceito (artigo 57.° do Decreto n.° 15 401, de 5 de Junho de 1928), o que determinava a sua nulidade absoluta, nos termos do artigo 363.°, n.° 8.°, do Código Administrativo, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 8/76, de 12 de Janeiro, decidiu o Provedor de Justiça solicitar ao agente do Ministério Público junto da Auditoria Administrativa do Porto, a interposição de recurso contencioso de anulação, recurso este já deduzido por aquele magistrado.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — APREENSÃO DE AUTOMÓVEL
Processo n.» 76/R-906-B-4
O presente processo tem origem numa reclamação feita por um cidadão que se queixava do facto de a Polícia Municipal de Lisboa lhe ter removido da via pública o seu automóvel, sem que o mesmo estivesse mal estacionado ou em mau estado de conservação, alegando, ainda, que jamais fora notificado pessoalmente para efectuar a remoção voluntária.
Consultados os processos organizados pela Câmara Municipal de Lisboa e pela própria Polícia Municipal, veio a apurar-se que:
cr) Já em 1974 os Serviços de Salubridade e Transportes da Câmara Municipal de Lisboa haviam solicitado à Polícia Municipal a remoção do carro de uma artéria da cidade, o que só não foi levado a efeito pelo facto de o carro ter mudado de local;
b) Ainda no final do ano de 1974 o veículo foi
encontrado noutra artéria em mau estado de conservação e com os pneus totalmente vazios;
c) Em 24 de Fevereiro de 1975 foi tentada a
notificação pessoal do proprietário para a remoção voluntária do veículo, tendo o mesmo recusado assinar o mandato de notificação, embora recebesse um duplicado deste, conforme tudo foi testemunhado nos autos;
d) O veículo só foi removido efectivamente em
5 de Abril de 1975, sendo certo que se manteve nos mesmos lugar e estado desde 24 de Fevereiro de 1975.
Face à situação de facto verificada, colocava-se o problema se saber se no presente caso se mostrava preenchido o pressuposto legal de remoção, ou seja,
se havia sido respeitado o disposto no artigo 35.° e seu § único da postura municipal publicada em edital, n.° 2, de 15 de Janeiro de 1966.
Dos elementos de que foi possível dispor concluiu--se efectivamente que o proprietário do veículo teve conhecimento dos propósitos de remoção que incidiam sobre o seu carro, não se podendo extrair relevância de maior da falta de assinatura do mandato de notificação, falta essa que é de imputar ao próprio reclamante.
Por outro lado, a situação do veículo, enquanto estacionado, era aquela que resultava do auto de notícia que o caracterizou como abandonado, não tendo o reclamante ilidido a força probatória que derivava do citado auto.
Face ao exposto, determinou-se o arquivamento do processo e aconselhou-se o reclamante a pagar as despesas de remoção e depósito, a fim de levantar o veiculo.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — CAMINHO DE FERRO
Processo n.° 78/R-148-B-4
Uma junta de freguesia do distrito de Braga pediu a intervenção do Provedor de Justiça por não conseguir que os Caminhos de Ferro Portugueses, E. P., respondessem à sua solicitação no sentido de que, para melhoria dos transportes dos habitantes da região, um comboio passasse sempre a determinada hora em certa estação.
Tendo presentes os interesses de deslocação dos cidadãos e de correcta protecção dos serviços de transportes públicos, este Serviço perguntou à CP as razões da ausência de resposta à junta de freguesia.
Decorreu algum tempo e depois a CP informou que as exposições da junta tinham sido objecto da sua melhor atenção, tendo-se efectuado várias reuniões de trabalho com o presidente da autarquia paroquial e com elementos do Gabinete do Sr. Ministro dos Transportes e Comunicações, o que permitira chegar a uma solução que resolvera o problema e contemplara os interesses das populações de diversos lugares e o próprio interesse da empresa.
Porque ao Provedor apenas competia providenciar para que o assunto não deixasse de ser tratado (escapando às suas atribuições o estudo da solução técnica preferível) e porque a apreciação do caso não fora descurada, foi arquivado o processo deste Serviço.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — AUTOMÓVEIS DE ALUGUER — CONCURSO
Processo n.° 77/R-91Í-B-4
Um cidadão regressado das ex-cclónias candidatou-se a uma vaga de licença de aluguer para veículos automóveis ligeiros, tendo sido graduado em lugar que não lhe garantia a obtenção da licença.
Reclamou por entender que o candidato beneficiado tinha menos tempo de exercício da profissão.
Página 2099
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(123)
Ouvida a câmara municipal que procedeu à abertura do concurso, justificou tal edilidade a graduação do reclamante pelo facto de este não ter apresentado a declaração de serviço efectivo a passar pelo sindicato nos termos do n.° 7.°, 4, da Portaria n.° 249/76, de 19 de Abril.
Por se ter entendido que a deliberação que havia decidido da graduação dos concorrentes era ilegal, fez-se a recomendação seguinte:
Através do ofício de V. Ex.8 n.° 1527, de 11 de Agosto de 1977, tomei conhecimento da argumentação jurídica utilizada para sustentar a sem-razão do reclamante relativamente à classificação dos concorrentes à concessão de uma licença de aluguer para a exploração de um veículo na freguesia de Ardãos, desse concelho.
Conforme se pode ver do mesmo ofício, a graduação do reclamante em 2.° lugar, resultou do facto de o mesmo, no entender desse, corpo administrativo, não ter apresentado a declaração comprovativa do tempo de serviço como motorista profissional (n.° 7.°, 4, da Portaria n.° 249/76, de 19 de Abril).
Considero, porém, que não tem apoio legal a deliberação tomada. Na verdade, sendo, como era, o reclamante sócio do sindicato há mais de um ano, a graduação dos candidatos devia efectuar-se tendo em conta o disposto no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 512/75, de 20 de Setembro, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 99/76, de 2 de Fevereiro, isto é, seria o tempo do exercício efectivo de profissão o factor determinante.
Neste quadro, esse corpo administrativo, ao considerar irrelevante a prova apresentada pelo reclamante, terá desatendido ao Decreto-Lei n.° 83/76, de 28 de Janeiro, diploma especial que concede aos regressados dos territórios das ex--colónias, desde que sindicalizados, o direito de concorrerem em igualdade de circunstâncias com os motoristas profissionais do continente, sendo-lhes levado em conta o tempo de exercício efectivo da profissão naqueles territórios, devidamente comprovado — artigo 2.° do diploma citado.
Assim, dada a existência de legislação especial, não parece merecer acolhimento o apelo que esse corpo administrativo lançou à Portaria n.° 249/76, de 19 de Abril, que, como é óbvio, se destina a regulamentar o diploma geral — Decreto-Lei n.° 512/75 —, cujo âmbito abarcava, tão-somente, os profissionais do continente.
É inquestionável que o exercício da actividade profissional dos regressados das ex-colónias se poderia provar por qualquer meio de prova admitido em direito, daí resultando que a declaração apresentada pelo reclamante era meio idóneo, até demonstração do contrário, para provar o exercício da actividade por conta de outrem.
Está, assim, a deliberação tomada ferida do vício de ilegalidade por violação da lei.
Com tal deliberação impediu-se o reclamante de exercer uma actividade para a qual, segundo se infere, reunia todas as condições legais de prioridade.
Face ao exposto, recomendo que esse corpo administrativo, se ainda a tempo, revogue a deliberação tomada, repondo a situação no seu devido lugar, ou, se aquela hipótese já se não verifica, encontre uma solução destinada a minorar os manifestos prejuízos sofridos pelo reclamante.
Na sequência desta recomendação do Provedor veio a autarquia reclamada dar a conhecer que afinal a declaração de exercício de actividade no território das ex-colónias era por de mais equívoca, e daí não ter sido considerada elemento idóneo para comprovar o exercício de actividade naquele território.
Dada a tergiversação havida, decidiu-se solicitar o envio do processo de concurso, a titulo devolutivo.
Face ao conteúdo do processo, concluiu-se ser de duvidosa veracidade o teor da declaração apresentada pelo reclamante como prova do exercício de actividade por conta de outrem no território em causa, e isto porque tal declaração não correspondia a outro documento junto ao processo, passado pela Di-recção-Geral de Viação, através do qual se podia ver a data a partir da qual o mesmo era possuidor da carta de condução, sendo certo ainda que o recla-.mante alegava simultaneamente ter sido sócio gerente de uma firma de automóveis de aluguer, mas não provava que conduzisse os veículos propriedade da firma, além de a localidade da sede desta firma não se situar na área onde, no mesmo período de tempo, se dizia ter exercido a actividade por conta de outrem.
Concluiu-se, assim, ter sido correcta a actuação da autarquia em causa, não deixando, porém, de se chamar a sua atenção para o facto de a recomendação só ter sido formulada por errada informação anterior dos fundamentos de facto e de direito da deliberação que decidiu da graduação dos concorrentes.
Processo n." 77/R-933-A-3
Recebeu este Serviço diversas reclamações de motoristas profissionais regressados dos territórios que constituem os novos países africanos de expressão portuguesa e que, ao pretenderem concorrer ao preenchimento de vagas como motorista de automóveis de aluguer, encontram dificuldades assentes no disposto no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 512/75, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 99/76, e na actuação dos sindicatos dos rodoviários, que levantariam entraves à sua filiação sindical.
As características do problema levaram este Serviço a procurar averiguar se as situações em causa se revestiriam de generalidade, a fim de, em caso afirmativo, recomendar as convenientes alterações legislativas, em ordem a garantir a estes profissionais as mesmas condições de acesso à profissão que existem para os motoristas que sempre trabalharam em Portugal.
Em consequência, buscou-se saber, para melhor documentação, das posições quer do Altc-Comissa-riado para os Desalojados, quer do Ministério dov Transportes e Comunicações.
Página 2100
1076-(124)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Referiu a primeira daquelas entidades parecer-lhe que as razões invocadas pelos sindicatos se resumiriam ao facto de considerarem ter autonomia para determinar as condições de admissão segundo as suas próprias disposições estatutárias, não se dispondo a cumprir o estabelecido no Decreto-Lei n.° 83/76, de 28 de Janeiro, e mais concretamente no seu artigo 1.°, n.° 1, achando quê seria pertinente uma intervenção moderadora do Provedor de Justiça.
Concluiu a segunda que não era do conhecimento do Ministério dos Transportes e Comunicações a recusa de inscrições sindicais do tipo denunciado, igualmente desconhecendo os motivos que estariam porventura dificultando as aludidas inscrições sindicais.
Analisando-se então o problema com a justificada profundidade que ele exigia, chegou-se à conclusão de que, com efeito, foram lesados os interesses legítimos de motoristas profissionais regressados dos antigos territórios ultramarinos ao pretenderem concorrer ao preenchimento de vagas como motoristas de automóveis de aluguer.
Essa lesão resultaria essencialmente do disposto no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 512/75, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 99/76.
É que esta disposição legal estabelece uma ordem de prioridade na atribuição de licenças para transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros e que assenta na inscrição como sócio efectivo no sindicato há mais de um ano.
Tornou-se evidente que, enquanto existir uma tal prioridade que corresponde à exigência de inscrição num sindicato, se está, ainda que indirectamente, a violar o preceito constitucional da liberdade sindical, expressa no artigo 57.° da Constituição da República Portuguesa.
Com efeito, conceder prioridade para a concessão de licença aos inscritos no sindicato há mais de um ano é dar a estes, não em resultado de qualificação profissional, mas tão-só de filiação sindical, uma vantagem sobre os demais concorrentes e que força aqueles a promoverem a sua inscrição, sem o que sabem de antemão que estarão preteridos. E assim se desvirtua e viola a liberdade sindical, por isso que, para obstar às dificuldades que os sindicatos levantem à inscrição de todo aquele que queira inscrever-se, não pode o sindicato decidir por si quem deseja ou não admitir como sócio.
Em qualquer circunstância cria-se uma situação injusta que carece de ser reparada, uma vez que não há dúvida que num ou noutro caso — e não interessa se são muitos se poucos, basta que os haja — tem sido dificultada, se não mesmo negada, a inscrição sindical a regressados das ex-colónias.
E esta situação não foi resolvida pela publicação do Decreto-Lei n.° 83/76, de 28 de Janeiro, pois este veio estabelecer a igualdade de concorrência às licenças com os motoristas profissionais do continente aos regressados das ex-colónias mas que estejam sindicalizados, e, se é certo que se autoriza aos regressados a sua inscrição no sindicato, tal autorização, para ser dada, implica prova documental suficiente prévia do exercicio efectivo da actividade por períodos superiores a um ano, e tal prova, em muitos casos, dados os condicionalismos em que esses motoristas regressaram, será, sobretudo exigindo-se que seja documental, muito difícil, se não mesmo
impossível, até porque em muitos pontos do território das ex-colónias não havia sindicatos de motoristas, e as entidades patronais podem já não existir, ou ser quase impossível o contacto com elas.
Assim, parece que só se poderia alcançar uma solução justa, dado que não serão as câmaras, apesar de lhes caber decidir os pedidos, que vão tomar posição diferente, enquanto existirem normas legais como no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 512/75, com a redacção do Decreto-Lei n.° 99/76, e do Decreto-Lei n.° 83/76, quando tais disposições fossem revogadas e alteradas.
Eis porque se afigurou se imporia a eliminação, por inconstitucionalidade das disposições dos n.os 1 e 2 do artigo 3.à do citado Decreto-Lei n.° 512/75, com a redacção do Decreto-Lei n.° 99/76, da exigência de inscrição como sócio efectivo sindicalizado há mais de um ano, devendo, pois, os n.os 1 e 2 passar a ter a seguinte redacção:
! — Motoristas exercendo a profissão há mais de um ano.
2 — Cooperativas de motoristas exercendo a profissão ha mais de um ano.
Por seu turno, o artigo 4.° deveria passar a ter a seguinte redacção:
Art. 4.° — 1 — Para efeito do disposto no artigo 3.° será levado em conta o tempo de exercício efectivo da profissão ou actividade.
2 — A contagem de tempo de exercicio efectivo da profissão ou actividade se" á feita:
d) Pelo sindicato respectivo, se se tratar de motoristas sindicalizados;
b) Por qualquer outro meio de prova suficiente, se o motorista não estiver inscrito no sindicato.
Finalmente, deveriam ser alterados o n.° 2 do artigo 1.° e o artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 83/76, como segue:
Artigo 1.° ............................
2 — É exigível prova suficiente, se possível documental, do exercício efectivo da actividade referida no número antecedente, bem como, em caso de dúvida, a prova da qualidade de cidadão português.
Art. 2.° — 1 — Na atribuição de licenças para a exploração da indústria de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros, os regressados dos territórios das ex-colónias concorrem em igualdade de circunstâncias com os motoristas profissionais do continente sendo--Ihes levado em conta o tempo de exercício efectivo da profissão naqueles terntórios, devidamente comprovado por qualquer dos meios de prova em direito permitidos, de preferência documental, se possível.
Nesta base se recomendou ao Sr. Ministro dos Transportes e Comunicações a solução de um problema que, tendo dado lugar a injustiças, poderia continuar, a não ser obviado, a propiciá-las.
Tal recomendação encontrou favorável acolhimento por parte daquele Ministério que aceitando as su-
Página 2101
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(125)
gestões apresentadas para alteração da redacção do Decreto-Lei n.° 512/75 se mostrou disposto a revogá-lo e a substituí-lo por outro, no qual se verterão matérias até agora dispersas por outros diplomas, consagrando-se o princípio da admissibilidade de outras provas da qualidade de motorista, independentemente da inscrição ou não no respectivo sindicato.
Processo n.« 78/R-936-3-4
Um candidato a licença de aluguer de automóveis ligeiros queixou-se do facto de ter sido afastado do concurso por deliberação de uma câmara municipal, com base no argumento de que havia manifesto receio de o candidato não vir a dedicar-se ao exercicio da actividade.
Tal fundamento da deliberação foi confirmado a este Serviço pela autarquia.
Após análise total da reclamação concluiu-se assistir razão ao reclamante, o que levou à formulação da seguinte recomendação:
Após análise da reclamação apresentada e ponderada a posição dessa edilidade sobre o objecto dessa reclamação, concluí assistir razão ao reclamante com base nos seguintes argumentos:
Jamais o receio de que um candidato não venha a desempenhar a actividade no local para que concorrera pode constituir motivo impeditivo da concessão de licença.
Os candidatos serão classificados em função dos requisitos e condições por si preenchidas face aos critérios legais. O eventual não cumprimento das condições legais pode e deve levar ao cancelamento da licença nos termos do artigo 8.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 512/75, de 20 de Setembro.
É ilegal, pois, neste ponto a deliberação que decidiu da não atribuição da licença ao reclamante com base no simples receio do não exercício da actividade.
Acresce, por outro lado, que o reclamante, como motorista profissional, tinha pelo seu lado a preferência legal prevista no artigo 3.°, n.° 1, do citado diploma legal.
Improcede, de igual modo, a argumentação, defendida por essa câmara, com base no facto de o ora reclamante não residir na área da freguesia onde se situava a vaga para licença de aluguer.
E que a residência na área da freguesia apenas e só funciona como critério de preferência para os concorrentes que se encontrem em igualdade de condições como prescreve o n.° 6, ponto 1, da Portaria n.° 249/76, de 19 de Abril.
Ora é por de mais evidente que não sendo o candidato escolhido motorista profissional, não se pode afirmar, sob pena de errada interpretação dos factos, que ambos os concorrentes se encontravam em igualdade de circunstâncias, e daí a impossibilidade legal de fazer funcionar o critério de residência como prioridade da atribuição de licença.
Por tudo o exposto, e sendo evidentes os vícios de violação da lei de que está ferida a deliberação que decidiu da atribuição da licença ao outro concorrente, tenho por bem recomendar a esse corpo administrativo, se ainda a tempo, a revogação da mesma deliberação ou, na hipótese inversa, reparar os danos sofridos pelo reclamante em virtude da actuação ilegai, sob pena, nesta última hipótese, de sugerir ao reclamante que interponha junto da Auditoria Administrativa a adequada acção cível de ressarcimento.
A recomendação do Provedor foi aceite na totalidade e ao reclamante foi atribuída a licença de aluguer em causa.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — LIVRETE DE AUTOMÓVEL
Processo n.° 78/R-1717-B-4
Um cidadão queixou-se de, tendo requerido à Direcção de Viação de Lisboa uma 2.a via de livrete, que se extraviara, da sua viatura mista de marca Renault e matrícula HU-41-06 e havendo junto competente impresso um duplicado do título de propriedade automóvel, aquele departamento lhe ter enviado pelo correio um livrete que dizia respeito ao veiculo — que não era o seu — de matrícula HV-41-06 e marca Volkswagen.
Ao tentar obter o documento correcto, fora-lhe dito que teria de requerer novo livrete, pois o lapso ocorrido na passagem do primeiro lhe era imputável, uma vez que no formulário escrevera um U por forma equívoca e que o funcionário encarregado do caso tomara esse símbolo por um V.
Entendendo que a Direcção de Viação dispunha de elementos para esclarecer eventual dúvida acerca da referida letra, o reclamante desejava que lhe fosse passado, sem encargo para ele, o livrete adequado.
Ouvida acerca do problema, a Direcção de Viação informou que o seu funcionário não tivera qualquer suspeita de que a matrícula do veículo não fosse HU-41-06 (até porque no requerimento — cuja fotocópia se remetia — não fora indicada a marca deste).
Mesmo na hipótese improvável de ao funcionário assistir alguma dúvida, os processos dos veículos Renault HU-41-06 e Volkswagen HV-41-06, depois de compulsados, não forneciam indicação acerca dos seus actuais proprietários.
Em resposta, este Serviço objectou que a observação do requerimento apresentado pelo reclamante permitia concluir que a matrícula nele indicada se assemelhava mais a HV-41-06 do que a HU-41-06, que seria a exacta.
Todavia, o impetrante afirmava que tivera de entregar na Direcção de Viação também um duplicado do título de propriedade automóvel, donde constava claramente o seu nome, o número e a marca do veículo.
Parecia assim de confirmar que a Direcção de Viação tinha elementos para determinar a matricula exacta e a marca da viatura em causa.
Por outro lado, ainda que a marca do veículo não constasse do requerimento do reclamante (pois
Página 2102
l076-(126)
II SÉRIE — NÚMERO 47
o impresso não o exigia), não se compreendia muito bem a razão por que, havendo sido exigida ao interessado a apresentação de um duplicado do título de registo de propriedade do carro, não fora efectuado o confronto entre os elementos insertos naquele requerimento e os inscritos no referido duplicado — o que certamente teria permitido- detectar o lapso ocorrido, independentemente de não existirem inicialmente quaisquer dúvidas relativamente à matrícula exacta do veículo em questão; outro tanto se poderia dizer, aliás, em relação ao confronto da marca apurada pela Direcção de Viação e os elementos constantes do duplicado do título de registo da propriedade da viatura em causa.
A Direcção de Viação retorquiu que não figurava no seu processo prova de se ter exigido exibição do duplicado do título de registo de propriedade em data anterior à emissão do livrete com a matrícula HV-41-06.
Apenas havia a certeza do envio daquele duplicado por meio da carta do impetrante que devolvera o livrete do carro HV-41-06 que recebera pelo correio.
Mas, porque podia haver dúvidas quanto â exigência anterior de exibição do duplicado do título de registo de propriedade — dúvidas que eram consequência dos precários meios de trabalho com que se debatia — e porque não era estranha à justeza da regra de prova in dublo pro reo, a Direcção de Viação decidiu emitir e mandar ao proprietário, sem meios, o almejado duplicado do livrete da viatura HU-41-06.
Satisfeita desta forma a pretensão do reclamante, foi arquivado o processo deste Serviço.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — REGISTO AUTOMÓVEL
Processos n.°' 78/R-266-B-4 e 78/R-497-B-4
Por vários adquirentes de automóveis montados pela FAP — Fábrica de Automóveis Portugueses, S. A. R. L., empresa sob intervenção estatal, foi comunicado ao Provedor que se viam impossibilidades de registar em seu nome e de transaccionar esses veículos, pois, apesar de haverem pago integralmente o respectivo custo, incluindo impostos alfandegários e demais encargos, aquela empresa não empregara tal numerário para os fins legais, deixando, nomeadamente, de liquidar as responsabilidades perante o fisco.
A situação chegava a ponto de alguns desses veículos já terem, até, sido apreendidos — sem qualquer culpa dos seus adquirentes.
Ouvida a FAP sobre a insólita situação, esta informou que o assunto, de momento, a ultrapassava, pois não dispunha de meios financeiros, só podendo a sua solução derivar de actuação dos Ministérios das Finanças e do Plano e da Indústria e Tecnologia.
Tendo em consideração a gravidade da situação, da responsabilidade de entidades públicas ou por estas tuteladas, o Provedor interveio várias vezes pessoalmente junto do Ministério das Finanças e do Plano para que o caso fosse resolvido.
Assim, no Diário da República, de 12 de Abril de 1978, veio a ser publicada a Resolução do Conselho
de Ministros n.° 52/78, concedendo uma aval à FAP para pagamento das dívidas existentes e consequente regularização do registo dos veículos.
Conquanto o montante do aval não fosse suficiente para cobrir todas as situações, a FAP começou a tratá-las segundo uma escala de prioridades, dando preferência aos casos de veículos já apreendidos.
Havendo o Provedor, através de sucessivas diligências, continuado a acompanhar a questão, obte-ve-se, a partir de certo momento, a indicação de estar em normal andamento a resolução dos vários casos suscitados, pelo que se procedeu ao arquivamento do processo.
TRANSPORTES E COMUNICAÇÕES — VIOLAÇÃO DE CORRESPONDÊNCIA — CONDUTA INCORRECTA DE FUNCIONÁRIO
Processo n.° 76/R-1577-B-1
Um cidadão do Alentejo queixou-se ao Provedor de Justiça de, na estação de correios da sua terra, lhe violarem a correspondência e de uma funcionária da mesma estação se lhe haver referido publicamente em termos injuriosos (designadamente cha-mando-lhe «gatuno»).
Colocado o caso aos Correios e Telecomunicações de Portugal, foi ele exaustivamente averiguado pela respectiva Inspecção.
Concluiu-se que não havia qualquer prova de violação da carta apresentada pelo reclamante.
Mas apurou-se que a funcionária acusada pelo queixoso teve um comportamento violador do preceituado na alínea 1) do artigo 7.° do Regulamento Geral do Pessoal dos CTT, pelo que, nos termos do artigo 18.° do Estatuto Disciplinar daquele pessoal, lhe foi aplicada a pena de repreensão escrita.
URBANIZAÇÃO Processo n.° 76/R-S82-B-4
Uma empresa industrial doara em 1962, à câmara municipal, dois lotes de terreno destinados a arruamentos de logradouros — isto no âmbito das operações de loteamento de uma zona em que a queixosa era proprietária de certa área.
Em 1973, porém, a câmara vendera esses lotes e autorizara edificarem-se neles construções de" altura superior à que antes admitira — designadamente em relação à própria reclamante.
Esta pretendia, pois, ser indemnizada do valor dos terrenos em causa, bem como pelos correspondentes juros.
0 assunto foi demoradamente estudado, com base na apreciação do processo existente na câmara municipal, tendo-se a seu respeito enunciado a seguinte posição:
1 — A queixosa, ao proceder à urbanização do terreno que lhe pertencia, nos termos e condicionalismos aprovados pela Câmara Municipal de Lisboa, não se tornou detentora, por esse lacto, de um direito a que correspondesse, por parte daquele Município, a obrigação de não vir a consentir ao adquirente de qualquer dos lotes criados pela dila ur-
Página 2103
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(127)
banização aproveitamento económico mais vantajoso do que inicialmente fora previsto.
Assim, a Câmara Municipal de Lisboa, ao pronunciar-se sobre a eventual modificação das condições de aproveitamento de qualquer um dos lotes enquadrados na referida urbanização, no sentido de lhe propiciar uma aplicação mais vantajosa, não tinha de se ater ao aspecto de direito privado relacionado com a transferência que da propriedade sobre esse lote se houvesse operado, entretanto, da firma urbanizadora para terceiro que a ela o tivesse adquirido: isto é, o aludido corpo administrativo não estava vinculado à denegação de pretensão que lhe fosse exposta com vista a uma utilização mais proveitosa de alguns dos lotes já urbanizados pelo simples facto de o mesmo constituir, nessa altura, propriedade de terceiro que o tivesse comprado à queixosa.
Com efeito, na apreciação e resolução de pretensão da índole daquela a que acima se alude, o Município de Lisboa apenas via o exercício da sua competência limitada pelos preceitos legais e regulamentares e pelos condicionalismos de ordem urbanística que necessariamente lhe cumprisse observar; sendo assim, não se vê que a circunstância de a Câmara Municipal de Lisboa haver consentido ao adquirente de determinado lote enquadrado na urbanização em apreço melhor aproveitamento económico que aquele que anteriormente fora previsto para o mesmo lote no âmbito da mencionada urbanização tivesse feito nascer para a reclamante o direito a ser indemnizada, pelo invocado Município, da diferença de valores correspondentes à primitiva e à subsequente utilização económica autorizada para o lote em questão.
Assim, não se encontra suporte legal para que se considere que o Município de Lisboa estaria obrigado a indemnizar a empresa reclamante pelo facto de haver consentido, a terceiro adquirente de um lote pela mesma vendido, a alteração das anteriores condições de aproveitamento de tal lote, proporcionan-do-lhe, desse modo, um benefício económico.
2 — O exposto não significa, evidentemente, que desde já se tenha por isenta de qualquer dúvida a correcção do procedimento então adoptado pela Câmara Municipal de Lisboa no que concerne à resolução que ao tempo foi dada ao problema da modificação das condições de utilização do questionado lote.
A apreciação de tal aspecto, acerca do qual se acham ainda em curso neste Serviço diligências tendentes ao completo esclarecimento da legalidade ou ilegalidade da posição então assumida pelo mencionado corpo administrativo, envolve, porém, problema do conteúdo e consequências distintas daquele outro que se analisou no anterior n.° 1, visto se reportar à actuação do Município, seus serviços e funcionários em matéria de prática urbanística, sem contender com o pensamento já expendido a propósito da questão anteriormente analisada.
Certamente que nada impediria, no entanto, que quem se sentisse lesado pela actuação da Câmara Municipal de Lisboa, por a considerar ilegal, tivesse impugnado contenciosamente a resolução que sobre o assunto houvesse sido tomada a propósito da alteração das condições de aproveitamento do lote em referência, ou procurasse ressarcir-se, pelos meios adequados, dos prejuizos que entendesse haver sofri-
do indevidamente (refira-se, entre parênteses, que a empresa, que agora se insurgiu contra a primeira alteração consentida pelo Município de Lisboa para a utilização do lote a que alude a sua reclamação, não deixou de dar a sua anuência a nova e ulterior modificação das características da construção a implantar no indicado lote, quando para tal foi consultada pela Câmara Municipal).
3 — Se o terreno cedido gratuitamente pela reclamante ao Município de Lisboa, por escritura de 3 de Julho de 1962, com vista à construção de arruamentos e logradouros públicos no local, segundo consta da reclamação dirigida a este Serviço, tivesse sido expropriado pela Câmara Municipal expressamente para aquele fim, não sofreria dúvidas que a alienação de parte do mesmo terreno a terceiros, com vista à implantação de construções urbanas, consubstanciaria aplicação de parte dos bens transmitidos a finalidade diversa daquela que justificara a expropriação e conferiria à entidade expropriada o direito a exigir a sua reversão (pelo menos na parte em questão) ou a pagamento de mais-valia, nos termos e condições dos preceitos legais então em vigor, de acordo com a jurisprudência firmada acerca do assunto. f
Tratar-se-ia, pois, de coisa diversa do direito de exigir pura e simplesmente ao Município de Lisboa a entrega da quantia de 851 712$, apurada como preço de venda da surperfície de 424,51 m2, acrescida de juros legais até à data da mesma entrega. Isto, além de que, em face do disposto no artigo 1.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 46 027, de 13 de Novembro de 1964, ainda em vigor ao tempo daquela venda, o direito conferido à entidade expropriada caducaria na hipótese de não ser exercido dentro do prazo de um ano, a contar da verificação da causa da reversão, e em prazo já se encontraria decorrido no caso em apreço, de acordo com os elementos do processo, ainda que de expropriação se houvesse tratado (o que sucedeu, como resulta do mesmo processo); efectivamente, a alienação a terceiros de fracção de 424,51 m2, destacada pelo Município de Lisboa do terreno em referência, haver-se-ia concretizado através de escritura celebrada em 30 de Maio de 1973, mas só em 4 de Março de 1975 é que haveria apresentado reclamação sobre o assunto à Subcomissão de Sindicância sobre Prática Urbanística em serviço no Município de Lisboa (a qual era legalmente incompetente, aliás, para decidir sobre os direitos que eventualmente pudessem assistir à empresa, pois apenas lhe cabia apreciar o aspecto da actuação daquele Município em matéria de urbanismo) e somente em 12 de Abril de 1976 se teria dirigido ao invocado Município procurando fazer valer os direitos de que se julga titular.
Naquela última data já se encontrava em vigor, aliás, o Decreto-Lei n.° 71/76, de 27 de Janeiro, que no seu artigo 9.°, n.° 1, abolira o direito de reversão quando a entidade expropriante fosse de direito público, e revogara, no artigo 107.°, n.° 1, diversos preceitos legais anteriores, entre os quais os artigos 1.° a 20.° da Lei n.° 2030, de 22 de Junho de 1948 (com algumas reservas), e o citado Decreto--Lei n.° 46 027, que contemplavam o exercício daquele direito de reversão, além de outras questões.
4 — Verifica-se, todavia, que o terreno em referência não ingressou no património da autarquia
Página 2104
1076-(128)
II SÉRIE — NÚMERO 47
municipal por via de processo de expropriação por utilidade pública, mas antes por mera via negocial privada, consoante decorre da circunstância de não haver sido pedida e publicada declaração de utilidade pública da expropriação do questionado terreno para efeitos de construção de arruamentos e logradouros públicos, ou para qualquer outra finalidade que pudesse justificar a expropriação, segundo comunicou a Câmara Municipal de Lisboa.
Com efeito, não havendo tido lugar a declaração de utilidade pública da expropriação do aludido terreno, não pode falar-se em processo de expropriação, já que a declaração de utilidade pública representaria o facto constitutivo da relação jurídica de expropriação, pois seria ela que definiria a situação jurídica do expropriante e da expropriada e seria por força da mesma que a empresa proprietária do terreno ficaria vinculada ao dever de o transmitir ao Município expropriante, mediante indemnização (v. Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo e do Conselho Ultramarino de 23 de Junho de 1950, 11 de Março de 1955, 1 de Julho de 1966 e 22 de Junho de 1967, respectivamente no Diário do Governo, 2." série, de 9 de Fevereiro de 1951, 23 de Novembro de 1955, apêndice de 2 de Outubro de 1968 e 2." série, de 31 de Agosto de 1967); isto, ainda que a transmissão do aludido terreno para a entidade expropriante viesse a concretizar-se, ulteriormente, através de escritura contratual, dispensando, assim, a fase litigiosa da expropriação (v. Acórdãos citados de 23 de Junho de 1950 e de 1 de Julho de 1966).
5 — Ora, não havendo o mencionado terreno ingressado no património autárquico por força de processo de expropriação por utilidade pública, mas antes por via de contrato de doação, como resulta do que anteceda, a viabilidade ou inviabilidade de pretensão exposta pela queixosa terá de ser aferida apenas pelos preceitos legais de direito privado aplicável aos contratos de doação, visto não ser possível equiparar à situação de expropriada a posição daquela empresa, que se apresenta no caso em apreço como mera doadora do indicado terreno ao Município de Lisboa — que por esta forma o veio a adquirir, sem exercer, portanto, o poder legal de expropriação de que era dotado (v. Acórdão de 23 de Junho de 1950, citado).
Assim, e ainda que a cedência gratuita ao Município de Lisboa da superfície de 4887 m2 de terreno, da qual veio a ser posteriormente desanexada a fracção de 424,51 m2, alienada a terceiros para efeitos de construção urbana, haja tido em vista, na altura, a aplicação do mesmo terreno à construção de arruamentos' e logradouros públicos no local da urbanização projectada, verifica-se que da escritura de doação do terreno em causa ao Município de Lisboa, celebrada em 3 de Julho de 1962, não consta qualquer referência expressa à destinação. a que ficasse sujeita a utilização do terreno doado, nem nela se acha inserida qualquer cláusula por virtude da qual fosse reconhecido à queixosa o direito à reversão do terreno cedido gratuitamente, ou ao percebi-mento de indemnização ou compensação pecuniária, na hipótese de tal terreno, ou parte dele, vir a. ser aplicado a fins diversos daqueles que especificamente se mencionassem.
Face ao exposto, e atendendo aos preceitos civilís-ticos que contemplam a matéria dos contratos de doação, não se vê fundamento legal para concluir que a Câmara Municipal de Lisboa se achará constituída na obrigação de entregar à firma em questão a importância de 851 712S, proveniente da alienação a terceiros da área de 424,51 m\ para efeitos de construção urbana, acrescida tal importância de juros legais até à data da referida entrega.
6 — Refira-se, marginalmente, que, ao tempo em que foi celebrada escritura de doação do terreno em apreço à Câmara Municipal de Lisboa — 3 de Julho de 1962 — ainda não existia legislação que regulasse, de modo global, a disciplina e fiscalização das operações de loteamento urbano; todavia, já era frequente, nas urbanizações particulares aprovadas pelos Municípios (não clandestina, porlAnto), prever-se que fossem executadas pelos autores de tais operações, à sua custa, as infra-estruturas de natureza urbanística que houvessem de servir o local (v. g. redes viárias, redes de abastecimento de água e electricidade, sistema de esgostos e espaços livres), prevendc-se ainda, por vezes, a cedência gratuita ou onerosa tíe terrenos às autarquias municipais, para efeitos de instalação de equipamentos colectivos ou outras finalidades.
As aludidas infra-esruturas urbanísticas e os terrenos em causa passavam a pertencer, por consequência, aos respectivos Municípios, e não se afigura que os mesmos se achassem necessariamente impedidos de dar aos terrenos (ou parte deles) que assim tivessem ingressado nos correspondem :s patrimónios públicos ou privados destino económico diferente do inicialmente previsto, se, em face dos condicionalismos urbanísticos definidos para o local, ou daqueles que adequadamente viessem a substituí-los, verificassem que esses terrenos (ou quaisquer fracções deles) se mostravam dispensáveis em relação aos objectivos anteriormente previstos, melhor se justificando, antes, a sua afectação a destino económico diverso.
E nem parece que os corpos administrativos ficassem automaticamente vinculados, na hipótese focada, a devolver tais terrenos (ou suas parcelas) aos autores das operações de loteamento, ou a atribuir--lhes qualquer indemnização ou compensação pecuniária, desde que tais consequências não tivessem sido expressamente estipuladas (como se julga que não costumavam ser) nos instrumentos contratuais de transmissão dos terrenos às autarquias municipais, nos casos em que esses intrurnentos eram necessários para o efeito, nem se tratasse de problema cuja resolução houvesse de ser remetida para os preceitos legais então vigentes em matéria de expropriações por utilidade pública, por não ter sido previamente declarada a utilidade pública dos terrenos em referência.
O ulterior Decreto-Lei n.° 46 673, de 29 de Novembro de 1965 (diploma que pela primeira vez procurou disciplinar a matéria tíe loteamentos urbanos), veio a contemplar, aliás, no seu artigo 6.°, o problema das prescrições a que deveriam ficar sujeitos os autores das urbanizações projectadas (v. g. no que concerne a condicionamento de índole urbanística, pagamento de mais-valia ou execução directa dos trabalhos de urbanização e cedência de terrenos para equipamento urbanístico); e o mesmo decreto-lei, ao admitir no seu artigo 11.° a possibilidade de modifi-
Página 2105
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(129)
cação, em certos terrenos, a requerimento dos interessados ou por iniciativa das câmaras municipais, das condições das licenças de loteamento anteriormente concedidas, não impôs a restituição de terrenos ou o pagamento de compensação pecuniária aos titulares das licenças em apreço pelo facto de os Municípios eventualmente saírem beneficiados das alterações verificadas, em razão do melhor aproveitamento económico de parcelas que lhes tivessem sido cedidas pelos autores das urbanizações (v. também aos artigos 19.°, n.os 1 e 2, e 22.° do posterior Decreto-Lei n.° 289/73, de 6 de Junho).
7 — Será de frisar, entretanto, como se fez já no antecedente n.° 2 em relação ao primeiro dos problemas apreciados, que as considerações agora expostas acerca da segunda das questões versadas nc processo em referência não significa, obviamente, que desde já se tenha concluído pela regularidade do procedimento adoptado pela Câmara Municipal de Lisboa ao alienar a terceiros, para efeitos de construção urbana, parte do terreno que lhe fora cedido gratuitamente pela queixosa, quanto a este aspecto, e considerando a informação recebida do Município de Lisboa no sentido de que «não há que estranhar a alteração do estudo de urbanização, no sentido de aumentar a densidade de construção na cidade», «atendendo ao prazo decorrido entre 1962 e 1973», continuam em curso diligências tendentes ao cabal esclarecimento da regularidade ou irregularidade do procedimento que na altura foi adoptado pelo aludido Município, face aos fundamentos e às condições legais e de facto que rodearam a afectação da parcela de terreno em apreço à construção de habitações.
Não se vê, todavia, que o resultado da análise da questão acima mencionada deva conduzir à modificação do entendimento já atrás expendido quanto à inexistência de obrigação legal da entrega à reclamante, pela Câmara Municipal de Lisboa, da importância de 851 712$ (que arrecadou como preço de venda da superfície de 424,51 mJ), acrescida de juros de mora até à data dessa entrega em vista os fundamentos em que se alicerçou o mesmo entendimento.
Nada obstaria, é claro, a que a reclamante tivesse impugnado contenciosamente a resolução tomada pelo indicado Município a respeito do problema em equação, se para tanto entendesse existir fundamento legal, ou procurasse obter pela via adequada a reparação pecuniária a que eventualmente se julgasse com direito.
Em face de tudo quanto fica exposto, entendo, pois, que não existe suporte jurídico para a exigência ao Município de Lisboa das quantias mencionadas nos documentos que acompanhavam a reclamação formulada pela queixosa, sem prejuízo de prosseguirem as diligências tendentes à completa elucidação da actuação desenvolvida na altura pelo dito Município acerca das questões enunciadas no processo, e sem prejuízo, igualmente, de a firma interessada poder tentar fazer valer pelo meio adequado — a via judicial — os direitos de que se julgue titular (v. g. no que concerne aos princípios da alteração da base negocial, se for caso disso).
Do inquérito organizado pela Comissão Coordenadora de Apreciação da Prática Urbanística não resultaram provas suficientemente conclusivas para se
poderem atribuir responsabilidades a quaisquer concretos elementos do pessoal municipal. De resto, os dois engenheiros envolvidos no caso já antes haviam sido afastados da Câmara por motivos disciplinares.
CAPÍTULO VII
Actuações da administração que, por menos legais
ou correctas, se registam destacadamente
Pela primeira vez no relatório anual se abre uma rubrica destacada para nela se registarem as actuações menos legais ou correctas da administração.
Não tendo o Provedor poderes decisórios, é evidente que, quando a Administração não segue as suas recomendações, e não apresenta razões válidas e convincentes para essa sua atitude, ou não presta os necessários esclarecimentos, ou os demora, não tem ele ao seu dispor meios para a forçar.
Assim, apenas lhe resta dirigir-se ao superior hierárquico, quando for caso disso, a solicitar a sua intervenção, ou, então, dar publicidade por meio dos órgãos de comunicação social, à actuação ilegal ou incorrecta, fazendo desse modo pública censura à entidade visada, ou, finalmente, registar o facto no relatório anual, levando-o ao conhecimento da Assembleia da República para esta, se o entender, pedir responsabilidades aos governantes, na sua qualidade de Órgão de Soberania representativa de todos os cidadãos portugueses, no uso da competência que lhe confere a alínea a) do artigo 165.° da Constituição, e, no exercício das suas funções de fiscalização, apreciar os actos do Governo e da Administração.
Confessa-se ser com màgua que se lança mão deste meio. Porém, perante os factos de que adiante se dá conhecimento e por si falam, entendeu-se ser necessário fazê-lo como medida pedagógica e um chamar de atenção para os responsáveis por essas condenáveis atitudes, em ordem a procurar evitar-se a sua repetição.
Oxalá este nosso objectivo possa ser alcançado e não haja necessidade de conservar esta rubrica nos relatórios anuais futuros.
1 — Actuação da Secretaria de Estado da Comunicação Social, no processo n.° 76/R-991-A-2.
Pela transcrição a seguir do ofício remetido se verifica que ela não só não atendeu uma recomendação do Provedor, como nem sequer lhe respondeu durante mais de um ano.
Eis o teor do oficio dirigido ao Secretário de Estado:
Em 30 de Maio de 1977, pelo meu ofício n.° 4554, formulei a S. Ex.* o Secretário de Estado de então uma recomendação relacionada com o caso do despedimento de vinte e três trabalhadores da Radiotelevisão Portuguesa, na sequência dos acontecimentos de 25 de Novembro de 1975.
No final, solicitava o envio a este Serviço, para exame, dos vinte processos que não tinham sido examinados, pois só três haviam sido remetidos, para me poder pronunciar igualmente sobre a forma como esses outros vinte processos teriam sido organizados.
Página 2106
1076-(130)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Em 16 de Agosto de 1977, pelo oficio n.° 6659, insisti por uma resposta dessa Secretaria de Estado sobre o seguimento dado à minha recomendação e pelo envio dos restantes vinte processos.
Pelo ofício n.° 7448, de 13 de Setembro, fiz nova insistência no mesmo-sentido.
Inexplicavelmente, em 20 de Outubro, por ofício n.° 1493/77, o Gabinete dessa Secretaria de Estado informou não encontrar o oficio n.° 4554 deste Serviço, pelo que, em 25 do mesmo mês, se remeteu fotocópia do mesmo.
Apesar disso continuou a Secretaria de Estado a não responder e estranhamente, em 31 de Janeiro de 1978, recebeu-se neste Serviço, enviado pelo secretariado da Cl/RTP fotocópia de um oficio que lhe fora dirigido pela comissão administrativa da RTP, em 26 de Dezembro de 1977, e no qual, por forma até pouco curial e revelando uma boa dose de ignorância, aquela comissão administrativa discutia o valor jurídico da recomendação do Provedor de Justiça, considerando-a inexequível.
Logo a seguir, iniciei uma série de insistências telefónicas para o Gabinete do Secretário de Estado, insistindo por urgente resposta aos meus ofícios, e, apesar das promessas, as respostas não vinham.
Decidi então, e várias vezes o fiz, deslocar--me pessoalmente a essa Secretaria, a pôr de viva voz o problema aos Srs. Secretários de Estado, a última das quais em Julho passado.
A resposta nunca veio, os processos pedidos nunca me foram enviados.
Daqui sou forçado a concluir, além do mais, que aqueles vinte processos estão organizados da mesma forma atrabiliária e ilegal por que foram organizados os outros três, e que a Secretaria de Estado entende apoiar a decisão da comissão administrativa da RTP de não seguir a recomendação do Provedor de Justiça e deixar que os processos pendentes no tribunal do trabalho sigam até julgamento final.
Nestas condições, comunico a V. Ex.a que determinei o encerramento do processo aqui pendente, e que a estranha actuação dessa Secretaria de Estado seja devidamente dada a conhecer no relatório anual a apresentar à Assembleia da República pelo Provedor de Justiça.
2 — Actuação do conselho de administração dos Correios e Telecomunicações de Portugal, no processo n.o 77/R-706-A-3.
Em 12 de Janeiro, foi enviada, pelo oficio n.° 281, ao conselho de administração dos TLP a seguinte recomendação:
Em referência ao ofício n.° 034145, de 22 de Novembro próximo passado, do conselho de administração dessa entidade comunico a V. Ex.a a recomendação que entendi fazer a respeito do assunto, e que è a seguinte:
Considerando o disposto no artigo 46.° da Portaria n.° 706/71, de 18 de Dezembro;
Considerando o disposto no n.° 3 do artigo 1.° da mesma Portaria;
Considerando o teor incorrecto da Ordem de Serviços, n.° 48/76, de 27 de Maio, já salientado no ofício deste Serviço n.° 7507, de 14 de Setembro do ano findo;
Considerando que as explicações fornecidas no ofício n.° 034145 de 22 de Novembro de 1977, da administração dos CTT, não são de aceitar, parecendo resultar da falta de compreensão das observações já feitas pelo Provedor de Justiça:
Entende-se dever recomendar:
1.° Que ao reclamante José Benvindo Martins de Araújo, trabalhador dos CTP — E. P., sejam pagas as remunerações relativas ao trabalho nocturno prestado entre Agosto de 1973 e Janeiro de 1976.
2.° Que o mesmo seja feito relativamente a todo e qualquer trabalho nocturno prestado por trabalhadores das carreiras tipo AC, A, B e C no período em causa.
Agradeço ser oportunamente informado da sequência que ela vier a merecer.
Apesar de inúmeras insistências, só pelo facto de ter sido comunicado ao Ministro dos Transportes e Comunicações, pedindo intervenção, como Ministro de Tutela, para que chamasse a atenção do conselho de administração dos TLP no sentido da incorrecção que resultava não só de não cumprir a recomendação, sem razão válida, como nem sequer responder à mesma, aquele conselho de administração, em Agosto — oito meses depois —, se dignou responder, recusando cumprir a recomendação, sem a ter sequer em consideração, uma vez que o faz com os argumentos que constavam do seu oficio de 22 de Novembro de 1977, portanto anteriores à recomendação do Provedor de Justiça, aliás, dí todo improcedentes.
3 — Actuação do conselho de gestão do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa, referente ao processo n.° 78/R-910-A-3.
O ofício que a seguir se transcreve fala por si, para se ver que o conselho de gestão não só não cumpriu a recomendação do Provedor, como não cumpriu os despachos ministeriais que a justificavam amplamente:
Com referência ao ofício de V. Ex.a de 11 de Setembro de 1978 ( reintegração de Américo Guedes de Carvalho), informo-o ce que entendo que o conselho de gestão deve cumprir cabal e rapidamente os despachos de SS. Ex.as o Subscretário de Estado do Tesouro de 11 de Dezembro de 1976, 24 de Fevereiro de 1977 e 14 de Março de 1977 e o Subscretário de Estado das Finanças de 3 de Janeiro de 1978, sendo, pois, como se afirma no último destes despachos, ilegítimas as várias recusas que contra a execução deles tem formulado.
Tal é o procedimento que vivamente recomendo.
Entretanto, entendi ser meu dever dar conhecimento destes factos a S. Ex.a o Secretário de Estado do Tesouro.
Mais informo V. Ex.ª de que, a manter-se a atitude do conselho de gestão do Banco Espirito
Página 2107
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(131)
Santo e Comercial de Lisboa, a divulgarei pelos meios ao meu dispor, designadamente no relatório de 1978, que a seu tempo enviarei à Assembleia da República.
4 — Actuação ilegal da Casa do Povo de Afife.
Embora tenha dado lugar já à publicação de uma nota oficiosa nos órgãos de comunicação social, entende-se dever registar com destaque este caso no relatório.
1) Foi apresentada ao Serviço do Provedor de Justiça uma reclamação de Olga Maria Lemos Gomes de Araújo Morais do Vale, contra o facto de ter sido injustamente excluída do concurso para vigilante da Casa do Povo de Afife, a pretexto de ser casada e mãe de um filho menor.
2) A comissão administrativa da referida Casa do Povo comunicou à reclamante que a escolha recaíra numa pessoa solteira, por considerarem que esta «se encontrará com maior predisposição psicológica para suportar diariamente com o equilíbrio e a serenidade necessária o contacto com cerca de quarenta crianças».
3) Apreciado o caso, após terem sido pedidos esclarecimentos, tanto ao organismo visado, como à Junta Central das Casas do Povo, o Provedor de Justiça recomendou a revogação da deliberação que excluiu a reclamante do concurso, pelas seguintes razões:
No edital em que se deu conhecimento público dos critérios de graduação do concurso em causa, não se fazia qualquer distinção entre candidatas solteiras e casadas.
Por isso, a comissão administrativa da Casa do Povo não podia vir derrogar os critérios que previamente estabelecera e com que legitimamente contavam as candidatas ao posto oferecido. Por outras palavras, a comissão estava vinculada a dar tratamento igual a mulheres casadas e solteiras.
4) Aliás, seria inconstitucional uma cláusula que vedasse às mulheres casadas o acesso ao concurso, pois é insensato considerar que o casamento ou a maternidade afectem o equilíbrio e a serenidade de uma mulher normal, por forma a incapacitarem-na de desempenhar uma actividade profissional, nomeadamente a de guarda e vigilância de crianças.
O edital acima referido é, de resto, inconstitucional, ao excluir do concurso os indivíduos do sexo masculino, contra o disposto no artigo 13.° da Constituição.
6) As funções de vigilância de crianças — por muito que isso possa contrariar práticas sociais e costumes enraizados — não serão especificamente «femininas». Em vários países — casos dos países nórdicos — os homens são encorajados a desempenharem, a par das mulheres, nos infantários e escolas infantis, o papel de encarregados e de educadores.
7) Não obstante a argumentação expendida, a Casa do Povo de Afife recusou-se a acatar a recomendação do Provedor de Justiça, persistindo na manutenção do acto reputado ilegal.
5 — Actuação do Governo Civil do Porto, interpretando erradamente o artigo 409.° do Código Administrativo, ao requisitar prédios urbanos mandados despejar por sentença transmitida em julgado dos tribunais competentes.
Não pode deixar de se registar neste relatório o reparo feito no oficio enviado àquela autoridade, em 15 de Dezembro, e que é do seguinte teor:
Após análise da reclamação apresentada pela Sr.a D. Alice de Jesus Fernandes Gonçalves concluí, à semelhança do que vem acontecendo em casos similares, que V. Ex.a lança mão do mecanismo previsto no artigo 409.° do Código Administrativo sem que as situações invocadas se possam integrar nos pressupostos determinantes de tal preceito, o que origina que os actos administrativos em causa estejam feridos do vício de violação da lei, por maior que possa ser o espírito humanitário que os dita.
Nestes termos, mais uma vez tenho por bem chamar a atenção de V. Ex.a para a inadequação da actuação em causa que, sobrepondo-se, em muitos casos, às decisões judiciais, afectará sobremaneira o respeito devido à instituição jurisdicional que todos — cidadãos e autoridades — devem salvaguardar.
6 — Actuação do conselho de gerência de Quimi-gal — Química de Portugal, E. P., como sucessora da Companhia União Fabril, no caso de um funcionário desta ilegalmente despedido e tratado no processo n.° 78/R-1389-A-3.
O comunicado, que a seguir se transcreve, e foi publicado nos jornais de Portalegre e Évora, e transcrito em outros de Lisboa e Porto, elucida cabalmente o caso:
Agostinho dos Santos Macedo, à data delegado comercial em Estremoz da Companhia União Fabril foi, por carta de 8 de Maio de 1975 da respectiva administração, rescindido o contrato individual, com invocação de justa causa, a partir de 31 de Março de 1975 (sic).
Inconformado com a decisão, uma vez que, em violação da lei, não lhe foram imputados factos concretos, nem facultado o direito de defesa, requereu aquele trabalhador a S. Ex.a o Ministro do Trabalho a declaração de inexistência jurídica do seu afastamento, ao abrigo do Decreto-Lei n.Q 471/76, de 14 de Junho, requerimento que, após inquérito, foi deferido por despacho de 29 de Janeiro de 1977, que determinou a sua reintegração.
Deste despacho recorreu a Companhia União Fabril para o Supremo Tribunal Administrativo, recurso ainda pendente e cuja demora levou o interessado a dirigir-se, entretanto, também ao Provedor de Justiça.
Interpelada por este Serviço a administração da Companhia União Fabril, confirmou esta que no processo que conduziu ao afastamento de Agostinho dos Santos Macedo não foi dada audiência ao referido trabalhador e tão somente lhe foram feitas as acusações de natureza genérica e abstracta.
Página 2108
1076-(132)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Sendo, assim, a ilegalidade patente e confessa, mesmo à face das normas então vigentes (artigo 31.°, n.° 3, do Decreto n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969), sublinhei esse facto àquela administração, recomendando, ao abrigo do preceituado nos artigos 2.° e 18.°, n.° 1, alinea a), da Lei n.° 81/77, de- 22 de Novembro (Estatuto do Provedor de Justiça), a readmissão do trabalhador, com todas as consequências legais.
Em resposta, informou a administração da Companhia União Fabril que, por deliberação do seu conselho de gerência, decidiu tão somente dar cumprimento ao que, pela via judicial, lhe venha a ser imposto.
Sem deixar de se reconhecer este direito, considero dever dar conhecimento público da situação, porque o caso constitui um exemplo frisante de injustificada indiferença às recomendações do Serviço do Provedor de Justiça.
Entendo, aliás, que procede mal e injustificadamente qualquer entidade pública que se recuse a revogar um acto seu manifestamente ilegal, sujeitando o particular às demoras e despesas de um processo judicial para conseguir esse resultado.
7 — Actuação da Câmara Municipal de Gondomar no processo n.° 77/R-1068-B-4.
Para completa elucidação deste caso, em que a Câmara deliberou não seguir a recomendação do Provedor e aguardar a decisão que vier a ser proferida pela Auditoria Administrativa do Porto, no recurso interposto pelo reclamante, transcrevem-se os oficios deste Serviço, solicitando a posição da autarquia, o de resposta desta, e o que contém a recomendação feita pelo Provedor.
É lamentável que, certamente por se julgar ser desprestigiante anular uma decisão, ou por mera teimosia, se não queira ver e entender que é precisamente o saber emendar o erro e a não persistência no mesmo o que maior prestígio dá à administração.
E quando, como no presente caso, esse erro é manifesto, a ilegalidade é patente, não é curial nem defensável que a administração se esconda por detrás do facto de estar pendente um recurso da sua decisão, para sob o pretexto de a aguardar, sabendo de antemão que ela lhe não poderá ser favorável, a não anular.
A) Oficio do Serviço do Provedor de Justiça de 11 de Outubro de 1977.
1 — Por intermédio do Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços Municipalizados da Zona Norte e Distrito de Aveiro é solicitada a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de se obter a anulação do despacho de V. Ex.a de 3 de Junho do corrente ano, através do qual exonerou o chefe dos serviços administrativos dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Água, Manuel David Nunes Ferreira dos Santos, baseado no facto de a deliberação que o havia admitido estar ferida do vício da qualidade absoluta, porquanto o aludido funcionário tinha já mais de 35 anos e não era funcionário público ao tempo da admissão.
2 — Da análise de toda a documentação junta infere-se, com alguma segurança, que V. Ex.a usou os poderes previstos no artigo 78.° do Código Administrativo fora do seu campo da estatuição legal, não tendo em conta o facto de o reclamante ser trabalhador da função pública ao tempo da admissão, circunstância essa atendível nos termos do artigo 460.°, n.° 2, do Código Administrativo, e, por último, desconheceu a relevância jurídica de que se pode revestir, para a aquisição do direito ao lugar, o exercício de funções de forma contínua, de boa fé e por um largo período de tempo, esquecendo ainda que, ao tempo em que V. Ex.a proferiu o despacho, já o limite de idade tinha sido afastado da legislação vigente como restrição ao direito ao trabalho, por força do Decreto-Lei n.° 232/76, de 2 de Abril, que, indubitavelmente, revogou o artigo 4.° do Decreto-Lei n,° 16 563, de 2 de Março de 1929 e, bem assim, o já citado artigo 460.°, n.° 2, do Código Administrativo, preceitos esses já fortemente abalados após a entrada em vigor dos artigos 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 49 031, de 27 de Maio de 1969.
3 — Face ao exposto, solicito a V. Ex.a se digne informar qual a posição desse corpo administrativo sobre o assunto, para além do que documentalmente se pode analisar e que, como deixo dito, aponta para ilegalidade do despacho em causa.
B) Oficio de resposta da Câmara Municipal:
Relativamente ao oficio n.° 8283, de 11 de Outubro findo (processo n.° 77/R-1068-E-4), tenho a honra de informar V. Ex.° do seguinte:
1. Denúncia apresentada ao presidente do conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Água em 2 de Junho último alertou para a ilegalidade do provimento do licenciado Manuel David Nunes Ferreira dos Santos nas funções de chefe dos serviços administrativos dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Água desta Câmara Municipal.
2. Por despacho de 3 de Junho último, do presidente do conselho de administração, foi aquele exonerado das suas funções, dada «a sanção grave estabelecida no n.° 6 do artigo 363.° do Código Administrativo».
3. Por deliberação de 8 de Junho do conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Água foi aquele despacho ratificado e, após indeferimento da reclamação apresentada pelo ex-chefe dos serviços administrativos, de que se junta fotocópia, «dado este ter sido ilegalmente provido, por deliberação nula e de nenhum efeito deste conselho de administração, de 31 de Dezembro de 1974», e tendo presente o teor do parecer da Procura-doria-Geral da República, homologado por despacho de S. Ex.a o Ministro do Trabalho de 3 de Dezembro de 1976 e publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 128, pp. 3904 e seguintes, de 2 de Junho de 1977.
4. Notificado o interessado, apresentou este recurso hierárquico nesta Câmara Municipal, apreciado na reunião de 16 de Junho findo, que o indeferiu.
5. Foi apresentado recurso nos termos do Decreto-Lei n.° 256-A/77, em 30 de Setembro, o qual foi do mesmo modo indeferido e de acordo com o
Página 2109
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(133)
n.° 3 do artigo 2.° daquele diploma, de 17 de Agosto, remetido para os devidos efeitos à Auditoria Administrativa do Porto.
6. Relativamente aos controversos aspectos técnico-legáis ora em apreciação no tribunal competente, tomo, ainda, a liberdade de expor a V. Ex." o seguinte:
a) O Decreto-Lei n.° 232/76, de 2 de Abril, re-
vogando o disposto no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 16 563, de 5 de Março de 1929, não revoga expressamente o disposto no artigo 460.°, n.° 2, do Código Administrativo, e deveria tê-lo feito por se tratar aqui de lei especial e, portanto, não revogável pela lei geral;
b) Entendeu, ainda, esta Câmara e o conselho
de administração dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Agua que uma coisa é o exercício de funções públicas e outra coisa diferente o gozo pleno do estatuto de funcionário público (confrontar o citado parecer da Procuradoria-Geral da República);
c) Quando o ex-chefe dos serviços administrati-
vos foi provido como professor provisório tinha já mais da idade limite então estabelecida no n.° 2 do artigo 460.° do Cód^ go Administrativo;
d) O provimento por concurso do interessado
foi feito contra legem, por não fundamentado.
Aproveito a oportunidade para protestar a total disponibilidade desta Câmara, dentro das condicionantes de serviço, para fornecimento de outros elementos que venham eventualmente a ser tidos por necessários.
O Recomendação do Provedor:
1 — Após análise da reclamação que me foi dirigida pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Serviços Municipalizados da Zona Norte e Distrito de Aveiro, respeitante à exoneração do chefe dos serviços administrativos dos Serviços Municipalizados de Electricidade e Água, Manuel David Nunes Ferreira dos Santos, e tendo em conta a resposta fornecida por V. Ex.a, concluí não haver qualquer fundamento legal para o despacho de exoneração proferido, pelas razões que aponto seguidamente.
2 — Antes de mais, mesmo que a deliberação do conselho de administração que admitiu o reclamante fosse nula e de nenhum efeito (artigo 363.°, n.° 6, do Código Administrativo), jamais V. Ex.a deveria ter proferido um despacho de exoneração, competindo-lhe, apenas, declarar a nulidade do acto. Este, porém, um aspecto de pouca importância que se refere apenas de passagem.
3 — Desde logo, não se vislumbra qualquer justificação para a utilização dos poderes que são conferidos a V. Ex.a pelo artigo 78.° do Código Administrativo. E isto porque, em boa verdade, não se estava perante uma situação que fosse da competência da Comarca Municipal, e, por outro lado, não demonstrou V. Ex." que, no caso concreto, se verificassem circunstâncias excepcionais ou que fosse impossível reunir extraordinariamente o mesmo corpo administrativo.
Assim, por haver manifesto erro do facto nos pressupostos determinantes da prática do acto, é este anulável por estar ferido do vício de violação da lei, quando não mesmo afectado por desvio do poder pelo facto de V. Ex.a ter usado de poderes para fim diferente daquele previsto no preceito que lhos conferiu.
4 — Embora reconheça que o conceito de funcionário público é um dos mais imprecisos da teoria do serviço público, parece-me, com toda a segurança, que a respectiva caracterização que vem sendo feita pela doutrina não se compagina com a tendência expansionista da actual administração pública. Mais: estou em crer que, no presente momento, a aplicação genérica de tal conceptualização levaria a considerar funcionários públicos uma percentagem mínima dos servidores do Estado.
Hoje o preenchimento dos lugares do quadro não è o único elemento que assegura a estabilidade de emprego ao servidor do Estado.
Por outras palavras, a permanência na função pública não é apenas garantida com a natureza vitalícia do preenchimento de um cargo.
É que, não se pode esquecer que toda a legislação actual, desde a fundamental — Constituição — à ordinária — Decreto-Lei n.° 656/74, de 23 de Novembro, com a redacção do Decreto-Lei n.° 24/75, de 23 de Janeiro — aponta no sentido de cometer ao Estado o encargo de assegurar a estabilidade de emprego.
Assim, à excepção das tarefas ou serviços temporários, todas as tarefas dos serviços públicos são necessidades normais permanentes, a realizar por pessoas que fazem da execução de tais tarefas o seu modo de vida.
Revela, assim, em meu entender, o pressuposto da profissionalidade e o da integração hierárquica, esta aferida no sentido da subordinação jurídica e económica.
Assente, pois, que um agente presta serviço a tempo completo, faz das suas funções a sua verdadeira ocupação profissional, e se encontra integrado numa escala hierárquica, não se vê razões para deixar de o considerar funcionário público.
É dentro deste quadro que não posso deixar de considerar o interessado como funcionário público, enquanto professor do ensino técnico, situação que tinha ao tempo em que foi admitido para os serviços municipalizados.
De qualquer modo, nunca se poderá esquecer que o requisito da idade exigido pelo artigo 460.°, n.° 2, do Código Administrativo não é mais que a emanação do princípio geral contido no artigo 4.° do Decreto n.° 16 563, de 2 de Março de 1929, que dispunha no sentido de que nenhum funcionário poderia ter primeira nomeação em qualquer repartição pública (. . .) e corpos administrativos (...) com mais de 35 anos. Isto para dizer que, mesmo que se fosse excessivamente rigoroso na delimitação do conceito na norma acima indicada, de que o preceito da lei administrativa é mero afloramento, e não disposição especial, dispensaria o reclamante do requisito de idade pelo facto de a nomeação, que V. Ex.a considerou viciada, não ser a primeira.
Ainda que não se vislumbre a legitimidade de V. Ex.a para considerar viciada a nomeação do reclamante para professor do ensino técnico, sempre
Página 2110
1076-(134)
II SÉRIE — NÚMERO 47
lembrarei a V. Ex.a que o estatuto especial do professorado, mesmo ao tempo, dispensava o requisito de idade.
Nesta parte, é, pois, inequívoco que a deliberação de admissão está isenta de qualquer nulidade e, consequentemente, o despacho de V. Ex.a inquinado de violação da lei.
5 — Por outro lado, não pode "V. Ex.a desconhecer a relevância jurídica de que se reveste, para aquisição do direito ao lugar, o exercício de funções de forma continua, de boa fé e por um largo período de tempo, situação essa temperada por uma nova lei que afasta o requisito da idade como condição ao ingresso na função pública (Decreto-Lei n.° 232/76, de 2 de Abril).
Quanto mais não fosse, o atacar-se uma deliberação com base num vício inexistente à face da legislação vigente na altura em que é proferido o despacho é, pelo menos, um acto administrativo eivado de abuso de direito.
Não se diga, porém, como V. Ex.a afirma, que o Decreto-Lei n.° 232/76 não revogou o artigo 460.°, n.° 2, do Código Administrativo, por esta disposição ser parte integrante de legislação especial. É que o preâmbulo do citado diploma é tão claro a afastar da legislação ordinária qualquer restrição ao direito ao trabalho que de uma forma peremptória bem se podia concluir, ao abrigo do disposto no artigo 7.°, n.° 3, do Código Civil, que o legislador quis revogar inequivocamente toda a legislação em contrário.
Mas nem esta lucubração jurídica é necessária, já que o preceito em causa — artigo 460.°, n.° 2 — nem preceito especial chega a ser relativamente ao Decreto n.° 16 563, de 2 de Março de 1929.
6 — Face ao exposto e sem necessidade de mais extensas considerações, e porque é manifesta a ilegalidade do despacho de «exoneração» do reclamante, tenho por bem recomendar a V. Ex." a revogação do citado despacho e a consequente reintegração imediata do interessado.
8 — Actuação da Câmara Municipal de Chaves no processo n.° 77/R-1252-B-4.
Os vários ofícios trocados entre o Serviço do Provedor de Justiça e a Câmara Municipal de Chaves, a partir da recomendação a esta feita e até ao encerramento do processo, ilustram bem a conduta ilegal e incorrecta daquela autarquia neste caso.
A) Recomendação do Provedor de Justiça:
1 — Após análise da reclamação apresentada neste Serviço pelo engenheiro António Álvares Guerra, ex--chefe dos serviços técnicos de obras desse corpo administrativo, concluí com segurança que as deliberações de 2 e 10 de Junho do corrente ano, através das quais foi decidido rescindir o contrato do reclamante por conveniência de serviço, são ilegais por estarem inquinadas do vício de desvio do poder.
2 — É por demais evidente que, para afastamento do reclamante, não se invocaram quaisquer razões objectivas de interesse público que pudessem integrar o conceito de «conveniência de serviço». Antes, e como transparece claramente das actas de 2 de Junho e de 16 do mesmo mês, tais deliberações assen-
taram em juízos de valor formulados sobre o modo como o funcionário desempenhava as suas funções, tendo servido de base a tal apreciação a participação apresentada por um presidente de uma junta de freguesia.
3 — Ora, como é entendido unanimemente pela doutrina e jurisprudência (veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, publicado em Acórdãos Doutrinais, ano xvi, n.° 190, p. 850), o comportamento de um funcionário, enquanto tal, só através de normas próprias do processo disciplinar pode ser apreciado.
4 — Ao formular-se juízos de censura ao funcionário, e por essa via caracterizar-se tal situação como conveniência de serviço, é por de mais evidente que se traduz no exercício de poderes para fins diferentes daqueles que a lei teve em vista ao conceder a um certo órgão poderes discricionários.
Assim, não tendo sido visado o fim de interesse público protegido pela norma que prevê a situação jurídica de «conveniência de serviço», bem se poderá afirmar que os actos administrativos em causa estão feridos do vício de ilegalidade por desvio do poder (artigo 19.°, § único, da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo).
5 — Face ao exposto, não podendo de modo algum aceitar que os corpos administrativos prossigam na prática de ilegalidades, apesar de para tal advertidos, tenho por bem recomendar a V. Ex.a a revogação das deliberações em causa, procedendo-se à reintegração do reclamante como é seu direito e assim se prestigiando esse corpo administrativo.
B) Resposta da Câmara Municipal de
Chaves:
Acusando a recepção do ofício n.° 10 361, de 30 de Dezembro de 1977, cumpre-me informar V. Ex.a de que a Câmara Municipal de Chaves, conforme já deu conhecimento a V. Ex.a através do oficio n.° 3590, de 18 de Novembro de 1977, aguarda a decisão que venha a ser proferida pelo M.mt> Juiz da Auditoria Administrativa do Porto, para onde tempestivamente o ora reclamante interpôs o competente recurso contencioso.
Mais tenho ainda a honra de informar V. Ex.a de que se encontra na sua fase de conclusão um processo de inquérito motivado pela reclamação do ex--chefe dos serviços técnicos de obras, engenheiro António Álvares Guerra, dirigida a S. Ex.a o Ministro da Administração Interna, e do qual esta Câmara Municipal enviará oportunamente uma cópia para apreciação de V. Ex."
C) Ofício do Serviço do Provedor de
Justiça:
Acabo de saber que V. Ex.a se não dignou dar conhecimento, aos vereadores desse corpo administrativo, do conteúdo da recomendação por mim formulada relativamente à reclamação apresentada pelo Sr. Engenheiro António Álvares Guerra.
Tal actuação de V. Ex.a é perfeitamente estranha, tanto mais que é sobejamente conhecida a falta de cobertura legal para a deliberação que decidiu da rescisão do contrato por conveniência de serviço.
Impõe-se, assim, que V. Ex.a submeta com urgência a minha recomendação a deliberação desse corpo administrativo.
Página 2111
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(135)
É também insólita a actuação de V. Ex.° ao decidir presidir à instrução do processo de inquérito instaurado ao reclamante, quando as boas normas relativas a isenção e à ética administrativa impõem que tal inquérito passe a ser conduzido, como espero, por pessoa estranha a todo o circunstancialismo que rodeou a rescisão do contrato do reclamante.
Por último, mas não menos importante, è a circunstância de essa Câmara ter posto a concurso o lugar desempenhado pelo reclamante, conforme se pode ver do Diário da República, 3.a série, de 9 de Março de 1978.
Atendendo ao facto de V. Ex.a, através do ofício n.° 75, proc. ind. de 6 de Janeiro de 1978, ter declarado aguardar a decisão da Auditoria Administrativa, parecia ficar arredada a hipótese de ao reclamante serem causados maiores gravames do que os sofridos anteriormente.
Assim não aconteceu efectivamente e essa Câmara, com a deliberação tomada, preparou-se para, definitivamente, postergar toda e qualquer expectativa de êxito no provimento do recurso, actuação que seguramente me cumpre repudiar.
Espero, pois, que o bom senso impere nessa edilidade, e ao deliberar-se sobre a minha recomendação, seja reposta a legalidade, e, consequentemente, suspensa a deliberação de abertura do concurso.
O que acabo de dizer comuniquei-o, via telefone, ao Sr. Dr. Guimarães, colaborador de V. Ex.a
Espero, assim, que a actuação dessa Câmara seja mais consentânea com os princípios por que se deve nortear a administração pública, na certeza, porém, que, de contrário, ver-me-ei obrigado a formular censura pública nos órgãos de comunicação social.
D) Resposta da Câmara Municipal de Chaves:
De posse do oficio de V. Ex.a com as referências identificadas e relacionsdo ainda com a nossa actuação sobre a reclamação apresentada pelo Sr. Engenheiro António Álvares Guerra, venho informar que o teor daquele ofício foi apreciado por este corpo administrativo, em reunião ordinária do dia 27 de Março passado, tendo sido deliberado:
! — Concordar com a posição então assumida pelo presidente em não ter dado conhecimento à vereação do teor do oficio n.° 10 361, processo n.° 77/R-1252-B-4, de 30 de Dezembro de 1977, da Provedoria de Justiça, uma vez que, em essência, o mesmo não continha matéria diferente daquela que já constava do oficio n.° 8332, de 12 de Outubro de 1977, apreciado em reunião da Câmara do dia 24 do mesmo mês, relativamente situação daquele reclamante — posição essa de que se deu conhecimento ao Sr. Provedor de Justiça, através do ofício n.° 75, proc. ind. de 6 de Janeiro de 1978.
2 — Esclarecer o Sr. Provedor de Justiça que o presidente da Câmara não está nem esteve a proceder a qualquer inquérito, mas sim e apenas à recolha de um conjunto de declarações que considerou úteis e necessárias para poder responder ao que lhe foi solicitado pelos Serviços do Ministério da Administração Interna, em face de uma exposição que o reclamante dirigiu a S. Ex.a o Ministro.
Se alguma vez se lhe chamou inquérito, houve manifesto lapso, pois de todos é conhecido que a
«ética administrativa» impõe que tais processos devem, em princípio, ser realizados por pessoa estranha aos circunstancialismos que lhes dão causa.
3 — Que a resolução tomada pela Câmara, em reunião do dia 13 de Fevereiro de 1978, quanto à abertura de concurso para provimento do lugar que foi ocupado pelo reclamante, assentou no facto de já estarem decorridos sete meses sobre a rescisão do respectivo contrato e sem que, neste lapso de tempo, se tenha vislumbrado por parte da Auditoria Administrativa qualquer solução — positiva ou negativa — quanto ao recurso interposto.
Assim, ao ter-se manifestado oportunamente que esta Câmara aguardava a decisão daquele Tribunal, sempre se pensou que ela fosse proferida num mais curto espaço de tempo, não havendo, por parte da Câmara, a intenção que é formulada pelo Sr. Provedor, mas sim a de reconhecer a necessidade de vir a preencher-se o respectivo lugar por alguém que definitivamente assegure e dê continuidade aos diversos serviços que estão cometidos àquele sector municipal.
4 — Fazer ver ao Sr. Provedor de Justiça que nos elementos deste corpo administrativo sempre tem imperado o bom senso, isto é, aquele que, perante um conselho, pretende converter em soluções úteis os muitos e variados problemas que se deparam aos respectivos munícipes, embora se tenha a certeza que isso não será conseguido por forma satisfatória e completa.
Que é, pois, de lamentar e muito mais de estranhar que o Sr. Provedor das várias vezes que se tem dirigido à presidência da Câmara, apenas o tenha feito num estilo ameaçador e acusatório, sem que, em qualquer delas, tenha procurado saber quais as razões que teriam determinado a actuação da Câmara em relação ao Sr. Engenheiro António Álvares Guerra e que tem sido alvo desta polémica.
5 — Considerar que, após a leitura do processo de declarações que foi remetido ao Sr. Provedor, este poderá ter ficado melhor elucidado e documentado para poder fazer, se assim o entender, a «censura pública» que anuncia na parte final do ofício que foi objecto de apreciação na reunião de hoje.
Que isso, a constituir mais uma ameaça, a Câmara repudia o processo que o Sr. Provedor procura seguir e continua a aguardar, para oportuna resolução a tomar, a sentença que vier a ser definida pela Auditoria Administrativa — órgão judicial a quem deve acatamento, como resulta do artigo 832.° do Código Administrativo.
£) Oficio do Serviço do Provedor de Justiça:
Em referência aos ofícios de V. Ex.a n.os 1497, de 21 de Março de 1978, e 1738, de 7 de Abril de 1978, cumpre-me oferecer as seguintes considerações:
Em primeiro lugar os autos e declarações remetidos por V. Ex.a só vêm confirmar abundantemente a ilegalidade das deliberações desse corpo administrativo de 2 e 10 de Junho do ano transacto, dado que é manifesto o vício do desvio de poder, conforme se encontra demonstrado na minha recomendação, a V. Ex.a formulada a coberto do ofício deste Serviço n.° 10 361, de 30 de Dezembro de 1977.
Página 2112
1076-(136)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Eventuais actuações do engenheiro Ávares Guerra em violação dos seus deveres funcionais deveriam ter sido comprovadas e apreciadas através de adequado processo disciplinar.
Quanto à metodologia utilizada no inquèrito--informação, enviado por V. Ex.a a este Serviço, além dos comentários já contidos no ofício n.° 1977, de 13 de Março, que agora reitero, cumpre--me esclarecer que, a nao ser prestada a simples informação que foi pedida pelo Sr. Ministro da Administração Interna, se impunha, como prova autêntica da isenção e da boa-fé dessa autarquia, que à outra parte, que até tinha pedido o inquérito, tivesse sido dada a oportunidade de provar os factos por si alegados.
E não posso deixar de referir que não se afigura adequado que o instrutor desse inquérito-informação haja sido precisamente o presidente da Câmara Municipal de Chaves, entidade envolvida nos factos em discussão.
Resta-me, contudo, a certeza de que, no inquérito a realizar por determinação de S. Ex.a o Ministro da Administração Interna, o reclamante engenheiro António Álvares Guerra vai ter oportunidade de, se delas de facto dispuser, poder apresentar provas dos factos constantes da exposição que endereçou àquela entidade.
Lamento efectivamente que V. Ex.a e a vereação desse corpo administrativo não tenham atentado na diferença entre o simples ofício e a recomendação do Provedor de Justiça, emanada face à ilegalidade evidente das deliberações em causa, e dentro da esfera da sua competência [artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro].
Quanto à ratificação que os membros desse corpo administrativo decidiram dar à actuação de V. Ex.a, é um problema de medida de grau de sensibilidade das pessoas e da noção que possam ter da defesa das suas prerrogativas.
Relativamente à deliberação de abertura do concurso, o meu reparo constante do ofício n.° 1977, de 13 de Março de 1978, é bem explícito quanto ao juízo de censura formulado.
A persistir-se na ilegalidade, permite-se defraudar o êxito do recurso, e, neste ponto, outra solução não vejo que não seja a de aconselhar o reclamante a intentar, no momento oportuno, a adequada acção cível para ressarcimento dos danos.
Só uma má consciência, susceptível de levar à perda da serenidade e bom senso, poderia explicar os termos do ofício de V. Ex.a, indo ao ponto de se permitir classificar de ameaçadora e acusatória a minha actuação de defesa da legalidade, e não é a V. Ex.a que compete fazer juízos de valor a tal respeito.
É evidente que, face à actuação de V. Ex.a e ao seu reiterado propósito em não querer compreender que a minha recomendação se destina a evitar o desprestígio dessa autarquia e a repor a legalidade que V. Ex.a desrespeitou, violentando frontalmente os direitos de defesa de um cidadão e usando de uma justificação indevida e não verdadeira para praticar um acto reprovável, não poderei deixar de, pelo menos, na altura própria, mencionar, censurando-a, essa actuação no relatório a enviar à Assembleia da República.
F) Ofício da Câmara Municipal:
1 — A Câmara Municipal de Chaves, acusando a recepção do ofício n.° 3283, de 24 de Abril, com a devida vénia mas não desejando manter uma polémica que considera estéril e que entende a nada conduzir, passa em claro sobre os juízos de valor emitidos acerca da sua isenção e boa fé e reafirma a sua posição de aguardar a sentença que sobre o assunto venha a ser ditada pela Auditoria Administrativa, entidade a quem em tempo oportuno o Sr. Engenheiro António Álvares Gerra dirigiu o competente recurso.
9) Actuação do Ministério das Finanças e do Plano nos processos n.os 76/R-1374 e 1471-A-2.
A recomendação feita em 6 de Setembro de 1977, ao Ministério das Finanças, e os oficies deste Serviço de 28 de Março de 1978, dirigido ao Secretário de Estado do Tesouro, e de 7 de Setembro de 1978, ao Ministro das Finanças e do Plano., que a seguir se transcrevem, dão exacta noção do caso.
A) Recomendação do Provedor de Jus-
tiça:
Foram apresentadas no Serviço do Provedor de Justiça, por Teotónio Machado Pires, antigo Governador do Distrito Autónomo de Angra do Heroísmo, e por António de Freitas Pimentel, antigo Governador do Distrito Autónomo da Horta, reclamações contra a suspensão das pensões vitalícias a que têm direito, efectuada ao abrigo de uma interpretação que reputo inadmissível do disposto no Decreto-Lei n.° 506/74, de 1 de Outubro.
Nada no diploma em questão sugere a intenção de lhe dar efeitos retroactivos, contra princípio constante do artigo 12.° do Código Civil. Este diploma tem de ser considerado como visando não atingir direitos adquiridos, mas apenas obstar à constituição de novas pensões. Acresce que a atribuição tíos benefícios de segurança social, previstos no artigo 63.° da Constituição da República, não pode ter o significado de recompensa ou prémio por bom comportamento cívico ou pelo correcto exercício de determinada actividade, antes é um direito reconhecido a todos os indivíduos, dc cidadão mais ilustre ao delinquente condenado a pena maior.
Assim, tenho a honra de recomendar que seja levantada a suspensão das pensões vitalícias dos reclamantes, que a elas têm direitos adquiridos (apenas se podendo admitir que sejam reduzidas nos termos legais se excederem os limites actualmente fixados).
Permito-me chamar igualmente a atenção para a necessidade de estudar as soluções a dar ao problema genérico da integração nos esquemas de segurança social dos cidadãos que exercem funções ou cargos públicos por períodos prolongados sem serem funcionários do Estado.
B) Ofício deste Serviço de 28 de Mar-
ço de 1978:
Em referência ao ofício do chefe do Gabinete de V. Ex.a n.° 0807, de 8 de Fevereiro de 1978, permito-me chamar a atenção para o facto de que a informação anexa da administração da Caixa Geral de Depósitos — que se limita a dar como facto consuma-
Página 2113
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(137)
do o cancelamento das «pensões do Tesouro» dos reclamantes António de Freitas Pimentel e Teotónio Machado Pires — contraria frontalmente a recomendação que dirigi em 6 de Setembro de 1977 ao Ministério das Finanças, e da qual junto fotocópia.
Fico aguardando o conhecimento da posição de V. Ex." sobre o seguimento que vier a ser dado ao assunto versado.
C) Oficio deste Serviço de 7 de Setembro de 1978:
Na sequência da minha recomendação de 6 de Setembro de 1977 e por não aceitar as conclusões do parecer da Procuradoria-Geral da República referido no ofício do Gabinete do Sr. Secretário de Estado do Tesouro de 5 de Junho de 1978, insisto junto de V. Ex.a para que dê seguimento às directrizes nela contidas.
Creio que, ainda que tivesse sido vontade histórica do legislador dar ao diploma em questão efeito retroactivo, a verdade é que, nos precisos termos do artigo 12.° do Código Civil, teriam de excluir-se da sua aplicação os direitos adquiridos, pois não vejo que possa, logicamente, ser outro o entendimento da disposição «presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular», mesmo quando lhe seja atribuída eficácia retroactiva.
Nestas condições, só me resta recomendar a V. Ex.a que profira despacho interpretativo no sentido de que o Decreto-Lei n.° 506/74, de 1 de Outubro, ao revogar os Decretos-Leís n.os 48 605, de 4 de Outubro de 1968, e 92/73, de 30 de Março, não abrangeu os casos das pensões concedidas anteriormente à data da sua entrada em vigor.
A não ser atendida esta recomendação, comunicarei o facto à Assembleia da República, nos termos do n.° 3 do artigo 34.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro.
10 — Actuação do Ministério dos Transportes e Comunicações no processo n.° 78/R-413-A-2.
O ofício de recomendação, que a seguir se transcreve, foi enviado ao Ministro dos Transportes e Comunicações por se ter tomado conhecimento de um despacho ministerial, anterior como é óbvio, que negava o pedido de revisão de um processo disciplinar, com fundamento em ter sido interposto recurso do mesmo para o Supremo Tribunal Administrativo e que tal facto leva a sobrestar-se no pedido de revisão.
O oficio era do teor seguinte:
Tendo-me sido apresentada uma reclamação pelo engenheiro Reis Borges por não ter sido aceite o pedido de revisão do processo disciplinar em que foi condenado, foi-me comunicado, em oficio de 9 de Maio de 1978, com a referência 2082, o despacho de indeferimento de S. Ex.a o Ministro dos Transportes e Comunicações, que assim decidiu por considerar que a interposição de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo deve sobrestar ao pedido de revisão.
Atendendo, porém, à unanimidade da doutrina, que é no sentido de que se não deve confundir o recurso contencioso com a revisão da de-
cisão disciplinar, uma vez que a revisão consiste num novo processo destinado a tomar conhecimento de documentos ou outros elementos de prova que no anterior processo não pudessem ter sido levados em conta, considero dever recomendar a V. Ex.a a ponderação da oportunidade de revisão do referido despacho, o qual não está correctamente fundamentado, dado que a revisão do processo disciplinar só devia ter sido denegada se não se verificassem os pressupostos constantes do artigo 73.° do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 32 659, de 9 de Fevereiro de 1943.
A esta recomendação respondeu o Ministério, comunicando um despacho do Ministro do teor seguinte:
Mantenho, enquanto subsistirem as circunstâncias presentes, a decisão do despacho anterior do Ministro que me precedeu.
E assim se manteve uma posição ilegal, lesando o direito que todo o cidadão tem à revisão de um processo desde que se verifiquem os pressupostos do Estatuto Disciplinar, sem se ter apreciado se tais pressupostos se verificavam ou não.
CAPÍTULO VIII
Inspecções a estabelecimentos prisionais A — Colónia Penal de Pinheiro da Cruz
1 — Introdução:
Em 19 de Agosto de 1976, na sequência de diversas reclamações de reclusos contra deficiências de instalações e de tratamento, três elementos do Serviço do Provedor de Justiça realizaram uma visita à Colónia Penal de Pinheiro da Cruz.
Dessa visita foi elaborado o competente relatório, enviado à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais em 4 de Outubro de 1976 e indicado no relatório anual, relativo a 1976, remetido à Assembleia da República.
Posteriormente foram dando entrada no Serviço do Provedor de Justiça outras reclamações de diferentes reclusos do mesmo estabelecimento prisional.
Tendo em conta essas queixas e o seu plano de contacto pessoal periódico com os locais de execução das penas criminais, o Provedor de Justiça decidiu efectuar nova visita à Colónia Penal de Pinheiro da Cruz.
2 — Data e duração:
16 de Março de 1978, das 10 horas e 30 minutos às 19 horas e 30 minutos.
3 — Execução:
Na visita tomaram parte:
Provedor de Justiça.
Coordenador Dr. Vaz Serra Lima.
Assessora Dr.a Branca Aurora Pena do Amaral.
4 —Descrição:
4.1 — A chegada à Colónia Penal verificou-se cerca das 10 horas e 30 minutos, tendo os visitantes
Página 2114
1076-(138)
II SÉRIE — NÚMERO 47
sido recebidos pelo director do estabelecimento prisional e chefe da corporação dos guardas.
Foram observadas as instalações, trocadas impressões com o director e funcionários da Colónia e colhidos depoimentos de numerosos reclusos.
A seguir se destacam sumariamente diversos aspectos do que então se apurou.
4.2 — Número e composição do corpo de reclusos:
4.2.1 — Efectivos:
À data da visita havia na Colónia 310 reclusos, número bastante inferior ao da lotação do estabelecimento (450), mas ainda inconveniente em face da composição do corpo de guardas.
Embora atenuado, o problema da segurança ainda influi desfavoravelmente no tratamento dos detidos.
4.2.2 — Composição etária:
Verificou-se a existência de reclusos com menos de 21 anos (36), alguns dos quais mesmo com idade inferior a 18 anos.
Este facto è de todo inadequado, já que prejudica a reintegração social dos menores, aos quais não pode ser dispensado o regime especial que a lei determina (mas que, por carência de instalações, a Prisão-Escola de Leiria não pode proporcionar) e aos quais é facultado o convívio com delinquentes adultos e calejados na senda do crime.
A situação parece repetir-se nos diversos estabelecimentos prisionais, não sendo estranha à sua ocorrência a vaga de delinquência juvenil registada nos últimos anos.
4.2.3 — Classificação de reclusos:
Entre os reclusos havia réus condenados com trânsito em julgado e réus condenados por sentenças ainda em recurso (portanto, em situação legalmente considerada como prisão preventiva).
Nos condenados havia, em mistura, os que expiavam penas maiores e os que cumpriam penas de prisão, os primários e os delinquentes habituais.
Esta promiscuidade, porque propiciadora de reiteração criminosa, è claramente indesejável.
4.2.4 — Grau de imputabilidade:
Na Colónia encontram-se reclusos com imputabilidade diminuída.
Não existem em Portugal instalações adequadas para reclusão de débeis mentais, pelo que em quase todos os estabelecimentos há reclusos sem plena imputabilidade.
Este facto é nitidamente inconveniente, já que prejudica a recuperação dos imputáveis e dificulta ou impossibilita o tramento dos mentalmente afectados.
4.3 — Instalações:
Na Colónia há quatro alas, que se consideram aceitáveis, quer em equipamento, quer em higiene.
As alas i e n não estão, como as outras, pavimentadas a tacos, mas não se notam agora outras diferenças assinaláveis entre as diversas alas.
A ala li acha-se quase vazia, aguardando reparação — que se previa morosa e dispendiosa — dos danos derivados de uma amotinação de reclusos.
Não há critérios para distribuição dos reclusos pelas alas, dependendo esta sobretudo das vagas. As partes comuns das alas estavam a ser utilizadas pelos diferentes reclusos.
Existe uma sala de convívio, com algumas mesas e cadeiras (que os utentes por vezes danificam).
Os pátios de recreio são terrenos despidos e sem zonas cobertas.
Por outro lado, há reduzidas dependências para o funcionalismo.
4.4 — Pessoal:
O cargo de director è exercido por um licenciado em Direito, que nas ex-colónias fez advocacia e desmpenhou diversas funções públicas (tendo uma destas por inerência a direcção de um estabelecimento prisional).
O actual director mostra-se integrado nas respectivas funções, procurando conduzir a vida da Colónia com disciplina e compreensão.
O corpo de guardas dispõe de 72 elementos, efectivos reputados insuficientes para bom funcionamento do estabelecimento (já que tecnicamente este exigiria a existência de 120 guardas).
O lugar de enfermeiro acha-se preenchido e o serviço de enfermagem é realizado por aquele técnico e um internado.
Há um médico permanente, deslocando-se à Colónia, para consultas semanais ou quinzenais, um psiquiatra.
Três vezes por semana, o único carro celular do estabelecimento — manifestamente insuficiente para esse serviço e para os outros fins que visa preencher (como a apresnetação de presos em tribunais) — vai a Prisão-Hospital de S. João de Deus, em Caxias, para consultas médicas da especialidade.
A Colónia dispõe de um orientador social e de um educador, sendo desnecessário, por evidente, salientar a extrema exiguidade desses quadros e a falta que maior número destes elementos representa para eficaz regeneração dos reclusos e cuidado acompanhamento das suas necessidades pessoais e familiares.
Aliás, a verba mensal para assistência social é apenas de 52 000S.
Continua a fazer-se notar a inexistência de professores que possam acompanhar os estudos por parte dos reclusos — a escola funciona no estabelecimento com pessoas não habilitadas para o ensino —, bem como de um professor ou monitor de educação física.
4.5 — Ocupação do tempo — Actividades culturais e recreativas:
A Colónia Penal de Pinheiro da Cruz é essencialmente agrícola, com '500 ha de floresta e zona arável.
Há também oficinas de carpintaria, serralharia e sapataria. Para o exterior são fornecidos diversos produtos (como madeira cortada, que é vendida à Holanda, entre outros).
A maior parte dos reclusos que trabalham — e os inactivos são menos de metade do total — ocupa-se na agricultura e pecuária.
Para as oficinas vão os que nela sabem laborar (com mais ou menos luzes) e para as lides agro--pecuárias seguem os da secção ce confiança (ou seja, os que tenham bom comportamento e um quarto da pena cumprida) e os que delas faziam profissão antes de presos.
Os reclusos podem trabalhar nas suas celas, requisitando na cantina o material de que necessitam.
Nas oficinas podem fazer objectos deles, pedindo para abrir folha de obra.
Página 2115
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(139)
Aos salários dos detidos é dado um dos destinos legais (família, reserva e disponível).
O tempo de recreio é igual para todos os reclusos (das 9 horas-9 horas e 15 minutos às 12 horas e das 14 horas-14 horas e 30 minutos às 17 horas e 30 minutos), os quais se dedicam ao futebol e a jogos de sala (como o ténis de mesa).
Continua a faltar uma pessoa qualificada para orientar e fomentar as actividades desportivas, tão necessárias para a manutenção da saúde fisica e psíquica dos detidos.
A estes são proporcionados, sobretudo aos fins de semana, cinema e televisão.
E os reclusos podem ouvir nas suas celas os aparelhos receptores de rádio de que sejam donos ou legítimos detentores.
Na Colónia há apenas cursos para instrução primária — dirigidos por pessoas não habilitadas —, sendo dadas facilidades aos reclusos que, por si, queiram dedicar-se a outros estudos.
Estas carências em matéria de ensino são indesejáveis, já que o ensino facilita a readaptação social dos detidos e a ocupação útil do seu período de reclusão.
Como no relatório da primeira visita, anota-se a conveniência de se firmar neste ponto um sistema de cooperação permanente com o Ministério da Educação e Cultura.
Há na Colónia uma pequena biblioteca, com alguma utilização pelos reclusos.
Para fomentar a leitura por parte destes era de considerar a cooperação da Fundação Gulbenkian (designadamente das suas bibliotecas móveis) e da imprensa estatizada.
A Associação dos Reclusos publica um jornal mensal denominado Novo Rumo, com conteúdo cultural e recreativo.
Essa Associação encontrava-se com reduzida actividade.
Mas a respeito da sua reestruturação existia alguma agitação.
É que os seus estatutos haviam sido recentemente reformados pelo director do estabelecimento (depois de, segundo este afirma, os reclusos se haverem desinteressado do caso, apesar de expressamente chamados à sua solução).
E, depois de os novos estatutos terem sido aprovados pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, os reclusos aparecem a reivindicar o direito de serem eles próprios a elaborar os estatutos da sua Associação, conseguindo que fosse suspensa a entrada em vigor da nova versão dos seus estatutos.
A mudança da conduta dos reclusos foi atribuída pela direcção, guardas e funcionários da Colónia à actividade de um «curso de dinamização» em curso no estabelecimento há alguns meses (cerca de quatro).
Não foram completamente esclarecidas a criação, natureza e finalidade desse curso. Falou-se em consciencialização dos presos, convívio destes com os guardas, desenhos e trabalhos manuais.
Soube-se que estava autorizado pela Direcção--Geral dos Serviços Prisionais e confiado, sem controle do director da Colónia, a F. Ribeiro Teles, ex-redactor do jornal Página Um, que promoveu a transferência para Pinheiro da Cruz de dois reclusos que tinham frequentado idêntico curso na Cadeia
Penitenciária de Lisboa, em Vale de Judeus, Alcoentre.
Segundo a direcção, guardas e funcionários da Colónia, o referido curso, para além de actividade recreativa e cultural, advogaria o primado dos direitos sobre os deveres dos reclusos e suscitaria nos detidos perigoso rancor contra os juizes e outras autoridades.
Tal curso iniciou a publicação do jornal Libertador, com conteúdo ali considerado injurioso, polémico e contestatário.
Havia mau ambiente em relação ao dito curso, tendo-se o corpo de guardas, entre outros, manifestado no sentido do urgente afastamento do «educador» Ribeiro Teles.
É, portanto, de toda a conveniência que o Ministério da Justiça e a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais inquiram sobre o funcionamento, finalidade e resultados do mencionado curso de dinamização (que parece ter-se desenvolvido em moldes idênticos noutros estabelecimentos prisionais).
Porém, nota-se desde já que é inadequada a entrega de um qualquer curso a uma única pessoa, estranha aos quadros dos serviços prisionais e subtraída ao controle dos directores dos estabelecimentos prisionais em que a sua acção é exercida.
Impõe-se uma averiguação detalhada sobre todos os questionados cursos de dinamização (circunstâncias e condições do seu aparecimento, regime e forma da sua realização, fins prosseguidos e resultados alcançados), não sendo de excluir que dele eventualmente derivem responsabilidades disciplinares.
4.6 — Visitas:
As salas são satisfatórias, não havendo horas fixas para as visitas aos reclusos (o que se justifica pela localização da Colónia Penal e pelas dificuldades de transporte).
4.7 — Alimentação:
As duas refeições distribuídas no dia desta visita foram suficientes e bem confeccionadas.
Alguns reclusos insinuaram que essas refeições eram melhores do que as habituais, mas não concretizaram deficiências destas, e è de salientar que a visita foi efectuada de surpresa (o que não terá dado viabilidade a eventual alteração — já de si difícil — de ementas).
A alimentação é confeccionda em boas instalações e servida, em condições aceitáveis, no refeitório ou em marmitas ('••ara os que desejam comer nas celas).
A respectiva verba, por cada recluso, é de 40$ diários, sendo a maior parte dos géneros fornecida pela Manutenção Militar.
4.8 — Tratamento:
O director da Colónia afirmou que desde a sua posse não houve casos de guardas ofenderem corporalmente os presos.
Tempos antes houvera um conflito com o recluso José M. Ferreira Soares, que teria atacado e ferido um guarda e sido depois batido por este.
Na altura desta visita não havia qualquer recluso nas celas disciplinares.
E nas relações entre guardas e detidos não se notaram atitudes repressivas.
A correspondência particular dos reclusos deixou de ser lida pelos funcionários do estabelecimento, em obediência à norma constitucional que garante o sigilo dessa correspondência.
Página 2116
1076-(140)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Esta è aberta na presença do destinatário e, verificado que não contém qualquer objecto estranho e ilegal, é logo entregue ao detido a quem foi endereçada.
Foi referida a aplicação aos reclusos do regime disciplinar de «pão e água».
Essas sanções, segundo o director da Colónia, serão raras e incidirão apenas em casos graves de assaltos de presos a celas alheias e de agressão entre reclusos.
A adequação do referido regime à actual Constituição Política está a ser objecto de estudo no âmbito do Serviço do Provedor de Justiça.
Quanto ao vestuário dos reclusos, saltou à vista a fraca intensidade (diríamos quase ausência) do fardamento prisional.
A maior parte dos detidos trazia vestida a própria roupa, exibindo muitos deles cabelos compridos e pouco cuidados.
A observação das massas de reclusos, designadamente nos recreios e nos corredores das alas de habitação, dava ur.ia impressão de certo desleixo e indisciplina.
Explicou a direcção da Colónia ter tido e estar ainda a sentir dificuldade em fazer voltar à ordem regulamentar uma situação anterior de tolerância, permissividade e cedência, em que muito se deixava à vontade dos reclusos.
Para a acção disciplinadora da actual direcção terão constituído obstáculo, entre outros factores, o espírito e a actividade do atrás aludido «curso de dinamização», sempre pronto a realçar os direitos dos detidos e os actos «repressivos» das autoridades prisionais.
Veja-se, como exemplo do clima de hostilidade dos presos, o incidente subsequente ao suicídio do recluso Bação: apareceu afixado um cartaz colorido que figurava um detido, com a cabeça coberta por um capuz negro, suspenso de um cadafalso erguido num terreiro cercado por altos muros. Num dos cantos destes era perfeitamente identificável uma das torres de vigia da Colónia Penal de Pinheiro da Cruz.
Porque era clara a alusão a uma execução oficial (traduzida pela forca e capuz), o dito cartaz foi mandado apreender, com observância das formalidades legais, pelo director do estabelecimento.
5 — Audiência a reclusos:
O Provedor de Justiça ouviu numerosos reclusos durante esta visita, fornecendo-lhes diversos esclarecimentos e interessando-se pelos seus problemas.
Tendo um dos detidos relatado a necessidade da sua rápida transferência (aliás já pedida), a sua pretensão foi considerada justa e satisfeita, após contacto com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, dias depois.
Outro recluso queixou-se de não saber o resultado de um julgamento a que fora submetido na comarca de Águeda. Anotado e averiguado (através do Conselho Superior da Magistratura) o caso, apurou-se que o detido em causa fora julgado à revelia e absolvido, do facto sendo dado conhecimento telefónico à direcção da Colónia, para transmissão ao interessado.
6 — ConclusÕes-recomendações:
A) A mistura de presos de diferentes classificações (com inclusão de menores, preventivos e afectados de problemas mentais) compromete a função correctora, necessariamente individualizada, da pena.
B) Há insuficiência de pessoal e meios para equilibrada vida prisional e para reintegração social — através do trabalho, de cultura física e mental e de empreendimentos de tipo colectivo — dos reclusos.
C) Há que manter a actual acção da direcção da Colónia no sentido de estabelecer um regime de disciplina, em que os reclusos sejam tratados com humanidade e justiça e em que as normas legais e os regulamentos do estabelecimento sejam feitos respeitar.
D) Há que averiguar tudo o que respeita ao «curso de dinamização» (nascimento, funcionamento e resultados).
B — Visita à divisão prisional da Policia Judiciária de Lisboa
A fim de averiguar das condições da detenção z regime a que estão sujeitos os detidos envolvidos na instrução de processos crime por assaltos a bancos, atentados bombistas e outros, e que se diz serem filiados ou simpatizantes do Partido Revolucionário do Proletariado, desloquei-me hoje, pelas 10 horas, à Polícia Judiciária, onde conferenciei com o Sr. Dr. Lourenço Martins, director-geral.
Recebido com a maior deferência, foi-me dada pormenorizada informação sobre o regime dos detidos.
O Sr. Director começou por me referir que o sector prisional da Polícia Judiciária se encontra, de certo modo, mais ligado à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais do que à Polícia judiciária, visto serem subordinados daquela os guardas e seus superiores, ser por intermédio dela que as refeições são fornecidas e dela depender a vigilância dos detidos.
Relativamente aos detidos que originaram a minha ida à Polícia Judiciária, eles são em número de dez, presentemente, e o número total de detidos na divisão prisional da Polícia Judiciária é, neste momento, ligeiramente superior a cem.
Espontaneamente, aiites mesmo que eu formulasse qualquer pergunta a tal respeito, o Sr. Dr. Lourenço Martins disse-me que as condições de instalação eram muito más, que toda aquela divisão, segundo um projecto já elaborado vai para quatro anos, deveria ser demolida e construída de novo em melhores moldes. O estado de conservação é péssimo, as celas não têm instalações sanitárias próprias e as gerais que existem são más, e ele entende, pedindo até que o Provedor de Justiça intervenha nesse sentido, que, enquanto se não fizerem as obras definitivas — e que se tornam prementes —, se deveriam; pelo menos, fazer obras de limpeza e melhoria, sobretudo nas instalações sanitárias e balneárias, aumentando a sua capacidade e pondo-as em condições de higiene mínima, que neste momento não têm, sendo certo que, por isso mesmo, e até pela dificuldade de saírem os vapores de águas, as paredes apresentam um péssimo aspecto, cheias de humidade, e o cheiro a mofo é incomodativo — o que,
Página 2117
3 JE ABRIL DE 1979
1076-(141)
de resto, tive ocasião de verificar na visita minuciosa que, na sua companhia, na do responsável da divisão prisional e do chefe dos guardas, efectuei á divisão prisional.
Relativamente à falta de recreio, inquirindo do responsável da divisão prisional sobre a razão por que os detidos o não tinham, explicou ele que essa falta se deve exclusivamente ao facto de não haver guardas em número suficiente. Com efeito, dado que muitos dos detidos não devem comunicar uns com os outros, dada a fase de instrução dos processos com vários arguidos, seria indispensável organizar vários turnos para o recreio, e não dispõe de guardas para tal, uma vez que há cento e poucos detidos e o número de guardas existente sujeita-se já a um excesso de trabalho semanal, que impede, sob pena de lhes tirar a folga, o que é impossível, de os sobrecarregar com mais vigilância ao recreio.
Este — como tive ocasião de observar e, de resto, me foi afirmado — oferece condições de segurança, pois foi construído um muro suficientemente alto que impede as veleidades de fuga por ali.
Se houvesse mais seis guardas, o recreio poderia começar a ser dado imediatamente. O Sr. Dr. Lourenço Martins, de acordo com o responsável pela divisão prisional, ficou de, urgentemente, pedir à Direcção--Geral dos Serviços Prisionais mais seis guardas, prontificando-me eu hoje mesmo — o que já fiz, com receptividade, mas com reticência pela dificuldade, do Sr. Director-Geral — a contactar o director--geral dos Serviços Prisionais no sentido de se conseguir o envio, mais rápido possível, desses seis guardas.
Relativamente às visitas, tive ensejo de verificar o mapa semanal organizado e ver que as mesmas se realizam três vezes por semana, por períodos que não excedem uma hora de cada vez.
Este regime de visitas, realizado no parlatorio, foi estabelecido quanto aos detidos dos familiares reclamantes pelo juiz instrutor do processo, o que está de acordo com o § 2.° do artigo 311.° do Código de Processo Penal, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.° 377/77. Sendo certo que os restantes têm visitas diárias.
Vi alguns detidos nas suas celas e nenhum me apresentou qualquer queixa.
Porque já o conhecia pessoalmente, fiz várias perguntas a um deles, o engenheiro Guiñóte dos Santos, que apenas se queixou das instalações, o que está perfeitamente certo, como eu próprio tive ocasião de verificar, e o Sr. Dr. Lourenço Martins, antes mesmo de eu lhe significar o propósito de visitar a divisão prisional, foi o primeiro a referir.
Queixou-se ainda, tendo o responsável da divisão prisional declarado que ignorava o facto e que tal deveria ter resultado de errada interpretação do funcionário, de que, tendo-lhe sido autorizado ser observado pelo seu médico particular, tal observação teve lugar no parlatorio, logo em péssimas condições, até porque se tornava necessária uma observação da cintura para baixo, obrigando a retirada de peças de vestuário, o que tudo era impróprio do local.
Quanto ao mais, referiu que o pessoal era todo ele impecável e correctíssimo, não havendo qualquer razão de queixa, e até pelo contrário só havia razão de agrado.
Do que me foi dado observar e ver tiro as seguintes conclusões:
1) As condições em que se encontravam os detidos não são satisfatórias, antes devem considerar-se bastante más, mas não por estarem submetidos a qualquer regime ou tratamento especial, ou desumano, ou a ser objecto de tortura, mas porque são muito más e inadequadas as instalações da divisão prisional da Polícia Judiciária;
2) Impõe-se que quanto antes se dê realização ao projecto, já aprovado, de substituição da divisão prisional. Entretanto,
3) Deverão efectuar-se, imediatamente, obras de limpeza nas celas e corredores e beneficiar, de modo a torná-las utilizáveis em condições mínimas de higiene, que não possuem, as instalações sanitárias — balneários e sanitas;
4) Deve conceder-se aos detidos, uma vez que vivem em regime de isolamento nas celas, pelo menos meia hora diária de recreio. Para tanto,
5) Deverá a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais destacar, com a maior urgência, mais seis guardas para a divisão prisional da Polícia Judiciária;
6) Se é certo que o fazem em regime de voluntariado, a verdade é que se não justifica que não seja pago salário algum aos detidos que se ocupam dos serviços de limpeza da divisão prisional, pelo que deverá, quanto antes, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais conceder à divisão prisional da Polícia Judiciária a verba necessária para esse pagamento;
7) Não há qualquer razão de queixa do pessoal, tanto guardas como seus superiores, que se encontra a prestar serviço na divisão prisional da Policia Judiciária;
8) Nenhuma queixa me foi apresentada quanto à forma como os detidos são tratados nos interrogatórios ou fora deles;
9) Deverá a divisão prisional da Polícia Judiciária providenciar para que, quando seja autorizada a observação de um detido pelo seu médico particular, a mesma se realize no posto médico existente, e não no parlatório.
Deste relatório sumário se enviarão cópias às seguintes entidades:
o) Ministro da Justiça;
b) Director-geral dos Serviços Prisionais;
c) Director-geral da Polícia Judiciária.
Em 11 de Outubro, o Sr. Ministro da Justiça enviou-nos o oficio que a seguir se transcreve:
1 — Tenho a honra de responder ao ofício de V. Ex.a de 12 de Setembro último (n.° 8385), depois de ouvido o director-geral da Polícia Judiciária.
2 — Reconhecendo ser, na integra, exacto o relatório enviado por V. Ex.a sobre a visita que fez, em 8 de Setembro, à zona prisional anexa à Polícia Judiciária, esclarece, apenas, o Sr. Director-Geral que o projecto de remodelação dessa zona prisional está a ser elaborado, mas não será, porém, executado antes de quatro anos.
3 — Diz ainda o Sr. Director-Geral: Reportando-me às conclusões do relatório de
S. Ex.a o Provedor de Justiça, concordo inteiramente com o que se preconiza nos n.0* 3, 4.
Página 2118
1076-(142)
II SÉRIE — NÚMERO 47
5, 6 e 9, congratulando-me com a ausência de queixas sobre o pessoal e a «forma como os detidos são tratados nos interrogatórios e fora deles».
Há dois pontos fundamentais: as carências graves no tocante às instalações e a ausência de recreio.
Quanto às instalações, penso que não se pode aguardar pela concretização da prevista remodelação de toda a zona prisional sem realizar obras de limpeza e beneficiação nas celas, corredores e principalmente nas camaratas.
Uma vez garantida a verba (provavelmente através do Cofre Geral dos Tribunais), a Policia Judiciária oferece todos os seus meios para, em colaboração com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, levar a cabo as necessárias acções.
Quanto ao recreio, é uma necessidade reconhecida, segundo penso, pelas próprias regras mínimas para tratamento de delinquentes. Simplesmente, há duas condições que é necessário preencher:
a) Um reforço do corpo de guardas;
b) Criar condições — e isso prende-se tam-
bém com as disponibilidades de pessoal — para que seja mantido o regime de incomunicabilidade ou comunicabilidade condicionada que o juiz de instrução, no interesse da justiça, tenha prescrito para alguns detidos.
Aproveito, finalmente, para salientar a necessidade de ser regulamentado o funcionamento das zonas prisionais anexas à Polícia Judiciária, em termos actualizados (o anterior despacho data de 16 de Outubro de 1964). Para o efeito, a Polícia Judiciária elaborou um anteprojecto de regulamento que vai enviar à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.
4 — Face a este condicionalismo, determinei já que, com urgência, me fosse presente, na sua forma definitiva, o projecto de regulamento que enfrente as lacunas verificadas.
C — Inquérito aos acontecimentos na Cadeia Penitenciária de Lisboa, em Alcoentre
o
Em Julho, na sequência de incidentes que vinham a dar-se na Cadeia Penitenciária de Lisboa, em Vale de Judeus (Alcoentre), e tendo os reclusos solicitado ao Sr. Ministro da Justiça um inquérito feito por uma comissão em que participassem representantes do Provedor de Justiça, da Ordem dos Advogados e do Ministério da Justiça, este solicitou ao Provedor a designação do seu representante, com a função de orientar e dirigir a comissão, condição que havia posto para fazer a designação, já que entendia não poder o representante do Provedor ficar subordinado aos restantes membros, designadamente ao do Ministério, precisamente para total salvaguarda da sua independência.
No mesmo dia designei o assessor, Dr. José Tomás Porto, para o efeito, o qual logo entrou em acção.
Do que foi o trabalho dessa comissão, e das conclusões a que chegou, dão sobeja notícia o rela-
tório, que adiante se transcreve e bem mostra o cuidado e a competência com que o inquérito foi realizado.
O relatório foi assinado pelo assessor deste serviço, Dr. José Porto, pelo representante da Ordem dos Advogados, Dr. Fernando Grade, e pelo Dr. Fernando Duarte, que representava o Ministério da Justiça, e não tem qualquer voto de vencido, mas apenas a declaração deste último de que, ta! como já fizera verbalmente na discussão do relatório, desejava referir que a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais tem razões explicativas da distribuição de presos mencionada na alínea e), n.° 2, a fl. 6 v.°
RELATÓRIO
£ — Introdução
1 — Determinou S. Ex." o Ministro da Justiça, por despacho de 3 de Julho do corrente ano, que se procedesse a inquérito aos acontecimentos ocorridos na Cadeia Penitenciária de Lisboa, em Vale de Judeus (Alcoentre), acontecimentos esses que se seguiram a uma tentativa de fuga ocorrida naquele estabelecimento prisional na madrugada c.o dia 21 de Junho do mesmo ano e que estão na base da greve de fome desencadeada a partir de 29 de Junho.
2 — Da comissão de inquérito fez parte o Dr. José Porto, em representação do Provedor de Justiça, o Dr. Fernando Duarte, em representação da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e o Dr. Fernando Grade, em representação da Ordem dos Advogados.
II — Âmbito e metodologia do inquérito
O inquérito teve como objectivo a averiguação da existência das prováveis arbitrariedades e acções violentas praticadas por alguns guardas nas pessoas de alguns reclusos, actos esses relatados pela denominada Comissão de Reclusos de Alcoentre, em carta datada de 25 de Junho de 1978, e dirigida ao Sr. Di-rector-Geral dos Serviços Prisionais, carta essa constante de fl. 59 dos autos e que aqui se dá por inteiramente reproduzida.
Como decorre do conteúdo do despacho de S. Ex.a o Ministro da Justiça, conjugado com a carta dos reclusos já referida, os factos a averiguar situam-se no tempo a partir da noite de 2! de Junho até ao início da greve de fome que, como dissemos, tem lugar a partir de 29 de Junho.
Para a averiguação dos factos a comissão de inquérito deu conhecimento aos reclusos e aos guardas prisionais daquele estabelecimento da sua presença e dos objectivos do trabalho a realizar.
Porém, só os reclusos, mais propriamente a Comissão de Reclusos, desejaram colaborar na realização do inquérito, fornecendo a identidade dos reclusos pretensamente ofendidos e indicando, de igual modo, os nomes de reclusos e de funcionários civis que poderiam testemunhar as ocorrências.
Por seu turno, os guardas prisionais, argumentando que a comissão de inquérito havia sido nomeada a solicitação dos reclusos, recusaram-se respeitosamente, e nos termos da declaração apresentada pelo chefe dos guardas, em representação da corporação dos
Página 2119
3 DE ABRIL BE 1979
1076-(143)
guardas, junta aos autos a fl. 77, a prestar quaisquer declarações.
Esta posição assumida pelos guardas prisionais impediu que se conhecesse, em toda a profundidade, a existência ou não de razões ou circunstâncias que pudessem explicar os eventos verificados, ou mesmo justificá-los.
De qualquer modo, e independentemente do acla-ramento do circunstancionalismo explicativo das atitudes, a recolha de elementos feita no presente inquérito indica com alguma segurança a verificação de um certo número de ocorrências, quais os seus responsáveis e as circunstâncias de tempo, modo e lugar em que as mesmas se produziram.
331 — Cronologia dos acontecimentos
1 — a) No dia 21 de Junho pelas 3 ou 4 horas foi detectada pelos guardas a existência de uma tentativa de fuga no estabelecimento.
b) A tentativa de fuga foi descoberta pelo facto de o recluso Wolfgang Erwin Enrich ter sido encontrado, sem qualquer justificação, fora da sua cela e ainda pelo facto de as portas das celas dos reclusos Juan Francisco Moran, Miguel Carrilho da Silva, José Comes Pires Coelho e Manuel Marques Lima terem sido encontradas semi-abertas.
c) Os reclusos presumivelmente implicados na tentativa de fuga são introduzidos numa sala denominada «secção de observação».
d) Daí o recluso Wolfgang Enrich é levado ao gabinete do chefe dos guardas onde é persistentemente interrogado pelo aludido chefe e ainda pelo subchefe dos guardas José Janeiro Varino e guarda Joaquim da Silva Rodrigues Cação.
O interrogatório visava a obtenção da identidade dos demais reclusos envolvidos na tentativa de fuga e de quais os métodos utilizados.
Para obtenção dos dados pretendidos, ainda que sem qualquer êxito, os guardas referidos, na presença do chefe dos guardas, agrediram-no a murro e a pontapé, causando-lhes, em consequência necessária, lesões na face e na região abdominal, lesões essas que terão demandado para a cura um número de dias indeterminado, mas inferior a dez dias.
e) Na manhã do dia 21 de Junho, pelas 8 horas, procedeu-se a uma busca a todas as celas por razões de segurança, busca essa justificada pela verificação da tentativa de fuga.
f) No decorrer da busca houve um incidente na cela do recluso António Maria dos Ramos Soares, também conhecido pelo Ilhéu.
O incidente teve lugar por causa de uma camisola interior que os guardas pretenderam retirar da cela, ao que o citado recluso se opôs.
Da troca de palavras havida e como consequência da recusa do recluso em ceder a camisola, resultou que o mesmo foi agredido a murro pelo subchefe Janeiro, não havendo indícios seguros de, nessa ocasião, os guardas Franque e Baltasar terem agredido o citado recluso, antes parecendo que os mesmos se limitaram, tão-somente, a proceder à busca na cela.
g) Dado o incidente havido e porque o recluso apresentasse sinais de agressão na face, decidiu o chefe dos guardas transferi-lo para a Colónia Penitenciária de Alcoentre.
Porém, o recluso recusou-se a entrar na carrinha que o havia de conduzir àquele estabelecimento prisional.
Para o obrigar a entrar na carrinha o guarda Joaquim Manuel Rodrigues Pereira agrediu-o na cabeça com a parte metálica do cassetete, causando-lhe lesões que terão demandado para a cura um período de seis dias.
Na altura desta agressão o guarda agressor encontrava-se acompanhado de outros guardas, pelo que a entrada na carrinha do recluso podia ter sido conseguida sem a utilização dos meios violentos usados.
h) Nesse mesmo dia e durante a manhã os reclusos foram mantidos encerrados nas suas celas.
Porém, o chefe dos guardas, sem aquela serenidade que as circunstâncias impunham, e com propósitos intimidativos, ordenou a um guarda não identificado que desferisse um tiro de arma caçadeira num dos pavilhões onde se encontravam os reclusos, o que só serviu para que os ânimos ainda mais se exaltassem e a não se ter verificado a intervenção do secretário do estabelecimento, que permitiu a abertura das celas, o acontecimento poderia ter consequências incalculáveis.
/) Ainda nesse mesmo dia, a hora indeterminada, mas, presumivelmente, quando o recluso Manuel Augusto Marques Lima era conduzido da sua cela para a «secção de observação», e por causas ignoradas, foi o mesmo agredido a murro e a pontapé pelo chefe dos guardas, Firmino Coelho de Castro, e guardas Joaquim da Silva Rodrigues Cação e Manuel da Silva Nanques.
j) No mesmo dia entre as 21 e as 22 horas, numa altura em que alguns reclusos se encontravam a conferenciar com o director da Cadeia, na presença do Sr. Capitão Prazeres Pais, com o propósito de entrar em contacto com a Embaixada Alemã, o chefe dos guardas, Firmino de Castro, sem qualquer autorização ou conhecimento do aludido director, ordenou a entrada na Cadeia de guardas e civis armados, uns com varapaus e outros com caçadeiras, entrada essa feita com grande alarido e que denunciava seriamente os seus propósitos agressivos.
Tal conjunto de pessoas só não entrou na zona prisional da Cadeia, graças à pronta intervenção do director da Cadeia.
Apesar da atitude apaziguadora do director da Cadeia, nessa altura o guarda Rodrigues Cação ainda ameaçou de morte o recluso António José Areal, correndo na direcção deste, tendo-se evitado a concretização de qualquer agressão na pessoa daquele recluso e na pessoa dos outros que se encontravam na zona administrativa, porque o Sr. Capitão Prazeres Pais os encerrou à chave no gabinete do director do estabelecimento.
k) Nesse dia, cerca das 16 horas, ao proceder-se à transferência do recluso Juan Francisco Moran para a Cadeia Penitenciária de Coimbra, e quando o mesmo se encontrava já na portaria da Cadeia, foi--lhe ordenado que entrasse num dos gabinetes laterais para ser revistado.
Uma vez aí e sem qualquer justificação o recluso foi agredido pelos guardas Joaquim Jorge Seguro, Manuel Saul Oliveira Tavares, José de Matos Gonçalves e Aurélio Mourato da Silva, causando-lhe lesões que terão demandado para a cura um número indeterminado de dias, mas não superior a dez.
Página 2120
1076-(144)
II SÉRIE — NÚMERO 47
l) Cerca das 17 horas e 30 minutos, também do mesmo dia, procedeu-se à transferência dos reclusos Miguel Carrilho da Silva e José Gomes Pires Coelho para a Colónia Penal de Pinheiro da Cruz.
Estes reclusos foram transferidos numa carrinha do estabelecimento prisional de Lisboa, de que era chefe de viatura o subchefe Carlos Matias e condutor o guarda motorista José António Ferreira Gomes.
Apesar de o guarda motorista ter conhecimento de que aqueles reclusos haviam sido revistados no interior da Cadeia, e sendo o responsável naquele momento pela viatura, aceitou abrir por duas vezes as portas da carrinha, para que os reclusos acima referidos fossem introduzidos nos gabinetes laterais da portaria, onde foram espancados.
Nesses gabinetes laterais da portaria o recluso Miguel Jorge Carrilho da Silva foi agredido a murro e a pontapé, a cassetete e com uma perna de uma cadeira pelos guardas Joaquim Jorge Seguro, Joaquim da Silva Rodrigues Cação, Domingos Costa Magalhães, Manuel Saul de Oliveira Tavares e Ismael Fernandes Santana Ferreira, causando-lhe, em consequência necessária, lesões que terão demandado para a cura um período de oito dias.
De igual modo, e também nos gabinetes laterais da portaria, o recluso José Gomes Pires Coelho foi agredido pelos guardas Joaquim Rodrigues Cação e Joaquim Jorge Seguro, causando-lhe lesões que terão demandado para a cura um número indeterminado de dias, mas não superior a dez dias.
m) No dia 23 de Junho, a hora indeterminada, a comissão de reclusos, representada pelo recluso José Alberto de Andrade Neves, pretendeu dar conhecimento e solicitar a tomada de medidas, face ao conjunto de violências exercidas sobre os reclusos, atra^ vés de telegramas a enviar à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e Ministro da Justiça.
Porém, e sem qualquer justificação, o chefe dos guardas Firmino de Castro opôs-se ao envio dos telegramas, atirando-os para o chão, donde foram retirados pelo citado recluso.
2 — Os factos atrás relatados, que resultam da prova obtida no presente inquérito, parecem ter constituído a causa própria do desencadeamento da greve de fome, que só viria a terminar após a satisfação da reivindicação dos presos quanto à nomeação da Comissão de Inquérito Tripartida e no momento em que esta iniciou os seus trabalhos.
Porém, não passou despercebida à Comissão a existência de outras circunstâncias que directamente terão contribuído para a criação do ambiente propício ao desencadear de conflitos entre os reclusos e os guardas prisionais.
Assim:
a) O estabelecimento entrou em funcionamento sem a exigível criação de quadros próprios de funcionários administrativos, verdadeiramente profissionalizados, tendo os efectivos existentes sido recrutados ad hoc pelos Serviços Prisionais Militares, e depois, subsequentemente, aproveitados, após integração no Quadro Geral de Adidos, pela Direcção--Geral dos Serviços Prisionais, com a finalidade de não serem criados ao mesmo pessoal problemas sociais;
b) Igual circunstancialismo se verificou em relação a grande parte dos guardas prisionais em serviço no
estabelecimento, a quem não foi ministrada qualquer preparação para o exercicio das funções;
c) A inexistência de um verdadeiro comando de corporação dos guardas e de uma eficaz direcção da Cadeia, ao ponto de o director Palma Vaz ter chegado àquele estabelecimento no próprio dia da tentativa de fuga, numa altura em que o anterior director, Dr. Sílvio Crespo, se havia afastado há já alguns dias;
d) Verifica-se, de igual modo, que o estabelecimento entrou em funcionamento sem que o parque oficinal estivesse nas mínimas condições de poder ocupar os reclusos;
é) A distribuição dos reclusos para este estabelecimento é feita sem o desejável critério selectivo, encontrando-se em total comunicação uns com os outros delinquentes primários, delinquentes habituais e por tendência, e ainda, o que é mais grave, reclusos cujo crime revela perversidade e baixeza de carácter, o que se torna um enorme factor de má influência junto dos delinquentes acidentais, o que, numa palavra e no dizer de um recluso, transformou o estabelecimento numa autêntica «escola de crime»;
f) Os reclusos permanecem o dia inteiro em total ociosidade, não havendo a mínima preocupação de ocupar o recluso pelo trabalho como forma de lhes tornar menos penosa a expiação de pena, e sobretudo como forma progressiva de realizar o fim último de qualquer sistema penitenciário, que è o de procurar a readaptação social do delinquente.
Aliás, pelo que se tem conhecimento, o mal referido não pode ser localizado apenas neste estabelecimento, pois é, de uma ou de outra, uma enorme deficiência do sistema penitenciário portaguês, e urge, desde já, sob pena de se postergar a finalidade máxima de solidariedade para com o recluso, lançar mão das planificações que visem minimamente recuperar socialmente o delinquente. De contrário a criminalidade recrudescerá e a vida nas cadeias tornar--se-à insustentável, surgindo, a cada passo, tumultos de grandes proporções;
g) A inexistência de qualquer regulamento interno da Cadeia e a ausência de disciplina impedem que os reclusos conheçam as suas obrigações e o ponto limite da sua actuação e acabam também por desmotivar gradualmente os guardas por estes desconhecerem os parâmetros da sua acção repressiva e fiscalizadora;
h) A acção nociva causada pela chamada «dinamização cultural» levada a cabo por uma equipa chefiada por um tal Ribeiro Teles, contratado para o efeito pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais. Tal acção fomentou junto dos reclusos a ideia de que os guardas prisionais eram, em quaisquer circunstâncias, os destinatários de toda a sua agressividade, contribuindo, de igual modo, para que os reclusos imputassem a toda a magistratura em geral e a todas as instituições policiais a causa da sua situação de marginalidade;
i) A penetração no interior do estabelecimento de movimentos reivindicativos de cariz político conducentes à anarquização do ambiente vivido dentro dos estabelecimentos prisionais.
3 — No desenrolar do processo e designadamente das declarações prestadas pelos reclusos Carrilho da Silva, Pires Coelho e Juan Moran, vieram ao conhecimento da Comissão alguns indícios de possível cor-
Página 2121
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(145)
rupção, cuja investigação não foi levada por diante pelo facto de ser do nosso conhecimento que, com propósito de apuramento de tais factos, se encontra em Alcoentre uma brigada da Polícia Judiciária.
Aliás, é indício da existência de possível corrupção o facto de o recluso Pires Coelho ter entregue à Comissão de Inquérito as chaves e instrumentos que lhe foram fornecidos, por guarda ou guardas não identificados, para facilitar a tentativa de fuga ocorrida em 21 de Junho.
4 — Vieram ainda ao conhecimento da Comissão outros factos relacionados com atitudes violentas praticadas por guardas sobre reclusos, mas porque tais factos já tinham sido objecto de inquérito realizado ao nível do estabelecimento, e porque tal averiguação se situava fora do âmbito do presente inquérito, decidiu a Comissão não prosseguir na sua investigação.
IV — Conclusões e propostas
A) Em primeiro lugar as violências físicas praticadas pelos guardas atrás identificados, de acordo com as circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas, poderão tornar os mesmos incursos no tipo legal de crime previsto e punido pelo artigo 299.° do Código Penal.
Nesta parte propõe-se, pois, que se extraia fotocópia de todas as peças do processo de inquérito e se remetam as mesmas ao Dig.mo Agente do Ministério Público da Comarca do Cartaxo para adequado exercício da acção penal.
B) Os factos averiguados, no entender desta Comissão, são susceptíveis de tornar incursos em responsabilidade disciplinar alguns guardas prisionais.
Nestes termos, seguidamente se indicam esses mesmos factos e os guardas prisionais a quem são imputados.
Todavia, porque é entendimento desta Comissão que os seus membros não se podem equiparar à figura jurídica do «instrutor», prevista no § 2.° do artigo 63.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, na medida em que a sua constituição não tem por objectivo o possível exercício de acção disciplinar, mas, tão-só e friamente, a averiguação das queixas apresentadas pelos reclusos, considera-se que o presente relatório não constitui, por si, parte acusatória de eventuais processos disciplinares.
Assim e nestes termos:
1 — O chefe dos guardas, Firmino Coelho de Castro, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar atrás referidas, praticou os seguintes factos:
o) Consentiu que dois guardas na sua presença agredissem violentamente o recluso Wolfgang Erwin Enrich;
b) Ordenou a entrada no estabelecimento prisional de guardas e civis armados, sem autorização e conhecimento do director da Cadeia, contribuindo para que se gerasse um clima altamente perturbador na Cadeia, tendo-se evitado ulteriores consequências graças à serenidade e pronta intervenção do director Palma Vaz e do Sr. Capitão Prazeres Pais;
c) Ordenou a um guarda não identificado que desferisse um tiro de caçadeira num dos pavilhões da Cadeia, numa altura em que os reclusos se encon-
travam encerrados nas suas celas, o que só contribuiu para exaltar ainda mais os ânimos;
d) Opôs-se sem justificação aparente a que a Comissão de Reclusos expusesse às instâncias competentes, por via telegráfica, a sua situação e solicitasse a tomada de medidas;
e) Comparticipou na agressão a murro ao recluso Manuel Augusto Marques Lima.
2 — O guarda prisional Joaquim Manuel Rodrigues Pereira, no dia 21 de Julho, cerca das 8 horas, agrediu voluntariamente e corporalmente, com a parte metálica do cassetete, o recluso António Maria Ramos Soares, causando-lhe lesões que terão demandado para a cura um período de seis dias.
A actuação do arguido teve lugar como forma de obrigar o recluso a entrar para uma carrinha celular, quando é certo que poderia ter conseguido o mesmo resultado sem utilização de tais meios violentos.
3 — O subchefe José Janeiro Varino, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar atrás referidas, praticou os seguintes factos:
a) Agrediu voluntária e corporalmente, a murro, o recluso António Maria Ramos Soares, causando-lhe lesões que demandaram para a cura um número indeterminado de dias, mas inferior a dez dias;
b) Comparticipou na agressão, a murro e a pontapé, de que foi vitima o recluso Wolfgang Erwin Enrich.
4 — O guarda Joaquim da Silva Rodrigues Cação, nas circunstâncias de tempo, modo de lugar já referidas, praticou os seguintes factos:
a) Comparticipou na agressão, a murro e a pontapé, de que foi vítima o recluso Wolfgang Erwin Enrich;
b) Comparticipou na agressão, a cassetete, a murro e a pontapé, de que foram vítimas os reclusos José Gomes Pires Coelho e Miguel Carrilho da Silva;
c) Comparticipou na agressão, a murro e a pontapé, de que foi vitima o recluso Manuel Marques Lima;
d) Ameaçou de morte o recluso António José Areal.
5 — O guarda prisional Joaquim Jorge Seguro, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar já referidas, praticou os seguintes factos:
a) Comparticipou na agressão de que foi vitima o recluso Juan Francisco Moran;
b) Comparticipou na agressão de que foram vítimas os reclusos Miguel Carrilho da Silva e José Gomes Pires Coelho.
6 — O guarda prisional Manuel Saul de Oliveira Tavares, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar já referidas, praticou os seguintes factos:
a) Comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Juan Francisco Moran;
b) Comparticipou nas agressões de que foram vítimas os reclusos Miguel Carrilho da Silva e José Gomes Pires Coelho;
c) Comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Manuel Marques Lima.
7 — O guarda prisional Domingos Costa Magalhães, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar indicadas, comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Miguel Carrilho da Silva.
8 — O guarda prisional Ismael Fernandes Santana Ferreira, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar
Página 2122
1076-(146)
II SÉRIE — NÚMERO 47
referidas, comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Miguel Carrilho da Silva.
9 — O guarda prisional José de Matos Gonçalves, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas, comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Juan Francisco Moran.
10 — O guarda prisional Aurélio_Mourato da Silva, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas, comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Juan Francisco Moran.
11— O guarda prisional Manuel da Silva Nan-ques, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas, comparticipou na agressão de que foi vítima o recluso Manuel Marques Lima.
12 — O guarda prisional José António Ferreira Gomes, nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidas, aceitou abrir as portas da carrinha de que era responsável, para que os reclusos Pires Coelho e Carrilho fossem revistados na portaria da Cadeia, quando é certo que sabia que os mesmos já haviam sido revistados, do que resultou, por errada compreensão dos seus deveres profissionais, que os reclusos fossem retirados da carrinha e espancados posteriormente por outros guardas.
O Propõe-se que se extraiam cópias das declarações dos reclusos Miguel Carrilho da Silva, José Gomes Pires Coelho e Juan Francisco Moran, e, bem assim, cópia da declaração a fl. 49, a fim de serem remetidos à brigada da Polícia Judiciária que está a investigar os casos de corrupção na Cadeia de Vale de Judeus, mais propondo que também lhes sejam entregues as chaves e os instrumentos, juntos ao processo, que foram facultados aos reclusos para a tentativa de fuga de 21 de Junho.
D) Propõe-se que, dentro das possibilidades dos restantes estabelecimentos prisionais afectos à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, sejam os reclusos da Cadeia de Vale de Judeus transferidos e dispersos o mais urgente possível e que esta Cadeia seja encerrada até um ulterior momento, em que seja possível formar pessoal adequado a pôr em funcionamento o importantíssimo parque oficinal ali instalado.
E) Propõe-se a remessa de cópias deste processo ao Ex."10 Sr. Procurador-Geral da República, adjunto, que está a investigar os factos relacionados com a fuga de 16 de Julho, para fins expressos no seu oficio a fl. 50.
CAPÍTULO IX
Esclarecimento público sobre o Serviço do Provedor de Justiça
Através da Secretaria de Estado da Comunicação Social, Direcção-Geral da Divulgação, fez-se uma 2.a edição, revista e actualizada, contendo a Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, que aprovou o Estatuto do Provedor, e na qual, já de acordo com esta nova lei, se pretende, sumariamente e em linguagem simples e clara, explicar o que é, para que serve, como funciona e como a ele se pode recorrer, o Serviço do Provedor de Justiça.
Este folheto, além de se encontrar na sala de espera do Serviço do Provedor, a fim de que quem a ele se desloca o possa ler e levar, se o quiser, foi
enviado a todos os órgãos de comunicação social, câmaras municipais, juntas de freguesia, sindicatos e associações.
Por seu turno, os relatórios de 1976 e 1977 foram enviados igualmente a todos os órgãos de comunicação social, a todas as autarquias locais, Universidades, bibliotecas, associações académicas, sindicatos, associações de interesse público, embaixadas de Portugal, principais consulados portugueses no Mundo e designadamente nos países onde existe emigração portuguesa, às organizações internacionais da ONU e do Conselho da Europa, às embaixadas acreditadas em Portugal e a todos os Ombudsman dos diferentes países que, com essa ou outra designação, mantêm serviços similares ao do Provedor de Justiça de Portugal.
Com idêntico fim de esclarecimento público sobre o Serviço e as suas actividades, o Provedor respondeu em emissões da Radiodifusão Portuguesa organizadas, sob a rubrica «A lei em que vivemos», pelo advogado Dr. Rui Moura Guedes: em Janeiro, 3 programas, e em Abril, 2, e, por duas vezes, uma para o 1.° canal, outra para o 2.°, na Radiotelevisão.
Em Abril, comemorando o aniversário da publicação do Decreto-Lei n.° 212/75, que criara o Provedor de Justiça, deu o Provedor uma conferência aos órgãos de comunicação social, da qual deram desenvolvidos relatos os jornais Diário de Noticias, Primeiro de Janeiro, Diário, Diário de Lisboa, Diário Popular, A Luta, Jornal Novo, Extra, Jornal de Notícias e Capital.
Em outras ocasiões, durante o ano, concedeu o Provedor entrevistas à Radiotelevisão em 23 de Abril e aos jornais Primeiro de Janeiro e Extra.
O semanário Expresso, no seu número de 5 de Agosto, publica uma reportagem a propósito dos relatórios do Provedor de Justiça, e a revista Relax do Médico, no seu número de Novembro, insere um bem elaborado artigo sob o título «O que é e para que serve o Provedor de Justiça».
Porque, no ano de 1978, se comemorou o 30.° aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem e o 25.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, aceitou o Provedor os convites que lhe foram dirigidos, um pelos professores e alunos da disciplina de Introdução à Política do Liceu de Abrantes e outro da Associação Direito e Justiça — Secção Portuguesa da Comissão Internacional dos Juristas —, para falar sobre essas datas.
Assim, deslocou-se ao Liceu de Abrantes em 5 de Dezembro, onde teve a satisfação de falar, perante centenas de jovens que escutavam com a maior atenção e interesse manifesto as palavras que proferiu sobre os direitos do homem na Constituição Política da República Portuguesa de 1976. E, dias depois, na sala de conferências da Ordem dos Advogados, em Lisboa, perante um vasto auditório constituído principalmente por juristas, e sob a presidência do presidente da assembleia geral da Associação Direito e Justiça, achando-se presentes na mesa o vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Procurador-Geral da República, o representante da Ordem dos Advogados e o Dr. Ângelo de Almeida Ribeiro, usava da palavra para falar sobre a data que se comemorava e a luta travada e a tra-
Página 2123
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(147)
var na defesa dos direitos humanos, tendo a sua fala sido publicada, quase na integre, pelo jornal A Luta.
Tendo os orientadores do estágio, quer dos magistrados judiciais, quer dos do Ministério Público, manifestado o desejo de, acompanhados dos respectivos estagiários, visitarem o Serviço do Provedor de Justiça e ali se inteirarem das suas actividades, como se organizam os processos, competência e poderes do Provedor de Justiça, realizaram-se essas visitas em dias diferentes.
Tanto numa como noutra, depois de breves palavras de saudação e introdução do Provedor, o adjunto Dr. Luís Silveira proferiu uma palestra em que explanou as origens das instituições deste género e do Serviço do Provedor de Justiça, as normas constitucionais e legais por que esta se rege, a sua competência, os seus poderes, a organização, a marcha dos processos e a natureza jurídica das recomendações.
No final das palestras, tanto o adjunto do Provedor como este, os coordenadores e assessores responderam a pedidos de esclarecimentos e questões postas pelos magistrados estagiários.
Deve assinalar-se ainda que, no decurso do ano, o adjunto do Provedor proferiu uma palestra, seguida de debate, sobre o Serviço do Provedor de Justiça, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, e uma outra na cidade do Porto, a convite do Instituto da Família e Acção Social, subordinada ao tema «A responsabilidade do Estado no atendimento dos cidadãos».
Finalmente, e pelo interesse de que se reveste, se dá notícia de que, a seu pedido, formulado com antecedência, esteve em Portugal Donald Rowat, professor de Ciência Política na Carlton University, de Otava, Canadá, que durante três dias, acompanhado de sua secretária, teve demoradas entrevistas com
O Provedor, o adjunto e a responsável pelos sectores de documentação e de relações públicas, Dr.a Maria Luísa Baracho, colhendo elementos sobre o Serviço do Provedor de Justiça para uma edição actualizada que pretende publicar em inglês, francês e espanhol.
Também por intermédio do sector de documentação, tem o Serviço enviado dados, além dos relatórios anuais, e uma síntese sobre a sua organização e actividades ao advogado Bernard Frank, presidente do Ombudsman Committee da International Bar Association, com sede em Allentown, Pensilvânia, que a eles se tem referido nas suas publicações: Newstetter, de periodicidade irregular, e Ombudsman and other Complatnt-Handling Systems Survey, de periodicidade anual (dados referentes ao período de
1 de Julho de um ano a 30 de Junho do ano seguinte).
CAPÍTULO X
Participação no Comité de Peritos em Direito Administrativo do Conselho da Europa
A participação portuguesa no Comité de Peritos em Direito Administrativo do Conselho da Europa continuou, em 1978, a ser assegurada pelo adjunto do Provedor de Justiça, Dr. Luís Silveira.
Efectuaram-se duas reuniões plenárias do Comité e uma do grupo de redacção, de que Portugal faz parte.
Os trabalhos do Comité centraram-se na discussão e preparação do projecto de resolução sobre o exercício de poderes discricionários por parte da administração, tarefa iniciada no ano anterior e cujo resultado final se prevê venha a ser submetido ao Comité de Ministros do Conselho da Europa antes do termo de 1979.
CAPÍTULO XI
Considerações finaSs
Ao cabo de mais um ano de trabalho é consolador poder afirmar-se que se tem a consciência de ter o Serviço do Provedor de Justiça feito o melhor que podia e sabia para responder às solicitações dos reclamantes e desempenhar a missão que lhe está confiada e que é de primacial importância num Estado democrático.
Mas, por outro lado, entristece ter de dizer-se que, apesar de continuar a verificar-se uma maior compreensão por parte da administração sobre a vantagem da existência deste Serviço e a necessidade de lhe ser prestada prontamente a colaboração que lhe é pedida, é mais lento do que seria para desejar esse aumento de compreensão, e há ainda vários sectores e departamentos, tanto na Administração Central como Local, onde se nota não só a falta de prontidão em responder, como ainda relutância em o fazer e até em aceitar e dar seguimento às recomendações e reparos do Provedor.
Por vezes verificam-se casos de falta de qualquer resposta apesar de insistências várias, durante meses, denotando um propósito evidente — de que até os responsáveis se vangloriam — de não responder.
Isto leva-me a pensar em que talvez venha a justificar-se um aditamento ao artigo 27.° da Lei n.° 81/ 77, em ordem a estabelecer que, na falta de resposta ou da prestação dos esclarecimentos pedidos, em prazo superior a trinta dias, poderá o Provedor notificar por carta registada com aviso de recepção o responsável, marcando-lhe prazo certo para o fazer, incorrendo na pena do § 2.° do artigo 188.° do Código de Processo Penal, considerando-se a falta de resposta equiparada à desobediência qualificada.
Chega a ter-se a desoladora impressão de que há departamentos que parecem apostados em emperrar as coisas, em tudo demorar e confundir, em continuar a ter o maior desprezo pelos direitos e legítimos interesses dos administrados, em querer estabelecer um clima de agastamento, talvez mesmo de revolta, que leva os cidadãos mais desesperados a, descontrolando-se e esquecendo depressa de mais um passado ainda recente, atirar para a democracia as culpas que só podem ser assacadas aos vícios e desmandos do autoritarismo, da irresponsabilidade e do desrespeito pela lei, que eram características próprias do regime anterior e não podem nem devem subsistir no actual.
Há processos disciplinares que se arrastam há anos, estando os visados suspensos de exercício e vencimentos, sem que nada o justifique, a não ser inércia e desrespeito pelos direitos e dignidade alheios.
Há processos camarários que jazem adormecidos em algumas repartições.
Página 2124
1076-(148)
II SÉRIE — NÚMERO 47
Ha requerimentos de cidadãos que aguardam meses e meses por uma decisão.
Há serviços públicos que não atendem quem os utiliza nem com a presteza nem com a urbanidade, e até humanidade, que devem.
Factos como estes repetem-se a cada passo, em repartições públicas, em empresas públicas. O utente de um serviço, o cidadão, é tratado como um inimigo que vem perturbar o dolce far niente do funcionário.
São inúmeras e enormes as «bichas» que se formam às portas de certas repartições, sem que se providencie pela melhor forma de organizar o serviço em ordem a evitá-las, a não obrigar o público a estar horas de pé sujeito à intempérie, com grave prejuízo para a sua saúde e a sua vida quotidiana.
Ainda agora, quase cinco anos depois do 25 de Abril, se continua a praticar a falta de humanidade — ainda que com apoio no artigo 45.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado — de suspender preventivamente trabalhadores arguidos em processo disciplinar com privação total da retribuição, às vezes durante largo período de tempo.
Em Agosto último, para essa iniquidade se chamou a atenção do Ministro da Reforma Administrativa, solicitando-lhe, uma vez que na projectada revisão daquele Estatuto Disciplinar se prevê alterar aquele artigo, para tomar providências imediatas, enquanto se aguarda a revisão, no sentido de não se verificarem suspensões preventivas de trabalhadores da função pública, acompanhadas de total suspensão de vencimentos. Esta solicitação teve acolhimento, e logo dias depois o Ministro circulou a todos os departamentos e serviços de administração pública para que procedam de modo que, em processo disciplinar, não sejam privados de vencimento de categoria os arguidos preventivamente suspensos.
Apesar disso — ainda que seja certo só de recomendação se tratar, e não de norma legislativa — continuam a verificar-se suspensões da totalidade dos vencimentos, sem se atentar em que tal prática é contrária aos mais elementares princípios de humanidade e que a única suspensão que poderá ser admissível será a do exercício, e nunca a dos vencimentos, já que todos têm direito à vida, à própria e à do seu agregado familiar.
Também inexplicavelmente se continua, em casos nítidos de existência de falta disciplinar, a rescindir contratos ou dispensar do serviço, por conveniência, sem, pois, formação de processo disciplinar, e sem audição dos visados, trabalhadores da função pública, que não estão no desempenho dos lugares de confiança, o que é manifestamente um desvio de poder, por estar fora do objecto e fim para que foi concedido o poder discricionário de exoneração por conveniência de serviço.
Não pode deixar de assinalar-se, ainda, apesar da publicação do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho, que em reforço da garantia da legalidade administrativa, logo no seu artigo 1.° impôs que, para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem fundamentar-se, com fundamentação expressa, com sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito, os actos administrativos abrangidos pelas diferentes alíneas do artigo, a verdade é que, mesmo ao mais alto nivel, continuaram a proferir-se despachos de mera concordância, sem a me-
nor espécie de fundamentação, o que, manifestamente, é altamente censurável e afecta a garantia da legalidade que o decreto-lei quis assegurar.
Estes três aspectos que acabam de anotar-se levam-me a concluir pela vantagem, e urgência, de o Primeiro-Ministro circular a todos os Ministérios, em ordem a que todos aqueles, Ministros, Secretários ou Subsecretários de Estado, directores-gerais ou funcionários com poder para tal, que tenham de praticar um acto administrativo dando cumprimento às disposições legais citadas, lhes dêem a devida fundamentação, que se abstenham de suspender preventivamente da totalidade dos seus vencimentos os arguidos em processos dísplinares, e, finalmente, que não usem, com desvio do poder, da facilidade de exonerar por conveniência de serviço, quando, efectivamente, a exoneração resulta de prática de falta disciplinar.
Seja-me ainda consentido chamar a atenção para a situação de algumas dezenas de cidadãos, a maior parte de idade avançada, doentes e sem recursos, que, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 171/77, de 30 de Abril, pediram para lhes ser concedida a pensão a atribuir aos cidadãos portugueses que se tenham distinguido por méritos excepcionais na defesa da liberdade e da democracia. Com efeito, não tenho notícia de que até hoje tenha sido concedida qualquer pensão, e não só, ao que me consta, o número de peticionários conta-se por não muitas dezenas, como nele se incluem também viúvas e órfãos de cidadãos que deram o melhor do seu esforço, sacrificaram a sua vida, os seus haveres, a sua liberdade, o seu bem--estar, na defesa da democracia e da liberdade.
É um acto de justiça a que têm incontestável direito e que requer da parte da Administração celeridade na organização, instrução e conclusão dos respectivos processos.
Entendo, também, ser um dever alertar desde já os órgão de soberania com poder legislativo para o grave problema social que se está criando através das vendas, em propriedade horizontal, dos andares para habitação de prédios urbanos que se encontram arrendados, a fim de, quanto antes, legislarem adequadamente.
Várias famílias, designadamente de pessoas idosas, que ocupam andares desde há largos anos para sua habitação, se encontram na iminência de perder os seus lares e não terem possibilidade de arranjar novas casas.
Isto acontece porque a Lei n.° 63/77, de 25 de Agosto, a meu ver, não acautelou devidamente os interesses legítimos dos inquilinos, defendendo capazmente o seu direito à habitação, não só por não ter estabelecido o preço a pagar pelo inquilino, no caso de o proprietário querer vender o prédio por andares, nem a forma do pagamento do preço, como não estabeleceu expressamente para estes casos o regime dos empréstimos para aquisição de habitação própria, e não dilatou o prazo para exercício do direito de preferência, que, reduzido a escassos oito dias (artigo 416.°, n.° 2, do Código Civil), impede o inquilino de saber se poderá obter o empréstimo necessário para exercer esse direito.
*
Não há dúvida de que o Português se foi apercebendo de que tem hoje uma instituição a que pode
Página 2125
3 DE ABRIL DE 1979
1076-(149)
recorrer sem gastar dinheiro em papel selado ou em selos fiscais e sem necessitar de mandatário para o efeito, e que se coloca inteiramente, com total isenção, ao seu serviço, para que seja reparada qualquer injustiça de que tenha sido vítima, ou até para, preventivamente, evitar que ela venha a ser cometida.
O cidadão tem já consciência de que nesta instituição encontra protecção e que os seus direitos e legítimos interesses têm hoje uma salvaguarda importante.
E se é certo que alguns, menos esclarecidos ou julgando ter direitos que de nenhum modo possuem, nem, de resto, seria justo que possuíssem, quando se vêem rejeitadas as suas queixas invectivam o Serviço e até se dirigem incorrectamente ao Provedor ou aos seus colaboradores, a verdade é que tantos há, reconhecendo o trabalho a seu favor desenvolvido, que nos enviam o seu testemunho escrito, ou nos procuram, para verbalmente nos darem a conhecer o seu agrado pela forma como o Serviço pugnou pelos seus direitos e legítimos interesses e resolveu os problemas que os angustiavam.
Não só o número de queixas vem aumentando de ano para ano, como ainda, à medida que o cidadão vai adquirindo conhecimento e consciência da existência e acção do Provedor de Justiça, vai aumentando o número de vindas ao Serviço para, ou directamente com o Provedor, ou no Sector das Relações Públicas, se inteirar da marcha da sua reclamação e expor novos elementos que julgue poderem reforçar a sua razão.
Para além disto, a experiência tem mostrado, e demonstrado, a vantagem dos contactos directos e inspecções aos serviços visados, não só para acelerar o andamento dos processos, como para sensibilizar os diversos departamentos para a necessidade de uma melhor, mais pronta e mais completa colaboração com o Provedor, e, até, para se detectar deficiências de que, por vezes, nem esses departamentos se haviam dado conta.
Acresce que também a experiência vem a revelar a necessidade de se proceder periodicamente a ins-
pecções sem aviso prévio, para melhor garantia da sua verdade e eficiência, e dos próprios inspeccionados, aos estabelecimentos prisionais.
Por outro lado, e dada a escassez, em relação ás necessidades que se verificam, do quadro de inspectores administrativos de que a Administração Pública dispõe, e de juízes e de agentes do Ministério Público, que possam, sem prejuízo do demais serviço, efectuar inquéritos, designadamente em departamentos de autarquias locais, começa a verificar-se — sob pena de os mesmos perderem oportunidade e de ficarem por esclarecer factos e ocorrências que necessitariam de averiguação imediata e rápida, cuidadosa e completa, pelo menos em relação aos que se apresentarem de maior gravidade, com relevante desprestígio para a Administração — a imperiosa conveniência de tais inquéritos e averiguações serem efectuados pelos assessores do Serviço do Provedor de Justiça.
Só que, sob pena de se sacrificar a celeridade do estudo das queixas e apesar do meritório esforço e indesmentida dedicação de que todos têm dado sobejas provas, o quadro de assessores revela-se insuficiente para a adequada resposta que se lhe pede e necessita de ser aumentado em pelo menos duas unidades.
É o que se irá procurar conseguir no mais breve prazo de tempo possível, para que o Serviço do Provedor de Justiça seja capaz de continuar a responder, cada vez com mais prontidão, àquilo que dele esperam os administrados e que lhe é imposto pelo prestígio que já adquiriu e, sobretudo, pelo interesse dos cidadãos.
Uma vez mais — e com que satisfação tal se faz porque não se trata de vulgar «naris de cera» ou de qualquer lugar comum, mas sim de prestar a devida justiça — regista-se ao encerrar este relatório o agradecimento e louvor a todos quantos trabalham no Serviço do Provedor de Justiça, pela lealdade, correcção, competência e dedicado zelo de que ao longo do ano deram sobejas provas, na certeza de que todos, na tarefa que a cada um cabe, deles se tornaram justificadamente merecedores.
Página 2126
PREÇO DESTE NÚMERO 75$00
IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA