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II Série — Suplemento ao número 68

Quarta-feira, 4 de Janeiro de 1984

DIÁRIO

da Assembleia da República

III LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

SUMÁRIO

Provador de Justiça (Relatório do):

7." relatório à Assembleia da República, referente ao ano de 1982.

7.° RELATÓRIO DO PROVEDOR DE JUSTIÇA À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA - 1982

CAPÍTULO I Introdução

1 — O presente relatório, referente ao 2." ano do meu mandato, é o 7.° relatório respeitante ao Serviço do Provedor de Justiça, que cumpre apresentar à Assembleia da República, depois que, em 1975, foi criada em Portugal a instituição do ombudsman.

Tem por fim descrever, nos termos em que o determina a lei (artigo 21.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro), as actividades desenvolvidas ao longo do ano de 1982, nele se anotando as iniciativas tomadas, as queixas recebidas, as diligências efectuadas e os resultados obtidos.

2 — De harmonia com as linhas gerais de actuação que já no anterior relatório ficaram delineadas, toda a acção do Provedor de Justiça se processou tendo em vista assegurar uma dinâmica tão rápida quanto possível junto dos órgãos e serviços tanto da administração central como da regional e local, incluindo empresas públicas e instituições personalizadas do Es-

tado, mediante a sensibilização de todos no que concerne à utilidade social da sua intervenção.

Creio poder afirmar que, hoje, é uma noção adquirida a de que o Provedor de Justiça, como órgão público, individual e independente, exerce, nos termos da Constituição da República (artigo 23.°), o controle sobre a actividade da Administração Pública, com o fim essencial de defender os direitos fundamentais da pessoa humana, tal como constitucionalmente, aliás, se acham também definidos e garantidos.

Pode, pois, dizer-se que é do conhecimento dos cidadãos, em geral, que a função do Provedor de Justiça corresponde à de um verdadeiro «defensor público», ao qual incumbe a missão de zelar pe/os direitos de todos quantos, em relação à Administração, se sintam lesados por situações de ilegalidade ou de injustiça e, portanto, afectados nos seus interesses legítimos em consequência de actos ou omissões dos poderes públicos.

3 — Na sua actuação não está o Provedor de Justiça vinculado a quaisquer regras formais, sendo absolutamente imparcial no exercício do seu mandato.

No entanto —acentue-se— não dispõe de quaisquer poderes decisórios, e daí que não possa anular ou alterar os actos da Administração.

Por tal, apenas lhe é possível, à face da lei, recomendar a sua revogação ou modificação, quando feridos de ilegalidade ou injustiça, revogação ou modificação essa a levar a efeito petos próprios órgãos donde hajam emanado os mesmos actos.

4 — Exactamente por isso, a actuação do Provedor de Justiça decorre paralelamente e é independente da utilização, pelos próprios interessados, dos meios (quer graciosos, quer contenciosos) que se achem previstos na lei.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Assim, tal actuação não interrompe os prazos esta-belecidos para a interposição de quaisquer recursos.

Por outro lado, não dispondo o Provedor de Justiça, como se viu, de poderes decisórios, a sua força resultará tão-só, e essencialmente, dos próprios fundamentos das «recomendações» que venha a dirigir às entidades visadas e assenta, antes de mais, na consciência e formação democrática dos órgãos da Administração, como aliás acontece em todos os países que vêm adoptando a instituição do ombudsman, a qual constitui, sem dúvida, uma emanação dos altos valores de um Estado de direito.

Essa força resultará ainda da própria personalidade do Provedor de Justiça e da sua formação técnico--jurídica, bem como da capacidade persuasiva da sua própria opinião, bem como da dos seus directos colaboradores, para que a análise, em cada caso, seja, quanto possível, juridicamente rigorosa e justa.

5 — O Provedor de Justiça tem encontrado, de uma maneira geral, receptividade ao nível de todos os órgãos da administração civil, sendo essa receptividade um indicio claro do sentido de dever legal (artigo 27.° da Lei n.° 81/77) de prestar todos os esclarecimentos e informações que lhes sejam solicitados pelo Serviço do Provedor de Justiça, empenhado como está em, através da sua actuação, assegurar a justiça devida a todos, corrigindo ou evitando erros ou falhas, quer de interpretação jurídica, quer de outra ordem, sempre admissíveis e, por vezes, despercebidos até, contribuindo deste modo para o aperfeiçoamento da máquina administrativa, que, assim, melhor servirá o cidadão e o bem comum.

Infelizmente, porém, órgãos ou serviços públicos há, ainda, quer no âmbito da administração central, quer da administração regional ou local, que não actuam com a celeridade que seria desejável, por enleados numa reprovável burocracite, por atitude negligente, ou mesmo falta de formação funcional, e que não tomam na devida atenção as solicitações do Serviço do Provedor de Justiça.

O prejudicado é o cidadão, é o País, é a democracia, pois são os próprios órgãos administrativos que assim demonstram não terem sabido compreender ou acertar o passo cora a evolução de um país que se quer modernizado, progressivo e actuante.

6 — Por outro Jado, e a despeito dos insistentes esclarecimentos que através de todas as oportunidades de divulgação se têm levado ao público, ainda é grande o número de reclamações ou queixas que são dirigidas ao Provedor de Justiça e que têm de ser rejeitadas liminarmente por versarem questões absolutamente excluídas da sua competência, designadamente questões que, embora afectando direitos ou causando prejuízos, se traduzem em meros litígios entre particulares.

Citarei, como exemplo, questões de inquilinato e propriedade, questões de sucessões e família, de exercício do poder paternal, a par de questões do foro criminal e outras.

É também muito frequente o pedido de intervenção do Provedor de Justiça a título de mera consulta jurídica, o que está manifestamente fora do seu campo de actuação.

Convém, pois, que todos possam saber mais exactamente que é unicamente com relação a acções ou omissões dos órgãos da Administração Pública que. por qualquer via (e designadamente por uma simples

carta), os cidadãos se podem dirigir ao Provedor de Justiça, expondo os casos que se lhe afigurem ilegal ou injustamente decididos, casos que serão objectivamente analisados do ponto de vista jurídico e defendidos, desde que afectando interesses legítimos.

Quando se trate, porém, de questões que, embora cabendo na área da competência do Provedor de fus-tiça, envolvam uma mais complexa indagação em matéria de facto, e para a qual o Serviço do Provedor de Justiça não dispõe —como se sabe— de meios adequados que permitam levar a efeito uma instrução completa, e desde que se reconheça que o reclamante tem ao seu alcance, para fazer valer o seu direito, outros meios legais, designadamente contenciosos, nesses casos limita-se, então, o Provedor de Justiça a encaminhar os interessados para os tribunais competentes.

7 — Através de encontros periódicos com todos os órgãos da comunicação social, tem o Provedor de fustiça procurado consciencializá-los do papel relevante que a imprensa pode desempenhar, dando-lhe colaboração, nomeadamente através do importante papel pedagógico na divulgação de uma imagem real e correcta do campo da sua actividade pública, para que todos possam saber que podem dirigir-se a alguém que, imparcialmente, está atento e disponível para analisar e defender direitos fundamentais da pessoa humana que possam ter sido afectados ou lesados.

Por outro lado, e como se sabe, os órgãos de comunicação social muito podem contribuir ainda para a defesa dos direitos dos cidadãos através da divulgação, com autenticidade e verdade, de actos de real injustiça, erros ou faltas, morosidade da Administração, etc, servindo desta forma o bem comum e dando ensejo, através dos poderes de iniciativa própria do Provedor de Justiça, a que este possa intervir para obter a reposição da ordem jurídica violada em consequência de actuações ilegais ou reprováveis da Administração Pública.

Finalmente, constituindo os órgãos da comunicação social uma das vias de sensibilização mais fortes da opinião pública, nunca será de mais acentuar a válida colaboração que podem prestar relativamente à acção do Provedor de Justiça na divulgação de todos os casos em que os órgãos da Administração sejam indiferentes às suas recomendações, para que se reparem situações de ilegalidade ou de injustiça.

8 — Por último, cumpre acentuar que o exercício de um direito deve ser proporcionado relativamente ao interesse que se pretende proteger, e que é dentro deste espírito que o Provedor de Justiça deverá actuar.

A possibilidade legal da sua intervenção representa, verdadeiramente, uma nova via de acesso ao direito, que é, sem dúvida, plenamente eficaz em países de concepção democrática.

A sua intervenção constitui, pois, mais uma garantia dada aos cidadãos num Estado que se pretende organizado sob o primado do direito.

Representa, na realidade, um meio prático, eficaz e gratuito, pelo qual se assegura o livre exercício de direitos fundamentais, consagrados na Constituição da República a par dos meios e garantias tradicionais, ou seja os meios graciosos e os meios contenciosos.

Isto é: as reclamações ou recursos hierárquicos e os recursos contenciosos a interpor para os tribunais administrativos.

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CAPÍTULO II Dados estalísticos e sua análise Dados estatísticos relativos ao ano de 1982

QUADRO N." I Movimento geral de processos

I — Número de processos organizados

Queixas escritas ................................................. 2 049

Queixas verbais .................................................. 514

Total ............................(a) 2 563

Iniciativas do Provedor ....................................... 140

Total geral.....................(a) 2 703

Das quais correspondem a processos de declaração de inconstitucionalidade:

Queixas ..................................................... 54

Iniciativas do Provedor ................................. 3

Total ........................._57

(a) Dos quais dois fórum anulados por nüo conterem matéria paru processo.

II — Número de processos reabertos

Transitando de 1977 ........................................... 2

Transitando de 1978 ........................................... 3

Transitando de 1979 ........................................... 5

Transitando de 1980 ........................................... 12

Transitando de 1981 ........................................... 2t

Reabertos em 1982:

De 1976 ......................................................

De 1977 ......................................................

De 1978 ......................................................

De 1979 ...................................................... 2

De 1980 ...................................................... 6

De 1981 ......................................................

De 1982 ...................................................... _ U

Total ......................... 62

III — Número de processos apensados

Processos apensados a outro já pendente, por idêntica

reclamação ..................................................... 201

Processos incluídos em iniciativa do Provedor ......... 10

Total ............................ 211

IV —Número de processos movimentados e a movimentar

Processos que transitaram de 1976 ........................ 100

Processos que transitaram de 1977 ........................ 96

Processos que transitaram de 1978 ........................ 107

Processos que transitaram de 1979 ........................ 267

Processos que transitaram de 1980 ........................ 351

Processos que transitaram de 1981 ........................ 1 252

Processos que transitaram dos meses anteriores ........ -

Processos reabertos ............................................. 62

Processos organizados em 1982 ............................. 2 701

Total ............................ 4 936

Processos terminados em 1982:

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

(a) lá considerados no cômputo geral do n." 2.

Processos que transitaram para 1983:

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

lo) N5o incluídos no total, por Já computados nas rubricas precedentes.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

QUADRO N.» 2 Queixas rejeitadas

I — Rejeitadas liminarmente

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

II — Rejeitadas após estudo, mas sem diligências

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

1)1 — Reiehadas com estudo e sdós dlllaênclas

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

QUADRO N.' 3

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

QUADRO N." 4

Classificação dos processos por assunto

a) Administração da justiça: Processo penal:

Instrução ............................................. 5

Prisão preventiva .................................. 3

Questões diversas.................................. 76

Outros processos judiciais:

Atrasos ............................................... 83

Questões diversas ................................. 93

Questões gerais..................................... 33

Total ...................... 273

6) Contribuições e impostos .................................... 94

c) Crimes (deficiência de previsão legal e ou perseguição criminal) ................................................ 9

d) Descolonização .................................................. 47

e) Direitos humanos:

Direito ao ensino .................................. 92

Liberdade de informação........................ 8

Outros ................................................ 117

Total ...................... 217

f) Direitos políticos ............................................... 4

g) Empresas:

intervenção estadual .............................. 3

Questões diversas .................................. 19

Total ........................._22

h) Expropriações ................................................... 21

0 Habitação:

Arrendamento ...................................... 29

Despejos .............................................. 5

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Ocupações ........................................... 1

Questões diversas .................................._49

Total ......................_84

/) Licenciamento de actividades industriais e comerciais t k) Obras:

Construções e obras ilegais..................... 19

Licenciamento ...................................... 23

Questões diversas .................................._42

Total ......................_84

/) Polícia............................................................ 27

m) Processo administrativo...................................... 14

n) Questões agrárias:

Reforma Agrária/ocupações .................... 2

Questões diversas .................................._20

Total ......................_22

r>) Regime prisional ............................................... 79

p) Registos ........................................................... 15

q) Segurança social:

Abono de família ................................. 1

Aposentação e reforma........................... 190

Pensão de sobrevivência ........................ 59

Questões diversas ......................... ....... 136

Total ......................_386

r) Trabalho:

Função pública:

Adidos ............................................... 176

Admissões ............................................

Carreiras ............................................. 158

Concursos ............................................ 142

Demissões e despedimentos..................... 4

Disciplina ............................................ 42

Provimento .......................................... 120

Reintegrações ....................................... 9

Remunerações ...................................... 134

Saneamentos ......................................... 4

Questões diversas ................................. 229

Total ........................ 1018

Sector privado:

Despedimentos ...................................... 3

Questões diversas .................................._41

Total ......................_44

s) Transportes e comunicações ................................. 34

0 Diversos ........................................................... 206

u) Assunto incompreensível .................................... ~

Total geral...................... 2 701

Ministério do Trabalho .......................................... 58

Ministério dos Assuntos Sociais ................................ 403

Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas ............. 104

Ministério da Indústria, Energia e Exportação............ 30

Ministério da Cultura e Coordenação Científica........... 10

Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes 108

Ministério da Reforma Administrativa........................ 196

Total ............................. 1819

II — Administração regional

Governo Regional dos Açores .................................. 1

Governo Regional da Madeira ................................. 8

Total............................._9

Ill — Administração local

Governos civis ...................................................... 2

Juntas distritais..................................................... 1

Assembleias distritais ............................................. 5

Federações de municípios ....................................... 2

Câmaras municipais ............................................... 211

Assembleias municipais .......................................... 2

Serviços municipalizados ......................................... 12

(untas de freguesia ................................................ 24

Assembleias de freguesia......................................... 2

Juntas de turismo.................................................._

Total ............................._261

IV — Empresas públicas, nacionalizadas e intervencionadas

Empresas públicas e nacionalizadas ........................... 182

Empresas intervencionadas ...................................... -

Total............................._182

V — Outras entidades

Presidência da República ........................................

Conselho da Revolução .......................................... 5

Assembleia da República ........................................ 11

Conselho Superior da Magistratura ........................... 1

Tribunais ............................................................. 278

Ministério público.................................................. 6

Forças Armadas..................................................... 28

Comissão Nacional de Eleições.................................

Comissões de recenseamento.................................... -

Entidades particulares............................................. 95

Indefinidas ...........................................................__6

Total ............................. 450

QUADRO N.° 5 Entidades visadas nos processos

I — Administração central

Governo ..............................................................

Primeiro-Ministro ..................................................• j»

Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional 4

Presidência do Conselho de Ministros........................ 12

Secretaria de Estado do Fomento Cooperativo............

Secretaria de Estado do Turismo.............................. 4

Ministério da Qualidade de Vida.............................. 4

Ministério das Finanças e do Plano........................... 211

Ministério da Administração Interna ......................... 70

Ministério dos Negócios Estrangeiros ........................ 27

Ministério da Justiça .............................................. 145

Mmistério 4a educação .......................................... 359

QUADRO N.'6 Características das queixas

I — Situação sóclo-prorlsslonal dos reclamantes

1 — Queixas individuais

Agricultor ............................................................ 29

Comerciante ......................................................... 39

Industrial ............................................................. 20

Militar ................................................................. 10

Proprietário .......................................................... 20

Trabalhador da administração central ........................ 659

Trabalhador da administração regional ......................

Trabalhador da administração local .......................... 46

Trabalhador de empresa públicB ou nacionalizada....... 48

Trabalhador do sector privado................................. 257

Aposentado ou reformado....................................... 257

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Desempregado ou sem profissão ............................... 167

Emigrante ............................................................ 25

Recluso ............................................................... 115

Profissão não declarada .......................................... 445

Total ............................. 2 127

2 — Queixas colectivas

Associações profissionais ......................................... II

Comissões de moradores ......................................... 2

Comissões de trabalhadores ..................................... 10

Entidades públicas ................................................. 28

Partidos políticos ................................................... -

Sindicatos e associações sindicais .............................. 137

Sociedades............................................................ 44

Outros ................................................................. 202

Total ........................ 434

II — Origem geográfica das queixas

I — Distritos continentais

Aveiro ................................................................ 73

Beja .................................................................... 27

Braga .................................................................. 130

Bragança .............................................................. 43

Castelo Branco ...................................................... 34

Coimbra............................................................... 151

Évora .................................................................. 37

Faro .................................................................... 54

Guarda ................................................................ 37

Leiria .................................................................. 103

Lisboa ................................................................. 966

Portalegre ............................................................ 18

Porto ................................................................... 459

Santarém .............................................................. 54

Setúbal ................................................................ 147

Viana do Castelo................................................... 46

Vifa Real ............................................................. 51

Viseu .................................................................._74

Total ............................. 2 504

2 — Regiões autónomas e território de Macau

Açores ................................................................. 12

Madeira ............................................................... IR

Macau ................................................................._-

Total ........................_30

3 — Estrangeiro e não identificada

Estrangeiro ........................................................... 26

Não identificada ....................................................__1

Total ............................._27

IH — Sexo. entidades colectivas, não Identificado

Feminino .............................................................. 713

Masculino ............................................................ J 535

Entidade colectiva .................................................. 313

Não identificado.................................................... -

Total ............................. 2 561

IV — intermediário

Assembleia da República ........................................ 7

Ministério público .................................................. 3

Total .................. .........._8

V — Interesse/Natureza

Individual ............................................................ 1 999

De grupo ............................................................. 510

Geral .................................................................._52

Total ............................. 2 56!

VI — Duração dos processos

Menos de 15 dias ................. ................................. 214

1 mês .................................................................. 547

2 meses ............................................................... 203

3 meses ............................................................... 225

4 meses ............................................................... 183

5 meses ............................................................... 165

6 meses ............................................................... 128

7 meses ............................................................... 119

8 meses ............................................................... 92

9 meses ............................................................... 85

10 meses .............................................................. 63

11 meses .............................................................. 66

12 meses .............................................................. 173

18 meses .............................................................. 178

24 meses .............................................................. 60

30 meses .............................................................. 17

36 meses .............................................................. 1

42 meses ..............................................................

48 meses ..............................................................

Total ............................. 2 525

QUADRO N.° 7 Medidas suscitadas petos processes

Diligências exteriores:

Inquéritos ...................................................... 1

Inspecções ...................................................... 6

Exames .......................................................... -

Outras ........................................................... -

Propostas de nova legislação, alteração ou revogação da vigente .............................................................. 26

Atendidas ....................................................... -

Recusadas ...................................................... -

Pendentes .......................................................

Pedidos de declaração de inconstitucionalidade............ 13

Atendidos ....................................................... 4

Recusados ...................................................... 5

Pendentes ....................................................... 2

Abertura de processo da iniciativa do Provedor.......... 8

Participação crime ................................................. 2

Recurso ou outra providência contenciosa através do

ministério público ............................................. 2

Recomendação:

Natureza:

Legislativa ................................................ 26

Administrativa .......................................... 139

De processo disciplinar...............................

De processo de inquérito ou sindicância ........

Resultado:

Acatamento .............................................. -

Não acatamento ........................................

Para procedimento futuro .................................

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Censura ou reparo ................................................. 44

Comunicação pública ............................................. 4

Comunicação especial à Assembleia .......................... -

Tentativa de conciliação ........................................

QUADRO N." 8 Funcionamento administrativo do SPJ

I — Correspondência

Número de ofícios recebidos ................................ 7 543

Número de ofícios expedidos ............................... 16118

II — Atendimento do público

Número de pesosas atendidas pelo Provedor............ 146

Número de pessoas atendidas pelo adjunto do Provedor............................................................... 118

Número de pessoas atendidas pelo Sector de Relações Públicas ......................................................... 2 497

Das quais:

Queixas ................................................ 442

Aditamentos .......................................... 134

Informações sobre o andamento das queixas 1 317

Pedidos de arquivo das queixas ................ 5

Pedidos de audiência .............................. 14

Questões fora da competência do SPJ ........ 2%

Outros assuntos ...................................... 289

Número de contactos telefónicos estabelecidos pelo Sector de Relações Públicas .............................. 450

Dos quais:

Da iniciativa do público.............. ............ 441

Da iniciativa do Serviço........................... 9

Insistência na resposta a ofícios do SPJ -

Ill — Diligências pessoais

Do Provedor...................................................... 51

Do adjunto do Provedor, de coordenadores e de assessores ............................................................ 4!

Do Sector de Relações Públicas ........................... -

IV — Reuniões

Reuniões de trabalho internas .............................. 15

Reuniões do conselho administrativo ...................... 1

Reuniões de todos os trabalhadores do SP) sobre

assuntos de trabalho e de pessoal .......................

Reuniões no Serviço com representantes das entidades

visadas ........................................................... -

Assistência às reuniões do Conselho Superior da Magistratura ........................................................ 40

QUADRO N.° 9 Actividades públicas

I — Esclarecimento público

Conferências de imprensa .................................... I

Entrevistas concedidas à imprensa ......................... 2

Entrevistas concedidas à rádio .............................. i

Entrevistas concedidas à televisão .......................... !

Notas oficiosas ................................................ 18

Palestras proferidas pelo Provedor......................... 1

Palestras proferidas pelo adjunto do Provedor e por

coordenadores .......................................... I

Il — Visitas técnicas ao serviço Visitas técnicas ao serviço....................................

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1892-(8)

II SÉRIE — NÚMERO 68

GRAFICO N." 1 Evolução da organização da processos durants o ano

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

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GRAFICO N.» 2 Número de piocc—o» organizado* — 1983

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

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II SÉRIE — NÚMERO 68

GRAFICO N.' 3 Numéro de processos termmados —1982

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Comentário aos dados estatísticas

1 — O número total de processos abertos em 1982 (2701) foi praticamente equivalente ao do ano anterior.

2 — Também a repartição das queixas entre escritas (2049) e verbais (514) justifica o mesmo tipo de observação.

As verbais representam, pois, cerca de 20% do lotai de queixas recebidas.

Receberam-se, em média, 10 queixas por dia útil.

3 — O quantitativo de processos de iniciativa do Provedor (140) revela um ligeiro aumento em relação ao ano transacto.

Estes processos — registando uma média de 2,6 por semana— continuam a ter origem sobretudo em artigos, notícias e cartas publicados na imprensa.

4 — Os processos relativos a questões de inconstitucionalidade sofreram um acréscimo assinalável em relação a 1980, voltando o seu total a situar-se ao nível dos anos anteriores a este último.

5 — O número global de processos movimentados (4936) representa um aumento de 374 (ou sejam 8,2 %) em relação ao ano antecedente.

A cada assessor coube, pois, uma média de 362 processos.

6 — Encerraram-se no ano em análise 2713 processos, o que significa um muito ligeiro saldo positivo.

7 — Para 1983 transitaram, assim, 2223 processos.

8 — No tocante às tomadas de posição do Provedor sobre os processos, observa-se que foram rejeitadas, sem decisão quanto ao fundo, 621 queixas (isto é, 24,2 % do total destas, o que representa uma diminuição de cerca de 2,8 % em relação ao ano precedente).

Nos processos em que o Provedor se pronunciou sobre o mérito das questões suscitadas verifica-se que formulou 26 recomendações legislativas, 139 recomendações administrativas e 44 reparos.

O Provedor apresentou em 1982, além disso, 11 pedidos de declaração de inconstitucionalidade de normas de diversa natureza.

9 — No período em questão, em 388 processos obteve-se resolução favorável aos interessados em função da intervenção do Provedor.

Este quantitativo corresponde a 14,3 % do total dos processos organizados no ano em referência e a 17,8 % daqueles em que o Provedor tomou uma posição quanto ao fundo.

Isto não significa, como é óbvio, que o resultado da actuação do Provedor em 1982 se tenha confinado à satisfação do mencionado número de casos pontuais: por um lado, um importante quantitativo de processos reporta-se a interesses de grupo ou mesmo gerais (e não meramente individuais); por outro, no elenco apontado não estão incluídos os processos em que o Provedor, embora não tendo podido solucionar certa situação concreta, todavia formulou recomendações ou reparos relativos à actuação futura das entidades públicas visadas.

10 — Os valores relativos aos assuntos abordados nos processos de 1982 mantiveram-se na linha dos anos anteriores.

Assim, as matérias mais versadas foram, sucessivamente, as do trabalho (1062, ou sejam 39 % do total), com especial incidência nos problemas da fun-

ção pública (1018), segurança social (386— £4%); administração da justiça (273 — 10 %) e direitos humanos, em geral (217 — 8%).

11 — De entre as entidades visadas, os departamentos da administração centrai relativamente aos quais se organizaram mais processos continuaram a ser os Ministérios dos Assuntos Sociais (403 —14,9 %), da Educação (359— 13 %) e das Finanças e do Plano (211 — 8%); em quarto lugar, o Ministério da Reforma Administrativa (196 — 7%) íomou a posição que no ano anterior coubera ao da Justiça.

Merecem referência também os totais de processos referentes a tribunais (278—10 %) e a empresas públicas e nacionalizadas (!82 — 6,7%).

No concernente à administração local, o mais numeroso elenco de processos respeita, naturalmente, a câmaras municipais (211—8%).

É de apontar, enfim, o reduzido número de casos dc âmbito da administração regional: 8, quanto à Região Autónoma da Madeira, e !. referente à Região Autónoma dos Açores.

12 — Igualmente no que concerne às características sócio-profissionais dos autores das queixas recebidas em 1982 se encontra uma notável regularidade, em confronto com os dados de anos anteriores.

Assim, a grande maioria das queixas continua a provir de trabalhadores por conte de outrem (1010 — 39,5 %), com especial relevo para os que prestam serviço à administração central (659 — 25,7 %).

Seguem-se os aposentados e reformados (257 — 10%), os desempregados ou sem profissão (167 — 6,5%) e os reclusos (115 — 4,5%).

Anote-se ainda o sempre relevante número de queixas oriundas de associações sindicais (137) e, em contraposição, o reduzido montante das enviadas por associações profissionais (11), comissões de trabalhadores (10) e comissões de moradores (2).

13 — Os distritos de que proveio o maior número de queixas foram, por ordem decrescente —e mantendo também a tendência constatada em anos anteriores —, os de Lisboa (966 — 37 %), Porto (459 — 17 %), Coimbra (151 — 5,8 %), Setúbal (147 — 5,7 %) e Braga (130 — 5 %). Dos distritos de Lisboa e Porto vieram, pois, mais de metade (54 %) das queixas recebidas.

Refiram-se os totais relativamente mocestos das queixas remetidas das regiões autónomas (Í2 dos Açores e 18 da Madeira) — inferiores aos de quase todos os distritos do continente.

E note-se, enfim, em confronto com o anc de 298!, um menor acervo de queixas vindas do estrangeiro (26).

14 — Tal como em anos passados, c número de queixas apresentadas por mulheres (7*3) quedou-se sensivelmente abaixo das enviadas por homens (1535) — aquelas representam, assim, 31 % das queixas formuladas por pessoas singulares.

15 — A maior parte das queixas foi directamente apresentada ou remetida ao Provedor.

De facto, através dos intermediários previstos no Estatuto do Provedor de Justiça apenas foram enviadas 8 queixas (7 através de deputados ou grupos parlamentares e 1 por intermédio do ministério público).

16 — Um apreciável quantitativo de queixas correspondia a interesses supra-individuais: 510 a interesses fie grupo e 52 a interesses da generalidade dos cidadãos.

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17 — Os dados sobre a duração dos processos concluídos em 1982 referem-se apenas aos iniciados após 1980, inclusive (pois em relação a anos anteriores este elemento não era apurado): por isso, o seu total é ligeiramente inferior ao total dos processos efectivamente terminados no ano em análise.

Feita esta observação prévia, registe-se que, desses processos, concluíram-se 24 % (761) no prazo de um mês, 61% (1671) dentro de um semestre e 83% (2269) no âmbito de um ano.

CAPITULO III

Processos relativos a questões de inconstitucionalidade

A) Principais processos relativos a questões de inconstitucionalidade, mas que não darem origem a pedidos dia declaração dessa vicio

1 — Subsidio ao papel e benefícios poetais à imprensa

Processo n.° 80/R-331-01-8

1 — Um advogado suscitou ao Provedor o problema da constitucionalidade de diversos despachos normativos governamentais que entre 1977 e 1979 estabeleceram regimes de subsídios ao papel e porte pago à imprensa.

2 — Sobre a questão apresentou o assessor encarregado do processo o seguinte parecer:

1 — Pretende o reclamante atacar, por via da declaração de inconstitucionalidade prevista no artigo 281.° da Constituição, um conjunto de despachos normativos e um despacho conjunto, agrupáveis em duas zonas diversas:

Por um lado, o regime de subsídio ao papel de que beneficiam certas publicações periódicas;

Por outro, os benefícios de natureza postal de que certas publicações periódicas usufruem.

2 — Os fundamentos legais do reclamante são os mesmos que a Comissão Constitucional utilizou no seu parecer n.° 26/77, ao pronunciar-se no sentido da inconstitucionalidade do decreto registado na Presidência do Conselho de Ministros sob o n.° 1394/77, diploma que atribuía às empresas editoras de publicações periódicas um subsídio de 20 % do custo do papel utilizado.

3 — Entendeu a Comissão que o decreto erm causa estava viciado de inconstitucionalidade orgânica, por violação da competência reservada da Assembleia da República —artigos 167.°, alínea c), e 38.°, n.° 7— e ainda de inconstitucionalidade material por ofensa dos artigos 37.° e 38.° da Constituição, designadamente dos n.°* 2 do artigo 37.° e 5 do artigo 38.°

4 — Afirmava então a Comissão, a propósito da inconstitucionalidade material:

Ê que um sistema democrático de imprensa deve assegurar aos jornais o fornecimento do papel de que eles necessitam e deve ainda permitir que todos eles, independen-

temente da sua tiragem e da sua sede, sejam fornecidos em iguais condições, com as mesmas possibilidades de compra e aos mesmos preços. [...]

Na realidade, as várias publicações passam a ter tratamentos diferentes — enquanto umas são auxiliadas através da concessão do subsídio, outras vêem-se sem ele. Está-se, assim, a afectar, se não de modo directo, pelo menos indirectamente, a liberdade de imprensa.

Por outras palavras, podemos dizer que se está a fazer verdadeira censura, uma censura económica, traduzida na maior facilidade de aquisição de papel por parte das empresas subsidiadas.

5 — No que se refere à inconstitucionalidade orgânica, os dois conjuntos de despachos parecem sofrer do mesmo vício do decreto que a Comissão Constitucional considerou preventivamente inconstitucional: violação da competência reservada da Assembleia da República — artigos 167.°, alínea c), e 38.°, n.° 7, da Constituição.

Claro que, siruando-nos agora no domínio da fiscalização sucessiva de inconstitucionalidade — artigo 281.° —, e já não da fiscalização preventiva — artigo 277.°—, a eventual inconstitucionalidade terá de ser ponderada norma por norma.

6 — Acontece, porém, que a doutrina do parecer n.° 26/77 não me parece razoável (releve--se-me a presunção de pretender pôr em causa doutrina que mereceu a aprovação unânime dos eminentes juristas que compõem a Comissão Constitucional).

7 — Se lermos atentamente o conjunto dos despachos impugnados pelo reclamante, veremos que eles, quer os que contemplam o subsídio de papel, quer os que incluem benefícios de índole postal, têm uma formulação positiva: não pretendem dificultar directamente a vida a certas publicações, mas facilitar a vida a outras.

8 — Ora, no que concerne ao subsídio de papel, se pensarmos que o preço do papel resulta do mercado, não vemos o que comportará de censura económica auxiliar algumas publicações e não auxiliar outras. Poderá, porventura, verificar-se violação do artigo 13.° da Constituição se a diferença de tratamento, por falta de justificação, assumir natureza discriminatória.

A meu ver, a doutrina do parecer conduziria a que o Estado se visse impossibilitado de auxiliar aquelas publicações que considera merecerem o seu apoio, quer pela sua ampla divulgação, quer pela qualidade e objectividade, quer por qualquer outro critério razoável. Alternativamente, ver-se--ia forçado a subsidiar todas as publicações periódicas.

9 — Estou em crer que apenas se poderia falar de censura económica se, por exemplo, o preço do papel fosse um preço «político» ou se o Estado detivesse o monopólio da sua produção e distribuição. Censura económica existiria se o Estado fixasse para o papel preços diversos, segundo a índole, a orientação, o âmbito de distri-

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buição ou o volume das edições, agravando os custos de umas publicações relativamente a outras.

10 — Mas não parece que tal aconteça: os direitos garantidos pelos n.os 1 do artigo 37.° e 2 e 3 do artigo 38.° pressupõem o livre acesso aos mercados de trabalho e de matérias-primas, não podendo o Estado adoptar medidas negativas — aumento do preço do papel, aumento dos impostos, elevação das taxas de juro nas operações de crédito— que dificultem tal acesso.

11—E o mesmo se dirá, mutatis mutandis, dos benefícios de natureza postal, o chamado «porte pago»: também aqui se não trata de agravar as condições de circulação e distribuição de algumas publicações (agravando-Ihes as taxas postais, por exemplo), mas sim de auxiliar a circulação e distribuião de outras, dimfnuindo-lhes tais taxas ou mesmo isentado-as delas.

12 — E se, por um lado, não considerarmos que os despachos em causa infringem o n.° 2 do artigo 37.° da Constituição, também temos as maiores dúvidas de que os regimes em causa ofendam o n.° 5 do artigo 38.° Se recuarmos ao tempo dos trabalhos da Assembleia Constituinte e relermos a discussão havida à volta da expressão «regime administrativo ou fiscal», em particular a intervenção do deputado Marcelo Rebelo de Sousa, nada encontraremos que permita concluir ter sido intenção dos constituintes obstar a sistemas como o do subsídio de papel ou do porte pago. Sem dúvida que foi intenção dos deputados impedir, por exemplo:

O agravamento dos impostos ou as isenções fiscais apenas para algumas empresas jornalísticas;

A bonificação dos juros para os créditos concedidos apenas a algumas empresas jornalísticas;

A concessão de créditos para aquisição de papel ou maquinaria no estrangeiro em condições diversas para as diversas empresas;

O estabelecimento de regimes de condicionamento de laboração diversos para os parques tipográficos das várias empresas jornalísticas — regulamento anexo ao Decreto n.° 46 924, de 28 de Março de 1966, artigo 11.° e tabela anexa, classe 28, esta alterada pela Portaria n.° 24 233, de 4 de Agosto de 1969— quando tal diversidade não resulta exclusivamente das diferenças de dimensão ou complexidade daqueles parques.

13 — Não me parece que o subsídio ao papel ou o porte pago constituam um regime administrativo, em termos de se poder considerar ofendido o n.° 5 do artigo 38.° Quando um cidadão, ou grupo de cidadãos, pretende exercer os direitos reconhecidos pelo n.° 3 do artigo 38.°, por exemplo, o mais que pode exigir do Estado é que este não dificulte o empreendimento com exigências ou limitações que não resultem directamente do funcionamento dos mercados ou das próprias leis. Não pode exigir o auxílio do Estado, não tem um direito subjectivo a ser bene-

ficiado. Terá, sim, o direito de ser beneficiado em igualdade de circunstâncias com os outros cidadãos que exerçam os mesmos direitos, ou seja, não ser discriminado (artigo 13.°). Mas não discriminar é «tratar por igual aquilo que é essencialmente igual» (v. nota ni ao artigo 13.°, Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira, Coimbra, 1978, p. 68). E é manifesto que editar o Diário de Notícias não é essencialmente igual a editar a Crónica Feminina e editar o Diário de Coimbra não é o mesmo que publicar o jornal O Sporting.

14 — Aliás, uma brevíssima e limitadíssima incursão no direito comparado mostra-nos que em França, por exemplo, o «carácter de interesse geral quanto à difusão do pensamento» vai condicionar os auxílios fiscal e postal (v. Libertes publiques, de Claude-AIbert Colliard, Dalloz, Paris, 1975, pp. 497 a 499). É verdade que não encontramos na Constituição da V República de 1958 normas análogas às dos nossos artigos 37.°, n.° 2, e 38.°, n.° 5, mas, ainda assim, não deixa de ter interesse a referência.

15 — Em conclusão:

a) Sem embargo de alguns aspectos dos des-

pachos em causa poderem consubstanciar violação do artigo 13.° da Constituição e, por isso, serem materialmente inconstitucionais, não consideramos que infrinjam globalmente os artigos 37." e 38.° da lei fundamental;

b) Os sete despachos em causa infringem o

disposto nos artigos 167.°, alínea c), e 38.°, n.° 7, da Constituição, estando viciados de inconstitucionalidade orgânica;

c) É quanto basta para propormos ao Sr. Pro-

vedor de Justiça que exerça a competência que lhe reconhece o artigo 281.° da Constituição, solicitando ao Conselho da Revolução que aprecie e declare a inconstitucionalidade das normas dos despachos juntos ao processo que ofendam a competência reservada da Assembleia da República.

3 — O Provedor concordou com esta argumentação.

Contudo, tendo em vista não criar graves dificuldades económicas à imprensa —e considerando estar-se perante inconstitucionalidade orgânica, e não material —, preferiu começar por expor ao Primeiro-Mi-nistro em Fevereiro de 1982 essa sua posição, sugerindo que os subsídios e demais benefícios em causa passassem a ser regulados por lei ou decreto-lei (mediante autorização legislativa).

4 — O Gabinete do Primeiro-Ministro respondeu que esta sugestão seria «tomada em consideração».

5 — Todavia, em 5 de Maio de 1982 foram publicados os Despachos Normativos n.os 69/82 e 70/82, regulando para esse ano a atribuição de subsídios ao papel e porte pago à imprensa.

O Provedor entendeu, por isso, manifestar a sua estranheza ao Primeiro-Ministro por, afinal, não ter sido tomada em consideração a sugestão que fizera, solicitando-lhe ainda que esclarecesse a sua posição sobre o assunto.

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6— Em 1 de Outubro de 1982 o Gabinete do Primeiro-Ministro informou que este entendia que os despachos normativos em questão «são, por si, esclarecedores sobre a posição do Governo relativamente à questão da competência e da forma jurídica no que se refere à regulamentação da atribuição dos benefícios à imprensa de porte pago».

7 — Tendo em conta que eventual pedido de declaração de inconstitucionalidade destes despachos normativos de 1982 já não seria eficaz, por não ser de esperar decisão sobre ele antes do fim do ano, o Provedor decidiu não o formular, exprimindo, contudo, neste relatório à Assembleia da República a sua discordância pelo modo como o Governo desatendeu a sugestão que fizera.

2— UcencGCrcteroBo tís fermáctas Processo n.° 81/R-2542-DI-3Í

Uma cidadã pediu a intervenção do Provedor no sentido da declaração de inconstitucionalidade das regras da Portaria n.° 413/73, de 9 de Junho (e diplomas conexos), que condicionam o licenciamento de farmácias em função de certos critérios de densidade populacional.

O Provedor não concordou com essa posição, com base nas razões seguintes:

Com efeito, em primeiro lugar, o artigo 51.°, n.° 3, da Constituição nada tem com a livre iniciativa económica privada constitucionalmente estabelecida e que as restrições legalmente impostas para a abertura de farmácias violariam. A iniciativa privada é regulada, não no artigo 51.°, n.n 3, da Constituição, mas no seu artigo 85.°

Por outro lado, a indústria farmacêutica é regulada pela Lei n." 2125, de 20 de Março de 1965, sendo a abertura de farmácias, ou a sua transferência, reguladas pelo Decreto-Lei n.° 48 547, de 27 de Agosto de 1968, e, posteriormente, pelas Poratrias n.05 413/73, de 9 de junho. 634/77, de 4 de Outubro, e 256/81, de 10 de Março.

Ê certo que o artigo 85.° da Constituição da República estabelece no seu n.° í que «nos quadros definidos pela Constituição, pela lei e pelo Plano, pode exercer-se livremente a iniciativa económica privada enquanto instrumento do progresso colectivo».

Porém, logo na base i da Lei n.° 2125 se estabelece que «é considerada de interesse público, como actividade sanitária, a função de preparar, conservar e distribuir medicamentos ao público», e na Portaria n.° 256/81, de 10 de Março, pode ler-se, por sua vez:

A base ; da Lei n.° 2125, de 20 de Março de 1965, considera de interesse público, como actividade sanitária, a função de preparar, conservar e distribuir medicamentos ao público. De harmonia com este princípio, a actividade das farmácias de venda ao público, conquanto se mova na esfera da iniciativa privada, está sujeita a regulamentação especial, tendo em vista o interesse da saúde pública em causa.

ê este interesse de saúde pública em causa que sobreleva em relação ao livre exercício da iniciativa económica privada, estabelecido, em geral, no artigo 85.°,

n." 1, da Constituição. Por isso se compreende a existência de regras especiais e restritivas para a iniciativa privada a respeito da abertura ou transferência de farmácias, sancionada constitucionalmente pela norma da alínea e) do n.u 3 do artigo 64.ü da Constituição.

3 —Não aplicação do regime de congelamento de rendas às casas de renda limitada

Processo n.° 81/R-2548-0I-32

Um grupo de arrendatários de casas de renda limitada sustentou perante o Provedor a inconstitucionalidade do artigo 27.° do Decreto-Lei n.° 445/74, de 12 de Setembro.

O Provedor, porém, não aceitou essa posição, com base no seguinte parecer do assessor encarregado do processo:

! — Na presente reclamação solicita-se que seja declarada, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do artigo 27.° do Decreto-Lei n.° 445/74, de 12 de Setembro, disposição que a seguir se transcreve:

Art. 27° Este diploma [Decreto-Lei n.° 445/74] não se aplica aos fogos sujeitos ao regime de renda limitada, bem como a outros regimes especiais definidos com objectivos sociais.

O diploma citado trata, fundamentalmente, das seguintes ordens de questões:

Suspensão para todo o País das avaliações fiscais para efeitos de actualização de rendas de prédios destinados a habitação (ta! suspensão já se verificava nas cidades de Lisboa e Porto desde a publicação da lei preambular que aprovou o Código Civil);

Condicionamento de demolição de fogos;

Obrigação de pôr à disposição, para arrendamento, as casas devolutas e as que vagarem, desde que as mesmas se não destinem à venda;

Fixação livre de rendas no caso de primeiros arrendamentos e fixação condicionada (aumentos percentuais) de rendas referentes a fogos que tenham estado anteriormente arrendados para habitação.

2 — Na presente reclamação, o problema de facto que se coloca é o seguinte:

A direcção do Cofre de Previdência da Polícia de Segurança Pública aumentou para 1000$ e 1250$, com início zm 1 de Janeiro de 1981, as rendas mensais relativas às habitações ocupadas pelos reclamantes nos bairros da Polícia de Segurança Pública do Porto, duodécimos mensais esses que eram de 255$.

Portanto, o que se passou não foi a fixação de rendas em primeiros arrendamentos, mas o aumento de rendas na constância dos respectivos arrendamentos.

3 — Ora, nos termos da lei gerai, o aumento das rendas dos prédios de habitação na constância dos respectivos arrendamentos era possível mediante a respectiva avaliação fiscal.

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Com efeito, o n.° 1 do artigo 1104.° do Código Civil vigente, a exemplo do que fora antes estabelecido nos artigos 47.° a 50.° da Lei n.° 2030, de 22 de Junho de 1948, estipula, como regra geral, o princípio da correspondencia entre a renda e o rendimento ilíquido constante da matriz, ao preceituar que «qualquer que seja a renda fixada no contrato, o senhorio tem o direito de exigir do arrendatário, decorridos 5 anos e não obstante cláusula em contrário, uma renda mensal correspondente ao duodécimo do rendimento ilíquido inscrito na matriz».

Para tanto, o artigo 1105.° do mesmo Código (v. artigos 47.°, n.° 2, 49.° e 50.° da Lei n.° 2030) concedia ao senhorio o direito de requerer a avaliação fiscal do prédio, destinada a corrigir o rendimento ilíquido inscrito na matriz, decorridos que fossem 5 anos sobre a avaliação anterior ou sobre a fixação ou a alteração contratual da renda.

Tal regime, porém, era inaplicável, desde a entrada em vigor da Lei n.° 2030 (artigos 48.° e 50.°) aos arrendamentos para habitação em Lisboa e Porto (artigo 10." da lei preambular que aprovou o Código Civil), cujas rendas se mantinham inalteráveis, qualquer que fosse a duração do contrato.

3.1 —Mais recentemente, o referido Decreto-Lei n.° 445/74 mandou estender a todo o País a suspensão das aludidas avaliações para efeitos de tal actualização de rendas.

Esse diploma nada mais estabeleceu quanto ao aumento das rendas na constância dos arrendamentos. O congelamento destas estabelecido no mesmo foi, assim, efectuado por via indirecta, através da suspensão das respectivas avaliações fiscais.

3.2 — Ora, o artigo 27.° do Decreto-Lei n.° 445/ 74, cuja apreciação é pedida com vista à declaração de inconstitucionalidade, determina que o referido diploma não se aplica aos fogos de renda limitada, bem como a outros regimes especiais definidos com objectivos sociais.

Assim, tendo-se concluído que o que aquele diploma estabelece é a suspensão das avaliações fiscais para efeitos de actualização de rendas, suspensão que à data da publicação do mesmo diploma já estava em vigor para as cidades de Lisboa e Porto, e dado que quanto a avaliações fiscais, nenhumas são, nem eram, efectuadas relativamente às habitações a que se refere a presente reclamação, não se vê que exista correspondência directa entre o disposto no mesmo diploma e o artigo 27.° citado, no tocante aos aumentos das rendas em causa.

Com efeito, os aumentos das rendas das casas dos funcionários da Polícia de Segurança Pública processam-se, não mediante avaliação fiscal, mas conforme o estabelecido no artigo 25.° do Regulamento aprovado pela Portaria n.° 20 696, de 25 de Julho de 1964, que se transcreve:

Art. 25.° A actualização das rendas é permitida:

a) Quando se registe variação apreciável do custo de construção ou do custo de vida;

b) Quando se verifique sensível melhoria na situação económica do agregado familiar do inquilino.

§ 1.° As rendas não poderão ser modificadas antes de decorridos 5 anos sobre o início do arrendamento ou da actualização [...]

§ 2.° no caso previsto na alínea a) deste artigo, o critério a seguir fundamentar-se-á nos índices publicados pelo INE e atenderá também à situação económica do agregado familiar.

§ 3.° Quando os Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública pretendam exercer o direito previsto neste artigo, devem avisar o arrendatário por carta registada com aviso de recepção pelo menos com 90 dias de antecedência da entrada em vigor da nova renda.

Se o arrendatário não quiser sujeitar-se ao aumento, deve entregar a casa despejada na data referida [...]

4 — Em face do que antecede, conclui-se que o aumento das rendas nas cidades de Lisboa e Porto dos prédios de habitação em geral já estava proibido muito antes da publicação do Decreto--Lei n.* 445/74, proibição esta indirecta, na medida em que o que havia sido determinado fora a suspensão das avaliações fiscais para efeitos de tal aumento, e sem aquelas este não era possível. E o Decreto-Lei n.° 445/74 veio estender a todo o País a suspensão das referidas avaliações.

Pretende-se na presente reclamação que o disposto no Decreto-Lei n.° 445/74 se deva estender a todos os casos de arrendamento, inclusivamente aos regimes de renda limitada e de arrendamento de casas de serviços sociais, dado que outra coisa não estabelece o mesmo decreto-lei.

Mas, conforme se verificou, a suspensão da avaliação fiscal nos casos em apreciação não tem qualquer significado, porquanto o aumento das rendas nestes casos especiais não depende de tal avaliação, mas de outros factores, como se viu.

E não admira que assim seja, porque o regime de arrendamento destas casas é especial, e a situação dos respectivos arrendatários face ao arrendamento e às próprias casas é também especial.

Se não, vejamos:

Nos termos expressos da Portaria n.° 20 696, atrás citada:

a) A atribuição das referidas casas da Polícia

de Segurança Pública é feita por concurso, só podendo concorrer os beneficiários dos Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública que não tenham casa própria ou por conta do Estado e que se encontrem colocados no comando em cuja área se situem as habitações;

b) Os concursos são anunciados no Diário da

República, sendo publicada no Diário da República a lista dos candidatos admitidos para atribuição das casas e dos classificados após tal atribuição;

c) Os concorrentes devem ser chefes de fa-

mília;

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d) A respectiva renda mensal não excederá ura terço do rendimento do agregado familiar;

c) O regime de contrato de arrendamento é especial, sendo especial a respectiva rescisão (por exemplo, o inquilino que perder a qualidade de beneficiário dos Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública perde o direito à casa);

/) O direito ao arrendamento, seja qual for o regime matrimonial, não se comunica ao cônjuge do arrendatário e caduca por sua morte.

5 — Tendo-se, assim, concluído que quer a atribuição das casas de renda económica da Polícia de Segurança Pública, quer o arrendamento e rescisão dos respectivos contratos, estão sujeitos a regime especial, sendo somente nos casos omissos que há que recorrer à lei geral do inquilinato, parece não poder submeter-se aquele regime ao regime geral das rendas de casa, mormente na parte respeitante ao aumento das mesmas, até porque neste aspecto particular existe lei especial que regula expressamente tal aumento e a forma como ele se processa.

Assim, a ressalva contida no artigo 27.° do De-creto-Lei n.° 445/74, relativa aos aspectos constantes do diploma não serem aplicáveis às casas de renda limitada ou económica, parece perfeitamente adequada.

Mas, mesmo que tal não tivesse ficado expressamente ressalvado no citado artigo 27.°, verifica-se que no preâmbulo do mesmo decreto-lei se salienta que tal diploma visa suster o processo de alta especulativa na oferta de habitações, actuando no mercado livre da habitação, sendo, portanto, este o seu âmbito e não outro.

E noutro passo ainda do aludido preâmbulo pode ler-se o seguinte:

A próxima legislação e os programas de acção do Governo devem atacar outros aspectos do problema da habitação, como sejam:

Regulamentação do regime de renda limitada;

Construção directa de novos conjuntos habitacionais pelas entidades oficiais;

medidas estas que se consideram de grande importância no programa de acção social do Governo.

Conclui-se, pois, que o regime legal das rendas em apreço não foi afectado pelo diploma publicado, dado que expressamente se delimitou neste o seu campo de aplicação, quer no preâmbulo, quer no articulado (artigo 27.°).

6 — Resta averiguar se a exclusão da aplicação do mesmo diploma a tal regime especial será inconstitucional, como vem defendido na presente reclamação.

O principal fundamento em que se baseia a reclamação é precisamente a desigualdade perante a lei entre os inquilinos das casas cujo arrenda-

mento é regulado pela lei geral e os inquilinos das casas de renda limitada ou económica, desigualdade que, tal como se contém na reclamação, seria inconstitucional face ao preceituado no artigo 13.° da lei fundamental.

Relativamente à citada disposição, não pode deixar de se referir a interpretação que tem sido defendida quer na Assembleia da República, quer na Procuradoria-Geral da República.

Assim, lê-se num dos pareceres emitidos por aquele corpo consultivo sobre a matéria (parecer publicado no Diário da República, de 10 de Abril de 1980) o seguinte:

No campo da igualdade e da não discriminação releva na nossa lei fundamental o seu artigo 13.°, que assim foi redigido:

1 — Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.

2 — Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social.

Na interpretação do princípio em causa, a doutrina deste corpo consultivo pode considerar-se condensada nas seguintes passagens do seu parecer n." 12/78, votado na sessão de 2 de Março:

[...] O princípio de igualdade, já solenemente proclamado na Declaracção dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, deve ser entendido sob dois ângulos ou planos: o da criação do direito e o da aplicação do direito. Sob este último plano, a igualdade perante a lei significa que na aplicação do direito não há lugar para operar discriminação em função das pessoas; todos beneficiam por forma idêntica dos direitos que a lei estabelece, todos por forma idêntica se acham sujeitos aos deveres que ela impõe.

Na primeira acepção, o princípio da igualdade dirige-se directamente ao órgão legife-rante, vinculando-o.

A igualdade perante a lei reclama agora, não que todos sejam tratados, em qualquer circunstância, por forma idêntica, mas sim que recebam tratamento semelhante.

Com isto se abre, porém, a questão de saber o que deve entender-se por condições semelhantes.

A semelhança nas situações da vida nunca pode ser total: o que importa é distinguir quais os elementos de semelhança que têm de registar-se —para além dos inevitáveis elementos diferenciadores — para que duas situações devam dizer-se semelhantes em termos de merecerem o mesmo tratamento jurídico.

Só que a solução deste problema já não poderá achar-se na base de critérios puramente formais.

A resposta é, no entanto, facilitada quando o legislador se não limita a enunciar o princípio geral da igualdade, mas especifica os tf-

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rulos — ou alguns deles — que não podem fundar um tratamento diferenciado entre cidadãos.

Quando isto acontece, tem de entender-se, em princípio, que viola a regra constitucional da igualdade o princípio que dá relevância a um desses títulos para, em função dele, beneficiar ou prejudicar um grupo de cidadãos perante os restantes.

Ora, como é sabido, a Constituição de 1976. depois de ter consagrado no n.° 1 do seu artigo 13.° o princípio da igualdade perante a lei, enuncia no n.° 2 do mesmo artigo uma série de factores, em razão dos quais ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever.

Semelhante entendimento coincide com o que vem sendo atribuído ao princípio da igualdade, e, portanto, ao da não discriminação, pelos comentadores da nossa Constituição.

Assim, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira sustentam que o princípio da igualdade contém uma directiva essencial dirigida ao próprio legislador: tratar por igual aquilo que é essencialmente igual e desigualmente aquilo que é essencialmente desigual. A qualificação das várias situações como iguais ou desiguais depende do carácter idêntico ou distinto dos seus elementos essenciais. Do que se trata desde logo é de uma proibição de arbítrio legislativo, ou seja, de uma inequívoca falta objectiva de apoio material-constitucional para a diferenciação ou não diferenciação efectuada pela medida legislativa.

Porém, a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação do legislador, pois o legislador é fundamentalmente livre na determinação dos elementos de comparação que considera decisivos para operar a diferenciação, exigindo-se apenas que esses elementos possam servir de base a critérios de diferenciação objectivamente adequados à prossecução da finalidade proposta. A demonstração de que também outros critérios poderiam ter sido escolhidos para melhor se conseguir a finalidade tida em vista pelo legislador não é suficiente para se produzir uma violação do princípio da igualdade.

[...] e o legislador não está impedido de emanar leis especiais para determinados domínios quando existirem situações a exigirem e justificarem essas normas especiais.

Portanto, e em face do que ficou referido, poderá concluir-se que a não aplicação do Decreto-Lei n.° 445/74 aos arrendamentos das casas de renda limitada ou económica será inconstitucional?

Em primeiro lugar, importa ter presente que, na parte que interessa, o citado diploma apenas vem proibir as avaliações fiscais para efeitos de aumento de renda.

E, quanto às casas de renda limitada ou económica, não são efectuadas quaisquer avaliações fiscais para aqueles efeitos, até porque tais aumentos se processam por outra forma.

Assim, poder-se-ia desde logo concluir que não há nexo de causalidade entre o que o diploma dispõe e o aumento das rendas naqueles regimes especiais.

Todavia, poderá pretender-se ir mais longe e argumentar-se que, afinal, o que o Decreto-Lei n.u 445/74 tinha em vista era o congelamento das rendas em todo o País, não tendo a disposição que suspendeu a avaliação fiscal outro objectivo. A ser assim entendido, tal objectivo deveria ser aplicável também às casas de renda limitada ou económica, sob pena de se cair em discriminação de tipo inconstitucional.

Mas, neste caso, essa discriminação seria daquelas que o artigo 13.° da Constituição sanciona?

Ora, como ficou dito, só resulta ferido aquele princípio quando não exista uma razão objectiva para a discriminação ou quando resulte tratamento diferente para situações semelhantes.

Conforme se demonstrou no n.° 4, o regime de arrendamento geral e o regime especial das casas de habitação da Polícia de Segurança Pública não são semelhantes, sendo também significativamente diferente a posição dos arrendatários num e noutro regime.

Não admira, pois, que o legislador tivesse pretendido dar tratamento diferente ao que era diferente, o que fez até por forma expressa, quer no preâmbulo do diploma, quer no seu articulado.

E, assim, surgiram, posteriormente àquele diploma, vários outros tratando do regime de rendas limitadas ou de renda económica, nunca tendo sido quanto a estes levantado qualquer problema de inconstitucionalidade.

Eis alguns desses diplomas:

Decreto-Lei n.° 797/76, de 6 de Novembro (cria os serviços municipais de habitação social e insere disposições sobre casas económicas, casas para famílias pobres, casas de renda económica e casas de renda limitada);

Decreto-Lei n.° 518/77, de 15 de Dezembro (estabelece que a competência conferida no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 683/73, quanto à fixação e actualizações das rendas das casas de renda limitada, passe a ser exercida nos concelhos onde tenham sido criados os serviços municipais de habitação social);

Portaria n.° 478/80, de 5 de Agosto (pauta os princípios pelos quais, nos termos do Decreto-Lei n.° 518/77, as câmaras municipais fixarão as rendas das casas de renda limitada).

Continuam, pois, a existir regimes especiais relativamente a certas casas de habitação, ocorrendo notar que a existência das mesmas e a sua atribuição apenas a alguns beneficiados também poderia ser tomada como ofensa ao princípio da igualdade, na medida em que, se nada mais fosse tido em conta, tomando-se apenas à letra o con-

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tido no referido preceito da Constituição, tal atribuição constituiria um privilégio, aspecto que, evidentemente, também ninguém levantou ou levantará, pelo menos os beneficiados.

7 — Antes de terminar, parece que não seria despiciendo fazer uma referência à razoabilidade ou não dos aumentos verificados nas rendas das casas da Polícia de Segurança Pública, a que respeita a presente reclamação.

Com efeito, tais rendas estavam fixadas em 255$ por mês, presumindo-se que tivessem sido fixadas aquando da sua construção (em 1959). Pelo menos, se a fixação tivesse sido recente, a reclamação não deixaria de o salientar.

Nos termos do regulamento respectivo, o valor da fixação estava pautado, no máximo, pelo terço do rendimento do agregado familiar. Agora, com o aumento verificado para 1000$ e 1250$ mensais, as rendas estão muitíssimo abaixo daquele limite (repare-se que as casas estão distribuídas aos funcionários que estão no activo, e não a reformados), sendo, presentemente, face à inflação verificada nos últimos 20 anos, de quantitativo relativamente mais baixo do que aquando da sua fixação, pelo que não se pode afirmar que o aumento tivesse saído fora do razoável, mesmo considerando que se trata de casas de renda económica.

8 — Julga-se, em face do que fica informado, não haver lugar à intervenção do Provedor de Justiça relativamente à questão posta, dado não se verificar a alegada inconstitucionalidade material da disposição em causa, não se verificando também inconstitucionalidade formal da mesma.

Tão-pouco há que apontar qualquer aspecto de ilegalidade.

Ainda no que respeita à razoabilidade ou não do aumento havido ou à entidade que o determinou, nenhum reparo há a fazer.

4 —Crimes militares. Peculato Processo n.° 82/R-23-DI-2

Um militar da Armada, réu em processo pendente no Tribunal de Marinha, solicitou ao Provedor que tomasse a iniciativa de suscitar a declaração de inconstitucionalidade do artigo 193.° do Código de Justiça Militar. Entendia, com efeito, que nesse preceito se não consagrava senão o crime de peculato previsto, em geral, no Código Penal, e que a sua apreciação em processo regulado pelo Código de Justiça Militar cerceava ao réu meios de defesa de que poderia dispor no foro comum.

O Provedor não concordou, contudo, com este ponto de vista, por considerar que:

O crime regulado no artigo 193.° do Código de Justiça Militar difere do que está previsto no artigo 313.° do Código Penal nos seguintes aspectos:

Encontrar-se o seu autor integrado ou ao serviço

das Forças Armadas; Ser praticado em razão de funções militares, quer

permanentes, quer acidentais.

Perante este quadro, impõe-se determinar se o regime daquele artigo 193.° pode ser considerado como versando matéria militar, pois só nesta hipótese a sua inclusão no Código de Justiça Militar estaria de harmonia com o artigo 148.° da Constituição, segundo o qual compete ao Conselho da Revolução fazer leis e regulamentos sobre a organização, o funcionamento e a disciplina das Forças Armadas.

Consistindo o crime regulado naquele artigo 193." um desvio das suas legais aplicações de dinheiro, valores ou objectos que os militares detêm em razão das suas funções militares, não há dúvida de que ele consubstancia uma infracção a um dever de disciplina militar, mais concretamente ao dever de zelo [veja Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol. li, p. 743, e Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, artigo 25.°, n.° 4, alínea d)].

Pelo que respeita à circunstância de o crime em causa ser julgado nos tribunais militares, também ela não viola o artigo 218.° da Constituição, uma vez que se trata de ura crime «essencialmente militar», expressão esta consagrada nesse preceito constitucional.

Com efeito, compulsando o Diário da Assembleia Constituinte, n.° 98, de 19 de Dezembro de 1975, p. 3183, verifica-se que com tal expressão se pretendeu afastar o critério então adoptado no Código de Justiça Militar, de harmonia com o qua! estavam subordinados ao foro militar todos os militares só pelo facto de o serem e fosse qual fosse a natureza do delito cometido.

Visou-se, assim, colocar a jurisdição militar no plano do foro material, abandonando o critério do foro pessoal, até então seguido.

Ora, sendo o crime previsto no artigo 193.° do Código de Justiça Militar de natureza militar, como atrás se demonstrou, tem necessariamente de se concluir que o facto de ele ser julgado nos tribunais militares não ofende o artigo 218.° da Constituição.

5 — Carreiras dos orientadores e educadores dos serviços prisionais.

Processo n.° 82/R-982-OI-16

Vários orientadores e educadores dos serviços prisionais vieram sustentar, junto do Provedor, a inconstitucionalidade das normas reguladoras das respectivas carreiras, na medida em que estabelecem para eles remunerações inferiores às correspondentes aos técnicos de educação e de serviço social dos mesmos estabelecimentos, os quais, em seu entender, desempenhariam funções idênticas às deles, reclamantes.

0 Provedor, no entanto, não acolheu esta opinião, por entender que:

1 — Através da análise do Decreto-Lei n.° 268/81, de 16 de Setembro, designadamente dos artigos 53.°, 54.° e 92.°, não se alcança fundamento bastante para classificar tal legislação como inconstitucional.

Com efeito, conforme se discrimina nos citados artigos 53.° e 54.°, há actividades nos serviços prisionais que parece exigirem maior e mais aprofundada preparação para o seu exercício (actividades de estudo, organização, promoção, dinamização, planeamento e prestação de pareceres), que se afiguram adequadas a habilitações de quem possua curso superior, enquanto

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relativamente a outras (de colaboração, acompanhamento, apoio, etc.) se supõe não serem necessárias tais habilitações.

Por outro lado, importa salientar o modo como podem ser exercidas as referidas actividades e sobretudo a qualidade do trabalho produzido, mesmo que sejam idênticas as funções desempenhadas, não podendo deixar de se entender que valerá mais o trabalho dos mais habilitados, devendo, pois, corresponder-lhe adequada valoração na remuneração.

2 — Põe-se, todavia, a hipótese de, na prática, o desempenho das funções dos educadores e orientadores sociais não estar adequadamente enquadrado, desempenhando os mesmos funções mais empoladas do que as devidas, assim como poderá acontecer que os técnicos estejam a ser subaproveitados no seu trabalho; mas tais factos, a existirem, não resultam, de modo algum, de inconstitucionalidade da lei, mas meramente da organização interna dos serviços e ou da forma como os mesmos se processaram, não cabendo ao Proveder de Justiça entrar nessa apreciação ou fazer qualquer crítica.

6 — Regime da função pública. Participação dos trabalhadores. Excedentes.

Processo n.° 82/R-l 139-DI-19

Uma federação de sindicatos representativos de trabalhadores da função pública pôs em causa, perante o Provedor, a constitucionalidade dos Decretos-Leis n.os 163/82 a 171/82, todos de 10 de Maio, e relativos a diversos aspectos do regime da função pública.

Do parecer da assessora encarregada do processo transcrevem-se, seguidamente, os passos principais:

I

Vem a Federação [...], em exposição datada de 18 de Maio de 1982, solicitar ao Provedor de Justiça que por ele seja pedida a declaração de inconstitucionalidade do conjunto de diplomas referentes à função pública publicados no Diário da República, 1.a série, n.° 107, de 10 de Maio, e que correspondem aos decretos-leis numerados de 163/82 a 171/82.

1 — Como questão prévia, é colocado o problema da inconstitucionalidade material do n.° 1 do artigo 60.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, correspondente à autorização concedida pela Assembleia da República ao Governo para legislar sobre a implementação de uma política de emprego na função pública e uma adequada gestão dos seus recursos humanos, em particular o pleno aproveitamento dos excedentes e a sua efectiva mobilidade.

Por falta de definição precisa do objecto, teria havido uma clara ofensa ao espírito do artigo 168." da Constituição da República Portuguesa.

2 — Mas, admitindo mesmo que se não perfilhe a tese da inconstitucionalidade (continua a entidade reclamante), teria sido iludido o sentido da própria autorização legislativa, já que o programa do Governo apontava «sem tibiezas

para o combate ao desemprego e para a plena integração dos excedentes» e, por outro lado, estaria subjacente à concessão da autorização legislativa «a inteligência de que a Constituição seria respeitada na execução do referido programa».

Assim, conclui a Federação que o alcance da autorização, no cumprimento dos artigos 51.°, n.° 1, e 52.°, alíneas a) e b), da Constituição da República Portuguesa e do próprio programa do Governo, só pode ter o sentido de integrar excedentes, e não de os criar.

Por este raciocínio, o Decreto-Lei n.° 167/82, de 10 de Maio, estaria (no menos) ferido de inconstitucionalidade orgânica.

3 — Por outro lado, é posta em causa a constitucionalidade formal de todos os diplomas, por terem sido elaborados sem uma verdadeira participação dos trabalhadores representados pelas organizações sindicais, visto que o Governo se teria limitado a ouvir os sindicatos, sem ter dado qualquer satisfação às suas pretensões e nem (pelo menos) ter contraditado as suas críticas.

4 — Finalmente, pôr-se-ia em causa a constitucionalidade, por omissão, dos Decretos-Leis n.M 165/82, 167/82 e 171/82, na medida em que não implementariam (como a Constituição da República Portuguesa prevê) qualquer política de emprego, nem dariam cumprimento aos preceitos constitucionais que consagram o direito ao trabalho.

Além disso, não se dá cumprimento também ao dever de trabalhar, contrapartida do direito ao trabalho expressamente imposta; quando se prevê a possibilidade de os trabalhadores dos quadros excedentários serem pagos sem uma necessária contrapartida de serviço, haveria mesmo uma violação do n.° 2 do artigo 51." da Constituição da República Portuguesa.

0 Estado, sendo obrigado a tomar medidas que garantam o trabalho, teria igualmente de impor o dever de trabalhar como corolário da execução das políticas do pleno emprego e da estabilidade no trabalho, previstas nas alíneas a) e b) do artigo 52.° da Constituição da República Portuguesa.

5 — Nesta óptica, por preceitos concretos ou por processos de intenção, todos os diplomas são globalmente contestados como ofensivos da Constituição por omissão de normas, ou por incompetência do órgão legislador, ou por expressa ofensa ao conteúdo de preceitos constitucionais.

II

1 — Cabendo-nos apreciar a pretensão acima enunciada, começaremos pela questão prévia, ou seja, pela inconstitucionalidade material do n.° 1 do artigo 60.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, a qual, segundo os reclamantes, ofenderia, «se não a letra, claramente o espírito do artigo 168.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa, por falta de definição do objecto e da extensão da autorização legislativa concedida ao Governo».

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Determina o n.° 1 do artigo 60° da Lei n.° 40/ 81:

Fica o Governo autorizado a publicar as medidas legais necessárias à implementação de uma política de emprego da função pública e a uma adequada gestão dos seus recursos humanos, em particular o pleno aproveitamento dos excedentes e a sua efectiva mobilidade.

O conteúdo (exacto) deste preceito e, consequentemente, os limites do seu alcance podem ser apreendidos sem dificuldade através das actas das reuniões da Assembleia da República publicadas no Diário respectivo, l.a série, de 15 a 19 de Dezembro de 1981, que correspondem à discussão das propostas de que resultaram leis correspondentes ao Orçamento Geral do Estado para 1982 e às grandes opções do Plano para igual período.

O assunto foi aflorado pelo Ministro das Finanças e do Plano e por alguns deputados em termos gerais (cf. pp. 920 a 1073), chegando o deputado Joaquim Miranda, do PCP, a afirmar que «os trabalhadores da função pública nada tinham a opor quanto à maior racionalização dos serviços públicos, mas haveria que pôr pertinentes perguntas a tais anúncios feitos a seco: que serviços vão acabar? Que critérios vão ser seguidos? Como vão ser seguidos tais critérios? [...]».

Oportunamente, a resposta foi dada pelo Ministro da Justiça e da Reforma Administrativa (cf. fls. 1257 e seguintes), em termos que se consideram satisfatórios para cabal cumprimento dos requisitos constitucionais postos em causa.

Com efeito, começou ele próprio por justificar a clarificação:

Pelo carácter necessariamente genérico deste artigo da proposta de lei, julgo que competirá ao Governo especificar um pouco o que julga fazer na execução desta autorização, que virá eventualmente a ser concedida (').

Passa, em seguida, a descrever as medidas já em preparação, tendentes à racionalização de estruturas de efectivos humanos e de serviços, definindo os parâmetros em que se contêm e os objectivos por elas visados, o último dos quais seria o descongestionamento da função pública através de pensões bonificadas, do abaixamento do limite de idade, da extinção de certos postos que forem vagando, da liberalização de licenças sem vencimento, etc.

No meio de protestos da oposição sobre alguns pontos da exposição, a ASDI congratulou-se com a verificação de que fora aceite o seu reparo no sentido de que «a proposta de autorização, ta!

(') Continuando, o Ministro afirmou:

Em primeiro lugar, e para que se não dramatize o problema da remuneração do funcionário público, devo salientar que o Govemo entende —como, aliás, foi acentuado no debate na generalidade pelo deputado Sousa Tavares— que importa sobretudo (e ao contrário do que foi afirmado há poucos minutos pelo deputado Nunes de Almeida) ter uma administração pública racionalizada e eficaz [...1 e, portanto, apta a desempenhar as tarefas que se propõe.

como fora anunciada, não tinha conteúdo e que o longo discurso do Ministro teria visado o objectivo de lhe conferir oralmente esse conteúdo».

Aplaudido pelo PS e pelo seu partido, o deputado Magalhães Mota reconhecia que a falta de conteúdo da proposta fora corrigida e o actual artigo 60.° da Lei n.° 40/81 foi aprovado por maioria.

Na medida em que ficou definido o conteúdo da norma de autorização e esta foi aprovada por maoria, não poderá já invocar-se a inconstitucionalidade material levantada pelos reclamantes com base na violação do preceito constitucional que determina que a Assembleia da República pode autorizar o Governo a fazer decretos-leis sobre matérias da sua exclusiva competência — é o caso do regime e âmbito da função pública, nos termos da alínea m) do artigo 167.°—, devendo definir o objecto e a extensão da autorização (cf. o artigo 168.°, n.° 1).

Não colherá, portanto, a inconstitucionalidade invocada, nem sequer a hipótese de que teria sido iludida a expectativa de que as medidas contidas na autorização legislativa teriam de se manter fiéis ao programa do Governo anteriormente aprovado, que visava «sem tibiezas o combate ao desemprego e a plena ocupação de excedentes».

A discordância da entidade reclamante é fundamentalmente de natureza política, e, sem perder legitimidade nesse ponto, não poderia o Provedor de Justiça apreciá-la, já que parece demonstrado que foram respeitados os limites da Constituição, e apenas nessa perspectiva tem de ser encarada a reclamação apresentada.

2 — Não parece colher igualmente o argumento de que o Decreto-Lei n.° 167/82 está ferido de inconstitucionalidade orgânica por extravasar os limites da autorização concedida, visto que se situa (como vimos) no âmbito da competência legislativa da Assembleia da República a matéria nele versada.

Diz a entidade reclamante que os artigos 51.°, n.° 1, e 52.°, alíneas a) e b), obrigariam o Govemo a promover a integração dos excedentes ainda existentes, não se consentindo a criação de novos excedentes, pelo que a Assembleia da República, ao conceder uma autorização legislativa, só o poderia ter feito «na inteligência de que a Constituição seria respeitada».

Ultrapassada a inconstitucionalidade da própria norma de autorização por falta de definição de conteúdo (inconstitucionalidade material), põe--se agora em dúvida não só a legitimidade do órgão legislador, mas ainda a ofensa global do diploma no que respeita ao direito ao trabalho e às garantias desse direito quanto à segurança social.

Antes de se apreciar este ponto, há que acrescentar que os preceitos constitucionais invocados prevêem expressamente o desemprego e a assistência aos desempregados e apenas proíbem (no que toca à segurança no emprego) os despedimentos sem justa causa e por motivos políticos ou ideológicos.

Tem, portanto, de ser posta em causa a forma incompleta de citação dos preceitos invocados e a consequente falta de exactidão, que afecta irre-

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dutivelmente a interpretação, trazida ao processo, dos textos constitucionais.

Com efeito, esses preceitos têm de ser apreciados no contexto geral dos princípios da Constituição e referenciados, sucessivamente, às garantias por ela dadas aos trabalhadores da função pública e aos trabalhadores em geral.

Obviamente, nem a letra nem o espírito dos preceitos constitucionais invocados são susceptíveis de criar, só por si, postos de trabalho ou de resolver milagrosamente situações de desemprego.

Por outro lado, é sabido que uma política de emprego planeada para um prazo médio ou longo poderá gerar, de imediato, situações de desemprego, sem que isso signifique falha na obtenção do objectivo final, isto é, o pleno emprego como meta ideal a atingir.

A lei (e a sua leitura) não pode desligar-se da realidade social concreta que visa disciplinar.

2.1—Ainda a propósito do Decreto-Lei n.° 167/82, foi levantado o problema de que não poderá existir direito ao trabalho sem o correspondente dever de trabalhar e que o Estado violaria o espírito constitucional ao remunerar o pessoal excedentário sem lhe garantir postos de trabalho e as tarefas inerentes.

A esta crítica se responderá com a previsão constitucional do próprio desemprego, competindo ao Estado, como entidade patronal, dar o exemplo no cumprimento das leis (2) a este respeito.

Assim, a situação do pessoal excedentário ou é de desemprego temporário —e a remuneração assume a natureza de subsídio especial— ou é de desemprego permanente, e configurar-se-á como um pagamento indemnizatório.

Não importa, no entanto, aprofundar este ponto, já que, a existir, a inconstitucionalidade invocada seria por omissão e estaria fora da intervenção do Provedor de Justiça qualquer iniciativa de pedir a sua declaração.

2.2 — A argumentação aduzida pela reclamante peca por ser simplista em demasia ou utópica em excesso.

A apreciação jurídica da proposta de lei conduziu-nos à conclusão de que a autorização legislativa abrangia a matéria do diploma dos excedentes (J), pelo que não será de invocar nem a sua inconstitucionalidade orgânica (4), nem a in-

O Cf. a alínea a) do artigo 52.° da Constituição.

O O Ministro da Reforma Administrativa referiu-se expres-samente à bolsa de emprego através da definição de um sistema de excedentes de pessoal e do seu estatuto remunerativo (cf. o I* suplemento ao Diário da Assembleia da República. de 19 de Dezembro de 1981, p. 1257).

(') Como já foi dito. o diploma parece conter-se no âmbito da autorização legislativa concedida ao Governo e integrada pela forma jé descrita, isto é, por explicação pormenorizada do Ministro da Reforma Administrativa através do artigo 60." da Lei n.° 40/81—respeitadas, portanto, as exigências da alínea b) do artigo 201." da Constituição, com referências à alínea m) do artigo 167.°

constitucionalidade material, já que esta não pode ser global, mas tem de referir-se a normas expressas.

3 — Outro problema apontado seria a incons-ittucionalidade formal de todos os diplomas, por falta de cumprimento dos requisitos constitucionalmente exigidos quanto à participação dos trabalhadores na elaboração da legislação de trabalho, nos termos dos artigos 56.°, alínea d), e 56.", alínea a), do diploma fundamental.

A falta dessa participação teria de entender-se como violadora de um dos seus direitos fundamentais (5).

Mas essa participação existiu, como se verá.

3.1 — Mesmo que o entendimento geral seja o de que estes preceitos, referidos à generalidade dos trabalhadores, também abrangem os da função pública, não pode negar-se que estes (e os da Administração em geral) são objecto de um regime específico, como decorre dos artigos 21.°, 270.° e 271.° da Constituição da República Portuguesa (que mais não são que uma tradução dos próprios fins da Administração Pública), cujos limites são a prossecução de interesse público e os direitos fundamentais dos cidadãos (6).

Neste contexto, a relação de emprego público assenta no fundamento de que a actividade profissional dos trabalhadores da função pública visa um alto interesse da comunidade (7),

De acordo com o artigo 48.°, n.° 4, da Constituição, os funcionários ou agentes da Administração Pública são titulares (como cidadãos) de direitos subjectivos inalienáveis, mas não podem dispensar-se, como trabalhadores, dos deveres específicos que decorrem do escopo da sua actividade (8).

Com efeito, a Constituição da República Portuguesa determina que eles estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como ele é definido nos termos da lei pelos órgãos competentes, podendo ser determinadas as incompatibilidades entre o exercício de empregos e cargos públicos e o de outras actividades ('),

A Constituição, sem deixar de proteger os direitos fundamentais dos cidadãos que são funcionários, faz prevalecer o interesse público sobre

O Ct. in Constituição da República Portuguesa Anotada. de J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, a nota vi ao artigo 171." (p. 150), com referência ao artigo 143." do Regimento da Assembleia da República.

(*) Podem, assim, encarar-se limites positivos —obrigatoriedade de prossecução de interesse público— e limites negativos: o respeito dos direitos dos funcionários como cidadãos.

O Cf. os n." 2 e 3 do artigo 15.°, 1 do artigo 21.° e 4 do artigo 48° Na perspectiva do sujeito activo (Administração), a relação de emprego, em comparação & relação empregador-•empregado do sector privado, transforma-se numa relação especial, correspondente ao conceito de «relação de serviço».

(') Cf. os n.°" 1 do artigo 267.° e 1 do artigo 270."

O De acordo com o último destes preceitos, isto é, o n.° 1 do artigo 270.° da Constituição.

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os seus interesses privados e a relação de serviço sobre a relação de trabalho.

Neste contexto se teriam, pois, de entender os direitos dos trabalhadores da função pública em relação aos direitos dos trabalhadores em geral. Como disse, os limites desses direitos têm de manter-se entre a obrigatoriedade de prossecução do interesse público e o respeito pela garantia dos direitos fundamentais da generalidade dos trabalhadores.

3.2 — Os mecanismos de participação dos trabalhadores são de consulta e de diálogo, e a lei não refere expressamente nem a forma de procedimento em concreto, nem sequer prevê carácter vinculativo para os pareceres emitidos pelas organizações sindicais ou pelas outras organizações de trabalhadores (10).

A falta de participação prevista nas alíneas d) do artigo 56.° e a) do artigo 58.° da Constituição da República Portuguesa traduz-se num vício de natureza processual, na falta de um pressuposto que afecta a própria lei e põe em causa a sua validade, por desconformidade com os normativos que lhe são subjacentes, isto é, com os preceitos da Constituição.

A participação dos trabalhadores, em geral, tem de entender-se na defesa dos seus interesses específicos, não podendo arrogar-se de prerrogativas mais amplas do que as constitucionalmente previstas.

Em relação à participação dos trabalhadores da função pública, tais prerrogativas serão, no máximo, iguais às dos demais trabalhadores, senão mais limitadas até (").

3.3 — Referindo o que se teria passado quanto às conversações mantidas com as estruturas sindicais da função pública, o Ministro da Reforma Administrativa descreveu o ponto em que elas haviam ficado, designadamente na parte respeitante à massa salarial e à sua discordância com a percentagem que se lhe poderia atribuir por aumento das remunerações.

Perante a irredutibilidade de posições e a impossibilidade financeira de a superar, o Ministro, nesse ponto, assumira a iniciativa de informar apenas os sindicatos da função pública do máximo até onde o Governo poderia ir quanto aos aumentos reclamados (u).

(,0) A participação dos trabalhadores deve ser entendida como pressuposto essencial à validade do processo de formação das leis de trabalho (ou referidas a trabalhadores), mas (al não significa que caiba aos interessados a definição das linhas gerais da política de trabalho — a qual compete inder-rogave'mente aos órgãos encarregados constitucionalmente de a definir, isto é, Assembleia da República e Governo—, nem sequer que caiba aos trabalhadores a condução do processo legislativo ou a elaboração das leis.

(") Sobre esta matéria, cf., in Estudos sobre a Constituição, vol. in, «A relação de emprego público na Constituição», por I. L. Pereira Coulinho; ibidem, pp. 661 a 689, «Os princípios constitucionais da Administração Pública», por J. M. Sérvulo Correia.

(") Cf., no local citado, a exposição do Ministro da Reforma Administrativa na discussão da Lei do Orçamento e do Plano para 1982.

Os diplomas em causa já estavam também em estudo nessa altura, e no decurso da sua elaboração foram várias vezes ouvidos os sindicatos representativos da função pública e discutidos os pontos de divergência.

Poder-se-á concluir que, neste aspecto, a elaboração dos diplomas também se manteve nos limites previstos na Constituição: a orientação e iniciativa couberam ao Governo, mas os trabalhadores foram ouvidos e aceites até algumas das suas reivindicações (l3).

Não nos parece, também neste ponto, que colha a argumentação da entidade reclamante, porque, obviamente, a Constituição não determina que a legislação do trabalho seja feita ou imposta pelos trabalhadores ao Governo.

Ill

1 — Apreciados os vários aspectos de inconstitucionalidade levantados na reclamação, que, ponto por ponto, foram refutados, restará concluir que não é fundamentada qualquer intervenção do Provedor de Justiça.

Na verdade, não lhe cabe apreciar a inconstitucionalidade por omissão, nem propor, portanto, ao Conselho da Revolução a sua apreciação.

Não parece consubstanciar-se qualquer inconstitucionalidade material, e foi também demonstrado que não terá razão de ser nem a inconstitucionalidade orgânica que é invocada, nem sequer o vício formal que se refere e que poderia ferir os diplomas de inconstitucionalidade formal por falta da participação dos trabalhadores, constitucionalmente exigida.

í. í — Como se disse, a participação institucionalizada das forças sociais organizadas na formação da vontade do Governo ou da Administração em questões de política económica e social vem a traduzir uma espécie de interpenetração do Estado com a sociedade, mas não uma inversão de posições, já que os seus pareceres não são vinculativos (").

Aliás, uma das funções do Governo é especificamente a função legislativa, como complemento das funções política e administrativa que cons-titucionalmenite lhe pertencem.

A legislação sobre a matéria em discussão pode inserir-se na competência derivada de autorização prévia, já que ela é ab initio pertença da Assembleia da República, mas a autorização foi dada e, quanto parece, dada em termos definidos, como determina a Constituição.

2 — Parece-nos, pois, que em todas as situações visadas se assegurou a garantia da constitucionalidade das normas publicadas.

(ll) Cf. os artigos 185.', 200.° e 203." da Constituição da República Portuguesa.

(M) Cf. os artigos 56.d, alínea d), 268." e 269." da Constituição. Veja ainda Sérvulo Correia, in Estudos sobre a Constituição, vol. Ill, pp. 661 a 689.

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Se bem que tais garantias visem a eficácia de toda a Constituição, haverá que invocar sempre uma norma violadora e não outra: a transgressão é feita norma a norma, não podendo imaginar-se uma infracção genérica e indeterminada (IS).

2.1 — Aliás, há mecanismos próprios para confirmar a validade dos diplomas publicados pelo Governo durante o funcionamento da Assembleia da República, considerando-se concedida a ratificação se, nas primeiras 15 reuniões posteriores à publicação do diploma, 5 deputados, pelo menos, não requererem a sua sujeição a ratificação (cf. o n.u 1 do artigo 172.").

Do mesmo modo, quando os decretos-leis são publicados pe'o Governo fora do funcionamento da Assembleia da República ou no uso de autorizações legislativas, considerar-se-á concedida a ratificação se, nas primeiras 5 reuniões posteriores a essa publicação, 20 deputados, pelo menos, não requererem a sua sujeição a ratificação (cf. o n.° 2 do mesmo artigo 172.°).

A ratificação tácita operará igualmente a validação do acto legislativo, mesmo originariamente inconstitucional por incompetência em razão da matéria, desde que esta não seja de competência exclusiva, isto é, não delegável, ou indisponível O6).

3 — A imprensa noticiou, em 15 de funho, que fora pedida pelo PCP e pelo PS a ratificação dos diplomas cuja declaração de inconstitucionalidade se pretendia (I7).

Em consequência da sua não votação, a ratificação do chamado «pacote da função pública» ficou adiada para data a fixar por consenso entre os grupos parlamentares.

Na medida em que os decretos-leis questionados vão ser apreciados pelo órgão competente, nem sequer será de dar à reclamante a única sujestão que seria possível e que já fora antecipadamente posta em prática.

Com base nestes argumentos, o Provedor não pediu a declaração de inconstitucionalidade dos diplomas postos em causa.

Pedidos de declaração de inconstitucionalidade

Em 1982, concluíram-se 11 processos em que o Provedor de Justiça apresentou ao Conselho da Revolução pedidos de declação de inconstitucionalidade.

A 4 deles vieram a corresponder declarações de inconstitucionalidade.

Noutros 4, o Conselho da Revolução decidiu não se pronunciar pela inconstitucionalidade das normas em questão.

Dos 3 restantes pedidos, 1 foi arquivado pelo Conselho da Revolução, por insuficiente identificação dos

(") Cf. Jorge Miranda. Estudos sobre a Constituição, vol. i, t. I. pp. 589 c segs.

('*) Sobre esta matéria, cf. Rui Machete, in Estudos sobre a Constituição, vol. i, pp. 281 e segs.

(") Cf., v. Diário de Notícias, de 15 de Junho.

preceitos em causa, e 2 não chegaram a ser apreciados por aquele órgão, devendo ter transitado para o Tribunal Constitucional.

1 — Aprovação de projectos de obras na zona de actuação do Gabinete da Área de Sines

Processo n.° 80/R-973-DI-26

A Câmara Municipal de Sines exprimiu ao Provedor de Justiça a sua discordância com o Decreto-Lei n.° 487/30, de 17 de Outubro, atentatório, segundo ela, da sua autonomia, constitucionalmente consagrada.

Estudado o assunto, o Provedor pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade do n.° 2 do artigo 5.° desse diploma, com base nas considerações seguintes:

1 — Afigura-se que o n.° 2 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 487/80 enferma de inconstitucionalidade orgânica.

2 — a) O n.° 2 desse preceito estabelece que a realização dos empreendimentos incluídos nos planos aprovados pelo Governo e cuja execução fique a cargo do Gabinete da Área de Sines «não carece de pareceres, licenciamentos, autorizações ou aprovações legalmente exigidos para empreendimentos da mesma natureza», salvo aqueles que o Governo excluir da dispensa.

b) Ê certo que o n.° 1 do artigo 2.° do Decreto--Lei n.° 166/70, de 15 de Abril, dispõe que «não carecem de licenciamento municipal as obras da iniciativa dos serviços do Estado».

Mas o mesmo se não passa quanto à aprovação dos respectivos projectos.

Na verdade, o n.° 2 do mesmo artigo estipula que «os projectos das obras a que se refere o número anterior, salvo quando se trate de obras em monumentos ou palácios nacionais, devem, porém, ser submetidos à prévia aprovação municipal, a fim de se verificar a sua conformidade com os planos ou anteplanos de urbanização e com as prescrições regulamentares aplicáveis».

c) O n.° 2 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 487/ 80 teve em vista, pois, retirar às câmaras municipais da área de actuação do Gabinete da Área de Sines a competência geral para a aprovação dos projectos de empreendimentos aprovados pelo Governo z a executar por este Gabinete.

d) Parece que tal objectivo só se poderia constitucionalmente conseguir através de lei da Assembleia da República, e não de mero decreto-lei.

Ê que o artigo 239.° da Constituição prescreve que as «atribuições e a organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos, serão reguladas por lei».

A confirmá-lo, o artigo 167.° da lei fundamental diz que é da competência exclusiva da Assembleia legislar sobre «h) Organização das autarquias locais».

e) Ora é uma lei — a Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro — que, no seu artigo 62.°, n.° 2, alínea e), estabelece que compete às câmaras municipais «conceder licenças para construção, edificação ou conservação, bem como aprovar os respectivos projectos, nos termos da lei».

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/) Parece, pois, que só mediante outra lei em sentido próprio, emanada da Assembleia da República, se poderia ter consagrado o regime constante do n.° 21 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 487/80.

g) Talvez se pudesse, em contrário, argumentar que a expressão «nos termos da lei», com que finaliza a alínea c) do n.° 2 do artigo 62.° da Lei n.° 79/77, significaria que a estatuição desse preceito só se aplicaria na medida em que um diploma legal expressamente conferisse às câmaras municipais certa competência, podendo por isso deixar de vigorar se diploma ou diplomas legais retirassem ou restringissem tal poder.

Afigura-se, todavia, que esse raciocínio não estaria correcto.

A expressão «nos termos da lei» refere-se, segundo parece, antes, ao condicionalismo ou processamento das aprovações em causa.

E, de qualquer modo, o que o artigo 62.°, n.° 2, alínea e), da Lei n.° 79/77 quer significar é que são as câmaras municipais —e não outras — as entidades que detêm, dentro do esquema geral de correlação dos poderes da administração central e das várias autarquias locais, a faculdade de aprovar projectos de obras e construções.

O Conselho da Revolução, porém, decidiu não declarar a inconstitucionalidade do preceito em causa (Resolução n.° 21/82, de 20 de Janeiro, publicada no Diário da República, 1.° série, de 1 do mês seguinte).

2 —Despejo, relativo a arrendamento particular, mediante diploma legai

Processo n:° 81/R-149-DI-3

O Governo cedera, a título gratuito, a propriedade de certo edifício a uma ordem religiosa, mediante portaria publicada em Setembro de 1979.

Posteriormente, através do Decreto-Lei n.° 554/80, de 25 de Novembro, veio determinar o despejo dos arrendatários que, naquela primeira data, já habitavam a casa — e isto com vista a que a ordem religiosa pudesse utilizar o prédio desocupado de quaisquer inquilinos.

Um destes, inconformado, pediu ao Provedor que solicitasse a declaração de inconstitucionalidade deste último diploma.

O Provedor assim o fez, com base nos seguintes argumentos:

1 — F ... veio requerer ao Provedor de Justiça a providência prevista no artigo 281.°, n.° 1, da Consituição da República, no sentido de solicitar ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 554/80, de 25 de Novembro.

2 — Aduz, a seu favor, os seguintes argumentos:

a) O exponente é titular do direito ao arrendamento do prédio sito na Rua da Estrela, 15, 4.°, desde 31 de Janeiro de

1979, direito esse que se lhe transmitiu por morte do anterior titular de quem o exponente era filho;

b) Por portaria do Ministro das Finanças de

de 11 de Setembro de 1979, publicada no Diário da República, 2." série, n.° 219, de 21 de Setembro de 1979, o Estado cedeu, a título definitivo e gratuito, o referido imóvel à Ordem das Irmãs Franciscanas Clarissas do Desagravo de Lisboa, passando, pois, a partir desta data, a referida Ordem a ser proprietária da fracção de que o exponente era o locatário;

c) Através do Decreto-Lei n.° 554/80, o

Estado decretou a caducidade do arrendamento do prédio em causa e ordenou o despejo administrativo do inquilino;

d) Tal diploma viola o artigo 65.° da Consti-

tuição, por impedir o exercício do direito à habitação por parte do exponente, violando, outrossim, o artigo 206.° da lei fundamental, por ter usurpado a função jurisdicional que compete aos tribunais;

e) Tal diploma está já a ser executado, dado

que o exponente recebeu em 18 de Dezembro de 1980 notificação para deixar a casa até 18 de Maio de 1981.

3 — Vejamos se o exponente tem razão.

4 — Como decorre do Decreto-Lei n.° 554/80, designadamente do seu preâmbulo, o Estado, ao constatar que com a portaria de 21 de Setembro de 1979 havia já transmitido a propriedade dos imóveis em causa para a instituição cessionária, sentia-se impossibilitado de lançar mão das providências que o Decreto n.° 139-A/79, de 24 de Dezembro, lhe faculta para pôr termo aos contratos de arrendamento que envolvam bens imóveis integradores do seu domínio privado.

Tais poderes, a serem utilizados atempadamente, é evidente que constituiriam uma forma legítima de exercer a função administrativa: aplicação da lei a uma caso concreto.

Dado, porém, que a propriedade do imóvel havia sido já transmitida, então a solução perfilhada foi fazer publicar um decreto-lei cujo conteúdo material é de feição individual e concreta.

Temos, assim, para nós, e como observação prévia, que o diploma em causa não é mais do que um acto administrativo a que o Governo deu a forma de decreto-lei.

O facto de o Governo ter adoptado ura decreto--lei para decretar medidas administrativas concretas e individuiais não significa que se deva considerar tal comportamento como acto legislativo.

Ê que, pese embora que os caracteres de formalidade e abstração tenham perdido o traço carac-terizador da função legislativa, a verdade é que o princípio da igualdade perante a lei, como princípio universalmente aceite, não pode deixar de ser ponderado com o devido peso (neste sentido Jorge Miranda, in Dicionário Jurídico da Administração Pública, in, p. 411).

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Dc íesto, a não se considerar a possibilidade de as leis individuais serem susceptíveis de recurso contencioso, e caso venha a firmar-se jurisprudência no sentido de tais leis estarem fora do controle de fiscalização constitucional, aí estarão os cidadãos sujeitos à violação incontrolável dos seus direitos (neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, p. 465).

E não se diga que o que viemos dizendo depara com o obstáculo do estatuído no artigo 16.°, n.° 1, da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo.

ê que, neste caso, importa dar à lei o seu sentido material, para que, desde logo, no artigo 16.u, n.° 1, da Lei Orgânica se possam conter os actos administrativos de conteúdo individual e concreto, ainda que revistam a forma de lei.

lnclinamo-nos, pois, a considerar que o diploma em análise mais não é do que um acto administrativo susceptível de recurso contencioso, mos-trando-se o mesmo ferido do vicio da usurpação do poder, na medida em que através do mesmo se dirimiu um conflito de interesses privados, actividade que faz parte da função jurisdicional, tal qual esta é definida pelo artigo 206.° da Constituição da República.

A perfilhar-se esta tese, bem se poderia solicitar a intervenção do digno agente do Ministério Público junto do Supremo Tribunal Administrativo para interpor recurso contencioso.

Reconhecemos, no entanto, as sérias dificuldades com que se deparará para levar o Supremo Tribunal Administrativo a aceitar a sindicabilidade contenciosa dos diplomas legais, uma vez que é jurisprudência pacífica daquele tribunal administrativo a insusceptibilidade de impugnação contenciosa dos decretos-leis (v., por todos, o Acórdão de 22 de Maio de 1980, in Acórdãos Doutrinais, ano xix, n.° 226, p. 1130 e seguintes).

Dadas as dificuldades enumeradas, poderá optar-se pela apreciação do tema em análise em matéria de fiscalização da inconstitucionalidade.

Tal apreciação depara com o exame de uma questão prévia, que é a questão de saber se as leis individuais são susceptíveis de tal fiscalização.

Apesar de a Procuradoria-Geral da República se ter pronunciado em sentido oposto a propósito da apreciação do Decreto-Lei n.° 484/77, de 16 de Novembro —diploma este que criou a empresa pública NAVIS, E. P. —, a verdade é que a jurisprudência da Comissão Constitucional aponta em sentido diverso (v., por todos, o Parecer n.° 3/78 da Comissão Constitucional, in Pareceres da Comissão Constitucional, 4.° volume, pp. 221 e seguintes).

Na verdade, o artigo 281.° da Constituição, ao referir-se ao controle da inconstitucionalidade, indica claramente serem passíveis de tal controle todo o tipo de normas. Ora, não distinguindo a Constituição o sentido material da lei, é evidente que não há razão para restringir o controle apenas e exclusivamente à lei de conteúdo normativo (neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., p. 481).

5 — Afastada esta questão prévia, vamos agora indagar da existência ou não de vícios de inconstitucionalidade do já citado Decreto-Lei r..° 554/ 80.

6 — Ê indubitável que o Estado, através daquele diploma, veio dirimir um conflito a favor de uma parte e em prejuízo da outra.

A resolução de um conflito de interesses por uma pessoa — Estado — totalmente alheia e estranha aos interesses em jogo traduz-se ao exercício da função jurisdicional.

A função jurisdicional incumbe aos tribunais, por força do que dispõe o artigo 206.° da Constituição.

O Governo, como órgão da soberania, quando administra justiça, como o fez no presente caso, viola o disposto no último preceito indicado.

Tal violação traduz-se no vício da inconstitucionalidade material.

7 — Ao dar forma legal a um acto administrativo, o Governo põe claramente obstáculo ao exercício do direito de recurso contencioso por parte dos cidadãos (artigo 269.°, n.° 2, da Constituição).

De resto, o recurso aos tribunais é um direito fundamental (artigo 20.° da Constituição da República) que vincula também as entidades públicas (artigo 8.°, n.° 1, do diploma ultimamente citado).

Ora, através de um decreto-lei de conteúdo individual, o Governo restringiu tal direito, o que constitui violação do disposto no artigo 18.°, n.° 3, da Constituição.

Por aqui se vê, também, e em nosso entender, que o diploma sob apreciação padece do vício de inconstitucionalidade material.

O Conselho da Revolução não aceitou estas razões, não declarando por isso a inconstitucionalidade alegada (Resolução n.° 63/82, de 7 de Abril, publicada no Diário da República, 1.° série, de 19 do mesmo mês).

3 — Restrições à exportação da leite dos Açores, bem como apücaçêo de contribuição fiscal sobre esse produto

Processo n.° 81/R-1320-DI-15

1 — Uma empresa de lacticínios dos Açores protestou, junto do Provedor, contra o disposto nos n.°* 18.° e 19.° da Portaria n.° 3/81, de 27 de Janeiro, das Secretarias Regionais das Finanças, da Agricultura e Pescas e do Comércio Interno daquela Região Autónoma, alegando a respectiva inconstitucionalidade.

A primeira dessas normas estabelecia que a saída de manteiga e queijo para fora da Região só seria permitida quando estivesse garantido o abastecimento local.

A segunda obrigou os fabricantes de lacticínios da Região a pagar ao Fundo Regional de Abastecimento $50 por litro de leite recebido, exceptuando o destinado ao consumo em natureza.

E insurgiu-se também contra uma comunicação recebida da Secretaria Regional do Comércio e Indústria, datada de 16 de Abril de 1981, segundo a qual, a partir dessa data, as saídas de produtos lácteos da

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Região ficariam subordinadas ao prévio pagamento da quantia fixada no n.° 19.° da Portaria n.° 3/81.

2 — Tendo-se considerado útil ouvir sobre a questão o Governo Regional dos Açores, este veio, através da Secretaria Regional do Comércio e Indústria, sustentar a constitucionalidade das regras em questão, alegando, designadamente, que:

a) O artigo 230.° da Constituição não teria a

natureza de uma injunção absoluta, devendo «ser condicionada às circunstâncias de facto, que surjam na sua aplicação, por forma a evitar-se a absorção da produção local pelos mercados exteriores».

Teria sido dentro dessa orientação, e no seguimento do parecer n.° 15/79 da Comissão Constitucional, que teria sido estabelecido, na Lei n.° 39/80, de 5 de Agosto, que: constituem matérias especificas para a Região o «b.b) Comércio, interno e externo, e abastecimento»; e «c.c) Orientação e controle das importações e exportações» (artigo 27.°); e, ainda, que compete ao Governo Regional: ««) Adoptar as medidas necessárias à promoção e desenvolvimento económico e social e à satisfação das necessidades colectivas regionais» (artigo 44.°);

b) A contribuição aplicada no n.° 19.° da Porta-

ria n.° 3/81 teria a natureza de taxa, podendo por isso ser criada por diploma dessa natureza.

Ela corresponderia aos benefícios propiciados aos produtores de leite pelo Fundo Regional de Abastecimento, em matéria de melhoria da qualidade da matéria-prima, redução do número de litros de leite registados pela indústria e racionalização da rede de recolha do leite.

3 — Sobre o assunto foram elaborados pelo assessor encarregado do processo e pelo adjunto do Provedor os pareceres seguintes:

Parecer do assessor:

1 — São duas, no essencial, as questões suscitadas no presente processo, consistindo ambas em alegados vícios de inconstitucionalidade de normativos contidos na Portaria do Governo Regional dos Açores n.° 3/81, de 27 de Janeiro, relativa a preços do leite e seus derivados.

2 — Assim, violaria o artigo 230.°, alínea b), da Constituição o seu n.° 18.°, do seguinte teor:

A saída para fora da Região de queijo e manteiga só virá a ser permitida quando estiver garantido o abastecimento local, mediante a emissão de um boletim de saída e certificado de qualidade passado pelas entidades competentes.

Afigura-se que tal violação é um facto. Primeiro, porque, não obstante a argumentação em contrário desenvolvida pela Secretaria Regional do Comércio e Indústria, na sua douta informação — que, arrancando da necessidade de interpretação dos textos constitucionais, põe o acento tónico na premência de «evitar-se absorção da produção local pelos mercados exteriores, gera-

dora de carências dificilmente supríveis no mercado do consumo regional» —, a letra do mencionado preceito da Constituição é peremptória em vedar às regiões autónomas «estabelecer restrições ao trânsito de pessoas e bens entre elas e o restante território nacional». Não se dá margem a excepções, tenham elas por base as razões invocadas por aquela Secretaria, ou quaisquer outras, sendo certo que, nos termos do artigo 9.°, n." 2, do Código Civil, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal (,8). Tanto basta para que também seja abalada a ilação oposta que a Secretaria Regional pretende tirar da lei ordinária, concretamente dos artigos 27.° e 44." da Lei n.° 39/80, de 5 de Agosto, que haverá que interpretar com a limitação resultante do texto constitucional.

Em segundo lugar, não cremos que desta forma fiquem as regiões autónomas impossibilitadas de prover à especialidade, sem dúvida relevante, dos problemas de abastecimento decorrentes da insularidade.

£ que essa especialidade, quando se consubstancie em proibição do tipo da contida no n." 18.° da portaria em apreço, sempre poderá ser suscitada e contemplada através de propostas de lei que apresentem à Assembleia da República, no exercício da iniciativa legislativa prevista na alínea c) do n.° 1 da Constituição (").

E se é certo que esta via não equivale à adoptada, quer quanto à celeridade, quer quanto à contingência, isso mesmo foi, em nosso entender, querido pelo legislador constituinte, sendo, nesse sentido, insuperável, enquanto se mantiverem as actuais soluções constitucionais.

Em abono desta posição, cite-se, finalmente, a intervenção do deputado Vital Moreira, autor da proposta que originou o aludido artigo 230.°, da qual se transcrevem as seguintes passagens mais significativas: «[...] quando se trata de impedir a autarquização económica das regiões [...] então não há qualquer argumento de ferir a sensibilidade de quem quer que seja que impeça ou deva impedir a Assembleia Constituinte de solucionar no melhor sentido [...] Esta matéria diz respeito a todo o povo português e diz respeito ou deve dizer respeito a todos os deputados presentes nesta Assembleia», porque põe em causa «não apenas o princípio da unidade nacional [...] mas também, e acima de tudo, uma justa ordenação constitucional do princípio da autonomia regional que aqui ninguém põe em causa» í20). ê dizer que também o «pensamento legislativo» (2I) não contraria, antes confirma, a nossa opinião.

(") Os cânones gerais de interpretação são aplicáveis ao domínio constitucional (Jorge Miranda. Estudos sobre a Constituição, Lisboa, 1977, p. 33).

(") V. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 1978, p. 425.

(*) Diário da Assembleia Constituinte, n.° 125. de 25 de Março de 1976.

(") Cf. Código Civil. n.° 1 do artigo 9." citado.

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Pelo exposto, pendemos, pois, para considerar organicamente inconstitucional o n.° 18." da portaria em apreço, na parte em que só permite a saída para Portugal continental dos produtos nele referidos, quando estiver garantido o abastecimento local.

3 —O n.° 19.°, 1, da Portaría n.° 3/81, é do seguinte teor:

As fábricas, cooperativas e restantes fabricantes de lacticínios pagarão ao Fundo Regional de Abastecimento a importância de $50 por litro de leite recebido, à excepção de todo o leite destinado ao consumo em natureza.

por seu lado, e na tese da reclamante, violaria os artigos 106.°, n.° 2, e 167.°, alinea o), da Constituição, que reservam à lei e à Assembleia da República a criação de impostos.

O problema reconduz-se, pois, à qualificação, como imposto ou taxa, da importância fixada naquela portaria — uma vez que as taxas estarão fora do âmbito destes preceitos constitucionais (") —, passando, assim, pela distinção conceituai entre aqueles dois tipos de encargos.

Ora, sem desenvolvermos aqui os termos dos respectivos conceitos, por demais conhecidos, sublinharemos que é no carácter unilateral do imposto, por contraposição à natureza sinalagmática da taxa, que reside o cerne da distinção. E, se é certo que a contraprestação, pressuposta pela taxa, pode não vir a traduzir um benefício para o obrigado, nem ser por ele solicitada, certo é, também, que não pode consubstanciar-se, apenas, na simples utilidade geral do ente público que a realiza, ou nos serviços que presta, em geral, ou num sector determinado. É necessário, sob pena de se negar a distinção entre taxa e imposto, que aquela contraprestação integre uma actividade especificamente dirigida aos obrigados ao pagamento.

Ora é esta actividade especificamente dirigida «às fábricas, cooperativas e restantes fabricantes de lacticínios», como contrapartida da importância que, pelo n.° 1.°, 1, da portaria em apreço, lhes é exigida, que não vemos configurada em preceito algum, nem que possa ser integrada pelas vantagens indirectas e sectoriais arroladas na informação da Secretaria Regional e que vão da invocada «melhoria da qualidade do leite» a «formas de racionalização da rede da sua recolha», passando pela «redução apreciável do número de litros rejeitados, no cais de recepção».

Sublinharemos, afinal, que cremos que a posição que vimos de expor ter o apoio da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo,

O Manuel Pires, «Disposições da Constituição de 1976 sobre matéria fiscal», Boletim da DGCi, 223-225, 34; parecer da Comissão Constitucional n.° 30/81, de 27 de Outubro, processo n.° 14/81.

da qual se salienta o acórdão do tribunal pleno de 17 de Março de 1976 í23).

Entendemos, assim, que também o n.° 19.°, 1, da portaria era apreço está ferido de inconstitucionalidade orgânica.

4 — Em face de tudo o exposto, propõe-se que, ao abrigo do n." 1 do artigo 281.° da Constituição, seja solicitada ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da insconstitucionalidade orgânica dos n.os 18." — na parte referente à saída para Portugal continental dos produtos nele aludidos— e 19.°, !, da Portaria n.° 3/81, de 27 de janeiro, do Governo Regional dos Açores, com fundamento em violação, respectivamente, dos artigos 230.°, alínea b), e 167.°, alínea o), ambos da Constituição.

Parecer do adjunto:

1 — Concordo inteiramente no tocante à inconstitucionalidade da norma do n.° 18." da Portaria n.° 3/ 81, pelas razões expostas pelo Sr. Assessor.

2 — Aliás, não convencem, de facto, os argumentos suscitados pelo GRA:

a) Por um lado, a Lei n.° 39/80, de 5 de

Agosto, terá sempre de ser interpretada em conformidade com o artigo 230.° da Constituição, que prescreve, sem reservas, que é vedado às regiães autónomas: «¿0 Estabelecer restrições ao trânsito de pessoas e bens entre elas e o restante território nacional»;

b) O próprio artigo 26.° dessa lei (que o

subsequente artigo 27.°, invocado pelo GRA, desenvolve) prescreve que a competência da Assembleia Regional para «legislar [...] sobre matérias de interesse específico para a Região» opera «dentro dos limites constitucionais»;

c) Note-se, aliás, que estas disposições, em

que o GRA pretende apoiar o acerto da sua posição, se reportam até à competência legislativa da Assembleia Regional, e não já do Governo.

Ora, o diploma em discussão é uma portaria das Secretarias Regionais das Finanças, da Agricultura e Pescas e do Comércio e Indústria.

Quer dizer: a actuação do Governo Regional sempre estaria, por maioria de razão, limitada nos termos do artigo 230.° da Constituição.

Mas mais: a verdade é que, segundo as alíneas bb) e cc) do artigo 27.° da Lei n.° 39/80, não é ao Governo Re-— gional, mas sim à Assembleia Regional, que compete legislar sobre «comércio, interno e externo, e abastecimentos»;

(a) Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, 178, 1331, c seguintes e respectiva anotação. Posteriormente, Acórdãos de 2 de Novembro de 1978 e 26 de Abril de 1979, loc. cit. 204, 1473, e 214, 870. E, no âmbito do Serviço do Provedor de justiça, veja processos n.*" 78-DI-37-A-3 e 79-D1-51-A-2, referidos nos respectivos relatórios anuais (suplementos à 2.' série do Diário da Assembleia da República, de 11 de Abril de 1980 e 31 de Janeiro de 1981).

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e sobre «orientação e controle das importações e exportações»; d) E o parecer n.° 15/79 da Comissão Constitucional, que o Governo Regional cita em seu favor, apresenta-se, a meu ver, contrário à própria posição que ele defende.

Ê que a Comissão Constitucional pronunciou-se claramente (e o Conselho da Revolução concordou, através da Resolução n.° 200/79) no sentido da inconstitucionalidade de uma disposição análoga à que ora está em causa: tratava-se de um despacho do Secretário do Comércio e Indústria da Região Autónoma dos Açores que proibia a saída da Região de gado bovino e suíno, enquanto não se mostrasse garantido o abastecimento regular da mesma.

Acrescente-se, mesmo, que o citado parecer, no seu n.° 7, não deixa de apontar qual a via que as regiões autónomas podem constitucionalmente empregar para procurar consagrar medidas do tipo das que estão em apreciação: apresentação de propostas aos órgãos legislativos do Estado, mormente à Assembleia da República.

Compreende-se, aliás, que assim seja: estando em jogo interesses não só das regiões autónomas mas do restante País (para onde a discutida venda de leite e lacticínios —no caso presente—, ou de carne bovina ou suína —no do Parecer n.° 15/79— se verificaria), é lógico que elas devam ser ponderadas e reguladas por um órgão com competência para emanar normas para todo o âmbito do território nacional.

3:

o) Já quanto ao n.° 19.° da mesma Portaria n.° 3/81 se me suscitam dúvidas sobre se é segura a sua inconstitucionalidade.

Na verdade, parece-me que consubstanciam suficientemente benefícios proporcionados pelo Fundo Regional de Abastecimento aos industriais de lacticínios da Região:

Não só os subsídios previstos no n.° 8.° da mesma portaria;

Como os aspectos referidos pelo Governo Regional dos Açores — estes últimos, traduzindo-se em actuações de um serviço público que, em execução das alíneas b), c) e d) do Decreto Regional n.° 6/78/A, se traduzem em benefícios, embora não exclusivos, para o conjunto das indústrias de lacticínios da Região;

b) Não obstante, e porque a questão não é líquida (como o revela a queixa, corroborada pela opinião do Sr. Assessor), veria vantagem em se suscitar também a apreciação do Conselho da Revolução sobre esse aspecto, para se dissiparem quaisquer dúvidas.

Com efeito, entendo que o Provedor (e os demais órgãos indicados no ar-

tigo 281." da Constituição) tem poder para suscitar a intervenção do Conselho da Revolução não só nos casos em que considere segura a existência de inconstitucionalidade, como também naqueles em que surjam dúvidas legitimas a tal respeito.

4 — Independentemente e para além da questão da inconstitucionalidade, penso que se deve chamar a atenção do Governo Regional dos Açores para a ilegalidade da determinação contida no ofício de 16 de Abril de 1981.

Com efeito, nada na Portaria n.° 3/81, nem noutras disposições que conheço, legitima o condicionamento da saída de lacticínios para o continente ao pagamento da contribuição estabelecida no n.° 19;° daquele diploma.

De facto, o n.° 18." da mesma portaria apenas declara que tal possibilidade de saída é função de estar ou não assegurado o abastecimento da Região.

A determinação em causa deverá, pois, ser revogada.

4 — O Provedor, concordando com estes pareceres, pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade dos preceitos em discussão.

E recomendou ao Governo Regional a revogação da determinação relativa à proibição de saída de leite antes de paga a contribuição criada pela Portaria n.° 3/81.

5 — Entretanto, o diploma em questão foi revogado, sendo substituído pela Portaria n.° 47/81, de 13 de Outubro, cujos n.°" 19.° e 20.° reproduziram, porém, as regras daquele primeiro, cuja constitucionalidade fora posta em causa.

6 — Por isso, o Provedor pediu, então, a declaração de inconstitucionalidade dessas normas da Portaria n.° 47/81.

7 — O Conselho da Revolução proferiu tal declaração, através da Resolução n.° 189-B/82, de 20 de Outubro (publicada em 25 desse mês).

4 — Contribuições para a Comissão Reguladora dos Produtos Químico* e Farmacêuticos

Processo n.° 81/R-2000-OI-24

Uma sociedade comercial suscitou o problema da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 374-H/79, de 10 de Setembro, na medida em que estabelece contribuições designadas por taxas, devidas à Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos.

O Provedor, sem embargo do respeito pela posição assumida pelo seu antecessor no processo n.° 79/ R.2819-D1.51, decidiu pedir ao ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade do artigo 2.° do referido diploma.

Fê-lo em função da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo sobre a matéria e por concordar com os pareceres do assessor e do adjunto do Provedor, proferidos naquele processo e transcritos no relatório do Provedor de Justiça de 1980 (pp. 5* a 59).

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O Conselho da Revolução não sancionou, porém, esta posição, pronunciando-se pela não declaração de inconstitucionalidade (Resolução n.° 159/82, de 2 de Agosto, publicada em 2 de Setembro seguinte).

5 — Transferência de trabalhadores da função pública

Processo n.° 81/IP-20

I — Em processo, de iniciativa do Provedor, relativo ao regime de transferência dos trabalhadores da função pública, foi elaborado, pela assessora dele encarregada, um parecer cujas partes principais se transcrevem:

Fundamentação concreta e específica da necessidade das transferências, quando impostas por «conveniência de serviço».

1—«Enquanto não era publicada legislação adequada a uma concreta reorganização da função pública» e «considerando a conveniência de dotar desde já a Administração Pública de dispositivos legais que permitam uma melhoria dos serviços», o Decreto-Lei n.° 152/75, de 25 de Março, veio permitir no seu artigo 1.° a transferência de qualquer servidor civil do Estado, serviços e empresas públicas, autarquias locais e demais pessoas colectivas de direito público, sem prejuízo do direito ao respectivo vencimento, por mera invocação de conveniência de serviço, e mediante simples despacho do respectivo Ministro, «para serviços, organismos ou quadros diferentes do mesmo ministério».

Com o pretexto de uma «melhoria dos serviços», abria-se a porta à violação de direitos individuais dos cidadãos e dos direitos dos trabalhadores, pondo-os à disposição de todas as arbitrariedades que a Administração, «por conveniência do serviço», quisesse usar.

No seu seguimento foi feita pelo Provedor de Justiça uma «chamada de atenção para a eventual necessidade de revisão do regime constante do Decreto-Lei n.° 152/75, de 25 de Março, no que se refere a transferências», mas não foi solicitada, como julgo se impunha já naquela data (já publicada que tinha sido a Constituição de 1976), a sua declaração de inconstitucionalidade.

2 —Só, porém, pelo Decreto-Lei n.° 191-D/ 79, de 25 de Junho, artigo 4.°, n.° 2, é que aquele artigo 1." do Decreto-Lei n.° 152/75, de 25 de Março, foi expressamente revogado.

3 — No entanto, os seus perigosos e nefastos efeitos, pelo recurso que facultava a todas as arbitrariedades, tinham já sido minorados, embora mais em teoria que na prática, por força do do imposto no artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/ 77, de 17 de Junho, ao ordenar que para além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente:

1 —..............................................

a) Neguem, extingam, restrinjam ou por qualquer modo afectem direitos

ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;

b) Afectem, de igual modo, e no uso de

poderes discricionários, interesses legalmente protegidos;

c) ..............................................

d)..............................................

e) ..............................................

/) Impliquem revogação, modificação ou

suspensão de acto administrativo anterior.

2 — A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão [...].

3 — Ê equivalente à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

Poderia defender-se que, mantendo-se em vigor o Decreto-Lei n.° 152/75 [e a prova é que se impôs posteriormente, em 1979, a sua expressa revogação (v. 2)], a transferência de qualquer servidor civil do Estado poderia ser simplesmente fundamentada no facto da «conveniência de serviço» e no fundamento de direito daquele preceito legal —dado que, iniludivelmente, a transferência de qualquer funcionário que se vinculou à Administração para em determinado lugar exercer as suas correspondentes específicas funções, exercidas em local certo e com garantias de estabilidade e duração definidas, afecta, extinguindo, restringindo ou negando direitos ou interesses legalmente protegidos, pelo que o acto administrativo que a determina, pelo artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/ 77, tinha de ser sempre fundamentado.

Julgo, porém, que o argumento não poderia nunca ser aceite, visto que o simples fundamento da «conveniência de serviço» vem inegavelmente contrariar o n.° 3 do artigo 1.° daquele Decreto-Lei.

Temos, assim, que, por força do Decreto-Lei n.° 256-A/77, conjugado com o Decreto-Lei n.° 152/75 (vigente até à publicação do Decreto--Lei n.° 191-D/79, de 25 de Junho) os «servidores civis do Estado [...]» podiam ser transferidos, sem prejuízo do direito ao respectivo vencimento, mediante simples despacho do respectivo ministro, para organismos e quadros do mesmo ministério, por mera conveniência de serviço, devendo, no entanto, aquela invocação ser devida e claramente explicitada nos termos do n.° 3 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77.

Mesmo assim, pelo carácter discricionário do acto, e dado que a prova de existência de desvio de poder do mesmo é ónus do transferido, tornava-se extremamente difícil a este contestar no Supremo Tribunal Administrativo a transferência que por conveniência de serviço, fundamentada embora, lhe fora imposta.

4 — Como já referido, a 25 de Junho de 1979 (Decreto-Lei n.° 191-D/79 — Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado) foi expressamente revogado o Decreto-Lei n.° 152/75.

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E, assim, porque é evidente que a transferência de um trabalhador para outro posto de trabalho vem sempre afectar direitos e interesses legalmente protegidos (quando ele acede em vincular-se à Administração, fá-lo para aquele certo e determinado posto de trabalho, para exercer as suas específicas funções, e com expectativas de acesso e regalias àquele posto de trabalho inerentes), a transferência deixou de poder ser imposta por simples invocação de conveniência de serviço, mesmo fundamentada, passando o despacho que a determinasse a ter de obedecer integralmente ao Decreto-Lei n.° 256-A/77.

5 — Porém, logo a 31 de Agosto de 1979, o Decreto-Lei n.° 356/79, com vista a «explicitar o alcance do artigo 1.° do supracitado Decreto-Lei n.° 256-A/77, a fim de pôr cobro a dúvidas surgidas na sua aplicação, designadamente no respeitante a actos de transferência e exoneração praticados legalmente no uso de poderes discricionários relativos a funcionários de escalão superior da Administração Pública [...]», vem interpretar o Decreto-Lei n.° 256-A/77 (seu artigo 2.°), estabelecendo, no seu artigo 1.°, que: «Os actos de transferência e exoneração de funcionários da Administração Pública [...], quando praticados legalmente no uso de poderes discricionários, independentemente de qualquer ilícito discipl inar [...] e se refiram a funcionários nomeados discricionariamente, consideram-se suficientemente fundamentados quando o fundamen»o invocado for o da conveniência de serviço.»

Quer dizer, esta disposição legal vem repetir o normativo imposto para as transferências pelo Decreto-Lei n.° 152/75, embora limitadamente, por um lado, quanto aos funcionários a que se destina, e alargadamente, por outro lado, quanto aos locais para os quais se pode determinar a transferência.

6 — No entanto, e pouco tempo depois, a 22 de Dezembro de 1979, considerando que aquele Decreto-Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto, «veio contrariar o espírito e a lei [...]» do Decreto-Lei n.° 256-A/77, que pretendia interpretar, o Decreto-Lei n.° 502-E/79 revoga pura e simplesmente o Decreto-Lei n.° 356/79.

Note-se, no entanto, que, por efeito daquela revogação, a partir unicamente de 22 de Dezembro de 1979, se não curou, nem se tentou salvar as situações de injustiça e ilegalidade (e até de inconstitucionalidade) que eventualmente se tivessem criado no período em que aquele Decreto-Lei n.° 356/79 tinha estado em vigor — de 31 de Agosto a 22 de Dezembro de 1979.

7 — Passados, porém, outros curtos 2 meses, a 18 de Fevereiro de 1980, o Decreto-Lei n.° 10-A/ 80, vem por sua vez revogar o Decreto-Lei n.° 502-E/79, de 22 de Dezembro, e repõe em vigor, a partir da data da sua publicação, o Decreto-Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto.

8 — ................................................

9 —....................................................

10 — Pela Resolução n.° 180/80, da Assembleia da República, de 20 de Maio, foi ratificado o Decreto-Lei n.° 10-A/80, de 18 de Fevereiro, voltando assim a ficar em vigor o Decreto-Lei n.° 356/79, de 1 de Agosto.

E, assim sendo, «os actos de transferência e exoneração dos funcionários da Administração Pública [...], quando praticados legalmente no uso de poderes discricionários, independentemente de qualquer ilícito disciplinar, e se refiram a funcionários nomeados discricionariamente», basta que sejam fundamentados com a mera invocação de «conveniência de serviço».

Volta-se assim, como já referido, e embora com incidência sobre um restrito número de funcionários, ao anterior regime que expressamente tinha sido estabelecido para todos aqueles trabalhadores da função pública pelo Decreto-Lei n." 152/75, de 25 de Março, revogado pelo artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-D/79, de 25 de Junho.

11 — Estando-se a tratar da necessidade, ou conveniência, de ser imposta fundamentação concreta e específica da necessidade de transferência, obviamente que a primeira questão que terá de ficar esclarecida é se poderá ser aceite como suficiente a fundamentação unicamente referida à «conveniência de serviço».

12 —Dispõe o artigo 18.°, n.° 2, da Constituição que «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição».

Por sua vez, o artigo 51.°, n.° 3, daquela lei fundamental estipula que «todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade».

Ê evidente que a aceitação, por parte do trabalhador da função pública, de exercer funções para a Administração representa uma escolha por ele feita, para uma determinada profissão e para certo género de trabalho, assumindo as responsabilidades do cargo, mas usufruindo, de pleno direito, também, de todos os direitos, garantias, regalias e expectativas que àquele posto de trabalho por ele escolhido são inerentes.

Qualquer acto discricionário da Administração que venha, por imposição, determinar uma alteração na profissão e género de trabalho pelo funcionário assim escolhidos, não poderá deixar, portanto, de ser considerado como inconstitucional, por violar o disposto nos artigos 18.°, n.° 2, e 51.°, n.° 3, da Constituição, excepto se aquele acto tiver tido como base o interesse colectivo ou a própria capacidade do funcionário.

13 — Por outro lado, preceituando a Constituição, no seu artigo 270.°, n.° 1, que «os funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, tal como é definido, nos termos da lei. pelos órgãos competentes da Administração», o poder discricionário conferido à Administração pressupõe — e impõe — que os actos discricionários que esta venha a praticar no exercício do poder que lhe foi conferido terão sempre em vista aquele interesse público e só este fim poderá justificar actuações que imponham limitações a direitos e garantias consti-

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tucionalmente atribuídos, mesmo que aquelas limitações tenham fundamentação pela Constituição admitida para a sua imposição.

Parece-me, assim, claro que qualquer acto de transferência de um servidor do Estado terá de conter uma especificação concreta dos motivos que a determinaram, visto que é a própria Constituição que impõe que eles só podem ser de «interesse colectivo» (é o caso, por exemplo, de a permanência do funcionário no seu posto de trabalho vir a perturbar os direitos ou legítimos interesses dos seus companheiros de trabalho) ou de «capacidade do próprio transferido» (será, por exemplo, o caso de manifesta incompetência, ineficiência, improdutividade ou inaptidão do funcionário para o lugar para que é transferido) e, de tal forma, que também se possa inferir ainda que aquela transferência tem por fim o interesse público ao qual exclusivamente o funcionário está obrigado.

Ê óbvio que, só podendo o acto determinativo de transferência de funcionários e agentes da Administração apoiar-se em razões de interesse colectivo e capacidade do próprio (artigo 51.°, n.° 3, da Constituição) e ter um fim de interesse público —melhoramento da Administração, inclusive (artigo 270.°, n.° 1, da Constituição) —, ao funcionário transferido só será possível contestar aquele acto, com alegação de que não existem os motivos que o podem justificar, ou o fira que tem de visar, usando o direito de recurso contencioso (artigo 269.°, n.° 2, da Constituição). Dado que o óivus da prova de inconstitucionalidade do acto (por violação do artigo 52.°, n.° 2, da Constituição ou do fim de interesse público imposto pelo artigo 270.°, n.° 1, da Constituição — desvio de poder) cabe ao funcionário transferido, aquela prova só será possível se aquele acto contiver, por si só, os elementos necessários que possibilitem aquela contestação. E tal só se dará, como é evidente, se o mesmo contiver especificados os motivos que o fundamentam.

íulgo, assim, pelo exposto, poder concluir que o acto administrativo praticado pela Administração, no exercício de competência legal e no uso de poder discricionário que a lei lhe confere, em que imponha a um funcionário ou agente de Estado a transferência para diverso posto de trabalho daquele em que foi provido, é inconstitucional, excepto se tiver como fundamento motivos ligados ao interesse colectivo ou à própria capacidade para o trabalho do transferido.

Será igualmente inconstitucional, por violar o artigo 269.°, n.° 2, da Constituição, se não contiver clara e explicitamente expressos os motivos que o fundamentam, visto não permitir assim ao interessado o uso do direito conferido pelo citado artigo.

14 — Segundo se lê no preâmbulo do Decreto--Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto, a mera invocação da conveniência de serviço como fundamento do acto administrativo discricionário que imponha uma transferência de funcionário ou agente do Estado «reconduz-se quase sempre a uma avaliação global da actividade desenvolvida pela entidade substituída no tocante ao maior ou menor grau de eficiência demonstrada, às perspectivas

de actuação esboçadas, às omissões reveladas» — o que, a assim ser, justificaria, constitucionalmente, porque reportada à «capacidade do próprio», a violação do direito do funcionário ou agente ao posto e ao género de trabalho que escolhera e em que estava investido, bem como o interesse público (do serviço) que lhe era subjacente.

É a própria lei a reconhecer que a «recondução» da conveniência de serviço a motivos concretos baseados na capacidade do trabalhador para o posto de trabalho de que é transferido se dá quase sempre, o que logo faz surgir a pergunta de como, nada mais constando do acto como fundamentação senão a simples alusão a «conveniência de serviço», poderá o interessado, quando esse «quase sempre» se não verifique e a conveniência de serviço se não tenha apoiado nos motivos citados, usar do recurso contencioso cujo direito a lei fundamental lhe confere, contestando o acto por inconstitucional — tanto mais que, repete-se, o ónus da prova da sua ilegalidade compete ao queixoso (M).

Além disso, a simples invocação da conveniência de serviço como fundamento do acto de transferência, unilateralmente alegada pelo seu autor, impedindo a possível aferição dos motivos que a baseiam com o fim imposto pela lei — o fim de interesse público—, poderá conduzir a actuações com vista a objectivos bem diversos daquele fim, nomeadamente o de afastamento do funcionário por razões de ideologias políticas ou partidárias, que, além de serem contrárias aos imperativos constitucionais [Constituição, artigo 52.°, alínea b)], podem ir mesmo contra o obrigatório fim de interesse público (por exemplo, em prejuízo da própria Administração), não podendo, por falta de fundamentos, ser contenciosamente recorríveis por desvio de poder.

E a pura e simples remissão para um conceito — o da conveniência de serviço — não garante ao interessado (funcionário transferido) usar do seu direito a recurso contencioso, garantido pela Constituição (artigo 269.°, n.° 2), pela impossibilidade prática de provar que aquele conceito se reconduz a uma avaliação da sua «capacidade» ou do interesse colectivo [únicas restrições legais que a Constituição admite para o direito que a mesma lhe confere de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho (artigo 51.°, n.° 2)], ou de impugnar o acto por «desvio de poder».

Não posso deixar de concluir que o acto administrativo, no uso de poder discricionário, que determine a transferência de funcionários ou agentes do Estado e que invoque unicamente a conveniência de serviço, ou não seja concreta e expli-

(*) Conforme jurisprudência, que se vai tornando dominante (v. g., Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, pleno, de 15 de Maio de l%t e Acórdãos da 1.' Secção dc 24 de Abril de 1972, de 3 de Maio de 1973 e de 20 de Outubro de 1977), embora o artigo 19." da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo preceitue que o exercício do poder discricionário só pode ser atacado contenciosamente com fundamento em desvio do poder, deve admitir-se que, no caso de erro nos pressupostos do uso desse poder, o acto respectivo pode ser impugnado com fundamento em violação de lei.

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citamente fundamentado, é um acto ferido de inconstitucionalidade, bem como que são inconstitucionais todas as disposições legais que admitam a mera conveniência de serviço como fundamento daquele acto.

Do mesmo modo, considero que será ferido de inconstitucionalidade aquele acto se os fundamentos invocados não corresponderem aos únicos motivos que pela Constituição são admitidos para restrição do direito do trabalhador à livre escolha da profissão e do género de trabalho e referidos no artigo 51.°, n.° 3, da Constituição.

Sintetizando:

1 — Quando um funcionário ou agente do Estado aceita (mediante a posse ou apresentação ao serviço) a investidura em determinado lugar, tal aceitação representa uma escolha por ele feita para uma certa profissão e determinado género de trabalho, assumindo as responsabilidades do cargo e usufruindo também de todos os direitos, garantias, regalias e expectativas que àquela profissão e posto de trabalho são inerentes.

2 — Qualquer acto discricionário da Administração que venha, por imposição, determinar uma alteração na profissão ou género de trabalho assim escolhidos, como a transferência, não poderá deixar de ser considerado inconstitucional, por violar os artigos 18.°, n.° 2, e 51.°, n.° 3, da Constituição, excepto se aquele acto se tiver fundamentado em motivos com base em «interesse colectivo» ou «capacidade» (competência, eficiência, produtividade, aptidão, etc.) do próprio funcionário ou agente transferido.

3 — Por outro lado, o poder discricionário conferido à Administração impõe que ele seja usado com um fim de interesse público (Constituição, artigo 270.°, n.° 1) e, assim, qualquer acto de transferência praticado no uso de poder discricionário, mesmo que de harmonia com as reservas impostas pelo artigo 51.°, n.° 3, da Constituição, será viciado de desvio de poder se não tiver um fim de interesse público.

4 — Ê óbvio que, só podendo o acto discricionário determinativo de transferência de funcionários e agentes da administração fundamentar-se em motivos que se reportem ao «interesse colectivo» ou à «própria capacidade» do transferido (artigos 51.°, n.° 3, da Constituição) e ter um fim de interesse público (artigo 270.°, n.° 1, da Constituição), quando tal não aconteça, o funcionário ou agente transferido só poderá usar o direito de recurso contencioso que a Constituição (artigo 269.°, n.° 2) lhe confere se puder provar (visto que é a ele que lhe cabe o ónus da prova) que a transferência não se fundamentou nos motivos que a Constituição estabelece ou não tem um fim de interesse público.

5 — Será assim igualmente inconstitucional — por obstar ao exercício do direito que o artigo 269.°, n.° 2, da Constituição confere — todo o acto de transferência exercido dentro da competência legal (artigo 52.°, n.° 3, da Constituição), no uso de poder discricionário, se no mesmo não se expressarem concretamente os motivos que o fundamentam.

6 — Deste modo e visto que, por um lado. tuJas es forças políticas do País que foram, dominantemente, ora umas, ora outras, Governo admitem e reconhecem que a invocação da conveniência de serviço como único fundamento de acto discricionário que imponha a transferência de um servidor de Estado pode ser e foi usada como cobertura de fins diversos daqueles que a lei impõe para aquele acto, sendo aqueles fins proibidos pela Constituição [artigos 52.°, alínea b), e 310.D], e, por outro lado, a pura e simples remissão para um conceito —o da conveniência de serviço — não garante ao interessado (funcionário transferido) usar do seu direito a recurso contencioso (artigo 269.°, n.° 2, da Constituição), pela impossibilidade prática de provar que aquele conceito se não reconduz a uma avaliação da sua «capacidade» ou do interesse colectivo (e repare-se que o próprio Decreto-Lei n.° 356/79 reconhece que ele se reconduz «quase sempre», o que admite que nem sempre acontece), nos termos do artigo 51.°, n.D 3, ou que tem fins diversos do fim de interesse público, não podendo impugná-lo por «desvio de poder»; não posso deixar de concluir que o acto administrativo, no uso de poder discricionário, que determine a transferência de funcionários ou agentes do Estado e que invoque unicamente a conveniência de serviço e não seja concreta e explicitamente fundamentado é um acto ferido de inconstitucionalidade.

São, do mesmo modo, inconstitucionais todas as disposições legais que admitem a mera conveniência de serviço como fundamento daquele acto, nomeadamente o Decreto-Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto.

2 — Com base neste parecer, o Provedor pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade de «toda a disposição legal que permita, em acto discricionário e no uso de competência legal, transferência imposta a funcionário ou agente do Estado, com a mera invocação de conveniência de serviço».

3 — E, tendo em conta também o referido parecer, bem como a análise de diversos processos abertos com base em queixas de funcionários ou agentes transferidos, formulou ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa a seguinte recomendação:

Tenho a honra de recomendar a V. Ex." — aliás no seguimento de outras recomendações idênticas feitas pelo Provedor de Justiça — que, após obtenção de prévia autorização legislativa da Assembleia da República, se digne providenciar para que, com a maior urgência, seja publicado diploma em que se estabeleça o regime global da transferência de funcionários ou agentes da função pública e que daquele regime constem, nomeadamente, as seguintes regras:

a) Exigência de no acto determinativo da

transferência constarem, concreta e especificamente, os motivos que fundamentam a necessidade da transferência;

b) Obrigação da elaboração de uma lista de

prioridades ou graduação dos motivos

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da transferência (dentro das limitações impostas pelos artigos 51.", n." 3. da Constituição da República Portuguesa), previamente definida e publicada:

c) Obrigação de prévia audição e. sempre

que possível, anuência do funcionário ou agente;

d) estipulação de concessão de subsídios de

transporte, deslocação e ajudas de custo, sempre que a transferência implique mudança de residência ou de domicilio, para u funcionário, com provado prejuízo económico.

4 — O Conselho da Revolução pediu, ao abrigo do artigo 28.", n." 2. do Decreto-Lei n." 505-F/76. de 30 de |unho. que o Provedor indeniilicasse a norma ou normas cuja inconstitucionalidade pretendia ver declarada.

5 — O Provedor respondeu que. não existindo um regime geral relativo à transferência dos funcionários e agentes da função pública, se tornava difícil unia enumeração completa das normas em questão. Indicou, porém, de entre elas, o artigo 1." do Decrcto-Lci n." 356/79, de 51 de Agosto, os artigos 50.". n." 1, e 32.". n.ü I. do Decreto-Lei n." 5I9-A/79. de 29 de Dezembro, e o artigo 1 I." do Decreto-Lei n." 273/79. de 3 de Agosto.

Pediu, porém, a suspensão da apreciação da inconstitucionalidade dessas normas pelo Conselho da Revolução, visto ter conhecimento dc estar em preparação diploma legal genérico sobre a matéria.

6 — Não considerando possível a solicitada suspensão, o Conselho da Revolução decidiu arquivar este pedido de declaração de inconstitucionalidade, com fundamento em insuficiente identificação das normas cuja desconformidade com a Constituição se pretendia ver analisada (Resolução n.° 58/82, de 18 de Março, publicada a 6 de Abril seguinte).

6 — Passagem ã disponibilidade de pessoal do corpo diplomático e consular

Processo n.ü 81/R-1531-QI-18

Um ministro plenipotenciário dc 2.:' classe que fora colocado na situação de disponibilidade manifestou ao Provedor a opinião dc que as correspondentes normas do Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros se não compadeciam com a lei fundamental.

O Provedor, concordando com esse ponto de vista, pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 57." do Decrcto-Lci n° 47 331. de 12 de Novembro de 1966. e 169." a 173.° do Decreto n.° 47 478, de 51 de Dezembro de 1966. E isto com fundamento no seguinte parecer do assessor encarregado do processo:

1 —F ... suscitou perante o Provedor de Justiça a questão da inconstitucionalidade das disposições do Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros (Decreto n." 47 478, de 31 de Dezembro de 1966) relativas à passagem à situa-

ção de disponibilidade por conveniência dc serviço como base na seguinte ordem de argumentos:

a) A manter-se a situação de disponibilidade

por 5 anos, ver-se-á compelido à aposentação, de acordo com o estipulado no artigo 172." daquele Regulamento, sendo certo que para a passagem àquela situação os funcionários visados «não são ouvidos nem têm a possibilidade de se defender das acusações que lhes são f ei las e que são englobadas na conveniência dc serviço»;

b) A decisão ministerial de determinar a

passagem à disponibilidade, precedida do parecer do conselho do Ministério (artigo 32.", n." 6. do Regulamento, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto n." 149/76, de 20 de Fevereiro), é um meio expedito de «obstar aos inconvenientes de instauração de processo disciplinar |...| com a audição do arguido», sabido que no fim de 5 anos na referida situação o funcionário passará à dc aposentado, se para tanto reunir condições, ou será. pura e simplesmente, afastado do serviço;

c) A descrita situação é reveladora da au-

sência de garantias dc defesa cm casos de aplicação de medidas que equivalem à sujeição a verdadeiras penas disciplinares, à margem de todas as regras da Constituição.

2 — Dispõe o artigo 169." do Decreto n.ü 47478. de 31 de Dezembro de 1966, que «os funcionários do serviço diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros í23) podem ser colocados na disponibilidade por conveniência de serviço, abrindo vaga».

O § único do referido preceito acrescenta que serão igualmente colocados naquela situação os funcionários no regime de assistidos como funcionários civis tuberculosos, aos quais se aplicam as disposições especiais desse regime, com prejuízo do prescrito na secção respeitante à situação cie disponibilidade.

O regime dos funcionários colocados na disponibilidade poderá resumir-se nos termos seguintes:

a) Os funcionários na disponibilidade abrem

vaga;

b) Recebem vencimento inacumulávcl, se ti-

verem 5 ou mais anos de serviço, calculado cm termos idênticos aos das respectivas pensões;

(:') Km cujo elenco se encontravam os ministros plenipotenciários dc 2.' classe. V. artigo 87.° do Regulamento:

A promoção a ministro plenipotenciário de 2.a classe depende, além dc j anos de bom c efectivo serviço como conselheiro de embaixada, da prestação durante a carreira de. pelo menos, 2 anos de serviço na Secretaria dc Estado, numa missão diplomática e num consulado.

Saliente-se que os funcionários do serviço diplomático formam, de acordo com o que estabelece o artigo 111." do Regulamento, um quadro técnico de serventia vitalícia.

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c) Podem ser chamados ao serviço, com

direito aos vencimentos por inteiro correspondentes à sua categoria, na Secretaria de Estado ou no estrangeiro, por razões de interesse público, ou colocados em vaga da sua categoria, decorridos que sejam 6 meses sobre a data da passagem à disponibilidade;

d) Os que não forem chamados ao activo

no prazo de 3 anos serão aposentados, se tiverem direito à aposentação, e perderão o lugar, caso não tenham esse direito;

e) O tempo de serviço passado na disponi-

bilidade no serviço apenas será considerado para efeitos de aposentação se durante cie os funcionários, auferindo vencimentos, houverem pago as quotas legais.

Tal regime constava integralmente do artigo 11.° da Lei Orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros, aprovada pelo Decreto-Lei n,° 29 319, de 30 de Dezembro de 1938, tendo sido transposto para a actual, aprovada pelo Decreto-Lei n.° 47 331, de 23 de Novembro de 1966 (artigo 37.°), e reproduzido nos artigos 169.° a 173.° do regulamento do mesmo departamento.

3 — A situação dc disponibilidade específica, cujo regime ficou traçado, decorre do exercício de um poder discricionário conferido ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, verificada que seja a «conveniência de serviço». Este conceito vago deverá, por seu lado, ser integrado por motivação de facto e de direito, conforme jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo í26).

Todavia, a questão do exercício do poder discricionário foi objecto de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, não se justificando nesta fase alguma intervenção a propósito. Por outro lado, tendo sido detalhadamente analisado o problema da conveniência de serviço no processo n." DI-50/80, distribuído ao assessor deste processo, será pertinente remeter para as considerações feitas naquele processo acerca da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 356/79, de 31 de Agosto, reposto em vigor pelo Decreto-Lei n.° 10-A/80, de 12 de Fevereiro (").

Pelas razões expostas, cingiremos a nossa apreciação à falada inconstitucionalidade das normas dos diplomas orgânico e regulamentar do Ministério dos Negócios Estrageiros atinentes à passagem à situação de disponibilidade.

(") V. Acórdão dc 13 de Dezembro de 1980, in Acórdãos Doutrinais, n.° 231, pp. 314 e segs., sobre a exoneração por conveniência de serviço do secretário privativo da missão diplomáica de Portugal na UNESCO e Acórdão do tribunal pleno de 21 de Janeiro de 1981, in Acórdãos Doutrinais, n.° 235, p. 912.

(") Ratificado pela Resolução da Assembleia da República n.° 180/80, dc 2 Jc Junho, e não declarado inconstitucional pelo Conselho da Revolução (v. Resolução n.° 167/81, de 1 de Agosto), com base em parecer da Comissão Constitucional, cuja argumentação não se nos afigurou convincente.

4 — Esta não era, porém, entrada de modo tão severo por diplomas coevos. Assim, o Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, aprovado pelo Decreto n.° 46 982, de 27 de Abril de 1966, dispensava ao referido instituto um tratamento completamente diferente no seu artigo 97.° Este preceito considerava na situação em causa o funcionário que, basicamente, aguardava abertura de vaga da sua categoria em que pudesse ser colocado, mas com direito à contagem do tempo de serviço e a todos os abonos correspondentes â mesma categoria. Nessa situação, os funcionários prestariam serviço onde as entidades competentes considerassem mais conveniente, mas em funções não inferiores às que lhes competiam pela sua categoria.

Para além disso, a Administração só gozava de certa margem de discricionariedade na ordem de reingresso, uma vez que este tinha precedência sobre transferências e quaisquer formas de provimento em lugares onde os funcionários pudessem ser colocados.

No plano doutrinal, o Prof. Marcelo Caetano, ao abordar a questão do direito ao lugar (M), referia-se à situação do funcionário colocado na disponibilidade, salientando que, para além de ficar a receber o ordenado por inteiro, podia ser incumbido de exercer funções eventuais que não impedissem a ulterior afectação a cargo efectivo, ficando na «disponibilidade em serviço». Embora presumindo a hipótese de extinção do cargo ou lugar preenchido por funcionário de nomeação vitalícia, aquele administrativista jamais defendeu o entendimento de que a disponibilidade representava, necessariamente, um fase preparatória da aposentação ou de perda do lugar. Pelo contrário, expressou a opinião de que, em caso de extinção de cargo ou lugar, poderia ser facilitada a passagem do funcionário à situação de aposentado se a Administração não conseguisse a integração do mesmo em lugar de categoria equivalente de outros serviços.

Entretanto, o Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, que criou o quadro geral de adidos, reconheceu aos funcionários adidos na disponibilidade os direitos comuns ao funcionalismo público, com excepção dos inerentes ao exercício de funções, mas sem prejuízo da contagem do tempo de serviço nessa situação para todos os efeitos legais (artigo 26.°, com a redacção que lhe foi dada pelo artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 175/78, dc 13 de Julho). Por seu lado, os artigos 75." da Lei n.° 85/77, de 15 de Dezembro (Estatuto dos Magistrados Judiciais), e 145.° da Lei n.° 39/78, de 5 de Julho (Lei Orgânica do Ministério Público), depois de referirem que se consideram na situação de disponibilidade os magistrados aguardando colocação em vaga da sua categoria nos 5 casos C9) que indicam, acrescentam que tal situação não envolve perda de antiguidade ou de vencimento.

(") V. Manual de Direito Administrativo, vol. n, 9." ed., pp. 736 c segs.

O Termo de comissão de serviço, regresso à actividade após cumprimento de pena ou cessação de licença ilimitada, extinção de lugares que ocupam, termo de prestação de serviço militar obrigatório e demais casos previstos na lei.

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Signilica isto que o regime consagrado na Lei Orgânica e no Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros não encontra paralelo no direito e na doutrina nacionais. Para o facto terá contribuído, indubitavelmente, a manutenção cm vigor da norma do artigo 11." do Decreto-Lei n." 29 319, de 30 de Dezembro de 1938, à margem de toda a evolução legislativa entretanto verificada a nível interno e também do próprio direito disciplinar.

Com efeito, o Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, aprovado pelo Decreto--Lei n." 32 652, de 9 de Fevereiro de 1943, e o estatuto disciplinar vigente (Decreto-Lei n.° 191-D/79, de 25 de [unho) foram aplicados ao pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros por força do que dispõe o respectivo Regulamento Ora, o Estatuto Disciplinar não permitia a aposentação compulsiva nem a demissão [perda do lugar (/'), para usar a terminologia dos diplomas orgânico e regulamentar do Ministério dos Negócios Estrangeiros] sem dependência de processo disciplinar (cf. o artigo 30."). O estatuto disciplinar vigente inovou a este respeito (cf. artigos 36.", n.u I, e 25.°). Sem querermos entrar já na análise do problema da constitucionalidade, poderemos adiantar, todavia, que a rigidez da figura da disponibilidade específica contrasta com o tratamento que à disponibilidade vem sendo concedido no nosso direito administrativo, particularmente no que toca à garantia da estabilidade da relação de serviço público.

5 — Um relance pelçs direitos de alguns países europeus fornecer-nos-á elementos para uma mais adequada compreensão da figura da disponibilidade.

a) No direito espanhol, a situación de disponi-ble, regulada no artigo 4." do Decreto de 28 de Abril de 1966, refere-se ao afastamento de funcionários pertencentes aos corpos gerais da administração civil do Estado que tenham sido nomeados para cargos de livre designação quando não possam ser colocados no mesmo ministério ou na mesma localidade. O funcionário ficará então à disposição da Presidência do Governo, que lhe dará opção para ocupar um posto na mesma localidade onde cessou funções ou naquela donde proveio. Segundo Torreblanca Vergara!.32), não se trata propriamente de uma situação administrativa, porque não confere um status especial ao funcionário. Se o funcionário se encontrava em situação de actividade quando passou à disponibilidade, continuará em actividade, pois o que sucede é

que se encontrava sem destino ao posto de trabalho concreto para exercer funções. Dito de outro modo. o funcionário disponível c aquele que mantém a relação dc serviço, apesar de lhe faltar a relação orgânica.

Re(ira-se que a Ley de Situaciones de 1954 suprimiu a cessação dc funções com fundamento cm conveniência de serviço e que a lei de funcionários vigente apenas reconhece a demissão (separación del servicio) como medida disciplinar (").

fe» No direito italiano ("), a disponibilidade é vista como uma modificação temporária da relação dc serviço decorrente da supressão do cargo ou oficio ou de cessação pela Administração dc actividade que se vinha desenvolvendo. O funcionário só é colocado naquela situação se não puder ser aproveitado para desempenhar outra actividade. Porém, enquanto se mantiver afastado do serviço, perceberá o respectivo ordenado, excluídas as remunerações por serviços especiais ou por trabalho extraordinário, e poderá ser transferido para cargo vago de outro serviço pela Administração ou a seu pedido. A transferência poderá ser a título provisório.

O funcionário na disponibilidade poderá ser chamado ao serviço em qualquer altura 2 anos a contar da data da passagem àquela situação e ser colocado em cargo da mesma categoria da respectiva carreira, com respeito pela antiguidade- que tinha à data em que transitou para a referida situação e pelo vencimento que auferia. Sc. findo aquele prazo, não for chamado à actividade nem transferido para outro cargo, passará à aposentação.

Idêntico tratamento será dispensado ao funcionário que não reassuma funções depois de chamado ou se recuse a exercer funções no novo posto onde haja sido colocado.

c) O artigo 44." do estatuto geral francês (3S) concebe a disponibilidade como a posição do funcionário que, colocado fora do seu serviço de origem, deixa de beneficiar, nessa posição, dos seus direitos à remuneração e à aposentação sem, todavia, perder os direitos adquiridos nessas matérias. Continua, em tal situação, sujeito a todos os deveres previstos no estatuto geral e no estatuto especial — se a algum estiver submetido — enquanto se não reportem directamente ao exercício efectivo de funções no serviço de origem. O funcionário na disponibilidade está sujeito, duas vezes por ano, a inquéritos destinados a assegurar que a actividade do funcionário corresponde aos motivos que levaram a Administra-

(M) O Regulamento remete para o Estatuto Disciplinar dos Funcionários (artigos 111." e 118.*).

(") Embcra a perda do lugar não possa cquiparar-sc completamente à demissão, como adiante veremos. V., a propósito, o § I." do artigo 116" do Regulamento do Ministério dos Negócios Eslrangeiros:

Ao Ministro compete igualmente passá-los à disponibilidade e demiti-los. nos termos legais.

(") Las Situaciones Administrativas dc tus Funcionários dc la Administración Civil del Estado, cd. do Instituto Garcia Oviedo. Universidad de Sevilla, n." 46, 1978, pp. 283-284.

(") losé T. Vergara, ob. cit., p. 286.

(M) Guido Zanobini, in Corso di dirilto amministrutivo, vol. m, 6." ed., pp. 346 c 347.

(") Acerca da situação de disponibilidade no direito francês, cf. La jonction publique et ses problèmes actuels, dc Victor Silvera et Serge Salon, pp. 321 e segs. (ed. de L'Actualité luridique), La jonction publique, dc Eliane Ayoub, p. 154, e Les relations du travail dans le secteur public, de Yves Sai m-(ours, pp. 197 c segs.; v. também La fonction publique. Agents dc l'Etat, des collectivités locales et des grands services publics, de Serge Salon c Jean Charles Savignac, pp 120 c 121.

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çâo a deferir a passagem àquela situação. Esta opera-se oficiosamente — apenas no caso de o funcionário ter esgotado as licenças por doença e não se encontrar era condições de retomar o emprego— ou a pedido do funcionário titular e no interesse deste.

A disponibilidade finda por iniciativa da Administração antes do prazo previsto ou no termo do mesmo (variável, segundo os motivos da passagem à disponibilidade) ou a requerimento do funcionário em qualquer momento no decurso do período de disponibilidade.

Se a disponibilidade não excedeu os 3 anos, a reintegração do funcionário operar-se-á numa das três primeiras vagas que ocorrerem. Caso tenha ultrapassado os 3 anos, a reintegração terá lugar numa das vagas que venham a surgir depois da data em que cessou, teoricamente, a situação de disponibilidade. A inexistência de vagas determina o prolongamento da disponibilidade. O funcionário que não requeira a sua reintegração findo o período de disponibilidade será irradiado do quadro. Aquele que recusar um posto dc trabalho por ocasião da sua reintegração poderá ser aposentado depois dc notificação da comissão administrativa paritária.

d) Por seu lado, o direito administrativo suíço não conhece a figura da disponibilidade como via de modificação ou dc cessação da relação de serviço C36).

6— Menos significativa se não revelará por certo uma abordagem, ainda que breve, de direito comparado a propósito da cessação dc funções, perante as inegáveis conotações desta matéria com a da disponibilidade por conveniência de serviço consagrada na Lei Orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros e reproduzida no respectivo Regulamento.

Aceita-se, a respeito (37), que uma das causas da cessação de funções seja a insuficiência (incapacidade) profissional do funcionário. Este tornou-se, ao fim de certo lapso de tempo, incapaz, desinteressado ou incompetente c já não consegue dar coma das tarefas que lhe estavam confiadas, sendo certo que se não encontrava doente nem podia beneficiar de alguma pensão de reforma. Nesse caso, reconhece-se a possibilidade de a Administração dispensar o funcionário com base em insuficiência dc ordem profissional. Só que, equivalendo tal mecanismo à aplicação disfarçada de uma medida disciplinar, se impõe o reconhecimento das indispensáveis garantias de defesa ao funcionário visado, a começar pela da instauração de processo destinado ao apuramento da alegada incapacidade profissional.

Com esta panorâmica dos direitos interno e estrangeiro, passaremos, de seguida, a apreciar o regime dc disponibilidade regido pelo Decreto--Lei n.° 47 331, de 23 de Novembro de 1966,

V. Droit administratif suisse, dc André Griscl. pp. 262 c segs.

{") Ci. François Grazier, in La fonction publique dans le Monde, p. 145.

e pelo Decreto n.° 47 478, de 31 de Dezembro de 1966, face ao vigente ordenamento constitucional.

7 — Observaremos, desde logo, o desfasamento completo das normas daqueles dois diplomas legais perante as situações reais que deverão reger, tendo em linha de conta, por um lado, a evolução da disponibilidade verificada no direito interno e, por outro, o regime da disponibilidade no plano do direito comparado. Tal desfasamento ficou-se devendo à manutenção nos diplomas de 1966 das normas do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 29 319, de 50 de Dezembro de 1938, consagradoras de um regime cuja severidade e imutabilidade contrastam llagrantcmente com o tratamento dispensado à disponibilidade nos planos nacional e internacional.

A disponibilidade específica, da qual nos vimos ocupando, estabelece, assim, uma indesmentível discriminação no tratamento dos funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros relativamente aos demais funcionários públicos de nomeação vitalícia, enquanto permite a passagem dos primeiros, a pretexto de conveniência de serviço, a uma situação que poderá, eventualmente, levar à aposentação (compulsiva) ou à perda do lugar, ou seja à demissão, sem os efeitos decorrentes da aplicação desta medida disciplinar, uma vez que não foi aplicada na sequência de processo disciplinar.

Para mais, nenhuma justificação aceitável entrevemos para a manuntenção de um regime mais gravoso para os funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros (M). Se não, vejamos:

a) Os funcionários diplomáticos fazem parte de um quadro técnico de «serventia vitalícia», nos termos do que dispõe o artigo 111.0 do Regulamento. Assim sendo, afigura-se contraditório que a Lei Orgânica e o Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros consagrem a abertura automática de vaga pelo funcionário colocado na disponibilidade. Com efeito, não se concebe que os funcionários diplomáticos, que são nomeados definitivamente ao fim de 3 anos de serviço (39), possam ver-se, pura e simplesmente, privados do respectivo lugar com a passagem à disponibilidade, ê que tal mecanismo ilude, na prática, a garantia do direito ao lugar, ou seja, o próprio carácter definitivo ou vitalício do acto de nomeação. A nível do Ministério dos Negócios Estrangeiros, um funcionário de nomeação vitalícia poderá deixar de o ser à margem de questões de ordem disciplinar e independentemente do desaparecimento do cargo ou de determinado serviço. Bastará para tanto que venha a ser colocado na disponibilidade pelo respectivo ministro, sob a alegação de conveniência de ser-

(") Os deveres especiais aos quais estão vinculados os funcionários diplomáticos (artigo 118." do Regulamento) não permitem argumentar, só por si, a favor da disponibilidade dos artigos 169." a 173." do citado Regulamento.

(") Cf. o artigo 83." do Regulamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros.

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viço. E 6 meses após a passagem àquela situação poderá ser colocado em vaga da sua categoria.

De tudo isto resulta que a nomeação vitalícia é para os funcionários diplomáticos uma ilusão, visto que a garantia que o artigo 83." do Regulamento pretende reconhecer fica, no fim de contas, prejudicada pelo regime dos artigos 169.° a I73.u do Regulamento e 37." da Lei Orgânica.

É, pois, nítida a desvantagem dos funcionários diplomáticos perante os demais funcionários públicos e pessoal portador de estatuto especial, como é o caso dos magistrados judiciais e do ministério público. Se, para além disso, tal desvantagem se traduzir numa ausência absoluta de garantia do direito ao lugar, estaremos então em presença de uma relação de emprego — a dos funcionários diplomáticos— caracterizada, basicamente, pela instabilidade.

Ora, não sendo esta característica definidora do estatuto do funcionário público í4") — como não o é da genoralidade dos trabalhadores, de acordo com o disposto no artigo 52", alínea b), da Constituição da República (garantia de segurança no emprego mediante a proibição de despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos) —, a disponibilidade específica agrava particularmente a situação dos funcionários diplomáticos em relação aos demais funcionários (incluindo os portadores de estatuto especial), sem que para tanto haja razão para distinguir entre uns e outros C"). E agrava-a também em lermos patrimoniais, uma vez que, tendo o funcionário menos dc 5 anos de serviço, não receberá remuneração alguma e, contando mais de 5 anos. apenas receberá remuneração inacumu-lávcl calculada em condições idênticas à da respectiva pensão de aposentação. A disponibilidade pode, pois, acarretar a suspenssão ou a redução de vencimentos. E todas as consequências provém de acto unilateral da Administração praticado no exercício de um poder discricionário.

b) Não será difícil concluir que este estado de coisas ofende frontalmente o preceito do n.° 2 do artigo 13." da Constituição da República (prin-

(") Cf. o Parecer n.° 20/75, de 10 de Abril, da Procuradoria--Ceral da República. São, a propósito, elucidativas as medidas restritivas à admissão de pessoal na função pública constantes ilo Decreto-Lei n." 140/81, dc 30 de Maio.

(") A manutenção de regime tão severo poderá ficar a dever-se a razões de ordem disciplinar, funcional ou política. Porém, qualquer dos motivos invocáveis para a vigência daquele regime não resiste às exigências de adaptação da disponibilidade aos direitos entretanto reconhecidos aos funcionários e demais trabalhadores rio tocante à estabilidade da relação dc emprego, a qual se traduz, normalmente, na impossibilidade de afastamento do funcionário ou trabalhador sem causa justificada apurada em processo disciplinar. Ê, pois. manifesta a inviabilidade de manutenção do regime da disponibilidade, tal como é entendido pelos diplomas rio Ministério dos Negócios Estrangeiros, não só perante a legislação ordinária, como face ao ordenamento constitucional, pois ambos reconhecem ao funcionário a possibilidade dc se pronunciar a respeito de actos susceptíveis dc afectarem de modo tão significativo a respectiva carreira. Não esqueçamos que. presentemente, o funcionário apenas poderá impugnar contenciosamente a decisão que o colocou na disponibilidade mediante a invocação de desvio de poder.

cípio da igualdade), considerando os factores de desigualdade apontados c a circunstância de o preceito constitucional citado não conter uma enunciação taxativa, mas exemplificativa (J2).

É, com efeito, discriminatório, face à evolução verificada a nível interno — para já não falar no tratamento concedido à disponibilidade em outras ordens jurídicas —, o regime de disponibilidade próprio dos funcionários diplomáticos, por envolver completa falta dc garantia do direito ao lugar e a penalização pecuniária do funcionário, à margem de qualquer processo no qual o visado possa, dc algum modu, delcnder-se da aplicação de um regime que lhe é manifestamente prejudicial.

c) A incerteza de regresso à actividade no prazo de 5 anos c o consequente espectro da aposentação compulsiva ou da perda do lugar completam o quadro deste regime, do mesmo passo que permitem aclarar u oposição do mesmo ao ordenamento constitucional. Como vimos, o funcionário colocado na disponibilidade pode ser chamado ao activo em vaga da respectiva categoria 6 meses sobre a data da passagem àquela situação. Não goza —ou melhor, continua a não gozar— dc alguma garantia de direito ao trabalho (ou ao lugar, se se preferir), porquanto a chamada à actividade de funções na Secretaria--Geral ou no esLrangeiro não depende do funcionário, mas exclusivamente da Administração, precedendo «razões de interesse público». Quer isio dizer que o funcionário apenas sabe antecipadamente da sorte que o espera, caso não seja chamado a retomar funções, ao fim de 3 anos: transição para a situação de aposentado ou afastado do serviço por perda do lugar.

Trata-se, no fim de contas, de aposentação compulsiva ou dc demissão disfarçada pela figura da disponibilidade. Estava, assim, encontrada uma via cómoda de se conseguir o afas-lamento de funcionários diplomáticos eventualmente reveladores dc insuficiências dc ordem profissional, de condutas susceptíveis de implicarem procedimento disciplinar ou de comportamento político (45) lido por menos adequado pelo titular da pasta dos Negócios Estrangeiros. Em lugar de se proceder disciplinarmente contra o funcionário, este, ouvido o conselho do Ministério, é passado à disponibilidade, prescindindo-se da audição do funcionário e de todos os meios de defesa que o mesmo possa querer utilizar para obstar à coloca-

C:) V. Prof. /orge Miranda, «Regime dos direitos, liberdades e garantias», inserto no volume in dos Estudos sobre a Constituição, o. 54.

(") Comportamento susceptível de constituir o funcionário em responsabilidade disciplinar por eventual falta de acatamento dc directrizes recebidas do ministério encarregado da condução da política externa. Já não se compreende, todavia, u colocação na disponibilidade de funcionário diplomático apenas pelo facto de não ser afecto à corrente política do Executivo. Sobre a aplicação do artigo 52.°. enquanto direito fundamental, ao funcionalismo, são de bastante interesse ns reflexões de José Luís Pereira Coutinho no seu artigo «A relação de emprego na Constituição — Algumas notas», in Estudos sobre a Constituição, vol. in, pp. 696 e segs.

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ção na referida situação. Só que aquela via — cuja sobrevivência ate 25 de Abril de 1974 apenas poderá ser explicada por razões de índole política, uma vez que no plano jurídico nem o Regulamento Disciplinar de 22 de Fevereiro de 1913 nem o Estatuto Disciplinar de 9 de Fevereiro de 1943 í44) podariam ser invocados para apoiar o regime da disponibilidade do Ministério dos Negócios Estrangeiros, porque para a passagem do funcionário à aposentação Cs) (sem ser por razões de doença ou dc limite de idade) ou para a demissão do mesmo (não decorrente da supressão do cairgo ou do serviço) requeriam, como requerem, a instauração dc processo disciplinar— impunha o reconhecimento de meios de defesa ao funcionário.

Ora, o mecanismo da disponibilidade vigente no Ministério dos Negócios Estrangeiros priva o funcionário dc todos os meios de defesa, apesar das consequências inegavelmente severas daquela situação.

Tal privação desrespeita dc modo directo a garantia constitucional de audição e defesa dos funcionários cm processo disciplinar consagrada no n." 3 do artigo 270.° da Constituição da República.

d) A vigência das normas do artigo 37." da Lei Orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros c dos artigos 169." a 173.° do respectivo Regulamento envolverá, em certa medida, uma ofensa pela Administração Pública do princípio da legalidade consagrado no artigo 267.° da lei fundamental, enquanto representa uma aceitação implícita de um regime avesso à Constituição e à lei (n.° 2 do artigo 267.° da Constituição) e uma possibilidade de actuação cm tudo desconforme aos direitos protegidos dos próprios funcionários. Por outro lado, não se vislumbra o interesse público subjacente ao regime da disponibilidade do Ministério dos Negócios Estrangeiros capaz de justificar, de algum modo, o saorifício dos direitos dos funcionários (**). Tal entendimento decorre, sem dúvida, de uma perspectiva de legalidade que se não circunscreve a elementos puramente formais, isto é, às normas jurídicas escritas de tipo legislativo e regulamentar (").

O princípio da legalidade, encarado numa perspectiva eminentemente dinâmica e humanista, implica, de acordo com as conclusões obtidas no

O Cf. artigos 9." cio Regulamento, 30." do Estatuto Disciplinar c 36.°, n." I, do vigente estatuto. E o § 1." do artigo 8." da Constituição dc 1933 respeitava aquele regime dc disponibilidade.

(,s) E a própria passagem forçada à inactividade.

O Acerca da inviabilidade dc sacrifício dos direitos dos cidadãos na prossecução do interesse público, v. Constituição da República Portuguesa Anotada, de Vital Moreira c J. I. Gomes Canoti\ho, p. 461.

(") V. o artigo do Dr. |osé Sérvulo Correia «Os princípios constitucionais da Administração Pública», in Estudos sobre a Constituição, vol. m, pp. 666 e segs.

XVlll Congresso Internacional de Ciências Administrativas de Madrid (w), o respeito por parte da Administração não só dos textos legais, cuja aplicação deve assegurar, mas igualmente das regras e princípios que protegem os legítimos interesses e direitos dos administrados reconhecidos nos planos nacional e internacional.

Ora. sob tal ângulo, aligura-se-nos insustentável a manulenção do regime da disponibilidade específica, do qual nos ocupámos ao longo destas páginas.

8 — De quanto vem de ser exposto dc concluir c que o regime da disponibilidade consagrado nos artigos 57." do Decreto-Lei n.° 47 531, de 21 de Novembro de 1966 (Lei Orgânica do Ministério dos Negócios Estrangeiros), e 169.° a 173." do Decreto n." 47 478, dc 31 de Dezembro de 1966 (Regulamento do referido departamento), ofende as disposições dos artigos 13.", n." 2, 52.°, alínea c), 267." e 270.°. n.° 3, todos da Constituição da República, razão pela qual somos do parecer dc que se justifica o uso pelo Sr. Provedor de )ustiça da faculdade que lhe é conferida pelo n." 1 do artigo 281." da lei fundamental.

0 Conselho da Revolução declarou a inconstitucionalidade das normas em questão mediante a Resolução n." 161/82, de 2 de Agosto (publicada a 2 de Setembro seguinte).

7 — Comparticipação fixa por cada embalagem farmacêutica do receituário dos Serviços Médtco-Sociais

Processo n.L 82/R-270-DI-4

1 — Uma confederação sindical suscitou ao Provedor o problema da constitucionalidade da Portaria n" 131/82, de 29 de Janeiro, que criou uma taxa fixa de 25$ aplicada a cada embalagem farmacêutica do receituário dos Serviços Médico-Sociais.

Sobre a questão foi elaborado pelo assessor encarregado do processo o seguinte parecer:

I) Fundamentos da queixa apresentada

A ... apresentou queixa, na qual suscitou o uso pelo Provedor de lustiça da faculdade que lhe é reconhecida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição da República relativamente à Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro (que criou uma laxa fixa de 25$ por cada embalagem de cada especialidade farmacêutica prescrita no receituário em uso nos Serviços Médico-Sociais a pagar pelos respectivos utentes), invocando, para o efeito e em síntese, os argumentos seguintes:

a) A portaria em causa é materialmente inconstitucional, por «contrariar a tendencial gratuitidade dos cuidados de saúde imposta pela Constituição» no seu ar-

(") V. o nosso relatório sobre o XVIII Congresso Internacional dc Cursos Administrativos, realizado em Madrid de 30 de )unho a 4 de |ulho de 1980 (relatório do Provedor de lusliça de 1980. pp. 248-249).

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tigo 64.°, preceito que não só garante o direito à protecção na saúde, como impõe ao Estado a criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, «cujas linhas gerais vêm expressas nas várias alíneas do n.° 3 do referido artigo»;

b) Revelando aquele preceito constitucional

a «existência de dois comandos», um a atribuir ou reconhecer o «direito à saúde» e outro a exigir dos órgãos competentes a «efectivação desse direito mediante a criação de um serviço nacional de saúde com as características impostas pela Constituição», a «inércia do legislador dá lugar a inconstitucionalidade por omissão», considerando que «nem só a total carência de medidas legislativas, mas também a sua insuficiência determinam a existência do vício»;

c) «Quando o Estado não só não cumpre, por

omissão, o segundo comando (deixando, assim, sem efeito prático o primeiro), como, antes pelo contrário, emite normas que directamente o violam», impõe-se, de conformidade com «doutrina citada, que foi desenvolvida no Parecer n.° 4/77 da Comissão Constitucional», a declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas violadoras da Constituição e, simultaneamente, «recomendação aos órgãos legislativos competentes para que emitam as medidas legislativas necessárias à concretização da norma constitucional»;

d) [ustifica-se, pois, quer o uso da faculdade

prevista no n.° 1 do artigo 281.° da Constituição para que o Conselho da Revolução aprecie e declare a inconstitucionalidade da Portaria n.° 131/ 82, de 29 de Janeiro, quer o «accionamento do dispositivo do artigo 279.° da Constituição, face à omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais referentes ao serviço nacional dc saúde e ao direito à saúde».

II) Apreciação dos argumentos invocados na queixa

l — Relativamente à alegada inconstitucionalidade material:

a) A Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro, assinada pelo titular da pasta dos Assuntos Sociais, para começar a vigorar em 1 de Fevereiro de 1982, veio determinar:

1.° Por cada embalagem de cada especialidade farmacêutica prescrita no receituário em uso nos Serviços Médico-Sociais será cobrada aos utentes uma taxa de 25$.

2." Para aplicação da taxa agora criada, cada prescrição só poderá conter uma embalagem de cada especialidade farmacêutica.

com excepção dos medicamentos apresentados em unidose, cuja prescrição em conjunto se considera como monoprescrição.

Reconhecendo a existência de situações clínicas em que a prescrição de medicamentos não deverá obedecer estritamente ao regime da Portaria n.° 131/82, sob pena de cometimento dc injustiças em relação a «cidadãos cujo quadro clínico obriga a tratamentos continuados por largo período de tempo», a Portaria n.° 188/82, de 13 de Fevereiro, visando «minimizar a incidência daquela taxa para casos de doenças crónicas», veio admitir a prescrição de medicamentos para tratamentos até períodos de 1 mês. Nos termos do n.° 1 desta portaria, ficaram excepcionados da «obrigação de prescrição de monoembalagem» os tonicar-díacos anti-hipersensivos, anticonvulsivos, antibióticos, antiparkinsónicos, terapêutica substitutiva hormonal e antidiabética, citostálicos e imu-nodepressores e antiglaucomatosos.

b) C objectivo que presidiu à criação da taxa de 255?, que passaremos a designar por «taxa fixa», foi o de — respeitando o esquema da comparticipação na aquisição dc medicamentos estabelecido na Portaria n.° 31/71, de 21 de Janeiro (w) — restringir o consumo de medicamentos, perante o verificado aumento de preços dos produtos medicamentosos, a despesa que o Orçamento Geral do Estado terá de suportar relativamente à assistência medicamentosa, sem contar com a prestada pelos hospitais oficiais í50), e o consumo excessivo de medicamentos em certas zonas do País, o qual pode «constituir motivo de preocupação não só no que respeita ao equilíbrio psico-fisiológico do indivíduo, como demonstra situações de manifesto desperdício (5')».

c) Aliás, do penúltimo parágrafo do preâmbulo do citado diploma se constata que a criação da taxa fixa pela prescrição de cada medicamento — «prática corrente em outros países»— resultou da necessidade de pôr em prática uma «política de racionalização na aplicação dos meios disponíveis na prestação de cuidados de saúde».

(") A Portaria n.° 31/71 fixou em 25 % a comparticipação dos beneficiários, pensionistas ou familiares no preço de venda ao público dos medicamentos nacionais ou originários dc países que, por acordo ou convenção em que Portugal seja parte contratante, tenham direito ao tratamento nacional e possam ser adquiridos nas mesmas condições, através das caixas de previdência, em que o são os produtos dc origem nacional. A comparticipação nos restantes medicamentos de origem estrangeira foi fixada em 40 %. Impunha-se este esclarecimento, uma vez que da redacção do primeiro parágrafo da parte preambular da Portaria n.° 131/82 poderia concluir-se, sem mais, que a comparticipação na compra dc medicamentos será de 25 % e 40 % do preço de venda ao público, tratando-se, respectivamente, de medicamentos de origem nacional ou estrangeira. O preço de venda de medicamentos ao público consta do Regimento Geral dos Preços dos Medicamentos e Manipulações, aprovado pela Portaria n." 659/81, de 4 de Agosto. O preço de venda ao público dc especialidades de importação foi, entretanto, actualizado pelo Despacho Normativo n.° 225/77. de 22 dc Novembro.

(™) Estimada em 14 milhões de contos pela portaria.

(") Cf. o quarto parágrafo da parte preambular da Portaria n.° 131/82. de 29 de Janeiro.

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d) Descritos os objectivos e o mecanismo de cobrança da laxa fixa. será chegada a ocasião de confrontá-los com o preceito da Constituição da República invocado, ou seja o artigo 64." Este preceito, como foi referido, depois dc reconhecer, no seu n." 1, o direito de todos os cidadãos ii protecção da saúde, vem explicitar, no sai n." 2, os meios dc efectivação desse direito, entre os quais avulta o da criação de um serviço nacional dc saúde universal, geral e gratuito, e. no seu n.u 3, as tarefas prioritárias que cabem ao Estado nesse domínio, das quais será de realçar a da alínea e):

Disciplinar e controlar a produção, a co-mercialização e o uso dc produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios dc tratamento e diagnóstico.

Sem pôr em causa o carácter imperativo ou vinculativo daquela norma dc cariz programático, ciemos que a «tendencial gratuitidade dos cuidados de saúde imposta pela Constituição no seu artigo 64."» — para utilizar a terminologia da autora da queixa— não é, só por si, prejudicada pela introdução de uma taxa fixa no esquema dc assistência medicamentosa dispensada pelos Serviços Médico-Sociais, lendo em linha dc conta não só a reconhecida tendência para a gratuitidade — objectivo só possível de atingir a longo prazo, pelas alterações de ordem estrutural ou organizativa c dc índole financeira que são exigíveis C1) —• nías também as finalidades visadas pela taxa íixa introduzida pela Portaria n." 131/82, entre- as quais será dc salientar a dc evitar práticas que redundem em desperdício de medicamentos c no consumo exagerado dos mesmos.

A (ais finalidades juntam-se as conhecidas dificuldades de ordem financeira espelhadas no Orçamento Geral do Estado (/') para 1982, no tocante às despesas do orçamento global da segurança social, que atingem a cifra de 157 005 milhares dc contos, sendo de 15 215 as despesas previstas com as prestações de subsídio por doença e maternidade. Será ainda de registar que a des-

C) lnscrindo-sc a assisiência medicamentosa no âmbito da assisiência nu doença, será bom não esquecer a lenta evolução nos planos interno c internacional dos sistemas dc segurança social. IV., a propósito, 1'rof. Sousa Franco, in 1'iiiiinças l'ú-blicas, vol. li. pp. 8 e segs. (ed. da As>ociaçâo Académica da faculdade Jc Direito dc Lisboa, 1981). Ao apreciar a norma do n." 1 do artigo 63.", o autor, depois dc referir (p. 27) que as características, programalicamcnlc definidas, de um sistema moderno, obrigatório, universal e igualitário dc segurança social eslão longe de ser concretizadas, devido ao modo como sc encontram ainda organizadas as instituições de segurança social, reconhece a tendência verificada «antes dc 25 dc Abril dc 1974 para que esta organização permita a realização desses desideratos, tornando-a uma organização global c nacional» (p. 28).|

0') No qual se articula o orçamento da segurança social. Pelo artigo 6." da Lei n." 40/81, dc 31 de Dezembro, que aprovou o Orçamento Geral do Estado para 1982, foi o Governo autorizado a elevar as contribuições para a segurança social relativamente a sectores ou empresas cujas tabelas salariais sofram aumentos superiores a 19% num período de 12 meses. O orçamento da segurança social foi poslo em execução pelo Dccreio-Lei n." 61/82, dc 27 de Fevereiro.

pesa global representa um acréscimo de 28,8 % sobre o valor das despesas correntes orçamentadas em 1981 (,J). Aliás, a análise da evolução financeira recente da segurança social permite concluir que. a par de aumento do número dc beneficiários, se verificou, a partir dc 1977 e até 1980. um decréscimo na qualidade de prestação de semços T5).

e) Em termos de constitucionalidade, não será. pois. decisivo o argumento de ofensa à norma da gratuitidade «tendencial» do artigo 64.", n." 2. da lei fundamental, tanto mais que o Estado, com maior ou menor hesitação e celeridade, tem vindo u cumprir parte das prestações, às quais se encontra vinculado, como contrapartida do direito posilivo (à protecção da saúde) que a lei constitucional reconhece aos cidadãos.

São disso exemplo a criação do Serviço Nacional dc Saúde pela Lei n." 56/79, de 15 de Setembro, dos centros comunitários de saúde e dos órgãos sociais do Serviço Nacional dc Saúde (Decreto Regulamentar n." 85/79. de 31 dc Dezembro), a prestação de serviço médico na periferia (Dccreto-Lci n." 245/80. de 24 dc |ulho). a aprovação do próprio Estatuto do Médico (Decrcto-Lei n." 373/79, dc 8 de Setembro) c a do regime do consultor médico (Dccrclo-Lci n." 201/80. de 25 de |unho). Embora não sejam conhecidas as linhas mestras do serviço nacional de saúde que o Governo sc propôs criar por ocasião da autorização legislativa concedida pela Lei n." 17—A/81, de 8 de Agosto, o certo c que. por não ter sido utilizada cm devido tempo aquela autorização, a mesma caducou (cf. o artigo 2." da l.ci n." 17-A/8I). De qualquer modo, não c posta cm causa a vigência da Lei n." 56/79, que instituiu o Serviço Nacional dc Saúde, tanto mais que no Orçamento Cerai do Estado para 1982 foi prevista uma dotação dc 53 864 milhares de contos para o mesmo Serviço (*).

/) O Serviço Nacional de Saúde já criado representará, pois. um dos passos a dar na caminhada para a meta fixada pelo legislador constitucional — serviço nacional dc saúde universal, geral c gratuito. Note-se que o Serviço Nacional dc Saúde constitui uma das vias para a efectivação do direito à protecção da saúde, pois que ouiras constam do n." 2 do artigo 64." da Constituição, como a da «criação de condições económicas, sociais e culturais que garantam a protecção da infância, da juventude c da velhice» e de «melhoria sistemática das condições dc vida c dc trabalho». Vem. isto para frisar que a Constituição sc não alheou das condições económicas pressupostas para a realização daquele direito, condições essas que estão igualmente na base da efectivação dc outros direitos constitucionalmente reconhecidos

(M) Anexo iv da lei do orçamento, l") Prof. Sousa Franco, ob. cit., p. 30.

(*) V. n." 21 da parle preambular do Dccieio-lxi n." 364/81. dc 31 dc Dezembro, que põe em execução o Orçamento Geral do Estado para 1982.

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aos cidadãos (57), como, por exemplo, os direitos à segurança social (artigo 65."), à habitação (ar tigo 65."). ao trabalho (artigos 51." e 52.") e ao ambiente e qualidade de vida (artigo 66."). Com eteiio, todas as incumbências atribuídas ao Estado para a plena efectivação desses direitos pressupõem a existência dos indispensáveis meios financeiros C*).

E o direito à protecção da saúde não escapa a tal situação, para mais, conhecidos os objectivos da Portaria n." 151/82. oportunamente explicitados, dc contrariar o consumo excessivo e o próprio desperdício de medicamentos.

g) Não será. assim, linear o entendimento de que existe uma inconstitucionalidade material consubstanciada na ofensa à regra da progressiva gratuitidade do serviço nacional de saúde, assinalada no artigo 64." da Constituição, pela portaria que criou a taxa fixa. Desde logo. porque, como vimos, a lei fundamental não deixou de reconhecer a indispensabilidade de meios financeiros para que o Estado possa assegurar o exercício dos já falados direitos fundamentais, entre os quais se conta o da protecção da saúde. E, se o Estado se debate com a insuficiência de verbas para fazer face aos múltiplos problemas económicos e sociais, não estará posta dc parle a adopção de medidas restritivas e moralizadoras —como as que foram anunciadas, para fundamentar a criação da taxa lixa. na parte preambular da Portaria n." 151/82—. as quais, representando um au-têntico agravamento dos custos da assistência medicamentosa (melhor dizendo, do próprio esquema dc comparticipação dos beneficiários dos Serviços Mcdico-Sociais na aquisição de medicamentos, ainda que de forma indirecta, como adiante iremos demonstrar), não deixam de se inserir no objectivo da gratuitidade tendencial ou progressiva dos serviços de saúde (em sentido lato), atendendo às já apontadas condicionantes dc ordem económico-financcira que forçaram o Estado (Administração Pública) a travar o consumo excessivo dc medicamentos e o desperdício destes.

/;) Para alem do mais. e sem esquecer a fase actual do sistema de segurança social (M) — cujas

("') Direitos fundamentais dc carácter económico, social c cultural.

{"*) As sucessivas alterações do regime de financiamento para aquisição dc habitação própria, ditadas pela exiguidade ou carência dc verbas orçamentais, são a prova da inequívoca dependência da efectivação de determinados direitos (neste caso. do direito à habitação) de factores dc ordem económica c financeira.

O Ouc se vem aproximando, na orgânica e nos processos dc funcionamento, dos princípios básicos de um sistema moderno de segurança social, embora se esteia bastante longe do objectivo linal, ou seja da concepção do sistema dc segurança social como uni serviço público igual aos outros, que deve ser financiado pela generalidade dos contribuintes através apenas dc receitas consignadas no Orçamento Geral do Ksludo ív. l'rof. Sousa Franco, ob. e/t., pp. 24 a 30 e 33). A referência ao sistema dc segurança social decorre da sua indissociabilidade das funções do Estado e das formas dc satisfazer as necessidades dc saúde, ainda que estas sejam diferentes das da segurança social. Daí que o sistema moderno de segurança social seja caracterizado pela obrigatoriedade, pela universalidade c pela igualitariedade (Prof. Sousa Franco. ob. c/7., p. 21).

receitas são suportadas pelos trabalhadores, pelas empresas e pelo próprio Estado, através das receitas dos impostos —. o agravamento pontual de custos já referido não constituiu, só por si, uma medida de oposição frontal à regra da gratuitidade progressiva dos serviços dc saúde (M). Antes poderá entender-sc que tal agravamento representa uma tentativa de defesa daquele objectivo de gratuitidade perante as dificuldades de ordem conjuntural que afectam a economia portuguesa, a avaliar pelos objectivos confessados da portaria posta em crise. A taxa fixa terá sido uma espécie de comparticipação C1) indirecta nas despesas imposta pelo Executivo aos beneficiários dos Serviços Mcdico-Sociais segundo o mecanismo vigente do seguro social ("2). A taxa fixa terá pretendido significar ainda as limitações das verbas orçamentais destinadas à cobertura dos encargos com a protecção da saúde dos Portugueses.

Nesta óptica, não se nos afigura defensável a tese da inconstitucionalidade material (6') da Portaria n." 151/82, tanto mais que a Administração poderá reduzir, por imperativos orçamentais (w), a sua percentagem na comparticipação nas despesas para aquisição de medicamentos pelos beneficiários das instituições de previdência.

t") A ideia do serviço nacional de saúde surgiu na >.' fase dc segurança social (fins da Segunda Grande Guerra), no relatório Bevcridgc de 1944. Depois dc muito discutida, foi objecto da formulação dc diversas alternativas, todas diferentes da medicina privada livre ou em regime convencional.

(*') Importará distinguir as comparticipações dos beneficiários das contribuições destes para as instituições de segurança social, uma vez que constituem receitas perfeitamente distintas daquelas instituições, conforme resulta das alíneas b) c r*) do artigo 154." do Decreto n." 45 266. de 23 dc Setembro dc 1463. que regulamentou as disposições da Lei n." 2115, de 18 dc lunho de 1962.

t":) Acerca do carácter sinalagmático do seguro social, v. Teor/V/ ila Relação furidica do Seguro Social, do Dr. )osé M. Sérvulo Correia, pp. 311 a 325.

('") Também designada por «substancial» ou «doutrinária», ocorre quando o conteúdo dc um acto do poder político contraria o conteúdo de uma norma constitucional. Sobre os tipos dc inconstitucionalidade, cf. Marcelo Rebelo de Sousa, in Direito Constitucional, vol. i. pp. 369 a 372. |. G. Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada, pp. 484 c segs.. e (. G. Canotilho. in Direito Constitucional, vol. i. pp. 393 e segs.

tM) Nos termos do disposto no artigo 9.' do Decreto Regulamentar n." 12/77. dc 7 de Fevereiro, o financiamento dos Serviços Médico-Sociais será assegurado, até à concretização do previsto no artigo 64.° da Constituição, através da Secretaria de Estado da Segurança Social, que lhes atribuirá mensalmente um duodécimo do orçamento aprovado. O Decreto Regulamentar n." 12/77 deu execução ao Dccreto-I.ci n." 17/ 77. de 12 de laneiro. que determinou a transferência dos Serviços Médico-Sociais das instituições dc previdência dc inscrição obrigatória para a Secretaria de Estado da Saúde.

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invocando o principio do máximo de eficiencia terapêutica, aliado ao da economia sem com tal actuação ofender a norma programática do n.° 2 do artigo 64.° da Constituição.

2 — Quanto à alegada inconstitucionalidade por omissão:

O instituto da inconstitucionalidade por omissão (ao qual se contrapõe o da inconstitucionalidade por acção) reduz-se à ausencia, parcial ou total, de medidas legislativas requeridas para a exequibilidade plena de normas constitucionais positivas, conforme decorre do artigo 279.° da Constituição (w). Só que a iniciativa do processo de fiscalização da inconstitucionalidade por omissão cabe exclusivamente ao Conselho da Revolução, através da solicitação de parecer ao seu órgão consultivo, a Comissão Constitucional [artigos 146.°, alínea b), e 284.°, alínea b), da Constituição], nada impedindo que a questão seja suscitada mediante exercício do direito de petição consagrado no artigo 49.° da Constituição, para lá das divergências doutrinais sobre o modo do exercício deste direito. O Provedor de Justiça apenas poderá solicitar a apreciação e declaração de inconstitucionalidade de quaisquer normas de acordo com o disposto no artigo 281.°, n.° 1. da Constituição e no n.° 2 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro. Daí que lhe esteja vedada alguma intervenção no domínio da alegada inconstitucionalidade por omissão.

Os pressupostos desta terão, assim, de ser apreciados em sede própria, a fim de se concluir ou não pela existência de uma omissão juridicamente relevante, de conformidade, aliás, com a orientação defendida no Parecer n." 4/77, de 8 de Fevereiro, da Comissão Constitucional (67). Pelas razões vindas de expor, não poderá o Provedor de Justiça pronunciar-se a respeito da pretendida inconstitucionalidade por omissão.

Ill) Possíveis inconstitucionalidades material, orgânica e formal das normas dos n." 1 e 2 da Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro, por violação dos artigos 106.", n." 2 e 3, e 167.", alínea o), da Constituição.

I — Apesar de os argumentos aduzidos pela reclamante se revelarem improcedentes, a Portaria n.° 131/82 merecerá atenta reflexão, com o objectivo de se lhe detectar a respectiva natureza tributária. Os conceitos de taxa e imposto têm

(") Cf. bases x e xxxui da Lei n.° 2115, de 18 de |unho de 1962, e artigos 32.". 44." e 45." do Decreto n." 45 266, de 23 de Abril de 1963.

(") Cf. Prof. J. Miranda, «Inconstitucionalidade por omissão», in Estudos sobre a Constituição, vol. i, pp. 339-352. I. G. Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., p. 500, e J. G. Cano-lilho, ob. cit.. pp. 388 e 389; v. também Manual de Direito Constitucional, t. it, do Prof. Jorge Miranda, pp. 664 e segs.

(1T) Neste parecer, publicado no vol. li dos Pareceres da Comissão Constitucional, viria a concluir-se pela inverificação dc inconstitucionalidade por omissão, por se encontrar em curso um processo legislativo na Assembleia da República destinado a dar exequibilidade às normas dos artigos 56.°. alínea b). e 58.°. n.° 2, alínea a), da Constituição.

vindo a ser abundantemente tratados na doutrina c na jurisprudência portuguesas, como foi referido nos pareceres emitidos nos processos n.°* 73-DI-37-A-3 e 79-R-2819-DI-51-A-2, cuja síntese consta dos relatórios do Provedor de fustiça de 1979 (pp. 46 a 49) e de 1980 (pp. 56 a 59). Poderemos, pois, partir do conceito de taxa como uma prestação pecuniária coactiva, sem carácter penalizador, mas a cujo pagamento corresponde uma contraprestação de um serviço por parte do Estado, e do de imposto como prestação pecuniária coactiva e unilateral, sem o carácter de sanção, exigida pelo Estado com a finalidade de realização de fins públicos (M). Assentando o sistema fiscal português no binómio ira-pojto-taxa, teremos de, com base nas características da designada «taxa fixa de 25$» da Portaria n.° 131/82, integrá-la num daqueles tipos de tributos e, de seguida, aplicar-lhe o respectivo regime.

2 — Respeitando a comparticipação na compra de medicamentos estabelecida pela Portaria n.° 31/71, de 21 de Janeiro, à qual nos referimos, a taxa da Portaria n.° 131/82 poderá ser caracterizada nos seguintes termos:

a) é uma «criação» daquele diploma, que

se dispensou de invocar alguma base legal para a aprovação do tributo em questão, embora se presuma ter o seu apoio no artigo 7.° da Lei n.° 56/79;

b) Incide sobre cada embalagem de cada es-

pecialidade farmacêutica prescrita no receituário dos Serviços Médico-Sociais (w), sendo cobrada, como se entrevê, no acto de aviamento (70) das receitas, ou seja, do fornecimento dos medicamentos nas farmácias;

c) Tem valor único, ou invariável, no raon-

ante de 25$, pelo fornecimento de cada embalagem de cada especialidade prescrita ao utente dos Serviços Médico--Sociais (");

d) ê cobrada pela entidade fornecedora

dos medicamentos (farmácias), sendo

(M) V. Lições de Finanças Públicas, do Prof. Teixeira Ribeiro, pp. 262, 263 e 267, Manual de Direito Fiscal, do Dr. Alberto Xavier, pp. 42 e segs., Princípios de Direito Fiscal, do Dr. António Braz Teixeira, pp 37 e segs.. Finanças Públicas e Direito Financeiro, do Prof. Sousa Franco, com a colaboração de E. Paz Ferreira, ed. da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, pp. 161 e segs.; v. também os pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n." 53/78, de 13 de Abril, e 64/80, de 28 de Agosto (Diário da República. '2.' série, n.°* 136, dc 16 de Junho de 1978, e 16, de 20 de laneiro de 1981). A jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo pode ser apreciada nos Acórdãos de 2 de Novembro de 1978 (Acórdãos Doutrinais. n.° 204, pp. 1473 e segs.) e de 26 de Abril de 1979 (Acórdãos Doutrinais. n.° 214, pp. 870 c segs.). Na doutrina estrangeira, a noção de taxas administrativas não sc afasta sensivelmente da que foi dada (cf. Finances publiques, de Maurice Duverger--Themis, ed. PUF, pp. 95 a 98).

(w) Exceptuando os casos previstos na Portaria n." 188/82, de 13 de Fevereiro.

(™) Este aspecto foi explicitado no despacho do Ministro dos Assuntos Sociais inserto no Diário da República. 2." série, n." 47, de 26 de Fevereiro de 1982, p. 1429.

(") Só podendo cada prescrição conter uma embalagem (n." 2." da Portaria n." 131/82).

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omissa a portaria (") acerca do destino a dar às importâncias cobradas pelos fornecedores de medicamentos; c) Tem, ainda que reflexamente, o objectivo dc obtenção de receitas para os Serviços Mcdico-Sociais.

3 — Recuando um pouco na tentativa de pra.-ceder ao enquadramento legal na Portaria n.° 131/ 82, poderemos constatar que, nos (ermos do disposto nas bases v. n." 1, x e xxxm da Lei n." 2115, «as condições gerais de atribuição das prestações» a conceder pelas instituições de previdência, nas quais se inclui a assistência medicamentosa (73), deveriam constar dc diploma regulamentar do Governo. Em execução de tal lei foi publicado o Decreto n.u 45 266, de 23 de Setembro dc 1963, cujo artigo 32." considerou inserida no esquema de protecção na doença a assistência medicamentosa, presentemente a cargo dos Serviços Médico-Sociais, por força do disposto no artigo 1." do Decreto-Lei n.° 17/77, de 12 de janeiro, e no artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 12/77, de 7 de Fevereiro. A assistência medicamentosa será dispensada enquanto durar a doença (n.° 1 do artigo 38." do Decreto n.° 45 266), tendo em vista o máximo de eficiência terapêutica c dc economia (n.° 1 do artigo 44." do Decreto n." 45 266). As condições de concessão de medicamentos foram relegadas para regulamento, de acordo com o n.° 2 do último preceito. As duas formas de fornecimento de medicamentos (farmácias abertas ao público mediante apresentação de receita médica exarada cm impresso da caixa e serviços próprios das caixas) foram contempladas no artigo 45." No artigo 46.° foi prevista a comparticipação (74) dos beneficiários nos serviços de consultas, visitas domiciliárias, elementos auxiliares de diagnóstico, medicamentos, internamento hospitalar e restantes meios de tratamento.

A comparticipação na aquisição de medicamentos consta da Portaria n.° 31/71, dc 21 de Janeiro, na base de 25 % ou 40 % do preço dc venda

(") Nos lermos do n." 2 do despacho minislerial dc 3 dc Fevereiro dc 1982, publicado em 26 dc Fevereiro, o valor das laxas cobradas será mensalmente creditado na conta corrente dc «ida farmácia, por forma a reduzir os prazos dc pagamento actuais.

(") A assistência medicamentosa corresponde a um tipo da modalidade das prestações cm espécie abrangidas pelo regime do seguro dc doença (cf. Legislação de Segurança Social, vol. t, dc Apclles |. B. Conceição c |osé Pinto Valente, p. 42).

(") O esquema comparlicipativo constante do regulamento aprovado pelo Decreto n." 45 266 estará implícito na Ix:i n." 2115 (bases v c x), atendendo à índole actual do nosso sistema de segurança social, que não cobre a totalidade dos encargos decorrentes do mesmo. Tal situação está bem patente nos mecanismos de gestão financeira da segurança social. Com efeito, como receitas das instituições estão contempladas, ao lado das contribuições patronais, das contribuições dos beneficiários e das comparticipações destes, as que, para o efeito, lhe forem consignadas pelo Orçamento Geral do Eslado (cf. o Decreto-Lei n.u 61/82. de 27 de Fevereiro).

ao público, percentagem que, como referimos, não sofreu alteração. Trata-se de uma receita das instituições de segurança social, a qual revestirá, no entender de alguns economistas (75), a natureza de receita retributiva [cf. alínea c) do artigo 154." do Decreto n.° 45 266J. Ora, este tipo de receitas pressupõe a existência de uma relação económica dc contraprestação entre o pagamento da receita por parte da entidade que a ela está vinculada e o recebimento de compensações das instituições de segurança social, desde que surja o evento que confere direito às compensações. Diversa será a natureza das contribuições . obrigatórias para as instituições de segurança social a pagar pelas entidades patronais e pelos trabalhadores [alíneas a) e b) do artigo 154." do Decreto n.° 45 266].

Estas últimas receitas, para lá das divergências doutrinais (76) sobre a sua natureza fiscal (como imposto ou taxa), parecem, face à evolução legislativa a que se tem vindo a assistir, merecer a qualificação de «impostos». São deveras significativas as autorizações legislativas concedidas ao Governo pela Lei n." 4/81, de 24 de Abril, para elevar a contribuição dos funcionários públicos para a ADSE para 1 % (artigo 56.°) e pela Lei n.° 39/81, de 31 de Dezembro (artigo 6.°), para elevar as contribuições para a segurança social em 1982 relativamente a sectores ou empresas cujas tabelas salariais sofram aumentos superiores a 19 % para um período de 12 meses.

Presentemente, são atribuições dos Serviços Médico-Sociais garantir a continuidade das prestações de acção médico-social devidas aos beneficiários das instituições de previdência e respectivos familiares e colaborar nas acções tendentes ao funcionamento integrado dos serviços de saúde, segundo dispõe o n.ü 1 do artigo 3." do L">ecrelo Regulamentar n.° 12/77, de 7 de Fevereiro. O financiamento dos Serviços Médico--Sociais é assegurado, até à concretização do objectivo previsto no artigo 64.° da Constituição, através de verbas da Secretaria de Estado°da Segurança Social. Por seu lado, o artigo 7.° da Lei n." 56/79, dc 15 de Setembro (Lei do Serviço Nacional de Saúde), reafirmou o princípio da comparticipação, embora apontando para o objectivo final da gratuitidade do serviço nacional de saúde, ao consentir no estabelecimento de «taxas moderadoras diversificadas». A interpretar o"e

(") Cf. Prof. Sousa Franco, ob. cit., pp. 32 c segs.

(") Sobre a qualificação das contribuições como «taxas», cf. Dr. Sérvulo Correia, ob. cit, pp. 305 a 311, e o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Gcral da República n.° 64/80, de 28 dc Agoslo, atrás citado. Em defesa da natureza parafiscal dc (ais receitas, v. Dr. A. Xavier, ob. cit., pp. 66 a 69. Este autor considera as contribuições para a Previdência como um «prémio de seguro dc direito público» cm relação às contribuições dos beneficiários.

Quanto às das entidades patronais, o autor inclina-se para a mesma solução, embora não deixando dc reconhecer a afinidade com o imposto. Contra tal entendimento, cf. Prof. Sousa Franco, in Finanças Públicas, vol. li. pp. 35. 36 e 37.

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modo diferente o preceito, teremos então de admitir que, perante a gratuitidade do serviço nacional de saúde, inexiste, na base das taxas moderadoras, uma relação de contraprestação (").

4 —Em virtude de na parte preambular da Portaria n.° 131/82 se referir que a taxa fixa pela prescrição de cada medicamento é prática corrente em outros países, convirá, embora com a indispensável brevidade, abordar, a respeito de tal matéria, os direitos belga e francês.

Para o primeiro, a parte do custo das prestações não é coberta pelo seguro social, mas sim pelo beneficiário, denominando-se, na linguagem corrente, a intervenção pessoal deste na cobertura parcial dos encargos por ticket moderateur (7S).

O mecanismo da taxa moderadora visa travar o recurso às prestações de saúde, partindo, assim, o legislador da presunção segundo a qual o segurado tem de suportar parte do custo da prestação, presunção que pode ser ilidida, quer com base na situação do beneficiário, quer no próprio valor da prestação. O princípio da comparticipação (ticket moderateur) encontra-se estabelecido no artigo 25.° da Lei de 9 de Outubro de 1965. O rei poderá, em certas condições, limitar a comparticipação do beneficiário até um montante que não pode ser superior a 25 % do custo da prestação ou grupo de prestações. Tal princípio é igualmente aplicável ao fornecimento de medicamentos (7'), podendo o rei fixar a comparticipação do beneficiário em função de uma taxa uniforme, que não de percentagem do custo dos produtos farmacêuticos.

No direito francês vigora princípio idêntico (w), cujo objectivo foi o de evitar possíveis abusos. Não correspondendo o reembolso à totalidade dos custos despendidos pelo segurado, deverá este ter de suportar parte das despesas (reembolso parcial). Porém, a fracção a suportar pelo segurado deve ser fixada em decreto. A taxa do ticket moderateur praticada em França é fixada com base em percentagens para o fornecimento de

f') O artigo 7.° da Lei n." 56/79, respeitando a norma constitucional do n." 2 do artigo 64.°, reafirmou o princípio da gratuitidade de acesso ao Serviço Nacional de Saúde. Tal acesso, como vimos, ainda se não concretizou nos termos previstos na Constituição da República, por razões de ordem ceo-nómico-financeira. Independentemente disso, e em termos teóricos, sendo gratuita a prestação dc cuidados de protecção da saúde pelo Serviço Nacional de Saúde, não poderá colocar-se a questão da comparticipação dos utentes cm termos dc uma «taxa», mas unicamente como autêntico «imposto» especial (indirecto) sobre o consumo de medicamentos. Isto apesar da designação do tributo por «laxa moderadora diversificada».

(") Cf. Droit de la sécurité sociale, de Pierre Denis. 3." ed.. p. 31 (Edições Larcier).

(") De lai esquema resulta que o beneficiário paga apenas o ticket moderateur ao farmacêutico, sendo este reembolsado da diferença pelos organismos seguradores (cf. Pierre Denis, Ob. cit., p. 36).

(w) Cf. Sécurité sociale, de lacques Doublet, pp. 142 e 143. colecção «Themis». ed. Presses Universitaires de France.

medicamentos, para as despesas de internamento hospitalar e para pagamento de honorários dos médicos e meios complementares de diagnóstico.

No período de maternidade não tem aplicação a referida taxa. À semelhança do que sucede em Portugal, os beneficiários são reembolsados em percentagens variáveis, segundo o tipo de medicamentos a fornecer pelas farmácias, considerados passíveis de reembolso perante a sua reconhecida indispensabilidade terapêutica. A referir ainda que o Código da Saúde prevê a possibilidade de, por decreto, serem estabelecidos esquemas específicos de fornecimento de medicamentos com o objectivo de evitar o esbanjamento dos mesmos. Entre nós a finalidade da taxa moderadora de racionalizar a utilização das prestações situa-se num campo algo diverso, de acordo com o princípio da gratuitidade, embora ainda nos encontremos —e não se sabe por quanto tempo — numa fase de comparticipação.

Munidos destes elementos, será altura de procedermos à caracterização da Portaria n.° 131/82.

5 — Deixaremos para um segundo momento a questão sobre se a taxa fixa poderia ter sido criada por portaria do Ministério dos Assuntos Sociais, ou seja por mero diploma regulamentar, considerando que a resposta dependerá da qualificação a efectuar.

Pelo que ficou dito, não será difícil concluir que o mecanismo estabelecido pelo referido diploma não deixa transparecer alguma relação sinalagmática directa ou reflexa entre o beneficiário dos Serviços Médico-Sociais —no acto de pagamento da taxa de 25$ ao fornecedor dos medicamentos — e aqueles Serviços. A contraprestação destes mantém-se, basicamente, porque não foi alterada a percentagem de comparticipação dos utentes de 25 % e 40 %, de acordo com a Portaria n.° 31/71.

Assim, a designada «taxa fixa» situa-se fora do âmbito da contraprestação (cobertura parcial do custo dos medicamentos a cargo dos Serviços Médico-Sociais) (8I). Em termos contabilísticos, po-der-se-á afirmar que os utentes dos Serviços Médico-Sociais, no acto de fornecimento dos medicamentos, terão direito a beneficiar do esquema comparticipativo (ou de contraprestação parcial na cobertura dos preços de venda de medicamentos ao público fixados na Portaria n.° 659/81, de 4 de Agosto) na percentagem de 25 % ou 40 % e que ficarão, simultaneamente, sujeitos a ver acrescida à importância resultante do esquema comparticipativo a quantia de 25$ multiplicada pelo número de cada embalagem de cada especialidade farmacêutica que figurar nas receitas médicas.

(") Não poderá dc algum modo sustentar-se que a taxa fixa representa um prolongamento da assistência médica, perante a evidente autonomia das prestações inseridas no quadro de protecção na doença. Aliás, é inadmissível a defesa do argumento dc que as taxas moderadoras diversificadas possam ser qualificadas como verdadeiras «taxas» precisamente por íhes faltar a bilateralidade que caracteriza tal tipo de tributo, cujo único objectivo, face ao disposto no artigo 7.° da Lei n.° 56/79, é o de «racionalizar a utilização das prestações».

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6 — Continua, portanto, a verificar-se a utilização dc um serviço público (Serviços Médico-•Sociais). no plano da assistência medicamentosa, pelos respectivos utentes, sem que se tenha alterado o esquema de comparticipação na cobertura dos respectivos encargos. O elemento inovador — taxa fixa — consiste num agravamento autónomo no acto de fornecimento dos medicamentos. Com efeito, a taxa fixa não tem a apoiá-la algum nexo sinalagmático enlrc o pagamento desse tributo e a prestação de uma actividade ou utilidade pelo ente público (Serviços Médico-Sociais). No domínio da assistência medicamentosa, que agora nos ocupa, a prestação do serviço esgota-se com a fixação das condições em que os utentes podem adquirir os produtos farmacêuticos, nas quais se incluem as percentagens que deverão desembolsar (25 % e 40 %) e os medicamentos abrangidos pelo esquema de comparticipação (K). A laxa fixa é um elemento que, podendo estar remotamente (M) ligado ao fornecimento (pois que sem o pagamento dela o farmacêutico não aviará a receita nos moldes praticados pelos Serviços Médico-Sociais), não faz dele parte integrante. E tanto assim é que, se, por hipótese, não convier ao utente o aviamento desta ou daquela embalagem prescrita na receita, em virtude de o agravamento introduzido pela taxa tornar o produto receitado mais caro para o utente dos Serviços Médico-Sociais do que para o adquirente normal, que o paga ao preço de venda ao público, a taxa poderá deixar de ser cobrada.

Para justificar a cobrança da taxa fixa não se descortina sequer alguma intervenção dos Serviços Médico-Sociais. Estes viram-na aprovada por portaria, com o objectivo muito bem definido de se pôr cobro a situações de consumo desmesurado ou de desperdício e também dc conseguir receitas para os Serviços Médico-Sociais, mas não com a finalidade de resposta a alguma solicitação dos utentes í"4).

(n) A este esquema de comparricipação oportunamente aprovado é que poderá, com propriedade, chamar-se de «taxa moderadora no fornecimento de medicamentos ou na prestação da assistência medicamentosa». No fim dc contas, mantém-se o sinalagma — pagamento das contribuições à Previdência e recebimento de prestações, parcial ou totalmente, custeadas pela segurança social. A respeito do carácter sinalagmático da relação do seguro social, sustenta o Dr. Sérvulo Correia que as contribuições e as prestações estão ligadas por um firme sinalagma genético c por um sinalagma funcional atenuado (v. ob. cit.. p. 324). Ora, a ausência de tais relações caracteriza a Portaria n.° 131/82.

(") Até pelo carácter autoritário do pretendido tributo.

(M) A taxa corresponde a um preço autoritariamente fixado pago pela utilização individual de bens semipúblicos e que retira a sua razão de ser de uma actividade do Estado ou dc outro ente público dirigida ao obrigado ao pagamento, quer tal actividade tenha ou não sido solicitada ou desencadeada pelo interessado. Então perguntar-se-á: qual a actividade do EsAado ou dos Serviços Médico-Sociais justificativa do pagamento da taxa fixa, uma vez que já se encontrava estabelecido o esquema comparticipativo e ou moderador?

7 — Embora louvável, a finalidade visada é de índole inegavelmente «penalizadora» (no sentido de agravar os custos) do consumo, uma vez que é estranha ao mecanismo de contraprestação gerado pelo pagamento das contribuições à Previdência e ao esquema comparticipativo.

E aqui residirá, em nosso entender, o aspecto nuclear da «taxa fixa de 25$». Para já, não poderá retirar-se, quer dos preceitos da Lei n.u 2115 c do Decreto Regulamentar n." 45 266, quer do artigo 7.° da Lei n.° 56/79, argumento susceptível de fundamentar a criação daquele tributo por mero diploma regulamentar, verificada a falta de nexo sinalagmático na relação tributária em causa. Nas expressões «condições gerais de atribuição das prestações a conceder pelas caixas» (base x da Lei n.° 2115) e «condições de concessão de medicamentos» (n.° 2 do artigo 44.° do Decreto n." 45 266) não poderá encontrar-se fundamentação válida para a criação de tributos como aquele que a Portaria n.° 131/82 consagrou. Aceita-se que, na base do princípio da comparticipação decorrente da fase actual do nosso sistema de segurança social, possam ser criadas taxas moderadoras (ou de comparticipação dos utentes) na repartição dos encargos decorrentes do funcionamento das instituições incumbidas de dispensar prestações de protecção da saúde, já não será, contudo, líquido que desses preceitos legais possa extrair-se a faculdade de criação de tributos que se não possam enquadrar na figura da taxa, cujos traços essenciais já foram indicados. O mesmo pode dizer-se da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (artigo 7.°).

Desde logo porque na taxa fixa a relação na qual se processou a cobrança tem lugar, como vinha sucedendo, entre o utente e o fornecedor de medicamentos (farmácia). Os Serviços Médico--Sociais apenas intervêm em momento posterior, para o efeito de acerto de contas, ou seja para custear a parte que lhes compete da prestação de assistência medicamentosa. O esquema comparticipativo, ou «taxa moderadora», insiste-se, não sofre alteração (8S). Elemento novo é o representado pela introdução de uma espécie de «adicional» ao preço de cada embalagem de cada especialidade com o intuito de dificultar o consumo de produtos farmacêuticos e, simultaneamente — embora se admita que tal objectivo não tenha sido querido de forma imediata —, obter receitas para financiamento dos Serviços Médico--Sociais. Por outro lado, a contrapartida dos Serviços Médico-Sociais continua a ser a mesma — o fornecimento de medicamentos na base de percentagens conhecidas. As contribuições dos utentes são ainda as mesmas, o mesmo se podendo dizer das comparticipações. Verdadeiramente, cons-

(u) Embora, face à legislação vigente, possa sofrer modificações por iniciativa da entidade prestadora dc cuidados de saúde entre 25 % e 40 %. A taxa fixa configura-se, pois, como um esquema de sobreposição ao comparticipativo, mas um esquema unilateral, daí derivando a sua proximidade dos impostos.

Constata-se, portanto, que na fase actual de protecção da saúde ainda não atingimos a meta da gratuitidade do serviço nacional de saúde.

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tata-se, a taxa fixa não está ligada, directa ou indirectamente, à prestação de um serviço por forma a poder afirmar-se a existência de nexo sinalagmático. A taxa fixa tem uma função correctiva, que é inteiramente marginal à relação de seguro social que se estabeleceu entre o utente e os Serviços Médico-Sociais. Também importará salientar que o conceito de sinalagma requer uma equivalência de ordem jurídica, segundo a qual as prestações recíprocas se devem efectuar, em regra, simultaneamente, e, se uma delas não for cumprida, o devedor da outra poderá recusar o seu cumprimento (w). Mas, como já deixámos referido, a actividade de prestação de serviço manteve-se, independentemente da vantagem ou benefício dela decorrente. E a afirmação da gratuitidade do serviço nacional de saúde (artigo 7." da Lei n." 56/79) funciona contra o entendimento de que o referido tributo «taxa fixa» possa ser considerado uma «taxa».

8 — O que se buscou foi, repetimos, agravar os custos e restringir o consumo de medicamentos (m) —finalidade da qual também resulta a obtenção de receitas — pelos utentes dos Serviços Médico-Sociais que desses serviços retiram, reflexamente, uma particular vantagem económica ou que geram, através desse consumo, despesas substanciais. Tanto assim é que — para além dos confessados objectivos da Portaria n." 151/82 — o pagamento da laxa fixa de 25$ não dá, por si. direito aos utentes dos Serviços Médico-Socia;s de exigir a prestação de assistência medicamentosa.

O que lhes confere tal direito é, por um lado, o pagamento das contribuições e, por outro, o esquema de comparticipação estabelecido, para além, é claro, do princípio da «gratuitidade do acesso ao serviço nacional de saúde». Estará, assim, a taxa fixa próxima das designadas «contribuições especiais» (de melhoria ou por maiores despesas) (M) ou dos tributos especiais (w). Só que tal constatação equivale, no nosso sistema fiscal, ao reconhecimento de que a taxa fixa se integra na categoria dos impostos, e não na das taxas, muito embora parte da nossa doutrina se incline a admitir uma classificação tripartida (impostos, taxas e contribuições especiais), sem, contudo, pôr em causa que, no plano jurídico, as contribuições especiais são verdadeiros impostos ("). Não deixaremos, apesar disso, de reconhecer que a taxa fixa retira o seu fundamento de um benefício individualizado reflexamente re-

C) Cr. Alberto Xavier, ob. cit., pp. 43 e 44.

(") Objectivo que é prosseguido pelos impostos indirectos (especiais). Racionalizar a utilização das prestações 6 finalidade do artigo 7." da Lei do Serviço Nacional de Saúde ao contemplar a criação de «taxas moderadoras diversificadas». Só que a designação de «taxa» não basta para deixar de qualificar essas taxas como verdadeiros impostos. E a taxB fixa não foge a esta realidade.

(") Cf. Manual cie Direito Fiscal, do Dr. A. Xavier, pp. 57 e segs.

(") V. Princípios de Direito Fiscal, do Dr. A. Braz Teixeira, pp. 46 e 47, que não reconhece autonomia a esta espécie tributária.

O V. Prof. Sousa Franco, in Finanças Públicas e Direito Financeiro (súmula), com a colaboração de E. Paz Ferreira, pp. 160 c 161.

sullante da actuação de um sujeito público (os Serviços Médico-Sociais) pelo uso invulgar ou anormal de bens ou serviços públicos por parte de certos sujeitos (os utentes dos Serviços Médico-Sociais), os quais oneram particularmente as finanças do Estado. Distinguindo-se, em certa medida, do imposto — por não peder sustentar-se a inexistência de uma certa contrapartida em troca da prestação —, a taxa fixa também se não identifica com a figura da taxa, por não haver uma contraprestação específica decorrente do pagamento dos 25$ por embalagem de especialidade.

O pagamento condicionará, é certo, o funcionamento do mecanismo da prestação sinalagmática subjacente, que se mantém inalterada entre os Serviços Médico-Sociais e os utentes destes Serviços. Só que não corresponde, como vimos, a prestação específica dos Serviços Médico-Sociais, mrs visa, primordialmente, objectivos que também são prosseguidos pela modalidade de impostos indirectos designada por «impostos especiais» (/"), como são os de restrição do consumo c de obtenção de receitas. Atente-se em que também na tributação do consumo do tabaco, do álcool e dos produtos importados se pretende reduzir o consumo por razões de ordem socioeconómica evidentes. Ora, no caso dos medicamentos não se passará algo de diferente. Visa-se restringir o excessivo consumo de medicamentos e evitar situações de desperdício através da criação da intitulada «taxa fixa» de 25$. Cremos estarem assim reunidos elementos suficientes para a qualificação da taxa em questão como autêntico imposto, tanto mais que se afigura irrelevante a designação de «taxa moderadora diversificada» do artigo 7." da Lei n.u 56/79.

9 — Tendo este tributo sido criado por portaria C2) do Ministro dos Assuntos Sociais —diploma que constitui uma das formas de que podem revestir-se os regulamentos ministeriais, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 202." da Constituição —, tal portaria ofende directamente o princípio da legalidade tributária consignado no artigo 106.°, n.° 2, da Constituição. Com efeito, esse preceito estabelece a regra da reserva da lei formal para a criação e determinação dos elementos essenciais dos impostos, ou seja, de lei da Assembleia da República ou de decreto-lei do Governo precedido de autorização legislativa do primeiro órgão de soberania, de acordo com o disposto nos artigos 167.°, alínea o), e 168° da lei fundamental.

É que da articulação do n." 2 do artigo 106.° com a alínea g) do artigo 164.° e a alínea o) do

(") Cf. Prof. Teixeira Ribeiro, ob. cit.. pp. 328 c segs.

(*!) Sobre as medidas tributárias atinentes ao consumo será preciso entrar em linha de conta com o disposto no n.° 4 do artigo 107." da Constituição. Deste preceito poderá, inclusivamente, concluir-se não ser viável por mero diploma regulamentar a criação de tributos com a feição da «taxa fixa». Será preciso ter também presente que a competência administrativa [artigo 202.", alínea c)l não permite a existência de regulamentos independentes, ou seja. não reportados a uma lei.

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artigo 167.° resulta que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a matéria da criação de impostos e sistema fiscal (M). Trata-se, pois, da consagração do princípio da legalidade no duplo aspecto da reserva da lei formal e da definição dos elementos nucleares dos impostos por meio de lei, conforme entendimento defendido pela Comissão Constitucional no seu Parecer n." 3/79 (M). Podendo a violação de tal princípio constituir, simultaneamente, uma ofensa a um dos direitos fundamentais dos cidadãos f95) — o de não pagar impostos que não hajam sido criados em termos constitucionais, reconhecido no n.u 3 do artigo 106.° da Constituição—, certo sector da doutrina qualifica tal violação como inconstitucionalidade material, e não como inconstitucionalidade orgânica C6). No caso sob apreciação poder-se-á admitir a existência de uma tripla inconstitucionalidade — formal, orgânica e material —, consoante o ângulo através do qual se encarar a infracção das normas constitucionais, isto é, inobservância das regras sobre a forma e processo de formação dos actos, relativas à competência ou atinentes ao conteúdo das próprias regras constitucionais C).

Todavia, e apesar de se haver esbatido na actual Constituição o relevo dos diferentes tipos de inconstitucionalidade, afigura-se-nos razoável a qualificação do vício de que enferma a Portaria n.° 131/82 como inconstitucionalidade material com base no reconhecimento (n.° 3 do artigo 106.° da Constituição) do direito fundamental dos cidadãos de não pagar impostos que não tenham sido estabelecidos em harmonia com a Constituição C4). Nada impedirá, porém, que, em alternativa, se suscitem perante o Conselho da Revolução as questões da inconstitucionalidade formal e orgânica (") da citada portaria, considerando que, paralelamente, não se mostram respeitadas as normas atinentes à tramitação do acto (portaria, em vez de lei ou decreto-lei aprovado ao abrigo de autorização legislativa) e à competência do órgão (ministro, em lugar da Assembleia da República ou do Governo, legislando por meio de decreto-lei). Ao referido órgão de soberania ca-

(") Sobre a orientação actual do princípio de reserva total da lei no âmbito da administração das prestações (subvenções que representam, simultaneamente, vantagem para uns cidadãos e encargo para outros), cí. Dr. J. Comes Canotilho, ob. cit., vol. i, pp. 42 c segs., e Dr. Sérvulo Correia, «Os princípios constitucionais da Administração Pública», in Estudos sobre a Constituição, vol. ui, pp. 664 c segs.

(") Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 7.°, p. 213.

(") Pois nem todos os direitos fundamentais estão incluídos na parte t do texto constitucional.

(*) Cf. Prof. Teixeira Ribeiro, Os Princípios Constitucionais da Fiscalidade Portuguesa, p. 11, Prof. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. n, p. 594, e Drs. A. Xavier, ob. cit., pp. 135 e 136, e Braz Teixeira, ob. cit., pp. 80 e 81.

O V. artigos 280.", n.° 2, e 281°, n." 2. da Constituição.

(") Cf. Prof. Jorge Miranda, ob. cit., p. 594, e os autores citados no mesmo sentido. Aquele constitucionalista sustenta que as inconslitucionalidades formal e orgânica «convolam-se ou sublimam-se» em inconstitucionalidade material.

Ç) No sentido da inconstitucionalidade formal geradora da inexistência jurídica, v. Dr. Miguel Galvão Teles, citado pelo Prof. |. Miranda, ob. cit-, p. 594.

berá deliberar sobre o tipo e a extensão das in-constitucionalidades detectadas ao longo da análise da Portaria n.° 131/82 (10°) a que procedemos.

IV) Conclusões

1 — De quanto fica exposto, de concluir é que:

1) Se mostram improcedentes os argumen-

tos de inconstitucionalidade material — traduzida na violação das normas do n.° 2 do artigo 64." da Constituição pela Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro— e de inconstitucionalidade por omissão invocados na queixa;

2) A Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro,

ofende as normas dos artigos 106.°, n.os 2 e 3, e 107.° da Constituição da República, justificando-se, por isso, o uso pelo Provedor de Justiça da faculdade que lhe é conferida pelo n.° 1 do artigo 281.° da lei fundamental, solicitando ao Conselho da Revolução que aprecie e declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade material dos proceítos dos n.os 1 e 2 da referida portaria ou, para o caso de assim não ser considerado adequado, as inconstitucionalidades orgânica e formal do mesmo diploma. Este, salvo outro melhor, o nosso parecer.

2 — Sobre este parecer pronunciaram-se, sucessivamente, o coordenador e o adunto, nos termos seguintes:

Parecer do coordenador:

1 — Concordo, genericamente, com as conclusões formuladas pelo Ex.™ Assessor em sequência do extenso e bem fundamentado estudo que as antecede e, assim, com a proposta feita no sentido de ser usada a faculdade conferida pelo artigo 281.°, n.° 1, da Constituição, solicitando-se ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade material dos preceitos em causa, com a adjuvante alternativa colocada in fine.

2 — De todo o modo, e pessoalmente, eu in-clinar-me-ia (sobretudo e também) para a verificação da inconstitucionalidade material, traduzida na ofensa feita pela Portaria n.° 131/82, de 29 de Janeiro, ao artigo 64.°, n.° 2, da Constituição e, muito designadamente, ao seu espírito.

Nesta sede, afigura-se-me com inteira pertinência a tese subjacente às considerações expendidas pela reclamante na sua exposição inicial no tocante a ser atingido o comando constitucional que aponta para um direito à saúde e em ordem a esse escopo para um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito.

Tais finalidades determinarão, com efeito, a subordinação da produção legislativa ordinária na matéria a um enquadramento que não consen-

(IM) Como actos derivados deste diploma, a Portaria n.° 188/ 82 e o despacho ministerial de 3 de Fevereiro de 1982 acabam irremediavelmente afectados pelas inconstitucionalidades da Portaria n." 131/82.

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tira qualquer tipo de oneração económica — ainda que do lipo «laxa» —, muito especialmente quando lai oneração, por esbatimento quase total da relação sinalagmática, se configure como figura muito próxima ou mesmo coincidente com uma exigência unilateral tributária (imposto).

Não interessará aqui discutir que outras medidas poderiam ser adoptadas para uma maior disciplina e para uma mais eficiente racionalização na aquisição de medicamentos e que pudessem lograr o desiderato que ora se diz servido com «a laxa de receituário».

[Aliás, parece-me que deveria ser através de disciplina e controle do próprio receituário médico que se poderia evitar o acréscimo de despesas (ou abusos) desnecessárias com a aquisição de medicamentos, e não com a imputação deste tipo ao beneficiário, que nem sequer é responsável pela recciia. |

Só que parece que aqueles objectivos não são legitimamente logrados —em sede de respeito pela Constituição— com sobrecarga desta natureza, tanto mais num país de um nível económico muito baixo e com um salário mínimo incompatível com o custo de vida.

0 princípio da gratuitidade —e nem sequer será caso de falar em gratuitidade tendencial, que os comandos constitucionais não exprimem tendências, mas apontam fins — consagrado na Constituição não parece, pois, compatibilizar-se com estas oncrações, ainda que se argumente que elas são indispensáveis: tal argumento afigura-se-me. no mínimo, paradoxal.

De facto, as finalidades propostas pela lei fundamental não poderão ser conseguidas através de normas que. na prática, as contrariam: isto ainda que o sistema possa ser mei-amcnie transitório e haja fundada razão — que não descortino — para a cobertura através do Orçamento Geral do Estado não ser possível.

A Portaria n." 131/82, portanto, afigura-se-me portadora dc vicio de inconstitucionalidade material igualmente pelas razões antecedentemente expostas.

Melhor: traduzirá com expressividade aquilo que. a meu ver sem repugnância, se poderá qualificar como verdadeira acção inconstitucional.

Parecer do adjunto:

1 —Concordo com a posição do Sr. Assessor, apreciada em estudo cuidado, profundo e rigoroso.

2 — Permito-me — aliás, não fazendo mais do que glosar questões já tratadas nesse estudo e sobre as quais na altura troquei impressões com o Sr. Assessor— realçar dois aspectos formais, é ccrio. mas que. creio, revelam a não correlação da contribuição em causa com o benefício obtido pela actuação dos Serviços Médico-Sociais, bem como o Tacto de ela não poder ser considerada como verdadeira laxa nem como comparticipação do utente para cobertura do custo do benefício obtido através do serviço público em causa:

a) Sc o utente dos Serviços Médico-Sociais resolvesse, por qualquer razão, não utilizar uma receita que lhe haja sido

passada por médico dos Serviços Médico-Sociais. não deixaria de haver por parte destes a prestação de benefício ou serviço ao particular, isto é, a actividade médica culminada com a passagem da receita.

Mas o utente não paga. afinal, a contribuição em discussão, na medida em que resolveu não comprar o medicamento, não tendo, por isso, apresentado a receita na farmácia; b) Se o preço corrente de certo remédio for inferior à soma do preço comparticipado pelos Serviços Médico-Sociais e da contribuição cm análise, o interessado, como regra, não utilizará o esquema dc intervenção dos Serviços Mcdico-Sociais.

Mas não está impedido de o fazer.

Se. por qualquer razão —até, porventura, para «testar» a aplicação do sistema —, o fizer, virá a pagar pelo medicamento um quantitativo superior ao do seu preço normal.

Este facto aponta no sentido de a contribuição em causa não poder considerar-se abrangida na ideia de comparticipação do utente na cobertura do custo do remédio obtido através do sistema de assistência medicamentosa dos Serviços Médico-Sociais.

3 — Ames de o Provedor tomar posição sobre a matéria foi publicada a Portaria n." 509/82, de 22 de Maio, que, revogando a Portaria n." 131/82. estabeleceu, contudo, um regime muito próximo do dela, embora passasse a designar por «comparticipação fixa» (e já não por «taxa lixa») a contribuição relativa ao receituário dos Serviços Médico-Sociais.

O Provedor, concordando com os pareceres acima transcritos, considerou que as razões neles expostas valiam também para fundamentar a inconstitucionalidade dos nr I." e 2." da Portaria n." 509/82.

Pediu, pois, a respectiva declaração ao Conselho da Revolução, ponderando:

As apreciações constantes dos documentos juntos referem-se à Portaria n.u 131/82, de 29 de faneiro. ora revogada pela Poriaria n.u 509/82.

Considero, porém, que elas valem também para esta última portaria, agora em vigor.

Designadamente, não é o facto de a contribuição em causa não ser já designada por «taxa lixa», mas por «comparticipação fixa», que lhe altera a natureza, já que o seu regime jurídico se mantém no essencial.

E a verdade é que esse regime não parece ajustar-se ao de uma «comparticipação».

Repare-se, com efeito, em que —apesar da modulação introduzida pelo n." 2." da Portaria n." 509/82 — continua a ser possível, no âmbho do sistema constante deste último diploma, que os beneficiários dos Serviços Médico-Sociais acabem, ao comprar medicamentos com receitas médicas passadas sob a égide desta instituição, por poder vir a pagar mais que o próprio preço de mercado desses remédios.

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Isso sucederá, nomeadamente, em relação com os medicamentos de preço até 52$ (sc a —verdadeira — comparticipação dos utentes, segundo o regime geral, foi de 25 % do preço de mercado) ou até 40$ (se a comparticipação for de 40 %).

4 — O Conselho da Revolução declarou tal inconstitucionalidade através da Resolução n.u 194-A/82, de 26 de Outubro, publicada a 29 desse mês.

5 — O Ministro dos Assuntos Sociais fez publicar em 6 dc Novembro de 1982 a Portaria n." 1025-B/82. mantendo, no essencial, o regime em questão, embora com algumas modulações.

0 Provedor resolveu abrir processo de sua iniciativa para ajuizar da constitucionalidade deste último diploma— processo ainda pendente no termo de 1982.

8 — Retroactividade do imposto para o Serviço de Incêndios

Processo n." 82/R-370-DI-6

1 — Uma associação representativa dos seguradores privados pediu a intervenção do Provedor acerca do regime decorrente, a propósito do imposto para o Serviço de Incêndios, dos artigos 50." da Lei n." 4/8' e 54." da Lei n.u 40/81.

2 — Sobre a questão foi pela assessora encarregada do processo elaborado o parecer seguinte:

II

I — A Associação f...| apresentou ao Provedor de )ustiça uma exposição em que reclama contra a manutenção na Lei do Orçamento Geral do Estado para 1982 (Lei n." 40/81, de 31 de Dezembro) de um erro técnico consubstanciado no seu artigo 54.", que reproduz, com um ligeiro aditamento, o preceito do artigo 53." da Lei do Orçamento Geral do Estado para 1981 (Lei n." 8-A/ 80, de 26 de Maio) e que foi objecto de diversidade de tratamento e de interpretação nos 2 anos em que o erro foi cometido. Assim:

No ano de 1980, o artigo 55." da Lei n." 8-A/80 não foi aplicado por, segundo o entendimento geral, se tratar de lapso legislativo a referência ao § 5." do artigo 708." do Código Administrativo, expressamente revogado pelo artigo 27." da Lei n." 1/79, de 2 de Janeiro, cujo conteúdo, aliás, antes fora incorporado no Decreto-Lei n.n 388/78, dc 6 dc Dezembro;

No ano de 1981, o artigo 50." da Lei n." 4/ 81 voltou a repetir, com um ligeiro aditamento, o preceito anterior, tendendo então a Inspecção-Geral dc Seguros dar-lhe cumprimento e exigir das empresas seguradoras o pagamento do imposto previsto no § 5." do artigo 708." quanto aos seguros efectuados no ano de 1980, quando aquelas empresas já vinham pagando aquele imposto mensalmente, nos termos do Dccrcto--Lei n." 388/76. com a nova redacção dada pela Lei n.° 10/79. de 20 de Março.

1.1—As empresas seguradoras impugnaram esta exigência, avançando dois tipos de considerações:

Na hipótese de se não ter pretendido repor em vigor o § 5." do artigo 708.° do Código Administrativo, tal exigência seria ilegal, por se tratar de uma duplicação de colecta (dupla tributação) baseada numa lei sem conteúdo, por se referir a regime tributário expressamente revogado;

Na hipótese de o § 5." do artigo 708." ter sido reposto em vigor, tal reposição seria materialmente inconstitucional, por violar o n." 2 do artigo 107." da Constituição, incidindo sobre rendimentos brutos, violando também o Estado de Direito pela aplicação retroactiva de norma de incidência tributária e pela exigência de dois impostos sobre a mesma matéria colectável (dupla tributação).

1.2 — Em face do exposto, a reclamante solicitou ao Provedor de lustiça dois tipos de providências:

«) Uma. tendo em atenção a ilegalidade do artigo 54." da Lei n.u 40/81, para providenciar como tiver por mais eficaz para obstar à cobrança injusta;

b) A segunda, para submeter a matéria aos órgãos competentes para a declaração de inconstitucionalidade com carácter geral, nos termos do n.° 1 do artigo 281." da Constituição.

II) O regime do imposto para o Serviço dc Incêndios desde o artigo 708." do Código Administrativo até à Lei n." 40/81, de 31 de Dezembro.

2 — Para melhor apreensão dos pedidos da reclamante iremos descrever as sucessivas modificações introduzidas no imposto para o Serviço de Incêndios regulado no artigo 708." do Código Administrativo (l01) até à Lei do Orçamento Geral do Estado para 1982 (artigo 54." da Lei n." 40/81. de 31 de Dezembro).

3 — O n." 3 do artigo 704." do Código Administrativo incluiu o imposto para o Serviço dc Incêndios na categoria dos impostos directos (uc).

3.1 —Porém, especificamente, o regime objectivo deste imposto constava do artigo 708." io Código Administrativo, que o criou com a finalidade de constituir o suporte financeiro para a manutenção dos serviços municipais de prevenção e extinção de incêndios.

3.2 — No regime do artigo 708.° do Código Administrativo, este imposto assumia duas modalidades distintas:

a) O imposto previsto no seu § I.", arrecadado directamente pelas câmaras que mantivessem ou subsidiassem serviços de incêndios e pago pelos proprietários

("") Na redacção dada pelo Decreto-Lei n." 45 676. de 24 de Abril de 1964.

(":) Na redacção dada pelo diploma referenciado na nota 101.

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dc prédios urbanos e de estabelecimentos comerciais ou industriais localizados no concelho, desde que uns e outros não estivessem seguros: a taxa deste imposto era de 0,5 "/<» sobre o valor da matriz predial, no caso de prédios urbanos, e do mesmo montante sobre o valpr normal determinado pelo factor 10 da colecta da contribuição industrial; b) O imposto previsto no seu § 5.", cobrado pela I nspecção-Geral de Crédito c Seguros às companhias de seguros, no valor de 6 % sobre os seguros contra fogo e de 2 % sobre os seguros agrícolas e pecuários, o qual era posto à dis^ posição do Conselho Nacional dos Serviços de Incênddio para ser distribuído pelas câmaras, tendo em atenção a receita obtida em cada concelho e os seus encargos com serviços de prevenção e extinção de incêndios:' as taxas incidiam sobre os prémios processados no ano imediatamente anterior.

3.5 — O que distingue a primeira modalidade (§ 1." do artigo 708.") da segunda (§ 5.° do mesmo artigo) c que naquela se pode falar num verdadeiro imposto municipal, já que o sujeito activo da relação tributária c a câmara; ao invés, neste último é o Estado que aplica o imposto, que o fiscaliza e que posteriormente entrega o seu produto à autarquia, sem que esta mantenha contacto algum com o contribuinte.

Em situação da natureza da segunda modalidade, o que se defende é que «a autarquia disporia de um crédito financeiro contra o Estado, tendo por objectivo o produto da cobrança, mas não de um crédito tributário contra o contri-buinte» (,0J). Esta posição é sustentada em todos os casos em que os tributos arrecadados pelo Estado revertem para um fundo comum, sendo porteriormente repartidos pelas autarquias, segundo critérios legais ou de necessidade financeira. Na filosofia do § 7." do artigo 708." do Código Administrativo, tais critérios legais de repartição foram genericamente definidos em função da receita obtida em cada concelho c dos respectivos encargos com serviços de prevenção e extinção de incêndios.

3.4 — Outra característica distintiva entre as duas modalidades de impostos refere-se ao sujeito tributário passivo: enquanto na primeira modalidade o imposto recaía sobre os proprietários de imóveis ou de estabelecimentos não seguros, já na segunda o imposto era cobrado às companhias seguradoras.

Não se vê motivo plausível para esta dicotomia de regimes, nomeadamente para que os proprie: tários de imóveis ou de estabelecimentos não pagassem qualquer imposto de incêndios a partir do momento em que segurassem os seus imóveis. Embora a averiguação da razão de ser deter-

('") Alberio Xavier, Manual de Direito Fiscal, t. 1974. p. 346.

minante desta dicotomia de regimes esteja, obviamente, fora do interesse directo para este estudo, poderá talvez pensar-se que o Estado pretenderia, neste caso, estimular o recurso ao seguro pelos proprietários de imóveis ou estabelecimentos.

4 — O imposto previsto no § 1." do artigo 708." manteve-se sem quaisquer alterações até à publicação da Lei das Finanças Locais, cujo artigo 27.", alínea a), revogou toda a parte Mi do Código Administrativo, em que aquele artigo se incluía, com excepção dos artigos 681." e 691."

5 — O imposto previsto no § 6." do mesmo artigo 708.", relativamente ao qual se suscitam todas as dúvidas relatadas na exposição, sofreu algumas modificações, nomeadamente quanto ao sujeito tributário passivo, elevação das taxas, período de cobrança (de anual para mensal) e entidades a favor de quem passou a ser afectado.

5.1 — As primeiras modificações ocorreram com a publicação do Decrelo-Lei n." 388/78, de 9 de Dezembro, que não só substituiu o Conselho Nac;onal dos Serviços de Incêndio pelo Conselho Coodernador do Serviço de Bombeiros (ar-ligo I."). como também passou a qualificar como receita própria deste último o produto da colecta prevista no artigo 708." [cf. artigo 4.°, alínea a)].

Nota-se também uma diferença significativa quanto ao destino ou rateio final dessas impor-lâncias, que deixaram, nos termos da lei, de ser distribuídas exclusivamente pelas diversas câmaras do País para passarem a subsidiar «corpos de bombeiros» [cf. artigo 4.", alínea a), e 2.", alínea

5.2 —O Decreto-Lei n." 388/78 foi submetido a ratificação pela Assembleia da República, lendo sofrido, pela Lei n." 10/79, de 20 dc Março, as alterações que passam a enunciar-se:

a) O Conselho Coordenador do Serviço de

Bombeiros, integrado no Gabinete dc Apoio às Autarquias Locais, passou a ser órgão de um novo serviço, o Serviço Nacional de Bombeiros (cf. artigos I." e 2.", na redacção ratificada);

b) Passaram a ser receitas consignadas ao

Serviço Nacional de Bombeiros c para subsidiar «corpos de bombeiros» 8 % sobre os prémios de seguros contra fogo e 4 % sobre os prémios dos seguros agrícolas e pecuários. Houve, assim, uma elevação de ambas a taxas anteriores em 2 % (cf. artigo 5.°, na redacção ratificada);

c) O sujeito tributário passivo deste imposto,

que, nos termos do artigo 708." do Código Administrativo, eram as companhias seguradoras, foi substituído pelos segurados [artigo 5.", n.° 1, alínea a), na redacção ratificada];

ri) A periodicidade da cobrança deixou de ser anual e reportada a prémios de seguros cobrados no ano anterior para passar a ser mensal (cf. artigo 5.°, n.us 2 e 33, na redacção ratificada);

e) A distribuição ou rateio pelo Conselho Coordenador do Serviço de Bombeiros das importâncias arrecadadas pelos cor-

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pos de bombeiros ficou sujeita a aprovação dos Ministros da Administração Interna e das Finanças, tendo em atenção os encargos com os serviços de prevenção e extinção de incêndios existentes em cada concelho (artigo 6.", na redacção ratificada).

As alterações introduzidas no Decreto-Lei n." 388/78 foram votadas, por unanimidade, na Assembleia da República {Diário da Assembleia da República, l.a série, n.° 30, de 9 de Fevereiro de 1979, p. 1030). Os debates produzidos acerca das matérias alteradas, nomeadamente quanto aos motivos determinantes da mudança de sujeito tributário passivo deste imposto, não são muito esclarecedores. Sabe-se, no entanto, que a iniciativa de tal medida coube ao Partido Socialista (Diário da Assembleia da República, 1 .a série, de 26 de laneiro de 1979, p. 907).

5.3 — 0 Decreto-Lei n." 418/80, de 29 de Setembro, publicado na sequência da Lei n.° 10/ 79, visou implementar uma nova e autonomizada estrutura do Serviço Nacional de Bombeiros. Relativamente ao aspecto tributário, que é o que releva nesta análise, manteve-se o regime anterior [cf. artigo 31.", n.° 1, alínea c)].

5.4 — Ê possível tirar as seguintes conclusões prévias das vicissitudes sofridas por este imposto:

a) O imposto previsto no § 5." do artigo 708."

do Código Administrativo começou por ser um imposto cobrado às empresas seguradoras, tendo passado a recair sobre os segurados, nos termos do artigo 5.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.° 388/78, com a ratificação introduzida pela Lei n.u 10/79. de 20 de Março;

b) Este imposto, embora consignado a entida-

des sucessivamente diferentes — Conselho Nacional dos Serviços de Incêndio, Conselho Coordenador do Serviço de Bombeiros e Serviço Nacional de Bombeiros — destinava-se, no regime inicial do Código Administrativo, a ser distribuído exclusivamente pelas câmaras que mantivessem, subsidiassem ou se comprometessem a subsidiar ou manter serviços de incêndios; a partir do Decreto-Lei n.° 388/78 passou a subsidiar «corpos de bombeiros», o que encontra o seu fundamento na concepção integrada de prevenção e repressão de incêndios a nível nacional, que justificou a criação do Serviço Nacional de Bombeiros;

c) Curiosamente, na altura em que o sujeito

tributário passivo passou a ser o segurado (Lei n.° 10/79), a taxa do imposto foi aumentada para, respectivamente, 8 % sobre os prémios dos seguros contra fogo e 4 % sobre os prémios dos seguros agrícolas e pecuários;

d) Ê possível defender, como se faz no pa-

recer anexo à reclamação e se fez na Assembleia da República, que o im-

posto previsto no artigo 5.° da Lei n." 10/79 substituiu o que era regulado pelo § 5." do artigo 708.", mesmo tendo variado o sujeito tributário passivo, as taxas e as entidades a favor de quem passaram a ser consignadas e distribuídas as receitas. Mesmo que tal se não admita no período que decorreu entre a publicação do Decreto-Lei n.u 388/78 e a publicação da Lei das Finanças Locais (Lei n.u 1/79, de 2 de Janeiro), tal conclusão é óbvia, pelo menos, a partir da publicação desta última lei, que revogou ioda a parte in do Código Administrativo, com exclusão dos artigos 689." e 691.° fcf. artigo 27.°, alínea o), da Lei n." 1/79].

6 — A Lei das Finanças Locais veio introduzir alguma confusão na já complicativa evolução deste imposto, não só por ter revogado, com excepções despiciendas, toda a parte in do Código Administrativo, como também por ter atribuído aos municípios a totalidade do produto da cobrança do imposto para o Serviço de Incêndios [cf. artigo 5.°, alínea o), n.° 3.°].

Afigura-se-nos que a revogação operada deixou intocada a nova regulamentação do imposto para o Serviço de Incêndios, não só pela desmunici-palização que pelas novas leis foi conferida a este imposto, como ainda por estar contemplado em leis avulsas desintegradas do contexto sistemático do Código Administrativo. Assim, na altura da publicação da Lei das Finanças Locais, o único imposto para o Serviço de Incêndios que passou a existir —o do Decreto-Lei n.° 388/78, com as alterações introduzidas pela Lei n.° 10/ 79 — nem era cobrado pelos municípios nem revertia, na sua totalidade, para estes.

Nota-se desde logo a ausência de lei tributária reguladora da incidência, taxa, sujeito(s) tributá-rio(s) passivo(s) e forma de cobrança do imposto para o Serviço de Incêndios, que a Lei n." 1/79 atribuiu aos municípios, já que o imposto anterior, com o mesmo nome e na sua feição municipalista, fora revogado por aquela lei.

Importa igualmente referir que, bem ou mal, a filosofia informadora da Lei das Finanças Locais em matéria de imposto para o Serviço de Incêndios era bem diferente da anteriormente existente, já que o imposto deveria ser arrecadado directamente pelos municípios, a totalidade do produto da cobrança revertia para os mesmos e não eram feitas quaisquer exigências àqueles no sentido da manutenção ou subsídio a serviços de prevenção ou extinção de incêndios.

Choca também o desfasamento, colisão ou retrocesso que esta nova filosofia de imposto veio introduzir, em termos de resultado útil ou de eficácia, no sistema vigente de prevenção e repressão de incêndios, virado para uma perspectiva unitária e integradora a nível nacional daqueles serviços.

7 — Parte das dúvidas expostas encontra resposta, não muito satisfatória, logo no artigo 35.°

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da Lei do Orçamento para 1980 (Lei n.° 8-A/80, de 26 de Maio), que determinou o seguinte:

1 — Durante o ano de 1980, o imposto para o Serviço de Incendios será cobrado nos termos dos §§ 1.° a 5.° do artigo 708." do Código Administrativo.

2 — As percentagens referidas no § 5." do referido artigo serão transferidas para os municípios que a elas têm direito até ao dia 30 de Junho e de acordo com a importância cobrada em cada concelho.

Pode discutir-se, como faz o parecer anexo à reclamação, a má técnica legislativa, que consiste em repor em vigor um imposto revogado quando os princípios da clareza e determinação exigidas cm respeito da legalidade tributária imporiam um novo tratamento sistemático integrado do imposto para o Serviço de Incêndios, em ordem a compatibilizar a filosofia informadora da Lei das Finanças Locais com outros impostos já existentes com o mesmo nome. O que é inquestionável é que, pelo menos, com a reposição em vigor deste artigo as câmaras (içariam inibidas de cobrar o imposto para o Serviço de Incêndios na modalidade antes prevista no § 1.° do artigo 708.° do Código Administrativo.

Mas foi quanto ao imposto antes previsto no § 5." do artigo 708." que iodas as dúvidas se levantaram, nomeadamente quanto à exigência do seu pagamento cumulativamente com o do imposto com o mesmo nome, na redacção dada pela Lei n." 10/79.

Na dúvida, a Inspecção-Geral de Seguros só cobrou durante o ano de 1980 o imposto para o Serviço de Incêndios previsto nos artigos 5." e 6." da Lei n.u 10/79. Quer isto dizer, por outras palavras, que durante o ano de 1980 a interpretação «oficial» dada ao artigo 35.° da Lei n.° 8-A/ 80 foi no sentido de entender que a reposição em vigor do § 5." do artigo 708." seria errada, por este imposto ter sido substituído pelo previsto na Lei n.° 10/79.

8 — Diferente, porém, foi a posição que veio a ser assumida nas Leis do Orçamento para 1981 e para 1982.

8.1 — Assim, o artigo 50." da Lei n." 4/81 determinava o seguinte:

1—Durante o ano de 1981, o imposto para o Serviço de Incêndios será cobrado nos termos dos §§ 1.° a 5." do artigo 708.° do Código Administrativo, sem prejuízo do disposto na Lei n.° 10/79, de 20 de Março.

2 — As percentagens referidas no § 5.° do referido artigo serão transferidas para os municípios que a elas têm direito até ao dia 30 de Junho e de acordo com a importância cobrada em cada concelho.

8.2 — Norma semelhante veio também a ser consagrada no artigo 54.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro:

1—Durante o ano de 1982, o imposto para o Serviço de Incêndios será cobrado nos termos dos §§ 1.° a 5.° do artigo 708.°

do Código Administrativo, sem prejuízo do disposto na Lei n.° 10/79, de 20 de Março.

2 — O imposto a que se refere o § 1 ° do referido artigo continuará a ser liquidado e cobrado pelos municípios.

3 — As percentagens referidas no § 5.° do referido artigo serão transferidas para os municípios que a elas têm direito até ao dia 30 de íunho e de acordo com a importância cobrada em cada concelho.

8.3 — A partir da publicação da Lei n." 4/81, a Inspecção-Geral de Seguros, nas circulares n.üs 15/81 e 16/81, de 6 e 7 de Maio, passou a exigir cumulativamente o pagamento dos dois impostos:

o) O previsto no artigo 5.° da Lei n.° 10/79 e no artigo 31." do Decreto-Lei n.° 418/ 80, pago pelos segurados;

b) O reposto em vigor do § 5.u do artigo 708.°, pago pelas empresas seguradoras.

Cabe rememorar que ambos os impostos, exigíveis a sujeitos tributários passivos distintos, incidem sobre a mesma realidade (os prémios de seguros) e são cobrados pela mesma entidade (a Ínspecção-Geral de Seguros): o imposto pago pelas empresas seguradoras tem a taxa de 6 % sobre os seguros contra fogo e de 2 % sobre os seguros agrícolas, incidindo ambos sobre os prémios processados no ano anterior, e o imposto pago pelos segurados em conjunto com os prémios de seguros tem a taxa de 8 % nos seguros contra fogo e de 4 % nos seguros agrícolas, incidindo ambos sobre os prémios pagos no próprio ano. e devem ser depositados pelas seguradoras, à ordem da Inspecção-Geral de Seguros, no decurso do segundo mês seguinte àquele em que se efectuar a cobrança.

Ill) Posições da reclamante e da Inspecção-Geral de Seguros quanto ao regime definido nos artigos 50.° da Lei n.° 4/81 e 54." da Lei n.° 40/81.

9 — A fls. 30 e 31 do parecer anexo à reclamação são expostas as três posições existentes quanto à matéria epigrafada:

a) A posição da Inspecção-Geral de Seguros,

quanto à exigência cumulativa dos dois impostos;

b) A posição de algumas seguradoras, quali-

ficando de inexistentes, por falta de conteúdo, as disposições dos artigos 50.° e 54.°;

c) A posição do parecer, adoptando inter-

pretação correctiva daquelas normas.

10 — A posição da Inspecção-Geral de Seguros não vem fundamentada no parecer, mas supõe-se que se baseia no seguinte tipo de argumentação:

a) Dadas as vicissitudes por que passou a segunda modalidade de imposto prevista no § 5." do artigo 708.° do Código Administrativo, a sua reposição em vigor pelo artigo 35." da Lei do

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Orçamento para 1980 levantou desde logo a dúvida se o legislador se queria reportar ao imposo na sua forma

b) Porém, tal situação veio a ser esclarecida

nas Leis do Orçamento Geral do Estado para 1981 e para 1982, que referem, expressamente, a aplicação dos dois impostos;

c) Tal intenção é também corroborada pela

manutenção da referência ao § 5." do artigo 708." e da forma de cobrança (n." 2 do artigo 30." e n." 3 do artigo 54.°, que só se referem especificamente àquele imposto);

d) Finalmente, a inserção da locução «sem

prejuízo do disposto na Lei n.° 10/79. de 20 de Março» nos dois citados preceitos legais teve a finalidade de desfazer as dúvidas existentes sobre a aplicação cumulativa de ambos os impostos.

11 — A segunda posição, que perfilha a qualificação dos artigos 50.° e 54.° como viciados de «inexistência» por falta de conteúdo, uma vez que mandaram aplicar normas que, por si, não existem, em virtude de terem sido revogadas, também não vem fundamentada.

Quanto a esta posição, podem, no entanto, levantar-se algumas objecções:

a) A remissão para norma revogada poderia

determinar inexistência se a intenção do legislador não fosse repô-la em vigor, embora com carácter transitório (por anos orçamentais), até à elaboração das normas definitivas regudado-ras deste tipo de imposto:

b) Tal intenção de reposição em vigor, se

era equívoca, nos termos do artigo 35." da Lei n." 8-A/80 (por poder questionar-se a substituição do imposto anterior pelo novo), parece ter deixado de sê-lo quando as referências ao § 5." do artigo 708." e às formas de cobrança inerentes a este imposto voltaram a ser repetidas nos artigos 50." e 54.°;

c) A errada formulação legal, a má técnica

legislativa utilizada e os vícios de que podem estar eivadas ambas as normas não são suficientes para as qualificar como inexistentes por falta de conteúdo.

12 — No parecer anexo à reclamação adopta-se uma terceira posição (fls. 17 e 18 e seguintes), que se pode consubstanciar nos seguintes termos:

Para que a ressalva da parte final do artigo 50.° da Lei n.° 4/81 não seja havida como inteiramente desprovida de conteúdo só se lhe pode atribuir o significado de com ela se esclarecer que o imposto de incêndios que se manda cobrar nos termos do artigo 708." do Código Administrativo não perde

as características que lhe foram atribuídas pela redacção dada pela Lei n.° 10/79 ao decreto-lei que o avocara e que são as seguintes: taxa de 8% para os seguros contra o fogo e de 4 % para os seguros agrícolas c pecuários e a possibilidade de repercussão directa sobre o segurado, que os termos do § 5.° do artigo 708.° não consentiam.

12.1 —Esta posição, que pretende encontrar a «solução mais acertada», baseia-se no seguinte tipo de argumentação:

a) Na altura em que entrou em vigor a Lei n." 4/81 (Lei do Orçamento Geral do Estado para 1981) existia na ordem jurídico-íiscal um único imposto para o Serviço de Incêndios —o que o Decreto-Lei n.° 388/78 avocara do artigo 708." do Código Administrativo, que a Lei n.° 10/79 convertera em receita consignada do Serviço Nacional de Bombeiros e que o Decreto-Lei n." 418/ 80 incorpora como receita própria, já sem distribuição obrigatória —, imposto que incidia sobre os prémios de seguros pelas taxas de 8% e 4% e que era directamente rcpercutível sobre os segurados;

6) Tendo o Serviço Nacional de Bombeiros, ou devendo ter, receita própria do Orçamento Geral do Estado, nos termos da alínea a) do artigo 31." do Decrelo--Lei n.° 418/80, entendeu o legislador não se justificar que se privassem as câmaras que mantivessem ou subsidiassem serviços de incêndios da antiga receita que lhes reconhecia o § 5." do artigo 708." do Código Administrativo: pretendeu-se, assim, manter transitoriamente um regime misto cm que, sem prejuízo das iniciativas e realizações locais, sc desenvolvesse um sistema nacional de defesa contra fogos;

c) Daí que o pensamento legislativo ínsito

nos artigos 50.° da Lei n.° 4/81 e 54.° da Lei n.° 40/81 (Leis do Orçamento Geral do Estado para 1981 e para 1982) seja, nitidamente, o de transferir para as câmaras municipais a receita que, por força do Decreto-Lei n.° 308/78 e da Lei n.° 10/79, deixara de lhes ser distribuída, pensamento que não invalida nem altera a política seguida depois do Decreto-Lei n.° 388/78, uma vez que o Serviço Nacional de Bombeiros, destinado a satisfazer uma necessidade indiscutivelmente colectiva, deverá ser financiado pelo Estado, como, aliás, se previa já na alínea o) do artigo 31° do Decreto-Lei n.° 418/80;

d) Ê certo que a redacção do artigo 50.° da

Lei n." 4/81 e a do artigo 54.° da Lei n.° 40/81 são defeituosíssimas, mas esta circunstância não invalida nem afecta o pensamento legislativo que se pode ex-

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Irair da história, da lógica e da integração no sistema: o legislador magis dixit quam voluii ao referir no n.° 2 que as receitas deveriam ser «transferidas para as câmaras que a elas têm direito», quando, na verdade, as câmaras «nunca tiveram direito» a tais importâncias;

e) A invocação do artigo 781.° é, assim, apenas «quanto aos termos em que deve ser efectuada a cobrança», que voltam a ser os da entrega à Inspecção--Geral dc Seguros e da sua distribuição pelas câmaras, mas não por todas: apenas por aquelas que mantenham ou subsidiem serviços de incêndios.

12.2 — Como argumentos suplementares, adu-zem-se ainda os de que diferente entendimento — no sentido da aplicação conjunta do § 5.° do artigo 708.° do Código Administrativo e do artigo 5." da Lei n.° 10/79, de 20 de Março — conduziria a:

Inconstitucionalidade material dos preceitos constantes dos artigos 50." e 54.° das Leis n.m 4/81 c 40/81, por violação do disposto no n.° 2 do artigo 107.° da Constituição, por sc tratar de tributação dc empresas com base cm rendimentos brutos;

Violação do Estado de direito por aplicação retroactiva de norma de incidência tributária;

Dupla tributação ou duplicação de colecta, por incidir cm rendimentos já tributados no mesmo imposto em 1980.

12.3 — À argumentação atrás explanada podem opor-se as seguintes objecções:

a) Começando desde logo pela referida no

n.° 12.2, julga-se que a interpretação de determinado dispositivo legal ou a recomposição do pensamento do legislador não podem fazer-se numa determinada orientação só porque a solução prevista na lei pode estar eivada de quaisquer vícios — inconstitucionalidade ou ilegalidade;

b) A construção jurídica constante dos n.os 12

e 12.!, embora aliciante, não encontra na letra da lei o grau de correspondência mínima que justifique uma interpretação correctiva.

Assim:

Tal posição seria defensável na redacção inicial, constante do n.° 1 do artigo 35.° da Lei n.° 8-A/80, de 26 de Maio, pese embora o facto de a redacção do n.° 2 do mesmo artigo constituir obstáculo de difícil ultrapassagem na defesa de tal tese, pelas razões que adiante serão aduzidas;

Porém, a partir do momento em que o legislador veio dizer (artigo 50.°, n.° 1, da Lei n.° 4/81 e artigo 54.°. n.° I, da Lei n.° 40/81) que a cobrança do imposto do referido § 5.° do artigo 708.° se faria sem

prejuízo da aplicação da Lei n.° 10/79, veio tomar uma posição expressa (,M) no sentido da cobrança dos dois impostos; Com efeito, se o legislador pretendesse cobrar apenas o imposto previsto na Lei n." 10/79 então o preceito deveria, pelo menos, ser redigido da seguinte forma:

Durante o(s) ano(s) de 1981(2), o imposto para o Serviço de incêndios será cobrado nos termos do §§ 1." a 4.° do artigo 708." do Código Administrativo (10S).

Omitindo qualquer referência expressa ao § 5." do artigo 708.°;

Por outro lado, a aplicação corrigida do § 5." do artigo 708.° com a Lei n.° 10/79 no sentido da cobrança de um único imposto — o desta última lei — vem conciliar o inconciliável: a cobrança de um imposto que é pago pelos segurados e com períodos de cobrança mensais e cuja forma de cobrança passa a ser anual e reportada a prémios de seguro processados no ano anterior, com a supressão, importante, do sujeito tributário passivo previsto no § 5.° do artigo 708." do Código Administrativo (empresas seguradoras).

13 — Em face do exposto, a posição que se adopta é a de que os artigos 50.° da Lei n." 4/81 e 54.° da Lei n.° 40/81 pretenderam, efectivamente, fazer renascer o antigo imposto do § 5.° do artigo 708.° do Código Administrativo. Este «renascimento» pode justificar-se por vários motivos:

a) Em primeiro lugar, o artigo 5." da Lei

n.° 1/79 (Lei das Finanças Locais), como se diz também nj parecer, não é um artigo criador de impostos, tendo como finalidade especificar o sujeito tributário activo —os municípios — dos vários impostos que enumerou;

b) Se os restantes impostos previstos na alí-

nea a) do referido artigo 5.° já tinham uma tutela objectiva e uma tipificação em leis preexistentes, tal não sucedia com o imposto para o Serviço de Incêndios, imposto de feição municipal revogado pelo artigo 27.° da Lei n.° 1/ 79; por outro lado, o imposto remanescente com a mesma designação, criado pela Lei n.° 10/79, manteve-se em vigor, mas sem características de imposto municipal;

c) Colocado perante a necessidade de definir

os elementos típicos do imposto para o Serviço de Incêndios (como exigido nos termos do n." 2 do artigo 106.° da Constituição), que passou a ser atribuído aos municípios, nos termos da Lei

V) Embora, reconheça-se, com redacção bastante ambígua.

O A referência à Lei n.° 10/79 seria desnecessária, por sc tratar dc imposto que, na filosofia desta lei, teria perdido o carácter municipal, bem como a iserção do número correspondente à forma de cobrança.

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das Finanças Locais, o legislador não adoptou uma posição delinitiva, como seria desejável, através dc uma lei própria reguladora deste tipo dc impostos nas suas várias modalidades: preferiu, até nova ponderação do assunto, repor em vigor em sucessivas leis orçamentais o antigo imposto para o Serviço de Incêndios, na sua feição muni-pal, regulado nos §§ 1." e 5." do artigo 708." do Código Administrativo;

d) Ao operar a reposição em vigor do im-

posto anteriormente previsto no § 5.p do artigo 708.", o legislador, inequivo^ camente, quis recriar o imposto revogado pela Lei n." 10/79; se outra fosse a sua intenção, teria sido fácil transferir para os municípios, com as devidas adaptações, apenas as receitas arrecadadas pelo imposto previsto na Lei n." 10/79 e prever apenas a cobrança deste e do imposto previsto no § I." do artigo 708.":

e) A explicação para este facto parece-nos

simples: a opção tomada foi não sacrificar o Serviço Nacional dc Bombeiros a favor das autarquias quando ainda estava aberto o recurso à utilização dc um sujeito tributário passivo —as empresas seguradoras —, que, através da Lei n." 10/79, inexplicavelmente, tinham recebido a benesse de transferirem para os segurados o imposto para o Serviço de Incêndios, que, no regime do Código Administrativo, era pago por elas.

outras, nomeadamente na dupla tributação internacional, em que pode não justificar-se, nomeadamente nos casos em que a sujeição do mesmo sujeito tributário passivo por virtude do mesmo facto resulta dc diferentes elementos de conexão adoptados pelos Estados. Os juízos sobre as desvantagens ou vantagens da existência de dupla tribulação devem colocar-se na fase prévia dé formulação de políticas legislativas fiscais. Certamente por esse motivo, não existe no nosso ordenamento jurídico, quer na lei constitucional, quer na lei ordinária, qualquer garantia atribuída ao contribuinte em matéria de dupla tribulação. 1

Na situação em análise também não ocorre ò fenómeno de duplicação de colecta, também invocado pela reclamante. A duplicação dc colecta pressupõe a existência de uma única norma legal com pluralidade de aplicações (lu?); no caso em apreciação trata-se dc 2 leis tributárias distintas.

15 — Reiroactividade da lei fiscal:

O sistema utilizado para a reposição em vigor do § 5." do artigo 708." do Código Administrativo por leis orçamentais de aplicação anual, com caducidade c renovação sucessiva e incidindo sempre sobre prémios de seguros processados no ano anterior, conduz, sem margem para dúvidas, à conclusão sobre o carácter relroactivo de todas as leis orçamentais em que aquele imposto foir sucessivamente, reposto em vigor o08), e de todas as le-s orçamentais futuras que utilizem idêntica metodologia. E que o título legal para exigência de cobrança do imposto é sempre e apenas a Iej orçamental do respectivo ano e a incidência dp imposto recai sempre também sobre prémios dè seguros processados no ano anterior

Nesta matéria, aliás, nem sequer tem interesse distinguir a retroactividade com base em «tactos» ou produção de «efeitos de trato sucessivo». Ê um tipo de retroactividade típica ou perfeita, de aplicação da lei nova a factos ocorridos no domínio da lei anterior.

A garantia da não retroactividade da lei fiscal não está formulada de forma expressa no textq constitucional f09) nem em forma de lei ordinária especificadamente reguladora de matéria tributária.

Porém, a generalidade da doutrina e da jurisprudência aceita, sem reservas, que a regra fundamental da não retroactividade prevista no artigo 12.° do Código'Civil se aplica à lei fiscal (cf. Cardoso da Costa, Curso de Direito Fiscal, 1970, pp. 215 e segs), dado ser norma de aplicação geral a todos os sectores do ordenamento

!V) Principais aspectos que podem suscitar-se quanto à situação descrita: dupla tributação/duplicação de colecta; retroactividade da lei fiscal; inconstitucionalidade material por ofensa do n.° 2 do artigo 107." da Constituição, e inconstitucionalidade material por ofensa do n.° 2 do artigo 107.° da Constituição.

14 — Dupla tributação/duplicação de colecta:

A situação em apreciação configura o conceito de dupla tributação, que pressupõe a existência de pluralidade de normas incidindo sobre o mesmo facto (identidade do facto): leis diferentes— o § 5." do artigo 708." do Código Administrativo e a Lei n." 10/79— e um único facto sobre que incidem as duas leis tributárias — os prémios de seguros. Para a integração do conceito —dupla tributação jurídica— é irrelevante que, a par da identidade do facto e da pluralidade de normas, haja também identidade do contribuinte — dupla tributação económica.

Aliás, tal aspecto não é de colocar na situação em análise, em que há diversidade de sujeitos trir butários passivos.

Há situações em que a dupla tributação existe e é desejada pelo legislador, tendo como fundamento as próprias finalidades genéricas do sistema fiscal e da act;vidade financeira (,06), havendo

('"") Caso típico é a dupla iributação por discriminação de Moniribuinics: tribulação da sociedade pelos lucros realizados c do sócio a quem são distribuídos.

("") Nos termos do § único do artigo 85." do Código dè Processo das Contribuições e Impostos, a duplicação dc colecta existiria «quando, estando paga por inteiro uma contribuição ou imposto, se exige da mesma ou de diferente pessoa uma outra de igual natureza referente ao mesmo facto tributário c ao mesmo período de tempo».

(1M) Diferente seria o entendimento se se tratasse de unia lei de execução permanente, não sujeita a caducidade, cm que a retroactividade seria apenas de colocar relativamente n prémios de seguros processados antes da entrada em vigor da lei, isto é, grosso modo. no primeiro ano dc vigência da lei.

Cm) Como sucede cm relação à lei penal (cf. artigo 29." da Constituição).

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jurídico (cf. Antunes Varela, Projecto de Código Civil, comunicação à Assembleia).

Dentro da mesma linha de considerações, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19 de lulho de 1972 (Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, anoxi, n." 131, pp. 1594-1595) defende a aplicação do artigo 12." do Código Civil ao campo do direito fiscal, indo até mais além, considerando a garantia da não retroactividade como incluída dentro do próprio princípio da legalidade:

Sabe-se que é um cânone fundamental do nosso sistema de direito civil a não retroactividade da lei (artigo 12." do Código Civil e artigo 8." do Código Civil de 1867). Assim também acontece no campo do direito fiscal, não só porque aquela regra, dominando lodo o ordenamento jurídico, é a expressão lógica da essência do normativo mas ainda porque assim o postula o princípio da legalidade do imposto consagrado no artigo 70." da Constituição Política (m).

Em suma: uma lei fiscal só pode aplicar-se aos factos ocorridos na sua vigência. Terá, portanto, dc respeitar factos passados c, bem assim, os efeitos já produzidos ("').

Outros autores vão mais longe, defendendo que o carácter retroactivo da lei fiscal não implica simples ilegalidade, mas antes consubstancia uma inconstitucionalidade material, por ofensa ao próprio princípio da legalidade do imposto (artigo 70." da Constituição dc 1955 e artigo 106.". n." 2, da Constituição de 1976).

Ê esta, por exemplo, a posição de Pessoa )orge {Curso dc Direito Fiscal. Associação Académica da Faculdade de Direito dc Lisboa. 1964. p. 129):

Aliás, pode dizer-se que o próprio princípio da legalidade postula a regra da não retroactividade, uma vez que a sujeição de um facto a um imposlo criado por lei posterior representa, efectivamente, uma tributação sem base legal, porquanto no momento em que o facto se verifica não havia uma lei que estabelecesse qualquer imposto.

Na mesma linha, também António de Sousa Franco (Estudos sobre a Constituição, 5° vol.. Sistema Financeiro e Constituição Financeira no Texto Constitucional de 1976. p. 534):

A reserva da lei formal tem diversos fundamentos, como a segurança jurídica objectiva e a protecção das expectativas legítimas dos contribuintes, entre outros já enunciados. Destes dois últimos fundamentos específicos decorre a proibição de atribuir efeilos retroactivos à lei «fiscal».

("') A formulação do n.° 1 e § 1." do artigo 70." da Constituição dc 1933 é sensivelmente idêntica, cm matéria dc impostos, à que consta do n." 2 do artigo 106° da Constituição de 1976.

('") Cf. também Acórdão do tribunal pleno dc 18 dc funho de 1975 (Acórdiios Doutrinais, n." 118. p. 1494) c Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Maio dc 1964 (ibidem, n" 22, p. 1270). dc 15 dc Maio de 1968 (ibidem, n.° 79. p. 983) e de 14 de lariciro de 1970 (ibidem, n.° 102, p 861).

Idêntica posição c assumida por Vital Moreira e Comes Canotilho (Constituição da República Porttiytesa Anotada, p. 241):

Deve entender-se que a ratio dc reserva de le; formal —des;gnadamente a segurança e a certeza jurídicas, a protecção das expectativas dos contribuintes— inclui, implicitamente. ;i proibição de atribuição de efeilos retroactivos á lei liscal. De resto, tal regra poderá eventualmente deduzir-sc do princípio da não retroactividade das leis dc imposição de deveres ou encargos aos cidadãos, implícito no principio da legalidade democrática (n." 4 do artigo 3." da Constituição).

Finalmente. Alberto Xavier (Manual dc Direito Fiscal, i. 1974. pp. 190 e segs.) assume o mesmo posicionamento com base na ideia de que a segurança jurídica, posta em contacto com matéria tributária e organizada no princípio da legalidade, se traduz «num princípio de protecção dc confiança», imperativo constitucional de qual-quor Estado de direito. Por outro lado, segundo o mesmo autor, se o princípio da legalidade consistisse apenas numa simples exigência da lei formal, ainda que esta se pudesse reportar a factos passados, a garantia que se pretende oferecer aos cidadãos ficaria em grande parte esvaziada. Finalmente, justifica, ainda, que, se a regra nullum tributum sine lege praevia não está corporizada no texto constitucional, tal como sucede com a regra nullum crimen. nulla poena sine lege praevia. tal facto deve-se à simples razão de tal proibição se encontrar já consagrada no artigo 70." da Constituição, sendo, pois, no princípio da legalidade que deve ver-se o fundamento da proibição constitucional da retroactividade das leis fiscais.

A posição assumido pelos quatro autores referidos afigura-se-nos a mas consentânea com as garantias não meramente formais consagradas na Constituição de 1976 e com os princípios constitucionais informadores do princípio da legalidade democrática, motivo por que propomos que a inconstitucionalidade material dos artigos 50." da Lei n." 4/81 c 54." da Lei n.° 40/81, por ofensa do disposto no n." 2 do artigo 106.° —princípio da legalidade do imposto, no qual se inclui uma garantia de não retroactividade—. seja levada à apreciação das enlidadas competentes.

16— Inconstitucionalidade material por ofensa do artigo 106.°, n.n 2. da Constituição (princípio da legalidade do imposto):

Siluando-nos num posicionamento que defende que o artigo 106.", n." 2, da Constituição, para além dos aspectos formais expressos (forma de lei, determinação dos elementos essenciais do imposto c competência de uma assembleia representativa), pretende salvaguardar aspectos materiais do princípio da legalidade, com a atribuição de uma garantia individual ao contribuinte, tal posição coloca-nos perante o problema de saber se, no caso concreto, tendo sido respeitada a forma constitucional estabelecida — forma de lei, lei emanada da Assembleia da República e lei regu-

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ladora dos aspectos típicos constitucionais do imposto—, não foi lesionado, de qualquer forma, o conteúdo material do principio da legalidade, de que aquele conteúdo formal é uma mera garantia. Com efeito, toda a metodologia adoptada para a reposição na ordem jurídica do imposto previsto no § 5." do artigo 708." do Código Administrativo é um espelho de falta de clareza e indeterminação, que devem ser evitadas na lei em geral e. em especial, na lei tributária. Caracterizando melhor:

O artigo 5.u, alínea a), n.° 3", da Lei n." 1/

79, de 2 de laneiro (Lei das Finanças Locais), atribuiu aos municípios a totalidade do produto da cobrança do imposto para o Serviço de Incêndios;

Em vez de regular em lei própria todo o regime aplicável a este imposto, na sua nova feição, o legislador preferiu repor em vigor um imposto revogado pelo artigo 27." da Lei n." 1/79, utilizando uma técnica inadequada, já que a criação de um imposto por via dc uma lei do Orçamento Geral do Estado só tem justificação para situações ou necessidades transitórias reportadas ao período de vigência de determinado orçamento;

Admitindo, no entanto, que a premência na criação de um título legal de cobrança deste imposto exigiu tal tramitação no primeiro ano de vigência da Lei n." 1/79, ainda se poderia aceitar a utilização deste «processo» no artigo 35." da Lei n." 8-A/

80, de 26 de Maio. mas já não a sua repetição nos artigos 50.° da Lei n." 4/81, de 24 de Abril, e 54." da Lei n." 40/81. de 31 de Dezembro;

Para além do processo ou metodologia processual utilizados, a redacção dos sucessivos preceitos orçamentais em que se consubstancia o regime material deste imposto levanta bastantes dúvidas: logo no ar-' tigo 35." da Lei n." 8-A/80 seria de questionar o lapso do legislador em referir um imposto já substituído na ordem jurídica por outro ainda em vigor, embora devido por sujeito tributário passivo diferente, o que motivou a sua não cobrança no ano de 1980:

Porém, a introdução da locução correctiva «sem prejuízo do disposto na Lei n." 10/ 79, de 20 de Março», se vem desfazer aquela dúvida, introduz ainda novos factores de indefinição: em termos terminológicos e de tipificação tributária, subsistem na ordem jurídica 3 tipos de impostos para o Serviço de Incêndios, dos quais apenas 2 são destinados aos municípios, .constituindo o outro receita de um serviço público, o Serviço Nacional de Bombeiros; esta dicotomia de afectação parece contrariar o disposto no artigo 50.° da Lei das Finanças Locais, que atribuiu aos municípios a totalidade do produto da cobrança daquele imposto, como igual-

mente contrariam o regime da mesma lei as distinções feitas nas leis orçamentais entre municípios com e sem direito ao imposto.

A situação que temos vindo a apreciar consubstancia, com efeito, um processo e forma de criação tributária em que os aspectos de tipicidade e determinação da obrigação fiscal são confusos e susceptíveis de variadas interpretações legais, o que contraria os valores da certeza e protecção de confiança, esta última traduzida na susceptibilidade de previsão objectiva das exigências tributárias, donde resulta que, tendo sido respeitado formalmente o princípio da legalidade, há um desrespeito dos valores e objectivos em que o mesmo assenta ou visa proteger ("2).

Por este motivo, afigura-se-nos que os artigos 50." da Lei n." 4/81 e 54." da Lei n." 40/81 estão feridos de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no artigo 106.". n." 2. da Constituição.

17 — Inconstitucionalidade material por ofensa do n." 2 do artigo 107." da Constituição (tributação de rendimentos brutos):

O n." 2 do artigo 107." da Constituição determina que a tributação das empresas incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

A redacção desta norma não permite concluir de forma incisiva uma expressa proibição da tributação de rendimentos brutos, antes constitui uma directriz ao legislador no sentido de a tributação das empresas incidir principalmente sobre rendimentos reais; acessoriamente, poderá incidir sobre outros rendimentos.

Aliás, tem sido entendido que a utilização da expressão «rendimento real» se destina não a proibir a tributação de rendimentos brutos, mas a optar, na tributação empresarial, pela tributação dos «lucros reais», efectivos au presumidos, ao invés dos «lucros normais», na linha já definida na reforma tributária de 1963 ("').

Por outro lado, e embora este não seja o argumento decisivo, cabe referir que o imposto para o Serviço de Incêndios previsto no § 5." do artigo 708.° do Código Administrativo foi pago pelas empresas seguradoras já na vigência da Constituição de 1976 (até à publicação da Lei n." 10/79, de 20 de Março), sem que pelas mesmas tivesse sido contestada a sua inconstitucionalidade superveniente (cf. artigo 293.°. n.° I. da Constituição).

('") V.. sobre esta matéria. Alberto XavieT. Manual de Direito físcal. i. pp. 118 e segs.

('") V.. sobre o assunto. Vital Moreira e Canotilho. Constituição da República Portuguesa Anotada, p. 242:

O n." 2 estabelece a regra dc tributação dos «lucros reais» (sejam efectivos ou sejam presumidos), c não dos «lucros normais», que intenta premiar a gestão real c anormalmente lucrativa c punir as situações restantes, vindo, no caso dc perdas efectivas, a incidir não sobre o rendimento, mas sobre o capital das empresas cuja gerência se lenha saldado com prejuízo.

No mesmo sentido. António de Sousa Franco, estudo já citado, p. 540.

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Em face do exposto, afigura-se-nos que os artigos 50." da Lei n.° 4/81 e 54.° da Lei n.° 40/ 81 não violam o disposto no artigo 107.°. n.° 2. da Constituição.

18 — Antes de finalizar, há, ainda, que definir o objecto de um eventual pedido de declaração de inconstitucionalidade, em ordem a estabelecer se o mesmo pedido deverá abranger também o artigo 50.° da Lei n.° 4/81 (Lei do Orçamento Geral do Estado para 1981, que caducou em 51 de Dezembro do respectivo ano) ou se deverá versar apenas sobre o artigo 54." da Lei n." 40/81 (Lei do Orçamento Geral do Estado para o ano em curso), tal como solicitado pelo exponente.

A apreciação pela Comissão Constitucional de normas caducas ou revogadas tem sido feita atendendo a meros critérios pragmáticos ou utilitaristas, baseados no «interesse útil» da apreciação de tais preceitos ('M). Embora pareça estar fora de questão a produção actual de efeitos do disposto no artigo 50." da Lei n.° 4/81, o que é cerlo é que, a verificar-se uma declaração de inconstitucionalidade material deste preceito pelo Conselho da Revolução, nos termos da alínea c) do artigo 146." e n." 1 do artigo 281." da Constituição, a eficácia dessa declaração é ex tune, salvo tratando-se de caso julgado (artigo 281". n.° 2, in fine, da Constituição). A retro3Cção dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade à data da entrada em vigor da Lei n." 4/81 permite concluir que, no caso em apreciação, o efeito útil a produzir pela declaração de inconstitucionalidade será a obrigatoriedade de reposição às companhias seguradoras dos impostos indevidamente pagos.

V) Conclusões e propostas

19 — De tudo o exposto há que concluir 6 seguinte:

a) Na situação em análise ocorre o fenómeno de dupla tributação, que exige a existência de pluralidade de normas [§ 5." do artigo 708." do Código Administrativo, reposto em vigor, e artigo 5.", alínea á), da Lei n.° 10/79]. e identidade do facto (prémios de seguros), embora não haja identidade do sujeito tributário passivo, circunstância, aliás, irrelevante para a integração do conceito. De qualquer modo. a ocorrência de dupla tributação não

("') Assim, num caso, em que se questionava a possibilidade de os consumidores reaverem o pagamento de um imposto sobre tabaco indevidamente pago, foi, de qualquer modo, emitido parecer sobre a inconstitucionalidade orgânica do diploma (Parecer n.° 27/78, 6." vol., p. 454); noutra situação, em que se colocava a apreciação da constitucionalidade de uma portaria aplicada exclusivamente a determinado ano lectivo, já a apreciação dc inconstitucionalidade não chegou a fazer-se por carecer de qualquer efeito útil (Parecer n.° 35/79, 10." vol.. p. 138); finalmente, num terceiro caso, de norma revogada, foi aceite a utilidade prálico-normativa do conhecimento actual do fundo do pedido, com base no princípio da eficácia cx lunc da declaração dc inconstitucionalidade e ainda pela possibilidade dc a norma revogada poder continuar a produzir efeitos (Parecer n.° t/80. 11." vol., pp. 28-29).

gera ilegalidade ou inconstitucionalidade — pelo menos, quanto ao primeiro caso, na ordem interna —, por não existir lei ordinária ou constitucional proibitiva;

6) No caso em apreciação não ocorre a situação de duplicação de colecta, que pressupõe a pluralidade de aplicações da mesma lei tributária, é não a aplicação de duas leis tributárias a contribuintes distintos;

c) Os artigos 50." da Lei n.° 4/81 e 54."

da Lei n." 40/81 são ambos retroactivos por se aplicarem a factos ocorridos antes da sua vigência (prémios de seguros processados no ano anterior).

A sujeição de um facto a um imposto criado por lei posterior assume a característica de uma tributação sem base legal, razão por que entendemos dever ser declarada a inconstitucionalidade material de ambos os preceitos, por ofensa ao n." 2 do artigo 106." da Constituição (princípio da legalidade do imposto);

d) A formulação confusa e contraditória

dos mesmos artigos 50." e 54.°, embora respeitando aspectos formais constitucionalmente estabelecidos, constitui uma quebra do princípio de garantia do contribuinte no sentido da determinação objectiva das suas obrigações fiscais, que constitui o fundamento do principio da legalidade. Por este motivo, os mesmos preceitos devem ser declarados materialmente inconstitucionais, por violação do fi° 2 do artigo 106." da Constituição (princípio da legalidade do imposto);

e) Os mesmos preceitos não ofendem o dis-

posto no n.v 2 do artigo 107." da Constituição, não só por esta norma não proibir de forma expressa ou implícita a tributação de rendimentos brutos, como também porque a formulação utilizada não visa tomar posição sobre a alternativa «rendimentos líquidos/rendimentos brutos», mas antes sobre os conceitos de «rendimento real» e «rendimento normal»; /) O pedido de declaração de inconstitucionalidade deve abranger tanto o artigo 50." da Lei n." 4/81 como o artigo 54." da Lei n.° 40/81, ainda cm vigor, por haver utilidade prático--normativa no conhecimento actual da primeira das normas.

19.1—Em face do exposto, propõe-se:

a) Que seja solicitada pelo Sr. Provedor de lustiça ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, de inconstitucionalidade material dos artigos 50.° da Lei n." 4/81 e 54." da Lei n.° 40/81, por ofensa ao disposto no artigo 106;°.

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n." 2. da Constituição (artigo 281.°, n.° 1, da Constituição), na dupla perspectiva de retroactividade e falta de clareza dos preceitos; b) Que se recomende a elaboração pela Assembleia da República dc lei reguladora do imposto para o Serviço de Encêndios, com o objectivo de dar uma execução coerente, permanente e com-prensível ao disposto no artigo 5.", alínea a), n." 3.", da Lei das Finanças locais (Lei n.° 1/79, de 2 de laneiro) — artigo 18.°, n." 1, alínea b), da Lei n.° 81/77. de 22 de Novembro.

3 — O Provedor concordou com a fundamentação e conclusões deste parecer, tendo, por considerar intolerável a retroactividade em questão, pedido a declaração de inconstitucionalidade das disposições referidas nas Leis n."v 4/81 e 40/8!.

4 — Formulou também à Assembleia da República a seguinte recomendação:

1 — A Associação... dirigiu-me uma exposição em que colocava dúvidas sobre a constitucionalidade dos preceitos constantes dos artigos 50.° da Lei n.° 4/81, de 24 de Abril, e 54." da Lei n." 40/81, de 31 de Dezembro (leis do Orçamento Geral do Estado para 1981 e para 1982), e me pedia para utilizar, neste caso, a competência que me é atribuída pelo n." 1 do artigo 281." da Constituição no sentido da apresentação do problema ao Conselho da Revolução, para efeitos de apreciação e declaração, com força obrigatória geral, de inconstitucionalidade daqueles preceitos. Em anexo juntou também parecer subscrito pelo Dr. Vítor Duarte Faveiro na defesa da sua pretensão.

2 — Da análise que fiz sobre o assunto concluí que aqueles preceitos violavam o princípio da legalidade contido no n." 2 do artigo 106." da Constituição (inconstitucionalidade material), por duas ordens de razões:

a) Carácter retroactivo. — Ambos os precei-

tos se aplicam a factos ocorridos antes da sua vigência (prémios de seguros processados no ano anterior), sendo certo que a sujeição de um facto a um imposto criado por lei posterior assume a característica de tributação sem base legal e que a própria metodologia utilizada nas leis do OGE, em que se incluem, de recriação anual e sucessiva daqueles impostos, constitui uma «clara violação do princípio do Estado de direito» (Parecer n." 5/81 da Comissão Constitucional) e uma «situação que choca a consciência jurídica e frustra as expectativas fundadas dos contribuintes, cuja defesa constitui um dos princípios do Estado de direito social» (Parecer n.° 18/81 da Comissão Constitucional), assumindo a característica de «retroactividades intoleráveis»;

b) Indeterminação.— A formulação con-

fusa e contraditória dos mesmos arti-

gos 50.° e 54.°, embora sejam respeitados aspectos formais constitucionalmente estabelecidos, constitui uma quebra do princípio da garantia atribuída ao contribuinte no sentido da determinação objectiva das suas obrigações fiscais, que constitui fundamento do princípio da legalidade.

3 — Na sequência da análise feita, decidi solicitar ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, de inconstitucionalidade das normas contidas nos artigos 50.° da Lei n.° 4/81, de 24 de Abril (Lei do Orçamento Geral do Estado para 1981), e 54." da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento Geral do Estado para 1982), por violação do disposto no n.° 2 do artigo 106.° da Constituição, na modalidade de inconstitucionalidade material.

4 — A análise de todo o processo permitiu-me também concluir que as providências avulsas tomadas naquelas leis orçamentais de recriação, por anos orçamentais sucessivos, de um imposto que fora revogado pelo artigo 27.° da Lei n.° 1/79, de 2 de Janeiro (lei das finanças locais) — o antigo imposto para o Serviço de Incêndios previsto no § 5." do artigo 708." do Código Administrativo (a pagar pelas empresas seguradoras sobre os prémios de seguros contra fogo, agrícolas e pecuários processados no ano imediatamente anterior) —, resultaram de essa Assembleia da República, no uso da sua competência própria, ainda não ter aprovado o novo diploma legal regulador do imposto para o Serviço de Incêndios com feição de execução permanente eestabilizada (cf. artigos 5o. alínea a), n.° 3.°, e 27.", alínea a), da Lei n.° 1/79, de 2 de Janeiro.

5 — Em face de tudo o anteriormente exposto, cumpre-me levar ao conhecimento de V. Ex.a a situação existente, para os fins que sejam tidos por convenientes e, nomeadamente, que se afigura mais conforme à legalidade que:

1.° Em leis orçamentais futuras a Assembleia da República não utilize a metodologia adoptada nos artigos 50.9 da Lei n.° 4/ 81, de 24 de Abril, e 54.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, de recriação, com efeitos retroactivos, de impostos já revogados e por via de formulações legais confusas;

2.° Pela Assembleia da República venha a ser aprovada a nova lei reguladora do imposto para o Serviço de Incêndios, com vista a dar execução coerente, permanente e compreensível ao artigo 5.°, alínea a), n.° 3.°, da Lei n.° 1/79, de 2 de Janeiro, que constitui também uma exigência lógica da revogação operada pelo artigo 27.°, alínea a), da mesma lei, de toda a parte in do Código Administrativo, em que se continha a disciplina básica do regime daquele imposto.

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6 — Agradeço a V. Ex.° que se digne transmitir-me as providências que venham a ser tomadas por essa Assembleia.

5 — O Conselho da Revolução, através da Resolução n.° 194-D/82, de 26 de Outubro (publicada a 29 desse mês), discordou, porém, da posição do Provedor, não declarando a pretendida inconstitucionalidade.

6 — Desconhece-se, por outro lado, o seguimento que na Assembleia da República tenha tido a recomendação formulada neste caso pelo Provedor.

9 — Transferência de magistrados judiciais e do ministério público com a classificação de «Suficiente»

Processos n.°s 82/R-815-01-12 e 82/R-l052-01-18

1 — O sindicato representativo dos magistrados do ministério público levantou junto do Provedor a questão da constitucionalidade dos artigos 34.°, n.ü 2, e 43.ü, n.° 2, da Lei n.° 85/77 e do artigo 121.°, n.° 5, da Lei n.° 39/78, na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.° 264-C/81, de 3 de Setembro.

Posteriormente, esta posição foi corroborada pela associação representativa dos magistrados judiciais.

2 — Sobre a questão foram elaborados, respectivamente pela assessora encarregada do processo e pelo correspondente coordenador, os seguintes pareceres:

Parecer da assessora:

1 — O sindicato reclamante solicita que o Provedor de Justiça peça ao Conselho da Revolução a apreciação da inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 34.°, n.° 2, e 43.°, n.° 2, da Lei n.° 85/77, de 13 de Dezembro, e 101.°, n.° 2, e 121.°, n.° 5, da Lei n.° 39/78, de 5 de Julho, na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.° 264-C/81, de 3 de Setembro.

Posteriormente, a associação vem também fazer o mesmo pedido no que se refere à Lei n.° 85/77.

2 — As normas respeitantes à transferência, muito semelhantes, estabelecem, respectivamente:

Artigo 43.° da Lei n.° 85/77:

1 — Os magistrados judiciais podem ser transferidos quando decorridos 2 anos ou 1 ano sobre a data da posse no cargo anterior, consoante a precedente colocação tenha ou não sido realizada a pedido.

2 — Independentemente dos prazos referidos no número anterior, o Conselho Superior da Magistratura pode proceder à transferencia, por conveniência de serviço, de magistrados que a tal hajam dado a sua anuência ou que tenham sido classificados de Suficiente ou Medíocre.

Artigo 101.°, n.° 2. da Lei n.° 39/78:

2 — O magistrado classificado de Suficiente ou Medíocre não pode ser transferido a não ser em virtude do sexénio, por motivo de natureza disciplinar ou por conveniência de serviço.

Artigo 121.°, n.° 5, da Lei n.° 39/78:

5 — Independentemente dos prazos referidos nos números anteriores, o Conselho Superior do Ministério Público pode proceder à transferência, por conveniência de serviço, de magistrados que a tal hajam dado a sua anuência ou que tenham sido classificados de Suficiente ou Medíocre.

Relativamente às garantias dos magistrados e dos agentes do. ministério público, estabelece a Constituição da República Portuguesa:

Artigo 221." (garantias):

1 — Os juízes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.

Artigo 225.° (agentes do ministério público):

1 — Os agentes do ministério público são magistrados responsáveis, hierarquicamente subordinados, e não podem ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.

3 — Uma vez que, nos termos do n.° 1 do artigo 280.°, são inconstitucionais as normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados, cabe interpretar as disposições em causa.

No comentário aos artigos 221." e 225.° diz-se na Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira, que estes artigos não garantem a inamovibilidade absoluta, tratando-se antes de uma garantia de legalidade, de reserva de lei, no que respeita às excepções, constitucionalmente autorizadas, a este princípio.

Também num parecer subscrito pelo Dr. Arala Chaves, publicado na Revista da Ordem dos Advogados, de Mao-Agosto de 1981, se afirma, a p. 564:

Hoje a ideia substancial que a inamovibilidade envolve é a da estabilidade no cargo, mas estabilidade relativa, definida e limitada pela lei, e não estabilidade absoluta, que vincula indissoluvelmente o magistrado ao lugar.

Importa ver qual a amplitude desta «reserva de lei no que respeita às excepções».

Na discussão que teve lugar na Assembleia Constituinte relativamente ao texto do artigo 21." da Comissão, que viria a ser o artigo 225." da Constituição da República Portuguesa, a propósito da utilização dos adjectivos «previstos» ou «determinados» como qualificativos dos «casos», disse o deputado Barbosa de Melo querer-se garantir «que as transferências não podem ser feitas por arbítrio de ninguém», e mais adiante:

[...] neste domínio não existe mesmo poder discricionário de quem quer que seja, no caso da Procuradora-Geral da República.

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Ela, Procuradoria-Gcral da República, não gozará nesta matéria de quaisquer poderes discricionários. Só pode tomar decisões neste domínio em casos determinados, claramente determ'nados e especificados na lei.

Depois de se ter considerado, pela boca do deputado José Luís Nunes, que as expressões «casos determinados» e «casos previstos» eram sinónimas, optou-se pela forma que já tinha sido aprovada para a redacção do artigo que viria a ser o 221.° da Constituição, relativo aos juízes, isto é, «casos previstos na lei». Não sem antes o deputado Barbosa de Melo ter afirmado que estava de acordo só na base de que a palavra «previstos» quer significar que a lei tem de determinar sempre um mínimo de pressupostos para que possa ser exercido este poder, mas não respeitará «esta fórmula uma lei que diga, sem especificar os pressupostos», que os agentes do ministério público podem ser transferidos por conveniência urgente de serviço. «Essa lei terá de dizer sempre e especificar os casos mais ou menos proximamente, como as circunstâncias o permitirem, terá de especificar os pressupostos em que o exercício de um poder de consequências tão graves para a vida do agente do ministério público pode ser exercido.»

4 — Nestes termos, poderá considerar-se que as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n." 264-C/81, de 3 de Setembro, se inserem no espírito e na letra dos preceitos constitucionais?

Suponho que, numa perspectiva rigorosa, será de entender que vão além do que está disposto, pois não se limitam a prever «casos». Estabelecem, de facto, um poder discricionário de transferência, por conveniência de serviço, relativamente aos magistrados que sejam qualificados de Suficiente ou Medíocre. É de notar, porém, que o texto do projecto deste diploma foi dado a conhecer à Assembleia da República pelo Governo quando solicitou a concessão da autorização legislativa, e nesta matéria só o deputado Carlos Candal se pronunciou quanto à qualificação de Suficiente implicar uma transferência que, no seu entender, era uma punição (Diário da Assembleia da República, n.ü 88, de 27 de Junho de 1981, p. 3547). Como se viu, tal como está o texto, tal classificação não implica, necessariamente, a transferência, mas é uma condição necessária para que a mesma possa ter lugar, se houver conveniência de serviço.

5 — Ambas as instituições reclamantes pedem ainda que seja solicitada a declaração de inconstitucionalidade do n.° 2 do artigo 34.° da Lei n.° 85/77, na redacção dada pelo mesmo Decreto--Lei n.° 264-C/81. Diz este preceito:

A classificação de Medíocre implica a suspensão do magistrado e a instauração de inquérito por inaptidão para o exercício do cargo.

O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público solicita o mesmo relativamente ao n.° 2 do artigo 101.ü da Lei n.° 39/78, de 5 de Julho, mas suponho que queterú referir o n.° 3, na re-

dação dada pelo Decreto-Lei n.° 264-C/81, visto tratar-se de disposição igual à anteriormente reproduzida do Estatuto dos Magistrados Judiciais, que, aliás, constava já, como aquela, dos textos iniciais dos respectivos diplomas, de 1977 e 1978.

Como se viu, resulta dos artigos 121.°, n.° 1, e 225.°, n.° 2, que os magistrados judiciais e do ministério público não podem ser suspensos senão nos casos previstos na lei (cf. n.° 1).

6 — As disposições legais acima referidas obedecem aos preceitos constitucionais, pois indicam com precisão casos em que os magistrados são suspensos, isto é, desde que obtenham a classificação de Medíocre.

Aliás, estes preceitos integram-se na economia geral dos diplomas, pois os artigos 136.° da Lei n.° 85/77 e 104.° da Lei n.° 39/78 mandam aplicar à instrução dos processos de inquérito as disposições relativas à instrução dos processos disciplinares, e nesta é permitida, nos artigos 120." e 188.°, a suspensão preventiva dos arguidos em processo disciplinar.

Nestes termos, não parece poderem considerar-se feridas de inconstitucionalidade as disposições contidas nos artigos 34.°, n.ü 2, da Lei n.° 85/77 e 101.°, n.° 3, da Lei n.° 39/78.

7 — Propõe-se à consideração superior que, nos termos do n.° 2 do artigo 18." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, se proponha ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do disposto no n.° 2 do artigo 43." da Lei n.° 85/77 e no n.° 2 do artigo 101.° e no n.° 5 do artigo 121." da Lei n.° 39/78.

Parecer do coordenador:

1 — O sindicato (cf. processo n.u 82/D1-12-A) e a associação (cf. processo n.° 82/DI-18-A) requerem ao Provedor de Justiça que seja solicitada ao Conselho da Revolução, nos termos do artigo 281.°, n.° 1, da Constituição da República, a apreciação e declaração de inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 34.°, n.° 2, e 43.°, n.° 2, da Lei n.° 85/77, de 13 de Dezembro, e 101.°, n.° 2, e 121.°, n.° 5, da Lei n.° 39/ 78, de 5 de Julho, na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.° 264-C/81, de 3 de Setembro.

Explicita, essencialmente, o primeiro:

Os dispositivos em causa, na parte em que permitem que magistrados classificados de Suficiente sejam transferidos por conveniência de serviço, violam o disposto no n.° 1 do artigo 221.° e no n.° 1 do artigo 225.° da Constituição.

É que, escrevem, segundo estes preceitos, os juízes e os agentes do ministério público não podem ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei: trata-se da consagração do princípio da inamovibilidade, que se deve considerar extensivo aos magistrados do ministério público, dada a identidade de conteúdo entre os dois preceitos constitucionais citados.

E tal princípio é, reconhecidamente, a primeira garantia da independência dos tribunais, consagrada no artigo 208.° da Constituição.

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Aplicado na sua pureza e integralidade, o princípio da inamovibilidade conduziria a que os magistrados não pudessem, sem a sua anuência, ser transferidos ou afastados donde foram colocados, nem mesmo por motivo de idade (princípio da vitaliciedade).

Contudo, se este último princípio sofre uma limitação etária, que se compreende e aceita, por racional, menos aceitável é já a permanência da regra do sexénio, por ter na sua base a desconfiança relativamente à isenção dos magistrados.

É, por sua vez, compreensível que um magistrado classificado de Medíocre, uma vez apurada a sua responsabilidade em processo disciplinar idóneo e com suficientes garantias de defesa, venha a ser sancionado com transferência ou aposentação compulsiva ou mesmo demissão, pois a defesa dos direitos dos magistrados nunca poderá fazer esquecer a existência de interesses mais valiosos, como o direito dos povos a uma justiça competente e pronta.

Mas, se as excepções ao princípio da inamovibilidade se justificam em certos casos, são já inadmissíveis quando representem, na prática, a negação daquele princípio: assim, quando o legislador constitucional comete ao legislador ordinário que regulamente os direitos que aquele consagrou, tal regulamentação pode apresentar medidas restritivas, mas sem que se ultrapasse o limite para além do qual tais direitos não passariam de palavras vãs.

Este limite foi, porém, ultrapassado pelas normas cuja inconstitucionalidade se argúi.

Ê que, ao permitir-se que se aplique a sanção de transferência — e acentua que esta medida, tal como se encontra prevista, tem evidente carácter sancionador— aos magistrados classificados de Suficiente —com a simples e vaga invocação da «conveniência de serviço» — está-se a esvaziar completamente de sentido o princípio da inamovibilidade.

Com eteito, a classificação ae Suficiente é uma classificação positiva, indicadora de que o magistrado executa satisfatoriamente as suas funções, embora sem condições para ser promovido.

Ora, sujeitá-lo à «pena» de transferência por mera invocação de conveniência de serviço significa colocá-lo nas mãos da discricionariedade da maioria dos conselhos superiores respectivos.

Trata-se, aliás, de dispositivo legal mais gravoso que o do artigo 534.° do Estatuto Judiciário de 1962, o qual apenas permitia que o Conselho Superior Judiciário propusesse a transferência de magistrados que tivessem sido classificados com nota inferior à de Regular.

A inadmissibilidade das normas em causa resulta ainda de que elas representam a aplicação de uma sanção disciplinar sem processo e com negação do direito de defesa, consagrado no artigo 270.°, n.° 3, da Constituição.

Fundamenta a segunda:

A aplicação das normas em causa, na parte em que permite a transferência compulsiva de magistrados judiciais, ofende o princípio da inamovibilidade dos juízes consignado no n.° 1 do artigo 221." da Constituição, tanto mais que nin-

guém deve ser passível de uma medida de carácter objectivamente disciplinar sem prévio processo disciplinar.

Acrescenta-se entender que uma lei ordinária que, na prática, subverta o referido princípio é inconstitucional e que, embora no ponto de vista formal possa parecer que os normativos em causa não seriam inconstitucionais, a verdade é que isso se verifica, designadamente no tocante à expressão «ou que tenham sido classificados de Suficiente ou Medíocre».

Distribuído o processo, produziu a Ex.ma Assessora sobre a matéria suscitada a informação antecedente, em cuja conclusão propõe que, nos termos do n.ü 2 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77. de 22 de Novembro, se coloque ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração de inconstitucionalidade do disposto no n.° 2 do artigo 43." da Lei n.° 85/77 e no n.° 2 do artigo 105.° e no n." 5 do artigo 121.° da Lei n.° 39/78.

Cabe emitir opinião.

Ê o que, de seguida, se tentará fazer.

2 — No tocante aos magistrados judiciais, dispõe, com efeito, o artigo 221.° da Constituição da República:

1—Os juízes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.

Quanto aos magistrados do ministério público, preceitua o artigo 225.° da Constituição da República:

1 — Os agentes do ministério público são magistrados responsáveis, hierarquicamente subordinados, e não podem ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei.

Em ambos os artigos se consagra, quer quanto aos magistrados judiciais, quer quanto aos do ministério público, o princípio da inamovibilidade, princípio que, como se alcança, é comum a ambas as magistraturas, salvaguardadas as consabidas diferenças no que toca à responsabilidade e à hierarquia.

Mas ao remeter-se a regulamentação das excepções para a lei ordinária há que convir que a inamovibilidade que constitucionalmente se garante aos magistrados (judiciais e do ministério público) se limita a ser, como apontam ]. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, p. 412, nota ti), «uma garantia de reserva de lei quanto às excepções à inamovibilidade».

A questão residirá, pois, em saber-se em que medida a lei ordinária, ao prever os casos de excepção, correspondeu ao pensamento do legislador constitucional e ao espírito inserto no preceito.

3 — Do cotejo entre os artigos 34.", n.° 2, c 43.°, n." 2, da Lei n.° 85/77 e 101.°, n.° 2, e 121.°, n.° 5, da Lei n.° 39/78 (na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.° 264-C/81, de 3 de Se-

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tembro) decorrem as seguintes regras com especial interesse para a matéria em apreço:

Assim, para além dos prazos fixados no n." 1 do artigo 43.°, o Conselho Superior da Magistratura pode proceder à transferência dos magistrados por conveniência de serviço sempre que aqueles anuam a tal transferência ou pelo decurso do sexenio.

Contudo, se o magistrado houver sido classificado de Suficiente ou de Medíocre, pode ser transferido sem a sua anuência.

Quer dizer que aquelas classificações são susceptíveis de determinar, pura e simplesmente, uma transferência por conveniência de serviço, tal como, afinal, é possível suceder aos magistrados que incorram em sanção de natureza disciplinar.

Só que. enquanto para os que se encontram incursos neste último condicionalismo a transferência decorre de decisão proferida em prévio processo disciplinar, com as garantias de defesa inerentes, para aqueles a transferência pode radicar-se, com melhor ou pior fundamentação, numa mera classificação, sem outro processo que o normal processo inspectivo — que, é bem de ver, não é processo disciplinar— e sem outro critério que ó pessoal ou subjectivo dos inspectores, variável de uma para o outro, e, por consequência, manifestamente aleatório.

4 — Será lícito, assim, duvidar —e duvidar muito seriamente — de que, ao remeter para a lei ordinária a disciplina legislativa das excepções ao princípio da inamovibilidade, o legislador constitucional haja admitido sequer que esta lei houvesse enveredado por uma zona tão insegura como é a de fazer depender a ocorrência dessas excepções de critérios não somente casuísticos, como subjectivos, e não uniformes para casos similares.

Ê que, com efeito, para além das hipóteses do sexenio (que é condicionalismo com que cada magistrado conta, não sendo aqui a altura própria para se discutir a sua indispensabilidade) ("5) e de transferência a pedido ou com anuência (uma e outra envolvendo atitude pessoal e livre do interessado), terá de concluir-se das normas visadas que um magistrado corre sempre o risco de ser transferido desde que não tenha obtido classificação superior a Suficiente e ainda que não haja incorrido em infracção disciplinar.

Convenha-se que bem parece situação incompatível com a inequivocidade que sempre deve ter «um caso previsto na lei».

5 — Tá se terá deixado antever o quanto é perigoso excepcionar um princípio com as características da inamovibilidade, sobretudo quando se utiliza como factor relevante para a sua derrogação o resultado das inspecções.

0") Pessoalmente, entendo que a isenção dc um magistrado não tem relação directa ou relevante com o tempo dc permanência em determinada comarca ou em certo tribunal.

O instituto pode, porém, encontrar justificação, à luz do interesse dos povos, numa renovação periódica de métodos ou de critérios de julgamento, o que não será de somenos importância.

É que para a justeza de classificação, mesmo que a seu respeito ouvido, o magistrado não tem decisiva ou, pelo menos, relevante influência.

A classificação decorre, fundamentalmente, dó parecer e da proposta do inspector, base de ulterior deliberação do conselho, e é desta simbiose que verdadeiramente resulta a nota funcional.

O facto de se não ter logrado ainda um sistema menos escolástico ou menos tradicionalista dc ajuizar da capacidade de um magistrado não significa que se lhe não devam reconhecer algumas deficiências (e não são de reduzida importância as que derivam da flutuação dc critérios inspecti-vos, da subjectividade de apreciação, da natureza, dificuldade ou quantidade dos processos, etc).

Ora, o simples reconhecimento dessas deficiências faz avultar o perigo de sc utilizar a nota classificativa como base para desencadear uma transferência por conveniência de serviço.

Escusado será também encarecer que determinadas transferências podem roçar pelo absurdo: pense-se, por exemplo, num juiz classificado de Suficiente num tribunal de família transferido por conveniência de serviço —e esta conveniência de serviço será, necessariamente, fundamentada pela inadequação do magistrado para o exercício da função naquele tribunal — para comarca onde, ao contrário do que lhe sucedia no juízo originário, terá de se haver com uma extrema variedade de tipos processuais ou com uma gama de questões diversas.

De resto, sempre será discutível entender que há juízes que não convém que estejam na comarca A, mas que podem exercer funções na comarca B, quando os povos que têm direito à justiça na comarca B têm o mesmo direito ao bom julgador que os da comarca A.

6 — Sendo evidente que a regra de inamovibilidade não pode (nem deve) ser entendida em termos absolutos — como sucederia a não existir regulamentação tipificadora das excepções— evidente será também que aquela regra, e o respeito que lhe é devido, ficarão despidos de sentido se a lei ordinária for pautada pela possibilidade de exercício de faculdades de natureza discricionária como aquela que permite determinar uma transfer rência por conveniência de serviço sem anuência, seja tal transferência pior ou melhor fundamentada.

É que, sé a simples circunstância de um magistrado ser classificado de Suficiente (e mesmo de Medíocre) abre a porta ao desencadear puro e simples de uma transferência, não é ser-se demasiado exigente considerar que se está em presença de uma verdadeira sanção, com a agravante de ela ser aplicada sem a precedência de processo próprio.

7 — A situação é especialmente preocupante no concernente aos magistrados classificados de Suficiente.

De facto — a menos que a língua portuguesa, suas palavras e sinónimos tenham passado a ter, mais ou menos arbitrariamente, significados e cambiantes diversos dos sempre conhecidos—, não deixa de causar espanto que se possa por mera conveniência de serviço transferir, assim atin-

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gindo a regra da inamovibilidade, um magistrado que os próprios termos da classificação apontam, não sendo porventura brilhante, como razoável ou bastante.

Mas, por outro lado, a classificação de Medíocre envolve um juízo tão negativo sobre um membro de um órgão de soberania que, neste caso. a transferência nunca se deveria efectivar sem a instauração de prévio processo de inquérito ou disciplinar.

O magistrado medíocre é potencialmente susceptível — por mais honesto que seja— de prejudicar as partes e os superiores interesses da justiça.

Todavia, estão no mesmo plano.

8 — O dispositivo legal que melhor serviria a regulamentação das excepções admitidas pelo princípio constitucional da inamovibilidade seria o que preceituasse só poderem ocorrer transferências ou pelo decurso do sexénio, ou por iniciativa própria, ou por anuência, ou em resultado de processo disciplinar.

O que equivalerá a dizer que não poderia haver transferências em sequência de classificações.

Mesmo no caso de magistrado classificado de Medíocre: aqui seria, sim, de abrir imediato processo disciplinar ou de inquérito, no qual, com todas as garantias de defesa para o visado, incluindo a possibilidade de recorrer, se buscaria aperceber os condicionalismos externos ou subjectivos que houvessem determinado uma menor capacidade do magistrado.

9 — Diga-se ainda que a inamovibilidade se destina —com a irresponsabilidade para os magistrados judiciais— a colocar o magistrado a coberto de pressões, inclusive dos próprios conselhos superiores, dando-se o caso de estes serem integrados de elementos estranhos à classe e à função (isto, note-se, em pura tese, não envolvendo, assim, qualquer juízo desvalorativo para os actuais ou passados componentes).

Ora, ficará frustrada se o magistrado a todo o momento se achar dominado pelo receio de ver perigar a sua estabilidade sem sequer o poder prever, pois não lhe é possível o conhecimento de como será classificado, e, se classificado de Suficiente ou de Medíocre, se tal classificação irá ou não desencadear a sua transferência.

10 — Parece evidente, então, que as normas visadas não correspondem ao princípio constitucional da inamovibilidade, designadamente à regulamentação objectiva que tal princípio tem de exigir.

Ao referir-se a «casos previstos na lei» não teria o legislador constitucional querido significar outros que não os casos extremos — e casos extremos exigem uma delimitação específica, taxativa e inequívoca (como, de resto, sucede nas hipóteses do sexénio, da transferência com anuência e da decorrente de processo disciplinar).

Não é, porém, ao que se viu, o que acontece com o condicionalismo em apreciação.

Com efeito, as normas cuja inconstitucionalidade se argui não definem, em termos de presciência inequívoca para os destinatários, em que condições pode ocorrer uma transferência por conveniência de serviço sem anuência.

Na verdade, o magistrado classificado de Suficiente ou de Medíocre sabe que tais classificações não acarretam, necessariamente, a sua transferência, mas ignora se, por ter sido assim classificado, será ou não transferido.

Ao reportar-se a casos «previstos na lei» o legislador constitucional considerou, implicitamente, a necessidade de se excluírem as situações não decorrentes de tipificações objectivas.

Por exemplo, uma coisa será dizer que o magistrado será transferido por conveniência de serviço sempre que seja classificado de Medíocre ou de Suficiente e outra — que é a que poderá ocorrer no enquadramento legal vigente — que o magistrado pode ser transferido sempre que tenha aquelas classificações.

Ora, dificilmente se concebe como «caso previsto na lei» o caso que depende (aleatoriamente) de uma faculdade discricionária, embora por lei consentida.

Com mais esta adjuvante: parece francamente incurial que possam, neste esquema, ocorrer situações em que magistrados com a mesma classificação (de Medíocre ou de Suficiente) sejam, uns transferidos .... outros não.

11 — Na sequência do que se escreveu no n." 6 e do que, aliás, foi relevado quer pelo sindicato quer pela associação, importa, a finalizar, atardar--nos ainda num aspecto.

Só os magistrados classificados de Suficiente ou de Medíocre são susceptíveis de ser transferidos nas circunstâncias apontadas.

Porquê?

A única resposta lógica que ocorre é que essa transferência consubstancia, nos casos em que ocorre, uma verdadeira sanção.

E sanção que não tem a precedê-la, na sua aplicação, processo disciplinar adequado, onde o visado pudesse alinhar a sua defesa contra tal medida ou onde, designadamente, se lhe concedesse a objectiva possibilidade de estruturar a sua discordância quanto à conveniência da mesma medida.

Ora, se a classificação de Medíocre deveria, inevitavelmente, dar azo ao desencadear de processo disciplinar, na hipótese de classificação de Suficiente, a existência desse processo é o lógico corolário de uma lídima necessidade de defesa para o magistrado que, embora tido como capaz, razoável ou bastante, é, ainda assim, atingido por decisão que, por sua natureza —basta ver o que ela envolve de incómodo material ou de repercussão subjectiva —, se reveste de carácter sancionatório e punitivo.

Assim sendo, e à luz do estabelecido no n." 3 do artigo 270." da Constituição, decorre a inconstitucionalidade da inexistência de processo disciplinar em que se garantissem a audiência e a defesa do atingido.

12 — Normas como as dos artigos 45, n." 2, c 101.", n." 2, da Lei n." 39/78 (ou do artigo 121.", n." 5) não correspondem, pois. a meu ver, a uma regulamentação adequada do princípio consagrado na lei fundamental e adquirem o vício da inconstitucionalidade, assim o ofendendo pelo seu cariz

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aleatório, indefinição perigosa e preocupante discricionariedade.

Além de que, estabelecendo uma verdadeira sanção sem precedência de processo disciplinar, ofendem também o princípio estabelecido no n.° 3 do artigo 270.° da Constituição.

Razão, entendo, pois, que assiste aos exponentes e à Ex.ma Assessora.

Nestes termos, pelo exposto e em conclusão, afi-gura-se-me que o Provedor de Justiça, ao abrigo do disposto no n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, deverá suscitar ao Conselho da Revolução a inconstitucionalidade material das normas em causa, por ofensivas dos artigos 221.°, n.° 1. 225.°, n.° 1, e 270.°, n.° 3, da Constituição da República.

Independentemente da actuação ventilada, mais proponho que:

a) Se sugira ao Conselho Superior da Magis-

tratura ponderação na aplicação das normas visadas até sobrevir decisão sobre a inconstitucionalidade suscitada, enviando-lhe cópia dactilografada dos pareceres e dos despachos proferidos no presente processo;

b) Se enviem igualmente cópias dactilogra-

fadas dos mesmos pareceres e despachos ao Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e à Associação Sindical dos Magistrados Judiciais Portugueses;

c) Também, com envio de tais elementos, se

dê conhecimento ao Ministro da Justiça.

3 — Concordando com esta posição, o Provedor pediu a declaração de inconstitucionalidade das normas em questão.

E sugeriu ao Conselho Superior da Magistratura e ao Conselho Superior do Ministério Público que so-bestivessem na aplicação dessas regras enquanto o Conselho da Revolução sobre elas se não pronunciasse.

4 — O Conselho da Revolução veio a declarar a inconstitucionalidade dos preceitos em análise, mediante a Resolução n.° 189-A/82, de 20 de Outubro (publicada a 25 desse mês).

10 — Carreira de Inspectores do Ministério da Educação

Processo n.° 82/R-1274-DI-21

1 — Um grupo de inspectores do Instituto Português do Património Cultural protestou pelo facto de a sua carreira estar definida em moldes que considerou discriminatórios, em confronto com as regras aplicáveis aos inspectores de várias direcções-gerais do Ministério da Educação.

2 — O Provedor de Justiça, fundado em razoes de constitucionalidade e de igualdade de tratamento deste tipo de funcionários, tentou, sem êxito, levar o Ministério da Educação a rever a legislação em causa.

3 — Face ao inêxito dessa diligência, o Provedor pediu ao Conselho da Revolução a declaração de inconstitucionalidade orgânica dos artigos 1.° e 6.° do

Decreto-Lei n,° 139-A/80 e 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 139-B/80, com base na seguinte argumentação;

1 — A revalorização de categorias operada pelos Decretos-Leis n.os 139-A/80 e 139-B/80, ambos de 20 de Maio, ter-se-á apoiado, segundo se afirma na parte preambular daqueles diplomas, quer no Decreto-Lei n.° 337/78, de 14 de Novembro, quer na Lei n.° 26/79, de 7 de Agosto, que ratificou este último. Por força do disposto no artigo 9.° da citada lei, o Governo ficou autorizado a definir, por decreto-lei, no prazo de 60 dias a contar da publicação da mesma lei, «a categoria da letra do funcionalismo público correspondente aos inspectores da Direcção-Geral de Pessoal».

2 — Porém, a autorização legislativa em causa foi utilizada, manifestamente, fora do respectivo prazo pelo Executivo, por ter caducado em Outubro de 1979 e os diplomas postos em crise (Decretos-Leis n.os 139-A/80 e 139-B/80) terem sido publicados em 20 de Maio de 1980.

3 — Para além disso, a letra da lei (artigo 9.° da Lei n.° 26/79) circunscrevia-se aos inspectores da Direcção-Geral de Pessoal, sendo de duvidosa legalidade a faculdade de se legislar mediante recurso a argumento de semelhança de situações profissionais, como refere o preâmbulo do Decreto-Lei n.° 139-B/80. Este diploma revela que o Governo terá exorbitado igualmente das respectivas atribuições ao «corrigir» pela via de decreto--lei a situação «injusta e descoordenada» que resultou do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 337/78, com a redacção que lhe foi dada pelo artigo único da Lei n.° 26/79.

4 — A definição da categoria de um determinado cargo constitui matéria que se enquadra no Estatuto da Função Pública, como resultava, aliás, da própria autorização legislativa conferida ao Governo.

Tratando-se de matéria da competência reservada da Assembleia da República [alínea m) do artigo 167." da Constituição], não caberia ao Governo legislar depois de ter caducado a autorização concedida no diploma de ratificação (a Lei n.° 26/79).

5 — As normas dos artigos 1.° e 6.° do Decreto--Lei n.° 139-A/80 e 1.° e 2.° do Decreto-Lei n.° 139-B/80, de 20 de Maio, ofendem o disposto nos artigos 167.°, alínea m), e 168.°, n.° 1, da Constituição, estando, pois, feridas de inconstitucionalidade orgânica.

4 — O Conselho da Revolução não chegou a pronunciar-se sobre o caso, devendo ele ter transitado para o Tribunal Constitucional.

11 — Encargos financeiros relativos às delegações escolares

Processo n.° 82/R-1199-DI-20

Uma câmara municipal sugeriu ao Provedor que analisasse a constitucionalidade do artigo 44.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 211/81, de 13 de Julho, que fez incidir sobre as autarquias locais os encargos com as delegações escolares do ensino primário.

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Apreciada a questão, o Provedor decidiu pedir a declaração de inconstitucionalidade da mencionada disposição, com base nas seguintes razões:

1 — O artigo 44.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 211/ 81, de 13 de Julho, veio estabelecer que as instalações, equipamento e mobiliários das delegações escolares estarão a cargo das autarquias locais.

Depara-se-nos um caso de criação de uma atribuição para as autarquias locais.

2 — Dispõe o artigo 239.° da Constituição que «as atribuições e a organização das autarquias locais, bem como a competência dos seus órgãos, serão reguladas por lei, de harmonia com o princípio da descentralização administrativa».

E o artigo 167.°, alínea h), também do diploma fundamental, estabelece que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre a «organização das autarquias locais».

A propósito do alcance desta norma escreveram Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, pp. 334-335) que «o termo 'organização' deve ser interpretado em termos amplos, abrangendo não só o regime dos órgãos autárquicos, mas também as atribuições das autarquias e a competência dos seus órgãos, isto é, todo o estatuto das autarquias locais».

No mesmo sentido se pronunciou a Comissão Constitucional no parecer n.° 24/79 (Pareceres da Comissão Constitucional, 9° vol., pp. 85 e segs.).

3 — Assim, entendemos que deve ser solicitada ao Conselho da Revolução, nos termos do artigo 281.°, n.° 1, da Constituição, a declaração de inconstitucionalidade da norma do artigo 44.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 211/81, de 13 de Julho, pois que a mesma viola o disposto nos artigos 167.°, alínea h), e 239.° do diploma fundamental.

O Conselho da Revolução não chegou a pronunciar--se sobre o problema, devendo ele ter transitado para o Tribunal Constitucional.

C) Evolução de pedidos de declaração de inconstitucionalidade relatados em anos anteriores

a) Autorização para a salda de militares para o estrangeiro

O Conselho da Revolução, através da sua Resolução n.° 113/82, de 15 de Julho, resolveu não se pronunciar pela inconstitucionalidade dos artigos 3.° e 6.° do Decreto-Lei n.° 35 983, de 23 de Novembro de 1946, que conferiam ao responsável pelo Exército um poder discricionário não limitado no tocante à autorização da saída de militares para o estrangeiro (Relatório do Provedor de Justiça de 1979, p. 59).

Contudo, e em parte na sequência do pedido de declaração de inconstitucionalidade suscitado pelo Provedor, o Conselho da Revolução aprovou nova legislação, remodelando de modo profundo o regime de saídas dos militares, com o objectivo, precisamente, de o ajustar ao direito de livre circulação (Decreto-Lei n.° 301/82, de 30 de Julho).

b) Regrme das leis orgânicas dos serviços públicos e do res-

pectivo funcionalismo

O Conselho da Revolução, pela Resolução n.° I94-E/ 82, de 29 de Outubro, decidiu não emitir qualquer juízo sobre a constitucionalidade do Decreto-Lei n.° 140/81, de 30 de Maio, por terem, entretanto, sido revogados os preceitos em causa e não haver interesse juridicamente relevante na emissão desse juízo (Rela; tório do Provedor de Justiça de 1981, p. 34).

c) Garantias de defesa em processo penal — Multa por não

apresentação de bovinos à tubercuünização periódica

Na sua Resolução n.° 174/82, publicada em 29 de Setembro de 1982, o Conselho da Revolução entendeu não se pronunciar pela inconstitucionalidade do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 26 114, de 23 de Novembro de 1935 (Relatório do Provedor de Justiça de 1981, p. 35).

CAPÍTULO IV

Principais recomendações

I) Assunto: Aposentação. Prova do tempo de serviço nas n--colónias

Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos:

Processo n.° 82/R-720-B-1

1 — O artigo 3.° do Decreto n.° 409-B/75, de 6 de Agosto, com o intuito de resolver com eficiência a situação dos ex-funcionários dos territórios de expressão portuguesa que já tinham ascendido ou viessem a ascender à independência, permitiu-lhes comprovar o tempo de serviço através de declarações sob compromisso de honra.

Assim, foram as pensões de aposentação provisórias calculadas com base nesse meio de prova.

2 — Porém, não obstante terem já decorrido 5 anos sobre a data em que o aludido diploma entrou em vigor, vem agora a Caixa Geral de Aposentações exigir aos desligados do serviço a quem a pensão provisória foi determinada com base em tempo de serviço certificado pela referida declaração de honra que comprovem esse mesmo tempo de serviço mediante documentos passados pelos novos Estados, designadamente pela República Popular de Angola. Isto para efeito de lhes ser atribuída à pensão definitiva.

Verifica-se, assim, que os serviços dessa Caixa entendem que o Decreto n.° 409-B/75 visou apenas as pensões provisórias.

3 — Afigura-se-me que tal entendimento não está de harmonia com a lei, por várias razões:

a) Nunca o diploma em causa podia dirigir-se unicamente às pensões provisórias, porquanto à data da sua publicação não havia elementos que garantissem a possibilidade de, ao tempo da atribuição das correspondentes pensões definitivas, os novos Estados virem a emitir tais certidões;

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b) O artigo 3." do Decreto n.° 409-B/75 refere-se

à passagem de certidões «para efeitos de aposentação», não distinguindo entre aposentação provisória e aposentação definitiva, enquanto o artigo 1.° utiliza expressamente a expressão «pensão provisória»;

c) O decreto em causa, não tendo sido ainda

revogado, continua, necessariamente, a produzir efeitos;

d) Embora a obtenção de documentos das ex-co-

lónias não seja impossível, continua a ser muito demorada (e nem sempre se concretiza).

4 — Neste contexto, ao abrigo do artigo 18.°, n.° I, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, formulo a seguinte recomendação:

Que seja revista a posição que a Caixa Nacional de Previdência vem a assumir quanto ao assunto, em termos de deixar de ser exigida aos titulares de pensão de aposentação provisória a comprovação, mediante documentos emitidos pelos novos Estados de expressão portuguesa, do tempo de serviço já provado de acordo com o artigo 3." do Decreto n.° 409-B/75.

Solicito a V. Ex." que se digne informar a posição dessa Caixa relativamente a esta recomendação.

II) Assunto: Assistência na dosnça

Procesco n.° 81/R-2253-B-1

Secretário de Estado da Indústria:

Na sequência de uma declaração apresentada neste Serviço pela comissão de trabalhadores da Empresa Pública Parques Industriais, foi elaborada neste Serviço a informação de que junto cópia c a que dei a minha concordância.

Considerando que a posição da EPPI, apreciada naquela informação:

a) Não tem em conta o elemento histórico rela-

tivo ao estatuto das empresas públicas;

b) Atribui ao artigo 38." do Estatuto da EPPI

um sentido que conduz a uma solução incongruente, pois não é de presumir que o legislador tenha querido a inscrição dos trabalhadores em causa em 2 sistemas de segurança social, para ambos descontando, embora só podendo beneficiar de um deles;

c) Não consegue desligar-se de uma interpretação

demasiado literal da lei;

d) Não atende ao sentido usual e jurídico do

termo «opção»; e

e) Conduz a um resultado claramente injusto,

como a própria entidade visada reconhece;

ao abrigo do artigo 18.°, n." 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, formulo a seguinte recomendação:

Que, de harmonia com o artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 275/78, diploma que aprovou o Estatuto

da EPPI e o considerou sua parte integrante, seja adoptada uma das seguintes soluções, ainda que a primeira me pareça a mais correcta:

a) A elaboração de um despacho a esclare-

cer o seguinte, relativamente ao sentido no artigo 38." do Estatuto:

1) O n.° 2 desse preceito vincula

a EPPI a acordar cora a ADSE a concessão de assistência na doença ao pessoal que, transitando para o quadro da Empresa, opte pela sua manutenção na Caixa Geral de Aposentações;

2) Não pode a EPPI inscrever no

regime geral de previdência o pessoal que tenha feito aquela opção;

b) Considerando que o legislador não previu

no artigo 38.°, n.° 2. do Estatuto a assistência na doença, seja elaborado um despacho que, preenchendo essa lacuna, com base no n." 3 do artigo 10." do Código Civil, determine a orientação referida nos n.os l) e 2) da solução anterior.

Solicito a V. Ex." que me seja dado conhecimento da posição aásumida por esse departamento quanto à presente recomendação.

Ill) Assunto: Baldios

Processo n.° 81/R-1645-IM

Director-Geral dos Registos e do Notariado:

Corre seus termos neste Serviço um processo através do qual se concluiu que a Junta de Freguesia de Moitas Venda, concelho de Alcanena, vem concedendo direitos de superfície sobre parcelas que integram baldios em manifesta fraude ao disposto nos Decretos-Leis n.ÜS 39/ 76 e 40/76, de 19 de Janeiro, e isto porque, embora a concessão do direito de superfície não envolva a apropriação do solo, a verdade é que vai obstar ao uso e fruição das parcelas por parte dos moradores das povoações situadas nas imediações do baldio.

Ora, tem este Serviço conhecimento de que o Sr. Conservador do Registo Predial de Torres Novas procedeu ao registo de um direito de superfície (anexo 1) com base em alvará passado pela Junta de Freguesia, quando o Código do Notariado exige para a constituição do direito de superfície escritura pública (artigo 89.°) e quando tais actos por parte da Junta de Freguesia são nulos, nos termos do artigo 280." do Código Civil, por serem negócios jurídicos em fraude à lei (Decretos-Leis n.os 39/76 e 40/76).

Ora, porque a situação concreta aqui relatada é susceptível de vir a verificar-se nas áreas de outras conservatórias, tenho por oportuno e conveniente junto de V. Ex.3 denunciar a presente situação, solicitando que sejam tomadas as providências que o caso requer.

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IV) Assunto: Bancário. Integração

Processo n.° 81/R-2020-B-1

Governador do Banco de Portugal:

1 — O Banco de Portugal recusa-se a admitir nos seus quadros..., alegando, basicamente, que o interessado «foi portador de passaporte emitido pelo Consulado de Portugal na Beira com base em certificado de nacionalidade falso, do qual constava ter residido em Portugal por mais de 5 anos, quando se verifica que nasceu e sempre residiu em Moçambique, conforme afirmação ... feita em requerimento dirigido ao Sr. Ministro da Administração Interna», segundo consta dos ofícios n.os 931, de 20 de Março de 1981, e 17 900, de 9 de Dezembro de 1981, juntos por fotocópia.

2 — Acontece que na data em que foi comunicada a decisão de indeferimento ao ora reclamenate já se encontrava publicado no Diário da República o despacho dos membros do Governo competentes que lhe conservou a nacionalidade portuguesa (Diário da República, 2." série, n.° 235, de 10 de Outubro de 1980, p. 6499). Por tal motivo, deixou de se verificar o impedimento à pretendida integração —falta de cidadania portuguesa — decorrente do regime contemplado no Despacho Normativo n.° 110/79, de 23 de Maio.

3 — Por outro lado, tendo ao reclamante sido conservada a nacionalidade portuguesa por decisão ministerial de 26 de Setembro de 1980, exarada a coberto do disposto no artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 308-A/ 75, de 24 de Tunho, o acto de conservação da nacionalidade, ao contrário do da concessão de nacionalidade, implica, necessariamente, a manutenção do vínculo de cidadania do reclamante ao Estado Português à data da publicação daquele diploma legal.

Significa isto que o reclamante ... jamais perdeu a nacionalidade portuguesa.

4 — A eventual prática pelo reclamante, ou por outrem a mando deste, de actos tidos por irregulares sujeitá-los-ia aos procedimentos disciplinares [v. alínea c) do n.° 10 do Despacho Normativo n.° 110/79] e criminal, através das instâncias competentes, sempre com respeito pelo direito de defesa em ambas as vias processuais. A\\fc, a obtenção de atestado de residência considerado falso faz incorrer em responsabilidade criminal as entidades que prestaram falsas declarações à respectiva junta de freguesia, e não só o interessado que dele se procurou utilizar.

5 — Daí que a recusa pura e simples de admissão do reclamante constitua acto arbitrário da administração desse Banco, o qual não poderá subsistir na ordem jurídica, uma vez que o Banco de Portugal não só carece de poderes para extrair consequências (que não sejam de índole disciplinar) da conduta do reclamante tocantemente à questão de conservação da nacionalidade portuguesa, como não dispõe de competência para punir o queixoso à margem dos mecanismos legais vigentes, impedindo o ingresso do mesmo nos quadros da referida instituição.

6 — Mostrando-se, assim, ofendidos preceitos da lei Ordinária e da Constituição da República relativos ao exercício do- direito de defesa, quer em processo disciplinar, quer em processo criminal, bem como os

efeitos decorrentes da conservação da nacionalidade portuguesa, perante as conclusões que o Banco de Portugal extraiu, à margem das atribuições que lhe são conferidas por lei, a respeito do comportamento do queixoso, formulo a V. Ex.a a seguinte recomendação:

Que seja revogada a decisão que recusou a admissão do reclamante... no Banco de Portugal, sem prejuízo do apuramento das responsabilidades disciplinar e criminal do interessado por alegadas irregularidades cometidas no processo de conservação da nacionalidade portuguesa, que correu os seus trâmites pela Conservatória dos Registos Centrais.

Agradeço ser informado sobre a sequência que vier a merecer a presente recomendação.

V) Assunto: Carreiras profissionais

Processo n.° 81/R-l 559-A-3

Ministro de Estado e das Finanças e do Plano:

1 —Em 5 de Novembro de 1981 dirigi a V. Ex.1 o ofício n.° 11 625 —xerocopia anexa n.° 1—', no qual pedia que me fosse transmitida «a posição de S. Ex." o Ministro de Estado e das Finanças e do Plano sobre o problema, designadamente em face da argumentação ora expendida e das críticas feitas à Direcção-Geral das Alfândegas pelo reclamante».

2 — Como resposta, obtive o ofício n.° 1718, processo n.° 1.2-8/157, de 24 de Novembro próximo passado —xerocopia n.° 2—, em que o Sr. Director--Geral das Alfândegas me remeteu fotocópias dos pareceres da Direcção-Geral da Função Pública e da sua Direcção-Geral e dos despachos que sobre eles recaíram— xerocopias n.os 3 a 8.

Era, precisamente, sobre esses pareceres, cujas fotocópias, aliás, já constavam do processo, que incidiam o desacordo e a reclamação do interessado, e daí a razão do pedido formulado na última parte do n.° 2 daquele meu ofício.

3 — Embora considere que com a remessa daqueles documentos se quis significar que se mantém a posição anteriormente assumida sobre o problema, fico sem saber qual a posição de V. Ex.a quanto à bem desenvolvida e fundamentada argumentação do reclamante no sentido de rebater a posição assumida nos acima referidos pareceres e despachos.

4 — Uma análise do problema, tão profunda quanto possível, face aos limitados elementos de que disponho, cria-me a convicção de que o reclamante e seus antigos colegas foram, de facto, prejudicados, quando da elaboração e aprovação da tabela de equivalências anexa à Portaria n.° 298/77, de 25 de Maio, pelas razões por ele indicadas, com precisão e clareza, na sua exposição, máxime fl. 6 a fl. 20 — xerocopia anexa n.° 9 —, e que me abstenho de reproduzir aqui, sendo ainda de considerar que a ncessidade de reservar para fiéis de armazém e patrões de escaler a categoria de fiel de balança de 1.a classe parece não poder ser

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invocada como razão de fundo para que os auxiliares de verificação de l.a e 2.a classes fossem prejudicados na categoria e correspondente letra de vencimento que lhes foi atribuída.

5 — Concordando embora em que o circunstancialismo invocado no último período do ofício xero-copiado sob o n.° 7 poderá justificar que não sejam tomadas por agora providências legais no sentido de ser reparada a injustiça denunciada, não posso deixar passar em claro os fundados receios expressos pelo reclamante e seus colegas —fls. 16 e seguintes da já aludida xerocópia n." 9— de que tudo irá continuar na mesma, dado o que se encontra previsto sobre a matéria no projecto da lei orgânica ora em estudo.

6 — Nestes termos, permito-me formular a V. Ex.° ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:

Que na nova legislação actualmente em preparação — lei orgânica para a Direcção-Geral das Alfândegas, em cujos quadros vão ser integrados os agentes que constituem o actual quadro paralelo — seja tomada em conta a situação, que considero anómala e menos justa, que foi criada aos antigos auxiliares de verificação de 1." classe das ex-colónias aquando da integração deles no quadro paralelo, com a categoria de fiel de balança da 2." classe, de modo a que eles sejam objecto de idêntico tratamento ao que vier a ser dado aos antigos fiéis de balança de 1." classe do quadro orgânico da Direcção--Geral das Alfândegas que detinham essa categoria em 25 de Maio de 1977, data da Portaria n.° 298/77.

7 — Muito agradeço me seja prestada oportunamente informação do seguimento que for dado a esta recomendação e do que, a final, vier a ser decidido sobre o problema.

VI) Assunto: Carreiras profissionais

Processo n.° 82/R-1364-B-4

Ministro da Administração Interna:

1 — O Decreto-Lei n.° 466/79, de 7 de Dezembro, criou 2 carreiras operárias relacionadas com contadores — mecânico de contadores (qualificada) e aferidor de contadores (semiqualificada) —, sem, contudo, especificar a sua caracterização.

2 — Os diferentes serviços municipalizados não têm, perante a mesma situação, procedido de maneira uniforme: uns integraram todos os operários na carreira de mecânico, outros na de aferidor e outros ainda numa e noutra.

3 — Ê assim que me parece de formular recomendação no sentido de que o Ministério da Administração Interna, no âmbito da sua função tutelar, indique aos serviços municipalizados os critérios adequados à caracterização e distinção das funções de cada uma das carreiras.

Vli) Assunto: Carreiras profissionais. Técnicos auxiliares

Processo n.° 80/R-853-A-2

Ministro da Reforma Administrativa:

1 —Em 23 de Outubro de 1980 foi dirigido ao então secretário de Estado da Reforma Administrativa o ofício n.° 11 770, cuja fotocópia, bem como dos documentos que lhe eram anexos, se junta para mais fácil elucidação de V. Ex.a (anexo i).

2 — A 23 de Março de 1981 dirigi ao então ministro da Reforma Administrativa novo ofício (anexo n), tendo a 8 de Abril de 1981 recebido, em resposta, o ofício n.° 2474, cuja fotocópia, bem como dos documentos anexos, se junta igualmente (anexo in).

3 — Do que é informado, um princípio genérico e fundamental se me afigura ser de extrair: as carreiras reestruturadas pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79 tiveram como fundamento da sua reestruturação, em regra, as «bases gerais» do ensino. Desta forma, foram estabelecidas «balizas» estanques e intransponíveis em função de 4 «metas» do ensino clássico português: a licenciatura, o bacharelato, o curso geral dos liceus e a escolaridade obrigatória (mesmo a carreira técnica profissional assenta, primordialmente, naquelas «metas», embora com a exigência de um curso tecnico-profissio-nal complementar).

Ê dentro destas «balizas» que são «classificados» e, inflexivelmente, colocados os trabalhadores da função pública.

Para o ingresso nas carreiras, assim reestruturadas pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79, não são considerados nem o «conteúdo funcional», nem.o mérito demonstrado, nem a aptidão revelada, nem a antiguidade na função pública ou nas funções que tem desempenhado. O funcionário ou agente não poderá transpor aquelas carreiras, seja qual for qualquer destes elementos, se não tiver as habilitações exigidas para as carreiras respectivas.

E esta a ideia básica e inflexível que, por exemplo, justifica a recusa que a então DGRF faz para a reestruturação da carreira técnica auxiliar, em função da reestruturação que foi feita da carreira administrativa pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79, em que, por efeito da mesma, às respectivas categorias vieram a ser atribuídas idênticas letras de vencimento das que já estavam estabelecidas para a carreira técnica auxiliar, que eram, antes do Decreto-Lei n.° 191-C/79, superiores às da carreira administrativa.

Recorde-se o parecer da DGFP (informação n.° 50/ DOC/80, de 15 de Janeiro de 1980, cuja fotocópia, em 24 de Abril de 1980, foi remetida a este Serviço pela Secretaria-Geral do MEU, a coberto do seu ofício n.° 002167), em que se escreve:

[•••]

De igual modo se encontra de momento afastada a hipótese de reestruturação, em termos globais, da carreira técnica auxiliar, uma vez que, na sua actual estruturação, a carreira comporta já o desenvolvimento previsto pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79 para carreiras de idêntico nível de exigências habilitacionais.

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4 — O certo é, porém, que:

a) Àscategorias da carreira técnica auxiliar eram,

antes do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, pelo seu conteúdo funcional, diverso do da carreira administrativa, atribuídas letras de vencimento superiores às que correspondiam às categorias da então carreira administrativa.

Não pode, sem dúvida, alegar-se que os técnicos auxiliares tenham direito a uma revalorização.das categorias da sua carreira só pelo facto de na carreira administrativa (cujas categorias eram inferiores) terem sido aquelas revalorizadas, passando a ser idênticas às da sua, em relação às letras de vencimento correspondentes.

Mas não se pode, também, segundo se afigura, deixar de tomar-se em conta que, quando a sua carreira passou a ser equiparada à administrativa, tal veio a criar uma situação de injustiça, com uma desvalorização das categorias de que eram titulares em relação aos seus colegas administrativos, e que essa injustiça é tanto maior quanto os. conteúdos funcionais dos cargos da sua carreira são mais complexos e que até o ingresso nela se fazia em muitos casos por selecção dos funcionários administrativos, sendo-lhes, por vezes, exigidas outras cumulativamente à habilitação estabelecida — curso geral dos liceus —, como, por exemplo, para os técnicos auxiliares do CICC;

b) Mantendo-se estruturada tal como está a car-

reira técnica auxiliar, continua existindo nela a categoria de técnico auxiliar de 3.a classe, letra N.

É o caso, por exemplo, dos quadros de pessoal do CICC e da Direcção-Geral do Saneamento Básico.

Deste modo, com a reestruturação da carreira administrativa operada pelo Decreto-Lei n." 191-C/79, ao passo que o ingresso nesta passa a fazer-se obrigatoriamente pela letra M (terceiro-oficial), o ingresso na carreira técnica auxiliar, em muitos serviços, continua a fazer-se pela letra N (técnico auxiliar de 5/' classe).

Por outro lado, e continuando a existir na carreira técnica auxiliar a categoria de técnico auxiliar de 3.a classe, de acordo com a alínea b) do n.° 1 do artigo 2.° do Decreto--Lei n.° 191-C/79 (exigindo 3 anos, pelo menos, para acesso, na categoria imediatamente inferior), conjugada com o disposto nos n.°s 3 e 4 do mesmo artigo (que exige, para efeitos de promoção, tempo normal de progressão na carreira), ao passo que um administrativo poderá ascender a pri-meiro-oficial (letra J) com 6 anos de carreira (3 como terceiro-oficial 4-3 como segundo-oficial), o técnico auxiliar, para poder ascender a técnico auxiliar principal (letra J), precisará, em princípio, de 9 anos na carreira (3 como técnico auxiliar de 3.a

classe+ 3 anos como técnico auxiliar de 2.a classe+ 3 anos como técnico auxiliar de l.a classe).

5— Assim, por tudo o exposto e ainda tendo em conta que o âmbito de aplicabilidade das carreiras técnico-profissionais previstas no artigo 10.° do Decreto--Lei n.u 191-C/79 é ainda muito restrito, considero que se impõe reapreciar genericamente a actual carreira técnica auxiliar.

Quanto às categorias, afigura-se-me que se impõe a extinção da categoria de técnico auxiliar de 3.3 classe, com a passagem automática (tal como pelo Decreto-Lei n.u 191-C/79 se estabeleceu para as categorias de 3.3 classe nas várias carreiras que reestrutura) dos seus titulares para técnicos auxiliares de 2.a classe. Afigura-se ainda que deveria ser estabelecida uma revalorização das categorias restantes, vindo pô-las na posição valorativa, em relação às categorias da carreira administrativa, que tinham antes de estas terem sido revalorizadas por efeito da reestruturação desta carreira feita pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79.

Em função' desta valorização em relação à carreira administrativa, suponho ainda que se poderia estabelecer como habilitação mínima para ingresso o curso complementar dos liceus, pois, e ao contrário do que tem defendido a DGFP (hoje DG RH), a actual estrutura do ensino secundário complementar, mais virada para a especialização que a anterior, sobretudo quando completada com o 12." ano de via profissionalizante, não em uma «estrutura generalizada», «que não faculta ao seu titular mais que mera formação genérica».

Aliás, a adequação daquela habilitação para as funções dos cargos da carreira técnica auxiliar tem levado a que o curso complementar dos liceus seja hoje exigido por alguns diplomas orgânicos como habilitação mínima para ingresso na carreira (v., por exemplo, o CICC).

Solicito a V. Ex.a que oportunamente me seja comunicada qual a posição desse Ministério sobre as considerações que acabo de expor.

VIII) Assunto: Chefe de serviços hospitalares

Processo n.° 81/R-80-A-2

Ministro dos Assuntos Sociais:

1 — Em 20 de janeiro de 1981 deu entrada neste Serviço a reclamação cuja fotocópia junto (anexo i).

2 — Dirigido um ofício para o Gabinete de S. Ex.a o Ministro da Reforma Administrativa (anexo ti), foi recebido, em resposta, o ofício n.° 2936, de 28 de Abril de 1981. cuja fotocópia se junta igualmente (anexo tu).

3 — Em referência àquele ofício do Ministro da Reforma Administrativa, dirigiu este Serviço a esse Gabinete o ofício n.° 5401, de 25 de Maio de 1981 (anexo iv), tendo obtido resposta pelo ofício n.° 13 034, de 15 de (unho de 1981 (anexo v).

4 — Tendo em conta o informado por esse Gabinete, a 13 de Julho de 1981 dirigiu-se ao Gabinete de S. Ex.a o Ministro da Educação o ofício n.° 7563 (anexo vi), tendo recebido resposta através do ofício n." 003543. de 29 de Setembro de 1981 (anexo vn)

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5 — Sobre o assunto foi emitido parecer deste Serviço, em que se escreve:

1 — Numa informação da DGH de 1978 escrevia-se:

Verifica-se nos quadros dos hospitais a existência de categoria com a mesma designação de «chefe de secretaria» e vencimentos variáve's — letras H e I —, o que urge uniformizar.

Por outro lado, a recente subida de letra dc vencimento que beneficiou os chefes de repartição e chefes de secção veio tornar aconselhável uma correspondente melhoria de situação para as chefias intermédias a unificar.

Ouvidos oficiosamente os técnicos da reforma administrativa que se encontram a trabalhar na preparação dos diplomas que reformularão as carreiras da função pública, obtivemos concordância para a seguinte alteração nos mapas de pessoal dos hospitais: criação da categoria de chefe de serviços administrativos hospitalares, com vencimento da letra C. Esta nova categoria viria substituir nos mapas dos estabelecimentos hospitalares as de chefe de secretaria, com as letras H e I, e as de chefe de aprovisionamento e chefe de contabilidade, com a letra H. Os actuais titulares das categorias a extinguir seriam distribuídos na nova, para o que os estabelecimentos deverão enviar as respectivas propostas.

2 — A supratranscrita proposta recebeu despacho ministerial de concordância em 8 de Agosto de-1978.

3 — Conforme por ofício da DGRDH foi informado a este Serviço do Provedor de Justiça a 13 de Outubro de 1980 (processo n.° 79-R-1724--A-8):

Aos hospitais distritais, em cujo mapa de pessoal não figuravam as categorias beneficiadas no citado despacho de 8 de Agosto de 1978, foi dada a possibilidade de criarem 3 lugares de chefe de serviços administrativos hospitalares para os sectores de secretaria/pessoal, contabilidade e aprovisionamento.

Não existem requisitos legais específicos para esse preenchimento, uma vez que se trata de categoria criada sem integração em carreira e por mero despacho, embora com a concordância prévia da DGFP, que relegou para momento posterior a regulamentação necessária.

4 — Pelo supra-exposto verifica-se estar a DG RH (e o próprio então Secretário de Estado da Reforma Administrativa) em equívoco.

Com efeito:

4.1 —A categoria de chefe de serviços administrativos hospitalares foi criada para substituir as categorias de chefe de secretaria (com as le-

tras H e I) e de chefe de aprovisionamento e de chefe de contabilidade (com a letra H).

4 2 — Não lhe corresponde, assim, a mesma área de recrutamento (chefes de secção com 3 anos de bom e efectivo serviço na categoria), visto a categoria de chefe de serviços administrativos hospitalares vir precisamente substituir a categoria de chefe de serviço e naquela categoria ou nas outras que vem substituir (chefe de aprovisionamento e chefe de contabilidade) «não existirem requisitos legais específicos para esse preenchimento».

Em regra, para aquela categoria, quando não existem as categorias que se destina a substituir, têm-se candidatado e sido nomeados chefes de sec ção.

4.3 — Assim sendo, não se me afigura haver necessidade de uniformizar nos estabelecimentos hospitalares dependentes dos MAS as categorias de chefia intermédia entre chefe de secção e de repartição criadas naquele Ministério, nomeadamente as de chefe de serviço e chefe de serviços administrativos hospitalares, visto aquela uniformização já ter sido feita pelo despacho ministerial de 8 de Agosto de 1978, com a substituição daquelas categorias intermédias pela única categoria de chefe de serviços administrativos hospitalares.

O que me parece é que há que «institucionalizar» a categoria de chefe de serviços hospitalares, atribuindo-se-lhe a letra que actualmente lhe deverá corresponder e os respectivos requisitos de recrutamento e provimento.

E tal, penso, embora por proposta do MAS, cabe ao MRA.

Porque a supratranscrita informação tem a minha concordância, permito-me dirigir a seguinte recomendação:

No uso da competência que a lei me atribui, recomendo a V. Ex.a que se digne providenciar para que, com a brevidade possível, seja estudada a proposta de institucionalização da categoria de chefe de serviços hospitalares, como categoria intermédia de chefe de secção e de chefe de repartição, com fixação de letra de vencimento adequada (tendo em conta que, actualmente, aos chefes de secção corresponde já a letra H de vencimento), seu conteúdo funcional específico e regras para recrutamento e provimento de pessoal para os respectivos lugares, devendo o respectivo diploma legal ter aplicação a todo o estabelecimento hospitalar, inclusive hospitais escolares.

Solicito a V. Ex.° que oportunamente me sejam comunicados o seguimento e a decisão que o assunto venha a merecer.

IX) Assunto: Classificações de serviço

Processo n.° 81/R-667-DI-11-A-2

Secretário de Estado da Reforma Administrativa:

Em referência ao ofício n.° 2089, de 24 de Março de 1982, em que era dada resposta ao meu ofício

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n.° 9776, de 25 de Setembro de 1981, comunico a V. Ex.a que, após a publicação do Decreto Regulamentar n.° 9/82, de 3 de Março, foi neste Serviço emitida uma informação em que se escreve:

[...]

4 — A 3 de Março de 1982 foi publicado o Decreto Regulamentar n.° 9/82, por cujo preâmbulo se toma conhecimento de que se encontra em curso o processo de revisão do Decreto Regulamentar n.° 57/80, em conformidade com o disposto no n.° 36 do Despacho Normativo n.° 128/81, e por cujos normativos se constata que é suspensa a aplicação do Decreto Regulamentar n.° 57/80. [...].

6 — Sobre o que se dispõe no Decreto Regulamentar n.° 9/82, de 3 de Março, afigura-se-me que há ainda que fazer algumas considerações.

É que, por efeito daquele diploma, é suspenso o Decreto Regulamentar n.° 57/80, mas, conforme o disposto nos seus artigos 1.° e 2.°, as classificações de serviço prestadas ao abrigo daquele Decreto Regulamentar n.° 57/80 e relativas ao ano de 1980 continuam a produzir os seus efeitos [respeitando-se os já produzidos

— alínea a) do artigo 1,° — ou os a produzir — alínea í>) do artigo 1.°], bem como continuam os processos pendentes relativos às mesmas.

7 — Ora, afigura-se-me que a manutenção das classificações de serviço dadas ao abrigo do Decreto Regulamentar n.° 57/80 e do Despacho Normativo n.° 128/81 e relativas ao ano de 1980 é, além de ilegal, totalmente incoerente com o justificativo da suspensão daqueles diplomas (o Despacho Normativo n.° 128/81, destinando-se a «esclarecer» o Decreto Regulamentar n.° 57/80, fica, necessariamente, suspenso por efeito da suspensão deste).

8 — Com efeito, tem-se defendido que a aplicação do Decreto Regulamentar n.° 57/80, cuja vigência se iniciou na data da sua publicação

— 10 de Outubro de 1980, quase no fim do ano de 1980—, ao ano de 1980 é ilegal, pois ilegal se considera a sua retroactividade com referência a um período (1980) em cuja quase totalidade aquele diploma ainda não tinha existência jurídica.

9 — Por outro lado, verifica-se que o artigo 23.° do Decreto Regulamentar n.° 57/80 dispunha:

1 — O presente regulamento tem carácter experimental e será revisto após 3 anos consecutivos da sua aplicação.

Por sua vez, o n.° 36 do Despacho Normativo n.° 128/81, como em muitas outras suas disposições, contrariando os normativos do decreto regulamentar que pretende «esclarecer», vem já admitir que a revisão do Decreto Regulamentar n.° 57/80 «terá lugar de molde a produzir efeitos em 1982 (antes de 3 anos da sua aplicação), estabelecendo ainda que aquela revisão «deverá conter soluções que visem corrigir as classifi-

cações atribuídas pelo presente sistema, se a experiência colhida em 1981 o revelar necessário».

10 — Ora, o certo é que a «experiência colhida em 1981», face à aplicação do Decreto Regulamentar n.° 57/80 no ano de 1980, foi tal que impôs a suspensão daquele diploma já para o ano de 1981, nem se aguardando o período de aplicação experimental por 3 anos, ou mesmo por 2, respectivamente previstos no Decreto Regulamentar n.° 57/80 (artigo 23.°, n.° 1) e no Despacho Normativo n.° 128/81 (n.° 36), até se proceder à sua revisão após aqueles períodos.

11 — Considerou-se, como no preâmbulo do Decreto Regulamentar n.° 9/82 se escreve, que já no ano de 1981 haveria conveniência em se aplicar o novo regime, «que certamente consagrará um regime mais adequado à prossecução dos objectivos propostos», e que para se obstar à aplicação mesmo ao ano de 1981 do Decreto Regulamentar n.° 57/80 (que o próprio Decreto Regulamentar n.° 9/82 reconhece, «pela experiência obtida», não é adequado à prossecução dos objectivos que se propunha) se impunha a sua imediata suspensão.

12 — Estranhamente, porém, reconhecendo-se embora a inadequação aos objectivos propostos das regras do Decreto Regulamentar n.° 57/80, e apesar de no n.° 36 do Despacho Normativo n." 128/81, ao abrigo do qual se .está procedendo à sua revisão, estar previsto que naquela revisão deverá conter-se solução que vise corrigir as classificações de serviço feitas ao abrigo daquele Decreto Regulamentar n.° 57/80, «se a experiência colhida em 1981 o revelar necessário», o Decreto Regulamentar n.° 9/82, que, face à experiência colhida, manda suspender imediatamente aquele Decreto Regulamentar n.° 57/80, mantém as classificações de serviço que, de acordo com este, e ilegalmente, foram dadas em relação ao ano de 1980.

13 — Mas, pior ainda: não só manda respeitar as classificações de serviço já dadas [alínea a) do artigo 1.°], como ainda manda dar seguimento aos processos ainda pendentes relativos àquele ano de 1980 e conforme com o Decreto Regulamentar n.° 57/80 (artigo 2.°).

14 — Por outro lado, a alínea b) do artigo 1." daquele Decreto Regulamentar n.° 9/82 ainda vai mais longe e manda aplicar, em relação às classificações de serviço relativas a 1980, dadas ao abrigo do Decreto Regulamentar n.° 57/80 (já por si só, como atrás referido, ilegais e pelo próprio Decreto Regulamentar n.° 9/82 reconhecidas como inadequadas, por não terem atingido os objectivos que se propunham àquele Decreto Regulamentar n.° 57/80), aos anos relevantes para promoção e progressão nas carreiras relativamente a este mesmo período. Quer dizer, mantém em vigor, em relação àquelas classificações de serviço dadas relativamente ao ano de 1980, o disposto no n.° 34 do Despacho Normativo n.° ¡28/81, que se considera como ilegal, já porque não previsto no Decreto-Lei n.° 191—C/ 79, de 25 de Junho, nem no Decreto-Lei n." 377/ 79, de 13 de Setembro, já porque vem contrariar

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o estabelecido no n.° 2 do artigo 3." do Decreto Regulamentar n.° 57/80.

A informação supratranscrita mereceu a minha concordância, pelo que, no uso da competência que a lei me atribui e em coerência e seguimento da posição já anteriormente assumida no meu ofício n.° 9776, de 25 de Setembro de 1981, me permito dirigir a V. Ex.° a seguinte recomendação:

Que se digne providenciar para que, por efeito da suspensão estipulada pelo Decreto Regulamentar n.° 9/82, de 3 de Março, sejam anuladas as classificações de serviço atribuídas ou a atribuir ao abrigo do Decreto Regulamentar n.° 57/80 e relativas ao ano de 1980, com consequente revogação das alíneas a) e b) do artigo Io e do artigo 2.° daquele Decreto Regulamentar n.° 9/82, com ressalva dos casos em que se tenham constituído direitos adquiridos por efeito daquelas classificações de serviço, isto é, das situações constituídas ao abrigo ou por efeito daquelas classificações de serviço.

Solicito a V. Ex.a que oportunamente me seja prestada informação quanto ao seguimento que a presente recomendação venha a ter.

X) Assunto: Concursos

Processo n.° 79/R-1611-B-4

Presidente da Câmara Municipal de Alenquer:

Informo V. Ex.a de que, após análise da reclamação apresentada neste Serviço relativamente à anulação do concurso público para preenchimento de 3 lugares de auxiliar de secretaria, cheguei às seguintes conclusões:

Ao contrário do que se pode inferir da acta da reunião de 24 de Julho de 1979, onde se deliberou anular o referido concurso, aberto por deliberação de 30 de Janeiro de 1979, a anulação tinha base legal.

Na verdade, tendo sido as vagas criadas sem observância do disposto no artigo 4.°, n.os 1 e 2, do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, tem de entender-se a deliberação de 30 de Janeiro de 1979 como nula e de nenhum efeito.

Apesar do apoio legal existente para a deliberação que decidiu da anulação do concurso, a verdade é que da acta da referida reunião não constam os fundamentos de direito da referida deliberação.

Por outro lado, não pode deixar de merecer reparo o facto de se ter procedido à abertura de concurso sem que se hajam definido previamente os critérios da selecção e da classificação dos concorrentes.

A não existir fundamento legal para a anulação do concurso, é óbvio que haveria de prosseguir-se nos ulteriores termos do concurso.

De qualquer modo, permito-me recomendar que, de futuro, seja posto o maior cuidado na formulação dos critérios de classificação dos concorrentes, recomendando ainda a necessidade legal de fazer constar das actas das reuniões os fundamentos de facto e de direito das deliberações tomadas.

X!) Assunto: Concursos

Processo n.° 79/R-709-A-2

Secretário Regional dos Assuntos Sociais da Madeira:

Como é do conhecimento de V. Ex.a, em 1979 foi apresentada uma reclamação relativa ao modo como se processou a admissão para 1 lugar de auxiliar de educação no Centro Regional de Segurança Social (ao assunto se referem os documentos cujas cópias, para mais fácil rememoração, se juntam.)

Da análise dos elementos recebidos para informação do processo extraí algumas conclusões, que me levam, em ordem a futuros concursos, a fazer a V. Ex.° a seguinte recomendação:

o) Os critérios de graduação devem ser previamente fixados, e não apenas já na pendência dos processos de concurso;

b) Tais critérios devem ser tornados públicos

para conhecimento dos possíveis interessados;

c) Ê inconstitucional a limitação dos concursos

a candidatos de um determinado sexo; .

d) O simples facto do estado de desempregado não

deve, por si só, servir de critério de graduação, pois pode não corresponder necessariamente a uma situação de maior carência. Importará, pois, que se adoptem nesta matéria critérios mais objectivos, definidores da efectiva situação de carência económica dos candidatos;

e) As exposições feitas a entidades com com-

petência para praticar actos definitivos e executórios (como é o caso de V. Ex.a) devem ser por estas decididas e depois notificadas aos interessados para estes poderem recorrer, querendo.

Neste caso, houve um «despacho» do Sr. Chefe de Gabinete e uma posterior «confirmação» do Secretário Regional, que, todavia, não foi especificamente comunicada à interessada.

XII) Assunto: Concursos

Processo n.° 82/R-211-A-2

Inspector-Geral do Ensino — Ministério da Educação e das Universidades:

Em referência ao ofício n.° 435, de 16 de Abril de 1982, de V. Ex.°, que agradeço, com vista a evitar atrasos na elaboração dos regulamentos de futuros concursos, e tendo em atenção a vantagem do conhecimento prévio daqueles pelos eventuais candidatos aos respectivos concursos, permito-me, no uso da competência que a lei me atribui, fazer a V. Ex.a a seguinte recomendação:

Que seja dado conhecimento dos regulamentos dos futuros concursos na data da publicação no Diário da República dos respectivos avisos de abertura.

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XK1) Assunto: Concursos

Processo n.° 82/R-223-A-2

Secretário de Estado do Orçamento:

Em 26 de Março de 1982 tive a honra de dirigir a V. Ex.a o ofício n-° 4516, tendo recebido, em resposta, o ofício n.° 1952, de 7 de Maio de 1982, desse Gabinete.

Acontece, porém, que os esclarecimentos que através daquele ofício da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, que lhe é anexo, me são prestados só se reportam às razões de facto que fundamentaram o despacho ministerial de 8 de Janeiro de 1982, que os reclamantes contestam, e não às justificações invocáveis para, por um simples despacho ministerial, se poder impor para determinado caso, e embora só a curto prazo, a não aplicação de uma disposição inserida num decreto regulamentar e que não admite excepções na sua aplicação.

Por mais razões de facto que possam justificar a não aplicação do disposto no artigo 32.°, n.° 2, do-Decreto Regulamentar n.° 12/79, de 16 de Abril, entendo que aquele normativo não pode deixar de ser cumprido enquanto não existir diploma, pelo menos com a mesma força legal, que o revogue.

Nestes termos, permito-me dirigir a V. Ex.n, no uso da competência que a lei me confere, a seguinte recomendação:

Que se digne revogar, por ilegal, o despacho de 18 de Janeiro de 1982, em que se determina que o disposto no artigo 32.°, n.° 2, do Decreto Regulamentar n.° 12/79, de 16 de Abril, não se aplique aos casos em que, dentro do prazo de validade do concurso em que o funcionário foi promovido, os lugares vagos da mesma categoria possam ser providos por candidato com classificação inferior ou que não tenha requerido a promoção nos movimentos anteriores.

Solicito a V. Ex.a que oportunamente me seja comunicado o seguimento que a presente recomendação venha a ter.

Acontece, porém, que aquela suspensão se não aplica às classificações de serviço relativas ao ano de 1980 nem, quanto a estas, aos efeitos previstos no n.u 34 do Despacho Normativo n.u 128/81, pelo que a questão objecto do presente processo continua actual e pertinente.

Conforme se escreve na informação n." 411/81 da Divisão de Estudos da Secretaria-Geral desse Ministério, que a 5 de Março de 1982 mereceu despacho de concordância de V. Ex.a:

[...] é um facto que a publicação do Despacho Normativo n.° 128/81 teve lugar em data posterior à abertura dos concursos em causa. Contudo, aquele diploma teve em vista esclarecer, interpretar e uniformizar os procedimentos da classificação de serviço regulada pelo Decreto Regulamentar n.° 57/80. Dado que este Ministério aplicou o sistema de classificação de serviço aprovado por aquele decreto regulamentar para efeitos dos concursos de promoção, observou, de igual modo, o procedimento estabelecido naquele diploma em matéria de classificação de serviço, não obstante entender que o referido despacho contém matéria inovadora que ultrapassa o próprio texto do Decreto Regulamentar n.° 57/89.

Porém, e como já foi acentuado, as normas daquele despacho foram e são observadas enquanto pelas entidades competentes não for declarada a sua ilegalidade ou, pelo menos, determinada a sua não aplicação.

Em aditamento ao já exposto no meu citado ofício anterior, cabe-me ainda referir que para poderem ter efeitos retroactivos, nos termos do artigo 13.° do Código Civil, necessário é que as leis interpretativas verdadeiramente o sejam, isto é:

Ê preciso que se trate de diploma com a mesma força do diploma interpretado (ou, pelo menos, com força interpretativa por este reconhecida, tratando-se de diploma de inferior grau hierárquico); e

É necessário sobretudo que se trate de diploma que venha a consagrar um dos sentidos possíveis do diploma a interpretar.

XIV) Assunto: Concursos

Processo n.° 81/R-1154-A-2

Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Agricultura, Comércio e Pescas:

Em 29 de Julho de 1981 foi dirigido ao Sr. Chefe dc Gabinete de V. Ex.a o ofício n.° 8293, cuja fotocópia se junta, bem como do requerimento que lhe era anexo.

Recebi, em resposta, o ofício cuja fotocópia e documentos igualmente se juntam para mais fácil esclarecimento.

Já na data da emissão do ofício da Secretaria-Geral desse Ministério —ofício n.° 002107, de 5 de Março de 1982 (fotocópia também anexa) — o Decreto Regulamentar n.° 57/80 e o Despacho Normativo n.° 128/ 81 tinham sido suspensos, por força do disposto no Decreto Regulamentar n.° 9/82, de 3 de Março.

Não pode, pois, tratar-se de diploma inovador.

Ao mandar aplicar a classificação obtida nos termos do Decreto Regulamentar n.° 57/80 aos anos anteriores relativamente aos quais não estivesse atribuída classificação, o Despacho Normativo n." 128/81 foi nitidamente inovador.

Reconhece-o, aliás, o próprio Ministério da Agricul tura. Comércio e Pescas.

De resto, o n." 34 do Despacho Normativo n." 128/ 81 foi até «inovador», na medida em que contraria o disposto nos Decretos-Leis n.os 191-C/79 e 377/79 (que não permitem qualquer retroactividade) e o n.° 2 do artigo 3.° do Decreto Regulamentar n.° 57/80, segundo o qual a primeira classificação nele regulada se reporta ao ano de 1980 (ao passo que o n.ü 34 do Despacho Normativo n.° 128/81 a torna extensiva a anos anteriores a esse).

Ora, sendo assim — e mesmo que valesse o argumento de que a Administração tem de obedecer às normas em vigor enquanto não revogadas, o que foi feito

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por esse Ministério —, traduziu-se na aplicação do Despacho Normativo n.° 128/81 mesmo para além da sua própria estatuição.

Ê que o aplicou a um concurso já encerrado aquando da sua publicação.

E é princípio geral o de que os concursos se regem pelas normas em vigor à data da sua abertura.

Não sendo o n." 34 do Despacho Normativo n.° 128/ 81 uma norma interpretativa, ele não poderia — mesmo que se entenda que a Administração lhe deve obediência — ser aplicado a um concurso aberto e encerrado antes da sua entrada em vigor.

Nestes termos e pelo exposto, no uso da competência que a lei me atribui, permito-me dirigir a V. Ex.a ? seguinte recomendação:

Que seja revogada a circular n." 71/81 da Secre-taria-Gera) desse Ministério, devendo os concursos de promoção em questão ser regidos pelas normas em vigor à data da sua abertura, como legalmente se impõe.

Solicito a V. Ex.3 que oportunamente me seja comunicado o conteúdo da decisão final que venha a ser proferida em seguimento da presente recomendação.

Finalmente, para conhecimento de V. Ex.', remeto fotocópia de um ofício que, após a publicação do Decreto Regulamentar n." 9/82, de 3 de Março, dirigi a S. Ex."1 o Secretário de Estado da Reforma Administrativa.

XV) Assunto: Concursos

Processo n.° 82/R-354-A-2

DirectorGeral de Pessoal — Ministério da Educação:

Em referência ao vosso ofício n.u 477/82/GETJ íprocesso n.° 21-CJ/82), comunico que, depois de se ter procedido ao cuidadoso estudo do assunto em causa, se chegou às seguintes conclusões:

a) Face à lei, nada impede que se possa abrir

concurso, nos termos do artigo 9." do Decreto-Lei n.u 273/79, para os lugares vagos do quadro único previsto no seu artigo 1.°, desde que sejam «reservadas» e não postas a concurso as vagas daquele quadro necessárias para a integração no mesmo, nos termos do Decreto Regulamentar n.° 63/ 80, do pessoal adido abrangido por aquele diploma;

b) Conforme esclarecimento dado por essa Direc-

ção-Geral de Pessoal respeitante a outra reclamação apresentada neste Serviço e relativa ao mesmo concurso (nossa referência processo n.° 82-R/405) e constante do vosso ofício n.° 469/82/GETI (processo n.° 21-MM/82), «não foram postas 3 vagas a - concurso porque era necessário reservá-las para a integração de funcionários supranumerários (ex-adidos) no âmbito do Decreto Regulamentar n.° 63/80, de 26 de Outubro, cuja implementação vem sendo feita»;

c) Nada há assim, face à lei, que objectar quanto

ao concurso em questão, cujo aviso foi publicado no Diário da República, 2.3 série, de 2 de Fevereiro de 1982;

d) Acontece, porém, que da sua abertura, ou de

outros concursos que se possam promover, poderá resultar uma evidente e injusta discriminação para cora o pessoal ex-adido do quadro supranumerário que ainda não foi integrado nos quadros dos estabelecimentos, de ensino, privando os que teriam possibilidade de candidatar-se, se já estivessem integrados nos quadros, de serem opositores conjuntamente com os seus colegas.

Assim, pelo exposto e dentro da competência que a lei me atribui, permito-me dirigir a V. Ex.3 a seguinte recomendação:

Que não sejam abertos mais concursos de provimento ao abrigo do artigo 9.ü do Decreto-Lei n.u 273/79 sem que esteja concluída toda a movimentação de pessoal prevista no artigo 16.", n.° 1, daquele diploma (que, aliás, pressuponho já estar em vias de conclusão) e a integração nos quadros, que se lhe deverá seguir (nos termos do artigo 11.° do Decreto Regulamentar n.u 63/80), do pessoal adido previsto no artigo I." daquele mesmo decreto regulamentar, na redacção dada pelo Decreto Regulamentar n." 53/81, de 20 de Novembro, bem como que se diligencie para que se proceda, com a maior urgência possível, à conclusão daquela total transição.

Solicito a V. Ex.3 que oportunamente me seja comunicado o seguimento dado à presente recomendação.

XVI) Assunto: Contribuições para a segurança social. Restituição

Processo n.c 79/R-2796-B-1

Presidente da Comissão Administrativa da Caixa de Previdência e Abono de Família dos Ferroviários:

Com referência ao caso a que se reporta o ofício n." 09421, de 30 de Abril de 1981, da 2.3 Repartição, 5.3 Secção, dessa Caixa, a seguir se expõe o que o seu teor nos suscitou:

Considerando que os despachos do Secretário de Estado da Segurança Social de 25 de Julho de 1978 c 24 de Outubro do mesmo ano vieram esclarecer que as importâncias pagas a título de indemnização pelo não cumprimento por parte da entidade patronal da obrigação de conceder férias não devem ser incluídas no cálculo da pensão e que os descontos que sobre elas tenham incidido podem ser restituídos aos interessados;

Considerando, portanto, que anteriormente àqueles despachos havia dúvidas, designadamente a nível oficial, sobre se a entrega desses descontos tinha a natu-

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reza de pagamento indevido e, consequentemente, se conferia aos beneficiários o direito ao respectivo reembolso:

Permito-me formular a seguinte recomendação:

Que o prazo de um ano previsto no artigo 129.° do Decreto n.° 45 266, de 23 de Setembro de 1963, para efeito de os beneficiários reclamarem a restituição das contribuições pagas indevidamente, seja contado a partir da data em que os referidos despachos foram comunicados aos interessados.

Agradeço a V. Ex." que se digne informar a posição dessa Caixa relativamente à presente recomendação.

XVII) Assunto: Cooperantes

Processo n.° 81/R-328-A-3

Direcção-Geral de Integração Administrativa:

Reclamação de ... por não ter sido considerado relevante, para efeitos de pensão provisória de aposentação, o tempo de serviço prestado como cooperante em Moçambique.

1 — Reporto-me ao ofício de V. Ex." n.° 57 578, de 31 de Julho próximo passado, e informação a ele anexa (xerocopias n.os 1 e 2).

2 — Se é certo que no acordo celebrado em 7 de Maio de 1975 entre o Estado Português e a FRELIMO, ao abrigo do qual o reclamante prestou serviço, não existe norma expressa respeitante aos efeitos em Portugal do serviço prestado como cooperante, o certo é que dos princípios que presidiram à celebração desse acordo, e até do conjunto de normas que o integram, ressalta à evidência, a meu ver, que o serviço prestado pelos antigos agentes e funcionários de Moçambique em regime de cooperação tem os mesmos efeitos como se prestado fosse ào Estado Português, independentemente da natureza do vínculo que anteriormente os ligava a este mesmo Estado.

Isto resulta até, com especial relevância, em matéria de aposentação, do disposto no artigo 15.° do referido acordo, que, de outro modo, seria incompreensível ou, pelo menos, teria que distinguir.

Mas, ainda que se entenda não ser assim, estar-se-ia em presença de uma lacuna, facilmente integrável pelo recurso à mens legis, a princípios de justiça relativa e ao disposto para um caso inteiramente análogo no Acordo Geral de Cooperação com Moçambique, aprovado pelo Decreto n.° 692/75, de 12 de Dezembro.

3 — Todavia, e porque a Caixa Geral de Aposentações, ao fixar a pensão definitiva, pode também levantar dúvidas, se não mesmo objecções, ao entendimento que acima preconizo, entendo que o problema deveria ser claramente resolvido por via interpretativa autêntica e, por isso, afigura-se-me de recomendar a V. Ex.D, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 18° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, que se digne promover o necessário para que, pela via considerada mais idónea (interpretativa ou outra), seja esclarecido que o serviço prestado ao abrigo de acordos de coopera-

ção ou de pré-cooperação (caso de Angola) pelos antigos agentes da ex-administração ultramarina que não reuniam, em face do disposto no Decreto-Lei n.° 23/75, de 22 de Janeiro, as condições para o ingresso no quadro geral de adidos seja considerado em Portugal, para todos os efeitos legais, incluindo os de antiguidade, promoção e aposentação, como' prestado ao Estado Português, desde que, quanto à aposentação, tenham satisfeito ou venham a satisfazer as correspondentes quotas.

4 — Muito agradeço me seja dado conhecimento do que V. Ex." pensa sobre o problema e da solução que, superiormente, ihe vier a ser dada.

XVIII) Assunto: Delegação de poderes

Processo n.° 81/R-1532-A-2

Secretário de Estado da Administração Escolar:

A propósito dè uma queixa de ... e em referência a um ofício deste Serviço, foi-me remetida pela Direcção-Geral de Pessoal a informação n.° 93/81 da DSPND, de 17 de Agosto de 1981, cuja fotocópia junto, bem como do ofício que a acompanhava.

Face aos esclarecimentos obtidos, mandei arquivar o processo, visto, por um lado, estar a correr seus trâmites e em fase adiantada recurso contencioso interposto pelo reclamante do despacho de 30 de Junho de 1981 do Sr. Director de Serviços de Pessoal não Docente (publicado no Diário da República, 2." série, de 16 de Julho de 1981) e, por outro, se me afigurar que o funcionário em causa não tem razão.

Porém, verificando que quer o despacho de 25 de Agosto de 1981, exarado por S. Ex.° o Secretário de Estado da Administração Escolar sobre a informação da DSPND, quer o despacho de 30 de Junho de 1981 do director de Serviços de Pessoal não Docente, já citado, não contêm, como manda a lei, qualquer referência ao facto de a sua prolação se verificar no âmbito de competência delegada, considero dever formular a V. Ex.° a seguinte recomendação:

Que os despachos proferidos no uso de competência delegada contenham sempre referência expressa a esse facto, nos termos do n.° 2 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 48 059. de 23 de Novembro de 1967.

XIX) Assunto: Direito ao bom nome

Processo n.° 82/IP-45-B-1

Presidente do Conselho de Imprensa:

Um jornal vespertino particular publicou a 6 de Maio de 1982 uma notícia relativa a um crime de estupro, com indicação do nome completo da vítima, menor de 14 anos.

Tratando-se de entidade privada, o Provedor não dispõe de poderes de fiscalização a seu respeito.

Mas, de acordo com critérios já antes seguidos em casos análogos, o Provedor aproveitou este ensejo para

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pôr o problema ao Conselho de Imprensa, nos termos seguintes:

Afigurando-se-me que na notícia de que se junta fotocópia o «direito à informação» não ficaria prejudicado se o nome da ofendida tivesse sido omitido, o que teria a vantagem de subtrair a mesma ao risco de a sua vida privada ser pejorativamente afectada pela natural repercussão que situações deste tipo têm no meio profissional e social das pessoas, submeto o assunto à consideração de V. Ex.°, para os fins que forem julgados convenientes, com vista a, de futuro, ser evitada a «identificação» em notícias deste tipo, sempre que essa identificação não revista interesse de ordem social.

XX) Assunto: Diuturnidades

Processo n.° 80/IP-107-A-2

Ministro das Finanças e do Piano:

Por iniciativa do Provedor de Justiça foi aberto neste Serviço um processo destinado ao estudo das normas que presidem ao processamento da concessão das diuturnidades reguladas pelo Decreto-Lei n.° 330/76, de 7 de Maio.

O assunto foi apreciado neste Serviço com base num memorial, de que junto cópia, sobre o qual foi emitida uma informação, a que dou a minha concordância, cuja cópia também anexa.

Nestes termos, solicito a V. Ex." que se digne informar-me de qual a posição desse Ministério face à fundamentação e conclusões da informação que segue anexa, a saber:

a) Ilegalidade do disposto na circular n.° 871-A/

77 da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, segundo a qual o pagamento das diuturnidades só é devido a partir do mês seguinte ao do requerimento do interessado, devendo, ao invés, o pagamento das mesmas passar a ser feito após o recebimento do respectivo requerimento, mas com efeitos a partir do mês seguinte ao daquele em que o interessado adquiriu o direito à respectiva diuturnidade;

b) Necessidade de alteração do despacho de 12 de

Fevereiro de 1977 do Secretário de Estado do Orçamento, divulgado pela circular n.° 857-A/77, de 16 de Fevereiro, da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, segundo o qual foi alargado para um ano o prazo de 90 dias para entrega da documentação comprovativa do tempo de serviço, findo o qual, em caso contrário, será suspenso o abono provisório que viesse sendo recebido.

A tal despacho deveria aditar-se norma em que se permitisse a prorrogação daquele prazo de um ano, sem que isso implique suspensão do abono que viesse sendo recebido a título provisório, se o interessado tempestivamente provar que, ou por culpa da Administração, ou por motivos que a ele sejam totalmente alheios, não pôde entregar

durante o citado prazo a documentação em causa;

c) Publicação de despacho de V. Ex.a, ao abrigo do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 330/76, em que expressamente fique determinado que:

cl) Nos termos da circular n.° 820-A/ 76 da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, a Administração passe a receber, necessariamente, todos os pedidos de diuturnidades, processando-se depois desse acto as necessárias operações de comprovação de tempo e análise da sua relevância jurídica para a aposentação e diuturnidades;

c.2) Ainda nos termos da citada circular n.° 820-A/76, independentemente daquelas posteriores operações, seja liquidado ao interessado o abono de diuturnidades, a título provisório, com início no mês seguinte àquele em que passou, segundo alegue, a ter direito às diuturnidades e com referência ao tempo de serviço que indique no seu requerimento;

e.3) Os serviços devem avisar publicamente os respectivos funcionários ou agentes de que podem apresentar o pedido de diuturnidades sem necessidade de junção imediata da documentação comprovativa do tempo de serviço alegado, embora sem prejuízo de posterior comprovação e elucidação de dúvidas sobre a sua relevância, bem como de que é contável, para efeitos de concessão de diuturnidades, todo o tempo de serviço susceptível de contagem para efeitos de aposentação, independentemente do facto de os interessados haverem já procedido aos respectivos descontos e sem necessidade de essa contagem ser prévia e efectivamente feita pela Caixa Geral de Aposentações.

Comunico a V. Ex.a que nesta data dou conhecimento do presente ofício, bem como da informação que lhe é anexa, para os efeitos tidos por convenientes, a S. Ex." o Ministro da Reforma Administrativa.

XXI) Assunto: Doeu mantos existentes nas ex-colónias

Processo n.° 82/IP-51-A-3

Aíim'sfro dos Negócios Estrangeiros:

1 — Tem-se verificado, frequentemente, ser necessário neste Serviço consultar processos individuais de funcionários que prestaram serviço nas ex-colónias, ou simplesmente alguns documentos deles constantes, a fim de se proceder à cabal apreciação de reclamações

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apresentadas e até para completamento e confirmação de declarações prestadas pelos mesmos funcionários.

Por seu turno, também os próprios funcionários têm muitas vezes necessidade de dispor daqueles documentos e grande dificuldade em obtê-los.

Nesta conformidade, e uma vez que a remessa de tais elementos raramente tem sido satisfeita ou, quando a mesma se verifica, o seu recebimento é, por vezes, tão tardio que já não aproveita ao esclarecimento pretendido, venho solicitar a V. Ex.a, Sr. Ministro, as necessárias diligências pessoais para obviar por via diplomática a essas dificuldades ou, se por essa via não for possível removê-las, que a questão seja incluída em agenda de negociações com a República Popular de Angola, com vista a que venha a ser facilitado o envio dos referidos processos ou fotocópias deles ou, pelo menos, fotocópias das peças que venham a ser solicitadas.

Quanto aos respectivos encargos, designadamente de remessa e legalização dos documentos em causa, afigura-se que poderiam ficar a cargo dos próprios interessados.

2 — Mais solicito que oportunamente me seja dado conhecimento do que sobre o presente assunto vier a ser decidido.

XX.II) Assunto: Ensino politécnico

Processo n.° 81/R-1963-B-4

Ministro da Educação e das Universidades:

1—Vários alunos do 12." ano, via profissionalizante, vieram apresentar-me queixa por se verem impossibilitados de prosseguir estudos no ensino superior.

2 — Posta a questão ao Gabinete de V. Ex.a, em 29 de Outubro passado vim a obter, dada pelo Gabinete Coordenador de Ingresso no Ensino Superior, a resposta constante da fotocópia anexa.

Verifica-se, face a essa resposta, que, apesar do disposto no n." 2 do artigo 9." do Decreto-Lei n.° 240/80, de 19 de Julho, quê prevê a normal sequência no ensino superior politécnico dos diplomados do 12." ano da via profissionalizante, só existem, presentemente, possibilidades de acesso a esse grau de ensino para 2 das 30 especialidades da via profissionalizante estabelecidas pelo Despacho n." 198/80.

3 — Os alunos da via profissionalizante deparam, assim, com um relevante obstáculo ao exercício normal do direito à sequência de estudos constitucionalmente consagrado [artigo 74.°, n.°s l e 3, alínea d)].

4 — Quanto, directamente, aos alunos que pretendiam, inscrevendo-se na via profissionalizante de Contabilidade e Administração (mapa tu anexo ao Despacho n.u 198/80), ingressar depois nos institutos superiores de contabilidade e administração, não se obteve, afinal, qualquer resposta específica desse Ministério.

5 — Ao colocar a questão, pretendia-se, precisamente, uma tomada de posição, tão breve quanto possível, a nível dos responsáveis pela política desse departamento.

6 — Recebeu-se, contudo, cerca de três meses depois, uma resposta do Gabinete Coordenador de Ingresso no Ensino Superior, que não toma posição sobre o problema.

Essa resposta, aliás, ao dizer que se trata de questão de eventual alteração da lei, revela não se ter entendido a situação destes alunos do 12." ano de Contabilidade e Administração.

7 — O problema é, em suma, o seguinte:

a) Esses alunos acreditaram em que, inscrevendc--se no 12.° ano da via profissionalizante na especialidade de Contabilidade e Administração, poderiam depois ingressar nos institutos superiores de contabilidade e administração;

¿7) Esse propósito veio a frustrar-se pelo facto de, à face da lei, os institutos superiores de contabilidade e administração' não serem considerados ensino superior politécnico:

c) A verdade, porém, é que os queixosos dizem

que no acto de inscrição lhes foi afirmado que a via escolhida permitia aquela sequên cia de estudos;

d) A consideração do número de queixosos e de

colegas a que o mesmo sucedeu revela que se não tratou de caso isolado, mas sim de situação que atingiu centenas —se não mais de um milhar — de alunos e que se verificou em múltiplas escolas. Esta situação encontrou, aliás, na altura, eco nos órgãos de comunicação social;

e) Note-se, de resto, que a redacção do próprio

Despacho n.° 198/80 é bem propícia a gerar esse lapso.

O curso da via profissionalizante que, afinal, não dá acesso aos institutos superiores de contabilidade e administração é designado de Contabilidade e Administração (mapa tu anexo àquele despacho).

E o curso da via de ensino que parece ser o que, afinal, dá acesso àqueles institutos é designado (mapa t) por Economia, Gestão, Gestão de Empresas, Organização e Gestão de Empresas.

Ponderados os factos que venho expondo, urgente se toma formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:

1) Que seja garantida uma adequada sequência

de estudos no ensino politécnico à generalidade dos alunos da via profissionalizante do 12." ano.

Isto como forma de concretização do direito constitucional de acesso ao ensino e sequência de estudos, bem como do regime já previsto no Decreto-Lei n." 240/80, de 19 de Julho;

2) Que seja encontrada uma solução — se ainda

possível — que de algum modo repare ou compense, com justiça e equilíbrio, o prejuízo causado aos muitos alunos da via profissionalizante, especialidade de Contabilidade e Administração, que, por deficiência de informação das escolas e imprecisa redacção do Despacho n.° 198/80, se inscreveram em via que, afinal, lhes não permitia o acesso aos institutos superiores de contabilidade e administração.

Do seguimento dado a esta recomendação agradeço a V. Ex.a que me seja dado conhecimento.

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KXIbl) Assunta: Ensino superior. Acesso

Processo n.° 82/R-1109-B-4

Director do Gabinete Coordenador de Ingresso no Ensino Superior:

Um candidato ao acesso ao ensino superior em 1981-1982 queixou-se por, na 1fase do respectivo concurso, aos que, com ele, haviam concorrido com a habilitação de disciplinas do ano propedêutico e do 12.° ano, não terem sido consideradas as classificações obtidas neste último, se correspondentes a disciplinas daquele ano a elas equivalentes.

O Gabinete Coordenador de Ingresso no Ensino Superior informou que esse critério fora apenas utilizado — aliás não uniformemente— na 1.a fase do aludido concurso. Na 2.a fase, e em resultado de reapreciação das normas aplicáveis, já as classificações em questão haviam sido tidas em conta. Em qualquer das fases, contudo, o interessado não obtivera colocação.

A posição do Gabinete não pareceu acertada, o que levou o Provedor a enviar-lhe a seguinte recomendação:

Não se afigura sustentável a posição assumida por esse Gabinete.

A lei aplicável foi sempre a mesma na 1.a e na 2.a fase.

O que esse Gabinete chama «aperfeiçoamento» na interpretação da lei não equivale à mudança desta.

A lei manteve-se e esse Gabinete é que na 1.a fase fez uma interpretação inaceitável, já que a interpretação correcta só podia ser uma.

Tão-pouco é aceitável a afirmação desse Gabinete de que a sua actuação respeitou o princípio de igualdade perante a lei.

Essa igualdade foi, desde logo, violada no tratamento diferenciado dado aos concorrentes à 1.a e à 2.a fases.

E, além disso, na própria informação desse Gabinete se reconhece que mesmo na 1 .a fase não se seguiu sempre o mesmo critério.

Também não convence o argumento de que a reclamação do queixoso não era atendível, por tardia, em relação à 1." fase.

É que, ao concluir ter sido incorrecta a interpretação da lei aplicada na 1 .a fase, a Administração deveria, espontaneamente, ter revisto o critério aí utilizado.

Admito que, concretamente, quanto ao queixoso, não se possa ainda dizer que, a ter-lhe sido aplicado na 1." fase o critério feito valer na 2.a, teria sido colocado.

Ê que só se poderia concluir nesse sentido depois de aplicar o mesmo regime a todos os que na 1.a fase foram, como ele, objecto de interpretação errónea da lei.

Assim, como compensação parcial do prejuízo sofrido — perda de um ano por erro da Administração—, e em face das razões que antecedem, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação :

Que ao queixoso, bem como a todos os candidatos nas mesmas condições, seja permitida a admissão, sem mais, no ensino supe-

rior, uma vez que nele teria ingressado no ano lectivo de 1981-1982 se na l.a fase tivesse sido feita uma correcta interpretação da lei.

Do seguimento dado a esta recomendação agradeço a V. Ex.a que me seja dado conhecimento.

XXIV) Assunto: Equivalência de habilitações. Doutoramento

Processo n.° 78/R-2232-B-1

Ministro da Educação:

1 — Várias reclamações foram apresentadas neste Serviço por não ser dado andamento à concessão de equivalência ao doutoramento pelas universidades portuguesas do grau de doutoramento do 3.° ciclo francês.

Independentemente da análise do conteúdo pedagógico da questão, que não cabe ao Provedor de Justiça, não poderei deixar de apreciar o assunto do ponto de vista jurídico, tendo em vista as irregularidades e mesmo ilegalidades que todo o processo de concessão de equivalência patenteia.

2 — Quanto ao despacho genérico do Secretário de Estado do Ensino Superior de 29 de Maio de 1978, afigura-se este abertamente ilegal.

Com efeito, o Decreto-Lei n.° 555/77, ao abrigo do qual ele se diz proferido, não comete ao Secretário de Estado do Ensino Superior nem à Direcção-Geral do Ensino Superior qualquer intervenção decisória em matéria de equivalências do ensino superior.

O Secretário de Estado do Ensino Superior não tem, no âmbito do citado diploma, qualquer interferência para definição das equivalências.

A Direcção-Geral do Ensino Superior tem apenas competência para promover o andamento dos pedidos (artigos 3.°, 4.°, 5.° e 8.°, n.° 5) e para informá-los antes de os remeter aos conselhos científicos das escolas.

A competência para concessão das equivalências cabe às universidades (artigo 2.°, n.° 2).

Nos casos normais, a equivalência é decidida por um júri constituído no âmbito das universidades (artigos 7.° e 8.°).

E mesmo a rejeição liminar dos pedidos de equiparação cabe aos conselhos científicos (artigo 5."), só cabendo à Direcção-Geral do Ensino Superior, a este propósito, informar os processos a remeter aos conselhos.

Em suma, o Secretário de Estado do Ensino Superior poderia, quando muito, emanar directivas para a Direcção-Geral do Ensino Superior no sentido de informar negativamente os processos relativos ao doutoramento do 3.° ciclo.

Mas foi completamente ilegal o facto de se haver considerado competir à Direcção-Geral do Ensino Superior a rejeição liminar de tais requerimentos.

3 — Quanto ao Despacho n.° 86/79 do Ministro da Educação:

3.1 — Quanto ao Despacho n.° 86/79 do Ministro da Educação, afigura-se ainda ilegal, dado que, tendo sido proferido ao abrigo do artigo 3.°, n.° 2, alínea b), do Decreto-Lei n.° 555/77, de 31 de Dezembro, o mesmo despacho confere à Direcção-Geral do Ensino

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Superior competência para apreciar se «determinada prova sanciona o nivel cultural [...]», quando esta competência pertence exclusivamente aos conselhos científicos das escolas ou unidades de ensino das universidades ou institutos universitários, de acordo com o disposto no artigo 5.° do citado Decreto-Lei n.° 555/77.

3.2 — Dispõe o artigo 5.°:

O pedido poderá ser liminarmente rejeitado por deliberação fundamentada daqueles conselhos, quando se verificar, em face da documentação apresentada e tendo em conta as informações prestadas pela Direcção-Geral do Ensino Superior, que o grau obtido pelo requerente é manifestamente insusceptível de comprovar o alto nível cultural, a aptidão para a investigação científica e as demais condições exigidas para os doutoramentos realizados nas universidades e nos institutos universitários portugueses.

Parece, pois, que resulta claramente da lei a intenção de conferir a apreciação do indeferimento liminar, condicionado aos parâmetros indicados, aos conselhos científicos, e não à Direcção-Geral do Ensino Superior.

Na verdade, o indeferimento liminar preconizado pelo artigo 3.°, à luz do qual foi emitido o Despacho Ministerial n.° 86/79, traduz apenas uma actividade meramente burocrática, designadamente em face do n.° 3 do referido artigo.

3.3 — «A falta de algum dos documentos exigidos no número anterior obstará à apreciação do pedido, determinando o respectivo indeferimento liminar.»

Parece, pois, que, de acordo com o n.° 2, alínea b), do. artigo 3.°, quando este refere o «diploma ou título equivalente que ateste a realização do doutoramento ou de outras provas de idêntica natureza», não competirá à Direcção-Geral do Ensino Superior verificar se essas provas sancionam o «alto nível cultural [...]», mas se este diploma ou título foi ou não entregue.

De outra forma, seria incompatível a actuação a nível burocrático da Direcção-Geral do Ensino Superior com a previsão do indeferimento liminar constante do artigo 5.° quanto ao nível científico.

Afigura-se, portanto, ilegal o Despacho n.° 86/79. quando atribui essa competência à Direcção-Geral do Ensino Superior, visto que tal indeferimento liminar, a ser proferido, deve sê-lo sempre pelos conselhos científicos.

Tendo em vista os fundamentos que antecedem, permito-me formular a V. Ex." a seguinte recomendação:

Que sejam revogados o despacho do Secretário de Estado do Ensino Superior de 29 de Maio de 1978 e o Despacho n.° 86/79 do Ministro da Educação, por se revelarem manifestamente ilegais, em face do Decreto-Lei n.° 555/77, de 31 de Dezembro.

4 — Do seguimento dado a esta recomendação agradeço a V. Ex.° que me seja dado conhecimento.

5 — Aproveito, aliás, para apontar que a nota sobre os resultados dos trabalhos da comissão ad-hoc designada para apreciação deste problema (fls. 46 e 47 do processo anexo) de modo algum confirma o que na informação n.° 37 de 1979 da Secertaria de Estado

do Ensino Superior (antepenúltimo parágrafo da fotocópia junta) se refere acerca das conclusões a que esta comissão terá chegado, o que não posso deixar de lamentar.

XXV) Assunto: Faltas

Proceso n.° 81/R-633-A-2

Secretário de Estado da Saúde:

1 — Na sequência da reclamação apresentada neste Serviço por .... terceiro-oficial dos Serviços Médico--Sociais, Serviço Distrital de Viseu, acerca do tratamento dispensado à ausência do serviço de funcionários que se candidataram a prestação de provas de concurso, a Comissão Instaladora dos Serviços Médico--Sociais (Serviços Centrais) veio a assumir, a propósito, a posição que consta do ofício n.° 26 625, de 29 de Outubro de 1981, junta por fotocópia, a qual consiste, basicamente, na consideração daquelas ausências como faltas ao serviço, até porque não se tratou de concurso realizado no âmbito de «carreira profissional normal do funcionário, mas sim de um concurso aberto por outra entidade oficial».

2 — Por se tratar de entendimento que considero ilegal e injusto, pelas razões constantes da informação prestada pelo Ex.m° Assessor do processo, cujo exemplar dactilografado se junta, formulo a V. Ex.n, ao abrigo do disposto no artigo 18.°, n.° 1, alínea a), e no n.° 1 do artigo 34.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:

Que pelos Serviços Centrais dos Serviços Médico--Sociais sejam tomadas providências no sentido de se não proceder a qualquer desconto na antiguidade do funcionário reclamante e de outros que estejam, eventualmente, na mesma situação, com base em ausência do serviço decorrente da necessidade de comparência a provas de concurso público, realizadas no âmbito de outro departamento ministerial, ao qual se hajam candidatado, tendo em vista o disposto nos artigos 3.° e 8." do Decreto com força de lei n.° 19 478, com referência ao artigo 48.°, n.° 4, da Constituição da República.

Agradeço que me seja informada a sequência que vier a merecer a presente recomendação.

Informação do assessor

1 — Independentemente de estar em curso uma reclamação endereçada ao Sr. Secretário de Estado da Saúde, não podemos deixar de adiantar que a posição assumida pelos Serviços Centrais dos Serviços Médico--Sociais (fls. 41 e 42) é manifestamente ilegal e injusta, porquanto:

a) O artigo 8." do Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1931, dispõe que o funcionário não pode, «salvo motivo justificado e licença do respectivo chefe de

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repartição ou director de serviços, interromper o seu trabalho», assinado que seja o livro de ponto, sob pena de tal interrupção ser considerada falta injustificada;

b) Ora, a participação num concurso para pre-

enchimento de vaga em quadro dâ própria Administração —apesar de se tratar de acto da iniciativa do funcionário vinculado a outro serviço do Estado— não deixa de constituir, num sentido amplo, um direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, as funções públicas, de harmonia com o preceituado no n.° 4 do artigo 48.° da Constituição da República;

c) É princípio indiscutível o de que a atribuição

de um direito — neste caso, constitucionalmente consagrado — pressupõe os meios indispensáveis ao exercício do mesmo;

d) O candidato ou concorrente funcionário tem,

portanto, o direito de, com prévia autorização dos seus superiores hierárquicos, ausentar-se do serviço com a finalidade de participar nas provas de concurso fora do Âmbito do departamento ao qual se encontra vinculado;

e) Tal ausência, decorrente do exercício de ura

direito elementar que a lei fundamental consagra, não pode determinar a marcação de falta, ainda que justificada, susceptível de afectar de algum modo a carreira do funcionário por via de descontos na antiguidade;

f) Orientação diferente significaria um autêntico

esvaziamento do direito que o cidadão, funcionário ou não, tem de se candidatar a empregos públicos, uma vez que representaria para os primeiros um evidente prejuízo nas respectivas carreiras;

g) Havendo motivo justificado para a interrup-

ção nas condições expostas — motivo justificado por razões alheias a questões de licença ou de saúde —, nem por isso deixará de ter aplicação o artigo 3.° do Decreto com força de lei n.° 19 478;

h) Não se compreende, por outro lado, que a Ad-

ministração conceda facilidades nos horários aos trabalhadores-estudantes (Lei n.° 26/81, de 21 de Agosto) e se recuse a reconhecê-las aos trabalhadores que se tenham candidatado a emprego diferente no seio da própria Administração.

2 — Termos em que sugerimos a intervenção do St. Secretário de Estado da Saúde para a resolução do caso concreto e do Sr. MRA, sugerindo, neste caso, actuação tendente a pôr cobro a dúvidas e práticas inadequadas que se estão a constatar.

XXVI) Assunto: Faltas

Processo n.» 81/R-833-A-2

Primeiro-Ministro:

1 — A coberto do ofício n.° 1790, de 3 de Fevereiro de 1982, junto por fotocópia, formulei ao Sr. Secretário de Estado da Saúde recomendação no sentido de

se não proceder a qualquer desconto na antiguidade dos funcionários que se hajam ausentado do serviço, devidamente autorizados, a fim de prestarem provas de concurso público, realizadas no âmbito de outro departamento ministerial, ao qual se tenham candidatado, tendo em atenção o disposto nos artigos 3.° e 8.° do Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1931, com referência ao artigo 48.", n.° 4, da Constituição.

2 — O Sr. Secretário de Estado, louvando-se em razões aduzidas num parecer dos Serviços Médico-•Sociais, cujo exemplar fotocopiado se junta, entendeu não dever acatar aquela recomendação.

3 — Sucede que a esforçada argumentação desenvolvida naquele parecer se circunscreveu ao campo puramente doutrinal, olvidando o aspecto relevante do interesse da própria Administração, como é o da valorização profissional dos respectivos funcionários. Com efeito, se um funcionário se candidata a um concurso no seio da Administração Pública, terá, forçosamente, de ausentar-se do local do seu emprego, mesmo que o concurso se realize a nível dos serviços onde se encontra integrado. Trata-se, pois, de uma exigência naturalmente decorrente da prestação de provas de concurso, a qual não deverá funcionar em detrimento do candidato que procura obter provimento em cargo mais vantajoso da carreira em que está Inserido ou de outra, uma vez que da selecção virá também a beneficiar a Administração.

4 — Nestes termos, considero de manter a recomendação em causa, o que levo à superior consideração de V. Ex.", ciente de que a questão merecerá a atenção que a Secretaria de Estado da Saúde lhe não votou.

XXVII) Assunto: Fundamentação dos actos

Processo n.° 81/R-2462-A-2

Secretário de Estado das Pescas:

1 — No seguimento da reclamação que me foi apresentada pelo Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública da Zona Sul e Açores acerca da interdição da entrada nas instalações do Instituto Nacional de Investigação das Pescas (INIP) do inspector superior..., decidida pelo respectivo director-geral, pude constatar, através de informações que me foram prestadas pelo Gabinete de V. Ex.", que o acto em questão não terá sido motivado, em flagrante oposição com o que determina a alínea a) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de lunho.

2 — A argumentação respeitante ao alegado indeferimento tácito ao recurso hierárquico interposto pelo visado (cf. o parágrafo segundo do ofício n.° 2506, de 22 de Setembro de 1982, junto por fotocópia) não altera, de qualquer modo, a questão da falta de fundamentação do despacho do INIP, por se tratar de acto para o qual a lei exige fundamentação expressa.

3 — Nestes termos, e embora a questão possa, em certa medida, considerar-se ultrapassada, com o levantamento da medida posta em causa, afigura-se-me pertinente, com vista a evitar a repetição de actos análogos, que se traduzem na aplicação de medidas punitivas infundadas e cuja impugnabilidade se pretende dificultar, formular a V. Ex.°, ao abrigo do disposto no artigo 18.°, n.° 1, alínea a), e no artigo 34.°, n.° 1,

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da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:

Que sejam dadas instruções a todas as direcções--gerais e organismos dependentes dessa Secretaria de Estado no sentido de que todos os actos que, de qualquer modo, restrinjam direitos dos funcionários, designadamente os que vedem o acesso dos mesmos a instalações e recintos, sejam suficientemente motivados [artigo 1.°, n.° 1, alínea a), do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de junho], por forma a permitir aos possíveis visados a impugnação dos mesmos actos.

Agradeço ser informado sobre a sequência que merecer a presente recomendação.

XXVUI) Assunto: Imposto complementar

Processo n.° 81/R-1784-A-2

Ministro de Estado e das Finanças e do Plano:

1 — No seguimento da reclamação apresentada neste Serviço acerca da não discriminação das importâncias respeitantes às despesas de transporte nos impressos modelo n.° 41-B, a Comissão de Gestão dos Serviços Médico-Sociais do Distrito de Setúbal enviou fotocópias da circular n.° 96/79 dos Serviços Centrais dos Serviços Médico-Sociais e do parecer n.° 109/79, do respectivo Gabinete Jurídico, dos quais se conclui, em síntese, que, por se mostrarem indissociáveis as importâncias concedidas a título de compensação por tempo perdido e as despesas de transporte, devem as mesmas quantias constar das relações nominais a remeter às repartições de finanças; não relevando, por conseguinte, a isenção contemplada na alínea j) do artigo 8.° do Código do Imposto Complementar, apenas respeitante às despesas de transporte.

2 — As conclusões do parecer em causa estão em flagrante contradição com as respectivas premissas.

Com efeito, se se admite, sem equívocos, a isenção das despesas de transporte para efeitos tributários, torna-se insustentável, sob alegação de indissociabili-dade do processamento das referidas despesas — aspecto que, para além de irrelevante do ponto de vista legai, ficou por demonstrar—, manter, sem qualquer distinção, as despesas de transporte nas relações enviadas aos serviços de administração fiscal.

3 — Tal procedimento dos Serviços Médico-Sociais equivale, por outro lado, a suprimir a isenção fiscal concedida por lei [alínea /') do artigo 8.° do Código do Imposto Complementar] às despesas de transporte efectuadas pelos médicos nas deslocações em serviço, carecendo, por conseguinte, de urgente rectificação por parte das entidades processadoras dos abonos em questão.

4 — Nestes termos, ao abrigo do que dispõem a alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° e o n.° 2 do artigo 34.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:

Que pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos sejam tomadas, com a possível brevidade, as providências que se mostrarem ade-

quadas com a finalidade de pelos Serviços Médico-Sociais ser observada a isenção reconhecida pela alínea do artigo 8.° do Código do imposto Complementar às despesas de transporte abonadas aos médicos por deslocações em serviço.

Agradeço que me seja comunicada a sequência que merecer a presente recomendação.

XXIX) Assunto: Imposto complementar

Processo n.° 81/R-1784-A-2

Ministro dos Assuntos Sociais:

1 — No seguimento da reclamação apresentada neste Serviço acerca da não discriminação das importâncias respeitantes às despesas de transporte nos impressos modelo n.° 41-B, a Comissão de Gestão dos Serviços Médico-Sociais do Distrito de Setúbal enviou fotocópias da circular n.° 96/79 dos Serviços Centrais dos Serviços Médico-Sociais e do parecer n.° 109/79 do respectivo Gabinete Jurídico, dos quais se conclui, em síntese, que, por se mostrarem indissociáveis as importâncias concedidas a título de compensação por tempo perdido e as despesas de transporte, devem as mesmas quantias constar das relações nominais a remeter às repartições de finanças, não relevando, por conseguinte, a isenção contemplada na alínea /) do artigo 8.° do Código do Imposto Complementar, apenas respeitante às despesas de transporte.

2 — As conclusões do parecer em causa estão em flagrante contradição com as respectivas premissas.

Com efeito, se se admite, sem equívocos, a isenção das despesas de transporte para efeitos tributários, torna-se insustentável, sob alegação de indissociabilidade de processamento das referidas despesas — aspecto que, para além de irrelevante do ponto de vista legal, ficou por demonstrar—, manter, sem qualquer distinção, as despesas de transporte nas relações enviadas aos serviços de administração fiscal.

3 — Tal procedimento dos Serviços Médico-Sociais equivale, por outro lado, a suprimir a isenção fiscal concedida por lei [alínea ;') do artigo 8.° do Código do Imposto Complementar] às despesas de transporte efectuadas pelos médicos nas deslocações em serviço, carecendo, por conseguinte, de urgente rectificação por parte das entidades processadoras dos abonos em questão.

4 — Nestes termos, ao abrigo do que dispõem a alínea a) do n.° 1 do artigo 18." e o n.° 2 do artigo 34.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:

Que pelos Serviços Médico-Sociais sejam tomadas, com a possível brevidade, as providências que se mostrarem adequadas com a finalidade de ser observada a isenção concedida pela alínea j) do artigo 8.° do Código do Imposto Complementar às despesas de transporte abonadas aos médicos por deslocações em serviço.

Agradeço que me seja comunicada a sequência que merecer a presente recomendação.

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XXX) Assunto: Licença para férias

Processo n.° 82/IP-100-A 2

Ministro da Reforma Administrativa:

Têm sido apresentadas neste Serviço reclamações de funcionários e agentes do Estado nas quais os mesmos se queixam de que, por erro da Administração na interpretação da lei correspondente, não lhes foi autorizado o gozo, total ou parcial, dos 30 dias de férias a que tinham direito.

Posteriormente veio a ser reconhecido pelo próprio serviço o erro cometido, mas, por falta de cobertura legal, foi impossível no próprio ano, ou no seguinte, o gozo pelos reclamantes dos dias de licença para férias a que tinham direito, embora lhes tivesse sido pago o respectivo subsídio de férias.

Com vista a evitarem-se situações idênticas, que não poderão deixar de se considerar ofensivas de direitos adquiridos e profundamente injustas, permito-me, no uso da competência que a lei me confere, formular a seguinte recomendação:

Que no futuro diploma sobre férias, faltas e licenças, cujo projecto se encontra já elaborado nesse Ministério, no seu artigo 7." (acumulação de férias), seja aditado um outro número, o n.° 5, cuja redacção poderia ser:

Artigo 7.°

(Acumulação de férias)

1 — ..............................................

2— ..............................................

3— ..............................................

4— ..............................................

5 — Sempre que o funcionário ou agente

se vir impedido de gozar, total ou parcialmente, as férias respeitantes a determinado ano por erro ou culpa da Administração, deverá gozá-las até 31 de Maio do ano civil imediato, em data a estabelecer por acordo com a Administração, tendo em vista a conveniência do serviço, devendo esta, na falta do referido acordo, ser devidamente fundamentada.

XXX)) Assunto: Licenciatura em Educação Física. Bacharéis

Processa n.° 79/R-847-8-1

Ministro da Educação:

O Sindicato dos Professores, em nome dos seus associados, e vários cidadãos diplomados pelas antigas escolas de educação física, apresentaram queixa com base nos seguintes fundamentos:

O Ministério da Educação e Universidades recusa-se a reconhecer a possibilidade de continuação de estudos, sem mais, aos indivíduos equiparados a bacharel nas condições do artigo 21.° do Decreto-Lei n.° 675/ 75.

A Portaria n.° 433/79 continua, ao que parece, em vigor. Ora, a referida portaria foi publicada ao abrigo dos artigos 7.° e 8.° do referido decreto-lei, o que parece manifestamente ilegal relativamente ao conteúdo,

designadamente, do artigo 7.° — plano de estudos para a licenciatura —, pois não estrutura a licenciatura em especialidades.

Além disso, a referida portaria estabelece as precedências das disciplinas que compõem a licenciatura, sem nunca referir o bacharelato, não permitindo, assim, aos equiparados a bacharel terminar o curso de licenciatura em 2 anos.

Embora o Despacho n.° 43/78 se possa considerar ultrapassado (será mais um elemento a considerar), estabelecia como prazo limite para as matrículas dos reclamantes o dia 28 de Abril de 1979, tendo sido publicado em 24 de Abril de 1979.

Mas também surgem problemas de conjugação da Portaria n.° 433/79 cora o Despacho n.° 43/79, segundo parece decorrer da resposta da Direcção-Geral do Ensino Superior.

Antes de mais, o Despacho n.° 43/79 afirma-se baseado no artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 675/75, referente ao esclarecimento de dúvidas (o que não se apresenta adequado).

Do curso especial definido no Despacho n.° 43/79 apenas consta uma disciplina integrada no 5.° ano de licenciatura do Instituto Superior de Educação Física, tal como o estabelece a Portaria n.° 433/79 —a de Metodologia do Treino Desportivo.

Isto parece significar que o curso especial previsto para os queixosos não lhes proporciona, afinal, a conclusão da licenciatura de 5 anos.

Ora, o artigo 20.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 675/75 é claro em determinar quem são os indivíduos equiparados a bacharel para efeitos de prosseguimento de estudos.

Por tal facto, deveria ser facultada a matrícula no 4.° ano de licenciatura, a concluir em 2 anos, embora com elenco especial de disciplinas.

No entanto, os institutos superiores de educação física não admitem propriamente, pelo menos de forma explícita, a matrícula no 4.° ano aos equiparados a bacharel.

Nestes termos, permito-me dirigir a V. Ex." a seguinte recomendação:

Que seja revogada toda a legislação que, ilegalmente, impede o prosseguimento de estudos, em termos de conclusão de licenciatura em 2 anos, nos institutos superiores de educação física aos equiparados a bacharel, nos termos do artigo 21.° do Decreto-Lei n.° 675/75.

Do seguimento dado a esta recomendação agradeço a V. Ex." que me seja dado conhecimento.

XXXII) Assunto: Ocupação. Renda

Processo n.° 81/R-2093-A-3

Ministro da Indústria, Energia e Exportação:

Acuso a recepção do ofício em referência, que agradeço. Contudo, e porque não pode merecer a minha concordância a posição assumida por esse departamento, permito-me dirigir a V. Ex." a recomendação anexa.

Considerando que a alínea e) do n.° 1 do artigo 31.° da Lei n.° 68/79, de 16 de Outubro, reconhece ao nu-titular da empresa ou do estabelecimento o direito

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de obter a fixação de uma renda mensal, a pagar por aqueles, no caso de carecer dela para assegurar a satisfação das suas necessidades essenciais ou do seu agregado familiar;

Considerando que ... é nu-proprietário do estabelecimento ocupado pela ...;

Considerando que da sua actividade como empresário da .... que explorava nas instalações hoje ocupadas, extraía este os rendimentos indispensáveis à sua sobrevivência e à do seu agregado familiar;

Considerando que a inexistência de sanção legal específica para o caso de ocupantes se recusarem a pagar a renda fixada não pode fundamentar a não fixação desta;

Considerando que, face a tal eventual recusa, o empresário sempre poderia recorrer aos tribunais para obter a satisfação dos créditos decorrentes do não pagamento da renda estabelecida;

Considerando, finalmente, que se a Lei n.° 68/78 revela insuficiências —e já foi recomendada a sua revisão—, seria de diligenciar no sentido de ser presente à Assembleia da República um projecto de diploma contendo as modificações consideradas necessárias:

Usando o direito que me confere a alínea a) do n." 1 do artigo 18." da Lei n." 81/77, de 22 de Novembro, considero ser de formular a V. Ex," a seguinte recomendação:

Que seja fixada uma renda justa, nos termos da alínea e) do n.° 1 do artigo 31.° da Lei n.° 68/ 78, a pagar a ... pela .... como remuneração pela utilização das instalações que ocupa e que são propriedade daquele.

XXXIN) Assunto: Pensões de reforma. Complemento

Processo n.° 81/IP-62-B-1

Direcção da Casa do Douro:

1 — Por despacho de 14 de Novembro de 1975 do então Secretário de Estado do Comércio Externo, publicado no Diário da República, 2." série, n.° 275, de 27 de Novembro de 1975, a comissão de gestão da Casa do Douro foi autorizada a mandar aposentar os seus servidores que tivessem 60 anos de idade c reunissem as condições mínimas legais de aposentação, ficando simultaneamente com a obrigação de despender as importâncias necessárias para que esses servidores recebessem pensões de reforma idênticas às que teriam se pertencessem à função pública (neste ponto convém salientar que tais trabalhadores descontavam para as caixas de previdência).

2 — Na sequência daquele despacho, e conforme o comprova o extracto da acta n.° 24 da sessão ordinária da comissão de gestão da Casa do Douro, foi mandada elaborar uma relação dos funcionários com mais de 65 anos (idade mínima de reforma na Previdência) que quisessem fruir daquela disposição governamental. Dos 19 funcionários que foram incluídos na referida relação apenas 14 acabaram por aceitar a passagem à situação de reforma.

3 — A Casa do Douro ficou então a pagar a esses 14 servidores a diferença entre a pensão que lhes caberia por aplicação do Estatuto de Aposentação e a que lhes era efectivamente paga pela Caixa Nacional de Pensões.

4 — Pretendem agora os referidos reformados, e por isso reclamaram para o Provedor de Justiça, que a Casa do Douro inclua nos complementos de reforma que lhes paga o montante que resultar da aplicação aos mesmos do regime das diuturnidades com que os funcionários públicos aposentados foram contemplados por força do Decreto-Lei n.° 341/77, de 19 de Agosto.

5 — A Casa do Douro nega-se, porém, a satisfazer tal pretensão, sustentando que o Decreto-Lei n.° 562/77, de 31 de Dezembro, que no seu artigo 3.°, n.° 2, prevê a aplicação do regime de diuturnidades ao pessoal reformado por conveniência de serviço, não é aplicável aos interessados, visto que eles, ao fim e ao cabo, se reformaram voluntariamente, conforme o demonstra a relação atrás citada.

6 — Ainda que a passagem à reforma destes trabalhadores haja sido (apesar de suscitada ou pressionada pela Administração), juridicamente, voluntária, não se pode deixar de entender que os reclamantes têm direito a ver a sua pretensão satisfeita, se bem que com base em fundamento diverso do alegado pelos queixosos. Os interessados, embora não estejam abrangidos pela Caixa Geral de Aposentações, têm legitimidade para invocar a aplicação do Decreto-Lei n.° 341/77, de 14 de Agosto, Bos seus casos. Isto porque, nos termos do despacho de 14 de Novembro de 1975, já mencionado, eles ficaram com a expectativa jurídica dc auferir pensões de reforma idênticas às que lhes seriam atribuídas se pertencessem à função pública.

E não se diga que esse despacho não tem valor jurídico, pois que, se assim fosse, então a Casa do Douro também não teria cobertura legal para proceder ao pagamento dos complementos de reforma, conforme está fazendo.

Neste contexto, ao abrigo do artigo 18.", n." 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, formulo a seguinte recomendação:

Que nos complementos de reforma que são pagos pela Casa do Douro, por força do despacho dc 14 de Novembro de 1975 do Secretário de Estado do Comércio Externo, seja incluído o montante correspondente à aplicação aos interessados do regime de diuturnidades com que os funcionários públicos foram contemplados com base no Decreto-Lei n.n 341/77, de 19 de Agosto.

Solicito a VV. Ex." que me seja dado conhecimento da posição que vier a ser assumida relativamente a esta recomendação.

XXXIV) Assunto: Pensões de sobrevivência

Processo n.° 82/R-170-B-1

Secretário de Estado das Finanças:

l — O artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 476/76, de 16 de Junho, estabelece que «a todos os servidores civis e militares reintegrados ao abrigo do Decreto-Lei n." 173/74, de 26 de Abril, será contado, para efeito de aposentação, o tempo relativo ao período ou períodos de interrupção de funções por motivos de natureza política, sem o pagamento de quotas para a Caixa Geral de Aposentações».

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Acrescenta o artigo 5.° do mesmo diploma que «a isenção do pagamento de quotas estabelecida no artigo 1.° deste diploma é extensiva ao Montepio, exceptuadas as situações resultantes dos artigos 8.° e 63." do Estatuto das Pensões de Sobrevivência».

2 — Os herdeiros hábeis de determinado funcionário público aposentado compulsivamente, mas posteriormente reintegrado, requereram ao Montepio dos Servidores do Estado o aumento das suas pensões de sobrevivencia por aplicação do citado regime do Decreto-Lei n.° 476/76.

Sucede, porém, que a sua pretensão não foi satisfeita, tendo o Montepio invocado que as pensões de sobrevivência que os interessados já estavam a auferir não podiam beneficiar da reintegração do dito funcionário devido ao facto de estarem a ser pagas ainda ao abrigo do Decreto-Lei n.° 24 406, cujo regime não é compatível com a isenção de quotas contemplada no artigo 5° do Decreto-Lei n.u 476/76, uma vez que faz depender o valor da pensão de sobrevivência do tempo de contribuição para o Montepio e do montante de quotas.

3 — Reconhece-se que o Decreto-Lei n.u 476/76 não previu o caso de o funcionário aposentado compulsivamente e depois reintegrado não ter chegado a estar abrangido pelo Estatuto das Pensões de Sobrevivência, tendo, todavia, descontado para o Montepio dos Servidores do Estado, ao abrigo do Decreto-Lei n.u 24 406. de 21 de Junho de 1934.

Contudo, considera-se injusto que este caso não seja contemplado paralelamente ao daqueles funcionários a quem é aplicável aquele Estatuto.

Neste contexto, considero de formular a seguinte recomendação:

Que seja elaborado um despacho que, com base no artigo 6.° do mencionado Decreto-Lei n." 476/ 76, determine que o período de interrupção de funções por motivos de natureza política, a que se refere o artigo 1.° desse mesmo diploma, vale. para efeito de pensão de sobrevivência a conceder ao abrigo do Decreto-Lei n." 24 406, como tempo de contribuição para o Montepio, corres-pondendo-lhe a quota que o funcionário se encontrava a pagar quando foi afastado do serviço.

Agradeço a V. Ex." que me seja comunicada a posição desse departamento relativamente ao presente assunto.

XXXV) Assunto: Posso. Exoneração

Processo n.° 80/R-2258-B-4

Secretário de Estado da Administração Escolar:

1 — ... apresentou-me a queixa cuja fotocópia segue em anexo.

2 — Após terem sido efectuadas as diligências consideradas úteis para apreciação da situação do reclamante, recebi da Direcção-Geral de Pessoal a informação constante da fotocópia anexa.

3 — Considero que a posição daquele departamento não é correcta no tocante ao despacho de exoneração, dado que:

4 — Por um lado, a citada informação da Direcção-•Geral de Pessoal acabara já por considerar que até ao ingresso no quadro geral de adidos o interessado continuou legalmente titular do lugar de docente na Escola de Cepa. Isto por as suas nomeações para 2 cargos em Moçambique se terem operado em comissão e por a eventual responsabilidade disciplinar por não apresentação na Escola após cessação da 2.° comissão ter, entretanto, prescrito.

Mas já não é aceitável a doutrina constante dessa informação (sobre a qual foi proferido despacho de concordância pelo director-geral de Pessoal, em 13 de Fevereiro de 1981) no sentido de, por não ser possível a acumulação de lugares, o ingresso dele no quadro geral de adidos, operado em 20 de Dezembro dc 1977, dever gerar a sua exoneração da escola a que pertencia.

Recorde-se que foi na sequência desse entendimento que foi publicado o despacho de exoneração, com a expressa menção de «por ter tomado posse noutro cargo público».

5 — Ora, este regime não seria aplicável à situação especial do queixoso.

Ele ingressou, com efeito, no quadro geral de adidos, na situação de actividade fora do quadro, por continuar então a prestar serviço como cooperante numa ex-colónia (esta situação só lhe foi dada por finda em 10 de Novembro de 1980, com efeitos a partir de 26 de Junho de 1980).

6 — Ora, a alínea a) do n." 3 do artigo 1." do Decreto-Lei n.° 356/77, de 31 de Agosto, que prevê precisamente essa situação, diz que se lhe aplicará o artigo 8." do Decreto-Lei n.° 180/76, de 9 de Março. Este artigo 8.", por seu turno, dispõe:

8."— I —O cooperante manterá a situação jurídica que possuía à data em que se vinculou à cooperação [...]

3 — Regressado a Portugal, o cooperante apre-sentar-se-á no Ministério da Cooperação, onde receberá guia de marchai para a empresa, organismo ou serviço de origem, a fim de ocupar o lugar ou a situação a que tem direito.

O ingresso do queixoso no quadro geral de adidos não implicou, pois, a tomada de posse de qualquer lugar no âmbito daquele.

Ao contrário: a integração no quadro geral de adidos (que, aliás, nem possui, como se sabe, lugares próprios de que seja possível tomar posse) significa, em geral, a manutenção do mesmo tipo dc vínculo que o funcionário tinha na administração das ex-colónias e, em especial, em casos como o do queixoso, a expressa conservação do lugar possuído aquando da entrada, com vinculação ao regresso a ele, finda a actuação como cooperante ou equiparado.

O despacho de 16 de Abril de 1981, que o exonerou, foi, pois, ilegal, por baseado em erro sobre os pressupostos.

7 — Aliás, tal acto foi também ilegal, na medida em que praticado pelo chefe de divisão, por subdele-gação.

É que o artigo 20.°, n." 2, do Decreto-Lei n.° 28/81, de 12 de Fevereiro, permitia, é certo, que os secretários de Estado subdelegassem poderes. Mas. como, face a esse diploma, eles não tinham poderes origina-

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rios, mas sim delegados dos ministros, aquelas subde-legações só poderiam recair sobre directores-gerais. São ilegais, pois, as subdelegações do 2° grau, ou autorizações de subdelegações concedidas por muitos secretários de Estado para que os directores-gerais conferissem poderes a chefias inferiores.

8 — Verifica-se, no entanto, que no Diário da República, 2.a série, de 9 de Junho de 1981, ou seja uma semana depois da recepção no MEU da petição de recurso que o queixoso apresentou, dirigida ao Supremo Tribunal Administrativo, vem publicado de novo o aludido despacho de 16 de Abril de 1981, parece que em rectificação, com um texto que é precisamente igual ao da primeira publicação, salva a omissão da frase «por ter tomado posse de outro lugar».

Não resulta claro o objectivo desta segunda publicação.

9 — A isto acresce outro aspecto da actuação, a meu ver, também ilegal, do MEU (DGP) e que igualmente compromete o direito de acesso à justiça do interessado. Este pediu, como era seu direito, certidão da informação que constituíra fundamento do despacho que o exonerou.

Pois o director-geral de Pessoal despachou sobre esse requerimento (fotocópia anexa):

Não autorizo. Passe-se apenas certidão do despacho, se isso for do interesse do professor.

Entendo que essa decisão violou o disposto no artigo 1.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho.

Constituindo tal parecer o fundamento do despacho de «Concordo» do director-geral de Pessoal, emanado sobre ele em 13 de Fevereiro de 1981 (e na sequência do qual o chefe de divisão terá, invocando subdelega-ção, emanado o despacho exoneratório de 16 de Abril de 1981), a Direcção-Geral de Pessoal não podia ter recusado a passagem da certidão pedida pelo queixoso.

10 — Nestes termos, tenho por bem efectuar a V. Ex/ a seguinte recomendação:

Que seja revogado o despacho de 16 de Abril de 1981, em que o chefe de divisão da Direcção-Geral de Pessoal exonerou o professor efectivo da Escola de Cepa, Fornos,.... por ter tomado posse de outro lugar.

Do seguimento dado a esta recomendação agradeço a V. Ex.a que me seja dado conhecimento.

11 — E não posso deixar de fazer reparo acerca da denegação da passagem de certidão requerida pelo interessado, recomendando também que, de futuro, assim não procedam os serviços desse departamento.

XJJOT1) Assunto: Posse. Exoneração

Processo n.° 81/R-2299-A-2

Ministro da Agricultura, Comércio e Pescas:

Em 20 de Novembro de 1981 foi presente neste Serviço uma reclamação cuja fotocópia se junta.

Solicitados esclarecimentos ao Gabinete de S. Ex.° o Secretário de Estado das Pescas, a coberto do seu

ofício n.° 3248, de 22 de Dezembro de 1981, foi por aquele Gabinete remetida «fotocópia do processo respeitante ao engenheiro...».

Sobre todos os elementos que constituem o processo deste Serviço quanto ao mesmo assunto foram emitidos informação e parecer do Ex.1"0 Provedor-Adjunto, cujas fotocópias junto igualmente. Do mesmo modo, e para mais fácil esclarecimento de V. Ex.a, se anexam fotocópias de todos os documentos para que naquela informação se remete.

Com apoio nos fundamentos da informação e do parecer emitidos neste Serviço e cujas cópias seguem anexas e a que dou a minha concordância, no uso da competência que a lei me atribui, permito-me dirigir a V. Ex.a a seguinte recomendação:

1) Que se digne revogar (anulação graciosa) o

despacho de V. Ex.a de 6 de Novembro de 1981 (publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 31, de 6 de Fevereiro de 1982, p. 980), pelo qual foi, por sua vez, revogado, por conveniência de serviço, o despacho datado de 30 de Julho de 1981 (publicado no Diário da República, 2." série, de 1 de Outubro de 1981), que nomeava o engenheiro agrónomo ... chefe de divisão da Direcção-Geral da Administração das Pescas, visto que:

a) A aceitar-se a doutrina de que a no-

meação daquele engenheiro como chefe de divisão confere imediatamente a qualidade jurídica de funcionário, pelo que aquele acto administrativo ficou sujeito ao regime dos actos constitutivos de direitos, o despacho de V. Ex." de 6 de Novembro de 1981 seria ilegal, por ter fundamento em «conveniência de serviço», quando os actos constitutivos de direitos só podem ser revogados com fundamento em ilegalidade;

b) A perfilhar-se o entendimento de a

nomeação do reclamante constituir acto discricionário, só tornado constitutivo de direitos após a posse, o despacho de 6 de Novembro de 1981 será, da mesma forma, ilegal, porque a conveniência de serviço que lhe serve de fundamento se apoia em pressupostos de facto que não correspondem à realidade, e, por isso, juridicamente irrelevantes;

c) De qualquer modo, se a nomeação

para o lugar em causa é um acto discricionário, já a eventual cessação da respectiva comissão o não é, não podendo operar-se por mera conveniência de serviço, mas apenas nos casos taxativamente previsto na lei.

2) Que, voltando a vigorar desde a data da sua

publicação no Diário da República, 2.a série, de 1 de Outubro de 1981, o despacho

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de nomeação do Sr. ... como chefe de divisão da Direcção-Geral da Administração das Pescas, logo que seja revogado o despacho que revogou tal provimento, se determine, no próprio acto que opere tal revogação, que se dê imediatamente posse ao reclamante do cargo de chefe de divisão da Direcção-Geral da Administração das Pescas, que não chegou a ocupar oportunamente por facto imputável à Administração.

Essa posse deve retroagir, para todos os efeitos legais, a 29 de Outubro de 1981, última data em que o Sr. .... no seguimento da carta que em 28 de Outubro de 1981 dirigiu ao Sr. Director-Geral da Administração das Pescas, se apresentou para tomar posse, que, ilegalmente, lhe foi recusada pelo referido director-geral.

Solicito a V. Ex.3 que oportunamente me sejam comunicados a decisão e o seguimento que o assunto venha a ter.

XXXVII) Assunto: Quadro. Alteração

Processo n.° 807R-853-A-2

Ministro da justiça:

1—Em 16 de Maio de 1980 foi entregue neste Serviço uma reclamação cuja fotocópia, bem como dos documentos que lhe são anexos, se junta.

2 — Em 23 de Outubro de 1980 foi dirigido ao então Secretário de Estado da Reforma Administrativa o ofício n.° 11 770, cuja fotocópia se junta igualmente, tendo a 8 de Abril de 1981 recebido, em resposta, o ofício n.ü 2474, cuja fotocópia, bem como dos documentos anexos, se junta também.

3 — Nesta data dirigi a V. Ex.a, como titular da pasta da Reforma Administrativa, o ofício cuja cópia remeto igualmente para mais fácil elucidação.

Considerando, porém, a conveniência em resolver de imediato a questão posta na reclamação em referência e reportada à situação dos técnicos auxiliares do Centro de Identificação Civil e Criminal, dentro do actualmente possível e sem prejuízo da eventual reestruturação genérica da carreira técnico-auxiliar, conforme sugerido no referido ofício desta mesma data, permito-me, no uso da competência que a lei me confere, formular a seguinte recomendação:

a) Atendendo a que a categoria de 3.° classe do pessoal de funções técnicas, e, em geral, não só nas carreiras técnicas como nas restantes, reestruturadas pelos Decretos-Leis n.os 191-C/79, de 25 de Junho, e 377/79. de 13 de Setembro, está extinta, que seja alterado o quadro de pessoal do Centro de Identificação Civil e Criminal, anexo ao Decreto-Lei n.° 63/76, dc 24 de Janeiro, relativamente ao pessoal técnico--auxiliar, sendo extinta a categoria de técnico auxiliar de 3.a classe e criados naquele quadro tantos lugares de técnico auxiliar de 2.a classe quantos os lugares de técnico auxiliar de 3.a classe extintos.

b) Atendendo a que o citado quadro de pessoal não prevê na carreira técnico-auxiliar lugares na categoria de técnico auxiliar principal (letra J) — topo da car-

reira técnico-auxiliar—, o que tem vindo a impedir os funcionários nela inseridos de poderem ter acesso àquela categoria, quando tenham os requisitos necessários, com manifesto e injusto prejuízo para a sua normal progressão na carreira, que sejam criados no quadro de pessoal do Centro de Identificação Civil e Criminal lugares de técnico auxiliar principal.

c) A semelhança do estabelecido para os titulares das categorias de 3.a classe das várias carreiras reestruturadas pelos Decretos-Leis n.°5 191-C/79, de 25 de (unho, e 377/79, de 13 de Setembro, seja introduzida no diploma orgânico do Centro de Identificação Civil e Criminal disposição que estabeleça a transição automática dos actuais titulares, a qualquer título, no Centro de Identificação Civil e Criminal, da categoria de técnico auxiliar de 3.a classe para a categoria de técnico auxiliar de 2.a classe.

Solicito a V. Ex.a que oportunamente me sejam comunicados a decisão e o seguimento que venham a merecer as recomendações que tenho a honra de lhe dirigir.

XXXVIII) Assunto: Reforma. Junta médica

Processo n.° 82/IP-86-B-1

Secretário de Estado da Reforma Administrativa:

1 — Reclamações recebidas neste Serviço, das quais se consideram paradigmáticas as que a seguir se juntam, tornam clara a imperfeição do processo de reforma dos funcionários públicos quando ela resulta de deliberação de junta médica.

2 — Se o funcionário submetido à junta médica está já afastado do serviço e com parte de doente, a solução legal poderá estar adequada.

O mesmo não acontecerá, porém, nos casos das reclamações em que os submetidos à junta médica continuem ao serviço até lhes ser comunicado o resultado.

3 — Nas demais hipóteses de reforma, o momento do desligamento é bem determinado, por um despacho comunicado ao interessado e publicado, ou por uma data previamente conhecida (a do limite de idade).

Com a reforma por invalidez, a situação é diferente para os funcionários que vão à junta médica e continuam a trabalhar até lhes ser comunicada a deliberação final.

Não podem abandonar o serviço sem conhecerem o veredicto médico, nem podem usufruir os «benefícios» a que, como funcionários do activo, têm direito, porque, a posteriori, são desligados a partir de um momento anterior.

Bastará referir que, se entretanto tiver lugar uma alteração da tabela remuneratória, de nada lhes servirá a melhoria, porque a pensão provisória que vai substituir a remuneração a repor é inferior, e a pensão definitiva terá também como base a anterior remuneração [cf. o n.° 1, alínea b), do artigo 43.° e o n.° 2, alínea a), do artigo 37." do Estatuto da Aposentação].

4 — As verdadeiras situações de «trabalho forçado» que poderão configurar-se estão patentes nas queixas anexas.

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No caso do processo n.° 81/R-2510, a auxiliar de limpeza teve de repor a remuneração de mais de um mês para receber a pensão de aposentação que por lei lhe pertence, o que significa que trabalhou como aposentada, ou sem remuneração, durante esse tempo (a pensão não é acumulável com a retribuição).

No processo n.° 81/R-248, o ajudante de notário esteve ao serviço 10 meses, foi-lhe aumentado, entretanto, o vencimento, mas a reforma baseou-se na tabela anterior, o que significa que a situação acima descrita se manteve durante quase um ano!

5 — Se bem que uma interpretação (possível ou correcta) dos preceitos legais citados pudesse apontar para que o conhecimento da deliberação da junta médica prevalecesse sobre o momento da sua realização — e será de ter em conta a eventualidade de vários exames complementares requisitados—, é facto que a prática administrativa considera pacífica e unanimemente que a data da junta médica marca o limite da actividade do funcionário e define a lei aplicável a todo o processo por invalidez.

Assim, e em franca oposição às restantes alíneas do artigo 43.° do Estatuto da Aposentação, a alínea o) será reportada a um facto, e não a um despacho, se se considerar o exame médico, e não a deliberação dele decorrente.

No entanto, mesmo a relevar o acto da deliberação ou o da homologação do parecer, quando exigido por lei, a situação de indefinição subsistirá enquanto não for publicada, ou dada a conhecer ao interessado, a decisão final.

Até lá —e repetindo—, continuará em serviço activo, com os direitos e deveres inerentes aos funcionários que não estão na disponibilidade, mas posteriormente são-lhe retirados os primeiros, com efeitos retroactivos, já que os segundos se pressupõem cumpridos, se não foi punido disciplinarmente.

6 — Em face destas reflexões sobre a aplicação dos preceitos do Estatuto da Aposentação referentes à aposentação por invalidez, permito-me formular a seguinte recomendação:

a) Que venha a ser publicado despacho norma-

tivo alterando a prática seguida e obrigando à publicação das deliberações da junta médica, nos termos exigidos para o despacho de desligação, produzindo-se os respectivos efeitos a partir da data dessa publicação; ou

b) Que venham a ser alterados os preceitos legais

de modo que se tornem impossíveis situações como as que se descreveram, nomeadamente pela publicação de despacho de desligação do serviço, seja qual for o fundamento da reforma.

7 — Agradece-se que seja comunicado o seguimento que for dado a este assunto.

XXXIX) Assunto: Rendas vitalícias

Processo n.° 81/H-1781-A-3

Ministro das Finanças e do Plano:

1 — Foi apresentada neste Serviço uma reclamação subscrita por..., referindo a mesma receber uma renda vitalícia de importância diminuta, quantia que durante

os últimos anos não tem sido actualizada, nem de longe, com o aumento do custo de vida.

2 — Ouvida sobre o assunto a Junta do Crédito Público, foi recebida a informação constante do ofício n.° 16 534, cuja fotocópia junto, em que se salientava que o Governo, através do Despacho Normativo n.° 47-C/77, de 28 de Fevereiro, do então Ministro das Finanças, procedeu a um reajustamento das rendas vitalícias, tendo em consideração a desvalorização que recairá nas importâncias auferidas trimestralmente pelos detentores daquelas rendas.

3 — Nesta conformidade, considero dever formular a V. Ex." a seguinte recomendação:

Tendo em conta o tempo decorrido desde o último reajustamento (mais de 5 anos);

Sendo certo que durante tal período a inflação provocou no custo de vida aumentos que totalizaram mais de 100%;

Tendo em atenção que, na generalidade, os ren-distas são pessoas de idade avançada e de recursos assaz limitados:

Muito embora sabendo que o Governo não é obrigado a fazê-lo, recomendo que, na medida em que as disponibilidades o permitam, se proceda, com a urgência possível, a novo reajustamento dos quantitativos das rendas em causa.

Solicito a V. Ex.° que se digne promover no sentido de me ser transmitido qual o seguimento que venha a ter a presente recomendação.

XL) Assunto: Responsabilidade civil Processo n.° 80/R-15B3-fcW

Presidente da Câmara Municipal do Porto:

Acuso a recepção do ofício acima referenciado, em relação ao qual será de ponderar o seguinte:

Independentemente da posição assumida pelos serviços autárquicos na informação n.° 148/72, de 8 de Junho de 1972, acerca do problema então exposto pelo Sr. A — e cuja decisão judicial o Município diz aguardar para resolução do assunto versado na reclamação ulteriormente apresentada pelo Sr. B —, cumprirá não esquecer que na situação agora em causa concorrem condicionalismos que a mencionada informação não revela que também existissem no problema primeiramente indicado.

Com efeito, o Sr. B apresentou ura documento, emanado do Instituto Geográfico da Universidade do Porto, no qual se referia expressamente que no dia e na hora em que se verificou a queda do ramo da árvore a que alude o processo a velocidade do vento era de 28 km/hora; esse valor não corresponderá certamente a uma rajada de vento forte e, por isso, não se compreende o fundamento em que a Direcção dos Serviços de Obras dessa Câmara Municipal baseou a sua alusão abstracta a «qualquer rajada de vento forte».

Por outro lado, o interessado apresentou igualmente ofícios, emanados também da Direcção Regional de Entre Douro e Minho, nos quais se documentava que a árvore em referência estava atacada de fungos causadores de podridão. E as fotografias tiradas pelo impetrante à citada árvore inculcam que o mau es-

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tado sanitário em que ela se encontrava era exteriormente perceptível em algumas zonas — também a aludida Direcção Regional declarou que frutificações dos fungos haviam sido observadas em partes de ramos mortos.

Acresce que a própria Direcção dos Serviços de Obras do Município admitiu o «peso da grande quantidade de frutos que a árvore tinha» como uma das causas da queda do ramo mencionado no processo em estudo. E tal facto também não era insusceptível de oportuno conhecimento por parte dos serviços autárquicos.

Assim, não se considera legítimo o paralelismo estabelecido entre o problema agora em causa e aquele outro cuja discussão está a correr os seus termos, para sc tornar dependente da respectiva decisão a resolução do assunto exposto pelo Sr. B.

Na realidade, e tanto quanto se poderá deduzir da invocação da informação n.° 148/72, não estava documentada no processo respeitante ao Sr. A a velocidade do vento que soprava na altura da queda do ramo da árvore a que ludia a sua exposição, nem o mau estado sanitário da mesma árvore, nem ainda a existência de peso provocado por grande quantidade de frutos nela existentes, ao contrário daquilo que se verifica suceder na hipótese actualmente em foco.

Face ao que antecede, justificado se entende, pois, que sejam pagos ao impetrante os prejuízos que lhe advieram da queda do ramo da árvore citada na sua reclamação, face aos condicionalismos concretos alegados e documentados no respectivo processo, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, recomendo a essa Câmara Municipal que diligencie no sentido da resolução do problema em apreço pela forma descrita.

Do seguimento que venha a ser dado à recomendação acima formulada agradeço a V. Ex.a que seja dado conhecimento a este Serviço.

XLI) Assunto: Responsabilidade civil Processo n.° 81/R-1799-B-1

Secretário de Estado da Saúde:

1 — ... apresentou-me uma exposição em que relata um acidente de enfermagem sofrido por sua filha

na altura com 15 meses de idade, que ocorreu cerca da 1 hora do dia 1 de Agosto de 1980 no Hospital de D. Estefânia, em Lisboa, em que foi interveniente a enfermeira ... e donde resultou o corte da falangeta do 5.° dedo da mão esquerda da criança.

2 — Do processo de inquérito n.° 14/1/80, instaurado pelo Hospital, é possível concluir o seguinte:

2.1 — O instrutor ouviu várias entidades sobre a ocorrência —o director interino dos serviços, o clínico mais graduado da sala, o clínico que procedeu a investigações sumárias sobre o acidente, os clínicos que intervieram no tratamento da menor, os enfermeiros que, em diferentes qualidades, exerceram superintendência sobre a tarefa em causa e a enfermeira ligada ao acidente.

2.2 — No processo ficou provada a ocorrência constante da participação: que no dia e local já referidos, estando a criança a receber soro endovenoso, e porque

a mão estivesse edemaciada e envolta em grande quantidade de compressas e adesivos, a enfermeira para mudar a posição da agulha, cortou o adesivo que estava junto à tala da mão, tendo cortado também a falangeta do 5.° dedo da mão esquerda da menina.

2.3 — No processo ficou igualmente provada a deficiência de execução da operação de enfermagem; no entanto, pelas declarações das várias testemunhas, que acentuaram as deficientes condições da sala (má iluminação, más condições materiais, deficiência do material utilizado), o excessivo número de crianças a assistir (uma média de 50/60 crianças com doenças de tipo infecto-contagioso, a maioria a receber soro), a insuficiência do pessoal disponível no período nocturno (2 enfermeiras por sala), donde resultava uma excessiva rapidez com que as tarefas tinham de ser executadas (excessiva rapidez em relação ao tempo necessário e teoricamente recomendável), o instrutor concluiu pela inexigibilidade de diferente comportamento e pela isenção de responsabilidade disciplinar da funcionária; o processo foi mandado arquivar por despacho de 13 de Março de 1981 do conselho de gerência do Hospital de D. Estefânia.

3 — Nestes termos, ao abrigo do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, entendo dirigir a V. Ex." as seguintes recomendações:

1." Que, no âmbito da sua competência tutelar sobre os Hospitais Civis de Lisboa, providencie no sentido de estes assumirem voluntariamente e por acordo com o interessado a obrigação de o indemnizarem pelos danos causados na menor;

2.° Que, no âmbito da mesma competência tutelar sobre os mesmos Hospitais, se providencie no sentido de serem ultrapassados os con-cionalismos concretos do precário funcionamento dos serviços de enfermagem do Hospital de D. Estefânia — devido a más condições de instalação e iluminação, excesso de doentes e falta de pessoal —, que estarão na origem ou constituíram causa do acidente (nexo causal).

4 — Agradeço a V. Ex.° que me seja dado conhecimento do seguimento dado ao que se deixa recomendado.

XUI) Assunto: Rusgas policiais

Processos n.os 8VIP-84-B-J e 82/R-53-B-1

Comandante-geral da Policia de Segurança Pública:

1 — Em referência ao transmitido no ofício do chefe de estado-maior dessa Polícia n.° 1608, de 18 de Fevereiro do corrente ano, informo V. Ex." de que se me afigura que as operações de rusga que incidam sobre particulares e não suspeitos, para além de constituírem, na realidade, vexame social para os visados, quando inocentes, põem em causa direitos fundamentais dos cidadãos como tal consignados na Constituição da República, e o próprio regime constitucional aplicável ao exercício de medidas de polícia, as quais, nos termos do n.° 2 do seu artigo 272.°, não devem ser utilizadas para além do estritamente necessário.

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2 — Em face do exposto, permito-me formular a V. Ex.a. no uso da faculdade concedida pelo artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:

Que, enquanto não for alterada a legislação policial em vigor, sejam emanadas instruções às entidades policiais no sentido de se especificar que as operações de rusga não deverão envolver quaisquer pessoas que imediatamente se identifiquem devidamente, mas somente aquelas sobre quem recaiam fortes suspeitas fundadas de haverem cometido delitos ou de os estarem preparando.

3 — Comunico a V. Ex." que do teor deste ofício fq)i dado conhecimento a S. Ex.a o Ministro da Administração Interna.

XLill) Assunto: SNAPA. Inquérito parlamentar

Processo n.° 81/R-1432-A-3

Presidente da Comissão Parlamentar de Agricultura e Pescas:

Os representantes dos trabalhadores das empresas nacionalizadas de pesca manifestaram-me já há cerca de um ano a sua preocupação pela situação no sector e, em particular, na SNAPA, cujo agravamento se vinha consubstanciando na tentativa de venda da frota pesqueira, sem suficiente salvaguarda dos postos de trabalho, no crescente endividamento e, por último, no arresto de 6 navios por ordem de um tribunal estrangeiro para possibilitar o reembolso pelos credores estrangeiros de dívidas da empresa. De todos estes tristes episódios, bem como de acusações de corrupção e contrabando, que, a confirmarem-se, são de certo gravíssimas, foi a opinião pública sendo informada pela comunicação social.

Finalmente, a SNAPA foi extinta pelo Decreto-Lei n." 161/82, de 7 de Maio. As avultadíssimas quantias que o Estado (portanto os Portugueses) concedeu à SNAPA perderam-se. Não estamos, porém, perante um desastre natural, mas sim em face de comportamentos humanos. E onde há actos —ou omissões — negligentes há a possibilidade de apurar responsabilidades. Entendo que, em defesa da democracia e da dignidade do Estado, se torna essencial conhecer a verdade. Para tanto, permito-me sugerir a V. Ex.° que essa Comissão, se assim o entender, tome a iniciativa de propor à Assembleia, nos termos da alínea b) do artigo 219.° do Regulamento, a instauração de um inquérito parlamentar à actuação do conselho de gerência da ex-SNAPA e do Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas.

Tomo a liberdade de juntar cópia de alguns elementos em meu poder.

CAPITULO V

Apreciação na especialidade de alguns processos concluídos em 1982

Administração da justiça

Processo n.° 82/R-1151-B-1

Sumário — Administração da Justiça. Acesso ao direito. Arguidos estrangeiros. Intérprete.

Objecto — Julgamento realizado por tribunais portugueses em que não teria sido respeitado o disposto no § 3." do artigo 6." da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Decisão — Reclamação improcedente.

Síntese:

1 — Um recluso estrangeiro apresentou ao Provedor de Justiça uma exposição em que se queixava de o tribunal em que fora julgado e de a administração penitenciária não terem dado cumprimento ao disposto no § 3." do artigo 6.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (aprovada para ratificação pela Lei n.° 65/78, de 13 de Outubro), que exige a tradução em língua conhecida pelo acusado da natureza e causa da acusação contra ele formulada.

2 — Através do Conselho Superior da Magistratura foi ouvido o juiz do tribunal visado, que informou ter o réu prescindido da tradução, por recusa em aceitar o intérprete nomeado para o efeito; o aspecto da tradução teria já sido apreciado em tribunal de recurso, o qual, por decisão já transitada em julgado, teria confirmado a decisão do tribunal inferior.

Por outro lado, a administração penitenciária provou a recusa da aceitação do intérprete nomeado, juntando o auto de nomeação do intérprete designado e certidão do acto de recusa do reclamante, comprovado por 2 testemunhas e pelo intérprete.

3 — Analisado o assunto, concluiu-se pela impossibilidade de intervenção do Provedor de Justiça, por se tratar de questão afecta aos tribunais, tendo-se, contudo, aconselhado o reclamante, se assim o entendesse, a apresentar a questão à Comissão Europeia dos Direitos do Homem, nos termos do artigo 26." da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Processo n.° 82/R-205-B-1

Sumário — Administração da justiça. Jurisdição.

Objecto — Audição de intervenientes em processo crime fora da área da comarca da sua residência.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Um cidadão residente na comarca de Alenquer queixou-se pelo facto de o juiz de instrução criminal de Vila Franca de Xira, cuja área de jurisdição abrange aquela comarca, estar a convocar para se apresentarem nesta última localidade os intervenientes em processos crimes pendentes no Tribunal de Alenquer, com o fim de serem ouvidos na instrução desses processos.

Esta actuação causaria graves transtornos aos interessados, forçados a deslocações longas, por vezes até infrutíferas, devido ao adiamento de algumas das diligências marcadas.

2 — Confirmada a situação, o Provedor ponderou que, dé facto, legalmente, a área de jurisdição do juiz de instrução de Vila Franca de Xira compreendia a comarca de Alenquer.

Mas afigurou-se que era menos adequado, designadamente em relação aos intervenientes em processos

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que viriam a ser julgados em Alenquer, forçar os residentes nesta comarca a deslocarem-se à sede do juízo de instrução criminal para serem ouvidos.

3 — Expôs, por isso, o assunto ao Conselho Superior da Magistratura. Ouvido, através deste órgão, o juiz de instrução de Vila Franca de Xira, este informou que aquela actuação correspondia à prática que encontrara estabelecida pelo seu antecessor.

Reconhecia, porém, que a mesma causava incómodos, por vezes pesados, às partes e testemunhas a serem ouvidas nos processos da comarca de Alenquer.

Decidiu, pois, passar a deslocar-se ele, juiz de instrução, a Alenquer, para audição das pessoas residentes na área da respectiva comarca.

3 — Obtida a modificação da situação em termos tidos por ajustados, encerrou-se o processo.

Processo n." 81/R-2525-B-1

Sumário — Administração da justiça. Processo contencioso. Prazo.

Objecto — Atraso na remessa ao Supremo Tribunal Administrativo, pelos Ministérios da Administração Interna e da Justiça, de recurso, entregue em 10 de Abril de 1981 na Secretaria-Geral do primeiro departamento, de despacho conjunto dos respectivos Ministros.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — Um indivíduo, cujo pedido de conservação da nacionalidade fora recusado por despacho conjunto dos Ministros da Justiça e da Administração Interna, queixou-se ao Provedor de Justiça, em 16 de Dezembro de 1981, pelo facto de não lhe ter sido notificada a subida do processo de recurso que entregara na Secretaria-Geral do MA1 em 10 de Abril de 1981, sabido que a lei confere à entidade recorrida o prazo de 30 dias para remeter o processo ao Supremo Tribunal Administrativo (artigo 2.°, n.° 2, do Decretc-Lei n.° 256-A/77).

2 — Ouvidos os departamentos visados, verificou-se que:

a) O recurso interposto pelo queixoso apenas fora

remetido ao Ministério da Justiça em 26 de Maio de 1981;

b) O recorrente viria a ser notificado da subida

do processo somente em Abril de 1982, ou seja, volvido um ano sobre a data da interposição do recurso;

c) Os dois departamentos visados devolviam reci-

procamente a responsabilidade pelo atraso verificado.

3 — O n.° 2 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 256-A/ 77 fixa à entidade recorrida o prazo de 30 dias para fazer subir o processo ao Supremo Tribunal Administrativo. Significa isto que o mesmo deveria ter sido remetido ao Supremo Tribunal Administrativo até 11 de Maio de 1981.

4 — Em virtude de a situação descrita traduzir frontal desrespeito pela legislação vigente em matéria de subida de recursos, manifestamente lesivo dos direitos e interesses do administrado, não obstante a sujeição

da Administração aos princípios da legalidade c da imparcialidade (artigo 257.° da Constituição da República), o Provedor de Justiça recomendou que aos serviços competentes dos departamentos envolvidos fossem dadas instruções no sentido do rigoroso cumprimento do prazo estabelecido no n.° 2 do artigo 2." do Decreto-Lei n.° 256-A/77.

5 — O Provedor de Justiça ordenou o arquivamento do processo ao receber dos Ministérios em causa comunicação aceitando a responsabilidade pela demora ocorrida e comunicando que fora chamada a atenção dos serviços para se evitarem, no futuro, situações similares.

Administração local

Processo n.° 81/R-466-fcM

Sumário — Administração local. Domínio público municipal. Alienação de terreno.

Objecto — Demora na concretização da alienação de uma parcela de terreno pertencente a um antigo caminho público.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a Câmara Municipal da Mealhada, alegando o seguinte:

Em 1978 o impetrante requerera à citada Câmara Municipal a cedência de uma parcela de terreno pertencente a um antigo caminho público situada junto a uma propriedade que lhe pertencia. E, decorridos os necessários trâmites legais, o referido órgão autárquico deliberara deferir a pretensão do interessado em 1980.

Todavia, sem embargo do dilatado lapso de tempo desde então decorrido e mau grado as várias diligências que o reclamante efectuara junto da Câmara Municipal da Mealhada com vista à concretização da alienação daquela parcela de terreno, o assunto ainda não fora solucionado, sem que o interessado conhecesse as razões desse facto.

2 — Para adequada apreciação do problema solicitou o Serviço do Provedor de Justiça à mencionada Câmara Municipal os elementos considerados úteis a propósito do assunto, tendo recebido, em resposta, o esclarecimento de que a concretização da pretensão do reclamante estava a aguardar a conclusão do processo de desafectação da questionada parcela de terreno do domínio público — processo esse que ainda se achava em curso.

3 — E, havendo sido solicitado ulteriormente ao citado órgão autárquico esclarecimento complementar acerca da posição do problema pendente, visto o interessado ter alegado que o seu requerimento já fora deferido em 1980, e na sequência dos necessários trâmites legais, veio a receber-se a informação de que, em seguimento das deliherações anteriormente tomadas a propósito do assunto, bem como das diligências ultimamente realizadas com vista à sua resolução, a Câmara Municipal da Mealhada, por deliberação de 16 de Novembro de 1981, resolvera deferir definitivamente a pretensão do requerente.

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4 — Encontrando-se solucionada, pois, a questão suscitada no processo, procedeu-se ao respectivo arquivamento.

Processo n.° 8Q/R-22B4-B-4

Sumário — Administração local. Passagem de certidões.

Objecto — Atraso na passagem de certidão. Inexistência de prazo para a passagem. Falta de sanções adequadas.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Recomendação aceite. Síntese:

1 — Reclama-se contra o atraso na passagem de uma certidão por parte da Câmara Municipal de Matosinhos relativa a um processo de loteamento.

2 — Apreciado o caso, concluiu-se que, embora a lei preveja sanções disciplinares para os funcionários que não passarem nos prazos legais, sem justificação, as certidões que lhes sejam requeridas [cf. Estatuto Disciplinar, artigo 23.°, n.° 1.°, alínea e)], a verdade é que não há prazo algum estabelecido na lei para a passagem de certidões que não sejam das actas, e, ainda que a passagem de outras certidões dependa de despacho dos presidentes das câmaras (cf. Código Administrativo, artigo 137.°, n.° 3.°), a verdade é que, negligenciando estes, propositadamente ou não, o despacho dos requerimentos respectivos, não existe meio algum para obter as certidões, salvo recurso contencioso. No domínio da Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro (artigo 105.°), desapareceu a responsabilidade penal que o Código Administrativo previa no artigo 355.°, § 3.u, para a recusa ou simples retardamento na passagem de certidões das actas das reuniões dos corpos administrativos.

3 — No caso corrente, a certidão requerida veio, depois de várias insistências deste Serviço, a ser. passada ao reclamante.

4 — Por seu turno, a Secretaria de Estado da Administração Regional e Local aceitou a recomendação do Provedor no sentido de serem legislativamente supridos os inconvenientes derivados da revogação do § 3.° do artigo 355.° do Código Administrativo pela referida lei, sem que norma correspondente viesse impor a sanção prevista naquela disposição legal.

A Secretaria de Estado indicou que iria tomar essa recomendação em consideração aquando da revisão da Lei n.° 79/77.

Administração Pública

Processo n.° 81/R-1284-A-2

Sumário — Administração Pública. Inquérito. Objecto — Falta de seguimento dado às conclusões

de inquérito à gestão do refeitório do pessoal do

Matadouro de Aveiro. Decisão — Reclamação procedente. Reparo. Síntese:

1 — O delegado da Junta Nacional dos Produtos Pecuários de Aveiro designara em Outubro de 1977

uma comissão composta de funcionários do Matadouro dessa cidade para proceder a uma inspecção às contas da gerência do respectivo refeitório, que apresentava défice e sobre a qual haviam surgido várias reclamações.

Essa comissão não pôde apreciar com rigor as contas em questão, por escassez de documentação relativa às receitas e despesas dos anos de 1976 e 1977.

Mas concluíra por propor que o gerente pagasse as dívidas respeitantes ao período em que estivera em funções e que se chamasse a atenção pela má aplicação dos subsídios de refeição pagos pela Junta para funcionamento do refeitório.

Como desconhecesse o efectivo seguimento dado a essas conclusões, um dos membros da aludida comissão pediu a intervenção do Provedor de Justiça.

2 — Ouvida a Junta, esta comunicou que o gerente do refeitório já fora obrigado a pagar o saldo devedor encontrado.

Mas não lhe fora levantado qualquer processo disciplinar, por um lado, porque a comissão de inquérito o não propusera e, por outro, porque esse elemento, embora funcionário da Junta, não geria nessa qualidade o refeitório, que funcionava com autonomia em relação a essa instituição.

3 — Esta argumentação não parecera completamente aceitável. De facto, não só estava em causa a má aplicação de dinheiros públicos —os subsídios de refeição atribuídos pela Junta para pagamento ao refeitório —, como o facto de este funcionar, na prática, sob a égide dessa entidade se revelava no facto de ter sido um seu delegado a ordenar o inquérito à respectiva gestão.

4 — Por isso, o Provedor formulou um reparo ò junta no sentido de, em casos análogos, designar um jurista para proceder a inquéritos deste tipo (ou, pelo menos, para participar em comissão que deles fosse encarregada), com vista a que não deixasse de ser suscitada a apreciação das eventuais responsabilidades disciplinares ou criminais detectadas.

•Agricultura

Processo n.° 82/R-2223-A-2

Sumário — Agricultura. Subsídio de electrificação agrícola.

Objecto — Demora no pagamento de subsídio de electrificação agrícola concedido. Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

1 — Em nome de um agricultor, analfabeto, de 73 anos, foi apresentada em 17 de Novembro de 1982 uma reclamação fundada na inexecução do despacho de 14 de Outubro de 1980 do Secretário de Estado de Energia e Minas (Diário da República, 2.a série, n° 254, de 3 de Novembro de 1980), que àquele atribuíra, ao abrigo do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto--Lei n.° 48 337, de 17 de Abril de 1968, uma comparticipação do Estado de 158 400$ para a realização de trabalhos de electrificação agrícola.

As obras haviam sido concluídas um ano antes do termo do prazo para o efeito fixado no mencionado despacho.

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2 — Em face do exposto, o Provedor de Justiça abordou a Secretaria de Estado da Energia, chamando a atenção, por um lado, para o tempo já decorrido sobre a conclusão dos trabalhos e, por outro, para o efeito constitutivo de direitos do despacho em causa.

3 — Em resposta, informou aquela Secretaria de Estado que em 18 de Janeiro de 1981 comunicara ao reclamante estar o subsídio à sua disposição.

Em face desta informação, arquivou-se o respectivo processo.

Comércio eiterno

Processo n.° 81/R-1885-A-2

Sumário — Comércio externo. Desalfandegamento de veículo. Taxa de estada em estância aduaneira.

Objecto — Desembaraço aduaneiro na Alfândega de Lisboa de motociclo de desalojado das ex-colónias com dispensa de pagamento da taxa de estada.

Decisão — Reclamação improcedente. Recomendação c reparo quanto a procedimento futuro.

Síntese:

1 — Um desalojado das ex-colónias apresentou queixa ao Provedor de Justiça alegando que na Alfândega de Lisboa vira recusado, inicialmente, pedido de abertura de processo para desalfandegar um motociclo por ele adquirido em Angola em 23 de Setembro de 1975, antes de obtido o indispensável boletim de registo de importação, bem como o de isenção de pagamento da taxa de estada.

2 — Ouvida a Alfândega de Lisboa, a mesma prestou a seguinte declaração:

a) A legalização do veículo teria sido demorada

devido à falta de documentos que atestassem ser ele propriedade do requerente;

b) Com a publicação do Decreto-Lei n.° 455/80,

de 9 de Outubro, fora possível desbloquear a situação, podendo então a Alfândega de Lisboa recorrer à prova testemunhal para comprovação da propriedade;

c) A atribuição do boletim de registo de impor-

tação, documento indispensável para o respectivo despacho, era da competência da Direcção-Geral do Comércio Externo;

d) O pagamento da taxa de estada é exigido,

conforme despacho de 9 de Outubro de 1979 do Secretário de Estado do Orçamento, publicado na circular n.° 242/79, série n, do Gabinete de Estudos da Direcção-Geral das Alfândegas.

3 — O problema foi colocado a Direcção-Geral das Alfândegas, nos seguintes moldes:

a) Do Despacho Normativo n.° 287/79, de 15 de Setembro, e da circular antes citada parece resultar o intuito de conceder a isenção do pagamento da taxa de estada desde que o interessado apresente em devido tempo pedido de legalização do veículo à competente estância aduaneira, ficando para momento ulterior a questão da prova da propriedade do veículo;

b) A não se ter verificado negligência do interessado na apresentação do pedido da legalização do motociclo, justificar-se-ia a concessão da pretendida isenção.

4 — A Direcção-Geral das Alfândegas manifestou estranheza relativamente ao que foi afirmado pelo queixoso, alegando que:

a) Nos casos de falta de documentos, sempre

tem sido norma abrir processos sem boletim de registo de importação;

b) A Direcção-Geral do Comércio Externo só

emitiria aquele documento com base numa declaração das alfândegas que atestasse ter o veículo sido importado sem documentos;

c) Quanto à taxa de estada, a Alfândega de

Lisboa ter-se-ia limitado a dar cumprimento ao estipulado na circular n." 242/79 do Gabinete de Estudos da mesma Direcção--Geral.

5 — Do exame da documentação apresentada pelo queixoso e da análise da posição assumida pela Alfândega de Lisboa e pela Direcção-Geral das Alfândegas não se conseguiu confirmar a afirmação, produzida por aquele, de que lhe fora recusada aceitação do pedido para regularizar a situação do motociclo antes da alteração do correspondente boletim de registo de importação. Por isso, foi determinado o arquivamento do processo.

6 — O Provedor fez, porém, reparo pela circunstância de os factos verificados neste processo parecerem contradizer a afirmação da Direcção-Geral das Alfândegas indicada no n.° 4: na verdade, no caso presente, a Direcção-Geral do Comércio Externo terá mesmo concedido o boletim de registo de importação sem qualquer declaração da Alfândega de Lisboa.

Além disso —e sobretudo—, chamou a atenção para que a circular n.° 242/79, reproduzindo doutrina de uma decisão do Secretário de Estado do Orçamento com a natureza de despacho normativo, deveria ter sido publicada no Diário da República, nos termos do artigo 122.° da Constituição.

Com efeito, esse despacho estabelecera, genericamente, regras com incidência na esfera jurídica dos cidadãos, estranhas à Administração, ao definir os pressupostos de aplicação das taxas de estada c os modos possíveis de comprovação da propriedade sobre os veículos.

Processo n.° 81/R-2154-A-2

Sumário — Comércio externo. Desalfandegamento de veículo. *

Objecto — Regularização da situação aduaneira de veículo adquirido por um desalojado das ex-colónias na República da Africa do Sul.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida. Síntese:

1 — Um desalojado das ex-colónias queixou-se ao Provedor pelo facto de lhe ter sido apreendido pela Guarda Nacional Republicana, 3 meses depois de haver entrado no País, um veículo automóvel ligeiro por ele adquirido na República da África do Sul. Alegava

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ainda que, apesar de ter pago uma multa na Alfândega de Lisboa, devido a atrasos verificados na entrega da documentação que lhe fora exigida para o desalfandegamento do veículo em questão, acabara por ser surpreendido com a informação de que o mesmo tinha sido considerado perdido a favor da Fazenda Nacional.

2 — A Alfândega de Lisboa, ouvida a respeito das razões determinantes da alegada perda do veículo, veio informar que:

a) O veículo em questão fora objecto do processo fiscal n.° 2032/78 da 1." Auditoria junto dessa Alfândega, tendo o seu proprietário sido condenado por infracção fiscal e havendo pago a multa que lhe fora aplicada no referido processo;

6) A viatura não havia sido desalfandegada no prazo estabelecido no § único do artigo 8.° do Contencioso Aduaneiro, nem dentro dos prazos suplementares que lhe haviam sido concedidos, o último dos quais por despacho de 23 de Dezembro de 1980;

c) Em face desta situação, fora a viatura considerada abandonada a favor do Estado, com base nos Decretos-Leis n.05 27 908, de 30 de Julho de 1935, e 249/75, de 22 de Maio.

3 — Na sequência dessa informação, foi solicitado esclarecimento acerca da data em que terminara o prazo concedido ao queixoso, por despacho de 23 de Dezembro de 1980, para juntar os documentos em falta e da data em que os mesmos vieram a ser produzidos.

Pareceram, com efeito, relevantes as razões expostas pelo queixoso para explicar o atraso na apresentação dos documentos, razões essas relativas à dificuldade na obtenção de documentação originária das ex-coló-nias.

Por isso, afigurava-se excessivamente gravosa a sanção da perda do veículo em favor do Estado.

Em resposta, o director da Alfândega de Lisboa esclareceu que:

a) A contar do despacho de 23 de Dezembro de 1980 fora concedida ao requerente uma prorrogação do prazo por mais 90 dias e os documentos em falta foram apresentados a acompanhar requerimento datado de 5 de Junho de 1981;

6) O Secretário de Estado do Orçamento, por despacho de 8 de Abril de 1982, autorizara a legalização da viatura propriedade do reclamante, ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.° 455/80, pelo que a Alfândega procedera à regularização da situação aduaneira do veículo, ficando sem efeito a determinação de abandono do mesmo a favor da Fazenda Nacional.

4 — Em face de tal decisão, que satisfizera a pretensão do queixoso, o Provedor de Justiça mandou arquivar o processo.

Processo n.° 81/R-744-A-2

Sumário — Comércio externo. Importação de veículo sem dispêndio de divisas.

Objecto — Recusa a emigrante de licença para importação de veículo automóvel sem dispêndio de divisas.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação

aceite. Síntese:

1 — O queixoso protestara contra o indeferimento pe.o Banco de Portugal do seu pedido para importar, sem dispêndio de divisas, um veiculo automóvel ligeiro, alegando, para o efeito, ter perdido a qualidade de residente nacional, porquanto se ausentara para França, não só por motivos de estudo, como também, e fundamentalmente, para trabalhar, conforme resultaria da fotocópia de certidão passada pelo Consulado-Gera: de Portugal em 3ordéus, que acompanhava a reclamação.

2 — O Banco de Portugal defendia, perante a Direc-ção-Geral do Comércio Externo, do Ministério do Comércio e Turismo, o entendimento de que o reclamante não perdera a qualidade de residente nacional por se ter ausentado do território nacional por mais de um ano por motivos de estudos, louvando-se no n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 47 919, de 8 de Setembro de 1967, preceito que proíbe a importação temporária ou definitiva de veículos automóveis aos residentes nacionais.

3 — A lei vigente à data do pedido de importação em causa (artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 172/77, de 30 de Abril) considerava emigrante, do ponto de vista fiscal, o indivíduo de nacionalidade portuguesa que comprovasse, através de certificado consular ou outro documento equivalente em termos probatórios, a sua qualidade de produtivo no país donde procedesse com, pelo menos, 1 ano de efectividade. Aquele conceito foi aliás, ampliado pelos n.os 2 e 3 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 455/80, de 9 de Outubro, que revogou o Decreto-Lei n.° 172/77.

4 — Ora, o reclamante comprovara, através de certificado consular, ter entrado em França em 26 de Setembro de 1967 e haver trabalhado no período compreendido entre 30 de Janeiro de 1972 e 9 de Fevereiro de 1974. Reunia, por conseguinte, no entender deste Serviço, os pressupostos exigíveis para a concessão dos benefícios concedidos pelo Decreto-Lei n.° 172/77, muito embora pudesse ter-se ausentado do País sem perda inicial do estatuto de residente nacional, como pretendia o Banco de Portugal. De facto, a qualidade de produtivo em França no período acima indicado acabara por retirar ao Banco de Portugal a possibilidade de continuar a considerar o queixoso residente nacional, perante o regime estabelecido por lei (artigo 4° do Decreto-Lei n.° 172/77).

5 — Ao sobrevalorizar a situação do residente nacional, baseada na ausência do País por motivos de estudo, o Banco de Portugal estava, afinal, a desrespeitar o artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 172/77, uma vez que o reclamante passara, entretanto, a reunir os requisitos para ser tratado como emigrante.

6 — Em face do exposto, o Provedor de Justiça recomendou que o Banco de Portugal revisse a denegação da licença para importação de veículo automóvel ligeiro solicitada pelo queixoso, em virtude de este ter comprovado documentalmente a qualidade de emigrante, de acordo com o regime sucessivamente estabelecido pelos Decretos-Leis n.os 172/77 e 455/80, e de não ser, por conseguinte, aplicável à situação descrita o regime do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 47 919.

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0 Banco de Portugal aceitou esta recomendação, emitindo parecer favorável à importação do veículo em causa, face à ampliação do conceito de emigrante produtivo, determinada pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n." 455/80, considerado interpretativo, nesse aspecto, do Decreto-Lei n.° 172/77.

Comércio interno

Pro;esso n.° 81/R-1813-A-3

Sumário — Comércio interno. Vendas e prestações de serviços em restaurantes e cafés.

Objecto — Prática seguida em Portugal de não entrega de documento comprovativo de despesa relativamente a vendas e serviços prestados naqueles estabelecimentos.

Decisão — Reclamação improcedente. Síntese:

1 — Um oidadão português dirigiu-se ao Provedor de justiça chamando a atenção para o facto de muitos estabelecimentos que servem café, chá, bebidas e lanches não entregarem, aquando da efectivação do serviço, talão comprovativo da despesa, à semelhança do que acontece noutros países, o que favoreceria a exploração dos turistas, emigrantes e até residentes, que acabariam, às vezes, por pagar quantias muitíssimo superiores às devidas.

2 — Relativamente à questão exposta, verificou-se que, quanto aos estabelecimentos hoteleiros e restaurantes, nos termos do n.° 1 do artigo 221.° do Decreto--Lei n.° 61/70, de 24 de Fevereiro, é sempre obrigatória a passagem de documento do qual constem os serviços prestados e o respectivo preço.

O mesmo não acontece em relação aos cafés, cervejarias, casas de chá e bares, que no aludido diploma são englobados na rubrica geral «Estabelecimentos de bebidas», em que só serão passados documentos de despesa quando o cliente o solicite (v. n.° 2 do citado artigo 221.°).

3 — Assim, e dado que o estender-se a obrigatoriedade de passagem de documento a todo e qualquer consumo nos estabelecimentos de bebidas conduziria ao exagero de se passar documento até para despesas insignificantes (tal como para um simples café) e considerando a possibilidade de o documento em causa ser sempre obtido quando solicitado, o Provedor de fustiça concluiu não se justificar a sua intervenção no sentido da alteração do regime legal vigente.

Contrato de prestação de serviços

Processo n.° 76/R-948-B^

Sumário — Contrato de prestação de serviços. Rescisão. Prestações em dívida.

Objecto — Alegada ilegalidade na rescisão de contratos celebrados para a prestação de serviços de consultadoria técnica e urbanística a um município e para a elaboração de planos de urbanização de pormenor. Falta de pagamento de remunerações devidas ao reclamante com referência a trabalhos exe-

cutados e entregues ao município no âmbito daqueles contratos.

Decisão—Reclamação parcialmente improcedente, controvertida noutra parte e procedente na parte restante. Reparo. Recomendação não aceite.

Síntese:

1 — Um arquitecto dirigiu ao Provedor de Justiça reclamação contra o presidente e a comissão administrativa do Município de Viana do Castelo que haviam exercido funções após 25 de Abril de 1974, apontando certos factos que considerava irregulares e ofensivos dos seus interesses legítimos.

Entre esses factos mencionava a rescisão de contratos celebrados com o reclamante e relacionados com o exercício de funções de arquitecto consultor urbanista e com a elaboração dos planos de pormenor a norte da Escola Técnica e do Campo de jogos e a nascente do Bairro Jardim, com a alegação de que o interessado não rinha cumprido as determinações da comissão administrativa.

O queixoso alegava que com tais determinações se pretendia a urbanização de uma zona agrícola — o que era vedado por lei— e que ele cumprira sempre as suas obrigações para com o Município.

Em consequência de tal rescisão, não havia sido efectuado o pagamento total das remunerações estipuladas, as quais ainda se achavam em dívida.

2 — O Serviço do Provedor da Justiça solicitou à Câmara Municipal de Viana do Castelo que esclarecesse a sua posição sobre o caso, e bem assim que indicasse se entendia efectuar brevemente o pagamento das remunerações que teriam ficado em dívida ao reclamante, bem como se pensava, por qualquer forma, e se disso fosse caso, rever a resolução anteriormente (ornada pela comissão administrativa do Município acerca da rescisão dos contratos oportunamente celebrados coro o interessado.

Em resposta, a Câmara Municipal remeteu cópia da deliberação tomada pela comissão administrativa do Município de Viana do Castelo em 4 de Dezembro de 1976, pela qual havia sido resolvido não renovar o contrato respeitante à prestação de serviços de arquitecto consultor urbanista do mesmo município pelo impetrante, tendo enviado igualmente cópia da deliberação que fora tomada pela Câmara Municipal em 24 de Janeiro de 1977 e na qual se entendera de considerar encerrado o assunto concernente à não renovação do aludido contrato, dada a resolução anteriormente tomada pela comissão administrativa acerca de tal problema.

3 — Ora, de acordo com os elementos então recolhidos no processo, afigurou-se ao Serviço do Provedor de Justiça não ter havido irregularidade na falta de renovação por parte da comissão administrativa do Município de Viana do Castelo do contrato oportunamente celebrado com vista à prestação de serviços de consultadoria técnica ao indicado Município.

No tocante, porém, ao problema da rescisão dos contratos oportunamente celebrados com vista à elaboração de planos de pormenor de diversas zonas da cidade de Viana do Castelo, constatou-se que o SROA, em ofício que haveria dirigido ao reclamante em 3 de Agosto de 1976, referia que a área proposta pelo Município para urbanização com zonas habita-

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cionais, situada entre a estrada nacional n.° 13 e a costa, a norte dos estaleiros navais, segundo o esquema apresentado, se encontrava defendida pelo Decreto-Lei n.° 356/75, de 8 de Julho, por ter solos com capacidade de uso agrícola elevada, e bem assim que se encontrava igualmente defendida, pelo mesmo motivo, a área adjacente ao Bairro Jardim.

Por isso mesmo se solicitaram à Câmara Municipal de Viana do Castelo novos esclarecimentos tendentes à cabal elucidação de tal aspecto do problema, considerando as razões em que se teria fudamentado a rescisão dos contratos para a elaboração dos planos de urbanização de pormenor que abrangiam as mencionadas zonas, já que o referido aspecto não se encontrava elucidado nos elementos recebidos daquele órgão autárquico.

E, simultaneamente, pediu-se que fossem também transmitidos esclarecimentos mais concretos acerca das razões em que se haveria fundamentado o Município para não pagar ao interessado as prestações pelo mesmo reclamadas, na hipótese de elas corresponderem a trabalhos que tivessem sido efectivamente apresentados, uma vez que, inculcando-se nos elementos do processo que a rescisão dos contratos para a elaboração dos invocados planos de urbanização de pormenor, celebrados em 15 de Maio de 1975, se teria fundamentado nos condicionalismos previstos nas respectivas cláusulas 9.09, Importaria atentar no faoto de tais cláusulas conferirem aos interessados o direito de receberem uma remuneração proporcional aos trabalhos que já estivessem executados e fossem entregues.

Ora, ainda que os elementos até então carreados ao processo não permitissem concluir com segurança sc seriam essas as prestações cujo pagamento estava em causa, notava-se que na reunião municipal de 1 de Julho de 1976 (anterior, por consequência, à de 18 de Novembro de 1976, que resolvera sobre a rescisão de 2 contratos anteriormente celebrados com o reclamante para a elaboração dos planos de urbanização de pormenor) um dos vogais da comissão administrativa propusera que lhe fossem pagas as 3." prestações referentes àqueles dois planos de pormenor, a fim de se cumprirem pontualmente os compromissos assumidos, face ao clausulado nos contratos de execução dos mesmos planos de pormenor e à informação que ao referido vogal fora prestada pelo engenheiro-chefe dos Serviços Técnicos Municipais de Obras no sentido de que os ditos planos continham os elementos essenciais que deviam informar a apresentação dos planos de pormenor em causa.

4 — Na sequência das mencionadas diligências, a Câmara Municipal veio a comunicar que, depois de apreciar o problema em foco, resolvera, em reunião de 22 de Novembro de 1977, confirmar as deliberações anteriormente tomadas nas reuniões de 24 de Janeiro de 1977 e 7 de Março de 1977 acerca do assunto.

Mas, porque tal resposta não elucidava, de modo algum, as dúvidas que o Serviço do Provedor de Justiça entendera necessário que fossem devidamente esclarecidas, ponderou-se à Câmara Municipal que para clarificação do problema pendente não se tornava suficiente que o mesmo órgão autárquico se limitasse a confirmar anteriores deliberações, que não esclareciam, em si mesmas, as dúvidas equacionadas, antes importando que a Câmara Municipal de Viana

do Castelo se pronunciasse concretamente sobre as questões que Lhe haviam sido expostas.

5 — Em resposta, o citado órgão autárquico enviou ao Serviço do Provedor de Justiça fotocópia de todo o processo municipal relaciónalo com o assunto, referindo que tal procedimento, dada a complexidade do problema em foco, seria o melhor esclarecimento que podia fornecer às questões que lhe haviam sido formuladas e acrescentando, simultaneamente, que através do indicado processo se poderia concluir que ao Município assistia toda a razão.

Analisada, porém, a volumosa documentação recebida, constatou-se que ela em nada auxiliava o esclarecimento concreto dos aspectos cuja elucidação fora especificamente solicitada à Câmara Municipal de Viana do Castelo.

Efectivamente, a citada documentação não referia qualquer tomada de posição do Município acerca da questão relacionada com a circunstância de determinadas áreas, cuja urbanização estava em estudo, se acharem defendidas pelas disposições do Decreto-Lei n.° 356/75, consoante fora comunicado pelo SROA ao reclamante em 3 de Agosto de 1976.

E, se bem podia suceder que o ponto em discussão houvesse entretanto deixado de revestir, em termos práticos, a relevância que teria assumido na altura, uma vez que o invocado diploma legal viera a ser ulteriormente revogado pelo Decreto-Lei n.° 308/79, de 20 de Agosto, que disciplinou em novos moldes a protecção dos solos agrícolas defendidos, nem por isso ficou explicada a posição ao tempo assumida pela comissão administrativa do Município de Viana do Castelo ao pretender, com base nos contratos oportunamente firmados com o reclamante, que este último incluísse efectivamente nos estudos de urbanização relacionados com os planos de pormenor em causa (ou com algum ou alguns deles) certas zonas que haviam passado a estar defendidas pelo Decreto-Lei n.° 356/75.

6 — Dir-se-ia que, em teoria, nada haveria impedido o impetrante de proceder em conformidade com a exigência formulada e mantida pelo Município de Viana do Castelo, com alegado fundamento nas cláusulas dos contratos anteriormente celebrados a respeito da elaboração de planos de pormenor de várias zonas da cidade, pois ao Município —plenamente conhecedor do assunto e dos preceitos legais aplicáveis — caberiam, em última análise, as responsabilidades decorrentes da sua actuação.

Mas tal forma simplista de encarar o problema não tornaria curial o procedimento da comissão administrativa ao postergar as disposições do Decreto-Lei n.° 356/75 e ao optar pela rescisão dos mencionados contratos (ou de alguns ou algum deles) com base na falta de estudo urbanístico de zonas que dele deveriam ter passado a ser excluídas, face à respectiva capacidade de utilização agrícola.

Na realidade, atentas as disposições contidas no Decreto-Lei n.° 356/75, publicado pouco depois da celebração dos contratos para a elaboração dos três planos de urbanização de pormenor mencionados no processo em estudo, afigurou-se que o procedimento mais acertado na altura teria consistido em adequar às normas legais entretanto postas em vigor os condicionalismos do contrato (ou dos contratos) que incluísse parcelas de terreno cuja capacidade de uso agrícola houvesse sido defendida pelo invocado diploma legal.

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7 — O aspecto em foco teria assumido especial re'evo no tocante ao plano de pormenor da zona a norte da Escola Técnica (como decorria de vários elementos do processo), desconhecendo-se, entretanto, se também haveria contendido, em alguma medida, com o estudo respeitante ao plano de pormenor da zona a nascente do Bairro Jardim.

Aliás, e independentemente de outras referências feitas ao aspecto em causa em vários documentos do processo, lia-se na exposição remetida pelo interessado ao Município de Viana do Castelo em 5 de Agosto de 1976:

[...] O que é um facto é que o próprio direc-tor-geral de Urbanização interino, em visita à Câmara de Viana do Castelo, posto perante o problema, se manifestou quanto à pertinência da manutenção da veiga até à Avenida do Atlântico e que o Secretário de Estado do Ambiente nos referiu a evidência da impossibilidade de se urbanizar a veiga.

8 — Assim, não pareceu isenta de censura a posição assumida na altura pela Comissão Administrativa do Município de Viana do Castelo quanto à falta de atenção pelas disposições do Decreto-Lei n.° 356/75 e quanto à rescisão dos contratos (ou alguns deles) anteriormente celebrados com o reclamante para a elaboração de planos de pormenor de determinadas zonas, na medida em que essa mesma recisão se houvesse conexionado com a postergação pela Comissão Administrativa das normas legais que então deveriam ter sido respeitadas.

9 — Entretanto, o pensamento imediatamente acima exposto não prejudicaria, só por si, as demais razões dc índole puramente técnica que o Município de Viana do Castelo houvesse entendido assistirem-lhe para considerar que os trabalhos apresentados pelo reclamante com referência aos planos de pormenor em causa (ou alguns deles) não satisfaziam aquilo que lhe era exigível contratualmente.

Com efeito, o exame de diversos elementos recolhidos no processo (v. g., algumas informações oportunamente prestadas pelo reclamante ao Município de Viana do Castelo e alguns despachos proferidos na altura pelo Presidente da Comissão Administrativa) evidenciava que entre as partes interessadas se tinha suscitado um diferendo, alicerçado fundamentalmente em divergência de índole técnica e urbanística, quanto às soluções adoptadas e a adoptar para as zonas abrangidas pelos planos de urbanização de pormenor em referência.

Ora,"as cláusulas 9.as dos contratos respeitantes à elaboração dos mencionados planos estatuíam que o Município se reservava o direito de em qualquer momento, e em definitivo, declarar rescindidos os aludidos contratos se reconhecesse que a actuação do autor não satisfazia ou não revelava condições de vir a desincum-bir-se satisfatoriamente das obrigações que sobre ele impendiam na elaboração dos planos de urbanização de pormenor.

E na apreciação dessa matéria se concluiu que não podia intervir o Provedor, atendendo à especificidade técnica do assunto e à margem de discricionariedade nele envolvida. Isto tanto mais que, havendo o Serviço do Provedor de Justiça solicitado anteriormente ao MHOP determinados esclarecimentos relacionados com alguns dos aspectos envolvidos no problema exposto,

visto se ter considerado de interesse o conhecimento da posição daquele Ministério acerca de tais aspectos, veio a receber, em resposta, uma comunicação que não permitia qualquer apreciação, ajnda que subjectiva, das atitudes assumidas por cada uma das partes em conflito, sendo insusceptível, por consequência, de fazer alguma luz sobre a razoabilidade ou irrazoabilidade das posições assumidas, quer pelo Município de Viana do Castelo, quer pelo interessado.

10 — No que concerne ao problema especificamente relacionado com a existência ou inexistência de um direito do exponente à percepção de determinadas importâncias correspondentes a trabalhos que efectivamente houvessem sido entregues ao Município de Viana do Castelo — independentemente da rescisão pela respectiva Comissão Administrativa dos contratos celebrados com o interessado para a elaboração de vários planos de urbanização de pormenor—, parecia resultar de vários elementos da vasta documentação reunida no processo que, após as resoluções de pagamento ao reclamante das 2." prestações respeitantes à elaboração dos planos de pormenor das zonas a nascente do Bairro Jardim e a norte do Campo de Jogos, o impetrante apresentara ao Município em 17 de Junho de 1976 outros trabalhos referentes aos projectos daqueles planos de pormenor.

Por outro lado, e segundo declaração constante da acta da reunião autárquica de 1 de Julho de 1976, um dos vogais da Comissão Administrativa do Município de Viana do Castelo fora informado pelo chefe dos Serviços Técnicos Municipais de Obras de que os referidos planos continham os elementos essenciais a que devia obedecer a sua apresentação, razão que levava esse vogal a propor naquela reunião o pagamento das 3." prestações relativas aos contratos para elaboração dos dois citados planos de pormenor.

Nesses termos, que não apareciam contrariados em quaisquer outros documentos do processo, concluía-se que a rescisão dos contratos para elaboração dos planos de pormenor das zonas a nascente do Bairro Jardim e a norte do Campo de Jogos, deliberada na reunião autárquica de 18 de Novembro de 1976 por alegada falta de cumprimento pelo interessado das premissas do Município relativas aos mencionados planos, constituía, só por si, razão bastante para que ao interessado deixassem de ser pagas as remunerações a que tivesse direito pelos trabalhos entretanto elaborados e apresentados, de acordo com o estabelecido nas cláusulas 9.0S dos correspondentes contratos.

Com efeito, ainda que a actuação do reclamante, consubstanciada nas soluções propostas nos novos trabalhos entregues em 17 de Junho de 1976, ou decorrente da sua actuação posterior, se tivesse apresentado à Comissão Administrativa do Município de Viana do Castelo como justificativa da recisão dos dois contratos em referência, tal circunstância não retirava ao interessado o direito de receber as remunerações proporcionais ao trabalho então executado e entregue, independentemente da discordância do citado órgão autárquico com determinadas soluções técnicas ou urbanísticas propostas pelo autor dos planos em causa, pois que as referidas cláusulas 9." lhe asseguravam expressamente esse direito, no caso de se verificar a rescisão dos contratos em apreço, com o fundamento nelas previsto.

Quanto ao plano concernente à zona a norte da Escola Técnica, a ele não aludira a declaração do

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citado vogal da Comissão Administrativa feita na reunião autárquica de J de Julho de 1976.

E isso, certamente, em virtude de o contrato relativo à elaboração do mesmo plano de urbanização de pormenor já haver sido anteriormente rescindido pela Comissão Administrativa, sob alegação de o seu autor ter desrespeitado por completo as recomendações e determinações do Município, designadamente não fechando a Avenida do Atlântico, de cuja parte final já corria processo de expropriação, e não urbanizando a veiga, consoante fora transmitido ao interessado.

Entretanto, e consoante decorria de vários documentos recolhidos no processo (v. g., diversas exposições dirigidas pelo reclamante ao Município e diversos ofícios por este último remetidos àquele primeiro), o interessado apresentara vários trabalhos relacionados com a elaboração do plano de urbanização de pormenor da zona a norte da Escola Técnica ainda antes de a comissão administrativa rescindir o contrato.

Em tais termos, afigurou-se igualmente que as deficiências que a Comissão Administrativa entendeu exis tirem nos mencionados trabalhos, face aos condicionalismos do correspondente contrato, também não poderiam servir de fundamento para que deixassem de ser pagas ao interessado as remunerações que, em vista da cláusula 9.a do aludido contrato, correspondessem àquilo que tivesse sido efectivamente executado e entregue no âmbito do contrato em referência.

11 — Face aos resultados do estudo levado a cabo sobre o assunto, o Provedor de Justiça recomendou à Câmara Municipal de Viana do Castelo que diligenciasse no sentido do pagamento ao reclamante das remunerações a que o mesmo tinha direito por trabalhos efectivamente realizados e entregues ao Município no âmbito dos contratos respeitantes à elaboração de planos de pormenor de várias zonas da cidade, de acordo com o estabelecido nas cláusulas 9." dos referidos contratos, pondo termo, desse modo, ao problema pendente, que se arrastava há alguns anos.

E, simultaneamente, frisou o Provedor de Justiça que não podia deixar de merecer reparo a posição assumida na altura pela Comissão Administrativa do Município de Viana do Castelo acerca do aspecto relacionado com a urbanização de áreas defendidas pelas disposições do Decreto-Lei n.° 356/75, de 8 de Julho, ainda que essa questão — não imputável, evidentemente, aos posteriores órgãos autárquicos — pudesse estar já ultrapassada pela ulterior publicação do Decreto-Lei n.° 308/79, de 20 de Agosto.

12 — Em resposta, porém, comunicou a Câmara Municipal que, havendo apreciado todo o processo em reunião de 5 de Agosto de 1980, deliberara não acatar a recomendação que lhe fora formulada, com base nas razões aduzidas no parecer jurídico que transcrevia, elaborado por um advogado.

Sobre tais razões se pronunciou então, detalhadamente, o Serviço do Provedor de Justiça, que concluiu pela improcedência dos fundamentos em que se baseara o não acatamento da recomendação feita. E, assim, continuou o Provedor de Justiça a sustentar a pertinência das considerações expendidas no estudo anteriormente realizado sobre o assunto, bem como as conclusões nele firmadas, entendendo, por isso, que a deliberação tomada pela referida Câmara Municipal na sua reunião de 5 de Agosto de 1980 não haveria sido aquela que se harmonizava com as cláusulas 9.80

dos contratos oportunamente celebrados com o reclamante.

Na realidade, tendo aquele elaborado e entregue ao Município os trabalhos a que aludia o processo, não parecia susceptível de contestação o seu direito à percepção de remunerações proporcionais aos mencionados trabalhos, de acordo com as cláusulas 9.as dos respectivos contratos. E, se os trabalhos em causa não corresponderam integralmente àquilo que ao seu autor era contratualmente exigível, não podendo, por consequência, ser totalmente aproveitados pela Câmara Municipal, daí decorreria tão-somente que no cálculo das citadas remunerações deveriam ser tomados em linha de conta os prejuízos resultantes da necessidade de o Município incumbir outrem de novos estudos tendentes a completar ou corrigir os executados e apresentados pelo reclamante, isto segundo o previsto igualmente nas referidas cláusulas 9.as

Nos termos expostos, entendeu o Provedor de Justiça que a Câmara Municipal de Viana do Castelo deveria rever a posição tomada acerca do assunto, deliberando, pois, no sentido do pagamento ao interessado das remunerações a que o mesmo tivesse direito, calculadas de acordo com o previsto nas cláusulas 9.as dos contratos várias vezes mencionadas; para tal efeito, poderia a Câmara Municipal diligenciar junto do reclamante com vista à possível fixação, por acordo, das remunerações a liquidar.

13 — Do teor do novo estudo realizado no Serviço do Provedor de Justiça acerca do problema pendente se deu ulterior conhecimento à Câmara Municipal de Viena do Castelo, havendo o Provedor de Justiça ponderado àquele órgão autárquico as considerações formuladas no mesmo estudo e recomendado, simultaneamente, que fosse revista a posição assumida pela Câmara Municipal na anterior reunião de 5 de Agosto de 1980.

Mas ta) recomendação também não veio a ser acatada pelo referido órgão autárquico, que, em reunião de 3 de Maio de 1982, resolveu manter as deliberações que já havia tomado anteriormente a propósito do assunto.

14 — Assim, e não estando ao alcance do Provedor de Justiça qualquer outra diligência susceptível de resolver a questão em aberto, foi determinado o arquivamento do processo, organizado com base na reclamação do impetrante, tendo-se comunicado, entretanto, à Câmara Municipal de Viana do Castelo que a posição por ela assumida acerca do problema suscitado não era, manifestamente, aquela que melhor se harmonizava com as conclusões decorrentes dos elementos recolhidos no aludido processo.

Contribuições e impostos Processo n.° 82/R-1491-A-2

Sumário — Contribuições e impostos. Contribuição industrial.

Objecto — Fixação do lucro tributável.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

1 — Um contribuinte reclamou com fundamento no facto de algumas repartições de finanças —entre as quais se contaria a de Leiria — se negarem a facultar,

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para efeitos das reclamações contra o lucro tributável previstas no artigo 71.° do Código da Contribuição Industrial, as informações dos serviços de fiscalização que hajam determinado a correcção dos lucros constantes das declarações do contribuinte.

Fundamentava a sua queixa em razões de lógica e de justiça, bem como no preceituado no n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho.

2 — Interpelada sobre o assunto, a Direcção-Geral dr.3 Contibuiçccs e Impostos sublinhou ser tal procedimento contrário às instruções emanadas, nomeadamente as constantes das circulares n.os C-10/64, de 18 de Agosto, e C-5/73, de 13 de Março, das quais resulta poderem ser requeridas certidões não só das actas das comissões de fixação dos lucros (cf. artigo 76.°, § 3.ü, do Código), mas das próprias informações dos serviços de fiscalização, quando aquelas se limitem a remeter para estas, sem permitirem conhecer o seu conteúdo.

3 — Em face do exposto, e porque aquela Direcção--Geral prometeu chamar mais uma vez a atenção das repartições de finanças para o rigoroso cumprimento das aludidas instruções, foi determinado o arquivamento do processo.

Processo n.° 81/R-91S-A-2

Sumário — Contribuições e impostos. Direitos alfandegários. Imposto de transacções. Isenção.

Objecto—Isenção de direitos alfandegários e de imposto de transacções na importação de 3 aeronaves.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

1 — Um cidadão queixou-se ao Provedor das dificuldades levantadas na importação para Portugal de 3 aeronaves, marca Cessna, com as quais se dedicara em Moçambique à exploração do transporte aéreo, actividade que, com a instabilidade ali gerada em 1976, pretendia prosseguir em Portugal.

Concretamente, requerera o reclamante, por aplicação analógica do Despacho Normativo n.° 287/79, e alegando antecedentes nesse sentido, a isenção para as referidas aeronaves dos direitos e sobretaxa de importação e do imposto de transacções, não tendo conseguido senão a isenção daqueles direitos e sobretaxa em relação a uma das aeronaves.

2 — Os precedentes invocados levaram o Provedor de Justiça a solicitar à Secretaria de Estado do Orçamento cópias de todos os despachos era causa e das respectivas fundamentações.

3 — Na sequência de tais contactos e de outros estabelecidos directamente com a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, foi o Provedor de Justiça informado de que se decidira reapreciar a questão, tendo sido concedidas ao reclamante, embora a título excepcional, todas as isenções por ele requeridas.

Foi, assim, determinado o arquivamento do processo.

Processo n.° 76/R-1118-A-3

Sumário — Contribuições e impostos. Imposto complementar. Tributação dos cônjuges.

Objecto — Desigualdade tributária em imposto complementar relativa aos cônjuges não separados.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação Síntese:

1 —Em fins de 1976 foi suscitada ao Provedor de Justiça a questão da inconstitucionalidade e da injustiça do regime vigente na tributação do agregado familiar em imposto complementar. Argumentava o reclamante, casado em regime de separação absoluta de bens, que da tributação conjunta dos cônjuges resultava, ou podia resultar, uma carga fiscal superior à soma das colectas que cada um deles pagaria se fosse solteiro, o que, obviamente, não concitava ao casamento, mas às uniões de facto.

2 — Reconhecendo a procedência, em boa parte, daquelas críticas, o Provedor de Justiça, ainda cm Julho de 1977, chamou a atenção do Ministério das Finanças e da Assembleia da República para as conclusões que sobre a matéria foram alcançadas no Congresso de 1955 da Associação Fiscal Internacional e para a necessidade de encontrar solução para aquelas situações de injustiça mais gritantes ('). E, com base no direito comparado, apontou-se para a divisão do rendimento colectável do agregado familiar pelo número total de pessoas que o constituem (sistema francês do quociente familiar) ou, ao menos, pelos cônjuges (sistemas americano e alemão).

3 — Em Dezembro de 1977 a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos respondeu que, estando em curso estudos tendentes à escolha do futuro sistema fiscal, nomeadamente à implementação do imposto único, não era aconselhável para já alterar a forma vigente de tributação dos cônjuges, conquanto tal hipótese pudesse ser admitida se a instituição daquele imposto único demorasse mais do que o previsto.

4 — O tempo decorrido, a entrada em vigor em 1 de Abril de 1978 do Decreto-Lei n.° 496/77 —visando a igualdade de direitos e deveres dos cônjuges — e a constatação de que o Decreto-Lei n.° 183-F/80, de 9 de Junho (2), não superavam integralmente as críticas que tinham dado origem ao processo e levaram .a nova interpelação do Ministério das Finanças.

Desta feita, a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos informou que «a crítica produzida quanto à forma de liquidação apontada e a sugestão para que as deduções das chamadas 'unidades familiares' se considerem no imposto complementar, dada a demora da instituição do imposto único, embora pertinentes, não poderão concretizar-se por iniciativa dos serviços, por transcenderem o âmbito da sua competência».

Sobre tal informação despachara o Secretário de Estado do Orçamento: «Remeta-se fotocópia ao Serviço do Provedor de Justiça.»

5 — O teor de tal resposta e o duvidoso êxito da via da declaração de inconstitucionalidade, já que a Comissão Constitucional e o Conselho de Revolução, a solicitação do Presidente da Assembleia da República, se haviam, entretanto, pronunciado negativamente O, levaram ao uso expresso da faculdade conce-

(') V. Relatório do Provedor de Justiça de 1977, ed. da Secretaria de Estado da Comunicação Social, pp. 75 e segs., e Diário da Assembleia da República, 2." série, n.° 62 (supl.), de 19 de Abril de 1978.

(-) Que estabeleceu uma tabela de taxas para os casados e outra para os não casados.

O Respectivamente o parecer n.° 25/81. de 28 de Julho, e a Resolução n." 200/81, publicada no Diário da República, de 3 de Junho de 1982.

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dida ao Provedor de Justiça pelo artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, dirigindo ao Secretário de Estado do Orçamento a seguinte recomendação:

Que o actual regime de tributação dos cônjuges em imposto complementar seja revisto, em ordem a evitar-se que. em violação frontal dos artigos 67.° e 107.° da Constituição, a carga fiscal incidente sobre o casal possa ser superior à soma das colectas de cada um dos cônjuges se fossem solteiros ou separados judicialmente de pessoas e bens.

6 —Em 11 de Abril de 1982 o Secretário de Estado do Orçamento despachou no sentido de se trans-mitor ao Serviço do Provedor de Justiça a sua concordância sobre uma nova informação da Direcção--Geral das Contribuições e Impostos onde se reconhece que aquela recomendação, ainda que «parcelarmente», «tem a sua pertinência, mormente quando ambos os cônjuges contribuem de uma forma aproximadamente igual para o rendimento do agregado familiar e se considera que seria pensável um regime de tributação Accionadamente fraccionada em função do número de pessoas que integram o agregado familiar e que contribuem para o rendimento do mesmo, no estilo do splitting norte-americano ou do coeficiente familiar francês».

Na sequência desta tomada de posição, a recomendação do Provedor de Justiça foi transmitida ao Grupo de Trabalho do Imposto Complementar.

Processo n.° 81/R-1328-A-2

Sumário — Contribuições e impostos. Imposto sobre sucessões e doações. Contribuição predial. Isenção

Objecto — Isenção do imposto sobre sucessões e doações e da contribuição predial relativa a instituição privada de solidariedade social.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

1 — A Santa Casa da Misericórdia de Santarém apresentou em 1 de Julho de 1981 reclamação fundada no facto de lhe continuar a ser exigida contribuição predial relativamente a imóveis que lhe haviam sido legados e para os quais requerera tempestivamente a isenção do imposto sobre sucessões e doações e da contribuição predial.

2 — Abordada sobre o caso a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, informou a mesma que a concessão da isenção se encontrava pendente da satisfação por parte da reclamante do preceituado no artigo 88.° do Estatuto das Instituições Privadas de Solidariedade Social, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 519-G2/79, de 29 de Dezembro, tendo em atenção a Portaria n.° 234/81, de 5 de Março. Informou ainda que a necessidade de a reclamante dar execução a tal preceito já fora transmitida à Direcção de Finanças do Distrito de Santarém.

3 — Da situação informou-se a Misericórdia, que, em resposta, sublinhou já haver entregue em Março

de 1981 ao Centro Regional de Segurança Social de Santarém toda a documentação exigida por aqueles normativos.

4 — Apurando-se, assim, que o arrastamento da situação era imputável, não ao Fisco, mas ao Ministério dos Assuntos Sociais, houve que abordar este departamento, o que se fez através daquele Centro. Só que este, por sua vez, informou que vinha já a insistir junto da Direcção-Geral de Segurança Social pelas diligências necessárias — no caso, o registo da constituição e dos estatutos da reclamante.

5 — Por diligência pessoal, soube-se, finalmente, que tal registo fora efectuado em 30 de Junho de 1982. Do facto deu o Provedor de Justiça conhecimento à Misericórdia, à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e à Direcção de Finanças do Distrito de Santarém, em ordem ao rápido desbloqueamento da situação, o que veio a conseguir-se, pelo que se arquivou o respectivo processo.

Processo n.° 81/R-1519-A-2

Sumário — Contribuições e impostos. Imposto de transacções. Isenção.

Objecto — Desigualdade em matéria de isenção de imposto de transacções entre empresas distribuidoras de energia eléctrica.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida. Síntese:

1 — Por uma empresa distribuidora de energia eléctrica e instaladora de material eléctrico de alta e baixa tensão foi apresentada uma reclamação fundada em alegada discriminação, para efeitos de imposto de transacções, entre, por um lado, aquela sociedade e outras empresas distribuidoras de electricidade ainda não integradas na Electricidade de Portugal (EDP), E. P., e, por outro, esta empresa pública.

Concretamente: o Código do Imposto de Transacções só isenta o material destinado à produção de electricidade; o Decreto-Lei n.° 502/76 (que criou a EDP) vedo, porém, considerar as actividades de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, a cargo da EDP, como compreendidas no conceito de processo produtivo de energia; daí que a EDP estivesse, ao contrário daquelas empresas, isenta do imposto em causa também relativamente ao material que adquiria para o transporte e distribuição de energia.

Tal situação discriminaria os próprios consumidores, conforme procedessem à ligação à rede pública, através da EDP, ou por intermédio daquelas outras empresas.

2 — Abordado sobre o caso, o Secretário de Estado do Orçamento, concordando com a existência de disparidade de tratamento, acabou por proferir despacho, em 27 de Novembro de 1981, tornando extensivo, com base no princípio da igualdade tributária, o regime da EDP a todas as restantes empresas de produção, transporte e distribuição de energia eléctrica, incluindo, naturalmente, a reclamante.

Satisfeita a reclamação, foi o processo arquivado.

Proc8SSO n.° 81/IP-2S-A-3

Sumário — Contribuições e impostos. Taxa de radiodifusão.

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Objecto — Regime de cobrança de taxa de radiodifusão e situações justificativas de isenção de pagamento da mesma taxa.

Decisão, — Formulação de recomendação que não foi atendida.

Síntese:

1 — Relativamente a várias reclamações dirigidas ao Provedor de Justiça acerca de diversas questões relacionadas com a cobrança da taxa de radiodifusão em certas situações que se afiguravam merecedoras de isenção de pagamento daquela taxa, decidiu o Provedor de Justiça abrir em Março de 1981 um processo de sua iniciativa em que foram analisados tais aspectos.

2 — Assim, foram objecto de apreciação as seguintes questões:

Aumento do quantitativo daquela taxa desde 1974-, Atraso na sua cobrança;

Não pagamento de taxa por parte de quem não possui aparelho receptor;

Isenção de pagamento de taxa em relação a deficientes;

Isenção de pagamento de taxa para idosos e pessoas de escassos recursos;

Pagamento de uma só taxa por parte de quem possui vários contadores de electricidade no mesmo prédio ou em várias casas de habitação (cidade, campo e praia).

De tais questões foram extraídas as conclusões seguintes:

Quanto ao aumento do quantitativo da taxa. — Por tal quantitativo se situar em 1974 em 100$ anuais e ter passado a 360$ por ano a partir de 1976, foi considerado excessivo aquele aumento;

Atraso na cobrança. — Somente em princípios de 1978 a RDP procedeu à cobrança da taxa referente ao 2° semestre de 1976, tendo apenas em Janeiro de 1980 iniciado o regime de cobrança mensal, através dos recibos das distribuidoras de energia eléctrica, o que se considerou demasiadamente desfasado;

Não pagamento da taxa por parte de quem não possui aparelho receptor. — Este aspecto, que confere à taxa de radiodifusão, pela forma como incide, a característica próxima da de um imposto, poderia ser afastado se se viesse a dar possibilidade aos não possuidores de aparelho de solicitarem a respectiva isenção de pagamento, sujeitando-os, porém, à fiscalização a exercer;

Isenção de pagamento de taxa em relação a deficientes. — Esta isenção poderia ser estabelecida na lei à semelhança do que se verifica relativamente à taxa de televisão (v. Decreto-Lei n.° 171/80, de 29 de Maio);

Isenção de pagamento de taxa para pessoas idosas e de escassos recursos. — Também a conceder em condições idênticas às que foram estabelecidas quanto à taxa de televisão (v. Decreto-Lei n.° 171/80);

Pagamento de uma só taxa por parte de quem possui vários contadores de electricidade no

mesmo prédio ou em várias casas de habitação. — Encontra justificação pelo facto de os respectivos titulares virem a ser onerados apenas uma vez, e não duas ou mais vezes, pela mesma taxa, como presentemente se verifica.

3 — As conclusões atrás explicitadas foram transmitidas ao Secretário de Estado da Comunicação Social, tendo sido recomendado que fossem tidas em conta na revisão do esquema legal de cobrança da taxa em causa. Vieram, por isso, a ser consideradas na revisão efectuada por um grupo de trabalho criado especialmente para o efeito em Fevereiro de 1981.

Todavia, o projecto de diploma de revisão preparado por aquele grupo de trabalho, em relação ao qual foi dada também colaboração pelo Serviço do Provedor de Justiça, através da prestação de parecer circunstanciado, não mereceu aprovação por parte do Governo, tendo este considerado preferível manter as isenções e reduções de taxa constantes da legislação vigente, embora alterando os escalões de consumo (isenção para os consumidores até 120 kWh/ano, taxa de 240$ para os consumidores de mais de 120 kWh/ano até 240 kWh/ ano e taxa de 720$ para os consumidores de mais de 240 kWh/ano), conforme o Decreto-Lei n.° 203/82, de 22 de Maio, não tendo sido, portanto, acolhidos no novo diploma os aspectos julgados pertinentes inseridos na recomendação do Provedor de Justiça.

Procosso n.° 81/IP-5-A-3

Sumário — Contribuições e impostos. Taxa de televisão.

Objecto — Regime de cobrança da taxa de televisão e situações justificativas de isenção de pagamento da mesma taxa. Prazo para requerer tal isenção.

Decisão — Recomendação atendida.

Síntese:

1—Numerosas foram as reclamações dirigidas ao Provedor de Justiça acerca da cobrança da taxa de televisão, especialmente no tocante à isenção de pagamento da mesma e dos prazos para a requerer.

Em face de tão elevado número de reclamações, resolveu o Provedor de Justiça abrir processo de sua iniciativa a fim de estudar em conjunto o constante daquelas reclamações, o que o levou a formular em Dezembro de 1981 ao Secretário de Estado Adjunto do Primeiro-Ministro para a Comunicação Social as seguintes observações, seguidas de recomendação, já referidas no Relatório do Provedor de Justiça de 1981 (a pp. 58-59), com vista a serem consideradas na revisão da respectiva legislação, na altura em curso naquela Secretaria de Estado:

Têm sido recebidas neste Serviço várias reclamações acerca da isenção de pagamento da taxa de televisão, que levaram este Serviço a analisar detidamente a legislação em vigor sobre a matéria.

Relativamente a tal legislação, bem como aos avisos e anúncios que, entretanto, têm sido publicados, cumpre salientar o seguinte:

1) No que respeita à avaliação da insuficiência económica com vista à concessão da isenção em causa, verifica-se que

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deixou de se ter em conta a composição do agregado familiar dos interessados.

Ora, entende-se que o novo sistema de avaliação pode conter em si injustiça relativa, na medida em que coloca no mesmo pé de igualdade o rendimento de agregados familiares numerosos com o de agregados familiares de composição reduzida;

2) Por outro lado, importa salientar que, em-

bora se afigure aceitável o propósito de a RTP condicionar sempre a isenção à carência de recursos económicos, tal não resulta, de modo algum, do disposto no Decreto-Lei n.u 171/80, de 29 de Maio.

Do teor deste parece decorrer, com clareza, que o único requisito exigido para a concessão da isenção, nos casos nele contemplados, é o facto de se ser reformado ou pensionista por invalidez ou sobrevivência.

Nada neste diploma diz respeito ao requisito da insuficiência económica, o que até parece reforçado pelo tratamento em conjunto da situação daquelas pessoas e das instituições posteriormente indicadas no respectivo artigo 1.°

E os meios de prova referidos no subsequente artigo 2.° respeitam, decerto, à qualidade de reformado ou pensionista, e não a factores económicos, de modo algum mencionados no citado diploma.

É certo que em avisos e anúncio? publicados pela empresa a este respeito a RTP tem esclarecido que a concessão, mesmo a pensionistas, está condicionada pela carência económica. Mas a verdade é que tal critério apa rece, face à lei, formalmente ilegal, po dendo os interessados, legitimamente, invocar a ignorância desses avisos e anúncios, ao invés do que sucede acerca do Decreto-Lei n.° 171/80, publicado no Diário da República;

3) Quanto ao regime geral decorrente do dis-

posto no Decreto-Lei n.° 401/80, de 21 de Setembro, e na Portaria n.° 26-N1/80, de 9 de Janeiro, importa tornar claro (o que nem sempre tem acontecido, quer em relação a particulares, quer às próprias juntas de freguesia) que os documentos a passar pelas juntas de freguesia têm em vista certificar os rendimentos e a composição do agregado familiar dos interessados, cabendo, porém, à RTP a apreciação da existência ou não de insuficiência económica, de acordo com critério também definido em lei ou regulamento (e não através de meros anúncios ou avisos da empresa);

4) Reconhece-se também que deverá ser fi-

xado claramente na lei o prazo para apresentação dos pedidos de isenção.

Nestes termos, afigura-se ter oportunidade e ser de toda a conveniência, com vista à concessão da isenção em causa, formular a seguinte recomendação:

I) Que seja publicada legislação com o fim de se definir claramente a necessidade de comprovação da insuficiência económica por parte dos interessados, mediante certificado das juntas de freguesia, do qual conste o rendimento e a composição do agregado familiar; 11) Que fique estabelecido, por lei ou regulamento, que compete à RTP definir o critério da insuficiência económica, e não através de avisos ou anúncios publicados pela empresa;

EU) Que seja fixado claramente na lei o prazo para apresentação dos pedidos de isenção do pagamento da taxa;

IV) Que, no tocante ao passado, sejam deferidos os pedidos de isenção apresentados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 171/80, desde que apenas falte para tal deferimento a comprovação de insuficiência económica.

2 — Tais observações e recomendação foram tidas em consideração e substancialmente acolhidas no Decreto-Lei n.u 472/82, de 16 de Dezembro.

Cooperantes

Processo n.° 81/R-3281-A-3

Sumário — Cooperantes. Aposentação. Tempo de serviço relevante.

Objecto — Revisão do despacho atributivo de pensão provisória de aposentação a um agente dos Serviços de Portos, Caminhos de Ferro e Transportes de Moçambique, assalariado eventual, que, após a independência dessa ex-colónia, nesta prestara serviço como cooperante.

Decisão — Situação não prevista na legislação vigente. Recomendação para que seja adoptada ijiedida legislativa que a> salvaguarde.

Síntese:

1 — Um antigo assalariado eventual da Direcçãc Provincial dos Serviços de Portos, Caminhos de Ferro e Transportes da ex-colónia de Moçambique pediu a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de lhe vir a ser considerado como relevante, para efeitos de aposentação, o tempo de serviço que prestara, na situação de cooperante, à República Popular de Moçambique.

2 — A Direcçào-Geral de Integração Administrativa, a quem compete atribuir as pensões provisórias dos agentes adidos que tenham requerido a sua aposentação ao abrigo das disposições combinadas do n.° 1 do artigo 49.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, e do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 356/77, de 31 de Agosto, pronunciou-se no sentido de que o tempo de serviço prestado na situação de cooperante só poderia ser considerado para efeitos de aposentação se o interessado tivesse em 22 de Janeiro de 1975 qualquer

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dos vínculos previstos no Decreto-Lei n.ü 23/75, da mesma data. Como o interessado era contratado a título precário, só veio a ser abrangido pelas disposições contidas no Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, motivo por que não podia ser considerado na situação de actividade fora do quadro durante o período em que esteve a prestar serviço para o Governo de Moçambique e, por conseguinte, não lhe podia ser contado aquele tempo, embora, segundo consta da certidão de efectividade, tenha descontado para efeitos de aposentação.

3 — Em face desta posição, entendeu-se formular a seguinte recomendação:

1 — Se é certo que no acordo celebrado em 7 de Maio de 1975 entre o Estado Português e a FREL1MO, ao abrigo do qual o reclamante prestou serviço, não existia norma expressa respeitante aos efeitos em Portugal, em matéria de aposentação, do serviço prestado como cooperante, não é menos certo que dos princípios que presidiram à celebração desse mesmo acordo, e até do conjunto de normas que o integram, ressalta, à evidência, que o serviço prestado pelos antigos agentes e funcionários da Administração de Moçambique, em regime de cooperação, tem os mesmos efeitos como se prestado fosse ao Estado Português, independentemente da natureza do vínculo que os ligava anteriormente a esse mesmo Estado.

Isso resulta, com especial relevância, em matéria de aposentação, do disposto no artigo 15.° daquele acordo, cuja norma, de outro modo, seria incompreensível ou, pelo menos, teria de distinguir.

Mas, ainda que se entendesse não dever ser assim, estar-se-ia em presença de uma lacuna, facilmente integrável pelo recurso à mens legis, a princípios de justiça relativa e ao disposto para um caso inteiramente análogo no Acordo Geral de Cooperação com Moçambique, aprovado pelo Decreto n.° 692/75, de 12 de Dezembro.

2 — Todavia, e porque a Caixa Geral de Aposentações, ao fixar a pensão definitiva, pode também levantar dúvidas, se não mesmo objecções, ao entendimento acima preconizado, deveria ele ser claramente consagrado por via interpretativa autêntica.

Por isso se recomendou que pela via considerada mais idónea (interpretativa ou de outra natureza) fosse esclarecido (ou decidido) que o serviço público prestado ao abrigo de acordos de cooperações ou de pré-cooperação (caso de Angola) pelos antigos agentes da ex-administração ultramarina que não reuniam, em face do disposto no Decreto-Lei n.° 23/75, de 22 de Janeiro, as condições para o ingresso no quadro geral de adidos, criado no antigo Ministério da Coordenação Interterritorial, fosse considerado cm Portugal, para todos os efeitos legais, incluindo os de antiguidade, promoção, progressão na carreira e aposentação, como prestado ao Estado Português, desde que, quanto à aposentação, tivessem satisfeito ou viessem a satisfazer os legais encargos.

4 — Desconhece-se ainda o seguimento dado a esta recomendação.

Descolonização

Processo n.* 78/R-10B9-A-2

Sumário — Descolonização. Certificado de habilitações.

Objecto — Envio para Portugal, através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, de certificado de habilitações para exercício de enfermagem.

Decisão — Reclamação procedente. Arquivado por se terem esgotado as possibilidades de intervenção do Provedor de Justiça.

Síntese:

1 — Uma auxiliar de enfermagem vinda de Angola, exercendo funções desde 1975 nos Serviços Médico--Sociais, expôs ao Provedor de Justiça em Maio de 1978 a sua situação, derivada do facto de não possuir em Portugal certificado comprovativo de ter tirado o curso de auxiliar de enfermagem, concluído em 1950 na Escola de Enfermagem do Hospital de Maria Pia, de Luanda, situação que levaria a que a mesma viesse a ser dispensada do serviço, conforme referido em ofício daquele departamento.

A interessada apresentou na altura documentos comprovativos de aptidão profissional passados pelos médicos com quem trabalhou.

2 — Exposto o assunto ao Secretário de Estado da Saúde, foi recomendado que fosse dado à queixosa um novo prazo, enquanto o Provedor de Justiça diligenciava junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros a obtenção do certificado em causa através do representante diplomático do nosso país em Luanda.

3 — Efectuada a diligência junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, foi por aquele Ministério informado que o pedido de envio daquele certificado havia sido transmitido ao Consulado-Geral de Portugal em Luanda, o qual comunicou que a interessada deveria remeter fotocópias dos documentos que possuísse, a fim de a Escola de Enfermagem melhor localizar o processo, documentos que foram enviados para Luanda, via Ministério dos Negócios Estrangeiros.

4 — Entretanto, o Ministério dos Assuntos Sociais informou que havia sido alargado o prazo inicialmente concedido à interessada e que a Direcção-Geral de Saúde solicitara o envio do documento directamente à Escola de Enfermagem.

5 — O Provedor de Justiça foi insistindo sempre junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros pela obtenção do certificado, sendo, entretanto, a queixosa dispensada do serviço, passando à situação de desempregada.

6 — Em Abril de 1982, após o envio de 14 ofícios ao Ministério dos Negócios Estrangeiros sobre o assunto, foi o processo arquivado, por se terem, assim, esgotado as possibilidades de intervenção do Provedor de Justiça, processo que será reaberto logo que seja recebido o documento em causa ou qualquer informação a ele respeitante.

Processo 81/R-568-B-1

Sumário — Descolonização. Descontos em pensão de aposentação.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Objecto — Reembolso dos descontos em pensão de aposentação feitos em Portugal após a independência das ex-colónias no âmbito de uma acção de execução que decorreu em tribunal português das ex-colónias.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Pretendia o reclamante que a Caixa Geral de Depósitos lhe devolvesse o montante de 110 000$ relativo a descontos que lhe tinham sido feitos na pensão de aposentação após o seu regresso de Moçambique, ocorrido posteriormente à independência.

Esses descontos haviam sido efectuados ao abrigo de uma acção de execução que corria termos em tribunal daquela ex-colónia no momento da respectiva independência.

2 — A Procuradoria-Geral da República, em parecer exarado no processo n.° 34/79, homologado pelo então Ministro da Justiça, concluíra pela necessidade de emanação de um diploma legal que permitisse intentar em Portugal as acções de execução relativas a sentenças de condenação proferidas pelos tribunais das ex-colónias, enquanto ainda portugueses, orientação essa que já tinha, aliás, sido defendida pelo Provedor de Justiça em anteriores processos apreciados neste Serviço.

A necessidade desse diploma resultou de os tribunais das ex-colónias terem deixado de ser portugueses, passando a tribunais estrangeiros.

Ora, não existindo ainda tal diploma, tinha de entender-se que os descontos contra os quais o interessado reclamara foram efectuados sem que para isso houvesse título legal, o que levou a concluir que ele tinha direito à restituição dos respectivos montantes.

3 — Desse entendimento se deu conta ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa, que, concordando com ele, ordenou o reembolso ao interessado da quantia descontada na sua pensão.

Processo n.° 80/R-226-A-3

Sumário — Descolonização. Integração na banca. Objecto — Integração na banca portuguesa de ex-bancária regressada de Angola. Decisão — Reclamação atendida. Síntese:

1 — Em Janeiro de 1980 uma ex-trabalhadora do Banco Totta Standard de Angola queixou-se ao Provedor de Justiça por não ter sido autorizada a sua integração na banca portuguesa, conforme decisões proferidas pela Secretaria de Estado do Tesouro e pelo Banco de Portugal.

2 — Analisada a situação da reclamante, concluiu-se o seguinte:

Fora admitida ao serviço daquele Banco em Abril de 1973;

Fora despedida sem justa causa em Abril de 1974; O motivo do seu despedimento fora a sua gravidez, na altura já no 7.° mês de gestação.

3 — Ora, a reclamante não poderia ter sido despedida, uma vez que, nos termos do acordo colectivo de trabalho dos bancários vigente em 1974 em Angola, qualquer trabalhadora bancária não podia ser despedida, mesmo com justa causa, a partir do 6.° mês de gravidez.

Ê certo que a queixosa poderia ter recorrido para a comissão corporativa a que se referia aquele ACT, comissão a quem competia velar pelo cumprimento do mesmo acordo. Todavia, a partir de 1974, aquela comissão nunca mais reuniu.

Também a reclamante não intentou acção no tribunal do trabalho por, entretanto, devido à situação vivida em Angola, se ter verificado a cessação do funcionamento normal dos tribunais.

Assim, e por a reclamante julgar não estar nas condições dos despachos existentes para integração dos bancários regressados das ex-colónias, não solicitara a sua integração na banca portuguesa, tendo deixado caducar os prazos legalmente estabelecidos para o efeito.

4 — O assunto foi, concretamente, exposto ao Secretário de Estado do Tesouro, por várias vezes, pelo Provedor de Justiça, tendo sido chamada a atenção para a hipótese de a situação ser revista à luz dos «casos especiais» a que se refere o Protocolo dos bancários regressados das ex-colónias, dado concluir-se que a situação da queixosa era, de facto, especial.

Em resposta, foi recebido do Gabinete da Secretaria de Estado do Tesouro um despacho do mesmo, datado de 19 de Novembro de 1981, do seguinte teor:

Esta Secretaria de Estado não se tem prevalecido da faculdade prevista no protocolo de 15 de Abril de 1976, para efeitos de consideração relevante de eventuais casos específicos, atenta a dificuldade de fixação de critérios adequados.

Nestas circunstâncias, optou esta Secretaria de Estado, por um princípio de segurança, por aplicar o Protocolo nas regras objectivas que contém.

A eventual procedência deste caso por parte desta Secretaria de Estado teria de ser ponderada face às suas repercussões noutras situações que se reclamam igualmente de «específicas».

Assim, a alteração da posição oportunamente tomada por esta Secretaria de Estado ficará dependente da eventual remessa pelo Serviço do Provedor de Justiça de elementos susceptíveis de se concluir estarmos perante um caso extremo, de natureza verdadeiramente excepcional, a reclamar, por isso mesmo, uma revisão da sua solução.

5 — Nesta conformidade, foi novamente salientado pelo Provedor de Justiça que o caso da reclamante era manifestamente especial, dado que a situação da mesma se caracterizava por ter sido vítima de despedimento ilegal, fundado em motivo claramente injusto e inadmissível, à face dos critérios de justiça social vigentes, acrescendo ainda a circunstância de a mesma não ter podido usar dos meios de conciliação e judiciais normais para reagir contra tal decisão de despedimento, peio que se considerava o caso susceptível de revisão por parte daquela Secretaria de Estado.

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6 — Em face desta última diligência do Provedor de Justiça, o Secretário de Estado do Tesouro autorizou, a título muito excepcional, a inscrição da reclamante nas listas para efeitos de ingresso no sistema bancário português.

Processo n.° 81/R-145-A-3

Sumário — Descolonização. Pagamento de transporte de viatura.

Objecto — Recusa de pagamento a um trabalhador bancário, por parte do Banco Borges & Irmão, do transpore do automóvel daquele, de Moçambique para Portugal, aquando do seu regresso.

Decisão — Reclamação atendida.

Síntese:

1 — Um trabalhador bancário regressado de Moçambique queixou-se ao Provedor de Justiça pelo facto de o Banco Borges & Irmão, instituição em que foi integrado, se ter recusado a efectuar o pagamento do transporte para Portugal da sua viatura, pagamento que se encontra previsto na alínea b) do n.° 11 do Despacho Normativo n.° 110/79, de 8 de Maio, que estabelece que compete à instituição integradora o pagamento do transporte de uma viatura automóvel.

Alegava o reclamante que tal recusa por parte do Banco se fundamentava no facto de o envio da aludida viatura se ter verificado mais de 6 meses antes do regresso do mesmo a Portugal.

2 — Foi pelo Provedor de Justiça exposto o caso ao conselho de gestão do Banco, chamando a atenção para a citada restrição, que não se contém no despacho referido, e solicitando informação sobre as razoes que teriam levado ao seu estabelecimento, designadamente se tal restrição teria sido confirmada por despacho ministerial.

3 — Em resposta, foi recebida a informação de que a restrição em causa havia sido estabelecida em reuniões de gestores da banca com o pelouro do pessoal do Banco de Portugal, não constando dessas reuniões os fundamentos das respectivas decisões.

4 — Assim, foi o assunto submetido ao Banco de Portugal, que informou que se entendera que durante o prazo de 6 meses imediatamente posteriores ou anteriores ao regresso do trabalhador funcionava a presunção de que os bens nesse período transportados para Portugal o foram por causa do regresso definitivo dele, conexo com a cessação do respectivo contrato de trabalho na ex-colónia. E, tendo ultrapassado aquele período, deveria o trabalhador fazer prova inequívoca de que a viatura era sua propriedade, comprovando igualmente o referido nexo de causalidade, a fim de poder beneficiar do regime invocado.

5 — Exposta de novo a questão, nestes termos, ao Banco Borges & Irmão, este comunicou que, reanalisada a sua posição e verificado o nexo de causalidade referido, havia sido autorizado o pagamento das despesas com o transporte do automóvel do queixoso.

Direitos fundamentais

Processo n.° 81/R-1758-B-4

Sumário — Direitos fundamentais. Direito de acesso aos documentos oficiais.

Objecto — Recusa de acesso a um relatório elaborado pela Direcção de Fiscalização Eléctrica do Sul na sequência de um acidente verificado na caixa de um elevador.

Decisão — R*eclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — Um cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a Direcção de Fiscalização Eléctrica do Sul alegando o seguinte:

O interessado fora vítima de acidente na caixa de um elevador, e sobre tal acidente elaborara aquela Direcção de Fiscalização Eléctrica um relatório que deveria ter sido enviado à Companhia de Seguros Comércio e Indústria, E. P., a fim de que a mesma pudesse resolver da indemnização que aquele entendia ser-lhe devida.

Todavia, a Direcção de Fiscalização Eléctrica do Sul não enviara o dito relatório à Companhia de Seguros, sob alegação de que esse relatório só podia ser entregue em tribunal.

2 — Para adequada apreciação do problema ouviu-se a Direcção de Fiscalização Eléctrica, a qual remeteu ao Serviço do Provedor de Justiça fotocópia do auto relativo ao acidente sofrido pelo reclamante e esclareceu que:

Não era norma do referido departamento enviar os autos da natureza daquele que estava em causa a qualquer dos intervenientes no processo em litígio, dado o uso indevido que uma das partes dele poderia fazer, admitindo o desconhecimento do mesmo pela outra parte;

A leitura feita pela Direcção de Fiscalização Eléctrica do Sul do artigo 149.° do Decreto-Lei n.° 43 335, de 19 de Novembro de 1960 (na parte em que dispunha que «todo o inquérito a promover [...] deverá sempre ser instruído [...] a pedido das mesmas autoridades»), levara à não permissão do envio do auto em referência às partes interessadas, visto as mesmas não serem reconhecidas como autoridades;

O envio do questionado auto ao Serviço do Provedor de Justiça assentara na interpretação da invocada norma legal, pois tratava-se de uma autoridade.

3 — Considerando, entretanto, as dúvidas suscitadas no processo acerca da interpretação do artigo 149.° do aludido Decreto-Lei n.° 43 335, solicitara a Direcção de Fiscalização Eléctrica do Sul ao Provedor de Justiça que lhe transmitisse o que houvesse conveniente sobre o assunto, para futura tramitação de processos análogos.

E, em resposta, ponderou-se que a posição que se afigurava mais correcta acerca do problema em foco, face ao teor dos artigos 147.° e 149.° do Decreto-Lei n.° 43 335, era no sentido de que estas normas legais não obstavam ao envio do auto em apreço (de certidão ou de fotocópia autêntica dele) à Companhia de Se-

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guros, ou ao próprio interessado, para os devidos efeitos.

Na realidade, o que o mencionado artigo 147.° estabelecia era a obrigatoriedade de as autoridades policiais ou administrativas participarem à Direcção-Geral dos Serviços Eléctricos e à Inspecção-Geral do Trabalho as ocorrências referidas no mesmo preceito legal, enquanto aquele outro artigo 149." se reportava apenas à emissão de parecer técnico pela fiscalização do Governo, a pedido de quaisquer autoridades abrangidas no âmbito do citado preceito normativo.

Assim, e independentemente de as seguradoras constituírem presentemente entidades públicas de natureza empresarial, a circunstância de o parecer técnico a que aludia o invocado artigo 149.° ser emitido a pedido de certas autoridades não impedia que de tal parecer fosse passada certidão ou cópia autêntica a quem nisso demonstrasse possuir interesse legítimo, de acordo com os princípios aplicáveis à passagem daqueles documentos, visto não resultar da mencionada norma legal que o parecer técnico em foco revestisse natureza secreta, confidencial ou reservada.

Nos termos descritos, concluiu-se, pois, que pareciam não existir obstáculos a que do parecer técnico referido no processo em análise fosse dado conhecimento à seguradora, ou, em idênticas condições, ao próprio reclamante, ou a terceiro igualmente interessado (que, assim, também poderá ter acesso ao teor do questionado documento).

4 — Do exposto se deu igualmente conhecimento à Companhia de Seguros interessada, bem como ao reclamante, com vista à adequada resolução do problema suscitado, se realmente tivessem interesse na obtenção da certidão ou cópia autêntica do indicado parecer técnico, e, em seguida, procedeu-se ao arquivamento do respectivo processo.

Processo n.° 81/R-937-B-4

Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ambiente e qualidade de vida. Indústria incómoda.

Objecto — Instalação de um estabelecimento industrial numa fracção de um prédio urbano, contrariando a licença de utilização.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

) — Os moradores de um prédio urbano situado em Recoveiro (concelho de Sintra) reclamaram dos incómodos advenientes da laboração de uma fábrica de confecções de roupa instalada no mesmo.

2 — Alertada para a situação pelo Provedor de Justiça, a Câmara Municipal de Sintra constatou que a utilização dessa parte do imóvel não estava a ser feita de acordo com a respectiva licença.

Deliberou, por isso, notificar os proprietários da fábrica para que a encerrassem no prazo de 180 dias.

3 — Esta ordem foi acatada, tendo passado a funcionar no local os escritórios — e não já a fábrica — da empresa em questão.

Processo n.° 81/R-1598-B-1

Sumário — Direitos fundamentais. Direito à intimidade da vida privada.

Objecto — Consentimento dos titulares de licenças de radiotelevisão contemplados em sorteios para a divulgação dos respectivos nomes e moradas.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação.

Síntese:

1 — Um cidadão reclamou contra a divulgação de nomes e moradas dos premiados no concurso da RTP — E. P., intitulado Ou vai ou Taxa, alegando, basicamente, que:

a) A distribuição de prémios aos portadores de

licenças com taxa em dia parecia ilegal, face ao Decreto-Lei n.° 401/79, de 21 de Setembro, uma vez que o vigente regime de licenças impõe que a taxa de utilização deve conservar-se sempre junto do respectivo aparelho;

b) A divulgação de nomes e moradas dos uten-

tes premiados, com ou sem taxa actualizada, seria ofensiva do artigo 33." da Constituição, sendo certo que a Assembleia da República rejeitara uma proposta de lei que visava a publicação dos rendimentos dos cidadãos para efeitos fiscais.

2 — Do estudo das questões suscitadas concluiu-se que:

a) Quanto ao primeiro fundamento invocado, não

assistia razão alguma ao queixoso, visto que os utentes não deixam de conservar a documentação relativa ao pagamento de taxas devidas pela utilização do serviço público de radiotelevisão pelo simples facto de se realizar o concurso e que, obtido o número sorteado, a localização do respectivo utente se processa por meios informáticos, com base em dados existentes nos arquivos ou bancos de dados da RTP, sem necessidade alguma de recurso à documentação em poder dos utentes;

b) O mesmo se não podia dizer a respeito da

segunda razão invocada, porque, embora pudesse, à primeira vista, revelar-se inócua a divulgação posta em causa (nome e morada dos utentes premiados, com ou sem a taxa em dia), o certo é que se não pode esquecer o impacto que a divulgação televisiva dos referidos elementos pode ter acerca do eventual não pagamento da taxa ou do facto do recebimento de determinado prémio. E isto sem o consentimento dos interessados, uma vez que, encontrado o número da licença, se seguia, automaticamente, a divulgação dos nomes e moradas dos utentes designados pelo sorteio;

c) Se o objectivo do referido programa era o de

estimular o pagamento das taxas pelos utentes —sem prejuízo, como é óbvio, do funcionamento dos mecanismos legalmente previstos para os utentes que se hajam es-

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quivado ao cumprimento da obrigação de as pagar—, tal finalidade poderá ser atingida, com respeito pelo desejo de manutenção do anonimato pelos utentes, através da mera divulgação do número das licenças contempladas nos sorteios, a menos que os titulares destas consintam na divulgação dos respectivos nomes e moradas. Poder--se-ia, pois, numa 1.3 fase, divulgar apenas o número da licença. Se fosse possível contactar telefonicamente o respectivo titular e dele obter autorização para divulgar o respectivo nome e morada, passar-se-ia à indicação ou não de tais elementos, com total respeito pela vontade de manter ou não o anonimato; cl) Dar publicidade a nomes e moradas dos utentes premiados, com a indicação de terem ou não a taxa em dia, à margem de qualquer autorização dos interessados, poderá ser prática menos correcta, dados os efeitos decorrentes daquele meio de comunicação social, especialmente se o objectivo a atingir reside, não tanto na divulgação dos nomes dos utentes em falta (caso em que a divulgação poderia ser considerada uma pena suplementar à contemplada no Decreto-Lei n.° 401/79), como em levar os utentes a terem a taxa em dia para poderem receber os prémios sorteados naquele programa. Por seu lado, os utentes terão interesse na aquisição dos prémios, e não, propriamente, na mencionada divulgação. Daí que esta se configure como um elemento manifestamente secundário na situação analisada.

3 — A questão da viabilidade de se respeitar o eventual desejo de manutenção do anonimato dos titulares de licenças de televisão premiados no programa Ou Vai ou Taxa, mediante a divulgação inicial apenas do número da licença contemplada, à qual se seguiria, logo que obtida a autorização do respectivo titular, a fase de divulgação dos nomes e moradas, foi colocada à RTP, salientando-se:

a) O inegável impacto da divulgação daqueles

elementos, à margem do consentimento dos titulares das licenças, os quais podem desejar que não se saiba que receberam prémios;

b) O carácter secundário dos nomes e moradas

dos titulares das licenças, uma vez que por parte da Radiotelevisão Portuguesa, E. P., a finalidade prosseguida através do programa em causa consiste em estimular os proprietários de aparelhos de televisão a manter actualizadas as respectivas licenças — sem prejuízo, portanto, do funcionamento dos mecanismos legalmente estabelecidos para os faltosos — e que o interesse directo dos proprietários reside na possibilidade de serem considerados candidatos aos prémios atribuídos pelo mesmo programa, objectivos esses passíveis de serem alcan-

çados apenas com base nos números das licenças;

c) O facto de a publicidade daqueles elementos, sem a autorização dos interessados, poder ainda ser entendida como aplicação de pena suplementar às previstas no Decreto-Lei n.° 401/79, de 21 de Setembro, porquanto a simples circunstância de ser dado a conhecer pela televisão que não cumpriu a sua obrigação de pagamento da taxa pode ser lesiva da imagem pública do titular da licença carecida de actualização.

4 — A Direcção de Programas da RTP opinou, a propósito, que:

a) Não existiam na RTP significativas reacções

de protesto por parte dos subscritores quanto ao sistema adoptado até então, sendo certo que se optou por uma modalidade agradável e elegante de convite à liquidação de taxas, em vez da aplicação de métodos repressivos que a legislação faculta;

b) Estão os produtores e apresentadores instruí-

dos no sentido de nunca se afirmar publicamente que este ou aquele subscritor «não pagou a taxa», substituindo esta afirmação pela forma eufemística «os nossos serviços não registam ainda o pagamento da taxa, pelo que este subscritor deverá fazer prova de que efectuou o pagamento para efectivamente ganhar o direito ao prémio»;

c) Todos os premiados compareceram ao pro-

grama televisivo, no decorrer do qual são efectivamente distribuídos os prémios, fazendo-o de livre vontade e até com expresso aprazimento;

d) Considerada a invulgar aceitação e popula-

ridade que o programa Ou Vai ou Taxa rapidamente conquistou, e que se traduziu também no elevado e expressivo número de subscritores que voluntariamente se apresentaram a regularizar a situação dos seus receptores de televisão, cria-se ter sido encontrado um processo influente de lembrar aos telespectadores o dever de pagamento da taxa.

A final, a Direcção de Programas, na expectativa de que o procedimento seguido não era susceptível de prejudicar quem quer que fosse, manifestou-se disposta a receber a indicação que o Provedor de Justiça achasse por bem transmitir-lhe a respeito da matéria.

5 — O Provedor de Justiça manteve e comunicou à RTP, a título de sugestão, as observações oportunamente formuladas quanto à necessidade de se respeitar a vontade dos titulares das licenças na divulgação dos respectivos nomes e moradas e determinou o arquivamento do processo.

Processo n.° 80/IP-106-B-1

Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao nome. Objecto — Aportuguesamento por ocasião de registo

em consulado português dos nomes de filhos de

emigrantes nascidos em França.

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Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Um emigrante português em França protestou contra o que entendia ser a ilegalidade —ou mesmo inconstitucionalidade — da actuação do Consulado de Portugal em Lião ao exigir, para efeitos de inscrição no registo civil, a tradução para Fabião e Fabiana dos nomes dos seus dois filhos, os quais, por terem nascido em França, haviam sido registados nos competentes serviços desse país de residência como Fabien e Fabienne.

2 — Estudado o assunto, concluíra-se que o Consulado se limitara a aplicar o disposto nos n.°* 2 e 3 do artigo 128.° do Código do Registo Civil, que determinavam, respectivamente, que os nomes próprios devem ser portugueses ou, quando de origem estrangeira, traduzidos ou adaptados, gráfica e foneticamente, à língua portuguesa, e que só são admitidos nomes próprios estrangeiros, sob a forma originária, se o registando for estrangeiro ou tiver outra nacionalidade além da portuguesa.

Ora, os filhos do queixoso não eram franceses, embora pudessem vir a obter essa nacionalidade por opção.

Esse regime não poderia, de resto, ter-se por ofensivo do artigo 33.°, n.° 1, da Constituição, na medida em que consagra o direito à identidade, englobando o direito ao nome. Esta norma constitucional apenas garante às pessoas o direito a ter um nome e a defendê-lo contra perturbações vindas de terceiros. Mas não obsta à existência de limitações de interesse público à liberdade de escolha do nome.

3 — A verdade, porém, é que, em termos de política legislativa, não se afigurava justo o regime em vigor, o que levou o Provedor a formular ao Ministério da Justiça a recomendação seguinte:

Estabelece o n.° 3 do artigo 128.° do Código do Registo Civil que são admitidos os nomes próprios estrangeiros, sob a forma originária, se o registando for estrangeiro ou tiver outra nacionalidade além da portuguesa.

Sucede, porém, que, além dos casos contidos na referida previsão legal, outros há que com eles têm uma certa afinidade. São todos aqueles em que o registando tem desde o nascimento o direito de adquirir uma nacionalidade estrangeira.

Com efeito, se o referido n.° 3 do artigo 128.° se justifica pelo propósito de não obrigar ao aportuguesamento do nome de um estrangeiro ou de um português com dupla nacionalidade, a verdade é que nos casos que agora se apontam essa situação poderá vir a surgir se os interessados manifestarem a vontade de adquirir outra nacionalidade.

Poder-se-á, todavia, argumentar que sempre, através da naturalização em país estrangeiro (ou, por vezes, de casamento com estrangeiro), se podem verificar alterações de nacionalidade — aquisição singular, ou em regime de dupla nacionalidade, de outra cidadania.

No entanto, afigura-se-nos que os casos em questão são bem mais próximos dos previstos no n.° 3 do artigo 128.° do Código do Registo Civil do que aqueles em que se obtém outra nacionalidade por naturalização ou casamento: é

que tais pessoas já possuem desde o nascimento um elemento de conexão com outro Estado (nascimento no respectivo território ou de pais nacionais desse Estado) que lhes permite, segundo a legislação correspondente, obter a cidadania respectiva através de mera declaração de vontade.

Nesse contexto, teria sentido alargar o âmbito do preceito em causa de forma a evitar, também naqueles casos, uma futura duplicação de nomes e, de qualquer modo, a imposição de um nome aportuguesado a um português que vem a adquirir (perdendo ou não a cidadania portuguesa) uma outra nacionalidade da qual se possa vir a considerar culturalmente mais próximo.

Considera-se que o problema é de ponderar, designadamente tendo em conta a projectada adesão à CEE e a situação de muitos emigrantes portugueses no estrangeiro.

4 — Esta recomendação veio a ter acolhimento na nova redacção dada ao n.° 3 do artigo 128.° do Código do Registo Civil pelo artigo 1." do Decreto-Lei n.° 379/82, de 14 de Setmbro, que passou a admitir os nomes próprios estrangeiros, sob a forma originária, se o registando for estrangeiro, houver nascido no estrangeiro ou tiver outra nacionalidade além da portuguesa, desde que tais nomes sejam admitidos no país da naturalidade ou nacionalidade, conforme os casos.

Processo n.° 80/R-1893-B-1

Sumário — Direitos fundamentais. Direito à saúde. Internamento hospitalar. Identificação.

Objecto — Falta de identificação e de comunicação à família relativa ao internamento hospitalar e posterior falecimento de vítimas de acidente.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — O pai da reclamante, pessoa de 77 anos de idade, desaparecera de casa dela, onde vivia, no dia 25 de Fevereiro de 1980.

Durante vários dias a reclamante tentou saber o que ihe tinha acontecido, através de vários contactos para os Hospitais Civis de Lisboa, o Hospital de S. José, a Polícia de Segurança Pública e o instituto de Medicina Legal.

Todas estas diligências foram, porém, infrutíferas, por em nenhuma dessas instituições constar qualquer referência relativa a pessoa com a identificação do pai da queixosa.

Tendo-o como desaparecido, a interessada procurou saber, através de notícias nos jornais, o que sucedera ao pai, também sem resultado.

Porque, entretanto, lhe referiram que o Instituto de Medicina Legal costumava, ao fim de 2 ou 3 semanas, promover o funeral de indivíduos cujo corpo aí tivesse dado entrada sem identificação, a queixosa de novo se dirigiu a essa entidade, vindo a concluir, pela análise de fotografias e registo de entrada, que fora isso que, de facto, sucedera ao cadáver do seu pai.

Mais apurou, por esse registo, que seu pai dera entrada em 26 de Fevereiro no Hospital de S. José, registado pela PSP como «homem sem fala» e sob o

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n.° 39 520, depois de ter sido vítima de atropelamento por comboio. O internamento hospitalar durara até 16 de Março, data do falecimento.

Dirigindo-se então ao Hospital de S. José, a queixosa obteve a entrega do espólio de seu pai, do qual constavam documentos com a respectiva identificação e até um papel com o nome, morada e telefone dela.

Expôs, por isso, o caso ao Provedor, para que não viessem a repetir-se no futuro situações semelhantes.

2 — Ouvido o Hospital de S. José, este respondeu que, dada a gravidade do estado do doente, a elaboração do processo administrativo fora posterior à ministração dos cuidados médicos que se impunham.

Ccmo o espólio do doente já tivesse sido, entretanto, arrolado e selado, não fora possível proceder à sua identificação.

3 — A PSP, por seu turno, também contactada, viera a arquivar o processo de averiguações suscitado pela interpelação deste Serviço, por ter considerado que o agente que no caso interviera tinha actuado de acordo com as regras aplicáveis.

4 — Não se afigurou satisfatória nenhuma destas tomadas de posição.

5 — Quanto ao Hospital, não pareceu acertado que não se tivesse procurado, através do espólio do doente, conhecer a sua identificação, na base dela se podendo detectar a sua família.

Assim, o doente estivera internado cerca de 20 dias sem poder beneficiar do acompanhamento da família, nem na doença, nem ao falecer. E, devido à mesma ausência de identificação, a família ficara privada de promover o seu funeral.

Por isso, o Provedor recomendou aos Hospitais Civis de Lisboa que em casos destes se passasse, em relação aos doentes internados sem identificação, a procurar apurar este elemento através do respectivo espólio, com vista à comunicação à família.

A recomendação foi aceite, tendo os Hospitais Civis de Lisboa passado a actuar em conformidade com ela.

6 — Quanto à PSP, e também por insistência do Provedor, o respectivo Comando-Geral deu instruções aos seus agentes no sentido de que, quando transportarem ao hospital algum doente em estado de coma, deverão, no acto de admissão, procurar quaisquer documentos ou outros objectos que permitam a sua identificação, promovendo de seguida que os familiares sejam avisados tão brevemente quanto possível.

Processo n.° 82/IP-11-B-1

Sumário — Direitos fundamentais. Direito à saúde.

Tratamento hospitalar. Transferência de doente. Objecto — Transporte indevido de um doente do

Hospital dos Capuchos para o Hospital de Silves. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação. Síntese:

1 — O Provedor de Justiça tomou a iniciativa de mandar abrir processo para averiguação e análise de um relato feito no jornal A Capitai referente à «viagem forçada, por engano, de um doente do Hospital dos Capuchos para o Hospital de Silves».

2 — A pedido do Serviço do Provedor de Justiça, foi realizado um inquérito à ocorrência, tendo-se concluído que o erro na transferência resultou não só

de na mesma sala haver 2 doentes a transferir para localidades com nomes semelhantes — «Silves» e «Sintra» —, como também da rapidez com que se desenrolou a operação e de os doentes serem indicados apenas pelo número da cama, e ainda de os vários intervenientes na operação não terem procedido a controle próprio, confiando em informações anteriores.

3 — Após análise do processo, o Provedor de Justiça entendeu estar-se perante um caso típico de erro derivado de «má organização e mau funcionamento de um serviço público», eventualmente susceptível de provocar efeitos danosos, sem que fosse possível apurar uma responsabilidade baseada em culpa de qualquer dos intervenientes individualmente considerados.

Embora no caso concreto não tivessem resultado daquele erro quaisquer prejuízos para o interessado, a necessidade de prevenir situações semelhantes futuras, em que tais danos pudessem eventualmente ocorrer, levou o Provedor de Justiça a recomendar ao Conselho de Gerência do Hospital dos Capuchos, na linha das preocupações já manifestadas pelo mesmo Hospital no despacho final exarado sobre o processo de inquérito, que fossem emitidas normas genéricas respeitantes à transferência de doentes entre aquele e outros hospitais.

Processos n.°> 81/R-2105-B-I e 81/IP-56-B-1

Sumário — Direitos fundamentais. Liberdade de expressão. Cinema. Pornografia.

Objecto — Cumprimento da legislação em vigor sobre a classificação de espectáculos.

Decisão — Reclamação procedente Punição dos responsáveis pela violação da lei.

Síntese:

1 — Um cidadão protestou em consequência de em determinado cinema do Porto terem sido exibidas numa sessão classificada para 13 anos sequências de amostras de filmes destinados a grupos etários superiores (filmes pornográficos).

2 — Após diligências feitas junto da Comissão de Classificação de Espectáculos e da Direcção-Geral de Espectáculos e do Direito de Autor, foi autuado o sócio gerente da empresa exploradora do cinema em questão, por infracção ao disposto no § 4.° do artigo 36.° do Decreto n.° 42 661, de 20 de Novembro de 1959.

Empresas

Processo n.° 807R-625-A-3

Sumário — Empresas. Revisão do contrato de viabilização.

Objecto — Demora na homologação da revisão de um contrato de viabilização e na assinatura do mesmo. Decisão — Reclamação procedente. Síntese:

1 — Uma empresa de lanifícios dirigiu-se ao Provedor de Justiça em Abril de 1980, referindo que o Fundo de Compensação não havia autorizado a bonificação

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de juros sobre o passivo consolidado e o apoio para fundo de maneio desde 7 de Maio de 1979, data em que estava prevista a assinatura da revisão do contrato de viabilização, assinatura que se não tinha concretizado devido a contencioso existente entre o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e a Caixa Geral de Depósitos, a que a empresa era alheia.

Para além disso, a empresa referia que também não beneficiara das bonificações previstas na circular n.ü 106 do Banco de Portugal.

2 — Exposto o assunto ao Banco de Portugal, este informara que tal contrato (revisão), no caso de ter sido proferido despacho ministerial favorável, deveria estar concluído no prazo de 15 dias, mas que, provavelmente, aquele prazo não seria cumprido, por falta de acordo das instituições de crédito intervenientes quanto à manutenção dos seus créditos sobre a empresa.

Relativamente à concessão das bonificações ao abrigo da circular n.u 106 do Banco de Portugal, o mesmo informou que tais bonificações, não fazendo parte da figura do contrato, não tinham chegado a ser solicitadas pela empresa, pelo que o Provedor de justiça sugeriu à empresa que o fizesse, o que se verificou.

3 — Dado que persistia a demora na homologação e assinatura do contrato, foi por várias vezes exposto o caso ao Ministério das Finanças e do Plano, tendo sido recebida resposta, em Março de 1981, de que o atraso se devia à indefinição por parte da empresa quanto ao esquema de apoios a serem prestados, nomeadamente financiamento ao abrigo da linha de crédito do Banco Mundial e subsídio da Secretaria de Estado do Emprego, e à necessidade de se ajustar o plano de recuperação aos valores reais de 1980, os quais constavam do balancete relativo a 31 de Dezembro daquele ano, e que só naquela altura havia sido entregue ao Banco Totta & Açores pela empresa.

4 — Finalmente, em Março de 1982 foi recebida a informação do Gabinete do Secretário de Estado das Finanças de que havia sido homologada, por despacho deste, datado de 9 daquele mês, a revisão do contrato e, assim, atendida a pretensão da interessada.

Em préstimo

Processo n.° 78/R-2385-A-2

Sumário — Empréstimo. Taxa de juro. Retroactividade. Objecto—Aplicação das taxas de juro fixadas pelo

Despacho Normativo n." 185/77 aos contratos de

empréstimo antes dele celebrados. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não

acatada. Comunicação à Assembleia da República. Síntese:

1 —O queixoso celebrara em 1974 vários empréstimos caucionados por uma apólice de seguro de vida, constando dos respectivos contratos que os mesmos eram celebrados por tempo indeterminado (só cessando por morte do devedor, pelo pagamento da dívida ou por falta de pagamento dos juros) e que o juro devido era de 4 %, sem qualquer menção à sua eventual alteração.

Em 1977, porém, passara a ser-lhe exigido o juro de 15,5 % (com a indicação de que no próximo vencimento este subiria para 20,5 %), isto em execução do Despacho Normativo n.° 185/77, de 8 de Setembro, do Secretário de Estado do Tesouro, que viera dispor que os juros dos empréstimos caucionados por apólices de seguro de vida passariam, mesmo em relação aos contratos anteriormente celebrados, a ser iguais à taxa básica do Banco de Portugal acrescida de 2,5 %.

Porque entendia que fora violado o que estipulava contratualmente, o interessado pediu a intervenção do Provedor de justiça.

2 — Ouvida sobre o assunto, a Secretaria de Estado do Tesouro defendeu a legalidade do Despacho n.° 185/77, alegando, por um lado, que este diploma continha disposição genérica provinda de órgão para tanto competente e que a mesma não era retroactiva, visto nela se especificar que, em relação aos empréstimos já existentes, a nova taxa só se aplicaria a partir do pró/.imo vencimento de juros e desde que tivessem decorrido 60 dias sobre a data do despacho.

E comentava, a propósito, que «desde tempos imemoriais, e no nosso direito desde D. Afonso 131, o legislador interferiu directamente no montante dos juros, remontando já ao direito canónico o debate sobre a legitimidade dos mesmos».

3 — Não tendo por convincente esta argumentação, o Provedor de Justiça formulou ao Secretário de Estado do Tesouro a seguinte recomendação:

a) Pelo Despacho Normativo n." 185/77, de 8 de Setembro, de S. Ex." o Secretário de Estado do Tesouro, foi determinado que a taxa de juro a aplicar aos empréstimos ou adiantamentos sobre apólices do ramo «Vida» passasse a ser igual à taxa de desconto do Banco de Portugal acrescida de 2,5 %, e que a nova taxa só seria aplicada aos empréstimos ou adiantamentos existentes a partir do próximo vencimento dos juros e desde que houvessem decorrido 60 dias a contar daquela data.

b) Nesses contratos, encarados doutrinalmente como empréstimos, com pagamentos antecipados e entrega aos contraentes de parte das suas reservas matemáticas, a existência de juros é explicada pela expectativa de descapitalização das reservas pelas seguradoras, a fim de fazerem face a compromissos futuros.

c) Não sendo elemento específico dos contratos, os juros estão sujeitos a alterações decorrentes da lei geral, entendida como categoria das leis ordinárias na qual se integram as leis propriamente ditas, normas emanadas da Assembleia da República [artigo 122.°, n.ü 2, alínea c), com referência aos artigos 164.° e 167.°, da Constituição da República] e os decretos-leis, normas emanadas do Governo [artigo 122.", n.° 2 .alínea /), conjugado com o artigo 201,°, da Constituição].

d) Da informação prestada pelo Gabinete de V. Ex.a constata-se a inexistência de base legal atributiva de competência ao Executivo para proceder a alterações destas taxas de juro.

e) São, por outro lado, irrelevantes os argumentos invocados acerca dos usos ou práticas costumeiras na matéria face ao disposto no artigo 3.°, n.° 1, do Código Civil, e relativamente à

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pretendida identificação do «legislador» com o «Secretário de Estado do Tesouro», sabido que o detentor da competência legislativa é o Governo (artigo 201.° da Constituição), e não os membros que o integram.

/) Os despachos normativos estão inseridos na categoria dos regulamentos do Governo [alínea f) do n." 2 do artigo 132." da Constituição], enquanto actos genéricos de execução permanente ou sucessiva, muito embora nem sempre contenham regulamentos, pois que podem limitar-se a interpretar, esclarecer ou aplicar um preceito legal. Requerem, por conseguinte, a existência de diploma legal.

g) Ora, não existindo tal diploma a facultar ao Secretário de Estado do Tesouro a alteração daquela taxa, nem tendo sido prevenida contratualmente a alteração, resultam, desde logo, ofendidos pelo Despacho Normativo n.° 185/77 os artigos 404." e 406.", n.° 1, do Código Civil e até, segundo alguns, o artigo 201° da Constituição.

h) Daí que se imponha a revogação do referido despacho normativo, ferido que se encontra de ilegalidade e mesmo, porventura, de inconstitucionalidade orgânica.

Termos em que o Provedor de Justiça formula, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 18." da Lei n." 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:

Carecendo o Despacho Normativo n." 185/77, de 8 de Setembro, da indispensável base legal de apoio, e ofendendo, por tal motivo, as disposições dos artigos 405." e 406.°, n.° 1, do Código Civil, e mesmo, porventura, do artigo 201." da Constituição Política, deve esse diploma ser revogado pelo Secretário de Estado do Tesouro.

O Secretário de Estado do Tesouro não aceitou esta recomendação, alegando, essencialmente, que o Decreto-Lei n." 180/70, de 25 de Abril, atribuíra ao Ministro das Finanças competência para fixar as taxas de juro, e que o Secretário de Estado do Tesouro teria, por força do artigo 2." do Decreto-Lei n.° 41 824, de 13 de Agosto de 1958 (como, aliás, os demais secretários de Estado), poderes para praticar todos os actos da Administração que entram nas atribuições legais dos ministros.

O Despacho Normativo n.° 185/77 teria, assim, cobertura legal suficiente, por isso não ofendendo os artigos 405." e 406." do Código Civil nem o artigo 201.° da Constituição.

5 — Face a essa resposta, pediu-se a 31 de Outubro indicação do eventual despacho de delegação do Ministro das Finanças sobre a matéria em causa, bem como esclarecimento da razão por que não fora utilizada a forma de portaria, exigida no próprio Decerto-Lei n.° 180/70, invocado pelo departamento em questão.

6 — Depois de múltiplas insistências, só em 3 de Dezembro de 1981 o então Secretário de Estado do Tesouro respondeu, referindo que não via possibilidade, na altura, de dar seguimento à recomendação do Provedor, não só «pelas possíveis repercussões daí advenientes, aliás de extensão indeterminada», como também atendendo ao «lapso de tempo entretanto decorrido sem que até à data o Governo tenha reconhecido a utilização de instrumento jurídico inadequado».

7 — Não considerando aceitável esta posição, o Provedor expôs o assunto à Assembleia da República em Setembro de 1982, ponderando, designadamente, que:

a) O atraso no tratamento do assunto não deveria

ser invocado para o não reapreciar, visto que ele era da responsabilidade da própria Secretaria de Estado do Tesouro;

b) As eventuais repercussões financeiras do pro-

blema deveriam ter sido oportunamente tidas em conta pelo Governo;

c) O Despacho n.° 185/77 violou frontalmente o

Decreto-Lei n.° 180/70, que exigia a fixação de novas taxas de juro mediante portaria;

d) Aliás, mesmo uma portaria emanada nesses

termos não poderia, sob pena de retroactividade, aplicar-se aos contratos antes celebrados e que não previssem tal alteração da taxa de juro;

e) Isto tendo em conta o princípio do cumpri-

mento pontual dos contratos, consagrado no artigo 406.° do Código Civil, e o facto de o próprio Decerto-Lei n.° 180/70 apenas declarar que entrava «imediatamente em vigor», não se lhe atribuindo, pois, eficácia retroactiva.

8 — Desconhece-se o seguimento que o asunto tenha merecido na Assembleia da República.

Ensino

Processo n.° 77/R-431-B-4

Sumário— Instalações escolares. Ocupação. Objecto — Falta de pagamento de indemnização. Decisão—Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — A proprietária de um prédio rústico apresentou em Março de 1977 queixa referindo que particulares, ao que parece sob o patrocínio ou colaboração dos presidentes da Junta de Freguesia de Ranhados e da Câmara Municipal de Viseu, haviam ocupado em 1975 o referido terreno sem qualquer autorização, onde construíram um edifício, que mais tarde foi destinado ao funcionamento de uma escola primária.

Teriam sido infrutíferas todas as diligências que desde a ocupação a queixosa fizera junto da Câmara Municipal de Viseu e dos ministérios competentes no sentido de lhe ser devolvida a sua propriedade ou de lhe ser paga a indemnização devida pela expropriação.

2 — Analisado o assunto, confirmou-se que se verificara, de facto, a ocupação referida por iniciativa de uma comissão de moradores.

Encontrava-se ali uma escola primária, construída pelos moradores da zona, com o apoio, em material, da Câmara Municipal de Viseu.

Estando a escola instalada e a funcionar normalmente, pareceu uqe seria socialmente indesejável proceder-se à sua extinção.

Mas considerou-se inaceitável que a queixosa não tivesse sido entretanto compensada dos prejuízos sofridos.

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Detectou-se, aliás, uma assinalável morosidade da Administração na resolução do caso, tendo o mesmo sido sucessivamente remetido de departamento para departamento entre 5 ministérios.

3 — O Provedor centrou as suas diligências na Câmara Municipal de Viseu e nos Ministérios da Educação e Cultura e da Habitação e Obras Públicas.

Depois de repetidas insistências e de novo protelamento da questão —em parte, devido a dificuldades orçamentais e a divergências sobre os montantes das verbas a pagar—, o Estado acabou por atribuir à interessada a indemnização tida por ajustada ao desapossamento do terreno de que fora alvo. E a Câmara Municipal de Viseu passou a pagar-lhe uma renda pela utilização do imóvel em que a escola funcionava.

Expropriação

Processo n.° 81/R-1370-B-4

Sumário — Expropriação. Fase judicial.

Objecto — Atraso na remessa a tribunal dos processos de expropriação.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Um cidadão queixou-se do facto de a Câmara Municipal de Setúbal não remeter a tribunal um processo relativo à expropriação de um terreno de sua propriedade.

Esta situação causava-lhe grave prejuízo, pois, por um lado, não podia dispor do terreno a expropriar, mas, por outro, tardava o recebimento da indemnização que lhe era devida.

2 — Analisada a reclamação, concluiu-se haver toda a vantagem em que o artigo 70.° do Código das Expropriações fosse alterado por forma a ser fixado um prazo limite para a remessa dos processos de expropriação a tribunal, sob pena de os interessados poderem pedir, em caso de desrespeito do prazo, a anulação da própria expropriação.

Feita adequada recomendação ao Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, este comunicou ter sido introduzida tal alteração no projecto de revisão do Código das Expropriações (4).

3 — No caso concreto que dera origem ao processo, a Câmara Municipal de Setúbal acabou, após insistência do Provedor de Justiça, por remeter ao tribunal da comarca os respectivos processos expropriativos.

4 — Foi, em consequência, arquivado o processo.

Processo n.° 79/R-152-B-4

Sumário — Expropriação. Terreno com aptidão agrícola.

Objecto — Revogação do despacho que declarou a utilidade pública da expropriação.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

(4) V. hoje Decreto-Lei n." 134/63, de 12 de Abril.

Síntese:

1 — Um munícipe de Oliveira de Azeméis protestou pelo facto de em 20 de Maio de 1978 ter sido decla rada a utilidade pública, com vista à construção de uma escola, de um terreno seu abrangido pelo regime do Decreto-Lei n° 356/75, de 8 de Julho, por ter capacidade agrícola defendida por esse diploma, nãc podendo, por isso, ser aplicado para outros fins.

2 — Ouvida a Câmara Municipal respectiva, entidade expropriante, a mesma respondeu que tivera de promover a expropriação por o interessado se ter recusado a vender amigavelmente o prédio rústico e que a exploração agrícola deste decerto não teria sequência, por estar a cargo de um casal idoso cuja filha estava a estudar e não iria dedicar-se à agricultura.

3 — Porque estas considerações não invalidavam a alegação de violação do Decreto-Lei n.° 356/75, este Serviço ouviu a Direcção-Geral das Construções Escolares e a Secretaria de Estado das Obras Públicas, as quais esclareceram que a declaração do terreno como tendo capacidade agrícola defendida fora posterior a declaração de utilidade pública, mas entenderam que, face a esse novo elemento, a Câmara Municipal deveria suspender a expropriação.

4 — De novo auscultada a Direcção-Geral das Construções Escolares acerca da sua posição quanto à revogação da declaração de utilidade pública do imóvel em causa, esta remeteu ofício, qw. recebera em 17 de Julho de 1979 da Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola, afirmando que aquele possuía «capacidade de uso não defendida pelo Decreto-Lei n.° 356/75».

E, tendo também recebido a mesma comunicação, a Câmara Municipal, que, entretanto, suspendera o processo de expropriação, veio perguntar ao Provedor se não considerava que, face a este novo elemento, poderia retomar tal procedimento.

5 — Dada a discrepância de posições da entidade competente para classificação dos terrenos, este Serviço voltou a consultar a Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola, que, enviando então um técnico ao local, veio a reconhecer (e lamentar) a inexactidão da segunda informação prestada; o terreno do queixoso tinha mesmo capacidade agrícola defendida nos termos do Decreto-Lei n.° 356/75.

6 — De novo posta perante esta siutação, a Direcção--Geral das Construções Escolares mostrou-se pronta a promover a revogação da declaração de utilidade pública do imóvel. Mas pediu ao Provedor que lhe indicasse para tanto quem deveria considerar como «terceiro interessado», para efeitos de ser conseguida a sua anuência a tal revogação, visto a declaração de utilidade pública ser acto constitutivo de direitos e ter já decorrido mais de um ano sobre a sua publicação.

7 — O Provedor esclareceu que, em seu entender, apenas o expropriante tinha, face à declaração de utilidade pública, a qualidade de «terceiro interessado».

Designadamente, a autarquia, que figurara como autoridade expropriante, não seria «beneficiário em nome próprio, pois surgiria como simples agente ou instrumento de realização de um interesse público protegido por lei» (Marcelo Caetano, Manual, t. n, 8.° ed., p. 952).

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8 — Em consequência, e depois de obtida a concordância do queixoso, foi revogada a declaração de utilidade pública contra a qual se insurgira.

Fornecimento de água a energia

Processo n.° 81/R-1189-B-4

Sumário — Fornecimento de água e energia. Canalizações de água. Ramais de ligação dos prédios à rede geral.

Objecto — Exigência indevida de encargos respeitantes à substituição de ramais de ligação de prédios à rede geral de abastecimento de água.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação atendida.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a Câmara Municipal do Sabugal, alegando que a mesma, estando a proceder à obra de renovação da rede de distribuição domiciliária de água àquela vila, em virtude de a rede existente já não se encontrar em condições de adequado funcionamento face às exigências da distribuição domiciliária, vinha exigindo aos proprietários dos prédios servidos pela rede anteriormente instalada o pagamento dos encargos inerentes à construção de novos ramais de ligação desses prédios à nova rede.

2 — Ouvida sobre o assunto, a Câmara Municipal comunicou que a obra de renovação em apreço resultava do facto de a rede de distribuição domiciliária de água anteriormente instalada ser muito antiga e de o material de que era feita a respectiva canalização não suportar já a pressão da água, por se encontrar deteriorado.

Acrescentou ainda que a sua actuação no tocante à exigência dos encargos a que aludia o reclamante se baseava no Regulamento do Serviço de Abastecimento de Água do Concelho do Sabugal, aprovado por portaria de 11 de Julho de 1968, uma vez que o respectivo artigo 8." estabelecia, na sua última parte, que, «quando por motivo de renovação ou de aumento de calibre da rede pública houver que remodelar ou renovar ramais de ligação, as despesas inerentes serão de conta dos proprietários ou usufrutuários dos prédios respectivos, revertendo para estes os materiais recuperáveis».

3 — Apreciado o assunto à luz dos preceitos normativos aplicáveis, concluiu-se que:

a) De acordo com o n.° 39 do Regulamento Geral

de Abastecimento de Água, aprovado pela Portaria n.° 10 367, de 14 de Abril de 1943, na redacção que lhe foi dada pela Portaria n.° 10 934, de 18 de Abril de 1945, a instalação dos ramais de ligação dos prédios à rede geral de abastecimento de água é efectuada pela entidade responsável pelo serviço de distribuição de água, por conta dos proprietários ou usufrutuários dos prédios a servir;

b) Nos termos do n.u 56 do invocado Regula-

mento Geral, compete à entidade responsável pelo serviço de distribuição de água manter, por sua conta, as canalizações da rede geral de distribuição e os ramais de ligação «em estado de permitirem o abas-

tecimento de água de todos os consumidores e utilizações de serviço público, providenciando com a maior urgência logo que tenha conhecimento de quaisquer avarias que prejudiquem esse abastecimento»;

c) Face ao alcance dos artigos 1.° e 2.° do De-

creto-Lei n.° 29 216, de 6 de Dezembro de 1938, e dos n.os 37 e 38 do Regulamento Geral de Abastecimento de Água, aprovado pela Portaria n.° 10 367, será perfeitamente legítima — e fora de qualquer dúvida — a aplicação do estatuído no n.° 39 (redacção actual) do mesmo Regulamento Geral não só à instalação inicial dos ramais de ligação dos prédios à rede geral de abastecimento, mas também a outras situações em que se torne necessária a execução de novos ramais de ligação por motivos imputáveis aos proprietários ou usufrutuários dos prédios (v. g., em virtude de remodelação destes últimos ou das suas canalizações interiores);

d) Nada se afigura autorizar a ilação de que en-

tendimento semelhante ao exposto na alínea anterior deva ser acolhido na hipótese de renovação ou substituição dos citados ramais de ligação por razões não imputáveis aos proprietários ou usufrutuários dos prédios, como acontecerá no caso de deterioração ou avaria a que eles sejam totalmente alheios, ou na hipótese de renovação ou remodelação da rede geral de distribuição de água por iniciativa da entidade responsável pelo respectivo serviço, pois isso equivaleria a fazer recair sobre tais proprietários ou usufrutuários o encargo de conservação dos ramais de ligação em estado de permitirem o abastecimento de égua;

e) Havendo sido intenção declarada no preâm-

bulo da Portaria n.° 10 367, e decorrendo do n.° 56 do Regulamento Geral por ela aprovado, que o encargo de conservação dos ramais de ligação dos prédios à rede geral de abastecimento deverá ser suportado pelos serviços de distribuição de água, caberá à entidade responsável pelo respectivo serviço —não constituindo, pois, encargo dos proprietários ou usufrutuários dos prédios servidos — custear a remodelação ou renovação dos mesmos ramais de ligação, seja por motivo de sua avaria ou deterioração (não imputável aos proprietários ou usufrutuários dos prédios), seja em resultado de renovação ou aumento de calibre da rede pública de abastecimento de água;

/) Pelas razões expostas, a última parte do artigo 8.° do Regulamento do Serviço de Abastecimento de Água do Concelho do Sabugal, aprovado por portaria de 11 de Julho de 1968, não encontrava suporte normativo nas disposições do Decreto-Lei n.° 29 216 e do Regulamento Geral de Abastecimento de Água, aprovado pela Portaria n.° 10 367 (e alterado no seu n.° 39 pela ulterior Portaria n.° 10 934).

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4 — Acerca das conclusões alcançadas no estudo elaborado sobre o problema, entendeu o Provedor de Justiça dever ouvir o Ministério da Habitação, Obras Públicas e Transportes, o qual comunicou, através da Secretaria de Estado das Obras Públicas, que, em face das disposições legais em vigor, a Direcção-Geral do Saneamento Básico vinha entendendo que a substituição dos ramais de ligação dos prédios à rede geral de distribuição de água por causas não imputáveis aos utentes constituía encargo da entidade que detenha a exploração do respectivo serviço.

5 — Dada a concordância do entendimento partilhado pela citada Direcção-Geral com as conclusões do estudo efectuado no Serviço do Provedor de Justiça, o Provedor formulou então à Câmara Municipal do Sabugal recomendação no sentido de que:

Fosse eliminada a parte final do artigo 8.° do Regulamento do Serviço de Abastecimento de Água do Concelho do Sabugal, por não se harmonizar com as disposições normativas aplicáveis ao assunto;

Não fossem exigidos aos proprietários dos imóveis servidos pela rede de abastecimento de água os encargos mencionados no processo, respeitantes à substituição dos ramais de ligação, por motivo da obra de renovação da rede de distribuição domiciliária de água.

6 — Em resposta, a Câmara Municipal do Sabugal transmitiu ulteriormente que havia tomado deliberação no sentido que lhe fora recomendado pelo Provedor de Justiça e, bem assim, que havia resolvido que as importâncias já cobradas a alguns munícipes lhes fossem restituídas ou, em alternativa, que fossem utilizadas para pagamento dos ramais de esgotos, fazendo-se posteriormente o acerto de contas, quer a favor da Câmara Municipal, quer a favor dos interessados.

Acrescentou ainda que com a mencionada deliberação concordara a Assembleia Municipal.

Ficou, assim, solucionado o problema em causa.

Processo n.° 81/R-2106-B-4

Sumário — Fornecimento de água e energia. Consumo de gás. Recibo de pagamento de factura.

Objecto — Recusa de entrega de documento comprovativo do pagamento de uma factura de consumo de gás cujo recibo fora extraviado pelo cobrador.

Decisão — Reclamação controvertida. Situação atendida pela entidade reclamada.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a empresa pública Electricidade de Portugal (EDP), E. P., alegando fundamentalmente o seguinte:

Em Abril de 1979, um cobrador daquela empresa pública extraviara um recibo que devia entregar ao impetrante e cuja importância já tinha sido paga. No próprio dia, o interessado dirigiu-se à sede da Electricidade de Portugal (EDP), E. P., onde deu conhecimento do sucedido e solicitou as providências ade-

quadas, havendo-lhe sido dito que o problema seria resolvido.

Sem embargo, porém, daquela diligência, bem como de várias outras que efectuara posteriormente (umas vezes por escrito e outras pessoalmente), a referida empresa pública ainda não tinha solucionado o assunto, pelo que continuava o interessado a não dispor de um documento comprovativo do pagamento da importância em causa, o que lhe ocasionava incómodos e prejuízos (já lhe fora, v. g., cortado por duas vezes o fornecimento de gás sem aviso prévio).

2 — Para adequada elucidação do problema solicitou o Serviço do Provedor de Justiça à empresa pública visada os esclarecimentos considerados úteis a propósito do assunto, havendo ponderado que, a confirmarem-se os factos expostos pelo reclamante, impor--se-ia que a questão fosse convenientemente solucionada, de modo a evitar novos e futuros problemas aos interessados.

3 — Em resposta, a Electricidade de Portugal (EDP), E P., comunicou que, decorridos 2 anos e meio sobre o acontecimento, era praticamente impossível averiguar o que realmente se teria passado; no entanto, era difícil admitir que o cobrador da EDP recebesse o valor correspondente a um recibo não o entregando no acto e também que o mesmo recibo não fosse reclamado pelo cliente que acabara de efectuar o seu pagamento.

Tal recibo continuava a figurar nos balanços mensais dos serviços da empresa pública como estando em débito.

Todavia, e não obstante não estar provado o pagamento da importância em causa, não era intenção da Electricidade de Portugal (EDP), E. P., prolongar o diferendo existente, pelo que passava a considerar como liquidado o recibo em apreço e disso dera já conhecimento ao interessado.

4 — Face à resolução dada ao problema suscitado, procedeu-se, pois, ao arquivamento do respectivo processo.

Processo n.° 82/R-51-B-4

Sumário—Fornecimento de água e energia. Estimativa de consumos.

Objecto — Facturação de consumos de água por estimativa muito desproporcionada em relação aos valores do consumo normal.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Porto, alegando que estes lhe vinham facturando e exigindo o pagamento de consumos de água calculados com base em estimativa que se mostrava manifestamente exagerada face ao valor do consumo normal do interessado.

2 — Uma vez colhidos dos referidos Serviços Municipalizados os esclarecimento necessários, veio a apurar-se que.

Os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Porto procuravam facturar apenas os

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consumos registados pelos contadores através de leitura bimestral; Embora não existisse fórmula de cálculo de consumo de água por estimativa, nos casos em que a leitura não podia ser efectuada nem era indicada pelo consumidor, procedia-se então à facturação do consumo por estimativa, em função dos consumos anteriores ou da média dos consumos registados pelo novo contador, na hipótese de ter havido substituição deste último;

Por vezes, em casos excepcionais de continuada impossibilidade de fazer a leitura do contador, os Serviços Municipalizados facturavam consumos para além da média habitual com o intuito de obrigarem o consumidor a facilitar o acesso ao contador. Tratava-se de casos raros, que eram prontamente corrigidos depois de confirmada a leitura;

Na hipótese em foco, e segundo diziam os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Porto, o interessado estava geralmente em casa. mas, por razões desconhecidas, não abria a porta ao leitor de consumos, pelo que a estimativa utilizada para facturação do respectivo consumo visava, precisamente, obrigá-lo a facilitar a leitura do contador;

Posteriormente, em face de leitura fornecida pelo consumidor, fora o mesmo reembolsado da importância que lhe havia sido facturada a mais.

3 — Apreciado o assunto, entendeu o Provedor de fustiça que, se os Serviços Municipalizados não dispunham de norma que definisse expressamente a fórmula de cálculo por estimativa de consumos de água, adequado seria que a estabelecessem, a fim de que os utentes soubessem qual o processo de contagem dos respectivos consumos quando os mesmos não pudessem ser apurados com base na leitura dos contadores (v. g., em caso de paragem ou avaria dos mesmos ou na impossibilidade da sua atempada leitura).

Aliás, apesar de não existir nos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Porto uma expressa norma que dispusesse sobre a fórmula de cálculo por estimativa de consumos de água, nem por isso existia obstáculo a que essa estimativa fosse efectuada com base nos consumos normais dos utentes, como era lógico e razoável e correspondia, afinal, ao procedimento geralmente adoptado pelos mesmos Serviços Municipalizados.

Assim, carecia de lógica e razoabilidade a facturação de consumos para além da média habitual com o objectivo de obrigar os utentes a facilitarem o acesso aos contadores, ainda que em casos excepcionais de continuada impossibilidade de fazer a leitura destes..

Não se discutia, obviamente, a necessidade que os Serviços Municipalizados tinham de controlar os consumos, pelo que deviam lembrar aos utentes essa mesma necessidade, bem como a obrigação de ser facilitado o acesso aos contadores e a consequência que da recusa dessa obrigação podia advir para os consumidores — interrupção do fornecimento de água, segundo o artigo 35.°, alínea e), do Regulamento de Abastecimento de Água.

4 — Nos termos expostos, concluiu o Provedor que os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento

do Porto deveriam abandonar o procedimento acima posto em causa, tanto mais que ele não poderia deixar de causar estranheza aos utentes conhecedores dos seus consumos normais e desconhecedores (como parecia haver sucedido na situação em causa) das razões e objectivos da facturação de consumos muito superiores aos correspondentes às médias habituais.

Do que antecede se deu conhecimento ao reclamante e aos Serviços Municipalizados —mencionando o «reparo» que se entendera merecer o procedimento focado— e, em seguida, procedeu-se ao arquivamento do processo, uma vez que o interessado já havia sido reembolsado da importância facturada a mais e que a entidade visada tinha passado a facturar-lhe apenas c consumo pelo mesmo indicado.

Processo n.° 81/R-1706-B-4

Sumário — Fornecimento de água e energia. Fornecimento de electricidade. Indemnização.

Objecto — Recusa de pagamento dos prejuízos causados a uma propriedade particular com a ocupação de terreno e corte de árvores.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de fustiça uma reclamação contra os Serviços Municipalizados de Viana do Castelo, alegando que estes lhe recusaram o pagamento da indemnização a que entendia ter direito por motivo dos prejuízos que para uma propriedade que lhe pertencia haviam resultado da ocupação de terreno da mesma, com a colocação de postes de sustentação de uma linha de energia eléctrica de alta tensão, bem como da destruição de árvores para constituição de uma faixa de protecção da mencionada linha.

2 — Exposta a situação à entidade visada, esta procedeu ao pagamento ao interessado da indemnização correspondente aos prejuízos que tinham sido causados à sua propriedade, o que levou ao encerramento do caso.

Habitação

Processo n.° 80/R-l 142-A-3

Sumário — Habitação. Bonificação. Retroactividade.

Objecto — Cerceamento do benefício da bonificação de juros a partir do 5.° ano de vigência dos empréstimos para construção ou aquisição de habitação própria e chamada de atenção para o aspecto da retroactividade na aplicação de tal cerceamento.

Decisão — Reclamação parcialmente improcedente. Arquivado por se terem esgotado as possibilidades de intervenção do Provedor de Justiça quanto ao aspecto procedente da reclamação.

Síntese:

1 —Um cidadão dirigiu-se ao Provedor de Justiça, referindo, acerca da bonificação de juros concedida pelo Baneo de Portugal nos 5 primeiros anos de vigência dos empréstimos para construção ou aquisição de habi-

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tacão própria, que deveria tal bonificação perdurar por toda a vida do empréstimo, e não apenas no aludido período.

Referiu ainda o mesmo cidadão que, no caso do empréstimo que contraíra junto do Crédito Predial Português, aquela limitação lhe foi aplicada com efeitos retroactivos, incidindo sobre o empréstimo anteriormente contratado.

2 — Expostas ao Ministério das Finanças e do Plano as duas questões citadas, decidiu este ouvir o Banco de Portugal sobre a matéria.

3 — Por seu turno, o Provedor de Justiça considerou de interesse solicitar informação também ao Crédito Predial Português.

4 — Através das duas informações recebidas, concluiu-se que a limitação no tempo da concessão daquela bonificação encontra a sua justificação não só no facto de ser no período inicial dos referidos empréstimos que se torna mais sentida a dificuldade de pagamento por parte dos utilizadores do crédito, mas também na circunstância de ao fim dos aludidos 3 anos o valor real das respectivas prestações se achar drasticamente diminuído pela acção inflacionista, avultando ainda que o elevado custo dos capitais envolvidos nestes financiamentos não permite a extensão por maior período do benefício social em causa.

Quanto ao aspecto especial focado na reclamação, de a suspensão daquele benefício não dever ser aplicada aos contratos celebrados antes da data de tal medida entrar em vigor, verificou-se, através de fotocopia do contrato de empréstimo do reclamante, que, tendo ele beneficiado daquela bonificação, havia ficado expressamente prevista no contrato a transitoriedade da mesma, o que, portanto, fazia prever a possibilidade de eliminação do benefício, que, de facto, veio a concretizar-se após os 5 anos referidos.

Processo n.° 78/R-l383-B-4

Sumário — Habitação. Casas económicas. Alienação. Objecto — Revogação do regime legal que proibia a

alienação das casas económicas oneradas com casal

de família.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — Um cidadão proprietário de uma casa económica veio queixar-se do facto de lhe não ser possível alienar a mesma por ter constituído um casal de família ao abrigo do Decreto-Lei n.° 23 052, de 23 de Setembro de 1933.

2 — A verdade é que o diploma —Decreto n.° 18 551, de 3 de Julho de 1930 — que havia criado o homestead (casal de família) tinha sido revogado pelo Decreto-Lei n.° 566/75, de 3 de Outubro, diploma este que, além disso, dispensou a obrigatoriedade da constituição de casais de família, isentando de tal obrigação os proprietários de casas económicas que não tinham chegado a constituir casal de família.

3 — Deste modo, com a publicação do Decreto-Lei n.° 566/75, aqueles que não haviam respeitado a lei antes deste vigente, não criando casais de família, passaram a poder alienar as casas económicas de acordo

com o regime do Decreto-Lei n.° 608/73, de 14 de Novembro.

Em contrapartida, os proprietários de casas económicas que, como o queixoso neste processo, haviam cumprido a legislação aplicável, criando casais de família, ficaram prejudicados face aos que não haviam dado execução aos normativos legais.

4 — Dada a flagrante injustiça da situação, o Provedor de Justiça recomendou aos Ministérios da Justiça e da Habitação e Obras Públicas a adequada alteração legislativa.

Esta veio a ser operada com a publicação do Decreto-Lei n.° 329/82, de 17 de Agosto, que eliminou a situação de desigualdade em questão.

Processo n.° 78/R-2546-B-4

Sumário — Habitação. Contrato de desenvolvimento para habitação.

Objecto—Ilegalidade do Despacho Normativo n.° 115/ 78, de 18 de Maio.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Foi levantada neste processo a questão da legalidade no Despacho Normativo n.° 115/78, que estabeleceu a forma de cálculo do valor de venda dos fogos construídos ao abrigo de contratos de desenvolvimento para habitação, no âmbito do Decreto-Lei n.° 412-A/77, de 29 de Setembro.

2 — Concluiu-se que as regras sobre o «valor de venda comercial» dos fogos estabelecidos no despacho normativo não se coadunavam com o regime constante do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 412-A/77 e que as regras sobre o «valor de venda contratual» poderiam, sem prejuízo do disposto na alínea d) do n.° 3 do artigo 10° do mencionado diploma legal, regular os casos em que não estivessem ainda concluídas as negociações para estabelecimento dos valores de venda dos fogos ao Fundo de Fomento da Habitação, no âmbito da garantia de compra a estabelecer nos mencionados contratos

3 — Face à ilegalidade do Despacho Normativo n.° 125/78, reconhecida pelo Ministério da Habitação e Obras Públicas, depois de apreciar as razões expostas pelo Provedor, este solicitou ao mencionado departamento que adoptasse medidas tendentes a reparar a ilegalidade verificada.

4 — Veio, assim, a ser elaborado e publicado o Decreto-Lei n.° 306/81, de 12 de Novembro, de natureza interpretativa, o qual, depois de alterar o mecanismo de fixação do valor de venda dos fogos previsto no despacho normativo em causa, adequando-o ao diploma interpretado, dispôs que as normas se aplicavam a todos os contratos de desenvolvimento regulados pelo Decreto-Lei n.° 412-A/77, quer já tivessem sido assinados, quer se encontrassem em fase de negociação.

Processo n.° 80/R-1098-B-4

Sumário — Habitação. Empréstimo. Agregado familiar. Objecto — Aplicação do conceito de agregado familiar previsto no Decreto Regulamentar n.° 33/79,

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de 7 de Julho, aos contratos de empréstimo celebrados ao abrigo do Decreto-Lei n.° 515/77, de 14 de Dezembro.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.

Síntese:

1 — Um reclamante apresentou queixa pelo facto de a Caixa Geral de Depósitos não aplicar ao contrato de empréstimo por ele celebrado em 7 de Fevereiro de 1979 para aquisição de casa própria o conceito de agregado familiar definido no artigo 3.°, n.° 4, do Decreto Regulamentar n.° 50/77, de 11 de Agosto (conjunto de pessoas que com o interessado vivessem em comunhão de mesa e habitação, ligadas por laços de parentesco, casamento, afinidade e adopção ou noutras situações especiais assimiláveis), o que onerava sobremaneira os seus encargos com o referido empréstimo.

O empréstimo fora contraído no regime especial de juro bonificado constante do Decreto-Lei n.° 515/77, de 14 de Dezembro.

2 — Analisada a reclamação, concluiu-se pela aplicabilidade de tal conceito. E certo que o Decreto-Lei n.° 515/77 não definia qual a composição do agregado familiar com vista a poder-se beneficiar do regime nele instituído. Mas o Decreto Regulamentar n.° 33/79, de 7 de Julho, viera, entretanto, dispor que, para efeitos de aplicação do artigo 2." daquele diploma legal, se consideraria como constituindo o agregado familiar do mutuário o fixado no n.° 4 do artigo 3.° do Decreto Regulamentar n.° 50/77, com exclusão dos hóspedes e dos empregados domésticos.

Esta noção de agregado familiar deveria, pois, aplicar-se a todos os empréstimos abrangidos pelo Decreto--Lei n.° 515/77.

Assim, o Provedor de Justiça recomendou à entidade visada que actuasse de acordo com este critério.

3 — Ponderou-se, designadamente, que, embora celebrado antes da publicação do Decreto Regulamentar n.° 33/79, o empréstimo em questão deveria ser abrangido pela noção de agregado familiar para que este remetera.

De facto, como o Decreto-Lei n.° 515/77 não definia o que se entendia por agregado familiar, para efeitos da sua aplicação, se o critério estabelecido no Decreto Regulamentar n.° 33/79 se não aplicasse a todos os contratos celebrados ao abrigo daquele decreto-lei (mesmo que anteriores à publicação deste diploma regulamentar), chegar-se-ia a uma situação injusta e incongruente. Isto é, na vigência e na aplicação do mesmo Decreto-Lei n.° 515/77 utilizar-se-iam dois conceitos diversos de agregado familiar e haveria, assim, empréstimos contraídos nos termos do Decreto-Lei n.° 515/ 77, para os quais não relevaria, afinal, a noção de agregado familiar mandada aplicar pelo Decreto Regulamentar n.° 33/79.

4 — Louvando-se num despacho do Secretário de Estado do Tesouro de 23 de Janeiro de 1978, que determinava que o conceito de agregado familiar a ter em conta seria o constante de um seu despacho de 19 de Abril de 1976 —e que abrangia apenas o cônjuge e filhos do mutuário—, a entidade visada não acatou a recomendação.

5 — Colocado o problema ao Secretário de Estado do Tesouro, veio este a concordar com a posição do

Provedor, mas acabou por considerar não dever impor à Caixa Geral de Depósitos tal procedimento, dadas as repercussões económicas que o mesmo teria nos empréstimos concedidos.

6 — Esgotado o poder de intervenção do Provedor de Justiça, foi o processo arquivado.

Obras

Processo n.° 79/R-1118-B-4

Sumário — Obras. Licenciamento. Zona protegida. Objecto — Definição de condicionalismos urbanísticos

em zona de protecção. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação

aceite. Síntese:

1 — Um reclamante, proprietário de uma casa situada na zona das muralhas de Buarcos, concelho da Figueira da Foz, apresentou queixa pelo facto de a Câmara respectiva lhe ter indeferido um pedido de licenciamento de obras de beneficiação para a sua casa, que ameaçava ruína.

2 — Ouvida a Câmara, esta respondeu que o indeferimento se ficara a dever ao facto de o imóvel se situar numa zona protegida, tendo, por isso, recebido parecer desfavorável do Instituto Português do Património Cultural, que considerou necessário proceder-se a um estudo detalhado da urbanização da zona de protecção.

3 — Posta perante esta posição, a Câmara Municipal comunicou em Janeiro de 1980 que iria promover a realização desse estudo.

4 — Depois de variadas insistências deste Serviço, a Câmara informou em Junho de 1981 que continuava a não existir o anunciado estudo, pois o mesmo envolvia delicados aspectos técnicos e o Instituto Português do Património Cultural acabara por não fornecer quaisquer directrizes gerais para a respectiva elaboração. Esclarecia, porém, que tendo o interessado, entretanto, dado início às obras que pretendia, as mesmas se tinham de considerar clandestinas, sujeitas, por isso, às correspondentes consequências legais.

5 — O Provedor reconheceu que as obras em questão se tinham de considerar ilegais, estando, por isso, sujeitas a demolição, nos termos do artigo 165.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas.

Mas ponderou também, por um lado, que o queixoso as efectuara praticamente em estado de necessidade, pois a casa ameaçava ruína se as mesmas se não realizassem, e, por outro, que, nos termos do artigo 167." daquele mesmo diploma, as obras poderiam, uma vez definidas as normas aplicáveis à zona, ser legalizadas, desde que a estas se adaptassem.

Sugeriu, por isso, à Câmara Municipal da Figueira da Foz que suspendesse a eventual legalização das obras em causa até à elaboração do necessário estudo urbanístico, condicionando depois tal legalização à adaptação das mesmas às directrizes que viessem a constar desse estudo.

6 — O aludido órgão autárquico veio a deliberar em Setembro de 1982 aceitar esta solução, mandando elaborar as normas orientadoras das construções e reconstruções na zona de protecção das muralhas de Buarcos, normas essas que depois submeteria à aprovação do

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Instituto Português do Património Cultural e da Assembleia Municipal.

E decidiu notificar o reclamante para que adaptasse as obras efectuadas a essas regras, como condição para as mesmas poderem ser legalizadas.

Obras públicas

Processo n.° 81/R-340-B-4

Sumário — Obras públicas. Regulamento.

Objecto—Ilegalidade de disposições de um regulamento municipal de edificações urbanas.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Dirigiu-se a este Serviço um grupo de técnicos que desenvolve a sua actividade no campo dos projectos e da execução de obras de construção civil no concelho de Coruche, apontando ilegalidades no novo Regulamento Municipal de Edificações Urbanas.

Assim:

a) O artigo 8.° limitaria indevidamente o número

de responsabilidades de obras a assumir no prazo de um ano. Essa limitação seria indevida c restritiva da valorização na profissão liberal que exerciam. Adequado seria antes o condicionamento da subscrição, simultaneamente, de mais que certo número de projectos ou o da assunção, também simultânea, de mais que determinado número de responsabilidades de obras;

b) O artigo 10." deveria estabelecer que as habi-

litações para a subscrição da ficha electrotécnica se regulassem pelas disposições do Decreto-Lei n.° 229/76, de 1 de Abril (projectos de instalações eléctricas);

c) As declarações referidas no artigo 12.° e no

n.° 3 do artigo 14.° (nos termos do § 1.° do artigo 6." do Decreto-Lei n.° 166/70, de 15 de Abril) deveriam, face à Tabela Geral do Imposto do Selo, estar isentas de ser apresentadas em papel selado.

2 — O Provedor, considerando justificadas estas pretensões, expô-las, com o seu apoio, aos órgãos autárquicos do Município de Coruche.

3 — Reconhecendo fundada a reclamação, a Câmara e a Assembleia Municipais de Coruche alteraram no sentido pretendido as normas do Regulamento Municipal de Edificações Urbanas.

Polícia

Processo n.° 81/IP-84-B-1

Sumário — Polícia. Identificação.

Objecto — Delimitação dos casos em que particulares podem ser abrangidos em operações de rusga policial, com a consequente condução à esquadra.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação atendida.

Síntese:

1 — O Provedor de Justiça tomou a iniciativa de mandar abrir um processo tendo como base uma notícia publicada no jornal O País, de 10 de Julho de 1981, relacionada com rusga pol:cial na Travessa da Conceição da Glória. Posteriormente foi anexada ao processo documentação relacionada com um requerimento do deputado Magalhães Mota ao Ministro da Administração Interna, que tinha como anexo a carta de um leitor publicada no Diário Popular, de 29 de Junho de 1981, em que este se insurgia contra operação da mesma natureza, de que teria sido vítima na Rua do Terreiro do Trigo, perlo de Alfama. Em ambos os casos teria havido condução a esquadras policiais, com libertação após algumas horas de permanência nas mesmas.

2 — Ouvido sobre a matéria o Comando-Geral da Polícia de Segurança Pública, veio este aduzir o seguinte:

2.1 —As operações de rusga são determinadas pelos comandos distritais nas respectivas áreas de jurisdição para cumprimento do disposto no artigo 3.°, n.05 3.°, 4.ü, 6.°, 7.°, 10.° e 11.°, do Decreto-Lei n.° 39 497, de 31 de Dezembro de 1953 (Estatuto da PSP).

2.2 — A realização de operações de rusga tem em vista a repressão do consumo e comércio de droga, detenção de indivíduos com mandatos de captura pendentes, localização de indivíduos procurados por autoridades judiciais, captura de evadidos de estabelecimentos prisionais e de desertores, apreensão de armamento em situação ilegal e de armas de agressão.

2.3 — A condução à esquadra é feita sempre que haja suspeição sobre quaisquer indivíduos, mesmo que portadores de bilhete de identidade, dado só ali ser possível consultar os respectivos ficheiros.

3 — Analisada a matéria, coricluiu-se que este tipo de actuação policial, para além de constituir, na realidade, um vexame social para os visados, quando inocentes, põe em causa os direitos fundamentais dos cidadãos, tal como consignados na Constituição da República, e o próprio regime constitucional aplicável ao exercício de medidas de polícia, as quais, nos termos do n." 2 do artigo 272.°, não devem ser utilizadas para além do estritamente necessário.

Outros países, em que o problema também se tem colocado revelam maior preocupação que a da nossa legislação vigente no estabelecimento de limites adequados a este género de actuação policial. Assim, na França, a Cour de Cassation, em decisão de 5 de Janeiro de 1973, decidiu:

Les pouvoirs de police administrative, s'ils permettent, quand des circonstances particulières l'exigent, de procéder à des vérifications d'identité, n'autorisent pas à retenir, fût-ce provisoirement, des personnes qui n'ont commis aucune infraction ou qui ne sont pas soupçonnées d'en avoir commis.

Erra França a esta regra só se admitem as excepções do flagrante delito e da investigação judiciária (Lan-glois, Guide du citoyen face à la police, Seuil, pp. 24

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e segs.). Também no Reino Unido a jurisprudência e doutrina têm exigido, para que actos destes sejam legais, que haja reasonable grounds for suspecting que os visados sejam responsáveis ou se preparem para actuações delituosas (V. B. Cox, Civí7 Liberties in Brltain, pp. 33 e segs.). Enfim, na República Federal da Alemanha tem-se entendido que a condução à esquadra de cidadãos é admissível, sim, mas na medida em que, ao serem abordados pela polícia, não forneçam os seus documentos de identificação ou estes se revelem suspeitos (H. Messmer, Deine Rechte Gegenüber Polizei und Staatsanwalt, pp. 37 e segs.).

4 — Nesta sequência, o Provedor de Justiça recomendou:

1) Ao Ministro da Administração Interna, que a

legislação policial venha a ser alterada no sentido de se especificar que as operações de rusga não deverão envolver quaisquer pessoas que imediatamente se identifiquem devidamente, mas somente aquelas sobre as quais recaiam suspeitas fundadas de haverem cometido delitos ou de os estarem preparando;

2) Ao comandante-geral da Polícia de Segurança

Pública, que, enquanto não for alterada a legislação policial em vigor, sejam emanadas instruções às entidades policiais no sentido de se especificar que as operações de rusga deverão envolver aquelas pessoas.

Ambas as entidades visadas responderam que iriam tomar em consideração as recomendações do Provedor

Pro:esso n.° 81/IP-13-B-1 Sumário — Polícia. Violências

Objecto — Violências ocorridas na esquadra da Mouraria (Lisboa). Decisão — Reclamação procedente. Síntese:

1 — Com base em notícia publicada na edição de 9 de Fevereiro de 1981 do jornal Portugal Hoje, relativa a agressões de que um cidadão teria sido vítima na esquadra da Polícia de Segurança Pública da Mouraria, foi aberto, por iniciativa do Provedor, o processo em epígrafe.

2 — Abordado o Estado-Maior daquela Polícia, veio a apurar-se que a aludida ocorrência originara processos disciplinares —que culminaram com punições de 5 agentes cem penas compreendidas entre 10 e 50 dias de prisão disciplinar—, além das respectivas participações criminais.

Assegurados, assim, os procedimentos impostos por lei, foi determinado o arquivamento do processo.

Processo n.° 80/R-2213-B-1

Sumário — Polícia. Violências. Vinhetas dos Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública.

Objecto — Exigência de pagamento de vinhetas para os Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública como forma de evitar a instauração de procedimento crinrnal.

Decisão — Recomendação. Síntese:

1 — Um cidadão (com o posterior apoio da secção de Cantanhede de um partido político) apresentou queixa contra o comandante do posto da Polícia de Segurança Pública desta localidade pela sua actuação para com aquele primeiro, no dia 28 de Novembro de 1980, quando se realizava um comício de uma das candidaturas à Presidência da República. Sem que o que:xoso, segundo alega, tivesse intervindo em qualquer desacato ou perturbação da ordem pública, ele teria sido por aquele agente da autoridade detido e, já no posto, agredido. Reclamou ainda do facto de então ter sido interrogado sobre a sua filiação política, bem como pressionado a pagar 100$ para que o caso não seguisse para tribunal.

2 — Sobre a matéria da reclamação foi interpelado o Comando-Geral da Polícia de Segurança Pública, que, após averiguações, informou ter o caso dado origem a processo crime instaurado no Tribunal Judicial de Cantanhede.

3 — Assegurado, assim, o procedimento criminal pelas ofensas corporais, entendeu-se que as outras condutas denunciadas justificavam que o Provedor de Justiça levasse mais longe as suas averiguações, pelo que foi solicitado ao delegado do procurador da República na comarca de Cantanhede que sobre as mesmas inquirisse o denunciado.

Dessa diligência não se logrou prova sobre a existência de quaisquer indagações relativas à filiação política do reclamante, mas obteve-se cópia da seguinte declaração:

Eu, abaixo assinado (seguem-se os elementos de identificação), declaro, para os devidos efeitos, que ofereço de minha livre e espontânea vontade a quantia de 100$, em virtude de um serviço que me foi resolvido neste posto a meu contento, para não ser submetido a tribunal.

Esclareça-se que tal declaração tinha apostas vinhetas para os Serviços Sociais da Polícia de Segurança Pública daquele montante.

3 — Em face desta declaração, não pôde deixar-se de abordar de novo o Comando-Geral da Polícia de Segurança Pública sobre a base legal de se fazer depender da compra de vinhetas o procedimento judicial, que, aliás, no caso, não terá deixado de se desencadear contra o queixoso.

O Comando-Geral respondeu cora a indicação do diploma legal onde se prevê a venda de tais vinhetas, esclarecendo ainda, mas agora sem qualquer referência ao caso concreto, cujo processo disciplinar já informara haver sido arquivado, «por não se ter apurado matéria disciplinar», que essa venda se encontra regulada em ordem de serviço, «não como meio de subtrair ninguém à acção da justiça, mas como corolário de litígios particulares insignificantes e sempre em regime de voluntariado».

4 — A contradição entre a lei e esta ordem de serviço, por um lado, e a realidade do caso concreto, por outro, levou o Provedor de Justiça a dirigir ao aludido Comando-Geral a seguinte recomendação:

Porque é claramente ilegal o teor da declaração onde, no caso, foram apostas as vinhetas, primeiro, porque comprar vinhetas «para não ser

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submetido a tribunal» (sic) representa uma coacção que viola o carácter facultativo que a lei atribui à liberalidade e, depois, porque é evidente que o procedimento criminal não está dependente de tal liberalidade, recomendo a V. Ex.a que se digne providenciar pelo estrito cumprimento da alfnea /) do artigo 20.° do Decreto-Lei n.° 42 794, de 31 de Dezembro de 1959, na parte em que acentua o carácter facultativo da compra das vinhetas aí previstas.

Regime prisional

Processo n.° 80/R-1919-B-1

Sumário — Regime prisional. Assistência médica. Sigilo profissional.

Objecto — Presença de guardas nas consultas médicas a que os reclusos necessitem de ser submetidos, quer no estabelecimento prisional, quer externamente.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação.

Síntese:

1 — Uma reclusa queixou-se ao Provedor de Justiça de ser prática corrente a imposição da presença de um guarda dentro do gabinete médico a assistir às consultas dos presos, sobretudo quando elas se realizam fora da cadeia, numa instituição hospitalar.

2 — Ouvido sobre a matéria, o Ministro da Justiça comunicou que sobre o assunto proferira em 12 de Novembro de 1980 despacho do teor seguinte:

Na circunstância, creio que, na verdade, se deve evitar a presença de guardas prisionais ou de outros funcionários da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais enquanto se realizam exames médicos.

Essa presença, quando não imposta por uma necessidade fundamental de segurança, é atentatória do resguardo em que se deve processar a relação médico-doente.

Ê evidente, no entanto, que a orientação que assim fixo não pode ser absoluta e inalterável; o sentido da responsabilidade, a prudência e o bom senso preconizam que a ela se abram excepções quando a perigosidade do recluso ou as circunstâncias em que se verifique o acto médico assim concludentemente o determinem.

Quando tal aconteça, o funcionário aue acompanhe o recluso doente deverá dar conhecimento do condicionalismo de excepção ao médico e justificá-lo posteriormente, se tal vier a ser reputado necessário pelo Ministro da Justiça ou pelo Di-rector-geral dos Serviços Prisionais.

3 — Por seu turno, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais indicou que, «perante uma situação a que a reconhecida perigosidade do preso haja de impor o condicionalismo de excepção que o despacho ministerial ressalva, se o médico hospitalar recusar a assistência ao doente sob custódia, só o respectivo director, ponderada a gravidade da doença e a maior ou menor urgência do tratamento, poderá autorizar que o acto médico seja prestado sem a presença do guarda, justificando posteriormente, se for caso disso, a decisão tomada».

4 — O aludido despacho ministerial não explicava a quem competiria decidir da existência ou não de uma situação em que se justificaria a presença do guarda ao acto médico.

Além disso, enquanto que, face ao conteúdo desse despacho, tal presença parecia dever constituir excepção, da resposta obtida da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais afigurava-se que esta entendia que a mesma deveria ser a regra, em relação a reclusos perigosos (embora não se indicasse a quem competiria definir tal perigosidade).

E, enfim, não seriam de excluir certos casos limites em que não ficaria claro o procedimento a seguir: aqueles em que as autoridades prisionais considerassem necessária a presença do guarda, mas o médico se recusasse, por razões deontológicas, a realizar a consulta nessas condições.

5 — Por isso se pediu a opinião da Ordem dos Médicos.

Esta informou que o seu Conselho Nacional de Deontologia fora do seguinte parecer:

A presença de estranhos durante o acto médico não é de aceitar, excepto quando a pedido do doente ou por decisão do médico, face à natureza dos exames a praticar (auxiliares e enfermeiros). Se e quando for expressamente invocada a perigosidade do preso em relação ao médico, só a este cabe decidir quanto à forma de prover à sua segurança pessoal.

6 — Tudo ponderado, e tendo em conta os diversos e contrapostos interesses em causa neste assunto, o Provedor definiu sobre ele a sua posição nos moldes seguintes:

a) Como princípio geral, deverá prevalecer, na prática, o da não presença de guardas ao acto médico, como se prevê, aliás, no aludido despacho.

b) Tal presença só deverá ser decidida em casos excepcionais em que haja fundadas e graves razões para recear que a ausência de guardas afecte a segurança. *

c) Essa decisão deve caber ao director do estabelecimento (ao contrário do que parece entender a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais).

d) Ao decidir, o director deverá ponderar a gravidade do caso, se o médico se recusar a realizar o acto médica com a presença de guardas.

e) Nos casos em que essa presença se verifique, o guarda deverá, tanto quanto possível:

e.\) Sem prejuízo da vigilância, ficar a distância tal que permita a confidencialidade do diálogo médico-doente;

e.2) Respeitar o direito ao recato do doente, designadamente em casos de exames ou observações em que aquele possa resultar mais afectado.

Afigura-se que uma atitude correcta e ponderada dos guardas poderá e deverá, designadamente, evitar que se dêem casos, como alguns que têm sido denunciados a este Serviço, em que os guardas comentam entre si as doenças dos reclusos ou presenciam determinados exames e observações clínicas.

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Ê evidente o melindre da questão e a dificuldade de conciliar estes interesses, que, em parte, são antagónicos.

Mas será de reconhecer que as sugestões supra podem constituir um passo no sentido de se encontrar a solução mais adequada às diferentes situações que podem ocorrer.

Processo n.° 81/R-1163-B-1

Sumário — Regime prisional. Disciplina. Visitas.

Objecto — Aplicação a reclusos de medidas preventivas e de regime especial de visitas antes da submissão a medidas punitivas.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação.

Síntese:

1 — Um recluso do Estabelecimento Prisional de Coimbra queixou-se de ter sido colocado em regime de castigo, preventivamente, com 8 dias de encerramento em cela de habitação, durante os quais ficou privado de visitas.

2 — Ouvida a direcção do Estabelecimento Prisional, apurou-se que o recluso tinha estado em situação de encerramento preventivo durante o período de 8 dias, por mera decisão do guarda participante, na sequência de uma alegada infracção disciplinar por ele praticada. De facto, o recluso fora encarcerado logo no dia 2 de Junho de 1981, data da ocorrência, e a decisão do director sobre o caso verificara-se a 9 do mesmo mês. Nesta decisão, o director aplicou ao recluso a pena disciplinar de 8 dias de isolamento, cobrindo, com efeitos retroactivos, o lapso de tempo (8 dias) que mediara entre a alegada «medida preventiva de encerramento» e a decisão punitiva.

Durante o mesmo período, o recluso ficou privado de visitas.

3 — Analisada a questão, concluiu-se pela irregularidade da actuação da direcção do Estabelecimento, por o Decreto-Lei n.° 265/79, de 1 de Agosto, não prever qualquer tipo de «encerramento» ou «isolamento preventivo» que possa depois ser tido em conta, como neste caso se pretendeu fazer, na punição aplicada. Durante o mesmo período não haveria também legitimidade para qualquer condicionamento de visitas áo queixoso, pois a situação em que se encontrava não era de cumprimento de pena disciplinar, a qual só poderia ser aplicada pelo director, nos termos do artigo 136.° do Decreto-Lei n.° 265/79. Enfim, não pareceu adequado que entre a participação e a decisão punitiva tenham mediado 8 dias, durante os quais o recluso ficou em situação sem cobertura legal.

4 — Por esta razão, recomendou-se ao director do Estabelecimento Prisional visado que para o futuro não fossem aplicadas aos reclusos medidas preventivas não permitidas por lei e que os mesmos não fossem sujeitos a regime especial de visitas antes da aplicação de qualquer medida punitiva; igualmente se acentuou a necessidade do cumprimento, em todas as situações, da formalidade de audição do recluso por escrito, cuja realização não decorria explicitamente da informação prestada.

Processo n.° 81/R-878-B-1

Sumário — Regime prisional. Inquérito. Objecto—Organização de inquérito em estabelecimento prisional por parte de funcionários do mesmo.

Decisão— Recomendação. Síntese:

1 — Um grupo de reclusos do Estabelecimento Prisional de Coimbra apresentou uma reclamação fundada no facto de um inquérito, decorrente de uma queixa que tinham dirigido ao Ministério da Justiça, estar a ser organizado por elementos da respectiva guarda prisional quando aquela queixa visava, precisamente, a actuação de certos guardas dessa corporação.

2 — Sobre o caso abordou o Provedor de Justiça o Ministério da Justiça e a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.

Entre os elementos facultados por aquele Ministério contava-se um ofício que lhe fora endereçado pela Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, onde, a terminar, se escrevia:

[...] a averiguação deste caso e de casos iguais, sempre a fazer pelos serviços de inspecção, não é viável por falta de unidades, independentemente dos problemas de melindre e falta de confiança que podiam equacionar relativamente a pessoal qualificado, como o são necessariamente, por definição, os senhores directores dos estabelecimentos centrais e especiais.

Por outro lado, da análise do processo, remetido pela mencionada Direcção-Geral, constatou-se, de facto, que o inquérito fora organizado pela hierarquia do respectivo corpo de guardas prisionais, contendo, além disso, imperfeições e irregularidades diversas, algumas claramente decorrentes de falta de preparação técnica.

3 — Em face do que antecede, o Provedor de Justiça endereçou à Direcção-Geral dos Serviços Prisio-nias a seguinte recomendação:

a) Não pode aceitar-se a forma como, subjectiva e objectivamente, foi elaborado o inquérito em causa.

b) Se essa Direcção-Geral não tem pessoal de inspecção suficiente, necessário se torna aumentá-lo.

c) O argumento de não ferir a susceptibilidade das direcções dos estabelecimentos é inaceitável, porquanto, por um lado, os serviços de inspecção existem, precisamente, para controlar e fiscalizar a actuação das administrações prisionais e, por outro, a sua presença pode até favorecê-las, na medida em que é uma entidade exterior a analisar os casos (um inquérito, como o que está em causa, organizado por pessoal do estabelecimento, será sempre suspeito aos olhos dos reclusos e de terceiros).

Por isso, formulo de novo a seguinte recomendação:

Que os inquéritos a acusações graves apresentadas pelos reclusos sejam levados a cabo pelos serviços de inspecção da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.

Registos e notariado

Processo n.° 79/R-268-B-1

Sumário — Registos e notariado. Casamento. Impedimento.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Objecto — Recusa de abertura de processo especial de impedimento em relação ao prazo internupcial.

Decisão — Recomendação não acatada. Exposição à Assembleia da República.

Síntese:

1 — Através de algumas queixas apresentadas ao Provedor, teve-se conhecimento de que diversas conservatórias do registo civil se recusavam a instaurar processo preliminar de publicações ou processo especial de impedimento de casamento ao verificarem não ter ainda decorrido, na sua opinião, o prazo internupcial estabelecido pelo artigo 1605.° do Código Civil.

i Deste modo inviabilizava-se eventual recurso ju-icial dessas decisões, o que deu origem a disparida-es de tratamento em relação a casos em que, tendo as conservatórias aberto processo de impedimento, os tribunais vieram a concluir que o prazo internupcial já estava esgotado, por o computarem de modo diferente do utilizado pelos serviços do registo civil.

2 — Contactada a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, esta entendeu ser correcta a actuação das conservatórias descrita em primeiro lugar, sustentando que o processo especial para conhecimento de impedimento de casamento se aplicaria apenas àqueles que não sejam detectáveis através dos próprios documentos apresentados para instruir o processo preliminar de publicações. Se a existência de impedimento resultasse já da leitura desses documentos — como seria o caso em relação ao impedimento do prazo internupcial —, o funcionário do registo civil limitar-se-ia a esclarecer os nubentes de que só depois de decorrido esse período se poderia organizar o processo de casamento.

Perguntada sobre o fundamento jurídico dessa recusa meramente verbal, a Direcção-Geral respondeu que, sendo os actos de registo normalmente requeridos por forma verbal, a recusa dos mesmos verbal o é também, a menos que o interessado declare que pretende recorrer.

3 — Não convencido por esta argumentação, o Provedor apresentou, a seu respeito, ao Ministro da Justiça, a seguinte recomendação, em Junho de 1980:

1 — Ora, tal entendimento colide, inegavelmente, com o direito que assiste aos nubentes de verem apreciado judicialmente qualquer impedimento matrimonial detectado pelo funcionário do registo civil ou constante da declaração de impedimento, tanto mais que inexiste apoio legal para se impor, sem hipótese de abordagem judicial, aos interessados a existência do impedimento do prazo internupcial.

2 — Com efeito, o cerne do problema parece residir na actuação das conservatórias ao recusarem a instauração do processo especial de impedimento do casamento, quando verifiquem a existência do impedimento impediente do prazo internupcial, à margem das leis do registo civil. É que a declaração de impedimento, que para os funcionários do registo civil é um dever (artigo 174.° do Código Civil), está sujeita à tramitação especial prevista nos artigos 314.° e seguintes do mesmo Código. No n.° 1 deste pre-

ceito determina-se que a declaração de impedimento é feita «por escrito autêntico ou autenticado ou, verbalmente, em auto lavrado pelo funcionário, assinado por eie, bem como pelo declarante, quando saiba assinar e o possa fazer», e no seu n.° 2 que da declaração deverá constar «especificadamente a identidade do declarante, a natureza do impedimento, a espécie e o número dos documentos juntos e a identidade das testemunhas». Por outro lado, o n.° 2 do artigo 174.° do Código do Registo Civil contempla as hipóteses de dedução e conhecimento pelo conservador de algum impedimento durante o prazo dos editais ou até à celebração do casamento, impondo ao funcionário que o faça constar do processo de casamento, «cujo andamento será suspenso até que o impedimento cesse, seja dispensado ou julgado improcedente por decisão judicial».

3 — Ora, se o funcionário tiver conhecimento de algum impedimento na ocasião da apresentação da declaração inicial e dos documentos com que deve ser instruída, não poderá, a meu ver, recusar-se a instaurar o respectivo processo, ainda que ante veja a necessidade de exarar despacho ordenando a suspensão do processo até que o impedimento cesse, seja dispensado ou julgado improcedente, mas sempre com respeito pela faculdade de impugnação pelos interessados (artigo 317." do Código do Registo Civil) do impedimento verificado pelo funcionário ou declarado por terceiro, para o que se torna indispensável organizar o processo de impedimento previsto nos artigos 314.° a 322.° do Código do Registo Civil, processo através do qual se opera a intervenção dos tribunais nos casos em que haja impugnação de algum impedimento (artigos 319.° a 32!.° do mesmo Código).

Não é, por conseguinte, ao funcionário do registo civil que compete decidir da existência e efeitos do impedimento do prazo intemupcial, à margem do disposto nos artigos 174.°, 314.° e seguintes, disposições, aliás, de carácter imperativo e de evidente interesse e ordem pública.

4 — Nem poderá falar-se de «recusa» sem processo preliminar de publicações ou sem processo especial de impedimento, nos quais devem ser exarados os despachos do funcionário do registo civil a determinar, com base em declaração ou reconhecimento prévio de impedimento, a suspensão do processo preliminar (ainda que íogo a seguir à declaração inicial e à apresentação de documentos) e a citação dos nubentes para efeitos de impugnação.

5 — A cessação do impedimento do prazo internupcial, nos termos em que é entendida pelos serviços técnicos, redunda numa autêntica «imposição» extrajudicial dos efeitos daquele impedimento, com manifesto desrespeito pelas normas de competência contempladas no Código do Registo Civil.

Não pode, assim, deixar de considerar-se irregular a actuação dos serviços do registo civil, os quais não poderão, no plano da legalidade, recusar-se a instaurar o processo preliminar de

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publicações e o processo especial de impedimento do casamento regulados no Código do Registo Civil, sob pena de se iludir a faculdade de apreciação judicial de impedimentos que aquele Código consagra.

Aliás, o procedimento em causa por parte de certo número de conservatórias está já a dar azo, na prática, a disparidades de tratamento e solução deste tipo de casos, situação essa sempre indesejável.

É que se conservatórias há que assim têm agido, outras não se têm eximido de — bem, no meu entender— instaurar os competentes processos preliminar e de impedimento de casamento. Ora, já existem decisões judiciais, proferidas em recurso das decisões tomadas em tais processos pelos conservadores, a propósito desta modalidade de prazo internupcial, posterior a divórcio por mútuo consentimento, consagrando sobre a respectiva contagem doutrina diversa da que tem sido seguida pela maioria dos órgãos do registo civil.

Termos em que me permito recomendar a V. Ex.a, de harmonia com o que estabelece a alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, que à Direcção-Geral dos Registos e do Notariado sejam transmitidas as indicações que forem tidas por convenientes no sentido de pelas conservatórias do registo civil não ser recusada instauração de processos preliminares de publicações ou especiais de impedimento do casamento, mesmo no caso de reconhecimento do impedimento impediente do prazo internupcial, em virtude de tal conduta inviabilizar a apreciação judicial de impedimentos matrimoniais imposta pelo Código dó Registo Civil.

4 — Em fulho seguinte foi recebida resposta da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, informando que mantinha a sua posição quanto à lei vigente, mas que, reconhecendo que tal situação não deveria subsistir, iria propor a correspondente modificação legislativa.

5 — Depois de várias insistências deste Serviço acerca do seguimento dado ao assunto, a Direcção--Geral voltou a manifestar-se contra a doutrina da recomendação do Provedor, alegando, essencialmente, que:

a) Ofender-se-ia o princípio da economia pro-

cessual se se entendesse que o conservador teria de organizar processo de impedimento nos casos em que a existência deste resultasse claramente da documentação apresentada pelos nubentes;

b) Perante a recusa verbal de organização de um

processo nestas condições, os interessados não ficariam impedidos de reagir, pois poderiam valer-se da reclamação hierárquica ou do recurso contencioso.

6 -r- Visto que o Ministro da Justiça não tomara, afinai, posição sobre a recomendação que fizera, o Provedor solicitou de novo que o fizesse.

7 — O Ministro respondeu em Setembro de 1981 que não aceitava a mencionada recomendação, por concordar com a informação da Direcção-Geral, se-

gundo a qual «os impedimentos que podem ser dispensados vêm indicados no artigo 1609.° do Código Civil e entre eles não consta o do prazo internupcial. Assim, nunca o conservador do registo civil poderia instaurar processo de dispensa para afastar o impedimento referido. Isto destrói por completo o argumento da Provedoria no sentido de que a não instauração do processo de casamento obstaria à apreciação pelo tribunal do impedimento de que nos vimos ocupando».

8 — Afigurando-se-lhe deslocadas estas razões, o Provedor solicitou em Dezembro de 1981 ao Ministro da Justiça a reapreciação do assunto, face a pareceres do assessor encarregado do processo e do adjunto, com cujo teor concordou e cuja parte principal se transcreve:

Parecer do assessor:

[...]

3 — O argumento da dispensa é, com efeito, improcedente, uma vez que o prazo internupcial continua a ser considerado [artigos 1604.°, alínea b), e 1605.° do Código Civil] impedimento impediente (ou seja, circunstância que impede o casamento, mas não o torna anulável se ele chegar a celebrar-se) (s), aspecto que nunca foi posto em causa.

4 — Só que o juiz da questão não deve ser — como à face da lei não é — o conservador do registo civil. Também neste aspecto a leitura que a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado fez da posição assumida pelo Serviço do Provedor de Justiça (que não da Provedoria, como, por lapso, foi indicado) não foi feliz. O Sr. Provedor de Justiça não defendeu a instauração de processo de dispensa pelo conservador. Referiu, sim, com base nos despachos e informações aludidos, que o funcionário do registo civil não pode recusar-se a instaurar o processo preliminar. Se o conservador entender que há impedimento, terá de proceder como manda a lei, e esta certamente não lhe confere poderes para recusar a instauração do processo de publicações. Se a instauração foi inútil ou não, di-lo-á o juiz, não o conservador.

Parecer do adjunto: [-1

2 — De facto, a tese da Direcção-Geral dos Registos e do Notariado contende com o disposto no artigo 1611.° do Código Civil, segundo o qual a declaração de impedimento é obrigatória para o ministério público e para os funcionários do registo civil (o que decerto engloba também o conservador, perante o qual os nubentes pretendem instaurar o processo de casamento) logo que tenham conhecimento do impedimento.

E a seguir se dispõe, que, feita a declaração, os nubentes só poderão casar se o impedimento cessar, for dispensado ou declarado judicialmente improcedente.

3 — Corrobora-o, aliás, o artigo 174.° do Código do Registo Civil, ao prescrever que a exis-

O Não origina verdadeira incapacidade, conforme salienta o Prof. Pereira Coelho, in Curso de Direito de Família, vol. 1, pp. 266 e 286 e segs.

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tência de impedimento pode ser declarada por qualquer pessoa, e deve sê-lo pelos funcionários do registo civil logo que dele tenham conhecimento.

4 — Note-se, de resto, que a doutrina se tem pronunciado também neste sentido.

Assim é que Arnaldo Alves, no Código do Registo Civil Anotado (de 1967, já que o seu comentário ao Código do Registo Civil actual não aborda este assunto; a argumentação vale, porém, para o Código do Registo Civil vigente, pois as disposições em causa são paralelas), refere, a p. 234, em comentário ao artigo 330.°:

1." Se for levado ao conhecimento do conservador algum impedimento que o deixe convencido da verdade, embora por menor, deve oficiosamente instaurar o respectivo processo (artigo 176.°, n.° 1.°).

3." O funcionário que lavra o auto é o conservador ou o ajudante em exercício, mesmo na hipótese de serem eles os denunciantes.

E a mesma opinião é defendida pelo Prof. Castro Mendes (já perante o Código do Registo Civil actual), nas suas Lições de Direito de Família, 1978-1979, Associação da Faculdade de Direito de Lisboa, p. 76, nota.

5 — A tese oposta, da Direcção-Geral, assentando em que o processo de impedimento só é de instaurar quando a respectiva declaração é feita por outrem que não o conservador, parece contrariar frontalmente a clara injunção do artigo 174.°, n.° 2, do Código do Registo Civil (pois, para manter a lógica, também teria de defender que igualmente neste caso não seria de organizar processo de impedimento).

6 — A alegação da Direcção-Geral de que, segundo o sistema que defende, os nubentes não ficariam privados de fazer apreciar judicialmente a atitude do conservador, pois teriam ao seu dispor o recurso nos termos do artigo 356.° do Código do Registo Civil, tão-pouco parece satisfatória.

a) £ que, como bem refere o Sr. Assessor, o juiz irá de certo apreciar, não propriamente a existência ou não de impedimento, mas sim se a recusa de recepção da declaração para casamento foi legítima ou não.

b) Aliás, se esse recurso proceder e o juiz mandar receber a declaração para casamento, continuará a subsistir o problema de saber como iria o conservador então fazer valer a existência do impedimento (se não podia, por sua iniciativa, organizar um processo de impedimento).

c) Poderá objectar-se porventura que, na hipótese de um recurso destes, seria o juiz que então iria, para ajuizar se a recusa da declaração para casamento fora legítima, apreciar da existência

. do impedimento.

Creio, porém, que isso não é sustentável, à face da lei.

Ê que o Código do Registo Civil pretende que a existência de impedimento seja analisada atra-

vés de processo próprio, com audição dos nubentes e de testemunhas, o que este recurso do artigo 356.° não comportaria.

E mais: o processo de impedimento, porque muitas vezes envolve matéria de facto, admite recurso para a Relação e desta para o Supremo Tribunal de Justiça.

Ora, o recurso do artigo 356.° só permite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, precisamente porque se considera estar apenas em causa então matéria de direito (e não já também de facto, como é comum a respeito de impedimentos).

9 — O Ministro respondeu enviando informação da Direcção-Geral, em que esta asseverava ter ponderado bem o assunto, especificando que entendia que o seu critério evitava aos interessados delongas e despesas inúteis.

Visto não ter obtido por parte do Ministro da Justiça correspondência positiva à sua recomendação em assunto de inegável alcance geral, o Provedor decidiu expô-lo à Assembleia da República em Maio de 1982.

A exposição do Provedor foi pelo Presidente da Assembleia da República transmitida aos presidentes dos grupos parlamentares.

Responsabilidade contratual

Processo n.° 77/R-712-B-1

Sumário — Responsabilidade contratual. Mora. Objecto — Pagamento de juros de mora. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1—No ano de 1963 um grupo de trabalhadores da circunscrição de telecomunicações dos CTT de Coimbra foi encarregado de elaborar um projecto de ampliação da rede telefónica subterrânea daquela cidade fora das horas de serviço e mediante determinada retribuição, cujo cálculo era função de algumas das principais características daquele projecto.

Foi esse trabalho, depois de concluído, enviado em Setembro de 1965 à Direcção dos Serviços de Telecomunicações para aprovação.

Sucedeu, porém, que só em Setembro de 1974 os interessados conseguiram ser pagos pelo trabalho apresentado.

2 — Dado, todavia, o tempo decorrido entre a entrega do projeoto de que foram incumbidos e a data daquele pagamento — cerca de 9 anos — e tendo em conta a desvalorização da moeda que entretanto se operou, requereram os interessados ao conselho de administração dos CTT que lhes fossem atribuídos os correspondentes juros de mora, à taxa anual cobrada pelo Banco de Portugal, isto é, à razão de 6 %.

A tal pretensão responderam os CTT que, embora não conseguissem identificar a causa para o lamentável atraso no pagamento do montante devido, não concluíam que fossem de liquidar juros, visto que não se encontrava estabelecida nenhuma condição relativa a prazos de pagamento nem regime de capitalização (com taxa fixada) para verbas eventualmente

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pagas com atraso relativamente à remuneração dos serviços prestados.

3 — Desta posição assumida no caso pelos CTT os interessados reclamaram para o Provedor de Justiça.

Na sequência dessa reclamação, foi o problema analisado à face da lei, tendo-se concluído que estava em causa um contrato de prestação de serviços, cujos lermos vêm regulados no artigo 1154.° do Código Civil.

Interessava, portanto, determinar o momento em que a companhia entrou efectivamente em mora, pois que, de harmonia com o artigo 804.° do Código Civil, é a partir dessa data que resulta para o devedor obrigação de reparar os danos causados aos respectivos credores.

Ora, dado que não fora estipulado qualquer prazo para o pagamento da referida contraprestação, tinha de concluir-se, ao abrigo do artigo 805.° do Código Civil, que a entidade devedora só teria incorrido em mora se tivesse sido interpelada para cumprir.

Traduzindo este aspecto matéria meramente de facto relativamente à qual o Serviço do Provedor de Justiça não dispunha de elementos para se poder pronunciar, foi então elaborada recomendação ao ministério da tutela no sentido de, caso aquela interpelação tivesse tido efectivamente lugar, os Correios e Telecomunicações de Portugal procederem ao pagamento dos juros a que se reporta o artigo 806.° do Código Civil e que se tivessem vencido a partir da primeira interpelação.

4 — A essa recomendação respondeu aquele ministério que os CTT só teriam sido efectivamente interpelados em 11 de Junho de 1974. Ora, como o pagamento da verba correspondente teria sido autorizado em 16 de Setembro do mesmo ano, esse lapso de tempo parecia normal, em termos de contabilidade pública, não devendo, por isso, dar azo ao pagamento de juros de mora.

5 — Perante esta resposta, foi o processo arquivado no Serviço do Provedor de Justiça.

6 — Acontece que, posteriormente, os interessados remeteram vários outros documentos, entre os quais uma carta datada de 8 de Junho de 1966 e dirigida por um deles aos CTT, a qual, pelos seus termos, se revelava uma autêntica interpelação para pagamento.

Deste facto se deu conhecimento ao Ministério dos Transportes e Comunicações, realçando o seu significado.

7 — O Ministério contestou este entendimento, considerando que na carta em questão o signatário se limitava a solicitar ao director de serviço que realizasse diligências para que o projecto fosse aprovado, o que seria diferente de pedir o pagamento do respectivo preço.

Aliás, nessa carta não seria sequer possível pedir-se qualquer pagamento, pois este só seria devido pelos CTT se e quando o projecto viesse a ser aprovado.

8 — O Provedor rebateu esta posição nos termos seguintes:

Pôde-se apurar, através do respectivo processo, cuja remessa foi solicitada aos Correios e Telecomunicações de Portugal, que os técnicos em questão se obrigaram perante os CTT a apresentar o projecto de ampliação da rede telefónica subterrânea de Coimbra mediante uma remuneração calculada com base em determinadas carac-

terísticas desse projecto, tendo procedido à execução de tal tarefa fora das horas de serviço e absolutamente subtraídos à orientação e direcção da companhia.

Ora, estes aspectos configuram nitidamente o contrato de prestação de serviços previsto no artigo 1154.° do Código Civil, e, como tal? é absolutamente inadmissível, sob pena de se estar a defender um Iocupletamento à custa alheia, considerar que os CTT só ficariam obrigados a pagar aos interessados depois de aprovado o projecto e se tal viesse a suceder.

Foi, pois, com a entrega do projecto que nasceu para os CTT a obrigação de procederem ao respectivo pagamento.

Por outro lado, e atentas as razões que acabo de invocar, não é possível atribuir à referida carta outro significado que não seja o de ela exprimir por parte do signatário a vontade de receber o preço do seu trabalho.

Com efeito, só este entendimento confere realmente sentido à alusão que aquele faz às grandes dificuldades económicas com que então se debatia.

O Provedor salientou ainda, enfim, que no processo deste Serviço se obtivera declaração do ex-director de serviço dos interessados que confirmava ter, na altura, a pedido de um destes, diligenciado superiormente para que eles fossem pagos.

9 — O Ministério respondeu que, consultados os CTT, estes mantinham a mesma posição, por entenderem que não houvera qualquer interpelação e que o pagamento de trabalho do género deste «supunha a respectiva aprovação ministerial, que não se verificou, por na altura ter sido considerada a verba pedida manifestamente exagerada».

10 — Tendo por insatisfatória esta opinião, o Provedor solicitou que, por um lado, lhe fossem concretamente expostos os argumentos jurídicos que levavam a entidade visada a entender não serem de aplicar as regras legais relativas ao contrato de prestação de serviços e, por outro, que fosse indicado então qual c tipo de contrato que, no entender da mesma, estaria em causa.

11 — Os CTT acabaram por aceitar o ponto de vista do Provedor, tendo em Março de 1982 mandado pagar a quantia em discussão.

Segurança social

Processo n.° 81/R-248-B-1

Sumário — Segurança social. Aposentação. Facto determinante da aposentação por invalidez.

Objecto — Demora por razões de conveniência de serviço na comunicação do resultado de junta médica.

Decisão — Reclamação procedente. Abertura de processo por iniciativa do Provedor.

Síntese:

1 — Um funcionário que exercera ininterruptamente funções em cartórios notariais durante 44 anos fora em Junho de 1977 presente à junta médica da Caixa Geral de Aposentações, não lhe tendo sido dado co-

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II SÉRIE — NÚMERO 68

nhecimento da deliberação desta senão em Março de 1978.

Durante o período de cerca de 9 meses que mediou entre a apresentação à junta médica e o desligamento do serviço, o funcionário chegara a acumular funções em 2 cartórios notariais, com manifesto sacrifício da sua saúde, tendo sido pago de acordo com as actualizações de vencimento (e emolumentos) decorrentes do Decreto-Lei n.u 106/78, de 24 de Maio, com efeitos reportados a 1 de Janeiro antecedente.

Apesar disto, a pensão provisória foi-lhe fixada em função dos vencimentos de 1977, e na pensão definitiva seguiu-se o mesmo critério, com base em que era a data da junta médica —e não a do desligamento decorrente do conhecimento da deliberação — que deveria prevalecer.

Infrutíferas haviam sido as diligências do interessado e a intervenção, que pedira, da Direcção-Geral, para que lhe fosse acrescido o tempo de serviço efectivamente prestado e calculada a pensão com base no vencimento realmente recebido.

2 — Embora este Serviço houvesse procurado fazer com que a Caixa Geral de Depósitos tivesse em conta as circuntâncias especiais deste caso, houve que reconhecer que, à face da lei (artigo 43.° do Estatuto da Aposentação), o regime da aposentação se fixa na data do facto que lhe dá origem — e este é, no caso da verificação da incapacidade, o parecer da junta médica que sobre ela se pronuncie.

3 — A Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, ouvida sobre a sua eventual responsabilidade na demora daquela comunicação, acabou por informar que o excepcional atraso verificado «foi exclusivamente devido a razões de conveniência de serviço, porquanto o funcionário em causa estava na altura a assegurar as funções inerentes a 2 lugares de notário que se encontravam vagos».

Não deixou, todavia, de acentuar o sacrifício que para o funcionário resultou do desempenho de funções em tais circunstâncias, o que teria até dado motivo a uma especial intervenção da Direcção-Geral no sentido de ser compensado na aposentação.

Essas diligências foram, no entanto, em vão.

4 — Afigurou-se que não deveria ser possível operar-se a repetição de situações destas.

Não é aceitável que, por conveniência de serviço, a Administração retenha (no caso concreto durante cerca de 8 meses) a comunicação do resultado de uma junta médica para suspender o prosseguimento normal do processo de aposentação.

Por isso, o Provedor decidiu abrir um processo de sua iniciativa — e que ainda se encontra em curso — tendente a estudar medidas gerais, de natureza administrativa ou, se necessário, legislativa, destinadas a obviar a este problema e, em especial, aos prejuízos que para os funcionários podem decorrer de procedimentos deste tipo (v., supra, recomendação xxxvm).

No caso concreto, não pôde, por a lei vigente a isso se opor, satisfazer-se a pretensão do queixoso no sentido de a sua pensão ser calculada com base na remuneração auferida à data do desligamento do serviço. Este obteve, de algum modo, compensação, embora parcial, pelo facto de lhe terem pago os aumentos de remuneração ocorridos entre a data da junta médica e a do desligamento do serviço.

P.0C63S0 n.° 81/R-2319-B-1

Sumário — Segurança social. Aposentação. Tempo de serviço.

Objecto — Tempo de serviço relevante para efeito de aposentação do pessoal da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa integrado na Caixa Geral de Aposentações.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação

aceite. Síntese:

1 — Tendo surgido dúvidas na aplicação do Decreto--Lei n." 247/80, de 24 de Julho, sobre a integração do pessoal da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa na Caixa Geral de Aposentações, no que respeita à contagem de todo o tempo de serviço prestado, com descontos obrigatórios para a Previdência, pelos trabalhadores que não optassem pela manutenção do regime em que se encontravam, foi emitido o Despacho Conjunto n." 118-A/81, publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 189. de 19 de Agosto de 1981.

No n.° 2 desse despacho esclarece-se que essa contagem, para efeitos de aposentação, de todo o tempo com descontos para a Previdência, só abrange o tempo de serviço que tenha sido prestado em qualquer das situações e entidades enunciadas no n.° 1 do artigo 1." do Estatuto da Aposentação.

2 — Sucede que o prazo que o pessoal visado em tal despacho teve para optar pelo regime da Caixa Geral de Aposentações findou antes de aquele despacho de esclarecimento ter sido publicado.

Ora, entre o pessoal que procedeu a essa opção encontravam-se alguns trabalhadores que tinham tempo de serviço com contribuições para a Previdência, mas prestado a entidades crivadas, o que, contrariamente às suas expectativas, os impedia, face ao citado despacho, de o verem repercutido na pensão de aposentação que posteriormente viessem a auferir.

Disso reclamou para o Provedor de Justiça um sindicato representativo dos trabalhadores da função pública.

3 — Tendo em atenção o facto de o aludido Despacho n.° 118-A/81 ter sido proferido a título de esclarecimento, o que pressupõe que, anteriormente à sua existência, havia dúvidas legítimas quanto à matéria sobre que ele incidiu, considerou-se que não era curial impô-lo ao pessoal que optou pelo regime da Caixa Geral de Aposentações dentro do prazo legal para o efeito, o qual decorrera antes de aquele despacho ter sido publicado. Isto porque ao tempo de tal opção esse pessoal não pôde ter uma exacta noção do regime que o mesmo despacho viera depois esclarecer.

4 — Neste contexto, o Provedor de lustiça sugeriu cos Ministros das Finanças e do Plano, da Reforma Administrativa e dos Assuntos Sociais que fosse permitido ao dito pessoal desistir da opção feita, admitindo que viesse a ser estabelecido determinado prazo para manifestação deása desistência.

5 — Tendo havido concordância por parte daqueles 5 departamentos, a Caixa Geral de Depósitos decidiu conceder ao pessoal em causa o prazo de 90 dias para requerer, querendo, a desistência da opção.

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Processo n.° 79/R-375-A-3

Sumário — Segurança social. Assistência médica. Discriminação.

Objecto — Reconhecimento aos filhos de funcionários do Ministério da Justiça da possibilidade de beneficiarem dos Serviços Sociais desse departamento, mesmo no caso de o outro progenitor ter direito de acesso a serviços sociais diversos, desde que a este renuncie.

Decisão—Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — Um sindicato representativo de trabalhadores dos registos e notariado reclamou para o Provedor de Justiça do indeferimento por parte dos Serviços Sociais do Ministério de Justiça do pedido de admissão como beneficiário de um filho de uma funcionária, indeferimento decidido com base no facto de ele poder obter assistência em função da actividade profissional do pai e de o regulamento daqueles Serviços não permitir opções na matéria.

2 — Acrescentava o sindicato reclamante que a referida funcionária, não se conformando com tal decisão, dirigira ao Ministro da Justiça uma exposição em que salientava a adaptação do Código Civil aos actuais princípios constitucionais, diploma esse em que foi eliminada a figura do chefe de família e estabelecida a igualdade jurídica entre os cônjuges.

Assim, concluía-se na mesma exposição que esse princípio da igualdade deveria possibilitar a qualquer dos pais, beneficiários de diferentes organismos de assistência, escolher um desses organismos para nele inscrever seus filhos.

Essa exposição não teria obtido resposta.

3 — Auscultado sobre a questão, o Gabinete do Ministro da Justiça limitou-se a veicular uma informação dos serviços segundo a qual os filhos da funcionária em questão não podiam beneficiar das regalias dos respectivos Serviços Sociais «por estarem abrangidos pelo artigo 6.° do Regulamento da Assistência na Doença e ainda porque no mesmo não existe disposição que permita optar».

4 — Não convencido, o Provedor apresentou ao Ministro da Justiça os seguintes argumentos:

É o seguinte o teor do citado artigo 6.°:

Aos beneficiários que, simultaneamente, o sejam também de outros serviços ou instituições estaduais ou corporativos que se proponham realizar qualquer das formas de assistência previstas nos artigos 1.° e 16.°, os Serviços Sociais do Ministério da Justiça somente facultarão aquelas modalidades que não estejam a ser prestadas normal e efectivamente por esses serviços ou instituições.

Ora, como no caso vertente o cônjuge da referida funcionária renunciou à prestação de qualquer assistência por parte da Previdência Social em favor de seu filho, parece que deve entender-se que este último não é beneficiário de qualquer serviço ou instituição estadual de segurança social, pelo que não cabe no âmbito da previsão do aludido artigo 6.°, não devendo este ser invo-

cado para efeito de se lhe negar a inscrição nos Serviços Sociais do Ministério da Justiça.

Teve-se também conhecimento, através do Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado, de que num outro caso, em que o marido de uma funcionária da Conservatória do Registo Civil da Maia, sendo embora trabalhador por conta própria, se não encontrava abrangido por qualquer esquema de assistência, fora igualmente negada ao filho da mesma a inscrição nos Serviços Sociais do Ministério da Justiça, com o argumento de que a assistência deve ser prestada «em atenção ao pai».

Em qualquer destes dois casos ressalta que os Serviços Sociais do Ministério da Justiça consideram ainda como válido o velho princípio de que o pai é que é a figura preponderante no agregado familiar, o que, neste particular, pode ter reflexos negativos sobre os filhos.

Neste contexto, e atendendo a que o poder paternal, na constância do matrimónio, pertence a ambos os cônjuges, solicito a V. Ex.a que se digne informar o que tiver por conveniente quanto à possibilidade de os casos focados serem revistos no sentido de ser permitida às interessadas a obtenção dos benefícios que pretendem, direito esse a levar sempre em conta futuramente em casos análogos.

5 — A resposta foi recebida através dos Serviços Sociais do Ministério da Justiça, que não concordaram com a posição do Provedor, argumentando:

a) Os casos de 2 funcionárias da Conservatória do Registo Civil da Maia que pretendiam beneficiar das regalias dos Serviços Sociais deste Ministério para filhos seus não foram atendidos em razão do disposto do artigo 6.° do Regulamento da Assistência na Doença.

Tal disposição existe por semelhança com o procedimento adoptado pela Previdência Social quanto a filhos de mulheres suas beneficiárias e de funcionários públicos, aos quais não reconhece o direito a assistência médica e medicamentosa, uma vez que tal direito lhes seja garantido pelo serviço público onde o pai trabalha.

b) Refere-se ainda no mesmo ofício que o cônjuge de uma das funcionárias «renunciou» aos seus direitos à Previdência Social e que o da outra se não encontra abrangido por qualquer esquema de assistência «por ser trabalhador por conta própria».

Salvo melhor opinião, afigura-se a este Gabinete que o primeiro não pode renunciar a um direito que não é seu e o segundo deve cumprir as suas obrigações, quanto a inscrição e pagamento de contribuições, para com a Previdência Social, passando então seu filho a ter um direito de que presentemente não usufrui.

De facto, nos termos da lei (Decreto-Lei n.° 170/ 80, de 29 de Maio), o direito ao abono de família e, consequentemente, às demais obrigações sociais que daí derivam (assistência médica e medicamentosa, por exemplo) é direito dos filhos de trabalhadores sujeitos a determinados regimes de protecção social, e não destes próprios. Assim, se o direito é dos filhos, os pais não podem, nem devem, renunciar a ele.

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6 — Dada esta posição da entidade visada, o Provedor voltou a solicitar, directa e expressamente, a intervenção do Ministro da Justiça, expondo as seguintes razões:

a) Os Serviços Sociais do Ministério da Justiça mantêm a posição negativa anteriormente assumida, invocando que também a Previdência Social, quanto a filhos de mulheres suas beneficiárias e de funcionários públicos, não reconhece o direito à assistência médica e medicamentosa quando esse direito é garantido pelo serviço público onde o pai trabalha.

b) Sucede, porém, que no âmbito da Previdência Social existe um preceito (artigo 38.° do Decreto n.° 45 266, de 23 de Setembro de 1963) segundo o qual a assistência médica e medicamentosa é concedida às pessoas por quem o beneficiário tenha o direito a abono de família.

Por outro lado, o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 197/77, de 17 de Maio, concede direito a abono de família aos descendentes dos trabalhadores ou do cônjuge a cargo dos mesmos, não fazendo depender de qualquer condição inerente aos ascendentes o exercício desse direito.

Ora, da conjugação destes dois aspectos resulta que no campo da Previdência Social é possível a uma trabalhadora do sector privado casada com um funcionário público receber abono de família pelos filhos e, consequentemente, terem estes direitos a assistência médica e medicamentosa ao abrigo do citado artigo 38.° do Decreto n.° 45 266.

c) A posição que os Serviços Sociais insistem em manter traduz-se numa— a meu ver, ilegítima, face ao princípio constitucional da igualdade — diferenciação de regime, conforme o funcionário em questão pertencer ao sexo feminino ou ao masculino, e for o pai, ou a mãe, funcionário do Ministério da Justiça.

d) E corresponde a uma interpretação que considero inadequada do artigo 6.° do respectivo Regulamento da Assistência na Doença.

O que este preceito pretende evitar é que se acumulem efectivamente os benefícios facultados pelos Serviços Sociais desse Ministério e os de outro esquema de segurança social.

Por isso, no mencionado artigo 6.° se diz que essa instituição «somente facultará aquelas modalidades que não estejam a ser prestadas normal e efectivamente» por outros esquemas de segurança social.

e) Não me parece, pois, que em casos como os que suscitaram o presente processo — pai trabalhando por conta própria e não inscrito em qualquer esquema de segurança social ou pai que declarou não pretender valer-se da assistência na doença proporcionada pela Previdência — se possa argumentar, como o fazem os Serviços Sociais, que tais progenitores deveriam, respectivamente, inscrever-se na Previdência ou não deixar de utilizar os benefícios desta.

f) Face ao exposto, solicito a V. Ex." uma resposta, tendo em consideração a opinião já antes expendida pelo Provedor de Justiça e os pontos de vista acabados de alinhar.

De facto, verificada a opinião defendida pelos Serviços Sociais desse departamento, considero adequado — por não concordar com ela — que V. Ex.° tome posição sobre o assunto.

7 — O Ministro veio a decidir a questão de acordo com a solução preconizada pelo Provedor.

ProcBsso n.° 81/R-1081-B-1

Sumário — Segurança social. Assistência médica.

Reembolso das despesas de deslocação. Objecto — Reembolso por parte dos Serviços Médico-

-Sociais das despesas de almoço. Decisão — Reclamação procedente. Síntese:

1 — Um beneficiário dos Serviços Médico-Sociais reclamou para o Provedor de Justiça pelo facto de estes terem indeferido o seu pedido de reembolso das despesas com o almoço do dia em que, acompanhado de sua mãe, se deslocara de Castelo Branco, onde reside, a Coimbra, a fim de ser submetido a uma consulta da especialidade de neurologia.

Baseou-se tal indeferimento, por um lado, na circunstância de a lei fazer depender o reembolso das despesas de alimentação da condição de a deslocação exigir um período de tempo superior a 12 horas e, por outro lado, no facto de os Serviços Médico-Sociais terem considerado que no caso concreto a deslocação para a consulta referida podia ser efectuada dentro daquele período de 12 horas.

Verificara-se, aliás, que o interessado saíra da residência pelas 5 horas e 30 minutos, tendo sido atendido cerca do meio-dia em Coimbra. Assim, teria podido regressar a casa dentro do aludido prazo de 12 horas.

E acrescentavam os Serviços Médico-Sociais que, para além de a quantia em discussão ser diminuta, tão-pouco encontraram razão para o interessado ser apoiado na deslocação por um acompanhante.

2 — Estudado o processo, não pareceu acertada a decisão dos Serviços Médico-Sociais, pelo que o Provedor lhes enviou a seguinte recomendação:

Verifica-se que o beneficiário se deslocou de Castelo Branco em carro próprio, com credencial que lhe foi passada para efeito da consulta de neurologia nesta última cidade.

Constata-se também que o interessado saiu de Castelo Branco às 5 horas e 30 minutos, tendo sido atendido perto das 12 horas no Hospital de Coimbra.

Face a estes dados, concluíram esses Serviços que o beneficiário, mesmo almoçando em Coimbra, tinha tido tempo de regressar a Castelo Branco antes de decorridas 12 horas sobre o momento da partida, decurso esse que constitui condição indispensável ao processamento da comparticipação para almoço.

Tal conclusão assentou em que a distância entre as duas referidas cidades é de 158 km e o tempo normal de percurso de 2 horas.

Ainda que se considere que o valor exíguo da eventual comparticipação não justifica, em termos práticos, as diligências desenvolvidas pelo reclamante para a receber, não pode, contudo, deixar

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de se reconhecer que se trata de uma regalia atribuída por lei e que, portanto, se for caso disso, deve ser-lhe concedida.

Assim, cabe salientar que, atendendo ao que normalmente se espera em matéria de consultas hospitalares, ao tempo que geralmente demoram tais consultas quando de neurologia, as quais habitualmente implicam uma longa conversa, às dificuldades que por vezes existem na procura de um restaurante de preços moderados, à demora no serviço das refeições, etc, parece demasiadamente precipitado inferir que o beneficiário tinha tido tempo de regressar a Castelo Branco antes das 17 horas e 30 minutos.

Neste contexto, formulo a seguinte recomendação:

Que, tendo em vista as considerações atrás expendidas, o caso seja revisto em termos de vir a ser atribuída ao interessado a comparticipação na sua alimentação e na do acompanhante.

3 — Os Serviços Médico-Sociais aceitaram a recomendação quanto ao queixoso. Mas não o fizeram no tocante ao acompanhante, alegando que os Serviços Médico-Sociais de Castelo Branco haviam referido não ter sido necessário o apoio deste.

4 — O Provedor solicitou que também esta segunda posição fosse reapreciada, pois existia no processo uma credencial, passada pelos próprios Serviços Médico-Sociais de Castelo Branco, da qual constava que o doente necessitava de ir acomanhado, em carro particular.

5 — Os Serviços Médico-Sociais vieram, a final, a acatar também esta última parte da recomendação.

Processo n.° 81/R-794-B-1

Sumário — Segurança social. Assistência medicamentosa. Comparticipação.

Objecto — Esclarecimento sobre quem deve restituir aos Serviços Médico-Sociais as comparticipações em medicamentos que, não estando abrangidos pela assistência medicamentosa, foram indevidamente lançados em receituário daqueles Serviços utilizado pelas empresas.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — O reclamante desempenha funções de médico do trabalho numa empresa do sector têxtil.

No exercício dessas funções, e ao abrigo dos despachos de 29 de Agosto de 1975, de 2 de Junho de 1976 e n.° 47/80, todos eles do Ministro dos Assuntos Sociais, utilizou receituário dos Serviços Médico-Sociais para prescrever a determinado trabalhador um medicamento incluído na lista de produtos por estes não comparticipáveis.

2 — Na sequência desse facto, os Serviços Médico--Sociais do Distrito de Braga oficiaram à empresa, sa-1/entando-lhe que era de deduzir no vencimento do médico em causa o montante relativo à comparticipação por eles já entregue à respectiva farmácia, montante esse que depois lhes deveria ser reembolsado.

I'bi dessa decisão que o interessado reclamou.

3 — Após estudo do caso, o Provedor de Justiça expôs aos Serviços Médico-Sociais do Distrito de Braga a sua posição, nos seguintes termos:

O Despacho n.° 47/80, publicado no Diário da República, 2." série, de 12 de Agosto de 1980 — anteriormente, portanto, à data da passagem da receita em questão — estabelece expressamente que os serviços e estabelecimentos por ele visados são responsáveis pelo uso indevido dos impressos que lhes forem distribuídos.

Por outro lado, esse mesmo despacho prevê que a distribuição dos impressos por esses serviços e estabelecimentos se faça a solicitação dos mesmos.

Logo, há que inferir que a empresa, se não queria assumir a aludida responsabilidade, podia ter renunciado ao uso do receituário dos Serviços Médico-Sociais. Como não o fez, ficou responsável pelo seu uso indevido.

Cabe agora averiguar se essa empresa tem o direito de exigir, a título de indemnização, que o médico ao seu serviço suporte o encargo da quantia relativa à comparticipação do medicamento que, embora não comparticipável, foi por ele receitado nos impressos dos Serviços Médico-Sociais.

Ora, sucede que só na hipótese de essa conduta do médico se ter traduzido numa infracção a qualquer seu dever como trabalhador é que poderia haver lugar a tal indemnização a favor da empresa. Isto de harmonia com o artigo 27.°, n.° 4, do Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969. O dever que, no caso vertente, eventualmente poderia ter sido infringido, seria o de realizar o trabalho com zelo e diligência, consagrado no artigo 20.°, n.° 1, alínea b), do citado decreto-lei.

Acontece, todavia, que apenas em 30 de Março de 1981 —ulteriormente, portanto, à data em que o médico receitou o produto em questão — é que os Serviços Médico-Sociais forneceram ao serviço médico da empresa a relação dos produtos farmacêuticos não comparticipáveis, ponto que leva a entender que a receita daquele não implicou por parte do reclamante um menor zelo ou diligência no exercício das suas funções.

Mas, mesmo a admitir-se que era ao médico que competia certificar-se de que o produto em questão era ou não comparticipável (hipótese que levanta dúvidas), o que é verdade é que o artigo 95." oo mencionado Decreto-Lei n.° 49 408 estabelece que a entidade patronal não pode compensar a retribuição em dívida com créditos que tenha sobre o trabalhador, nem fazer quaisquer descontos ou deduções no montante dessa retribuição, salvo em determinados casos, como seja o de existir decisão judicial transitada em julgado ou auto de conciliação que liquide a indemnização.

E, em face destas razões, o Provedor concluiu que o montante em causa deveria ser exigido à empresa, e não ao seu médico.

4 — A entidade visada concordou com este ponto de vista, tendo deixado de promover deduções do tipo da aqui contestada.

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Processo n.° 81/R-1583-B-1

Sumário — Segurança social. Desalojados. Pensão de velhice.

Objecto — Exigência, para comprovação de carência económica, de atestado de junta de freguesia em que a interessada já não residia.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Reclamou a interessada, desalojada de Moçambique, da morosidade do seu processo de pensão de velhice, sobretudo devido à exigência, por parte do Centro Nacional de Pensões, de um documento que se lhe tornava difícil obter e cuja apresentação se lhe afigurava desnecessária.

Consistia tal documento num atestado passado por determinada junta de freguesia, a declarar que ela não dispunha de quaisquer rendimentos próprios.

2 — Sucedia, porém, que, posteriormente a ter residido na área daquela junta de freguesia, a reclamante tinha vivido em 3 locais distintos, o último dos quais era o Lar da Cruz Vermelha Portuguesa, em Alcoitão, onde se encontrava à data da instrução do seu processo de pensão.

3 — Face ao exposto, e tendo em atenção que a desalojada já tinha entregado uma declaração do IARN onde se comprovava a sua situação de carência económica, o Serviço do Provedor de Justiça expôs ao Centro Nacional de Pensões que parecia ser excessiva a exigência feita, não encontrando razões para que se não considerasse suficiente, para o efeito, a referida declaração do IARN ou um eventual atestado passado pela junta de freguesia a que pertence o Lar da Cruz Vermelha Portuguesa, em Alcoitão, onde aquela estava à data instalada.

4 — O Centro Nacional de Pensões concordou com esta posição, declarando considerar de facto bastante para provar a carência económica da queixosa o atestado que recebera do IARN.

Processo n.° 81/R-247&-A-3

Sumário — Segurança social. Pensão de aposentação. Remunerações acessórias.

Objecto — Revisão da pensão de aposentação definitiva fixada a um antigo administrador de concelho de Angola, em cujo cálculo não foi incluída uma gratificação pelo exercício de funções na presidência de um corpo administrativo.

Decisão — Reclamação improcedente.

Síntese:

1 — As gratificações atribuídas por lei aos administradores de concelho que nas ex-colónias exerciam também as funções de presidentes dos corpos administrativos não têm sido consideradas relevantes para efeitos da determinação da remuneração que há-de servir de base de cálculo das respectivas pensões de aposentação.

E isso porque se entende que o exercício dessa presidência representava uma simples acumulação de cargos e, como. tal, a remuneração que lhe competia é

irrelevante para aquele efeito, de harmonia com o disposto no n.° 5 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 52/75, de 8 de Fevereiro, e artigo 48.° do Estatuto da Aposentação.

2 — Em 1981, porém, 3 acórdãos da 1.a Secção do Supremo Tribunal Administrativo decidiram que os abonos recebidos por administradores de concelho, nos termos do artigo 5.° do Diploma Legislativo de Angola n.° 2929, de 22 de Outubro de 1958, na nova redacção que lhe foi dada pelo Diploma Legislativo n.° 3125, de 14 de Junho de 1961, quando nas situações previstas nesse mesmo preceito legal, deverão ser contados para o cálculo da pensão de aposentação, desde que não ultrapassem o quantitativo da gratificação estabelecida no artigo 7.° do Diploma Legislativo n.° 3958, de 23 de Dezembro de 1969.

Com base nesse facto, veio um antigo administrado de concelho de Angola pedir a intervenção do Provedo de Justiça no sentido de ao caso dele ser aplicad; idêntica doutrina interpretativa e, consequentemente ser alterado, em conformidade, o montante em que a sua pensão definitiva de aposentação havia sido fixado.

3 — Entendeu-se que não havia lugar à intervenção solicitada, porque, «por um lado, o facto de uma dada questão de direito vir a ser solucionada, no domínio de aplicação da mesma legislação, por forma diversa, por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, não constitui razão válida para que qualquer delas, designadamente a que beneficia os interessados (recorrentes ou recorridos), deva ser considerada como a mais acertada sob o ponto de vista jurídico; por outro lado, porque, encontrando-se tais decisões pendentes de recurso para o tribunal pleno, enquanto este tribunal se não pronunciar, será prematuro dirigir à Administração qualquer recomendação no sentido de alterar o procedimento até agora seguido».

Foi por tal arquivado o processo, sem prejuízo de poder vir a prosseguir, se ocorrer motivo para que isso venha a considerar-se justificado.

Processo n.° 81/R-877-B-1

Sumário — Segurança social. Pensão de sobrevivência.

Objecto — Recusa de pensão de sobrevivência a viúvos de contribuintes do Montepio dos Servidores do Estado que não eram herdeiros hábeis face ao Decreto-Lei n.° 24 046, de 25 de Junho de 1934.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação aceite.

Síntese:

1 — O viúvo de uma contribuinte do Montepio dos Servidores do Estado reclamou para o Provedor de Justiça por lhe ter sido indeferido o pedido de pensão de sobrevivência que formulou ao abrigo do artigo 4." do Decreto-Lei n.° 191—B/77, de 25 de Junho, por não ser herdeiro hábil face ao Decreto-Lei n.° 24 046, de 21 de Junho de 1934.

2 — Estudado o assunto, verificou-se que, de facto, a situação se apresentava injusta. Com efeito, o artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-B/79, de 25 de Junho, viera atribuir a cônjuges sobreviventes de funcionários falecidos antes de 1 de Março de 1973 (data da publi-

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cação do Estatuto das Pensões de Sobrevivência) o direito de requererem pensão de sobrevivência, desde que não beneficiassem de qualquer outro esquema de segurança social com essa finalidade ou, na hipótese de poderem estar abrangidos pelo regime do Montepio dos Servidores do Estado, no caso de os falecidos funcionários neste se não terem voluntariamente inscrito, nos termos do Decreto-Lei n.° 24 046.

Não foram contemplados, porém, aqueles que, sendo herdeiros hábeis segundo a lei actual, não o eram face ao Decreto-Lei n.° 24 046: tratava-se, designadamente, de ex-maridos de funcionárias falecidas.

A incongruência da situação resultava até do facto de que estes interessados já teriam direito à atribuição de pensão de sobrevivência se as suas falecidas mulheres não se tivessem inscrito no Montepio e para ele descontado.

3 — Posta a questão à Caixa Geral de Depósitos, esta reconheceu o acerto da argumentação do Provedor.

4 — Por isso, o Provedor de Justiça formulou ao Ministro das Finanças e do Plano a seguinte recomendação:

a) Segundo o artigo 4.°, n." 1, alínea e), do Decreto-Lei n.ü 191—B/79, de 25 de Junho, podem habilitar-se a pensão de sobrevivência os herdeiros hábeis dos funcionários ou agentes falecidos antes de 1 de Março de 1973 que não estavam abrangidos por qualquer esquema de pensões de sobrevivência.

b) De harmonia com a alínea /) desse preceito, podem igualmente habilitar-se a pensão de sobrevivência os herdeiros hábeis de funcionários e agentes falecidos antes de 1 de Março de 1973 que só ao abrigo do Decreto-Lei n.° 24 046, de 21 de Junho de 1934, detinham essa qualidade, mas que não beneficiaram da pensão fixada nesse diploma por falta de inscrição voluntária dos funcionários ou agentes falecidos.

c) Todavia, os familiares de funcionários ou agentes inscritos no regime do citado Decreto-Lei n.° 24 046 e que, embora não fossem considerados «herdeiros hábeis» face a esse diploma, o são à luz dos critérios actualmente consagrados na lei. não são contemplados pelo aludido artigo 4." do Decreto-Lei n.° 191-B/79. Ê o caso, por exemplo, dos viúvos de funcionárias públicas que contribuíram para «sobrevivência» nos termos do Decreto-Lei n.° 24 046.

d) Ora, relacionando a incapacidade que acabamos de referir com o regime estatuído na mencionada alínea e) do n.° 1 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191—B/79, cai-se no absurdo de haver pessoas privadas do direito a pensão de sobrevivência devido unicamente ao facto de serem familiares de funcionários que contribuíram para sobrevivência. Isto porque, se não fosse essa contribuição, cairiam as mesmas no âmbito da alínea /) do n.° 1 daquele artigo 4.°, que atribui esse direito.

Neste contexto, formulo a seguinte recomendação:

Que seja revisto o regime definido no artigo 4.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 191-B/ 79, em termos de serem contemplados com pensão de sobrevivência os (hoje) herdeiros

hábeis de funcionários ou agentes falecidos antes de 1 de Março de 1973 e que, conquanto estes tivessem contribuído para um esquema de pensão de sobrevivência, não puderam dele beneficiar em virtude de. à luz desse esquema, não serem considerados «herdeiros hábeis».

5 — O departamento em questão respondeu ter preparado projecto de diploma legal no sentido recomendado.

Processo n.° 81/R-628-B-1

Sumário — Segurança social. Protecção a grandes deficientes.

Objecto — Recusa do pagamento integral de despesas derivadas do acompanhamento permanente de um deficiente profundo.

Decisão — Reclamação improcedente face à lei vigente. Recomendação de alteração legislativa.

Síntese:

1 — Um empregado bancário pediu a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de lhe ser concedida a comparticipação ou pagamento integral das despesas derivadas da assistência permanente requerida por um seu filho deficiente profundo, manifestamente desprotegido em relação aos demais deficientes passíveis de educação especial.

2 — As exposições antes feitas às entidades competentes não haviam merecido resposta.

3 — Estudado o assunto, concluiu-se que a situação objecto da queixa não derivara de incorrecta aplicação da lei vigente, mas sim de uma falta de resposta do esquema de assistência aos deficientes profundos. Deveria, portanto, encaminhar-se o caso para um grupo especializado que, no âmbito do Ministério dos Assuntos Sociais, revia a legislação de deficientes.

4 — Nesse sentido foi formulada recomendação pre-conizando-se que situações do tipo desta passassem a ter adequado tratamento legal.

5 — Tendo, entretanto, em 15 de Janeiro de 1981, sido publicado o Decreto Regulamentar n.° 3/81, a Secretaria de Estado da Segurança Social encaminhou o caso concreto do reclamante para o Centro Regional de Segurança Social de Lisboa, entidade competente para nele intervir.

Foi então dado conhecimento deste facto ao interessado, elucidando-se o mesmo acerca dos seus direitos face à nova legislação.

6 — Quanto ao problema global, a Secretaria de Estado da Segurança Social informou que iria ter em conta a recomendação do Provedor no âmbito da revisão dos diplomas legais aplicáveis, designadamente do Decreto-Lei n.° 170/80. Isto, na perspectiva de eventual generalização de subsídios a deficientes de maior grau de dependência, designadamente através do alargamento de âmbito do chamado «subsídio complementar a grandes inválidos», que necessitem de assistência constante de terceira pessoa.

Processo n.° 78/R-1513-A-3

Sumário — Segurança social. Subsídio de desemprego. Objecto — Revogação de despacho de concessão do subsídio de desemprego.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — A queixosa, desalojada das ex-colónias, requerera subsidio de desemprego, tendo-lhe sido comunicada em 12 de Setembro de 1971 a respectiva concessão. Todavia, o despacho que deferira o pedido da reclamante viera a ser revogado no mês seguinte com fundamento em disposição constante de uma circular (n.° 13-D-SD/77, de 28 de Setembro de 1971) publicada posteriormente ao deferimento. Esta norma regulamentar exigia que a prova do trabalho anterior, para efeitos de concessão de subsídio de desemprego a trabalhadores vindos das ex-colónias, se fizesse com base em documento originário destes mesmos territórios.

2 — O Provedor de Justiça, seguro de que a legalidade dos actos administrativos é apreciada com base nas normas vigentes à data da sua prática e de que o deferimento do pedido consubstanciava acto constitutivo de direitos, recomendou a revogação do despacho revogatório e a confirmação daquele deferimento.

E não deixou de salientar nessa ocasião que, embora compreendesse o intuito moralizador da exigência constante da circular em questão, entendia que a mesma não encontrava apoio na legislação aplicável (Decreto-Lei n.° 259/71 e Despacho Normativo n.° 152/77, de 8 de Julho) e se apresentava como demasiado rigorosa, por ser muitas vezes difícil aos interessados, atentas as circunstâncias em que a descolonização teve lugar, disporem de documentação comprovativa de trabalho anterior exarada nas próprias ex-colónias.

3 — O Secretário de Estado do Emprego, com base em parecer do auditor jurídico do Ministério do Trabalho, concordou com a ilegalidade do despacho revogatório, mas veio sustentar que, decorrido o prazo de recurso contencioso, tal acto se tornara irrevogável, por força do disposto no n.° 2 do artigo 18.° da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo.

4 — O Provedor de Justiça rejeitou tal argumento, por considerar que aquela disposição legal não é aplicável aos actos constitutivos de deveres, extintivos de direitos ou denegatórios da constituição de um direito, como era o caso. Não faz sentido aplicar o princípio da irrevogabilidade, justificável pela necessidade de consolidar a situação dos particulares, a actos desfavoráveis aos interesses destes.

5 — O Secretário de Estado do Emprego, aceitando a bondade da argumentação deduzida, revogou o despacho em causa e confirmou o acto da concessão de subsídio.

Processo n.° 81/IP-44-B-1

Sumário — Segurança social. Subsídio de desemprego.

Pensão de reforma. Objecto — Articulação entre a cessação do pagamento

do subsídio de desemprego e o início do da pensão

de reforma. Decisão — Recomendação acatada. Síntese:

1 — De harmonia com a legislação que rege o subsídio de desemprego, este benefício extingue-se quando o seu titular atinge a idade legal de reforma.

Assim, têm os subsidiados todo o interesse em requerer as pensões de reforma por velhice com a antecedência necessária para evitar que haja um hiato entre a extinção do subsídio e o início da pensão.

2 — Através de casos que têm sido submetidos ao Provedor de Justiça, constatou-se que, por desconhecimento pormenorizado da lei e do tempo que a pensão de reforma leva a ser processada, sucede muitas vezes que os interessados não requerem atempadamente este último benefício, o que determina que fiquem desprovidos de qualquer protecção monetária durante certo lapso de tempo.

3 — Neste contexto, determinou o Provedor de Justiça a abertura de um processo de sua iniciativa com vista ao estudo da questão.

Em resultado desse estudo, foi recomendada ao di-rector-geral de Segurança Social a instituição de um sistema que alerte os beneficiários que estão a auferir subsídio de desemprego para a necessidade de requererem a pensão de velhice com uma margem de tempo, relativamente à data em que perfaçam a idade de reforma, susceptível de lhes evitar uma interrupção no recebimento das prestações pecuniárias.

4 — A Direcção-Geral de Segurança Social informou que esta recomendação do Provedor vinha reforçar um projecto seu no sentido da realização de um estudo de articulação global relativa à transição entre os regimes de prestações imediatas e diferidas, estudo esse de cujo seguimento e resultados prometeu informar este Serviço.

Por outro lado, comunicou que dera instruções para que o Centro Nacional de Pensões e os centros regionais de segurança social chamassem a atenção dos beneficiários de subsídio de desemprego cuja idade se aproximasse da da reforma para que requeressem a pensão respectiva com uma antecedência mínima de 3 meses em relação àquela data.

Seguros

Processo n.° 82/R-744-B-1

Sumário — Seguros. Acidente de viação. Indemnização.

Objecto — Recusa de pagamento de indemnização relativa à utilização de veículo em substituição durante o fim-de-semana.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

I — Um cidadão queixou-se contra a Fidelidade — Grupo Segurador, E. P., com fundamento em esta seguradora se negar a pagar integralmente as despesas com o aluguer de um veículo durante o período em que o reclamante teve o seu imobilizado, em reparação de danos causados por acidente da exclusiva responsabilidade de um segurado daquela.

Concretamente, não queria aquele Grupo Segurador pagar o preço do aluguer durante os períodos de fim--de-semana, nem os prémios de seguro do veículo alugado, alegando também que através da própria seguradora se teria obtido um aluguer mais barato. E, especificamente, quanto àqueles prémios, alicerçava-se em que o reclamante deveria ter tomado uma de duas

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atitudes: ou solicitar à sua própria seguradora que as coberturas do seu veículo fossem aplicadas durante a paralisação ao veículo alugado, ou pedir a suspensão daquelas coberturas durante o mesmo período.

2 — O Provedor de Justiça chamou a atenção da administração da Fidelidade para, por um lado, o artigo 562.° do Código Civil, que impõe o dever de «reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação», bem como para a jurisprudência dominante na matéria, e, por outro lado, para o facto de o aluguer do veículo e o seguro do mesmo se terem ficado a dever à falta de resposta da seguradora a uma carta que o reclamante lhe dirigiu logo após o acidente, solicitando que por ela fosse posto um veículo à disposição.

Em face de tais considerações, a entidade visada concordou em reembolsar integralmente o interessado.

Trabalho — Administração local

Processo n.° 8G7R-803-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Carreiras.

Objecto — Recusa de transição de cantoneiros (de vias municipais) da 2." classe para a 1classe, de acordo com o respectivo tempo de serviço.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — O Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a Câmara Municipal de São João da Pesqueira, alegando que esta aplicara incorrecta e ilegalmente as disposições dos Decretos--Leis n.os 191-C/79, de 25 de Junho, e 466/79, de 7 de Dezembro, a um associado do mesmo Sindicato, cantoneiro (de vias municipais) do quadro de pessoal daquela autarquia, pois que, em vez de o ter feito transitar para a categoria de operário não qualificado de 1." classe, o mantinha na categoria de operário não qualificado de 2." classe, com fundamento na circunstância de que o referido trabalhador não possuía o requisito de bom e efectivo serviço previsto no artigo 14.°, n.° 8, alínea b), do citado Decreto-Lei n.° 191-C/79.

2 — Apreciado o assunto, foi sobre ele elaborada uma informação na qual se punha em dúvida que o artigo 21.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 191-C/79 (aplicável à transição nas carreiras do pessoal auxiliar da administração autárquica constante do anexo i ao Decreto-Lei n.° 466/79, por força do estatuído no artigo 31.°, n.° 2, deste último diploma normativo), ao aludir simplesmente ao «tempo de serviço» na respectiva categoria ou carreira para efeito de transição para as novas categorias do pessoal integrado em carreiras horizontais, estivesse a contemplar, simultaneamente, o requisito de «qualidade de serviço» a que alude o artigo 14.°, n.° 8, do mesmo Decreto-Lei n.° 191-C/79, ao definir os «módulos de tempo» para acesso à classe imediatamente superior de cada uma das carreiras operárias uniformizadas, e ao qual também fazia apelo o artigo 22.°, n.° 1, ao referir-se aos «requisitos de promoção previstos neste diploma e nos respectivos diplomas orgânicos».

3 — Para adequada elucidação do problema focado, bem como de algumas outras questões que foram então suscitadas na mencionada informação acerca dos termos em que deveria ter lugar a transição dos cantoneiros (de vias municipais) do quadro de pessoal da Câmara Municipal de São João da Pesqueira para as novas categorias da correspondente carreira, na sequência dos invocados Decretos-Leis n.05 191-C/79 e 466/79, e tendo igualmente em consideração determinadas disposições da Portaria n.° 739/79, de 31 de Dezembro, e do Decreto-Lei n.° 377/79, de 13 de Setembro, entendeu o Serviço do Provedor de Justiça oportuno solicitar à Secretaria de Estado da Administração Regional e Local que, face ao estatuído no artigo 43.° daquele Decreto-Lei n.° 466/79, transmitisse os esclarecimentos que julgasse úteis a propósito do assunto.

4 — Em resposta, veio a ser recebida da Direcção--Geral da Acção Regional e Local uma informação na qual se concluía que à transição dos trabalhadores em causa para o novo quadro de pessoal do Município de São João da Pesqueira, em execução do Decreto--Lei n.° 466/79, era aplicável o disposto no artigo 21.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 191-C/79, independentemente da classificação de serviço.

Quanto ao disposto no n.° 8 do artigo 14.° do mesmo Decreto-Lei n.° 191-C/79, contemplava-se aí a progressão normal nas carreiras operárias, estruturadas nos termos de tal diploma, exigindo-se então para acesso à categoria imediatamente superior a classificação de serviço não inferior a Bom.

5 — Assim, o Provedor de Justiça transmitiu à Câmara Municipal de São João da Pesqueira o teor da informação que neste Serviço fora elaborada sobre o assunto, bem como o conteúdo daquela outra que recebera da mencionada Direcção-Geral, tendo ponderado que, na hipótese de o problema em apreço ainda não haver sido adequadamente solucionado curial seria que se procedesse à sua resolução nos termos dos Decretos-Leis n.05 466/79 e 191-C/79, mediante reforma da deliberação anteriormente tomada pelo citado órgão autárquico a propósito do assunto, na parte respeitante aos cantoneiros (de vias municipais) interessados, de forma a atribuir-se-íhes', com efeito retroactivo, a categoria de transição a que tinham direito, de acordo com o tempo de serviço prestado.

6 — Em resultado das diligências efectuadas, a Câmara Municipal comunicou que, face aos esclarecimentos que lhe tinham sido transmitidos, deliberara fazer, com efeito retroactivo, transitar para a categoria de cantoneiros (de vias municipais) de 1.° classe, de acordo com o tempo de serviço prestado, os trabalhadores daquela carreira que não tinham sido abrangidos pela deliberação anteriormente tomada pelo mesmo órgão autárquico a respeito do assunto.

7 — Encontrando-se resolvido, pois, o problema suscitado no processo, procedeu-se ao respectivo arquivamento. 1

Processo n.° 81/R-1859-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concursos.

Objecto — Ilegalidades num concurso para provimento de um lugar de telefonista de 2.a classe de uma câmara municipal. Interposição de recurso contencioso.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Decisão — Reclamação procedente. Recurso contencioso. Síntese:

1 — Foi apresentada reclamação por alegadas ilegalidades ocorridas num concurso documental para provimento de um lugar de telefonista de 2.a classe da Câmara Municipal de Lousada, aberto por aviso publicado no Diário da República, 3.a série, n.° 107, de 11 de Maio de 1981.

2 — Analisado o processo de concurso, foi recomendado àquele corpo administrativo autárquico que procedesse à sua anulação, pelas irregularidades que se passam a expor:

a) Não fora dado cumprimento ao disposto no artigo 22.° do Decreto Regulamentar n.° 68/80, de 4 de Novembro, que determina que a lista definitiva dos candidatos admitidos a concurso, bem como dos excluídos, com a indicação do motivo da exclusão, deverá ser publicada no prazo de 30 dias após a publicação da lista provisória ou nos 15 dias imediatos à resolução dos recursos, e precedendo despacho de homolgação da entidade competente para proceder à abertura do concurso.

Assim, com a não publicação da lista definitiva dos candidatos admitidos a concurso fora preterida uma formalidade essencial, geradora de vício de forma.

b) Lê-se no artigo 24.° do citado diploma:

1 — Finda a prestação de provas ou a apreciação dos elementos relevantes que legalmente devam ser lidos em conta para a graduação dos candidatos, o júri graduá-los-á, adoptando a classificação de 0 a 20, dispondo-os em lista por ordem decrescente das classificações.

A valorização dos candidatos é feita pelo júri, que aprecia o seu mérito livremente ou de acordo com os critérios estabelecidos, devendo o resultado de tal apreciação ser traduzido na atribuição de uma cias sificação que pode ir de 0 a 20 valores.

Não tendo dado uma classificação aos candidatos, o júri violou o n.° 1 do artigo 24.° do Decreto Regulamentar n.° 68/80, ferindo de ilegalidade, na modalidade de violação da lei, a deliberação da Câmara ívlunicipal de Lousada de 4 de Novembro de 1981, que vierai homologar a lista final de ordenamento dos candidatos aprovados (lista esta que viria a ser publicada no Diário da República, 3.a série, n.° 291, de 19 de Dezembro de 1981).

c) Dispõe o artigo 25.° do Decreto Regulamentar n." 68/80:

I — Em caso de igualdade de classificação no termo das provas ou métodos de selecção, serão observadas as seguintes prioridades:

a) Melhor classificação de serviço nos 3 anos

imediatamente anteriores;

b) Frequência de curso de formação com

informação de aproveitamento;

c) Estar ao serviço da entidade em cujo

quadro ocorra a vaga;

d) Mais tempo de serviço contado, suces-

sivamente, na categoria, na carreira e em serviço público.

Estas prioridades, como nitidamente ressalta da letra da lei, servem para a ordenação na lista dos can-

didatos que obtenham a mesma classificação. Quer dizer, não constituem preferência a considerar pelo júri de 26 de Agosto de 1981 —, a prioridade a que se actuando, sim, e se necessário, em momento ulterior à valorização dos candidatos.

Como resultava da leitura da acta — relatório do júri de 26 de Agosto de 1981 —, a prioridade a que se refere a alínea a) do n.° 1 do artigo 25.° (estar ao serviço da entidade em cujo quadro ocorra a vaga) fora considerada na avaliação da candidata que veio a ser classificada em 1.° lugar.

Estava, assim, também ferida de ilegalidade, na modalidade de violação da lei, por erro de direito, a deliberação camarária de 4 de Novembro de 1981, que definiu a lista dos candidatos aprovados no concurso.

3 — O Provedor recomendou, por estas razões, à Câmara Municipal de Lousada a revogação do acto contestado.

Mas, como estava iminente o decurso do prazo de revogação de acto constitutivo de direitos (como este o era), decidiu também expor a situação ao agente do ministério público na Auditoria Administrativa do Porto.

Este veio a interpor recurso contencioso da anulação da deliberação da Câmara Municipal de Lousada, eivada de ilegalidades.

Desconhece-se ainda o resultado desse recurso, em que a Câmara Municipal apresentou contestação.

Processo n.° 81/R-1660-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concurso. Objecto — Irregularidades em concurso de provimento

para uma vaga de leitor-cobrador de 2.a classe de

uma câmara municipal. Decisão — Reclamação procedente. Reparo. Síntese:

1 — Foi apresentada reclamação relativa à ocorrência de irregularidades no concurso de provimento para uma vaga de leitor-cobrador de 2.a classe aberto por deliberação dó Município de Lousada de 19 de Janeiro de 1981, com aviso publicado no Diário da República, 3.a série, n.° 107, de 11 de Maio do mesmo ano.

2 — Analisado o processo de concurso, constatou-se a existência de ilegalidades, as quais, todavia, já não podiam ser atacadas, por se encontrar esgotado o prazo para interposição de recurso contencioso e para revogação do acto administrativo de provimento, subsequente ao concurso ferido de invalidade.

O processo foi, por isso, arquivado.

3 — Mas o Provedor não deixou de formular à Câmara Municipal um reparo pela verificação das irregularidades que se passam a expor:

a) Nos termos do artigo 20." do Decreto Regulamentar n.° 68/80, de 4 de Novembro, constará de lista provisória, a elaborar pelo júri do concurso e a publicar no jornal oficial, a indicação dos candidatos admitidos e excluídos, sendo possível recurso, no caso de exclusão, para o órgão executivo do Município, cuja decisão, no sentido do afastamento, constituirá acto administrativo contenciosamente impugnável.

O júri, ao excluir 2 candidatos por falta de requisitos de admissão ao concurso somente quando reuniu

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para proceder à graduação e ordenação em listas dos aprovados, desrespeitou o conteúdo normativo do supramencionado artigo 20.°

b) Não foi dado cumprimento ao disposto no artigo 22.° do decreto regulamentar em causa, que determina que a lista definitiva dos candidatos admitidos ao concurso, bem como dos excluídos, deverá ser publicada no prazo de 30 dias após a publicação da lista provisória ou nos 15 dias imediatos à resolução dos recursos, e precedendo despacho de homologação da entidade competente para proceder à abertura do concurso. Com efeito, não foi publicada a lista definitiva a que se refere este artigo.

c) Não parece acertado, pelas legítimas dúvidas que pode suscitar nos candidatos, que nas listas provisórias, que não representam ainda a graduação dos candidatos, mas apenas a enumeração dos admitidos e dos excluídos, os nomes sejam precedidos dos ordinais 1.°, 2.°, etc.

Foi o que sucedeu com a lista provisória, publicada no Diário da República, 3.a série, n.° 171, de 28 de Julho de 1981.

d) Lê-se no artigo 24.° do Decreto Regulamentar n.° 68/80:

1 — Finda a prestação de provas ou apreciação dos elementos relevantes que legalmente devam ser tidos em conta para a graduação dos candidatos, o júri graduá-lo-á, adoptando a classificação de 0 a 20, dispondo-os em lista por ordem decrescente das classificações.

A valorização dos candidatos é feita pelo júri, que aprecia o seu mérito livremente ou de acordo com critérios prefixados, devendo o resultado dessa apreciação ser traduzido numa classificação de 0 a 20 valores.

Não tendo assim procedido, o júri violou o disposto no n." 1 do artigo 24.°:

e) Estabelece o artigo 25." do mesmo diploma:

1 — Em caso de igualdade de classificação no termo das provas ou métodos de selecção, serão observadas as seguintes prioridades:

a) Melhor classificação de serviço nos 3 anos

imediatamente anteriores;

b) Frequência de curso de formação com

informação de aproveitamento;

c) Estar ao serviço da entidade em cujo qua-

dro ocorra a vaga;

d) Mais tempo de serviço contado, sucessi-

vamente, na categoria, na carreira e em serviço público.

Estas prioridades, como claramente ressalta da letra da lei, servem para ordenação dos candidatos na lista que, em resultado do concurso, obtenham a mesma classificação. Quer dizer, não constituem preferências a considerar pelo júri aquando da apreciação do mérito dos candidatos, eferindo-se, sim, a um momento ulterior.

Ora, a preferência da alínea a) do n.° 1 do ar-tigo 25° foi tomada em consideração para efeitos de classificação dos candidatos a quem foram atribuídos os 3 primeiros lugares. E a da alínea d) foi atendida na classificação do concorrente colocado em 1.° lugar.

Processo n.° 80/R-1292-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concursos. Contratos eventuais.

Objecto — Não provimento de uma candidata aprovada em concurso para escriturario-dactilógrafo em vaga aberta no período de validade do concurso. Ilegalidade da prorrogação de contratos eventuais celebrados por 2 meses.

Decisão — Reclamação procedente. Reparo.

Síntese:

1 — Apresentou reclamação uma candidata aprovada em concurso de provimento para vagas de escriturario-dactilógrafo da Câmara Municipal de Alvito, com o fundamento de este corpo administrativo autárquico, ao mostrar intenção de preencher 2 lugares criados no período de validade do concurso, ter desrespeitado o seu resultado, não a contactando a ela nem à candidata graduada depois de si, e decidindo proceder à admissão de estagiários, cujos contratos foram, sucessivamente, prorrogados e cuja entrada posterior nos quadros da autarquia estaria prevista.

2 — Estudado o caso, concluiu-se que não fora legalmente correcta a actuação da Câmara Municipal.

Por um lado, esse procedimento acabava por frustrar os resultados do concurso. De facto, a Administração não é legalmente obrigada a prover os aprovados a concurso. Mas, ao pretender, no prazo de validade do mesmo, preencher algum lugar por ele abrangido, teria de recorrer aos candidatos já aprovados e segundo a graduação respectiva.

A admissão de elementos para exercerem as funções de escriturarios-dactilógrafos sem que a queixosa houvesse sido contactada para tanto violava, pois. este regime legal.

Por outro lado, a prorrogação dos contratos celebrados com os elementos designados por «estagiários» revelava-se também ilegal, por exceder o prazo de 2 meses estabelecido no n.° 4 do artigo 53.° do Decreto--Lei n.° 294/76, de 24 de Abril.

Essas prorrogações até teriam de se considerar inexistentes, face ao disposto no artigo 1.° do Decreto--Lei n.° 175/78, de 13 de Julho, que aplica tal cominação aos provimentos que desrespeitem o regime legal de excedentes de pessoal.

3 — Embora a Câmara Municipal tivesse acabado, entretanto, por prover a reclamante para o lugar pretendido, o Provedor de Justiça não deixou de formular--Ihe reparo a respeito das ilegalidades que cometera.

Processo n.° 81/R-2375-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concursos.

Contratação eventual. Objecto — Inexistência de vaga. Contrato eventual

ilegal.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente.

Síntese:

1 — Uma candidata aprovada num concurso para escriturario-dactilógrafo aberto pela Câmara Municipal de Resende, reclamou porque, encontrando-se o

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II SÉRIE — NÚMERO 68

concurso ainda válido e existindo uma vaga por prover, aquele corpo administrativo autárquico se recusara a admiti-la, antes preferindo celebrar um contrato eventual com um terceiro para o desempenho das funções correspondentes ao cargo.

2 — Instruído o processo, verificou-se que não existia a vaga referida, nem poderia ser criada, por força do n.° 2 do artigo 16.° do Decreto-Lei n.° 466/79, de 7 de Dezembro, pelo que nesta parte carecia de fundamento a queixa.

3 — Já no que concerne ao contrato eventual, embora permitido pelo n.° 1 do artigo 53.° do Decreto--Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, não poderia ter duração superior a 2 meses, como imperativamente dispõe o citado preceito. Aliás, o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 175/78, de 13 de Junho, sanciona com a inexistência jurídica as admissões de pessoal que contrariem aquele dispositivo legal.

Esta situação irregular motivou que fosse dirigido um reparo à Câmara Municipal de Resende, bem como uma recomendação no sentido de em casos futuros ser respeitada na admissão de pessoal eventual a classificação decorrente do concurso ainda válido, não deixando, para o efeito, de se consultar, sucessivamente, os mais bem classificados.

Processo n.° 80/IP-50-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concursos de provimento. Limite de idade.

Objecto — Exigência do requisito de idade não superior a 65 anos para admissão a concursos de provimento de lugares dos quadros da administração autárquica.

Decisão — Situação regularizada.

Síntese:

1 — Através da leitura de anúncios e avisos de abertura de concursos para provimento de lugares publicados no Diário da República, 3." série, verificou o Serviço do Provedor de Justiça que algumas câmaras municipais vinham exigindo como condição de admissão a esses concursos, entre outras, a de não terem os candidatos idade inferior a 18 nem superior a 65 anos, invocando-se, por vezes, como fundamento de tal condição, o disposto no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 498/ 72, de 9 de Dezembro, na redacção que lhe fora dada pelo Decreto-Lei n.° 191-A/79, de 25 de Junho.

2 — Apreciado o assunto neste Serviço, concluiu-se que o disposto no artigo 4.°, n.° 1, do citado diploma não devia nem podia fundamentar, imperativamente, a exclusão de tais concursos de interessados que tivessem mais de 65 anos de idade, desde que, por aplicação do estatuído no artigo 4.°, n.° 2, do mesmo Decreto-Lei n.° 498/72, na sua redacção actualizada, pudessem os candidatos (se acaso viessem a ser providos nos lugares postos a concurso) perfazer o mínimo de 5 anos de inscrição na Caáxa Geral de Aposentações, até atingirem o limite de idade fixado na lei para o exercício dos respectivos cargos.

3 — Assim, e porque o procedimento posto em causa não constituía caso isolado, o Provedor de Justiça ponderou ao Gabinete de Apoio às Autarquias Locais a conveniência de o mesmo suscitar a atenção das autarquias locais para os preceitos normativos aplicá-

veis ao assunto através de circular, a fim de se obstar à exclusão dos concursos em apreço de interessados que pudessem reunir os requisitos legais indispensáveis para admissão aos mesmos.

4 — Não obstante a diligência então realizada, e apesar de se haver admitido que com a ulterior publicação do Decreto n.° 68/80, de 4 de Novembro, o problema em causa não voltaria a surgir, face ao teor do artigo 6.°, alínea b), do mesmo diploma regulamentar, constatou-se posteriormente que voltaram a ser publicados no Diário da República, 3.a série, avisos de abertura de concursos para provimento de lugares dos quadros de pessoal autárquico, mantendo como condição de admissão a exigência de idade não superior a 65 anos, sem qualquer referência ao condicionalismo previsto no artigo 4.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 498/72, de 9 de Dezembro.

Por isso, o Provedor de Justiça ponderou novamente à Direcção-Geral da Acção Regional e Local a oportunidade de ser chamada a atenção das autarquias locais para a questão em apreço, havendo, simultaneamente, dado conhecimento do assunto à Camara Municipal de Lisboa, a cujos quadros de pessoal pertenciam os lugares mencionados naqueles últimos avisos.

5 — Em resposta, a Direcção-Geral da Acção Regional e Local comunicou que, em seguimento da sugestão formulada, transmitira às câmaras municipais uma circular suscitando a respectiva atenção para as normas legais aplicáveis à matéria em foco.

Por seu turno, a Câmara Municipal de Lisboa esclareceu que a limitação consignada nos referidos avisos de abertura de concursos de provimento derivara da interpretação dada ao teor do artigo 4.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 498/72, na redacção que lhe fora dada pelo Decreto-Lei n.° 191-A/79, uma vez que não eram conhecidas naquele Município as considerações que o Provedor de Justiça formulara anteriormente ao Gabinete de Apoio às Autarquias Locais. Todavia, após recepção do ofício que lhe fora remetido a propósito do assunto, a Câmara Municipal passara a tomar em linha de conta os preceitos normativos aplicáveis à matéria em causa.

6 — Considerando, pois, o resultado positivo das diligências efectuadas, foi determinado o arquivamento do processo.

Procssso n.° 82/R-617-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Concurso de provimento. Lista de classificação dos candidatos.

Objecto — alteração da lista de classificação dos candidatos a um concurso de provimento elaborada pelo respectivo júri.

Decisão — Reclamação procedente. Situação não regularizada. Recurso contencioso.

Síntese:

1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor de Justiça uma reclamação contra a Câmara Municipal de Alcobaça, alegando o seguinte: o impetrante candidatara-se a um concurso aberto pelo citado órgão autárquico para provimento de 1 lugar de fiscal de obras de 3." classe e fora graduado em 1." lugar pelo júri do mencionado concurso, de acordo com os elementos

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a tomar em linha de consideração para elaboração da respectiva lista de classificação.

Todavia, a Câmara Municipal, ao deliberar sobre a aprovação daquela lista de classificação, alterou a graduação dos candidatos aprovados, ordenando o reclamante em 2.° lugar e colocando em 1.° lugar o candidato que havia sido ordenado em 4.° lugar pelo júri do respectivo concurso.

E, assim, fora tal candidato nomeado para o dito lugar de fiscal de obras de 3.a classe.

2 — Apreciado o assunto à luz do disposto no artigo 24.° do Decreto Regulamentar n.° 68/80, de 4 de Novembro (cf., a propósito, os artigos 1.°, n.° 1, e 2.° do mesmo diploma), afigurou-se que, embora o n.° 4 daquele artigo 24.° nada referisse acerca da possibilidade ou impossibilidade de a entidade competente alterar a lista de classificação elaborada pelo júri do concurso, a verdade é que a mesma norma dispõe que a mencionada lista tem de ser aprovada pela entidade que haja mandado proceder à abertura do concurso.

Assim, não pareceria de negar a tal entidade o direito de não aprovar a lista em apreço se verificasse que nela não fora respeitado o resultado das provas eventualmente prestadas pelos candidatos, ou que não haviam sido considerados elementos relevantes que legalmente devessem ser tidos em conta para a graduação dos concorrentes (v. artigo 24.°, n.° 1, do citado decreto regulamentar), ou se constatasse que não fora observado qualquer outro preceito ao assunto aplicável.

O que já não parecia acertado era que pudesse a aludida entidade modificar, discricionariamente, a graduação e ordenação dos candidatos ao concurso feita pelo respectivo júri, quando ela se mostrasse adequadamente efectuada em harmonia com o resultado do concurso e com os preceitos normativos ao assunto aplicáveis, e muito menos ainda quando, como teria sucedido no caso concreto, nem sequer houvessem sido evidenciados na reunião autárquica mencionada no processo quaisquer motivos fundamentados para e não aprovação da lista de classificação elaborada pelo júri.

3 — Em tais termos, foi o assunto exposto seguidamente à Câmara Municipal de Alcobaça, havendo-se solicitado também esclarecimento acerca da posição da Direcção-Geral de Acção Regional e Local a propósito do assunto.

Da Direcção-Geral veio a ser recebida informação no sentido de que nada tinha a objectar ao entendimento perfilhado pelo Serviço do Provedor de Justiça a respeito da questão suscitada.

Quanto à Câmara Municipal, comunicou ela que não parecia ser errado que a entidade que tinha de aprovar a lista de graduação dos candidatos proposts pelo júri do concurso detivesse o poder de não concordar exactamente com tal proposta e de a alterar no sentido e de harmonia com o que achasse mais justo.

No caso em apreço, a Câmara Municipal de Alcobaça, ao apreciar a proposta do júri do concurso e ao discuti-la — era face das várias intervenções feitas na discussão prévia—, entendera, por escrutínio secreto, que a graduação dos concorrentes deveria ser aquela que estabeleceu.

Não o fizera discricionariamente, pois, sendo um órgão colegial e tendo discutido exaustivamente o assunto antes da votação (havendo cada membro apresentado os seus argumentos e invocado as razões de

preferência que, no ponto de vista respectivo, deveriam ser tidas em conta), viera, por maioria de votos, a alterar a proposta do júri do concurso, o que parecia ser lícito.

4 — Sobre o problema em análise veio o Provedor de Justiça a ponderar à Câmara Municipal de Alcobaça que a argumentação por ela expendida deveria ser entendida nos termos e limites que já haviam sido ante riormente apontados.

E seria de notar igualmente que, consoante se frisara na altura, a deliberação autárquica tomada acerca do assunto em causa não evidenciava as razões em que se teria fundamentado a não aprovação da lista de classificação elaborada pelo júri do concurso.

Por outro lado, a citada deliberação não deixara de ser tomada discricionariamente, pois se baseara apenas em critérios ou razões que a Câmara Municipal então • adoptara para resolução do assunto, e não na apreciação dos resultados dos elementos que tinham sido tomados em conta pelo júri do concurso para graduação e classificação dos candidatos.

5 — E havendo-se tido conhecimento pouco tempo depois, através de contacto telefónico estabelecido com o impetrante, de que o mesmo impugnara contenciosamente a deliberação autárquica posta em causa no processo, veio a ser igualmente ponderado à Câmara Municipal de Alcobaça (à qual se comunicou a posição que também já havia sido anteriormente assumida pela Direcção-Geral da Acção Regional e Local a propósito do assunto) que, na hipótese de tal se mostrar ainda viável, nos termos do artigo 2.", n.° 2, do Decreto-Lei n.° 256-A/77, de 17 de Junho, adequado seria que se procedesse à revogação da mencionada deliberação, de acordo com o pensamento expendido pelo Provedor (e acolhido pela citada Direcção-Geral), visto essa deliberação ter afectado, sem fundamento expresso adequado e válido, a situação do candidato inicialmente graduado em 1.° lugar na lista de classificação elaborada pelo júri do respectivo concurso.

6 — Em resposta, porém, esclareceu o aludido órgão autárquico que resolvera sustentar integralmente a deliberação anteriormente tomada acerca do problema, pelos fundamentos aduzidos em nova reunião camarária em que fora apreciado o recurso contencioso interposto pelo reclamante contra aquela outra deliberação.

Assim, e porque nos termos descritos caberia à Auditoria Administrativa decidir sobre a questão suscitada em tal recurso contencioso, foi determinado o arquivamento do processo organizado no Serviço do Provedor de Justiça com base na reclamação do interessado.

Processo n.° 80/R-1972-B-4

Sumário — Trabalho. Administração local. Faltas.

Objecto — Marcação indevida de faltas a funcionário da Câmara Municipal de Vila do Bispo.

Decisão— Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1—Um sindicato representativo do pessoal da administração local apresentou queixa ao Provedor por terem sido pela Câmara Municipal de Vila do Bispo

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marcadas 4 faltas injustificadas a um leitor-cobrador, relativamente a dias em que ele teria trabalhado normalmente e assinado o livro de ponto.

2 — Ouvida a Câmara Municipal, esta respondeu que as faltas haviam sido marcadas porque o funcionário, depois de por algumas vezes ter sido dispensado do serviço da parte da tarde para visitar sua mulher, hospitalizada, havia declarado expressamente ao presidente da edilidade, quando novo pedido nesse sentido lhe fora recusado, que se ausentaria de qualquer modo, com autorização ou sem ela.

Aliás, o funcionário teria sido nessa ocasião incorrecto para com o presidente da Câmara, quando este lhe chamara a atenção para o atraso que se vinha sistematicamente verificando na realização do seu trabalho de leitor-cobrador.

De resto, a Câmara até teria pretendido não prejudicar o funcionário, ao marcar-lhe apenas faltas injustificadas, sem lhe levantar processo disciplinar.

3 — Porque a resposta da entidade visada não fora muito precisa, este Serviço pediu-lhe que indicasse, concretamente, as datas e circunstâncias das faltas em questão.

E, como se verificasse discordância, ao serem recebidos estes elementos, com a indicação de datas diversas, noutro documento antes remetido pela Câmara, pediram-se depois também para análise as folhas correspondentes do livro de ponto.

4 — Analisada toda a questão, verificou-se que nas várias datas referidas pela Câmara o livro de ponto estava assinado pelo interessado e devidamente encerrado, isto excepto em relação à tarde de um desses dias, em que as assinaturas dele apareciam rasuradas.

5 — O Provedor reconheceu que o funcionário terá agido incorrectamente, quer ao atrasar o seu serviço, quer na forma como se dirigiu ao presidente da Câmara.

Admitiu também que este drgão autárquico, ao marcar-lhe faltas injustificadas, sem lhe levantar procedimento disciplinar, terá querido, afinal, não o prejudicar.

Mas o que não parecia legalmente possível seria a marcação de faltas, para mais injustificadas, em relação a datas em que não se provava, através do livro de ponto, ter o funcionário estado ausente do serviço.

6 — Esta a posição transmitida à Câmara Municipal (já que se não conseguiu apurar quem fizera a mencionada rasura no livro de ponto).

7 — A entidade visada aceitou a opinião do Provedor, tendo revogado a marcação de faltas injustificadas.

Processo n.° 807R-1703-B-4

Sumário —Trabalho. Administração local. Provimento.

Objecto — Admissão de pessoal sem obediência ao regime legal aplicável aos excedentes.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

\ — Um munícipe de Monchique comunicou ao Provedor que a Câmara Municipal respectiva procedera em Maio de 1980 à admissão de 2 eventuais, 1 contínua e 1 escriturária-dactilógrafa (uma delas cônjuge

de um funcionário camarário), sem obediência às regras legais aplicáveis à admissão de pessoal.

2 — Perguntou-se à Câmara Municipal qual o procedimento utilizado na admissão desses elementos e, designadamente, se teria sido respeitado o regime de prévia consulta ao quadro geral de adidos, previsto nos diplomas relativos a excedentes de pessoal (Decre-tos-Leis n.M 294/76, de 24 de Abril, e 175/78, de 13 de Julho).

3 — O referido órgão autárquico reconheceu que não dera cumprimento a essa legislação.

Fizera-o por alegada urgência na admissão dos dois trabalhadores em causa, urgência que teria levado até a prescindir de qualquer anúncio público do propósito de admissão de 1 escriturario-dactilógrafo (a admissão do contínuo tinha sido precedida de edital, afixado por 15 dias).

4 — O Provedor chamou a atenção para que as admissões em questão tinham de ter-se por ilegais.

Compreendendo, porém, a invocação de necessidade da autarquia em dispor dos elementos em causa, e que na altura já se encontravam em funções havia um ano, recomendou que a situação fosse regularizada mediante pergunta ao quadro geral de adidos sobre se dispunha de pessoal das categorias em questão.

Só seria aceitável a manutenção ao serviço dos trabalhadores em causa se a resposta do quadro geral de adidos fosse negativa ou não viesse a ser recebida no prazo que a lei para tanto prevê.

5 — A Câmara Municipal de Monchique assim procedeu, o que conduziu ao encerramento do caso.

Proc3sso n.° 79/R-623-B^

Sumário — Trabalho. Administração local. Reclassificação.

Objecto — Revisão do processo legal de reclassificação dós arquivistas das secretarias das câmaras municipais.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — Um funcionário administrativo da Câmara Municipal de Cascais, com a categoria de arquivista, foi reclassificado na categoria de fiel de arquivo, face ao disposto no Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, o que se traduzia na descida de 2 letras na tabela de vencimentos dos funcionários públicos.

2 — Analisada a questão, constatou-se que aquela reclassificação resultara da própria lei.

De facto, o Decreto-Lei n.° 76/77 (e a Portaria n.° 787/77, que o regulamentara) só previa a categoria de arquivista para o grupo de actividades 3 (bibliotecas, museus e turismo).

Não sendo esse o caso do reclamante, que trabalhava na secretaria da Câmara, fora legalmente correcta a sua reclassificação como fiel de arquivo.

Esta reclassificação representou uma descida de 2 letras na tabela de vencimentos do funcionalismo.

3 — Face à injustiça da situação — porventura extensiva também a outros funcionários em situação similar—, o Provedor recomendou ao Ministério da

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Administração Interna a publicação de alteração legislativa que a resolvesse.

4 — Esta recomendação veio a ser aceite através do Decreto-Lei n.° 466/79, de 7 de Dezembro, que determinou a reclassificação como terceirooficial dos arquivistas das secretarias das câmaras municipais.

5 — Porém, a Câmara Municipal de Cascais não procedeu imediatamente à reclassificação do queixoso, com o argumento de que à data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 466/79 ele possuía a categoria de fiel de arquivo. Em seu entender, a reclassificação como terceiro-oficial só deveria aplicar-se aos funcionários que tivessem a categoria de arquivista à data da publicação desse diploma.

6 — Reaberto o processo e reexaminada a questão, concluiu-se continuar a assistir razão ao reclamante.

De facto, o Decreto-Lei n." 466/79 visou corrigir anomalias resultantes da aplicação do Decreto-Lei n.° 76/77 e, consequentemente, deveria beneficiar os funcionários na situação do reclamante, que tinham originariamente a categoria de arquivista, muito embora à data da publicação daquele primeiro diploma estivessem colocados noutras categorias por força da reclassificação, cuja injustiça tal decreto-lei pretendia precisamente corrigir.

A não se entender aplicável o Decreto-Lei n.u 466/ 79 aos funcionários nesta situação, ficaria praticamente frustrado o objectivo que, nesta matéria, esse diploma tivera em vista.

7 — Ponderadas estas razões à Câmara Municipal de Cascais, esta acabou por aceitar a recomendação no sentido de ser reclassificado o interessado como terceiro-oficial.

Processo n.° 79/R-648-BM

Sumário — Trabalho. Administração local. Remunerações por horas extraordinárias.

Objecto — Recusa de pagamento por uma assembleia distrital de remunerações por horas extraordinárias de quantia superior a um terço do vencimento principal.

Decisão—Reclamação procedente. Recomendação

aceite. Síntese:

1 — Apresentou reclamação um trabalhador da Assembleia Distrital de Coimbra, contra a recusa, por este órgão, de proceder ao pagamento de horas extraordinárias para além do montante correspondente a um terço do vencimento principal, em aplicação do n.° 4 do artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 372/74, extensível à administração local por força do Decreto-Lei n.° 417/74.

2 — Analisada a situação, confirmou-se a aplicabilidade geral da referida norma legal limitativa do número de horas extraordinárias que podiam ser prestadas pelos trabalhadores da administração central e local.

Mas verificou-se também que fora a Assembleia Distrital que, sistematicamente, exigira ao queixoso a prestação de serviço extraordinário para além do referido limite legal.

3 — Considerou-se que este procedimento devia cessar por contrariar o objectivo da lei, mas teve-se por claramente injusto que o queixoso não fosse pago por trabalho efectivamente prestado e a que se não pudera eximir.

Isto de acordo com o princípio da proibição de enriquecimento sem causa por parte da Administração, já aplicado pelo Provedor de Justiça em vários outros casos anteriores.

4 — Ouvida sobre o assunto a Direcção-Geral dos Recursos Humanos, esta concordou com a posição do Provedor.

Salientou que o propósito da lei, com a fixação do limite máximo de horas extraordinárias, era o de evitar a subversão, através do respectivo pagamento, da escala geral de remunerações.

Mas também entendia injusto que, por incorrecta gestão de pessoal por parte da Administração, tal lei fosse utilizada para proporcionar aproveitamento por aquela de trabalho efectivamente realizado e não pago.

5 — Apoiado nestas razões e na concordância da referida Direcção-Geral, o Provedor recomendou à Assembleia Distrital o pagamento das horas extraordinárias em questão, o que ela acabou por aceitar.

Trabalho — Comissões de trabalhadores

Processo n.° 81/R-1027-A-3

Sumário — Trabalho. Comissões de trabalhadores. Participação nos planos de reorganização das empresas.

Objecto — Recusa de participação da comissão de trabalhadores de uma empresa de economia mista nos trabalhos preparatórios de reestruturação da mesma.

Decisão — Reclamação procedente. Reparo.

Síntese:

1 — O presidente da mesa da assembleia geral da UTIC — empresa de economia mista — rejeitara o pedido formulado pela respectiva comissão de trabalhadores no sentido de esta se reunir com a comissão eleita pela referida assembleia para elaboração de um projecto de reestruturação da empresa.

2 — Ouvido sobre o assunto, aquele responsável disse que assim procedeu, por um lado, na medida em que a aplicação da Lei n.° 46/79, de 12 de Setembro, sobre o controle de gestão, nunca terá sido «devidamente esclarecida em relação a empresas como a UTIC» e, por outro lado, tendo em conta que a comissão designada para estudar a reestruturação da empresa não tinha a natureza de órgão desta. Acres-fentou mesmo, a este propósito, que o estudo em questão bem poderia ter sido da iniciativa de um qualquer grupo de sócios, que não poderia legalmente ser obrigado a admitir a participação nesses trabalhos da comissão de trabalhadores da empresa.

3 — Não pareceu acertada esta argumentação. A questão da aplicação da Lei n.° 46/79 que tem levantado dúvidas de interpretação e concretização é a relativa à participação dos trabalhadores nos órgãos de gestão das empresas do sector empresarial do Estado (artigo 30.° e 31.°). Quanto ao direito de as comissões

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de trabalhadores intervirem na reorganização dessas empresas (artigo 33.°), não se têm suscitado dúvidas, nem sequer em relação às que, como a de que trata este processo, têm a natureza de empresas de economia mista.

Além disso, a alínea d) do artigo 33.° da Lei n.° 46/ 79 reconhece às comissões de trabalhadores das empresas em causa o direito de «reunir com órgãos ou técnicos encarregados dos trabalhos preparatórios de reorganização».

Na referência a «técnicos» parecia caber o tipo de comissão instituída para estudar a reorganização da UTIC. E a referência a «órgãos ou técnicos» teria tido em vista abarcar, genericamente, as várias formas possíveis de se proceder ao estudo da reestruturação das empresas em questão. Aliás, se assim não fosse, tornar-se-ia fácil frustrar o objectivo de participação querido pelo legislador — bastava encarregar do estudo de tal reorganização uma entidade ou grupo que não tivesse, em rigor, o carácter de órgão da empresa.

4 — O Provedor exprimiu esta sua posição à entidade visada, fazendo reparo pela atitude tomada, que, por isso, não considerou legalmente acertada.

Trabalho —Empresa pública

Processo n.° 80/R-1112-A-3

Sumário —Trabalho. Empresa pública. Admissão. Factores de exclusão: local de residência, não cumprimento do serviço militar e idade máxima e mínima.

Objecto — Exclusão de concurso de admissão.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação parcialmente aceite.

Síntese:

1 — Com base na reclamação apresentada, o Provedor de Justiça constatou existirem nas regras de admissão no Banco Nacional Ultramarino factores condicionantes, no mínimo duvidosamente compatíveis com o princípio consignado nos artigos 13.° e 52.°, alínea b), da Constituição (texto de 1976). Estavam neste caso os limites mínimo e máximo de idade (20 e 30 anos, respectivamente), a exigência de haver cumprido o serviço militar e a de possuir domicílio no local do posto de trabalho a preencher.

2 — Recomendou a eliminação dos dois últimos e. a justificação expressa, de acordo com a natureza das funções a desempenhar, dos limites de idade, isto nos termos da recomendação já transcrita no relatório do Provedor de Justiça de 1981, a pp. 57-58.

3 — O conselho de gestão do Banco Nacional Ultramarino aceitou a recomendação quanto aos limites de idade, embora com algumas reservas decorrentes da estrutura etária do seu pessoal, e quanto ao serviço militar. Manteve, porém, a sua posição no que se refere ao local de residência dos candidatos.

Processo n.° 81/R-2464-A-3

Sumário — Trabalho. Empresa pública. Carreira profissional. Critérios de promoção.

Objecto — Não promoção em concurso interno realizado nos CTT/TLP.

Decisão — Inviável a intervenção quanto ao caso concreto. Recomendação para futuro. Síntese:

1 — O reclamante, trabalhador da empresa pública CTT/TLP, queixou-se de que, em resultado de um concurso interno de promoção aos níveis M, N e O, teria sido preterido em favor de candidatos menos habilitados, em virtude de um injusto juízo acerca da sua competência profissional.

2 — Ouvida a entidade visada, esta referiu que o queixoso fora, mesmo assim, promovido ao nível M, tendo sobretudo em conta a sua antiguidade e actividade anterior.

Eventual promoção a nível superior a esse fora posta de parte pelo júri do concurso, tendo em conta a fraca valorização da actual competência e actividade profissional do trabalhador, factor decisivo para a graduação dos candidatos ao concurso em causa.

3 — Tendo-se pedido para análise a documentação do concurso, incluindo os currículos dos candidatos, verificou-se que se tratava de situação relativamente à qual se deveria aplicar a orientação constante do Provedor de Justiça no sentido de não interferir na actividade de avaliação de mérito ou proficiência profissionais, a não ser que se detecte flagrante e ostensiva injustiça ou irregularidade.

4 — Porque tal se não verificava, o Provedor de Justice limitou-se a recomendar aos CTT/TLP que, de futuro, as actas das reuniões dos júris dos concursos passassem a referir, ainda que de forma sucinta, as razões do ordenamento dos candidatos.

De facto, as actas do júri no caso apreciado eram a este respeito quase omissas, não permitindo um juízo suficientemente fundado acerca da motivação da graduação estabelecida.

Processo n.° 81/R-1801-A-3

Sumário — Trabalho. Empresa pública. Prescrição. Dívidas fiscais.

Objecto — Recusa de pagamento do imposto complementar de um director por parte da entidade onde prestava serviço.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação aceite.

Síntese:

1 — O reclamante exercera as funções de presidente da direcção do Grémio dos Armadores de Pesca do Arrasto e de presidente do conselho de administração da Companhia Portuguesa de Pescas até 1974 e 1975, respectivamente.

Ambas as entidades vinham pagando sempre o imposto complementar do reclamante na parte relativa às remunerações que delas auferia.

2 — Nos anos de 1973 e 1974 recusaram-se, porém, a fazê-lo. O reclamante pagou o imposto referente ao ano de 1973, mas, por alegada falta de meios, não efectuou o pagamento do imposto referente a 1974. Exposta a questão ao então ministro das Finanças, este veio a determinar que o pagamento do imposto em causa por aquelas entidades não violava a proibição constante do artigo 25.° do Decreto-Lei n.° 375/74,

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de 20 de Agosto, razão que havia motivado a referida recusa.

3 — Face à difícil situação financeira das entidades em causa, foi o problema submetido à consideração do departamento tutelar, Secretaria de Estado das Pescas. Apoiado em parecer da Auditoria Jurídica do Ministério da Agricultura e Pescas, o Secretário de Estado considerou a dívida extinta por prescrição, nos termos do artigo 38.° da lei do contrato de trabalho (regime jurídico anexo ao Decreto-Lei n.° 49 408).

E nem uma declaração da Comissão Liquidatária do Grémio dos Armadores de Pesca do Arrasto, reconhecendo expressamente que as quantias em causa não haviam sido pagas, o fez mudar de ideias.

4 — Submetida a questão, por iniciativa do reclamante, à consideração do Provedor de Justiça, concluiu-se pela razão que àquele assistia:

a) A prescrição, a ter-se verificado, nunca teria

operado nos termos do artigo 38.° da lei do contrato de trabalho, mas sim nos do artigo 317.° do Código Civil, já que o reclamante não era trabalhador subordinado das entidades devedoras;

b) Assim sendo, não se estaria perante um caso

de prescrição extintiva, que tornaria a confissão da dívida inócua, face à extinção da própria obrigação, mas perante uma prescrição presuntiva, isto é, fundada na presunção do cumprimento (artigo 312.° do Código Civil);

c) Neste caso, a declaração escrita do devedor de

que não cumpriu não poderia deixar de elidir a presunção de cumprimento.

5 — Perante a complexidade técnica do caso, optou-se por transmitir à Secretaria de Estado das Pescas a posição do Provedor de Justiça sobre ele, sem recomendar formalmente a alteração do procedimento adoptado, antes solicitando a repondêração do problema.

6 — Submetido de novo o processo à Auditoria Jurídica do Ministério da Agricultura e Pescas, veio esta a rever por completo a sua posição, aderindo à análise feita pelo Provedor de Justiça. A concordância do Secretário de Estado das Pescas, em atitude que se regista, permitiu satisfazer a pretensão do reclamante.

Processo n.° 82/R-699-A-3

Sumário — Trabalho. Empresa pública. Reclassificação de bancários.

Objecto — Situação dos bancários integrados na banca portuguesa vindos das ex-colónias, face à dos bancários dos quadros da banca metropolitana.

Decisão — Não intervenção do Provedor de Justiça, dado as questões em causa estarem afectas ao tribunal competente.

Síntese:

1 — Uma associação de bancários regressados das ex-colónias e integrados na banca portuguesa expôs ao Provedor de Justiça a situação destes bancários, configurando-a de discriminatória em relação à dos bancários que já pertenciam aos quadros da banca

metropolitana aquando da sua integração, designadamente quanto às classificações e reclassificações verificadas e à não total contagem de tempo de serviço, discriminações constantes do contrato colectivo de trabalho do sector bancário e que os reclamantes classificavam até de inconstitucionais.

2 — Analisado o assunto, concluiu-se que acerca das classificações e reclassificações dos retomados bancários, da não contagem do tempo de serviço em que os mesmos estiveram a aguardar integração e correspondente perda de vencimentos relativos a esse período, já o Provedor de Justiça, oportunamente, havia decidido no sentido de não tomar posição.

Com efeito, tinham-se e têm-se fundadas dúvidas quanto à subsistência dos anteriores contratos de trabalho daqueles bancários e à continuidade do vínculo que os ligaria à banca portuguesa aquando da sua integração, considerando-se controverso que trabalhadores bancários com as mesmas habilitações literárias e idêntica antiguidade tenham ou venham a ter na banca portuguesa situações, categorias e regalias diferentes só porque uns vieram das ex-colónias e outros pertenciam aos quadros metropolitanos.

Assim, tendo em conta os aspectos controversos daquelas questões e dado que as mesmas se encontram afectas ao tribunal competente, o Provedor de Justiça decidiu não intervir nelas, considerando preferível aguardar a decisão judicial que as resolva definitivamente.

3 —No que respeita à alegada desigualdade de tratamento face ao contrato colectivo de trabalho, verifica-se que tal aspecto está intimamente ligado às questões referidas no n.° 2, designadamente com a não manutenção do citado vínculo aquando da integração daqueles bancários, uma vez que, a decidir-se, em definitivo, que se teriam operado em Portugal, quanto aos mesmos bancários, verdadeiras admissões, com inerente assunção de novas relações laborais conformes com o protocolo de 1976, tal desigualdade encontraria adequado fundamento jurídico.

Trabalho—Função publica

Processo n.° 81/R-984-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Categoria de ingresso no quadro geral de adidos.

Objecto — Rectificação, com efeitos retroactivos, dessa mesma categoria e pagamento das diferenças de vencimento respectivas.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 —Um segundo-oficial, letra N, que desempenhava as funções de chefe de contabilidade do quadro privativo de um município de Angola foi nomeado em 5 de Março de 1974, precedendo concurso, chefe de secção de contabilidade, letra L, do mesmo quadro, lugar de que tomou posse no dia seguinte.

Obrigado a fugir' precipitadamente da localidade onde trabalhava, conseguiu obter mais tarde documento comprovativo da sua qualidade de agente da administração autárquica daquela ex-colónia, mas desse do-

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II SÉRIE — NÚMERO 6

cumento constava, erradamente, a sua anterior categoria de segundo-oficial (chefe de contabilidade), embora a letra L de vencimento, correspondente à real categoria em que se encontrava investido desde 5 de Março de 1974, estivesse correctamente indicada.

Quando pediu o seu ingresso no quadro geral de adidos, fez alusão a esse erro e, antes de ter sido proferido despacho permissivo, entregou novo documento — guia de vencimento—, donde constava a designação funcional que possuía. Todavia, foi admitido naquele quadro com a categoria de segundo-oficial, letra N.

Reclamou várias vezes, mas só em Março de 1980 é que obteve uma decisão, aliás de indeferimento, com base no argumento de que a sua pretensão correspondia «a uma promoção não prevista na legislação para o quadro geral de adidos».

2 — Pedida a intervenção do Provedor de Justiça, procedeu-se a uma instrução e análise sumárias do respectivo processo, na sequência das quais se entendeu por bem chamar a atenção do director-geral da Integração Administrativa para o facto de ter passado a existir, pelo menos a partir do início do ano de 1974, no quadro privativo de pessoal do município a que o reclamante pertencia, na sequência da criação de novos lugares, devidamente autorizada por despacho da respectiva entidade tutelar de 24 de Janeiro do mesmo ano — legalmente, portanto—, u mlugar autónomo de chefe de secção de contabilidade, letra L.

Este facto parecia dar inteira razão ao queixoso, tanto mais que ele provava ter tomado posse desse lugar em 5 de Março de 1974.

3 — Por seu despacho de 4 de Agosto de 1981, aquela entidade rectificou, com eficácia retroactiva, reportada à data dos efeitos do ingresso no quadro geral de adidos, a categoria que inicialmente havia sido atribuída ao reclamante para a de chefe de secção dc contabilidade, letra L, e, simultaneamente, procedeu è reclassificação da mesma, nos termos do n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, para a de primeiro-oficial, letra J, com efeitos a partir da publicação do respectivo despacho no Diário da República.

Esta última decisão foi ainda contestada pelo interessado, mas sem razão, porque as reclassificações de categorias só são legalmente possíveis após a entrada em vigor das alterações ao Decreto-Lei n.° 294/76, introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 819/76, de 12 de Novembro, e, mesmo assim, com efeitos reportados à data da publicação no jornal oficial dos despachos que as ordenem.

Ê certo que esta norma legal pode dar lugar a prejuízos materiais quando se trate de reclassificações que se traduzam por subida de letra de vencimento e que não tenham sido feitas pela Administração em tempo julgado normal e por culpa ou negligência dela.

Todavia, e embora o Provedor tivesse exposto tal problema geral ao Ministro da Reforma Administrativa, este pronunciou-se pela inconveniência, designadamente por razões de ordem financeira, da adopção de uma medida legislativa que alterasse o regime jurídico aplicável à reclassificação dos adidos.

Processo n.° 807R-1982-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação. Diuturnidade.

Objecto — Reclassificação de categoria de ingresso no quadro geral de adidos para efeitos de integração em quadro privativo de uma autarquia local com mudança de carreira. Tempo de serviço relevante para efeitos de concessão de diuturnidades.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Um observador de 3.a classe, letra G, do Serviço Meteorológico da ex-colónia de Moçambique passou, a partir de 16 de Dezembro de 1967, à situação de licença ilimitada. Em 1974 celebrou com a Câmara Municipal de Lourenço Marques um contrato de prestação de serviços como arquitecto, pelo período de 2 anos, e em 22 de Maio de 1975 vinculou-se à cooperação com a República Popular de Moçambique, nos termos do acordo assinado entre a FRELIMO e o Estado Português, para exercer as funções de arqui-tecto-chefe, letra D, do Gabinete de Urbanização daquela mesma Câmara, contrato que cumpriu.

Ao ser admitido no quadro geral de adidos, foi-lhe considerada a categoria de observador, letra G, e não a de arquitecto-chefe, letra D, contra o que reclamou, mas sem êxito.

Entretanto, foi destacado para prestar serviço como arquitecto numa autarquia local, no quadro da qual poderia vir a ser integrado, caso a sua categoria de ingresso no quadro geral de adidos viesse a ser reclassificada para a de arquitecto.

Em face disso e da posição já assumida pelo Ministério da Reforma Administrativa, pediu a intervenção do Provedor de Justiça, aproveitando ainda a oportunidade para reclamar contra o facto de não ter sido considerado relevante, para efeitos de concessão de diuturnidades, o tempo em que trabalhara para a Câmara Municipal de Lourenço Marques, na situação de licença ilimitada e em cumprimento do referido contrato de prestação de serviços.

2 — Instruído o respectivo processo, concluiu-se por ter sido correcta a decisão do Ministério da Reforma Administrativa, no tocante à impossibilidade legal da reclassificação de categoria pretendida pelo interessado, nos precisos termos do n.° 2 do artigo 5.° do Decreto--Lei n.° 179/80, de 3 de Junho, uma vez que, encontrando-se ele a prestar serviço numa autarquia local, era esta que teria a competência exclusiva para indicar a designação funcional de integração no quadro do seu pessoal. E, se essa integração se poderia fazer com a categoria de arquitecto, nada impedia que, como tal, viesse a concretizar-se, tanto mais que era esse o desejo expresso daquela autarquia. E foi isso mesmo que aconteceu.

3 — A Direcção-Geral de Integração Administrativa manteve a sua anterior posição de não considerar relevante, para efeito de diuturnidades, o tempo de serviço prestado à Câmara Municipal de Lourenço Marques até à data da independência de Moçambique, pois considerava-o prestado em cumprimento de um contrato submetido a regime de direito privado, dado o disposto no artigo 26.° da Lei de 14 de Junho de 1913, relativamente ao regime de incompatibilidade dos funcionários na situação de licença ilimitada.

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Esta argumentação não era, porém, válida, pois nã. se tratava de um contrato de prestação de serviço au tónomo, mas sim de mera prestação eventual de serviço nos termos da alínea c) do artigo 45.° e do artigo 48.°, ambos do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, não abrangida pelo regime geral de incompatibilidades, como resulta claramente do § 4.° do artigo 430.° do mesmo Estatuto.

4 — Formulada recomendação no sentido de o problema ser reanalisado, o director-geral da Integração Administrativa veio a aceitá-la, mandando contar, para efeitos de diuturnidades, o tempo de serviço em questão.

Processo n.° 81/R-1043-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação de categorias.

Objecto — Atribuição de efeitos retroactivos a uma reclassificação de categoria não efectuada pela Administração em tempo considerado razoável e normal Prejuízos e diferenças de tratamento.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.

Síntese:

1 — Um antigo regente agrícola, técnico de 1 .a classe, letra H, dos Serviços de Agricultura e Florestas de Angola, ingressou no quadro geral de adidos em 1 de Novembro de 1975 com essas mesmas categoria e letra de vencimento.

Não obstante o disposto no n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril —redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 819/76, de 12 de Novembro—, só veio a ser reclassificado 2 anos mais tarde para a categoria de engenheiro técnico agrário principal, aquando da sua integração num quadro do Ministério da Agricultura e Pescas, mas com efeitos a partir da publicação do respectivo despacho no Diário da República.

Este facto motivou, só por si, que colegas do reclamante com a mesma categoria de origem e antiguidade, mas reclassificados mais cedo, ficassem a ser mais antigos na carreira do que ele e que tivessem auferido diferenças de remuneração que àquele eram negadas e com as quais sempre contara.

O interessado pediu a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de à reclassificação de que fora objecto serem atribuídos efeitos retroactivos à data do seu ingresso no quadro geral de adidos, com pagamentos das diferenças de vencimento correspondentes.

2 — Uma análise deste caso e de outros semelhantes levou a que se concluísse pela legalidade do acto administrativo que reclassificara o reclamante e fixara os respectivos efeitos.

Admitiu-se, porém, que a rigidez do preceito do n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76 dava lugar a que se gerassem situações de grande injustiça e de diferença de tratamento, pelo que urgia reformulá-lo.

Com esse objectivo foi dirigida ao Ministro da Reforma Administrativa a seguinte recomendação:

F ex-agente adido, ora integrado num quadro do Ministério da Agricultura e Pescas, dirigiu

a este Serviço a exposição de que, em anexo, junto xerocopia.

Numa primeira análise do problema, e na pressuposição de que os elementos fornecidos pelo interessado são exactos, parece estar-se, de facto, em presença de anomalia geradora de injustiças relativas de certa gravidade, a que urge pôr termo.

E não se trata de caso isolado, como se depreende de várias reclamações que ultimamente me têm sido dirigidas sobre o mesmo problema.

A antiga Direcção-Geral de Recrutamento e Formação reconhece a diferença de tratamento de que têm sido alvo os agentes adidos que não foi possível reclassificar antes da integração em quadros de serviços e organismos da Administração Pública (não obstante o que se dispõe no n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, actual redacção), mas mostra-se impotente para resolver as injustiças decorrentes da situação, dado o disposto na parte final desse mesmo n.° 3 e no n.° 5 do Despacho Normativo n.° 335/79 de 9 de Novembro.

Assim, e porque me compete assegurar, além da legalidade, a justiça da Administração (artigo 1.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro), formulo, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da mesma lei, a seguinte recomendação:

o) Que se proceda, com a maior urgência, a um reexame das situações criadas pelo disposto na parte final do n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, com a redacção que a este artigo deu o Decreto-Lei n.° 819/ 76, de 12 de Novembro, e no n.° 5 do Despacho Normativo n.° 335/79, de 9 de Novembro, aos adidos que não foram objecto de reclassificação oportuna antes da sua integração na Administração Pública portuguesa ou não o são com o fundamento de se prever para breve essa mesma integração e que, por isso mesmo, por omissão e ou exclusiva culpa dos competentes serviços, não puderam ou não podem beneficiar das tabelas de equivalência anexas ao Decreto-Lei n.° 377/79 com efeitos retroactivos a 1 de Julho de 1979; paralelamente

b) Que seja também analisada a situação dos

agentes adidos cujas categorias deveriam ter sido reclassificadas, com subida de letra de vencimento, por força da alínea a) do n.° 1 e do n.° 3 daquele artigo 19.°, mas que o não foram também, pelos apontados motivos, antes de ter ocorrido o acto ou facto que determinou a aposentação deles, circunstância esta que os impede de beneficiarem do correspondente aumento de vencimento para efeitos de cálculo das respectivas pensões de aposentação.

c) Que, se se chegar à conclusão de que se

está em presença de situações de injustiça (absoluta ou relativa), sejam toma-

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das as adequadas providências legais para corrigi-las.

A meu ver, os casos antes referidos e outros idênticos apontam até para a conveniência da revisão genérica do sistema actualmente em vigor quanto à produção de efeitos das reclassificações e alterações de categorias operadas ou a operar ao abrigo da alínea 6) do n.° 1 do artigo 19.° e do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 294/76, quando se traduzam por subida de letras de vencimento, de modo que lhes seja atribuída eficácia retroactiva a momento (ou momentos) que melhor possa salvaguardar os legítimos interesses, se não mesmos direitos, dos agentes adidos originários das ex-colónias.

Não se compreende por que é que estes agentes não hão-de beneficiar do aumento de vencimento por subida de letra desde o seu ingresso no quadro geral de adidos, na hipótese de nessa data já os agentes titulares de idênticas designações funcionais ou de designações com o mesmo conteúdo funcional na função pública portuguesa beneficiarem de letras de vencimento mais elevadas.

Também eles são, afinal, agentes da administração pública portuguesa a partir daquela data.

Neste caso, nem sequer releva a principal razão dos preceitos contidos na última parte do acima referido n.° 3 do artigo 19.° e do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 294/76 — não obriga à restituição de diferenças de vencimento quando a reclassificação ou alteração de categorias se traduza por descida de letra.

3 — Esta recomendação não foi acatada por aquele membro do Governo, que para tanto invocou os seguintes fundamentos:

a) O princípio da não retroactividade de efeitos consignado no n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, com a redacção que a este preceito foi dada pelo Decreto-Lei n.° 819/ 76, de 12 de Novembro, sofreu já as derrogações impostas pela necessidade de proceder à adequação das categorias de grande número de funcionários adidos ao novo ordenamento de carreiras instituído pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, com efeitos reportados à aata de entrada em vigor deste diploma (1 de Julho de 1979).

b) Verifica-se até que, para possibilitar a aplicação deste diploma e do Decreto-Lei n.° 377/79, de 13 de Setembro, ao maior número possível de funcionários adidos, o Despacho Normativo n.° 335/79, de 9 de Novembro, fixou critérios de transição mais flexíveis do que aqueles que vieram a ser aplicados à generalidade dos funcionários públicos.

c) Contudo, nem todas as situações poderiam ser abrangidas, designadamente aquelas que, pelo

seu recorte específico, não eram reconvertíveis ao novo ordenamento de carreiras; noutros casos, e transição para o novo ordenamento teria de processar-se na horizontal, isto é, sem melhoria salarial, uma vez que a posição remuneratória de base coincidia já com o novo escalonamento salarial.

d) As providências do Despacho Normativo n.° 335/79 foram complementadas e reforçadas, designadamente no que se refere aos funcionários integrados em carreiras de tipo horizontal, pela publicação dos Despachos Normativos n.05 202/ 80, de 27 de Junho, 293/80, de 11 de Agosto, e 355/80, de 30 de Outubro.

e) O conjunto de providências tomadas teve em atenção a situação especial dos funcionários adidos e esgotou as possibilidades de intervenção do MRA através de medidas genéricas de reclassificação.

/) Por outro lado, do exame das situações concretamente referenciadas não se poderá sequer concluir que tenha havido lapsos manifestos de avaliação ou casos de aplicação errada dos princípios. Contudo, mesmo que venha a confirmar-se tal hipótese, julga-se que a respectiva solução terá de ser encontrada através de actos concretos de gestão ou de aplicação da lei, e não através de novas providências legislativas.

g) Considero ainda que qualquer alteração dos princípios legais informadores da política de reclassificação do pessoal do quadro gerai de adidos é susceptível de desencadear movimentações em cadeia, que conduziriam, inevitavelmente, à instabilidade e paralisação dos serviços.

h) No que se refere à revisão das pensões que foram fixadas por referência a categorias subvalorizadas, informo que o assunto está a ser estudado no âmbito do grupo de trabalho já constituído ao abrigo da previsão do Decreto-Lei n.° 245/81, de 24 de Agosto.

4 — O processo foi arquivado, por parecer esgotada a possibilidade de intervenção do Provedor.

Processo n.° 81/R-2137-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação.

Objecto — Alteração da designação funcional de ingresso no quadro geral de adidos, em ordem a tornar possível a integração de agente oriundo dos Serviços c!e Portos, Caminhos de Ferro e Transportes de Angola num quadro da Administração Pública portuguesa. Critério menos justo seguido nessa alteração.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — Um antigo chefe de estação dos Caminhos de Ferro de Angola, letra M, foi integrado, com essa mesma designação funcional e letra de vencimento, no quadro geral de adidos, tendo sido posteriormente destacado para prestar serviço no Governo Civil do Distrito de Viana do Castelo, onde passou a desempenhar tarefas de natureza administrativa.

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Com a publicação do Decreto-Lei n.° 179/80, de 3 de Junho, surgiu a oportunidade de ele poder vir a ser integrado no quadro de pessoal daquele Governo Civil, mas, dada a categoria que tinha nos seus serviços de origem e respectivo conteúdo funcional, não reclassificada até então, pòs-se o problema da viabilidade dessa integração e, na afirmativa, o de saber qual a categoria que lhe deveria ser atribuida.

O governador civil do Distrito de Viana do Castelo pronunciou-se pela conveniencia dessa integração e, embora se tivesse inclinado inicialmente pela atribuição da categoria de segundo-oficial, acabou por incluir o reclamante no mapa respectivo com a categoria de terceiro-oficial, na qual o interessado veio a ser, na verdade, integrado.

Reagiu ele de pronto, invocando a diferença de tratamento dado a antigos colegas seus e a situação de injustiça em que fora colocado comparativamente a outros agentes remunerados também pela letra M, criticando ao mesmo tempo a actuação do Ministério da Reforma Administrativa, por não ter feito a reclassificação que se impunha antes da integração, dando, por isso, lugar à injustiça de que fora vítima.

2 — A Direcção-Geral de Integração Administrativa sustentou a legalidade da sua actuação no caso do reclamante e esclareceu que poderia ter encarado a reclassificação no acto de integração para a categoria de segundo-oficial se não fora a circunstancia de do mapa enviado constar, como categoria a atribuir-lhe, a de terceiro-oficial.

Todavia, e porque de uma questão de justiça relativa se tratava, propôs-se considerar a rectificação da categoria de integração do reclamante através de um despacho ministerial conjunto, desde que, previamente, fosse garantida por parte do Governo Civil do Distrito de Viana do Castelo a existencia da correspondente vaga ou, em caso negativo, a criação do respectivo lugar, nos termos do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 179/ 80, de 3 de Junho.

£ foi pela via indicada em primeiro lugar que o problema veio a ser solucionado.

Processo n.° 82/R-439-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação e seus efeitos. Tempo de serviço. Integração.

Objecto — Não consideração, para efeitos de progressão na respectiva carreira, de tempo de serviço prestado anteriormente à integração em quadro de um serviço do Estado e em categoria objecto de reclassificação. Efeitos da aplicação do disposto no Despacho Normativo n.° 335/79, de 9 de Novembro.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente.

Síntese:

1 — Um sindicato de trabalhadores da função pública apresentou queixa contra o Ministério da Indústria, Energia e Exportação, pelo facto de 2 associados seus, ex-adidos, terem sido integrados no quadro da Direcção-Geral do Comércio Externo com a categoria de escriturario-dactilógrafo de 2.a classe, letra S, quando essa integração deveria ter sido feita com a mesma designação funcional, mas de 1.a classe, letra Q, por na data daquela integração terem para tanto já o

número de anos de serviço suficiente, nos termos do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, e do Despacho Normativo n.° 293/80, de 4 de Setembro.

2 — No decorrer da instrução do respectivo processo verificou-se que se tratava de matéria da competência do Ministério da Reforma Administrativa, e não do Ministério da Indústria, Energia e Exportação, como pretendia o sindicato reclamante, dado o facto de se tratar de agentes oriundos das ex-colónias ingressados no quadro geral de adidos, cujas categorias haviam sido objecto de reclassificação.

3 — Posto o problema à Direcção-Geral de Integração Administrativa, concluiu-se que, de facto, os interessados à data da reclassificação das suas anteriores categorias de origem —catalogadores de 2.a classe, letra S — possuíam já mais de 5 anos de serviço relevante para efeitos de progressão na carreira de escriturarios-dactilógrafos, pois se encontravam abrangidos, quer pelo n.° 1, quer pelo n.° 2 do Despacho Normativo n.° 202/80, de 27 de Junho. Por outro lado. o facto de terem sido já integrados num quadro da Administração Pública portuguesa não impedia que se fizesse a devida correcção, não obstante estarem esgotados os prazos estabelecidos na Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo para o recurso contencioso do acto administrativo reclamado, pois o legislador teve o cuidado de no n.° 6 daquele despacho normativo ressalvar essa hipótese.

Quanto à pretensão de a alteração da letra de vencimento de S para Q ter efeitos retroactivos a 1 de Julho de 1979, ela era manifestamente improcedente, pois o Despacho Normativo n.° 335/79, de 9 de Novembro, manda transitar para as categorias constantes da 2." coluna do anexo i ao Decreto-Lei n.° 377/79, de 13 de Setembro, com efeitos retroactivos àquela data, apenas os agentes que à data da publicação do Decreto-Lei n.° 191-C/79 fossem titulares das categorias com designações funcionais incluídas na 1." coluna daquele anexo, onde não figura a de catalogador.

Por outro lado, e por força do disposto no n.° 3 do artigo 19." do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, com a redacção que a este artigo deu o Decreto-Lei n.° 819/76, de 12 de Novembro, as alterações resultantes das reclassificações das categorias dos agentes do quadro geral de adidos só produzem efeitos a partir da data em que o despacho que as ordenar for publicado no Diário da República.

Consequentemente, os reclamantes viram alteradas as suas categorias de integração no quadro da Direcção--Geral do Comércio Externo para a de escriturario-dactilógrafo de 1.° classe, letra Q. mas apenas com efeitos desde 26 de Janeiro de 1981.

Processo n.' 81/R-1573-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Serviço militar.

Objecto — Pedido de ingresso no quadro geral de adidos sobre que recaíra despacho de indeferimento com base no argumento de que a prestação de serviço militar no antigo ultramar português, mesmo que obrigatório, importa o corte do vínculo que anteriormente ligava os assalariados ao Estado.

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Decisão-— Reclamação procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — Um assalariado do quadro privativo dos Serviços de Aeronáutica Civil de Angola requereu em 1976 o seu ingresso no quadro geral de adidos. Três anos depois, quando regressou definitivamente a Portugal, foi informado de que o respectivo processo se não encontrava na estação oficial competente, pelo que era de presumir que ali não tivesse dado entrada aquele requerimento ou o respectivo processo se tivesse extraviado.

Feito prova, por meio do pertinente recibo, de que a petição fora, de facto, entregue na antiga Repartição de Adidos, o interessado foi admitido a formular nova petição e a instruí-la com os necessários documentos.

Esse pedido foi. porém, indeferido com base no facto de o agente não possuir em 22 de Janeiro de 1975 um ano de serviço efectivo e ininterrupto, já que o tempo de serviço militar, que obrigatoriamente prestara em Angola, não poderia ser-lhe considerado para o efeito, em virtude de se ter considerado extinto, na data em que iniciou a prestação daquele serviço militar, o anterior vínculo de assalariado eventual que o ligava ao Estado, por ser precário e transitório.

2—Requisitou-se à Direcção-Geral de Integração Administrativa o respectivo processo c, após análise do mesmo, concluiu-se pela procedência da reclamação. Consequentemente, entendeu-se dever formular recomendação no sentido de o interessado vir a ser admitido no quadro geral de adidos, corri base nas seguintes considerações:

2.1 —O interessado entregou em 14 de Março de 1976. na estação oficial competente, o seu pedido de ingresso no quadro geral de adidos, como se vê do recibo que nessa data lhe foi passado pela antiga Repartição de Adidos da Direcção-Geral de Administração Civil. Pelo menos, é o que resulta da respectiva fotocópia e do que o interessado sempre afirmou nas petições dirigidas a essa Direcção-Geral e a este Serviço.

Ainda que o respectivo processo não tenha sido completamente instruído, o certo é que, a ser exacta aquela data de 14 de Março de 1976, o pedido deu entrada dentro do prazo legal.

O facto de nessa altura vigorar ainda o Decreto-Lei n." 23/75. de 22 de janeiro, não invalida essa conclusão, dado que 1 mês e 10 dias depois era publicado o Decreto-Lei n." 294/76. de 24 de Abril (que veio permitir o ingresso dos assalariados no quadro geral de adidos), e era já na vigência do novo regime que o pedido deveria ter sido apreciado, se o respectivo processo se não tivesse extraviado.

2.2 — O assalariamento do reclamante para o exercício das funções de assistente de operações e tráfego do Serviço de Aeronáutica Civil de Angola não foi efectuado a título eventual, nos termos da alínea c) do artigo 45." do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, mas sim para o exercício de um cargo do quadro permanente privativo do pessoal daqueles serviços — pessoal assalariado técnico auxiliar—, previsto na alínea c) do mapa n anexo ao Decrelo-Lei n.° 76/72, de 7 de Março, e, portanto, por contrato de prestação de serviço assalariado, nos termos do § 2° do ar-

tigo 45." e dos artigos 51." a 54.". todos do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino.

De notar que o assalariamento era a forma de provimento naquele cargo prevista na lei (artigo 45.° do Decreto-Lei n." 76/72) e fez-se por diploma de provimento (artigos 11.", § l.u, e 52." do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino).

Trata-se de assalariamento para lugar permanente do quadro, com dotação específica no orçamento de Angola, que «tendia para a estabilidade no serviço» e que, por isso mesmo, se encontra abrangido pelo disposto no artigo 53." da Lei do Serviço Militar (Lei n.° 2135, de 11 de )ulho de 1968). tornada extensiva às ex-colónias pela Portaria Ministerial n.° 24 225, de 6 de Agosto de 1969, e pelo artigo 276.", n." 6, da Constituição da República.

Este é também o ensinamento do Prof. Marcelo Caetano (Manual. 9.a ed., pp. 717 e 718) e da Pro-curadoria-Geral da República (v. g., parecer n." 80/60. de 10 de Novembro de 1960).

Por isso, o recrutamento do reclamante para ir prestar serviço militar obrigatório não importou quebra do vínculo que o ligava ao Estado, mas sim a passagem à situação de actividade fora do quadro (n." 1 do artigo 94." do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino).

E tanto assim foi entendido pela Direcção dos Serviços de Aeronáutica Civil de Angola que, após o cumprimento daquele dever, o reclamante regressou ao seu serviço de origem, independentemente de nova nomeação, e. por isso. desde logo foi abonado dos vencimentos que lhe competiam.

5 — Esta recomendação foi aceite e. no seguimento dela, o interessado foi admitido no quadro geral de adidos, com efeitos reportados a 14 de Março de 1976.

Processo n.' 80/R-279-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras.

Objecto — Transição para a carreira técnica superior, ao abrigo do artigo 25." do Decreto-Lei n.° I9I-C/ 79, de 25 dejunho, de elementos já pertencentes ã carreira técnica antes de 1 de fulho de 1979.

Decisão— Recomendação atendida. Homologação pelo Primeiro-Ministro de parecer geral interpretativo.

Síntese:

1 — Por um dos sindicatos representativos dos trabalhadores da função pública foi apresentada ao Provedor de justiça reclamação por ainda não terem os técnicos especialistas (letra E) do quadro da Direcção-Geral do Património Cultural, da Secretaria de Estado da Cultura, beneficiado da revalorização da letra de vencimento de E para D estabelecida para os técnicos superiores principais ou equiparados pelo artigo 8." do Decreto-Lei n." I9I-C/79, de 25 de funho, e isso com efeitos a partir de I de Julho de 1979, data da entrada em vigor deste diploma.

2 — Solicitados esclarecimentos à direcção-geral em causa, foi por esta informado que:

a) Oportunamente tinha sido criado na Secre-laria-Geral do então Ministério da Comunicação Social um grupo de trabalho para estudo da aplicação ao pessoal do quadro

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único daquele Ministério do Decreto-Lei n.° 191-C/79 e em reuniões com a Di-reCção-GerEl da Função Pública pugnara-se no sentido da publicação da portaria a que se refere o artigo 20.° desse diploma;

b) Porém, a Direcção-Geral da Função Pública

não concordara com a aplicação do artigo 8." do Decreto-Lei n.° 191-C/79 ao pessoal técnico daquele departamento, mesmo quando titular de curso superior, com grau de licenciatura ou não;

c) Apoiava-se esta posição no argumento de que,

em conformidade com o artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79 e com o mapa i anexo ao Despacho Normativo n.° 1/80 (publicado no Diário de República, 1." série, de 4 de Janeiro de 1980), só poderiam ingressar na carreira técnica superior estabelecida por aquele primeiro preceito os técnicos para ingresso em cuja carreira estivesse prevista no diploma orgânico do respectivo serviço a exigência habilitacio-nal de curso superior adequado. Ora, para ingresso na carreira técnica do quadro único da Secretaria de Estado da Comunicação Social e da Secretaria de Estado da Cultura não se encontrava no Decreto-Lei n.° 48 686, de 15 de Novembro de 1968. estabelecida tal exigência;

d) Finalmente, depois de continuadas diligências

da Secretaria de Estado da Comunicação Social, tinha já sido elaborado um decreto que previa que os técnicos respectivos seriam integrados na carreira técnica superior estruturada pelo artigo 8.° do Decreto--Lei n.° 191-C/79, embora sem efeitos retroactivos.

O Provedor considerou que a situação dos interessados ficaria resolvida para o futuro, embora não concordasse com a solução da não retroactividade, imposta pela Direcção-Geral da Função Pública.

3 — O critério adoptado pela Direcção-Geral da Função Pública foi uniformemente mantido, tendo sido publicadas numerosas portarias de transição, ao abrigo do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, que não previram a passagem à carreira técnica superior dos indivíduos já inseridos em carreiras técnicas de serviços cujos diplomas orgânicos não exigissem expressamente a titularidade de curso superior para o acesso a essas carreiras.

E isto, note-se, mesmo em relação a técnicos que possuíam, efectivamente, a habilitação de licenciatura ou outro curso superior.

4 — Entretanto, chamado a pronunciar-se sobre a questão, o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República emitiu parecer, datado de 10 de Abril de 1980 e homologado pelo Secretário de Estado da Administração Interna em 8 de Maio seguinte (publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 180, de 6 de Agosto de 1980), no qual concluiu:

a) Na transição para a carreira técnica superior ao abrigo do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, o artigo 25.° ressalva os direitos daqueles que já estão inseridos em carreiras.

sem qualquer distinção quanto a habilitações legais.

b) Mesmo que não sejam possuidores de licenciatura ou curso superior adequado, os funcionários que em 1 de Julho de 1979 integravam a carreira técnica prevista pelo Decreto-Lei n.° 49410, de 24 de Novembro de 1969, de acordo com o Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, têm direito a transitar para a carreira técnica superior estruturada por este diploma.

c) O Despacho Normativo n." 1/80, de 4 de Janeiro, e todos os diplomas que não permitiram a transição daqueles técnicos para a carreira técnica superior, fazendo uma interpretação errada das normas constantes do Decreto-Lei n.° 191-C/ 79, de 25 de Junho, são ilegais.

5 — Tendo tomado conhecimento do referido parecer, o Provedor de Justiça solicitou ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa informação acerca da sua posição sobre a questão, designadamente quanto à ilegalidade do Despacho Normativo n.° 1/80 e das portarias publicadas no seguimento dele, bem como quanto às situações de desigualdade que passariam a verificar-se para os técnicos já integrados ou a integrar nos novos quadros, de acordo com a interpretação consagrada no n.° 5 do Despacho Normativo n.° 1/80, face aos que seriam integrados em conformidade com o despacho que homologou o referido parecer da Procuradoria-Geral da República.

6 — O Secretário de Estado da Reforma Administrativa respondeu que, na sequência das conclusões do parecer da Procuradoria-Geral da República, já fora elaborada portaria de acordo com o critério preconizado e superiormente homologado.

Em relação aos restantes casos, seria, no entender da Secretaria de Estado da Reforma Administrativa, prematura a assunção de qualquer posição, visto que o despacho homologatório do Secretário de Estado da Administração Interna só era vinculativo para os respectivos serviços.

7 — O Provedor considerou que esta posição não seria a mais correcta.

Por um lado, concordava com o teor do parecer da Procuradoria-Geral da República. Por outro, considerou inaceitável a criação, assim, de uma situação de desigualdade entre os técnicos, conforme os departamentos a que pertencessem.

Por isso, recomendou ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa que homologasse o parecer da Procuradoria-Geral da República ou, se necessário, promovesse a homologação deste pelo Primeiro-Minis-tro, por forma que a sua doutrina passasse a vincular todos os departamentos da administração central.

8 — Foi esta segunda via a escolhida, tendo o Pri-meiro-Ministro, em despacho de 28 de Outubro de 1981 (publicado no Diário da República, 2? série, de 10 de Dezembro seguinte), homologado o parecer em questão, resolvendo assim o problema, com efeitos genéricos.

Processo n.° 8Ü7R-1404-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras. Objecto — Promoção a chefe de serviços administrativos hospitalares.

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Decisão — Atendida a pretensão.

Síntese:

1 — Um sindicato representativo de trabalhadores da função pública apresentou ao Provedor uma queixa cujo conteúdo era, na essência, o seguinte:

a) Em Agosto de 1978 fora criada a categoria de

chefe administrativo hospitalar nos estabelecimentos dependentes da Secretaria de Estado da Saúde, com vencimento da letra G. Isto com o objectivo de se corrigirem anomalias de remunerações e de designações funcionais;

b) Em 5 de Dezembro de 1979, o director-geral

dos Hospitais autorizara a nomeação de uma funcionária, sócia daquele sindicato, para o lugar de chefe de serviços administrativos;

c) A proposta fora retida na Direcção-Geral dos

Hospitais, sem qualquer justificação, desde aquela data até 5 de Janeiro seguinte, data em que viera a ser enviada ao Tribunal de Contas;

d) Tendo sido em 27 de Dezembro de 1979 pu-

bticado o Decreto-Lei n.° 513-U/79, que fez cessar o regime de instalação dos serviços e estabelecimentos da Secretaria de Estado da Saúde, ficara assim prejudicada a autorização concedida. De facto, a demora da Direcção-Geral dos Hospitais no envio da proposta de nomeação para o Tribunal de Contas fizera com que este a recusasse, por inoportuna;

e) O sindicato reclamante pedia a intervenção

do Provedor com vista a ser remediada a omissão dos serviços, efectivando-se a promoção da sua asociada à categoria de chefe de serviços administrativos.

2 — Suscitada a questão pelo Provedor, o Departamento de Recursos Humanos do Ministério dos Assuntos Sociais veio a comunicar, passado tempo, que fora atribuída à interessada a categoria de chefe de serviços administrativos hospitalares no quadro do pesoal do hospital em que vinha exercendo funções, integração que produzia efeitos a partir de 1 de Novembro de 1980.

3 — Resolvida assim a questão, foi o processo mandado arquivar.

Processo n." 81/R-1084-8-1

Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras. Directores regionais do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica.

Objecto — Atraso na publicação da portaria prevista no n.° 3 do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 633/76, de 28 de Julho (com a nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 314/80, de 19 de Agosto), tendente a estabelecer a remuneração e condições de exercício dos cargos de directores regionais do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica.

Uecisão — Reclamação procedente. Formulado reparo à actuação do Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e Comunicações.

Síntese:

1 — Um director regional do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica apresentou ao Provedor de lustiça uma exposição em que pedia a sua intervenção no sentido da publicação da portaria prevista no n.° 3 do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 633/76, de 28 de Julho (com a nova redacção dada pelo Decreto--Lei n.° 314/80, de 19 de Agosto), pois do atraso nessa publicação resultava que, estando a desempenhar efectivamente aquelas funções desde 1977, estaria a ser remunerado muito aquém das remunerações atribuídas a cargos similares da administração central e regional, com grau de exigência e responsabilidade comparáveis.

2 — Inicialmente, o Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e Comunicações justificou que a publicação da portaria estaria dependente da publicação do novo diploma orgânico do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, a qual veio, efectivamente, a concretizar-se através do Decreto-Lei n.° 355/81, de 9 de Dezembro. Publicado este, que, aliás, manteve sem alterações a disposição legal respeitante ao regime estatutário dos directores regionais, e como subsistisse inércia do membro do Governo competente em promover a publicação da portaria, foram feitas diversas insistências junto daquele, que só vieram a ter efeito útil em Julho de 1982, altura em que ele informou estar já preparado o projecto de portaria tendente a equiparar a subdirector--geral os cargos de directores regionais da Madeira e dos Açores.

Entretanto, o reclamante, cansado de aguardar a publicação da portaria e com problemas de saúde, foi desligado do serviço, para efeitos de aposentação, após submissão a junta médica, não tendo vindo a beneficiar do novo regime remuneratório nela previsto.

3 — Analisado o condicionalismo em que se processou a preparação do projecto de portaria tendente a equiparar a subdirector-geral os cargos dos directores regionais do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica da Madeira e dos Açores, conclui-se o seguinte:

a) O projecto de portaria confirma a razão que

assistia ao reclamante ao chamar a atenção para o baixo nível de remuneração atribuído aos cargos de directores regionais do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica;

b) O processo utilizado pela Secretaria de Estado

para dar execução ao disposto no n.° 3 do artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 633/76, de 28 de Julho (com a nova redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 314/80, de 19 de Agosto), foi conduzido com morosidade não compatível com a vontade do legislador, que, em norma avulsa, permitia a resolução do assunto por via de portaria.

Não tinha igualmente sido dada explicação razoável para o facto de a publicação dessa portaria estar dependente da reformulação da orgânica do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica, poste-

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nórmente feita pelo Decreto-Lei n.° 335/81, de 9 de Dezembro, quando veio a verificar-se que o artigo 56.° da Lei Orgânica do Instituto Nacional de Meteorologia e Geofísica não foi modificado por este último decreto-lei;

c) Das demoras havidas com a resolução do as-

sunto resultaram graves prejuízos para o reclamante, não só por ter exercido funções de efectiva chefia de delegação regional desde 26 de Maio de 1977, sem lhe ser atribuída a remuneração correspondente ao alto grau de responsabilidade das funções (e nem se diga que o carácter provisório da sua nomeação não lhe conferiria quaisquer direitos, porque o que está em causa é a desconformidade entre o montante da remuneração e o grau de responsabilidade da função, que não deixa de exigir-se mesmo a um dirigente provisório), como também por esse exercício não ter aproveitado para efeitos do cômputo da sua pensão de aposentação, com base na remuneração que deveria corresponder ao cargo que desempenhou;

d) A situação de inércia legislativa originou pre-

juízos para o reclamante, já neste momento irreparáveis, e, não estando perfeitamente justificados os motivos de tais atrasos, esse facto não podia deixar de merecer reparo, tendo em vista evitar situações que só contribuem para o descrédito da Administração Pública.

4 — O Provedor formulou, pois, o correspondente reparo ao Secretário de Estado dos Transportes Exteriores e Comunicações.

Processo n.° 807R-853-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras. Reestruturação da carreira técnico-auxiliar.

Objecto — Posição de injustiça relativa das categorias dos técnicos auxiliares face à revalorização das categorias da carreira administrativa por efeito da reestruturação destas feita pelo artigo 10.° do Decreto--Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho.

Decisão — Recomendação atendida. Medida legislativa em preparação.

Síntese:

1 — Os técnicos auxiliares do Centro de Identificação Civil. e Criminal reclamaram ao Provedor por se lhes pretenderem atribuir as letras de vencimento J, L e M, conforme fossem técnicos auxiliares principais, de l." classe ou de 2." classe, idênticas às que pelo artigo 10.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, passaram a corresponder às categorias da carreira administrativa.

Ora, o diploma orgânico do Centro de Identificação Civil e Criminal condicionava à posse do curso complementar do ensino secundário o acesso à carreira técnico-auxiliar nele existente.

Os interessados julgavam-se, por isso, com direito a ser abrangidos pelo n.° 2 do artigo 10.° do citado Decreto-Lei n.° 191-C/79, regulador da carreira téc-nico-profissional; por outro lado, alegavam que já em 1976, aquando da criação da carreira técnico-auxiliar, as letras de vencimento das respectivas categorias eram já as de J, L e M, enquanto que aos primeiros--oficiais, segundos-oficiáis e terceiros-oficiais correspondiam, respectivamente, as letras L, M e Q.

2 — Dos esclarecimentos fornecidos pelos departamentos competentes pôde concluir-se que a reestruturação de carreiras operada pelo Decreto-Lei n.° 191—C/ 79 assentava, essencialmente, no escalonamento de habilitações obtidas através do sistema geral de ensino vigente.

Desta forma, foram estabelecidas balizas estanques e intransponíveis em função de 4 níveis do sistema de ensino português: a licenciatura, o bacharelato, o curso geral do ensino secundário e a escolaridade obrigatória (mesmo a carreira técnico-profissional, prevista no artigo 10.° do referido diploma, assenta, primordialmente, nessa escala de habilitações, embora com a exigência de um curso técnico-profissional complementar).

Para o ingresso nas carreiras, assim reestruturadas pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79, não são considerados nem o «conteúdo funcional» dos cargos exercidos, nem o mérito demonstrado, nem a aptidão revelada, nem a antiguidade na função pública ou nas funções desempenhadas. O funcionário ou agente não poderá transitar da sua categoria para outra a cujo acesso corresponda habilitação superior à que possui.

Daí a justificação da recusa da Administração em fazer qualquer reestruturação da carreira técnico-auxiliar diversa da correspondente à carreira de oficial administrativo, relativamente à qual o Decreto-Lei n.° 191-C/79 passara a exigir a mesma habilitação de acesso — o curso geral do ensino secundário.

3 — Ponderou-se, porém, que, antes do Decreto-Lei n.° 191-C/79, às categorias da carreira técnico-auxiliar eram, pelo seu conteúdo funcional diverso do aas da carreira administrativa, atribuídas letras de vencimento superiores às que correspondiam a estas últimas.

Não se pode, sem dúvida, alegar que os técnicos auxiliares tenham direito a uma revalorização das categorias da sua carreira só pelo facto de as da carreira administrativa terem sido revalorizadas, passando a ser de nível remuneratório idêntico ao da sua.

Mas não se pode também deixar de tomar em conta que, quando a carreira técnico-auxiliar passou a ser equiparada à administrativa, isso veio a criar uma situação de injustiça relativa, com a desvalorização das categorias respectivas, face às dos oficiais administrativos. E essa injustiça é tanto maior quanto os conteúdos funcionais dos cargos da carreira técnico-auxiliar são mais complexos e que até o ingresso nela se fazia, em muitos casos, por selecção dos funcionários administrativos, sendo-lhes, noutros casos, exigidas, cumulativamente à habilitação geral, ainda outras de natureza específica.

Este é, aliás, o caso dos técnicos auxiliares do Centro de Identificação Civil e Criminal, para o ingresso em cuja carreira é exigido o curso complementar do ensino secundário.

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4 — Face a estas conclusões, o Provedor de Justiça formulou ao Ministro da Reforma Administrativa a seguinte recomendação (v. recomendação vn):

Por tudo o exposto, e ainda tendo em conta que o âmbito de aplicabilidade das carreiras técnico--profissionais, previstas no artigo 10.° do Decreto--Lei n.° 191-C/79, é ainda muito restrito, que seja reapreciada genericamente a carreira técnico--auxiliar.

Partindo das funções (técnicas, mas auxiliares dos demais técnicos) que lhes incumbem, caberia ajuizar da carreira a facultar-se-lhes, em termos de categorias e remunerações correspondentes, bem como das regras de recrutamento. Afigura-se ainda que deveria ser estabelecida uma revalorização das categorias actuais, vindo pô-las na posição valorativa, em relação às categorias da carreira administrativa, que tinham antes de estas terem sido revalorizadas por efeito da reestruturação feita pelo Decreto-Lei n.° 191-C/79.

Em função desta revalorização em relação à carreira administrativa, suponho ainda que se poderia estabelecer como habilitação mínima para ingresso o curso complementar dos liceus, pois, e ao contrário do que tem defendido a Direcção--Geral da Função Pública (hoje Direcção-Geral dos Recursos Humanos), a actual estrutura do ensino secundário complementar, mais virada para a especialização que a anterior, sobretudo quando completada com o 12.° ano da via profissionalizante, não é uma «estrutura generalizada», dando «uma mera formação genérica».

Aliás, a adequação daquela habilitação para as funções da carreira técnico-auxiliar tem levado a que o curso complementar dos liceus seja já hoje exigido por alguns diplomas orgânicos como habilitação mínima para o ingresso na carreira (v., por exemplo, o Centro de Identificação Civil e Criminal).

5 — Na mesma data o Provedor recomendou também ao Ministro da Justiça que:

a) Fosse alterado o quadro de pessoal do Centro

de Identificação Civil e Criminal, anexo ao Decreto-Lei n.° 63/76, de 24 de Janeiro, relativamente ao pessoal técnico-auxiliar, sendo extinta a categoria de técnico auxiliar de 3.a classe e criados naquele quadro tantos lugares de técnico auxiliar de 2.a classe quantos os lugares pertencentes à categoria extinta.

De facto, na generalidade dos organismos e serviços não existia já a 3.a classe das carreiras técnicas;

b) Fossem criados no quadro de pessoal do Cen-

tro de Identificação Civil e Criminal luga-gares de técnico auxiliar principal;

c) Fosse introduzida no diploma orgânico do

Centro de Identificação Civil e Criminal disposição que estabelecesse transição automática dos então providos, a qualquer título, no Centro de Identificação Civil e Criminal na categoria de técnico auxiliar de 3.3 classe para a categoria de técnico auxiliar de 2.a classe.

6 — O Secretário de Estado da Justiça comunicou que estava em estudo a reestruturação orgânica do Centro de Identificação Civil e Criminal, durante a qual seria devidamente apreciada a recomendação do Provedor.

7 — Por sua vez, o Ministro da Reforma Administrativa informou que o posicionamento relativo dos técnicos auxiliares e de outros técnicos profissionais inseridos em carreiras do grupo do pessoal técnico--profissional tinha merecido atenta ponderação por parte do seu departamento.

Nessa perspectiva, fora constituído um grupo de trabalho com vista a analisar e estudar o ordenamento das carreiras especiais susceptíveis de serem englobadas no âmbito do artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 191—C/ 79, pensando-se que, a curto prazo, adequada medida legislativa viria a ser submetida à apreciação do Governo.

8 — Considerando-se de momento não caber' mais qualquer diligência, foi mandado arquivar o processo.

Processo n.° 79/R-2543-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Categoria.

Objecto — Celebração de contrato de docente do ensino superior em categoria funcional inferior à correspondente à habilitação possuída.

Decisão — Reclamação procedente. Reparo.

Síntese:

1 — A reclamante iniciara a docência no Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa com a categoria de equiparada a assistente. Por se desconhecer na altura a sua média de licenciatura, fora-lhe atribuída uma média de 13. De facto, a escola onde se tinha licenciado ainda não efectuara então as operações necessárias à fixação da média de curso destes diplomados. Posteriormente foi indicada a classificação exacta — Bom (14 valores). A partir deste momento existiam todas as condições previstas na lei para ser atribuída à interessada a categoria de assistente eventual. A verdade, porém, é que, apesar de ter havido formulação de propostas nesse sentido, só ao fim de 2 anos a reclamante foi contratada como assistente eventual.

2 — Ouvida sobre a questão, a Direcção-Geral do Ensino Superior informou que:

1) O Instituto apenas remetera em Setembro de

1979 a proposta de contrato de assistente eventual, que lhe fora solicitada em 2 de Novembro de 1978;

2) O instituto propusera, anualmente, a renova-

ção do contrato da interessada na categoria de equiparada a assistente;

3) A interessada nunca reclamara das decisões

tomadas, pelo que se presumia que com as mesmas se tinha conformado.

3 — Embora a escola declinasse qualquer responsabilidade no caso, esta era patente, em face da informação da Direcção-Geral do Ensino Superior.

4 — Como as irregularidades detectadas se revelavam insusceptíveis de recurso contencioso, e a reclamante viu a sua situação regularizada, foi arquivado

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o processo, sem embargo de reparo às entidades visadas — Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa e Direcção-Geral do Ensino Superior — pelo atraso, respectivamente, na formulação e no andamento da proposta de contrato da interessada como assistente eventual.

Processo n.° 81/IP-21-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Cessação de funções de trabalhadores eventuais.

Objecto — Cessação de funções, sem fundamentação concreta ou pré-aviso, de prestadores eventuais de serviço não abrangidos pelo artigo 1do Decreto-Lei n.u 656/74.

Decisão — Solução prevista em projecto de diploma

legal. Síntese:

1 —O Provedor de lustiça vinha, desde tomada de posição que assumira a propósito do projecto de lei de bases da função pública, insistindo com o Ministério de Reforma Administrativa na necessidade de reapreciação, em termos justos e adequados, da situação dos prestadores eventuais de serviço não abrangidos pelo artigo 1." do Decreto-Lei n." 656/79 e, portanto, não equiparados aos contratados.

De facto, estes podiam, legalmente, ver cessar as suas funções a qualquer tempo, sem necessidade de fundamentação especifica nem pré-aviso, situação indesejável reflectida em numerosas queixas apresentadas ao Provedor.

2 — Foram publicados, entretanto, o Decreto-Lei n." 35/80, de 14 de Março, posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n." 286/80, de 16 de Agosto, e o Decreto-Lei n." 140/81, de 30 de Maio, cujos artigos 4." e 9", respectivamente, fixaram regras aplicáveis ao contrato de prestação eventual de serviço.

3 — Estes diplomas vieram sanar, em parte, os inconvenientes da situação de instabilidade e falta de garantias a que estavam sujeitos os prestadores eventuais de serviço. Todavia, eles não se aplicavam às situações de eventuais criadas antes da sua publicação.

Por isso, resolveu o Provedor abrir processo de sua iniciativa com vista a providenciar para que fosse colmatada tal lacuna legal.

4 — Solicitados esclarecimentos ao Ministério da Reforma Administrativa quanto à questão da subsistência de situações de eventuais criadas antes da publicação daquela legislação, obteve-se informação de que esteve já elaborado projecto de diploma legal visando reformular o regime de vínculos na função pública. O regime desse diploma determinaria a conversão generalizada dos vínculos entre a Administração e os prestadores eventuais de serviço, reconduzindo os casos existentes às situações aí tipificadas. Tal operação traduzir-se-ia, nuns casos, no provimento definitivo dos agentes em lugares do quadro e, noutros casos, na modificação da relação jurídica existente, através da celebração de novos contratos, em função da natureza do trabalho prestado e cm correspondência com as modalidades de contratos previstas no citado projecto.

5 — Face aos esclarecimentos obtidos, foi mandado arquivar o processo, aguardando-se a publicação do diploma sobre «vínculos» e conhecimento concreto dos seus normativos.

Processo n.° 80/R-1733

Sumário — Trabalho. Função pública. Concursos.

Objecto — Controle das declarações prestadas por candidatos a concurso para professor eventual dos ensinos preparatório e secundário.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação aceite. Recurso contencioso.

Síntese:

1 — A reclamante, professora provisória de Trabalhos Manuais, foi opositora ao concurso dc professores provisórios para o ano lectivo de 1980-1981, regulamentado pelo Decreto-Lei n.° 15/79.

Era portadora do curso de Formação Feminina e também da especialização de bordadora rendeira, pelo que, aquando do preenchimento do boletim de concurso, o fez com a indicação da média aritmética desses 2 cursos.

Aquando da publicação das listas provisórias no Diário da República, 2.a serie, de 8 de Abril dc 1980. verificou que figurava nas mesmas, mas não com a média com que tinha concorrido (15,2); esta fora alterada para 11,3, ou seja, a classificação correspondente ao concurso de Formação Feminina.

Reclamara e recorrera hierarquicamente dessa situação, alegando para tanto que vários outros concorrentes havia na mesma situação cujas classificações não tinham sido corrigidas.

Tal reclamação e recurso não obtiveram provimento, com o fundamento em que a classificação da queixosa estava calculada de acordo com a lei e que a Dirccção--Geral de Pessoal não dispunha de elementos para duvidar das classificações declaradas pelos outros candidatos apontados pela queixosa c confirmados nos boletins de concurso pelos conselhos directivos das escolas a que pertenciam.

2 — Analisando o assunto, verificou-se que a classificação da queixosa fora, de facto, bem calculada pelos serviços.

Mas entendeu-se que a Direcção-Geral de Pessoal não podia, desde que surgissem reclamações nesse sentido, eximir-se a controlar a veracidade das declarações apresentadas por outros concorrentes, mesmo que confirmadas pelos conselhos directivos das escolas.

Este sistema destinava-se a facilitar o processo dos concursos, mas não deveria suprir a intervenção correctora da Direcção-Geral de Pessoal, perante a qual aqueles se processavam.

3 — Esta posição foi exposta à Direcção-Geral de Pessoal, com a solicitação de que procedesse à comprovação das declarações dos concorrentes citados pel.u reclamante e informasse o Serviço do Provedor dc lustiça do resultado dessa diligência.

4 — Como, porém, a Direcção-Geral dc Pessoal não procedesse assim e se estivesse a esgotar o prazo de eventual revogação ou anulação das colocações contestadas, o Provedor pediu a intervenção do Secretário de Estado da Administração Escolar e, con-

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comitantemente, comunicou o caso ao procurador--geral-adjunto junto da l.a Secção do Supremo Tribunal Administrativo para efeitos de eventual interposição oficiosa de recurso contencioso.

5 — Este recurso veio a ser considerado intempestivo pelo Supremo Tribunal Administrativo, com o fundamento em que a interessada interpusera o anterior recurso hierárquico passado mais de um mês sobre a decisão contestada, e isto apesar de o Ministério Público haver interposto o recurso oficioso dentro do ano posterior àquele acto.

6— Tendo-se, entretanto, pedido a documentação relativa aos concorrentes em questão e solicitado de novo a comprovação do acerto das respectivas declarações, a Direcção-Geral de Pessoal veio a verificar que, tal como a interessada alegara, as mesmas também deveriam ter sido corrigidas pela mesma razão por que a dela o fora.

7 — Como, porém, já se havia esgotado o prazo de eventual revogação das colocações desses professores, enquanto actos constitutivos ilegais, a situação concreta não pôde ser reparada.

Mas o Provedor chamou a atenção da Direcção-Geral de Pessoal para a sua menos adequada actuação — aliás comprovada pela verificação da discrepância entre as classificações declaradas pelos concorrentes em questão e as que legalmente lhe cabiam —, tendo recomendado que «em futuros concursos não deve essa Direcção-Geral deixar de controlar as declarações dos candidatos, mesmo que confirmadas pelos conselhos directivos, se surgirem reclamações ou dúvidas legítimas acerca da sua exactidão».

A entidade visada respondeu que já assim vinha então a actuar.

Processo n.° 82/R-248-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Concurso.

Objecto— Ilegalidade da lista de admissão a concurso para vagas de assessor dos quadros de pessoal da Direcção-Geral do Emprego e do Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra.

Decisão— Recomendação não acatada.

Síntese:

1 — Um grupo de técnicos superiores principais dos quadros de pessoal da Direcção-Geral do Emprego e do Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra apresentou reclamação em que se queixava de que o concurso para as vagas de assessor dos quadros dos citados serviços, aberto por efeito de despacho de 16 de Dezembro de 1980, mediante aviso publicado no Diário da República, 2." série, de 18 de Dezembro de 1981, de que haviam sido excluídos, seria ilegal, pelas seguintes razões:

a) Imposição de que os candidatos tivessem per-

feito 3 anos na categoria de técnico superior principal à data da publicação da abertura do concurso, quando só poderia exigir-se que eles preenchessem os requisitos exigidos para admissão ao concurso no fim do prazo da sua abertura (30 dias);

b) Violação dos n.os 2 e 3 do artigo 2.° do Decreto

Regulamentar n.° 74/79, de 31 de Dezem-

bro (regulador dos concursos documentais a realizar no âmbito do Ministério do Trabalho), visto o concurso não ter sido aberto com precedência de proposta do director--geral do Emprego nem do director do Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra, mas por proposta do então chefe do Gabinete do Secretário de Estado do Emprego, aliás um dos candidatos ao mesmo.

2 — Estudado o assunto e ouvida a entidade visada, o Provedor entendeu dever recomendar a revogação da abertura do concurso, com base nas seguintes razões:

a) Era ilegal a estipulação do aviso em que se fixava a abertura do concurso para aferição da existência dos requisitos de admissão. E isto porque, de acordo com o artigo 3.°, n.° 2, do Regulamento dos Concursos Documentais do Ministério do Trabalho, aprovado pelo Decreto Regulamentar n.° 74/79, «os requerimentos de admissão aos concursos deverão [...] ser entregues no prazo de 30 dias a contar da data da publicação do aviso da respectiva abertura». Por sua vez, o aviso de abertura do concurso em análise estipulava que este «é declarado aberto pelo prazo de 30 dias a partir da data do presente aviso no Diário da República».

Desde que o concurso foi aberto pelo prazo de 30 dias, a Administração não poderia impedir que ao mesmo se candidatassem todos aqueles que durante o respectivo prazo de abertura preenchessem os requisitos por lei indicados para o poderem fazer.

Enquanto o concurso estiver aberto, todos podem concorrer, desde que na data em que o façam ou até ao termo do prazo da abertura possuam os requisitos fixados na lei para poderem ingressar nos lugares em questão.

Aliás, é de tal forma desusada a limitação imposta neste caso que não havia conhecimento de a mesma ter sido estabelecida em qualquer outro concurso no âmbito do Ministério do Trabalho. Por outro lado, se numerosas vezes tem sido trazida à discussão a possibilidade de admissão de candidatos que posteriormente à data do encerramento do concurso apresentaram os requisitos de admissão para o mesmo exigidos, não se afigurava ter sido alguma vez posta a hipótese de se não admitirem candidatos que durante o prazo de abertura do concurso viessem a adquirir aqueles requisitos.

Podem citar-se em favor desta posição os pareceres da Procuradoria-Geral da República n.os 9/58, de 12 de junho (Boletim do Ministério da justiça, n.° 80, Novembro de 1958), e 20/51, de 17 de Maio (Boletim do Ministério da justiça, n.° 29, Março de 1952), e os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 9 de lulho de 1970, de 15 de Maio de Í969, de 14 de Maio de 1970, de 23 de Abril de 1971 e de 18 de fulho de 1969, todos unânimes no sentido de que os requisitos legais de provimento em determinados lugares postos a concurso se devem verificar até à data do encerramento deste.

b) No caso concreto, chegava mesmo a indiciar-se desvio de poder — aliás, até admitido como possível pela Auditoria Administrativa do Ministério do Trabalho—, na medida em que num dos documentos constantes do processo os serviços reconheciam que a escolha da data da abertura do concurso como decisiva para aferição da titularidade das condições de

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candidatura não resultava do facto de se ter esse critério como o mais seguro (conforme fora respondido a este Serviço), mas sim do propósito declarado de assim se proporcionar mais facilmente a ascensão de certo conjunto de técnicos superiores que não tinham podido ser colocados como assessores no ámbito das chamadas «regras de primeiro provimento» relativas aos lugares decorrentes da reorganização dos quadros do departamento em causa.

c) Eram ilegais, por contrários ao estipulado no n.° 2 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, o n.° 2 e respectiva alinea b) do aviso do concurso em questão.

Com efeito, o n.° 2 do aviso do concurso estabelecia que para o cómputo dos 3 anos na categoria de técnico superior seria considerado o tempo de serviço prestado em categoriav equivalente à de técnico principal, letra E, correspondente à actual categoria de técnico principal, letra D, incluindo os anos em que se atingira o mesmo nível remuneratório desta pela atribuição de diferenças de vencimento.

Essa norma — de resto, contraditória com a do n.° 1 do mesmo aviso— violava claramente o n.° 2 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, quando dispõe que a lugares de assessor só poderão concorrer os técnicos superiores principais que contem um mínimo de 3 anos na categoria.

Além disso, era completamente oposto à lei vigente admitir-se que na contagem daqueles 3 anos se viesse incluir o tempo prestado em «situações de facto» em que certos elementos receberam vencimento correspondente ao de técnico superior principal, mas sem estarem legalmente providos em lugares dessa categoria.

Por sua vez, também surgia ilegal o disposto na alínea b) do n.° 2 do aviso, segundo a qual, para o cômputo dos 9 anos de progressão na carreira exigidos no n.° 2 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 191-C/79, bem como no n.° 1 do aviso, seria considerado o tempo de serviço prestado em algumas categorias de «chefia» que especificava.

E isto porque, por um lado, conforme se verificava pelos documentos constantes do processo, os dirigentes a que se reportava a alínea b) do n.° 2 do aviso só haviam ingressado na carreira técnica (e posteriormente, por força do Decreto-Lei n.° 191 -C/79, na carreira técnica superior) quando cessaram as funções de dirigentes e, por outro lado, porque os cargos dirigentes referidos naquela regra (excepto o de chefe de divisão) não se podiam reportar à classificação de cargos dirigentes concretamente especificados pelo Decreto-Lei n.u 191—F/79, nem a estes haviam sido equiparados.

d) Enfim, verificava-se que também não fora cum-. prido o trâmite, exigido pelo artigo 2.° do Decreto Regulamentar n.° 74/79, da prévia proposta de abertura de concurso por parte do director-geral do Emprego e do director do Fundo de Desenvolvimento da Mão-de-Obra.

Ê que houvera, sim, propostas de tais entidades nesse sentido, mas anteriores à publicação do mencionado diploma.

Não parecia, assim, que estivesse satisfeita a formalidade processual da prévia proposta contemplada no Decreto Regulamentar n.° 74/79.

3 — O Secretário de Estado do Emprego veio, mediante despacho publicado em 7 de Agosto de 1982, a revogar a lista classificativa do concurso em questão, bem como as nomeações que na sua sequência já haviam ocorrido.

Fê-lo, porém, por razões diversas das apontadas pelo Provedor.

E, de resto, recusou-se a anular todo o concurso — como este recomendara — com fundamento no facto de já se encontrarem pendentes no Supremo Tribunal Administrativo vários recursos contenciosos relativos a esta questão.

4 — Em face do exposto, o Provedor considerou esgotada a sua possibilidade de intervenção no caso.

Processo n.° 82/IP-31-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Concursos. Poder discricionário.

Objecto — Limitação da discricionariedade admitida pelo artigo 118.° do Decreto Regulamentar n.° 55/80 nos concursos para escriturários dos serviços de registo e notariado.

Decisão — Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Este processo fora aberto por iniciativa do Provedor, originada pelo facto de se ter verificado, na análise de algumas queixas, que a Direcção-Ceraí dos Registos e do Notariado interpretava o artigo 113.° do Decreto Regulamentar n.° 55/80, de 8 de Outubro, relativo aos concursos para escriturários dos respectivos serviços, como consagrando, em certa medida, um poder discricionário da Administração no tocante à escolha dos candidatos.

2 — Com efeito, embora tal interpretação não fosse absolutamente líquida, a verdade é que o preceito em questão parecia poder ser entendido no sentido dc que estabeleceria uma única preferência de entre os candidatos já pertencentes a serviços da Direcção--Geral dos Registos e do Notariado — a de possuírem a classificação de Muito bom.

Nada se dizendo expressamente quanto à forma de graduação dos não titulares dessa preferência (nem, aliás, da ordenação a fazer entre os vários que a pudessem invocar), parecia que a Administração ficava, em certa medida, livre de escolher o concorrente que considerasse melhor, em função dos interesses do serviço.

3 — Considerou-se indesejável esta situação.

Por um lado, não é aconselhável que, no âmbito de um concurso, para mais documental, a Administração possua uma tão larga margem dc discricionariedade na graduação e escolha dos candidatos. Estes devem poder ser ordenados segundo critérios objectivos, previamente definidos e conhecidos pelos interessados.

Por outro, a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado nem indicava, normalmente, com suficiente precisão, os fundamentos que a conduziram a preferir este ou aquele candidato de entre os colocados em posição de igualdade.

4 — Por isso, o Provedor recomendou ao Ministro da Justiça que fizesse publicar diploma que regulasse, objectivamente e com maior precisão, os factores

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de graduação dos candidatos do concurso em questão, por forma a reduzir ao mínimo a discricionariedade admitida pelo regime então vigente.

5 — Esta recomendação foi aceite, tendo o Secretário de Estado da (ustiça emanado, em 15 de Março de 1982. despacho normativo completando o artigo 113." do Decreto Regulamentar n." 55/80 no sentido preconizado pelo Provedor.

Processo n.r 80/R-I80I

Sumário — Trabalho. Função pública. Concurso de professores. Preterição.

Objecto — Revogação de colocação ilegal como professor de escola do magistério primário.

Decisão — Reclamação procedente. Reparo.

Síntese:

1 — No ano de 1979-1980, a reclamante não obteve colocação na Escola do Magistério Primário de Lisboa, para leccionar a disciplina de Movimento e Drama, em virtude de outro candidato ao respectivo concurso ter ficado em I." lugar.

2 — A interessada pediu que tal situação fosse revista e alegou que o candidato colocado não poderia de modo nenhum ter a classificação que indicava, pois ela reportava-se ao 4." ano do curso que servia de habilitação própria, e não era a classificação final deste.

5 — Ouvida sobre o assunto, a Direcção-Geral de Pessoal veio a concluir que a reclamante tinha sido injustamente preterida, embora desde logo invocasse que se encontravam ultrapassados todos os prazos para interposição de recurso contencioso.

4 — Dado que estava já esgotado na altura o prazo de revogação do acto contestado, e que nos anos lectivos posteriores a situação da reclamante se normalizou, o processo foi arquivado, sem embargo de terem sido dirigidos à Direcção-Geral de Pessoal os seguintes reparos:

O primeiro, pelo facto de o recurso hierárquico apresentado ao Ministro da Educação pela queixosa da decisão da Direcção-Geral ter, afinal, sido decidido pelo próprio director-gcral.

De facto, esta atitude é claramente ilegal e frustra completamente os objectivos do recurso hierárquico.

De resto, o Supremo Tribunal Administrativo tem decidido (v., por todos, o Acórdão dc 8 de Fevereiro de 1979, in Acórdãos Doutrinais, n." 210, p. 745) que na delegação de competência não cabe o poder de o delegado decidir dos recursos hierárquicos interpostos para o delegante das suas decisões.

Aliás, no caso presente, o director-gcral dc Pessoal, ao rejeitar o recurso hierárquico em causa, nem sequer invocara a delegação;

O segundo, tendo cm conta as circunstâncias seguintes:

A lista provisória, comendo a colocação ilegal da reclamante, fora publicada em 13 de Novembro de 1979:

O Conservatório Nacional, onde fora obtida a classificação em causa, esclareceu a Direcção-Geral de Pessoal da verdadeira classificação relevante do reclamado em 10 de Abril de 1980, isto é, perfeitamente dentro do ano posterior à produção de efeitos do acto contestado c no decurso do qual

' este, enquanto constitutivo de direitos, mas ilegal, teria podido ser revogado. Ora, esta revogação do acto em questão teria sido possível à Direcção-Geral de Pessoal; esta. porem, apesar de ter tido conhecimento da ilegalidade daquela decisão muito antes de ela se tornar inatacável, não o fez.

5 — A entidade visado veio esclarecer que a referida decisão do director-geral dc Pessoal não fora proferida sobre o recurso da interessada, mas sobre a informação a prestar ao Provedor.

Sobre o recurso hierárquico ter-se-ia formado, sim. acto tácito de indeferimento.

Também sob este aspecto, porém, a actuação da Administração não deixou de ser censurável, por não ter dado o seguimento legal ao recurso hierárquico da queixosa.

Processo n.'1 79/R-1152-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Concurso. Processo.

Objecto — Processamento indevido de concurso documental para inspector do Ministério da Educação. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação. Síntese:

I—O reclamante, considerando-se num concurso para inspector do Ministério da Educação indevidamente graduado, requereu várias vezes, sem êxito, que lhe fosse passada certidão das actas do concurso, para tomar conhecimento dos critérios de apreciação pelo respectivo júri.

Entendia, designadamente, que não haviam sido tomados em conta o seu tempo de serviço e habilitações, constando-lhe que, ao invés, o júri teria sobretudo considerado como factor de ordenação a instrução de processos disciplinares no âmbito da Inspecção Admirtistrativo-Financeira. possibilidade que, porém, só teria sido facultada a alguns dos candidatos.

Porque mesmo depois da publicação da lista definitiva continuava a não lhe ser passada a certidão pedida para efeito de eventual recurso, o interessado solicitou a intervenção do Provedor de Justiça.

2 — Após insistência deste Serviço, foi. enfim, passada a certidão pretendida.

3 — Analisado, além disso, todo o processo do concurso, revelou-se este afectado por várias irregularidades, que deram lugar aos seguintes reparos do Provedor de Justiça:

a) Apesar de se tratar de concurso documental, foram declaradamente tidos em conta factores alheios aos documentos apresentados pelos candidatos, em especial as informações fornecidas pela Inspecção Administrativo--Financeira;

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b) Não foram previamente comunicados aos can-

didatos os critérios de selecção;

c) O júri não elaborou actas, pelo que não se

pode concretamente ajuizar do acerto do atendimento ou não das reclamações apresentadas nem das exclusões e graduações decididas;

d) O júri utilizou como primeira prioridade um

factor não previamente anunciado, relativamente ao qual os candidatos não estavam colocados, à partida, em posição de igualdade.

De facto, nem a todos fora proporcionada a possibilidade de organização de processos de inquérito ou disciplinar ou o exercício de outras actividades inspectivas no âmbito da Inspecção Administrativo-Financeira;

e) Não parece admissível a tentativa de interfe-

rência nas decisões do júri por parte da Inspecção Administrativo-Financeira (este organismo enviara, com efeito, ao júri do concurso, na pendência deste, um ofício afirmando que seria desvantajosa para o serviço de inspecção a eventual exclusão de 2 candidatos, que identificava); j) Enfim, a informação prestada pela Secretaria--Geral, no sentido de que todos haviam sido graduados em função dos critérios estabelecidos pelo júri, nomeadamente das informações prestadas pela Inspecção Administrativo-Financeira, não se revelava exacta, assim parecendo que o júri nem sequer respeitara integralmente as regras por ele próprio definidas. É que do processo consta expressamente que um dos concorrentes escolhidos não prestara qualquer colaboração à Inspecção Administrativo-Financeira e que, quanto ao outro, o conhecimento das suas q ualidades também era só mediato, e não por haver trabalhado nesse departamento.

4 — A Secretaria-Geral do Ministério contestou estes reparos alegando, designadamente, que:

a) Tratando-se de concurso documental, a apreciação dos currículos dos candidatos deveria ser complementada por elementos comprovativos da sua aptidão para o exercício de funções inspectivas.

Nesse sentido apontaria, aliás, o aviso de abertura do concurso, ao esclarecer que os concorrentes deveriam apresentar, além do currículo, quaisquer outros documentos que facilitassem a apreciação daquelas aptidões;

6) Tratando-se da escolha de inspectores e abrangendo a área de recrutamento destes funcionários oriundos de outras carreiras, a antiguidade e as habilitações dos candidatos seriam factores insuficientes para ajuizar da sua capacidade para funções inspectivas;

c) A lei não impunha a publicação dos critérios

de selecção. E estes foram comunicados aos concorrentes que os solicitaram para efeitos de recurso;

d) O reparo relativo à não elaboração de actas

pelo júri tinha natureza meramente formal,

pois os critérios de apreciação deste constavam da informação que ele redigira para graduação dos candidatos;

e) A utilização do critério relativo à realização de tarefas de inspecção no âmbito da Inspecção Administrativo-Financeira não fugiria do procedimento normal em concursos documentais, em que se considerava a experiência obtida em actividades relacionadas com os cargos a prover;

/) Enfim, os 2 concorrentes escolhidos, que não tinham trabalhado na Inspecção Administrativo-Financeira, haviam efectuado tarefas de tipo inspectivo noutros departamentos.

5 — Não concordando com esta argumentação, o Provedor formulou ao Ministro da Educação a recomendação seguinte:

a) Tenho por ilegal o entendimento de que num concurso documental se possam utilizar factores de graduação não representados ou reflectidos nos respectivos documentos.

A própria natureza do concurso documental implica que neste apenas se tenha em conta o que consta ou esteja reflectido nos documentos apresentados. Isto como exigência de objectividade na apreciação e de possibilidade de controle por parte dos interessados e das instâncias competentes para apreciar da legalidade e justiça dos concursos.

A Secretaria-Geral desse Ministério afirma que o recurso às informações dos serviços e a outros elementos relativos à actividade profissional dos candidatos estaria legitimada pela referência no aviso de abertura do concurso «a quaisquer outros documentos que facilitem a formação de um juízo sobre as aptidões dos candidatos para o exercício do cargo a concurso».

Mas, precisamente, o que parece de entender é que, se seria legítima a consideração pelo júri do concurso de aspectos ou factores constantes da documentação apresentada, nesses termos, pelos candidatos, já o não foi o recurso a elementos estranhos a esses documentos e neles não referidos, designadamente a tomada de informações aos serviços sobre as aptidões dos concorrentes.

b) Outro problema é o de saber se para cargos desta natureza estaria indicado o concurso meramente documental.

Mas, se assim não é, caberia ao Ministério estabelecer as necessárias regras jurídicas para a consagração do tipo de recrutamento que se tivesse por mais adequado ou, se tais regras não são vinculativas, competir-lhe-ia abrir o tipo de concurso tido por mais adequado.

A verdade, porém, é que o concurso em causa foi documental.

c) Diz mais a Secretaria-Geral que não era legalmente imposta a prévia publicação dos critérios de selecção.

Ê certo.

Mas o reparo que formulei tinha por objectivo conseguir que o Ministério passasse a organizar os concursos pela forma que considero mais justa e correcta.

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Ora, é indubitável que constitui um justo e salutar procedimento o de se tomarem conhecidos dos candidatos, antes ou por ocasião da abertura dos concursos, os critérios de selecção a utilizar.

E, concretamente, só assim eles teriam podido, nos termos da parte final do aviso de abertura deste concurso, ponderar que tipos mais de documentos lhes interessaria apresentar com valor para a graduação.

d) Tão-pouco parece de concordar com a afirmação de a não elaboração de actas constituir um aspecto meramente formal.

E procedimento normal e generalizadamente aceite o de que as sessões e decisões dos órgãos colegiais, como um júri de concursos, devem estar tituladas em actas.

E isto não só por razões formais.

£ que é em larga medida através dessas actas que depois os interessados e os órgãos de controle poderão conhecer do fundamento das decisões tomadas e da sua legalidade e justiça.

e) Enfim, contínuo a entender que, independentemente dos objectivos tidos em vista, é sempre indesejável uma conduta do tipo da que a Inspecção Administrativo-Financeira assumiu, ao chamar a atenção do júri para o prejuízo que adviria da exclusão dos 2 candidatos, que considerava serem pessoas qualificadas!

Entendo que nenhum serviço ou entidade deve, seja a que pretexto for, procurar influir nas decisões de um júri de concurso.

Em face dos fundamentos expostos, tenho por bem formular a V. Ex.D a seguinte recomendação:

Nos concursos já abertos, ou que: de futuro venham a ser abertos, devem ser tomadas em consideração as observações que antecedem, designadamente:

a) Em quaisquer concursos devem ser pre-

viamente publicados os critérios de se- * lecção a utilizar;

b) Igualmente em todos os concursos deve-

rão sempre ser, pelos respectivos júris, elaboradas actas donde constem as suas decisões e onde se concretize a respectiva fundamentação;

c) Em caso algum deverão entidades estra-

nhas aos júris procurar influir na decisão destes;

d) Nos concursos documentais apenas deve-

rão ser tomados em conta aspectos ou elementos constantes dos documentos respectivos.

7 — O processo foi arquivado depois de recebida a informação de que o Ministro da Educação, por despacho de 28 de Setembro de 1982, mandara divulgar esta recomendação pelos respectivos serviços.

Processo n.° 80/R-22B1-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Contratos.

Objecto — Renovação de contrato como técnico auxiliar de 2." classe, em cumprimento do n.° 3 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 280/79, de 10 de Agosto.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada para efeitos de alteração da lei. Síntese:

1 — Apresentaram reclamação vários agentes contratados como técnicos auxiliares de BAD, aos quais deveriam ser atribuídas classes superiores, em função do disposto no Decreto-Lei n.° 280/79, de 10 de Agosto.

Tais mudanças de categoria não podiam operar-se, porém, na prática, pois, estando eles providos por contrato e tomando-se necessária a celebração de novos contratos para as categorias superiores, o Tribunal de Contas não concedia visto para os novos contratos, com base nos Decretos-Leis n.°* 35/80, de 14 de Março, e 140/81, de 30 de Maio, que estabeleceram, genericamente, a proibição de celebração de contratos de pessoal com duração superior a 3\meses.

2 — O Provedor não pode, nos termos da lei vigente, discutir a actuação do Tribunal de Contas.

Mas, considerada a situação, afigurou-se ser esta claramente injusta.

De facto, por um lado, a recusa do visto aos contratos em questão vinha obstar a uma subida de categoria pretendida pelo legislador para este pessoal.

Por outro lado, não parecia que na mente da lei, ao proibir genericamente a celebração de contratos de pessoal de duração superior a 3 meses, estivesse o propósito de nesta incluir também a celebração de novos contratos para categorias diferentes de pessoal já antes ao serviço também provido por contrato.

3 — Nesse sentido se formulou recomendação aos Ministros das Finanças e do Plano e da Reforma Administrativa, para que publicassem diploma legislativo que tomasse efectiva a subida de categoria prevista para estes trabalhadores nos Decretos-Leis n.°s 191-C/79 e 280/79.

4 — As entidades citadas responderam que iriam preparar medida legislativa no sentido recomendado.

Processo n.° 8G7R-11-54-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Contrato. Readmissão.

Objecto — Demora na readmissão de ex-funcionàrio contratado.

Decisão — Reclamação procedente. Reparo. Síntese:

1 — Um sindicato apresentou reclamação no interesse de um ex-terceiro-ajudante da Secretaria Notarial de Vila Nova de Ourém que, tendo solicitado a rescisão do contrato, nos termos do n.° 1 do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 49 031, de 27 de Maio de 1969, requereu, passados 16 meses, o reingresso nos serviços, tendo sido obrigado a aguardar 2 anos pela nova colocação.

2 — Ouvida sobre o assunto, a Direcção-Geral dos ' Registos e do Notariado sustentou que não se poderia

fazer, nesta hipótese, uma aplicação literal do n.° 2 daquela mesma disposição legal, quando determina que o ex-contratado que tenha prestado mais de 3 anos de serviço efectivo «terá d'reito, desde que o requeira no triénio posterior à rescisão, a ocupar, mediante novo contrato e com dispensa do limite de idade, a

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vaga da sua categoría e classe que se verifique no quadro a que pertencer depois de requerida a readmissão ao serviço».

E isto porque, em seu entender, esta norma não poderia reportar-se apenas a eventual vaga do lugar antes ocupado, mas sim a qualquer vaga da sua categoria.

O funcionário nestas condições teria, assim, apenas direito «a uma vaga da sua categoria [...] que se verifique depois de requerida a sua readmissão».

Como o funcionário em causa tivesse antecedentes disciplinares e baixa classificação de serviço, tinha-se considerado acertado fazer a sua colocação em serviço de reduzido movimento.

A Direcção-Geral defendia, pois, dispor de um poder discricionário no tocante à escolha da vaga em que se operaria a readmissão e do momento em que esta leria lugar.

3 — Apesar de o processo ter sido arquivado, por, entretanto, o interessado ter sido colocado em vaga que aceitou, o Provedor, não concordando com a posição definida pela entidade visada, não deixou de lhe formular o reparo seguinte:

Não quero, porém, deixar de salientar a V. Ex.a que não considero acertada a interpretação que essa Direcção-Geral faz do n.° 2 do artigo 8." do Decreto-Lei n.° 49 031 e que a leva a entender que esse preceito lhe confere um poder discricionário, em termos de poder readmitir os elementos por ele abrangidos por forma a provê-los em qualquer vaga.

De facto, o preceito em causa diz:

Se, porém, o funcionário tiver prestado mais de 3 anos de serviço efectivo, terá direito, desde que o requeira no triénio posterior à rescisão, a ocupar, mediante novo contrato e com dispensa de limite de idade, a vaga da sua categoria e classe que se verifique no quadro a que pertencer depois de requerida a readmissão ao serviço.

Assim, a lei não diz que ele tem direito a ser provido em qualquer vaga com tais características: se assim fosse, teria falado de «uma vaga», «qualquer vaga» ou «vaga» apenas.

Mas a prescrição em causa usa o artigo definido: o funcionário «terá direito [•••] a ocupar [...] a vaga»; qual vaga então? Rèsponde-o a parte final: a «que se verifique [«..] depois de requerida a readmissão ao serviço».

Além, pois, da utilização do artigo definido para caracterizar a vaga em referência, há que atentar em que esta frase final há-de ter algum sentido próprio.

Ele não é, decerto, apenas o de dizer que a readmissão tem por pressuposto o requerimento e só pode dar-se em relação a vaga existente depois da apresentação deste.

Se assim fosse, tratar-se-ia de expressão inútil e tautológica, pois essa ideia já na mesma norma antes fora expressa ao estabelecer-se a condição «desde que o requeira».

A DGRN estaria, pois, obrigada a colocar o queixoso na vaga que se verificasse depois do seu requerimento (ou numa delas, se à mesma data já existissem várias).

Não podia proceder como o fez: aguardar mais de 2 anos para o readmitir, apesar de, entretanto, terem surgido várias vagas.

Compreende-se, aliás, o objectivo da lei: tratou-se, precisamente, de evitar que, por um uso incorrecto ou tardio de poder discricionário, a Administração frustrasse ou comprometesse o direito do funcionário a regressar ao quadro.

Fê-lo, de resto, em termos semelhantes aos aplicáveis ao regresso de licença ilimitada (Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1931, artigo 14.°, § 1.°), situação com a qual esta tem forte analogia.

E isto porque também aqui o tempo de serviço já prestado antes da rescisão do contrato justificou para o legislador esta forma especial de garantir o regresso do funcionário aos quadros com as características do cargo antes exercido.

Processo n.° 79/R-1880-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Despedimento por faltas injustificadas. Reintegração.

Objecto — Pedido de reintegração de um trabalhador assalariado despedido por faltas por doença injustificadas e ausência do seu domicílio quando visitado pelo subdelegado de saúde.

Decisão — Recomendação não atendida.

Síntese:

1 — Um ex-assalariado eventual do Centro de Identificação Civil e Criminal dirigiu-se ao Provedor de Justiça em 1979, queixando-se de que, apesar de todas as exposições que, desde o seu despedimento daquele Centro em 1974, enviara, solicitando a sua reintegração no mesmo, não conseguira deferimento da sua pretensão, pelo que considerava ser vítima de grande injustiça.

2 — O reclamante exercera no Arquivo de Identificação (hoje Centro de Identificação Civil e Criminal) mais de 4 anos de serviço efectivo, em conformidade com a contagem de tempo de serviço determinada pela alínea q) da declaração da Secretaria de Estado da Administração Pública (publicada no Diário do Governo, 1." série, de 2 de Abril de 1970).

Assim, se desse faltas por doença, estaria, em princípio, abrangido pela alínea 6) don," 1 do artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 49 031, de 24 de Novembro de 1979 — abono de remuneração integral no 1.° mês de faltas e dois terços do vencimento até ao 3.° mês de ausência.

Porém, o reclamante faltara ao serviço em 4 de Maio de 1974, e só no dia 7 desse mês apresentara atestado médico comprovativo de doença, pelo que não observara a imposição do § 3.° do artigo 2° do Decreto-Lei n.° 26 334, de 4 de Fevereiro de 1936, que lhe era aplicável pelo disposto na alínea p) da declaração citada; isto é, não participara o estado de doença no prazo de 24 horas.

Por outro lado, não fora encontrado no seu domicílio quando, para efeitos de controle de doença, o subdelegado de saúde o visitou. Só cerca de 15 dias depois apresentou atestado médio comprovativo de que na data da visita do subdelegado se ausentara de casa para tratamento no consultório do seu médico. Infringira, assim, o disposto no § 4.° do artigo 8.° do

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Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1931, o que provocara o seu despedimento, sem pagamento de qualquer abono ou indemnização.

3 — Analisado o processo pessoal do interessado, o Provedor considerou provado que ele faltara ao serviço e estivera ausente de casa na data da visita do subdelegado porque se encontrava, efectivamente, doente, só não tendo legalmente justificado as faltas dadas e a ausência de casa por ignorância das disposições legais específicas existentes nesta matéria para os assalariados eventuais não pertencentes aos quadros permanentes.

Apesar de reconhecer que a ignorância da lei a ninguém aproveita, o Provedor entendeu dever tomar em consideração a boa fé do reclamante em todo o processo, a injusta disparidade do regime estabelecido pela lei para os assalariados, em particular para os assalariados eventuais não pertencentes a quadros permanentes, em relação ao de todos os outros trabalhadores da função pública e ao dos do sector privado, e ainda a precária situação económica do reclamante.

Por isso, recomendou que se procedesse à reintegração do queixoso, sem prejuízo da aplicação das normas gerais vigentes sobre admissão de pessoal.

4 — O Secretário de Estado da Justiça não aceitou, porém, este ponto de vista, referindo que:

d) O reclamante não reagira oportunamente à decisão que em 1974 dera por findo o seu contrato de assalariamento eventual, só o fazendo mais tarde, «quando o desemprego se começa a acentuar no País»;

6) Mas, mesmo que se entendesse como justa a readmissão ao serviço, esta não será viável perante os preceitos legais vigentes c até se revelaria desnecessária face ao volume de trabalho existente.

5 — Considerando-se as razões alegadas, e que a readmissão do reclamante não constituía direito que legalmente pudesse invocar, veio o processo a ser arquivado.

Processo n.° 81/R-1856-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Direito à igualdade. Discriminação.

Objecto — Aplicação do regime do Decreto n.° 109/ 80, de 20 de Outubro, a todo o pessoal dos serviços gerais dos estabelecimentos e serviços dependentes da Secretaria de Estado da Saúde.

Decisão — Reclamação parcialmente atendida. Elaborada recomendação.

Síntese:

1 — Uma federação de sindicatos apresentou ao Provedor de Justiça uma exposição em que contestava a legalidade do despacho conjunto das Secretarias de Estado da Saúde e da Reforma Administrativa de 18 de Março de 1981, emitido ao abrigo do artigo 17.° do Decreto n.° 109/80, de 20 de Outubro, publicado no Diário da República, 2." série, n.° 147, de 30 de Junho de 1981.

Segundo a reclamante, o despacho em causa estaria eivado de ilegalidade e inconstitucionalidade, petos seguintes motivos:

a) Assinatura por 2 membros do Governo sem

virtual competência para o efeito, face à lei orgânica do governo então vigente e às competências delegadas pelos respectivos ministros;

b) Carácter não interpretativo, mas inovador, do

mesmo despacho, por restringir a aplicação do Decreto n.° 109/80 ao pessoal dos serviços gerais dos hospitais centrais, distritais e concelhios e dos centros de saúde com unidades de internamento, sem que a restrição feita encontrasse na letra do decreto o mínimo de correspondência verbal;

c) Inexistência jurídica, por ter sido publicado

na 2.° série do Diário da República, e não na l.a série, tal como exigido pelo artigo 3.° da Lei n.° 3/76, de 10 de Setembro, com a nova redacção dada pela Lei n.° 8/77, de 1 de Fevereiro;

d) Injustiça e discriminação do despacho, por

tratar diferentemente trabalhadores posicionados em idênticas áreas de actuação e integrados no mesmo ministério, pelo simples facto de trabalharem em determinados serviços, o que ofenderia a letra e o espírito do princípio da igualdade expresso no artigo 13.°, n.° 1, da Constituição e implícito na alínea a) do seu art'go 53."

2 — Ouvidas as posições dos autores do despacho, vieram estes a aduzir o seguinte:

a) As entidades subscritoras do despacho eram

organicamente competentes, nos termos de delegações de competência publicadas no Diário da República, 2.a série, n.° 19, de 23 de Janeiro de 1981 (Despacho n.° 1/81, do MAS), e Diário da República, l.a série, n.° 27, de 2 de Fevereiro de 1981 (Despacho Normativo n.° 55/81, do MRA);

b) O despacho tinha carácter interpretativo, e não

inovador, resultando, quer do preâmbulo, quer do artigo 3.° do Decreto n.° 109/80, que o legislador tinha em mente a sua aplicação exclusiva às unidades de saúde com características de internamento;

c) A publicação do despacho normativo na 2.a sé-

rie não acarretava inexistência jurídica, tratando-se de mero lapso ou «erro material»;

d) A justificação da aplicação exclusiva do De-

creto n.° 109/80 a pessoal exercendo funções em hospitais ou centros de saúde com unidades de internamento residia na circunstância de estes agentes exercerem as suas funções em condições muito mais penosas do que os que trabalham em serviços com regime exclusivamente ambulatório.

3 — Analisada a questão nas suas quatro perspectivas, concluiu-se que:

1) As entidades subscritoras do despacho eram competentes, tendo em atenção o disposto no artigo 17.° do Decreto n.° 109/80, de

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20 de Outubro, e artigo 30.° do Decreto--Lei n." 28/81. de 12 de Fevereiro;

2) Eram de aceitar as razões invocadas pela Admi-

nistração para a defesa do carácter interpretativo do despacho;

3) A publicação do despacho na 2.11 série do Diá-

rio da República era incorrecta, tendo em atenção o disposto no artigo 3.u, alínea /), da Lei n." 3/76. de 10 de Setembro (com a nova redacção dada pela Lei n." 8/77, de 1 de Fevereiro), mas tal não acarretaria inexistência jurídica, situação que, nos termos do artigo 10.". n." 1. da Lei n.° 3/76, só se verificaria nos casos de não publicação;

4) Não havia ofensa ao princípio da igualdade

previsto no artigo 13.u, n.° 1. da Constituição, já que os argumentos invocados pela reclamante para o justificar eram de carácter exclusivamente formal (identidade de áreas de actuação e integração do pessoal no mesmo ministério), sendo de aceitar a justificação das entidades reclamadas, Da-seada na maior penosidade do exercício de funções em hospitais ou estabelecimentos equiparados, e sendo certo que um dos corolários do princípio da igualdade exige o tratamento desigual de situações desiguais.

4—Contudo, atendendo ao vício de forma verificado, o Provedor de Justiça recomendou ao Secretário de Estado da Reforma Administrativa «que o despacho conjunto dos Secretários de Estado da Reforma Administrativa e da Saúde relativo à aplicação do Decreto n." 109/80, de 20 de Outubro, e publicado no Diário da República. 2.a série, n.° 147, de 30 de |unho de 198/, seja novamente publicado, agora na l.3 série do Diário da República, tendo em atenção o disposto no artigo 3." da Lei n." 3/76. de 10 de Setembro (com a nova redacção dada pela Lei n." 8/77, dc I de Fevereiro) e tendo em vista a função de garantia que representa para os administrados a regularidade formal de que se devem revestir os actos do Governo».

Processo n.' 81/R-1241-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Disciplina.

Objecto — Nulidade da proibição de condução de viaturas sem procedência de processo disciplinar.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação parcialmente acatada.

Síntese:

1 — Um guarda prisional em serviço no Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz apresentou queixa ao Provedor de Justiça pelo facto de, por ordem de serviço subscrita pelo respectivo director (n.° 18/81, de 23 de Abril), lhe ter sido proibida a condução de veículos do Estado afectos àquele Estabelecimento, a pretexto de ter «dado mostras de incompetência na condução de viaturas».

2 — Examinado o processo de inquérito, do qual resultara tal decisão, ponderou-se que:

a\ Em processo de inquérito ou de averiguações não há arguidos, pois o objectivo de tal tipo de processo é o de apuramento de factos determinados;

b) No caso concreto, terá, desde o início, havido

a intenção de tratar o reclamante como arguido, à margem das normas legais aplicáveis do Estatuto Disciplinar (artigos 68." e seguintes);

e) Do relatório do processo de averiguações instaurado viera à concluir-se, com apoio em parecer de peritos de uma empresa concessionária, que o reclamante não fora negligente na sua actuação e que a avaria no motor do veículo que ele conduzia se ficara a dever a desgaste natural do respectivo molor;

c) O director do Estabelecimento Prisional, não

concordando com tal conclusão, mandara realizar diligências complementares, que consistiram na audição de guardas c de um recluso, visando a recolha dc dados que lhe permitissem concluir pela imperícia do reclamante como condutor; e) Porém, tal procedimento afasta-se das normas do Estatuto Disciplinar (artigo 53.°, n.° 6) relativas, ao apuramento da competência profissional:

/) Mesmo a concluir-se pela incompetência profissional do guarda reclamante, o director do Estabelecimento Prisional teria de mandar, instaurar processo disciplinar, sob pena de, como veio a acontecer, não serem asseguradas ao visado as mínimas garantias dc defesa.

3 — Perante tais conclusões, o Provedor de Justiça formulou recomendação ao director-geral dos Serviços Prisionais, com o objectivo de ser anulado todo o processado após o relatório do processo de averiguações, por evidente inobservância de normas do Estaiuto Disciplinar, a qual afectara a garantia de defesa do guarda reclamante.

4 — Na sequência de tal recomendação, aquela Di-recção-Geral veio a informar que:

a) Considerava pertinentes os reparos feitos quanto

às imperfeições e irregularidades formais do processo de averiguações em questão;

b) Apesar disso, a retirada do guarda das fun-

ções de motorista não representava qualquer sanção disciplinar ou alteração dc categoria profissional. A categoria do visado era a de guarda e a designação de guarda motorista significava apenas distribuição de uma tarefa específica a um guarda, a qual lhe podia a todo o tempo ser retirada;

c) Pelas razões mencionadas, foi recomendado à

direcção do Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz que, em aditamento ao artigo 2." da Ordem de Serviço n.° 17/81, de 23 de Abril, fosse publicado na mesma ordem de serviço que a peritagem efectuada à viatura não demonstrara que a respectiva avaria tivesse resultado de qualquer negligência do guarda reclamante.

5 — Comunicado ao queixoso o resultado da intervenção do Provedor de Justiça, foi determinado o arquivamento do processo.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Processo n.° 81/R-1433-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Disciplina. Objecto — Transferência de funcionária do IFADAP,

apesar de ter sido mandado arquivar processo de

inquérito relativo a actos seus. Decisão — Reclamação procedente. Reparo. Síntese:

1 — Uma funcionária do Instituto Financeiro de Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, ao regressar de férias, em Março de 1981, vira-se suspensa das funções que exercia (chefe da Secção de Correspondência e Arquivo), e transferida para o quadro dos serviços de pessoal como adida.

Essas decisões haviam sido tomadas por deliberação da comissão directiva do Instituto datada de 5 de Março de 1981, a qual também mandara organizar inquérito a propósito dos factos que a levaram a assumir tal atitude.

Tratara-se, fundamentalmente, de ter sido entregue em 27 de Fevereiro desse ano, por protocodo, na sede do organismo, um ofício do Banco de Portugal aprovando as linhas de crédito «Seca Outono 80/Geada Janeiro 81», ao qual não teria sido dado, porém, o seguimento exigido pela urgência desse assunto.

A funcionária considerou injustas tais decisões, pois entendia não ter sido responsável pelos aludidos factos e entendia ter sido afectada na sua honorabilidade profissional pelo teor das mesmas e pela divulgação que. mediante circular interna, lhes fora dada.

2 — Ouvida a comissão directiva do IFADAP, esta começou por afirmar que, nos termos dos artigos 18.° e 19.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro (Estatuto do Provedor de Justiça), e do artigo 20.° do Decreto Regulamentar n.° 46/78, de 30 de Novembro, entendia que a questão estaria excluída das atribuições do Provedor de Justiça.

Esclarecia, contudo, que o «processo disciplinar» levantado à queixosa fora arquivado e que ela era agora chefe da Secção de Arquivo, em resultado da reestruturação orgânica que levara à extinção da secção que antes dirigia.

3 — Não pôde aceitar-se a argumentação do IFADAP relativa à falta de competência do Provedor a seu respeito, essencialmente baseada na invocação de que, sendo esse organismo um instituto público, não caberia na expressão «administração central, regional e local, incluindo as empresas públicas», utilizada no Estatuto do Provedor de Justiça para definir as entidades sujeitas ao seu controle.

E isto porque tanto a Constituição (empregando no artigo 24.° a ampla expressão «poderes públicos») como o Estatuto do Provedor (utilizando no seu artigo 1." a fórmula «Administração Pública») parecem revelar o propósito de abarcar todos os entes públicos na esfera de competência do Provedor.

E o mesmo significado terá a menção «incluindo as empresas públicas», constante da alínea a) do n.° 1 do artigo 19.° da Lei n.° 81/77: ela justificava-se por ser a propósito destas que porventura se poderiam suscitar algumas dúvidas acerca dos poderes de fiscalização do Provedor a seu respeito; e até resultaria menos lógico que o Provedor pudesse exercer controle sobre as

empresas públicas, e não já sobre os institutos públicos, cujo grau de autonomia em relação à administração central é inferior ao daquelas.

Apesar de exposta esta posição ao IFADAP, este considerou dever promover a obtenção de parecer da Procuradoria-Geral da República sobre o assunto.

Tal parecer (n." 11/82), publicado no Diário da República, 2.a série, de 30 de Novembro de 1982, foi concordante com a opinião expressa pelo Provedoi

5 — Quanto à situação da queixosa, verificou-se que, entretanto, a comissão directiva fizera divulgar nota de serviço comunicando o arquivamento do processo, por não se ter apurado qualquer responsabilidade dela nos factos que o originaram.

E não se encontrou motivo para discutir a atribuição das funções que acabou por vir a exercer em resultado da reestruturação do Instituto.

Mas o Provedor formulou reparo ao IFADAP pelo facto de, ao mandar instaurar o inquérito, haver, concomitantemente, transferido a queixosa.

Teria sido porventura possível suspendê-la preventivamente se o processo em causa tivesse natureza disciplinar.

Tendo-se tratado de mero processo de inquérito, não teria sido legítima, nem a eventual suspensão, nem a transferência operada, qualquer delas não previste na lei.

Processo n.° 82/R-362-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Disciplina. Objecto — Recusa de confiança de processo disciplinar

e de audição de testemunhas. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação

parcialmente acatada. Síntese:

1 — Um funcionário da Casa Pia de Lisboa queixou-se por em processo disciplinar lhe haver sido aplicada uma multa de 5000$, com base em exposição que fizera, segundo ele, apenas para protestar acerca do tratamento de favor de que teria beneficiado certo colega em matéria de promoção.

2 — Analisado o processo disciplinar em causa, pareceu, de facto, que a punição aplicada se revelava desproporcionada em relação ao teor da exposição do funcionário que o originara.

E, além disso, observou-se que o instrutor do processo recusara, ilegalmente, a confiança do mesmo, quando requerida pelo advogado do interessado, bem como a audição de certas testemunhas por ele oferecidas (com o argumento de que ele as poderia ter apresentado num inquérito que antes correra em relação ao colega contra cuja promoção protestara).

3 — Em face do exposto, o Provedor formulou a seguinte recomendação:

Considero que no processo disciplinar se verificaram dois vícios formais e um substancial. Assim:

a) Por um lado, bem parece que o instrutor não podia, nos termos em que o fez, recusar a confiança do processo em casa do advogado.

De facto, foi interpretado o artigo 60.° do Estatuto Disciplinar em vigor como estabelecendo a

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faculdade, e não a imposição, da confiança do processo ao advogado do arguido.

Mas a verdade é que o citado preceito legal dispõe:

O processo poderá ser confiado ao advogado do arguido, nos termos e sob a cominação do disposto nos artigos 169.° a 171.° do Código de Processo Civil.

E dispõe o mencionado artigo 169.°, por seu turno;

1 — Os mandatários constituídos pelas parles podem requerer que os processos pen-Hentes lhes sejam confiados oara examp m sua casa.

3—[...] juiz, que deferirá o pedido quando não haja inconveniente.

Em suma: o juiz —e, consequentemente, por via da remissão feita pelo artigo 60.° do Estatuto Disciplinar, o instrutor do processo disciplinar — deve deferir o pedido do advogado quando não haja inconveniência.

Ou, por outras palavras, para recusar a con-finança do processo tefá de ser devidamente fundamentada a inconveniência.

No caso presente, o instrutor, interpretando menos correctamente a lei — na suposição de que ela lhe conferiria um poder discricionário acerca da concessão da confiança do processo —, não explicita qualquer inconveniente.

Afigura-se, pois, ilegal a recusa de confiança do processo ao advogado do queixoso.

b) Ilegal parece também ter sido a recusa por parte do instrutor da audição das testemunhas indicadas pelo arguido na sua defesa, e isto com o argumento de que tal audição seria impertinente, por náo estar em discussão no processo a actuação do funcionário ... e por aquele ter tido no processo de averiguações ocasião de suscitar esse problema.

É que, desde logo, o artigo 59.° do Estatuto Disciplinar dispõe que o instrutor pode recusar a audição de testemunhas indicadas pelo arguido, «para além do número global de 20, se já considerar suficientemente provados os factos alegados pelo arguido».

Ora, nenhum destes condicionalismos se verifica ocorrer.

Com efeito, ele só indicou 3 testemunhas, e de modo algum o instrutor considerou provados — antes pelo contrário — os factos alegados pelo arguido e que aquelas deveriam comprovar.

É, aliás, abundante a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo no sentido de considerar que a falta de audição das testemunhas indicadas, dentro do condicionalismo legal, pelo arguido é ilegal e afecta o seu direito de defesa, tornando, por isso, a partir daí, inválido o processo.

Recorde-se, por todos, o Acórdão de 28 de Fevereiro de 1980, in Acórdãos Doutrinais, n.os 224-225, p. 978:

Não pode o senhor instrutor recusar a inquirição de testemunhas com o fundamento de que os seus depoimentos não interessam

à descoberta da verdade ou «já não adiantam para o apuramento da verdade». Está em causa a defesa do arguido. Só depois de se conhecer o depoimento da testemunha se poderá valorizá-lo.

Para além disto, acresce que, no caso concreto, nem corresponderão à realidade as razões invocadas pelo instrutor: o facto de num outro processo de averiguações o queixoso não ter pedido essa diligência de modo algum releva.

De facto, este processo não era dirigido contra ele, e, mesmo que o fosse, e se tratasse de processo de inquérito, e ainda que tivessem nele já sido ouvidas as testemunhas, elas teriam de ser ouvidas de novo, no âmbito, agora, do processo disciplinar.

£ que neste é que se discute a responsabilidade do arguido, importando, por isso, que nele sejam ouvidas as testemunhas indicadas por aquele.

Também não parece relevar o dizer-se que não está em causa no processo em apreço a actuação do funcionário ...

Ê que ela o está, indirectamente embora: o queixoso é acusado de ter feito afirmações desabona-tórias quanto àquele e que não seriam verdadeiras.

Ora, o arguido apresentou as aludidas três testemunhas, com a alegação de que elas poderiam comprovar os factos (ou parte deles) que imputava a tal funcionário.

c) Finalmente, afigura-se-me que o conteúdo das exposições do arguido não justificaria a pena aplicada.

Nelas o queixoso pretende, fundamentalmente, contestar a promoção do funcionário ...

E também não parece que as afirmações a respeito daquele funcionário —aliás mais alusões ou sugestões do que propriamente afirmações — possam ter-se como actos antidisciplinares.

d) Pelo exposto, e ao abrigo do artigo 18." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, entendo dever formular a V. Ex." a seguinte recomendação:

Que em futuros processos disciplinares se não actue como se actuou no presente no tocante à concessão da confiança do processo e à audição de testemunhas;

Que, quanto ao processo em apreço, e não obstante pender já recurso no Supremo Tribunal Administrativo, tendo em atenção a não audição das testemunhas indicadas e a irrelevância disciplinar dos documentos que basearam a acusação, se revogue a punição aplicada.

4 — A Casa Pia respondeu que em futuros processos disciplinares iria ter em conta a recomendação do Provedor.

Quanto ao caso concreto, afirmou ir aguardar a decisão do Supremo Tribunal Administrativo, para o qual o interessado, entretanto, recorrera.

5 — Posto o problema ao Ministro dos Assuntos Sociais, como entidade tutelar da Casa Pia, ele assumiu posição idêntica à desta, acrescentando que «de facto constam do processo os factos imputados ao arguido, tendo as testemunhas sido ouvidas».

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II SÉRIE — NÚMERO 68

Perante esta segunda recusa, restou ao Provedor encerrar o processo, não sem que antes houvesse feito reparo ao Ministro dos Assuntos Sociais, referindo que:

O Provedor .não discutira a realidade dos factos (as aludidas exposições) imputados ao arguido, mas sim o — no seu entender, excessivo — relevo disciplinar que lhes fora atribuído;

Era patente, pela leitura dos autos, que não haviam sido ouvidas todas as testemunhas oferecidas pelo interessado.

Processo n.1 81/R-1449-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Exercício de

funções por aposentado. Objecto — Termo da situação irregular criada pela

admissão de funcionário aposentado não precedida

de autorização prévia e do visto do Tribunal de

Contas.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação e

reparo. Síntese:

1 — Um engenheiro civil apresentou queixa ao Provedor de Justiça sobre a sua reclassificação no Gabinete de Apoio Técnico da Lousã, tendo referido, por contraposição à sua situação, a de um engenheiro já desligado do serviço para aposentação a exercer, em regime de acumulação, funções de director no mesmo organismo.

2 — À reclassificação do queixoso fora recusado visto pelo Tribunal de Contas, pelo que o Provedor entendeu não lhe caber discuti-la.

Mas considerou-se pertinente apreciar a questão da alegada situação irregular referida pelo reclamante.

3 — Ouvido sobre o assunto, o presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro veio reconhecer, implícitamente, que a situação do funcionário mencionado na queixa era irregular,, visto que não existia autorização do Conselho de Ministros para o exercício de funções no referido Gabinete, autorização essa necessária pelo facto de o mesmo se encontrar desligado do serviço para efeitos de aposentação (artigo 78.° do Estatuto da Aposentação).

4 — O exercício de funções em causa requeria, por outro lado. que o despacho que o houvesse autorizado, enquanto acto gerador de despesas, tivesse sido visado pelo Tribunal de Contas [alínea g) do n.° 1 do artigo 1° do Decreto-Lei n." 146-C/80. de 22 de Maio].

5 — A falta do visto, por seu lado (no caso de não ler sido reconhecida a urgente conveniência de serviço pelo membro do Governo competente), implicava a inexequibilidade e ineficácia do diploma ou despacho sujeito ao visto (artigo 3." do Decreto-Lei n." 146-C/80).

6 — Tendo-se ponderado estas razões ao presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro, o mesmo informou que estava em preparação diploma legal tendente a regularizar situações como a visada neste processo.

7—Em vista disso, o Provedor considerou dever fazer reparo acerca da situação ilegal em que se encontrava o director do Gabinete de Apoio Técnico da Lousã, recomendando que não lhe fossem pagas

quaisquer remunerações relativas a tal cargo enquanto esse tipo de situação não fosse, eventualmente, sanado por diploma legal.

Processo n.' 80/R-590-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Faltas.

Objecto — Redução de remuneração e marcação de faltas injustificadas a docente do ensino superior, por alegado incumprimento de contrato.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Situação regularizada nessa medida.

Síntese:

) — O reclamante celebrara contrato com a Escola Superior de Belas-Artes do Porto, contrato pelo qual se obrigara a leccionar (nos termos do artigo 92." do Decreto-Lei n." 41 663. de 11 de Novembro de 1957) no ano lectivo de 1978-1979 a disciplina de Sociologia do 1." ano. em regime de tempo integral — 12 horas semanais.

Devido a erro de estimativa da Escola, as turmas de Sociologia do I." ano só acabaram por preencher um horário de 6 horas. Por essa razão, a Escola solicitara que o docente se encarregasse também de leccionar 6 horas semanais de Psicologia.

2 — Porque o inleressado não aceitara esta solução, o conselho directivo da Escola Superior de Belas--Artes do Porto decidiu em 5 de Maio de 1979 reduzir-lhe o vencimento para metade e considerar injustificadas as faltas dadas à disciplina de Psicologia.

3 — Em Novembro de 1979 o docente voltou, mediante novo contrato, a ensinar e a ser remunerado em regime de tempo integral. Mas, não conformado com a redução temporária de vencimentos nem com a injustificação das faltas, apresentou queixa ao Provedor de Justiça.

4 — Posta a questão à Secretaria de Estado do Ensino Superior, esta foi de parecer que fora ilegal a decisão tomada quanto às faltas, mas que estaria correcta a remuneração apenas por metade do período em questão.

5 — Estudado o assunto, pareceu que, do ponto de vista estritamente formal, o queixoso não poderia de facto sofrer, em relação às 6 horas dc docência de Psicologia, uma marcação de faltas injustificadas nem redução de remunerações.

E isso porque o contrato que celebrara dizia unicamente respeito ao ensino da disciplina de Sociologia.

Mas também se afigurou que, para que o interessado tivesse legitimidade moral para reclamar o pagamento correspondente à prestação das 12 horas de serviço semanal a que se obrigara, importaria comprovar que, em relação às 6 horas semanais excedentes do período de leccionação efectiva de Sociologia, ele sc colocara à disposição da Escola para realização de quaisquer outras tarefas docentes (investigação, apoio de alunos, etc.) relativas à mesma disciplina.

Não se provou, contudo, que assim tivesse succ-. dido.

Ao invés, a Escola afirmava mesmo que o docente teria, primeiro, aceite ensinar também Psicología e que só acabou por o recusar na medida em que, entretanto, conseguira outra ocupação docente suplementar numa instituição particular.

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Deste modo, pareceu equilibrada a posição assumida pela Secretaria de Estado do Ensino Superior, qi:e levara, de qualquer modo, à revogação da sanção, sem dúvida gravosa, da marcação de faltas injustificadas.

Processo n.° 81/IP-60-B-1

Sumário ■—Traba ho. Função pública. Faltas. Antiguidade.

Objecto — Desconto das faltas por doença na contagem de tempo de serviço. Decisão — Recomendação acatada. Síntese:

l— Foram apresentadas ao Provedor de Justiça numerosas reclamações contra a consideração, em conjunto com o período de férias, das faltas, devidamente justificadas por doença, no conjunto dos 30 dias a que se refere a alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72, de 18 de Março, e consequente desconto na antiguidade na função pública.

Assim, de acordo com esta interpretação, sustentada pelas Direcções-Gerais da Função Pública e da Contabilidade Pública e generalizadamente aplicada pela Administração, o período de 30 dias de faltas que não deviam descontar-se na antiguidade, ficaria, desde logo, preenchido pela licença para férias, se gozada na integralidade.

E qualquer falta por doença que, conquanto justificada por atestado médico, fosse dada, acrescendo aos 30 dias de férias, deveria desde logo descontar para efeitos de antiguidade.

2 — já num dos processos em questão o Provedor defendera, nos termos seguintes, a opinião segundo a qual pelo menos os primeiros 30 dias de faltas justificadas por doença, para além dos 30 dias de licença para férias, não deveriam descontar na antiguidade:

Em vários processos pendentes neste Serviço se tem posto o problema da contagem ou não, para efeitos de antiguidade, das faltas justificadas dadas em cada ano por trabalhadores da função pública, para além da licença para férias a que tenham direito.

Trata-se, designadamente, do caso de trabalhadores que, depois de terem gozado já integralmente as respectivas férias, dão ainda faltas justificadas, umas mediante participação, outras através da apresentação de atestado médico.

À primeira vista, pareceria que a licença para férias não deveria, a partir do Decreto-Lei n.° 49 031, de 27 de Maio de 1969, ser considerada no âmbito da alínea b) do n.° 1 do artigo 1." do Decreto-Lei n.u 90/72, de 18 de Março. De facto, as férias passaram, depois daquele citado diploma, a ser consideradas, não como um conjunto de faltas justificadas, mas sim como constituindo objecto de um direito dos trabalhadores da função pública.

Contudo, a excepção, expressamente mencionada na parte final dessa alínea b), à licença para férias acumulada faz crer que o legislador terá querido abranger as férias, para efeitos do

Decreto-Lei n.u 90/72, na noção de «faltas justificadas, incluindo as correspondentes a licenças».

Mesmo sendo assim, porém, afigura-se que o problema pode continuar a pôr-se, pelo menos, quanto às faltas justificadas por atestado médico que, dadas para além da licença para férias a que se tenha direito, todavia, não ultrapassem o total de 30.

De facto, a alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72 exceptua do desconto na antiguidade as faltas justificadas que não dêem lugar a perda de direitos ou regalias.

Ora, segundo o § 4.° do artigo 8." do Decreto com força de lei n.° 19 478, os primeiros 30 dias de faltas por doença não produzem qualquer desconto no vencimento, mesmo de exercício.

Por outro lado, e agora nos termos do artigo 6.°, n.u 2, alínea c), do Decreto-Lei n.° 49 031, tais faltas não implicam qualquer redução na licença para férias do ano seguinte.

Solicito, pois, indicação da posição dessa Direc-ção-Geral sobre se é legal ou não o desconto na antiguidade dos trabalhadores da função pública das faltas justificadas mediante participação ou por atestado médico (neste caso até ao limite de 30).

A ser considerado legal o desconto em causa, ainda conviria que esse departamento se pronun-oiasse sobre se entende ou não justa uma revisão do regime vigente.

3 — Visto a Administração não ter aceite este ponto de vista, o Provedor recomendou ao Secretário de Estado da Administração Pública, em 15 de Janeiro de 1979, que fosse preparado diploma legislativo que explicitasse que as faltas justificadas por doença, pelo menos até 30 dias, não descontariam na antiguidade do funcionalismo público.

O Secretário de Estado respondeu em Fevereiro seguinte que no projecto de diploma legal sobre faltas, férias e licenças fora introduzida norma no sentido recomendado pelo Provedor, acrescentando que na mesma se esclarecia igualmente que não provocariam desconto na antiguidade, nem a licença para férias, nem as faltas dadas ao longo do ano por conta destas.

4 — A verdade, porém, é que até ao termo de 1982 não foi publicado o diploma em questão.

5 — Entretanto, o Provedor decidira retomar de novo o problema em termos de interpretação da lei já vigente sobre o assunto.

De facto, e a propósito de divergências de interpretação surgidas no Ministério da Educação e das Universidades, a Procuradoria-Geral da República emitira em 23 de Outubro de 1980 o° seu parecer n.° 83/80, em que concluíra:

Nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.u 90/72, de 18 de Março, não são de descontar na antiguidade do funcionário:

a) As faltas justificadas por doença que não

excedam 30 dias em cada ano;

b) Os dias em que estiver ausente no exer-

cício do seu direito a férias e as faltas a imputar nestas, que lhe forem justificadas ao abrigo do artigo 4° do Decreto n.° 19 478, de 18 de Março de 1931.

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II SÉRIE — NÚMERO 68

6 — Este parecer, cuja conclusão e fundamentação essencial coincidiam com a tomada de posição do Provedor referida no n.° 2, veio a ser homologado pelo Ministro da Educação e das Universidades em 24 de Novembro de 1980.

7 — Posteriormente, porém, e sob parecer da Direcção-Geral de Pessoal do Ministério, o mesmo responsável governamental revogou essa homologação, por despacho de 19 de Janeiro de 1981.

8 — Tendo em conta a situação assim criada, geradora de inegável insegurança jurídica, e não podendo concordar com a motivação do parecer da Direcçãc--Geral de Pessoal que suscitara o despacho revogatório da aludida homologação, o Provedor considerou oportuno dirigir ao Primeiro-Ministro recomendação, cuja parte essencial se transcreve:

1 — O Decreto-Lei n." 90/72, de 18 de Março, conforme expressamente refere o seu preâmbulo, porque «tem suscitado dúvidas de execução no que respeita às alíneas b) e c) do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 348/70, de 27 de Julho», destina-se a «uniformizar a aplicação de tais preceitos, de harmonia com a intenção que presidiu ao enunciado das respectivas normas».

2 — Desde modo, por expressa disposição do seu preâmbulo, o n.° 1 do artigo 1.° do Decreto--Lei n.° 90/72 destina-se a traduzir o espírito («a intenção») dos preceitos legais contidos nas alíneas b) e c) do n.° 2 do atrigo 1.° do Decreto--Lei n.° 348/70.

3 — Determina o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 348/70, cujas dúvidas de execução o Decreto--Lei n.° 90/72 vem esclarecer, de harmonia, não com a sua letra, mas com a intenção que presidiu ao enunciado das respectivas normas:

Artigo 1.°— 1 —..............................

2 — As listas de antiguidade ordenarão o pessoal pelas diversas categorias e classes e, dentro delas, segundo a respectiva antiguidade, devendo ainda conter as seguintes indicações:

b) Número de dias descontados nos termos do § 1.° do artigo 26." do Decreto n.° 19 478.

Pela interpretação rigorosa da letra da supra-transcrita alínea b), e nos termos do § 1.° do artigo 26.° do Decreto n.° 19 478, ser-se-á levado a concluir que por aquela disposição serão des contadas na antiguidade todas as faltas justificadas excedentes a 30 em cada ano civil, com única exclusão das que forem dadas por motivo de nojo e por licença acumulada nos termos do § 4.° do artigo 12.°

Não podendo restar dúvidas de que os 30 dias que podiam ser autorizados para gozo da chamada «licença graciosa» (Decreto n.° 19 478, de 18 de Março de 1931) estão, por força daquele decreto, incluídos no cômputo de faltas justificadas (v. § 1.° do artigo 26.° e § 4.° do artigo 12.° daquele diploma, bem como o despacho da Presidência do Conselho de Ministros de 4 de Setembro de 1931, publicado no Diário do Governo, n.° 208, de 9 de Setembro de 1931, e. aliás, citado no parecer da Direcção-Geral de

Pessoal do MEC de 29 de Dezembro de 1980, que veio a determinar a revogação pelo Ministro da Educação da homologação ministerial do parecer da Procuradoria Geral da República já citado), evidente se torna que o § 1.° do artigo 26.° do Decreto n." 19 478 inclui no cômputo dos 30 dias de faltas justificadas, a não serem descontadas na antiguidade para efeitos de promoção à classe superior, os dias de licença graciosa e todas e quaisquer outras faltas justificadas (excepto as expressamente nele excepcionadas) que o funcionário tenha dado em cada ano civil.

Seria este o regime que a alínea b) do artigo 1.", ii." 2, do Decreto-Lei n.° 348/70 tinha por intenção impor, conforme parece resultar da sua letra?

4 — Anteriormente à publicação do Decreto--Lei n.° 348/70, de 27 de julho, tinha sido publicado o Decreto-Lei n.° 49 031, de 27 de Maio de 1969.

Por força do seu artigo 6.°, «os funcionários com mais de um ano de serviço efectivo [...] passam a ter direito a gozar 30 dias de licença para férias em cada ano [...]», dispondo ainda o n.u 4 do mesmo artigo que «a licença para férias substitui a licença graciosa, adaptando-se-lhe o regime desta em tudo o que não seja incompatível com a sua natureza».

As ausências dadas ao serviço, assim, no gozo da licença para férias deixam de ser faltas autorizadas e, como tal, carecidas de justificação. São ausências ocorridas no uso de um direito dos funcionários. Daí não poderem ser daqueles dias descontadas as faltas justificadas por doença até 30 dias, por efeito do Decreto-Lei n.° 49 031, e actualmente (Decreto-Lei n.° 544/75, de 29 de Setembro, mantido em vigor pelo Decreto-Lei n." 184/76, de 11 de Março), mesmo excedendo esses 30 dias.

Por outro lado, o artigo 10." do Decreto-Lei n.° 49 031 vem admitir que, além do direito de faltar por nojo — já sancionado pelo Decreto n.u 19 478— «os funcionários têm direito de faltar por motivo do seu casamento [...]», especificando no seu artigo 11." ainda que ambos aqueles tipos de faltas justificadas «não dão lugar a perda de quaisquer direitos ou regalias».

Diferentemente do que estabelece o artigo 6.° para a licença para férias, que considera um direito sem necessidade de qualquer justificação à qual fique condicionado, o Decreto-Lei n.° 49 031 sujeita o exercício do direito a faltas por motivos de nojo (artigo 9.°) ou casamento (artigo 10.°) à necessidade de justificação, incluindo as ausências ao serviço por aqueles motivos no grupo das faltas justificadas (artigo 11.°), e, porque no Decreto n." 19 478 só se fazia referência às faltas justificadas por nojo, sente a necessidade de especificar que agora ambos esses tipos de faltas, quando justificadas por nojo (artigo 9.°) ou casamento (artigo 10.°), não originam a perda de «quaisquer direitos ou regalias», não sendo, pois, de computar no período de 30 dias de faltas sem relevância para efeitos de antiguidade.

5 — Da aplicação da alínea b) do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 348/70, na interpretação rígida da sua letra, resultaria o absurdo de essa disposição ignorar ou revogar os preceitos

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acima referidos (artigo 6.°, quanto à licença para férias, e artigos 10." e 11.°, quanto às faltas justificadas por casamento) do Decreto-Lei n.° 49 031.

E, assim, por força da alínea b) do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 348/70, teríamos que só não seriam descontadas na antiguidade as faltas justificadas por casamento e as dadas no período de maternidade, e ainda que se continuaria a aplicar à licença para férias o significado e regime da licença graciosa.

6 —Daí o Decreto-Lei n.° 90/72, de 18 de Março, vir explicitar o preceito daquela alínea b) do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 348/70, não de harmonia com a sua letra, mas com a intenção que presidiu ao enunciado das respectivas normas.

7 — F. qual não pode deixar de ser aquela intenção, isto é, o espírito da lei?

A de interpretar o § 1." do artigo 26.° do Decreto n.° 19 478 no sentido que resulta das novas disposições do Decreto-Lei n.° 49 031.

E, assim, quando a alínea b) do n.° 1 do artigo 1." do Decreto-Lei n.° 90/72 fala em «faltas justificadas», não pode considerar-se que nas mesmas inclua as ausências por exercício do direito de gozo de licença para férias, que, por força do Decreto-Lei n.° 49 031, deixaram de ser faltas carecidas de justificação; quando refere «faltas justificadas, incluindo as correspondentes a licenças», não pode deixar de reportar-se às licenças cujo gozo determine faltas carecidas de justificação (licença por doença, por exemplo) e, quando excepciona as faltas justificadas que, «segundo a lei, não dêem lugar a perda de direitos ou regalias», não pode deixar de se referir às faltas justificadas por nojo, casamento, maternidade ou outras relativamente às quais a lei consagre o mesmo regime.

E verifica-se, assim, como esta . argumentação — que se afigura correcta e a única possível — destrói a usada no parecer da Direcção-Geral de Pessoal do MEC, quando contadiz as conclusões da Procuradoria-Geral da República.

Se naquele parecer (n.° 3.1.2, p. 43) se reconhece expressamente que «a licença para férias já não pode considerar-se sucessão de faltas justificadas», como pode logo a seguir admitir-se que na alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72, quando se referem a «faltas justificadas», se incluam os dias no gozo de licença para férias?

Aliás, toda a restante argumentação (n." 3.1.3 e 3.1.4) assenta na incongruência de, por um lado, se reconhecer que o gozo da licença para férias «já não pode considerar-se sucessão de faltas justificadas», mas, por outro, se continuar a considerar os dias correspondentes como uma sucessão de faltas justificadas e, portanto, incluídas naquelas a que se refere a alínea b) do n.u 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72.

8 — Poder-se-á perguntar como cabe na interpretação, que se defende, da alínea b) do n.° 1 do atigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72, a inclusão nas excepções referidas naquele preceito «das faltas que correspondam a licenças para férias acumuladas».

Afigura-se-me que aquela referência, ao contrário de se opor à interpretação que se defende, é factor que vem em sua ajuda.

Com efeito, se as ausências em gozo de licença para férias tivessem de ser incluídas no cômputo dos 30 dias de faltas justificadas para além dos quais elas começam a ser descontadas na antiguidade, por que razão se excluiriam daquele cômputo só porque não tinham sido gozadas no ano a que diziam respeito?

O que me parece é que o legislador entendeu que, tendo o funcionário direito a gozar 30 dias de licença para férias, não se podendo assim considerar aquelas ausências como faltas justificadas (pois não carecem de qualquer justificação), entendeu que, por óbvio, não teria sequer de fazer alusão às mesmas. Considerou, porém, que, quando esse gozo excedesse os 30 dias em que em cada ano o funcionário tinha direito a ausentar-se para gozá-las, seria conveniente explicitar (não se esqueça que esse é o verdadeiro objectivo do Decreto-Lei n.° 90/72) que aqueles dias excedentes, porque no gozo de licença para férias (embora para além dos 30 dias a que naquele ano o funcionário tinha direito), não são incluídos no cômputo dos 30 dias de faltas justificadas, para além do qual as mesmas passam a descontar na antiguidade.

9 — Aliás, só assim se compreende a revogação do artigo 26.° do Decreto n.° 19 478, expressamente determinada pelo artigo 5.° do Decreto--Lei n.° 90/72.

Se por aquele diploma se quisesse manter integral o § 1.° daquele artigo, no sentido que lhe foi dado na altura da sua publicação, só no mesmo se querendo integrar as excepções posteriormente pela lei estipuladas (faltas justificadas por casamento e maternidade), o que teria passado a fazer-se mediante os termos da alínea b) do n.° 1 do seu artigo 1.°, ao explicitar «[...] com excepção das que, segundo a lei, não dêem lugar a perda de direitos e regalias [...]», para que necessitava o Decreto-Lei n.° 90/72 de revogar todo o artigo 26.° do Decreto n." 19 478?

Isto só se entende e justifica, dentro do objectivo expresso do Decreto-Lei n.° 90/72, se se aceitar que o que o legislador pretendeu foi também revogar o regime anterior da licença graciosa estabelecido nos restantes normativos daquele artigo 26.° (em que o gozo daquela licença consistia num conjunto de faltas justificadas), passando a vigorar o regime da licença para férias do Decreto-Lei n.° 49 031, que é um direito do funcionário, não carecendo o seu gozo de justificação.

Deste modo, pelas razões invocadas no parecer emitido neste Serviço e pelos motivos alegados no parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, com cuja doutrina igualmente concordo, sou levado a optar pelas conclusões a que aqueles pareceres chegam, já porque se me afiguram as consentâneas com a lei, já porque elas se mostram conducentes a uma situação mais justa para os funcionários doentes.

Chamo ainda a atenção para que as razões expostas no parecer da Direcção-Geral de Pessoal

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do MEC, que apoiaram o despacho ministerial revogatório da homologação ministerial que tinha sido dada ao parecer da Procuadoria-Geral da República, não se me afiguram válidas.

Com efeito, já em 1978 a Direcção-Geral da Contabilidade Pública, reconhecendo embora a necessidade de revisão do sistema adoptado relativamente aos reflexos na antiguidade dos trabalhadores da função pública das faltas por doença não excedentes a 30 dias em cada ano, além das de licença para férias, referia que na Direcção--Geral da Função Pública estava a ser elaborado, ao abrigo da autorização constante da Lei n.° 42/ 78, de 6 de Julho, um projecto de diploma sobre férias, faltas e licenças na função pública; e também em 1978 a Direcção-Geral da Função Pública informava que, «quanto à necessidade de alteração do quadro legal em que se insere a problemática em apreço, cabe-nos adiantar que esta Direcção-Geral está sensibilizada para o efeito, existindo já um grupo de trabalho encarregado da elaboração do projecto do novo regime de faltas e licenças na função pública».

Juntam-se fotocópias dos ofícios da Direcção-Geral da Contabilidade Pública e da Direcção--Geral da Função Pública em que se dão as referidas informações.

Ora, o certo é que caducou já a autorização legislativa que, pela Lei n.° 42/78, de 6 de Junho, tinha sido concedida pela Assembleia da República ao Governo paa legislar sobre a matéria; caducou também outra lei (n.° 14/80, de 27 de )unho), em que idêntica autorização foi dada, e até à data não foi publicado o tal diploma legal enunciado pela Direcção-Geral da Função Pública já em 1978.

E, no entanto, à sombra de uma interpretação da alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 90/72, de 18 de Março, que considero, tal como a Procuradoria-Geral da República, inadequada e extremamente injusta, vêm sendo em todos estes anos prejudicados trabalhadores da função pública, quer profissional, quer economicamente.

Não considero, aliás, pelas razões expostas, que careça de aguardar-se a publicação de um regime legal geral sobre faltas e licenças ou sequer de um diploma a estabelecer o regime que defendo em relação à alínea 6) do n.° 1 do artigo 1." do Decreto-Lei n.° 90/72.

Há, simplesmente, segundo julgo, que reconhe-. cer como inadequada e injusta a interpretação que lhe foi dada pela antiga Direcção de Serviços da Reforma Administrativa, em 22 de Março de 1972, e que continuou a ser regularmente adoptada pelos serviços.

Recomendação

Nestes termos, e por. tudo o exposto, tenho a honra de recomendar a V. Ex.°, no uso da competência que a lei me atribui, que, ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 40.° da Lei n.° 38/78, de 5 de Julho, se digne homologar, para valer como interpretação oficial perante todos os serviços públicos, o parecer de 23 de Outubro de

1980 do Conselho Consultivo da Procuradoria--Geral da República, determinando a sua posterior publicação no Diário da República, ou, se se considerar preferível, que V. Ex.a se digne solicitar o parecer da Procuradoria-Geral da República sobre a questão.

9 — O Primeiro-Ministro não chegou a pronunciar-se sobre esta recomendação.

Mas o processo foi encerrado quando se teve conhecimento de que no projecto de diploma em preparação sobre faltas, férias e licenças se incluíra preceito consagrando legislativamente a solução preconizada pelo Provedor.

Processo n.° 81/R-2023-B-1

Sumário — Trabalho. Função pública. Faltas. Confirmação de doença.

Objecto — Marcação de faltas a funcionária cujo estado de doença não pôde ser verificado pelo delegado de saúde, em virtude de avaria das campainhas e telefones internos do prédio onde residia. Interpretação do § 2.° do artigo 8.° do Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1931.

Decisão — Reclamação procedente. Participação do caso ao representante do Ministério Público junto da 1.a Secção do Supremo Tribunal Administrativo.

Síntese:

1 — Uma funcionária da Direcção-Geral da Contabilidade Pública dirigiu ao Provedor de Justiça uma exposição em que se queixava da injustificação de 12 faltas por doença (em virtude de não ter sido possível verificar o seu estado de doença pelo competente delegado de saúde, por na altura estarem avariadas as campainhas e telefones internos do prédio onde residia, conforme declaração feita pela empresa incumbida da administração do imóvel).

O pedido inicial de justificação das faltas com base naquele motivo foi indeferido por despacho de 28 de Agosto de 1981 do subdirector-geral da Contabilidade Pública. Posteriormente, novos pedidos de justificação daquelas faltas pela reclamante foram indeferidos por despacho do director-geral da Contabilidade Pública de 26 de Outubro de 1981 e despacho do Secretário do Estado do Orçamento de 29 de Dezembro de 1981; em 14 de Maio de 19982, o Secretário de Estado do Orçamento exarou novo despacho confirmativo do anterior, não tendo atendido o pedido de reconsideração dessa decisão feito pelo Serviço do Provedor de Justiça, tendo em atenção a doutrina constante do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 1.a Secção, de 11 de Fevereiro de 1966.

Os citados despachos de indeferimento baseiam-se na interpretação que, a nível da Secretaria de Estado do Orçamento, é dada ao § 2.° do artigo 8.° do Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Maio de 1931, segundo a qual a presunção de inexistência de doença prevista naquele preceito revestiria a natureza de «presunção júris et de jure». Tal interpretação estaria homologada por despacho interpretativo do Subsecretário de Estado das Finanças de 19 de Abril de 1940, constante da circular da Contabilidade Pública n.° 40, série B, de 29 do mesmo mês e ano.

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2 — Analisada a questão, entendeu-se que a posição assumida pelo Secretário de Estado do Orçamento e serviços do mesmo dependentes não exprimiria a forma mais correcta de interpretar o disposto no § 2." do artigo 8.° do Decreto com força de lei n." 19 478. já que a presunção de inexistência de doença nele estabelecida seria qualificável apenas como presunção júris íantum. susceptível de ser elidida por prova em contrário, o que a interessada fez na situação em apreciação. Esta posição é também defendida nos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de Março de 1937 (Colecção.... vol. 111. p. 89) e de 11 de Fevereiro de 1966 (Colecção .... vol. 52. pp. 467-471), referindo-se expressamente neste último que «a parte final do § 2° do artigo 8." do Decreto n.° 19 478 não impõe ao funcionário a obrigação de permanecer em caso. limitando-se a estabelecer uma presunção a avaliar segundo as circunstâncias». Na situação em análise ainda relevaria o facto de não se tratar propriamente de ausência do domicílio de funcionário efectivamente doente na altura em que ocorreu a visita, mas antes de uma impossibilidade material dc atendimento do médico por facto não imputável ao funcionário doente (avaria das campainhas e telefones do prédio comprovada por terceira entidade).

A Direcção-Geral da Função Pública, que também foi ouvida sobre o caso. defendia interpretação idêntica, o que colocava o problema adicional de desigualdade de tratamento, quanto a esta matéria, do pessoal afecto à Secretaria de Estado do Orçamento, já que diferente doutrina estaria a ser aplicada pelos restantes ministérios.

3 — A situação objecto da reclamação foi comunicada ao representante do Ministério Público junto da 1.° Secção do Supremo Tribunal Administrativo, para efeitos de eventual interposição de recurso oficioso do despacho do Secretário de Estado do Orçamento de 29 de Dezembro dc 1981, nos termos dos artigos 46.", n." 2.°. e 51.". n." 4.", do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo, em virtude de a interessada já não poder interpor recurso contencioso e de terem resultado infrutíferas ate então as diligências feitas no sentido da reconsideração daquele despacho.

|á depois de interposto o recurso oficioso, o Secretário de Estado do Orçamento acabou por concordar com a posição que fora defendida pelo Provedor, revogando o seu despacho anterior, contra o qual a queixosa reclamara.

Processo n.r 77/R-1097-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Habilitações.

Objecto— Ilegalidade do n." 3 da Portaria n." 255/77. de 12 de Maio.

Decisão— Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

I — Um sindicato representativo dos enfermeiros apresentou queixa em 1977 pelo facto de a Portaria n." 255/77, de 12 de Maio, ao organizar os quadros do pessoal de enfermagem das Direcções-Gcrais dos Serviços Prisionais e Tutelares de Menores, ter atri-

buído a categoria de auxiliar de enfermagem a pessoal dc enfermagem que não possuía as devidas habilitações legais.

2 — Estudado o assunto, verificou-se que o teor do preceito discutido deveria ter resultado de uma interpretação discrepante dada pelos serviços do Ministério da Justiça à posição assumida pela Direcção-Geral da Função Pública sobre o assunto.

De facto, esta Direcção-Geral, ao pronunciar-se sobre o projecto de reorganização dos quadros em causa, admitira a colocação como auxiliares de enfermagem dos que nessa altura possuíssem as categorias de auxiliares de enfermagem de 1.a e 2.a classes, no pressuposto de que seriam titulares da correspondente habilitação legal.

Por isso, o Provedor dirigiu ao Ministro da lustiça uma recomendação nos seguintes lermos:

Tal como está, o n.u 3 da Portaria n." 255/77, de 12 de Maio, viola preceitos legais vigentes: o artigo 10." do Decreto-Lei n." 32 612. de 31 de Dezembro de 1945. que determinou que «a partir de 1 de (aneiro de 1944 será proibido o exercício público da profissão de enfermagem a quem não esteja munido de diploma [...]». sendo tal diploma passado- pelas escolas de enfermagem, que habilitam para o exercício da profissão de enfermeiro e de auxiliar de enfermagem, nos termos do artigo 7." do Deoreto-Lei n." 38 884, de 28 de Agosto de 1952.

Compreende-se que um diploma de reorganização do Ministério da Justiça, como o foi o Decreto-Lei n." 523/72. não podia (nem o fez) con-trapor-se ao que genericamente, e por motivos de interesse público, estabeleciam os diplomas respeitantes ao exercício da profissão de enfermagem.

Este diploma limitou-se a permitir que, no caso de não haver enfermeiros, as funções que a esies competiam fossem desempenhadas — inclusivamente mediante preenchimento dos respectivos lugares, o que, contudo, não confere, sem mais, a respectiva categoria aos neles providos— por duas categorias de trabalhadores: auxiliares de enfermagem ou ajudantes de enfermaria, conforme fossem ou não habilitados com o respectivo curso. Não havia, portanto, direitos adquiridos a ressalvar, e a Portaria n.° 255/77 é que inovou, ofendendo os preceitos legais antecedentes e normas de habilitação profissional que parecem indiscutíveis.

Se havia, como parece depreender-sc, algumas situações ilegais, devia ter-se aproveitado para fazer a reestruturação da carreira de enfermagem, no âmbito do Ministério da lustiça. em concordância com as disposições legais vigentes, e não contrariando-as. Assim, o referido diploma devia ter sido alterado nos termos propostos pela Direcção-Geral da Função Pública, podendo explicitar-se, como parecia necessário, que o pessoal sem as habilitações adequadas se manteria com o mesmo vencimento e na respectiva categoria, extinguindo-se os correspondentes lugares à medida que vagassem.

Uma vez que se manteve a portaria tal como estava e que. à sua luz, foi publicada a respectiva

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lista nominativa, importa analisar a situação face aos direitos adquiridos pelos agentes nomeados.

Ê doutrina assente (cf. Acórdãos Doutrinais, n.° 110, p. 202) que o legislador pode modificar o estatuto legal do funcionário, incluindo a categoria, devendo, porém, respeitar os seus direitos subjectivos, entre os quais o de que à nova categoria corresponda o mesmo vencimento.

Assim, não se vê dificuldade na alteração da portaria, nos termos sugeridos pela Direcção-Geral da Função Pública, que, aliás, como se viu, imperativos legais impõem, acrescentando uma regra transitória segundo a qual os agentes nomeados ao abrigo da anterior disposição que não possuam as devidas habilitações legais passarão a ser designados ajudantes de enfermaria, mantendo-se o respectivo vencimento e categoria, com extinção dos respectivos lugares à medida que vagarem.

3 — Após múltiplas insistências, foi comunicado, em Setembro de 1982, que o Ministro da Justiça ordenou que fosse preparado um projecto de diploma de modo a que o problema seja resolvido nos mesmos termos do Decreto-Lei n.° 305/81, de 12 de Novembro, isto é, de se manterem nas categorias que possuem, mas «fora de carreira», os agentes que não tenham as devidas habilitações, uma vez que, face ao tempo decorrido, as situações constituídas ao abrigo da Portaria n.° 255/77 se consolidaram.

Processo n.° 81/R-2243-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Limites de idade.

Objecto — Ilegalidade dos limites de idade fixados na alínea d) do n.° 2 do Despacho Normativo n.° 345/ 80, de 28 de Outubro.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Um cidadão suscitou ao Provedor a questão da ilegalidade dos limites de idade estabelecidos no Despacho Normativo n.° 345/80, de 28 de Outubro, relativo à admissão de pessoal de apoio nos estabelecimentos oficiais de ensino.

2 — Analisado o assunto, considerou-se pertinente a queixa, tendo o Provedor feito a seguinte recomendação ao Ministro da Educação e das Universidades:

O Despacho Normativo n.° 345/80, de 28 de Outubro, estabelece limites de idade de 21 e 50 anos para indivíduos estranhos à função pública poderem concorrer às vagas de pessoal de apoio para os estabelecimentos oficiais de ensino.

ê certo que o Conselho da Revolução não con-/ siderou inconstitucionais os limites de 21 e 55 anos fixados no n.° 2 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 57/80, mas aquele diploma, ao fixar o limite máximo em 50 anos, parece ilegal. De facto, o Despacho n.° 345/80 (contrariamente ao que se terá verificado relativamente aos limites de 21 e 55 anos estabelecidos no Decreto-Lei n.° 57/80) não teria força legal para derrogar o Decreto-Lei n.° 232/76, de 2 de Abril, que revogou o limite geral de 35 anos constante do Decreto-Lei n.° 16 563, de 5 de Março de 1929.

Nestes termos, ao abrigo do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, considero de formular a seguinte recomendação:

Que seja revogada ou alterada a alínea a) do n.° 2 do Despacho Normativo n.° 345/ 80, na medida em que estabelece o limite de 50 anos para ingresso do pessoal de apoio das escolas, por estar ferida de ilegalidade, ao violar o Decreto-Lei n.° 232/ 76 e, afinal, o próprio n.° 2 do artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 57/80.

3 — A entidade visada comunicou concordar com a recomendação, tendo mandado elaborar um projecto de despacho que, substituindo o Despacho Normativo n.° 345/80, fixaria os limites de idade em causa de acordo com o Decreto-Lei n.° 57/80.

Processo n.° 80/R-933-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Primeiro provimento.

Objecto — Provimento na carreira técnica superior dos quadros únicos do Ministério da Agricultura e Pescas ao abrigo das regras estabelecidas no Despacho Normativo n.° 275/80, de 19 de Setembro (publicado no Diário da República, 1.a série, de 12 de Outubro de 1978).

Decisão — Recomendação parcialmente atendida.

Síntese:

1 — Um ex-contratado além do quadro, engenheiro técnico agrário de 2." classe, queixou-se por ter sido integrado nos quadros do Ministério da Agricultura e Pescas, em primeiro provimento, na mesma carreira e categoria, apesar de nessa data ser já licenciado em Economia e exercer funções correspondentes a técnico superior.

Segundo o reclamante, isso não teria sucedido se não fosse a restrição imposta pelo Despacho Normativo n.° 57-B/80, de 5 de Março, que considerava abusiva e discriminatória para os contratados além do quadro. De facto, esse diploma regulamentar impunha que a integração dos contratados além do quadro se fizesse em categoria igual ou equivalente à que já possuíssem, enquanto que as regras gerais aplicáveis ao restante pessoal permitiam, em certas condições, o provimento em categoria superior.

2 — Solicitados os esclarecimentos necessários, veio a concluir-se que o reclamante, à data do primeiro provimento, era já titular da licenciatura em Economia e se encontrava a exercer efectivamente funções de técnico superior de 2.a classe.

Por isso, ele deveria ter sido integrado, por força das regras de primeiro provimento estabelecidas no Despacho Normativo n.° 275/78, de 19 de Setembro (publicado no Diário da República, 1.a série, de 12 de Outubro de 1978), emitido ao abrigo e. nos termos do artigo 52.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.°*221/77, dc 28 de Maio, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 320/78, de 4 de Novembro, na categoria de técnico superior de 2.a classe da respectiva carreira, correspondente à licenciatura que possuía.

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Quanto ao Despacho Normativo n.° 75-B/80, con-cluiu-se que o mesmo deveria ser revogado, por ilegal, visto contrariar as regras de primeiro provimento estabelecidas no n.° 1 do artigo 52.° do Decreto-Lei n.° 221/ 77, as quais permitiam a integração em categoria superior à possuída se o funcionário fosse titular da necessária habilitação legal e estivesse já a exercer as correspondentes funções.

3 — Nestes termos, o Provedor de Justiça recomendou ao então Ministro da Agricultura e Pescas que:

a) Fosse revisto o primeiro provimento do recla-

mante na categoria de engenheiro técnico agrário de 2.° classe, processando-se antes a sua integração nos quadros do MAP na categoria de técnico superior de 2.a classe;

b) Fosse revogado, por ilegal, o Despacho Nor-

mativo n.° 75-B/80, com a consequente revisão das listas nominativas de primeiro provimento já eventualmente elaboradas ao seu abrigo, devendo ele ser substituído por diploma com as mesmas finalidades, mas respeitando as regras de primeiro provimento constantes do artigo 52." do Decreto-Lei n.° 221/77.

4 — O secretário-geral do Ministério da Agricultura e Pescas comunicou que o reclamante ia ser integrado nos quadros únicos do Ministério na categoria de técnico superior de 2.a classe, ao abrigo da regra estabelecida na alínea c) do n.° 1 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 180/80, de 3 de Junho, conjugada com o disposto no n.° 2 do artigo 2.° do mesmo diploma, na versão dada pelo Decreto-Lei n.° 288/80, de 16 de Agosto.

Aquele provimento veio a ser publicado no Diário cia República, 2.a série, de 7 de Abril de 1981.

5 — Quanto à revogação do Despacho Normativo n.° 75-B/80, o departamento visado informou que entendia não a dever realizar, por considerar legal tal diploma, acrescentando que «nenhum efeito prático poderia extrair-se de uma eventual revogação do diploma normativo em questão, uma vez que da sua aplicação resultaram actos constitutivos de direitos que se encontram sanados pelo decurso do tempo».

6 — Foi, assim, solucionada a situação do queixoso, de acordo com a recomendação feita.

Por isso, embora não concordasse com a opinião do MAP em relação à legalidade do Despacho Normativo n." 75-B/80, o Provedor decidiu encerrar o processo; de facto, da sua eventual revogação já não resultariam quaisquer efeitos práticos.

Processo n.° 79/R-1481-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Reclassificação.

Objecto — Recusa de reclassificação na categoria de terapeuta de 1.° classe, letra I.

Decisão—Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — Uma funcionária do Centro de Saúde Mental Infantil de Lisboa protestou por na reclassificação do pessoal lécnico-auxiliar da Direcção-Geral de Saúde

não lhe ter sido atribuída a categoria de terapeuta de I." classe, letra I, a que se achava com direito.

2 — A Direcção-Geral sustentou o bem fundado da sua posição, .referindo que o n.° 7.1 do despacho de 4 de Abril de 1978, regulador da reclassificação em causa, dispunha que seriam integrados na 2.° classe (como, efectivamente, o fora a queixosa) os profissionais com habilitação adequada e menos de 3 anos de exercício de funções técnicas.

3 — Não se julgou convincente esta argumentação, já que o n.° 7.2 do mesmo despacho estabelecia que seriam integrados como técnicos auxiliares de l.a classe os que, possuindo habilitação legal adequada, houvessem sido providos em lugares correspondentes ao grau 4 da extinta carreira de técnicos terapeutas regulada no Decreto-Lei n.° 414/71, de 27 de Setembro. Ora, no mapa i anexo a este diploma, o grau 4 era precisamente o de técnico terapeuta de 2." classe. E, segundo

0 processo, a queixosa já possuía esta categoria quando em 30 de Dezembro de 1977 fora publicado o Decreto Regulamentar n.° 87/77, que determinava a reclassificação em questão.

4 — A entidade visada retorquiu que mantinha a sua posição, pois não possuía qualquer prova de a funcionária ter sido provida em lugar do grau 4 antes da publicação do Decreto Regulamentar n.° 87/77.

5 — Contactado o Centro de Saúde Mental Infantil de Lisboa, obteve-se copia do diploma de provimento da queixosa como técnica terapeuta da fala de 2." classe cm 17 de Maio de 1977 (publicado no Diário da República, de 27 do mês seguinte), aliás um despacho do director-geral de Saúde.

6 — Face a este documento, a Direcção-Geral de Saúde reclassificou a interessada como terapeuta de

1 0 classe com efeitos desde 1 de Março de 1978.

Processo n.° 80/R-189-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Reclassificação. Objecto — Revisão da categoria de integração na função pública.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não

acatada. Síntese:

1 — Um engenheiro técnico agrário apresentou reclamação por não ter sido integrado nos serviços do Ministério da Agricultura e Pescas nas mesmas data e condições em que o foram todos os restantes trabalhadores que prestavam serviço na empresa agrícola a que pertencia e cujo pessoal transitou para o funcionalismo público em resultado de intervenção estadual.

Embora posteriormente o queixoso tenha sido contratado pelos serviços do Ministério da Agricultura e Pescas, ele não pôde, porque não estava ao serviço em 28 de Maio de 1977, beneficiar dos direitos que foram reconhecidos aos outros agentes, designadamente da reclassificação operada nos termos do Decreto-Lei n.° 221/77, dessa data.

2 — Ouvida a Secretaria-Geral do Ministério da Agricultura e Pescas, esta respondeu que o interessado não fora integrado nesse departamento em conjunto com os trabalhadores da empresa em causa porque ele não tinha o estatuto de empregado por conta de outrem, mas sim o de administrador.

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5 — A Direcção Regional de Agricultura do Algarve, por seu turno, precisou que à data da intervenção estadual o queixoso exercia funções de director agrícola, pelo que, juridicamente, era um trabalhador por conta da empresa.

4 — Posta de novo a questão à Secretaria-Ceral do Ministério da Agricultura e Pescas, com o apoio de documentação entretanto obtida, confirmativa da indicação dada pela Direcção Regional, aquela veio a reconhecer ter havido lapso na caracterização das funções do queixoso, o que levara inicialmente à sua não integração.

5 — O Provedor apresentou então ao Ministério da Agricultura e Pescas a seguinte recomendação:

Tendo em conta que, quer os serviços distritais do Ministério da Agricultura e Pescas (Direcção Regional de Agricultura do Algarve), quer a Secretaria-Geral reconhecem que só devido a lapso da Administração o reclamante não foi integrado em lulho de 1976, parece que deveria ler sido revisto o indeferimento do requerimento que apresentou no sentido de lhe ser reconhecida a categoria de engenheiro técnico de l.a classe, que teria se na altura devida tivesse sido integrado. Ê que o parecer que terá fundamentado o despacho será de considerar demasiado formalista nas suas conclusões ao afirmar, simplesmente, que, como ele reiniciou funções só posteriormente a Maio de 1977, não poderá ingressar no quadro e ser reclassificado com contagem de todo o tempo de serviço anterior, sem cuidar de se deter na motivação que tal determinou.

Assim, recomendo que seja revista a categoria profissional do queixoso, de modo a compensar, ainda que muito incompletamente, o erro que se reconhece ter sido cometido pelos serviços em 1976.

6 — Esta recomendação não veio a ser aceite, porque, entretanto, o reclamante fora integrado nos quadros do Ministério da Agricultura e Pescas através de diploma de primeiro provimento.

Sabido que o Tribunal de Contas entende que não é possível a revisão de provimentos efectuados- nesses lermos, restaria a hipótese de publicação de uma disposição legal específica, eventualidade que o Ministério da Agricultura e Pescas excluíra, porque ela se reportaria apenas a um caso individual.

Processo n.- 80/R-872-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Reclassificação.

Objecto — Aplicação à administração local do Deoreto--Lei n." 513-M 1/79. de 27 de Dezembro, sobre reclassificação das educadoras de infância.

Decisão — Reclamação procedente.

Síntese:

1 —Um grupo de educadoras de infância c auxiliares de educação reclamou pelo facto de os serviços de que dependiam não haverem procedido à sua reclassificação após a publicação do Decreto-Lei n." 513-MI / 79, de 27 de Dezembro.

2 — Estudado o assunto, pareceu que uma correcta interpretação da lei já deveria conduzir à aplicação àò educadoras de infância ao serviço de autarquias locais das categorias e remunerações constantes do referido diploma.

De facto, a carreira das educadoras de infância do Ministério da Educação, com as correspondentes remunerações, havia sido, como as da generalidade do pessoal docente, estabelecida pelo Decreto-Lei n." 290/ 75, de 14 de |unho.

E o Decreto-Lei n.u 466/79 viera dispor que a carreira das educadoras de infância ao serviço das autarquias locais seria a definida no Decreto-Lei n." 290/ 75.

Este último diploma fora revogado pelo Decreto-Lei ¡i" 513-M 1/79, que estabelecera em novos moldes a generalidade das remunerações do pessoal docente incluindo as educadoras de infância.

Afigurou-se, pois, que a remissão feita no Decreto-Lei n" 466/79, a propósito das educadoras de infância, para o Decreto-Lei n.° 290/75 se deveria, logicamente; entender como reportada, não sem concreto a este diploma, mas ao diploma que em cada momento regulasse a carreira e remunerações do pessoal docente em geral.

3 — O Provedor de Justiça assinalou ao Ministério da Administração Interna a injustiça que representava c tratamento discriminatório de que estavam a ser alvo as educadoras de infância ao serviço das autarquias locais, face aos outros docentes com a mesma categoria e habilitações a ensinar em estabelecimentos do Ministério da Educação e Cultura.

4 — O Ministério da Administração Interna concordou com esta posição, mas entendeu preferível, para melhor definição da situação, proceder à publicação de diploma legal específico, que veio a ser o Decreto-Lei n.u 14/82, de 20 de faneiro.

Processo n.° 80/R-758-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.

Objecto — Reposição ilegal de remunerações le professores ordenada pelo Despacho n." 35/80. do Secretário de Estado da Educação.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

I — As reclamantes concorreram a nível nacional para o concurso de professores profissionalizados não efectivos dos ensinos preparatório e secundário do ano de 1979-1980.

Foram colocadas, ao abrigo da alínea c) do n." 2 do artigo 2.u do Decreto-Lei n." 354/79. de 30 de Agosio, na Escola Preparatória de Fernão Mendes Pinto, na Trafaria, tendo começado a exercer funções no dia 17 de laneiro de 1980.

O artigo 16." do mesmo diploma reconhecia aos professores colocados nestas condições o direito a receber os vencimentos desde o dia 1 de Outubro dc 1979, c isso porque o atraso na colocação não era da responsabilidade deles. E, com efeito, tais remunerações foram pagas às interessadas em Fevereiro de 1980.

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Todavia, no dia 8 de Abril de 1980 foram informadas de que teriam de repor os vencimentos relativos ao período de 1 de Outubro até à data em que entraram em funções, por força do Despacho n/5 33/ 80, daquela mesma data, do Secretário de Estado da Educação.

Por esta razão apresentaram queixa ao Provedor.

2 — Estudado o assunto, ouviu-se o departamento visado, salientando-se que o despacho em questão parecia violar claramente o artigo 16.° do Decreto-Lei n." 354/79.

3 — Entretanto, o Secretário de Estado da Educação publicou ainda, em 19 de Agosto, o Despacho n ° 87/80, determinando que o período em causa, além de não remunerado, também não seria contado como tempo de serviço para efeito algum.

4 — Este Serviço continuou a insistir na ilegalidade da situação, agora agravada pelo referido novo despacho, também meramente regulamentar.

5 — Enfim, o processo veio a ser arquivado com base no Despacho do Secretário de Estado da Educação e Administração Escolar n.° 9/EAE/82, publicado no Diário da República, 2.a série, de 9 de Julho dc 1982, que revogou os Despachos n.os 33/80 e 87/80, considerando-os ilegais. •

Processo n." 80/R-1465-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.

Objecto — Pagamento dos meses de Julho, Agosto e Setembro a uma professora colocada ao abrigo do artigo l.u do Decreto-Lei n." 99/77, de 17 de Março.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — A reclamante, professora do ensino primário, foi colocada em Junho de 1977 na Delegação Escolar dc Vila Nova de Foz Côa, onde esteve a trabalhar até fins de Julho. Tal colocação tivera lugar ao r.brigo do artigo 1do Decreto-Lei n.° 99/77, de 17 de Março, uma vez que no ano anterior trabalhara durante todo o ano lectivo.

Porque não lhe foram pagos os vencimentos dos meses de Julho, Agosto e Setembro, ao contrário do que sucedera a colegas suas colocadas em delegações das Direcções dos Distritos Escolares de Coimbra e de Aveiro, a interessada pedira a intervenção do Provedor de Justiça.

2 — Ouvida sobre o assunto a Direcção do Distrito Escolar da Guarda, esta respondera que o não pagamento das remunerações em causa resultara da posição tomada pela 10.a Delegação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, que considerara que fora irregular a colocação por mero alvará dos professores nas condições da queixosa: este tipo de colocação só seria admissível para os professores a exercerem funções docentes, e não para os que estivessem a trabalhar nas direcções ou delegações escolares.

Aguardava, assim, a Direcção do Distrito Escolar da Guarda que o provimento da reclamante (e de outros professores em condições análogas) fosse efectuado nos termos que considerava legais.

3 — A posição assumida pela Direcção do Distrito Escolar pareceu inaceitável, dado que a reclamante fora colocada de acordo com o artigo 1." do Decreto--Lei n." 99/77.

O artigo 15." do mesmo diploma manda contar, para todos os efeitos legais, como ano de serviço completo o tempo de serviço prestado pelos docentes por ele abrangidos.

Não parecia, pois, contestável que a reclamante tivesse direito aos vencimentos de Julho, Agosto e Setembro.

0 n." 2 do Despacho n.° 52/77, publicado no Diário da República, 2.a série, de 21 de Abril de 1977, mandava que as direcções dos distritos escolares remetessem à Direcção-Geral de Pessoal as listas nominativas dos professores a quem houvessem sido ou estivessem a ser abonadas remunerações nos termos do artigo 1." do Decreto-Lei n.° 99/77.

Embora a reclamante tivesse sido colocada em Junho de 1977, deveria o seu nome constar da lista existente na Direcção-Geral de Pessoal para efeitos de abono de vencimentos.

Além disso, à contagem de certo tempo de serviço deve corresponder o pagamento da respectiva remuneração.

4 — Posto o assunto à Direcção-Geral de Pessoal, esta foi de parecer que as «colocações feitas para produzirem efeitos nos termos do Decreto-Lei n.° 99/77, de 17 de Março, para que possam considerar-se correctamente abonados os vencimentos pelo exercício de funções, mesmo que eventualmente administrativas, não estão sujeitas a diploma de provimento».

Resolveu, pois, emitir instruções nesse sentido às várias direcções dos distritos escolares, visto que noutras ainda surgira este mesmo tipo de situação.

5 — Com a informação, por parte da Direcção do Distrito Escolar da Guarda, de que tinham sido liquidados os vencimentos em dívida à reclamante, foi arquivado o processo.

Processo n.° 82/R-191-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.

Objecto — Abono das diferenças remuneratórias devidas pelo provimento em cargo de categoria superior.

Decisão—Reclamação procedente. Situação atendida. Síntese:

1 — Uma ajudante administrativa principal do Ministério da Indústria, Energia e Exportação queixou-se ao Provedor de Justiça pelo facto de não lhe terem sido pagas, ao fim de 4 anos, diferenças remuneratórias, às quais se considerava com direito, devidas ao seu provimento no cargo de terceiro-oficial, com eficácia retrotraída a 1 de Abril de 1978, levado a efeito pela 54.a lista nominativa de pessoal administrativo daquele departamento.

2 — Efectuadas que foram diligências junto da Secretaria-Geral do Ministério da Indústria, Energia e Exportação e da 11 .a Delegação da Direcção-Geral da Contabilidade Pública, apurou-se que a questão suscitada pela queixosa deveria ser solucionada através da publicação de diploma legal que regularizasse situações decorrentes da publicação, fora do prazo le-

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galmente fixado, de listas nominativas de pessoal originadas pela reestruturação determinada pelo Decreto--Lei n." 548/77, de 31 de Dezembro.

Considerou-se, com efeito, que o atraso, da responsabilidade do Ministério, na publicação das listas nominativas de provimento, não deveria prejudicar os funcionários em termos de remuneração.

Concordando com este ponto de vista, o Ministério da Indústria, Energia e Exportação comunicou ir providenciar no sentido da publicação do diploma legal necessário para regularizar essa situação.

Processo n.° 79/R-1374-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações. Agentes de facto.

Objecto — Pagamento dos vencimentos devidos pelo exercício efectivo de funções durante cerca de 2 anos por trabalhador ilegalmente admitido.

Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.

Síntese:

1 — A reclamante foi admitida em 2 de Novembro de 1977 com a categoria profissional de assistente dentária, auxiliar técnica, na Escola Superior de Medicina Dentária do Porto.

Desde a data de admissão que vinha assinando diariamente o livro de ponto.

A partir de Janeiro de 1978, e durante cerca de 2 anos, não lhe foram, todavia, pagos quaisquer vencimentos, pelo que se dirigiu ao Provedor.

3 — Analisado o assunto, verificara-se que a Escola havia admitido ilegalmente a queixosa ao serviço, antes de obtida autorização do Ministério das Finanças, pois aquela não possuía vínculo à função pública.

4 — Apesar da irregularidade da situação, a verdade é que a interessada prestara serviço no período em questão, serviço do qual a Administração — aliás responsável pela referida ilegalidade— beneficiara.

Por estas razões, e de acordo com a posição pelo Provedor tomada em casos deste tipo, norteada pelo propósito de obstar ao enriquecimento sem causa com base no trabalho de agentes de facto, insistiu-se para que à queixosa fossem pagas as remunerações relativas ao período em questão.

5 — Assim veio, efectivamente, a suceder, tendo tais remunerações sido pagas à reclamante.

Processo n.° 81/R-2152-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações. Enriquecimento sem causa.

Objecto — Não pagamento de vencimentos a trabalhador eventual, por exercício «de facto» de funções de escriturário, por determinação e com consentimento da Administração.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — O interessado neste processo queixou-se ao Provedor porque, tendo sido proposta em 25 de Novembro de 1980, pelo juiz-presidente do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Famalicão, a sua admissão

como escriturário eventual, e havendo desde logo passado, por determinação do mesmo magistrado, a exercer as respectivas funções, não recebera, entretanto, qualquer remuneração, por se aguardar a «confirmação» da sua admissão pela Direcção-Geral dos Serviços Judiciários.

Porém, aquela «confirmação» só fora recebida quase 2 meses passados — a 11 de Maio de 1981. E apenas a partir desta data é que passara a ser-lhe pago o respectivo vencimento.

2 — Ouvido sobre o assunto, o Tribunal informou que os vencimentos do queixoso só haviam sido pagos a partir de 11 de Maio de 1981 porque fora essa a data da sua admissão, decidida pela Direcção-Geral dos Serviços ludiciários.

De facto, embora a proposta para o efeito coubesse ao Tribunal, a admissão em causa era acto da competência da referida Direcção-Geral.

3 — O Provedor reconheceu que a posição dos serviços centrais do Ministério da Justiça quanto à competência para decidir da admissão do reclamante estava correcta, não devendo o Tribunal tê-lo colocado a exercer funções antes de aquela se operar.

Mas, de acordo com orientação já antes firmada em casos semelhantes, entendeu que não seria legítimo à Administração ter-se aproveitado do efectivo trabalho do queixoso, de 25 de Novembro de 1980 a 11 de Maio de 1981, sem qualquer contraprestação.

E isto com base no princípio geral do não locuple-tamento à custa alheia, também aplicável à Administração.

Recomendou, pois, que ao interessado, como «agente de facto», fossem pagas as remunerações correspondentes ao período em discussão.

4 — A Direcção-Geral dos Serviços Judiciários aceitou a recomendação, tendo liquidado ao queixoso os aludidos vencimentos.

Processo n.° 81/R-1778-B-4

Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações. Prescrição.

Objecto — Pagamento de diferenças de vencimentos. Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:

1 — A reclamante desde 24 de Abril que não obtivera qualquer decisão, quer da Reitoria da Universidade do Porto, quer da Direcção-Geral do Ensino Superior, sobre o requerimento pedindo a correcção do vencimento que vinha indevidamente a auferir (letra J), quando teria direito ao da letra F.

De facto, não seria aquele o vencimento que lhe corresponderia, enquanto provida em lugar de técnico investigador.

2 — Ouvidos os competentes departamentos do Ministério da Educação, concluiu-se pela razão da queixosa, que, todavia, tardara em pedir a revisão do seu vencimento.

3 — Punha-se, designadamente, a questão da eventual prescrição de parte das remunerações por ela pedidas.

4 — O reitor da Universidade do Porto entendeu, porém, aliás de acordo com o critério que o Provedor

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vinha preconizando em casos destes, em que a falta de pagamento de quantias devidas seja da responsabilidade da Administração, não invocar a prescrição, tendo ordenado a liquidação das diferenças de vencimento reclamadas.

Processo n.° 81/R-1871-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Requisição. Reclassificação.

Objecto — Pagamento das diferenças de vencimentos e subsídios auferidos durante o período em que um agente adido exerceu, em regime de requisição, funções de categoria e letra de vencimento superiores às que tinha no quadro geral de adidos. Reclassificação de categoria de origem não existente em Portugal.

Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Recomendação acatada. Síntese:

1 — Um antigo capataz de 2.a classe, letra T, do Instituto dos Cereais de Angola, ingressou no quadro geral de adidos, e a partir de determinada data passou a prestar serviço, em regime que se qualificou de destacamento, na Junta Autónoma das Estradas, exercendo, porém, funções de escriturario-dactilógrafo, letra S. Não obstante, aquela Junta continuou a remunerá-lo pela letra T.

Foi posteriormente reclassificado para a categoria de escriturario-dactilógrafo, letra S, mas com efeitos a partir da publicação do respectivo despacho no Diário da República.

Reclamou não só contra o facto de lhe terem sido abonados os vencimentos e outros subsídios correspondentes à letra T, mas ainda contra o lacto de os efeitos da reclassificação serem retroactivos a 4 de Dezembro de 1981, e não a 1 de Julho de 1979, como entendia ser de direito.

2 — A Junta Autónoma de Estradas informou que foram distribuídas ao reclamante funções específicas de escriturario-dactilógrafo por se ter verificado que eram as que melhor se enquadravam nas suas aptidões profissionais. As funções de capataz agrícola, que exercera anteriormente em Angola, não lhe davam quaisquer conhecimentos ou mesmo simples experiência que pudessem ser aproveitados em trabalhos de estradas. Entre a alternativa de lhe facultar uma ocupação ou mandá-lo regressar ao quadro geral de adidos, optou-se por dar-lhe uma oportunidade de ser útil no exercício de funções diferentes das que correspondiam à sua categoria de origem, com evidente proveito para o interessado. E, enquanto não fosse reclassificado, teria de ser abonado pela letra de vencimento correspondente à categoria de ingresso no quadro geral de adidos e constante da guia de vencimentos de que foi portador.

3 — Esta posição foi considerada menos correcta, pelo que se dirigiu ao presidente da Junta Autónoma de Estradas a seguinte recomendação:

3.1 —O reclamante, contrariamente ao que se afirma, não foi destacado, mas sim requisitado, para prestar serviço nesse organismo. Ê o que consta da guia de vencimentos de que foi portador.

De resto, aquela forma de actividade dentro do

quadro geral de adidos foi abolida pelo Decreto--Lei n.° 389/78, de 12 de Dezembro.

Nessa situação —a de requisitado—, ficou ele em actividade fora do quadro geral de adidos, por força do disposto na alínea a) do artigo 35.° do Decreto-Lei n.° 294/76 e na alínea b) do n.° 1 do artigo 1.° daquele Decreto-Lei n.° 389/78, e por isso mesmo é que os seus vencimentos passaram a ser pagos por verbas próprias dessa Junta Autónoma (n.° 3 do artigo 29.° do Decreto--Lei n.° 294/76 e artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 389/78).

Daí que, por força do que se acha determinado na alínea c) do n.° 2 do artigo 26.° do Decreto-Lei n.° 294/76, na redacção que a este artigo deu o Decreto-Lei n.° 175/78, de 13 de Julho, tenha direito, desde a data em que aquela requisição se efectivou, ao vencimento, diuturnidades, subsídio de refeição, subsídio de Natal, abono de família è respectivas prestações complementares, subsídio de férias e demais remunerações que auferirem os agentes dessa Junta Autónoma que exercem as mesmas funções.

E as funções que ele sempre exerceu foram as de escriturario-dactilógrafo, letra S, e não as correspondentes à sua categoria de origem — capataz, letra T.

Será, pois, pela letra S que ele deverá ser, segundo se afigura, remunerado, dando-se, assim, cumprimento integral ao princípio consagrado na alínea a) do artigo 53.° da Constituição da República.

3.2 — O argumento de que, entre não se lhe assegurar colocação ou dar-se-lhe oportunidade de ser útil em funções diferentes das específicas da sua categoria, se optou por esta segunda hipótese é irrelevante, já que o n.° 1 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 294/76 prevê a hipótese de os agentes adidos requisitados serem chamados a desempenhar funções de nível diferente das correspondentes à sua categoria de origem, e a alínea b) do n.° 2 do mesmo artigo é bem clara ao dispor que os agentes nessas situações gozam no serviço utilizador de todas as regalias dos lugares que ocupam (neste caso, o de escriturario-dactilógrafo, letra S).

De qualquer forma, tomada que foi a opção de lhe dar a oportunidade de ser útil no exercício das funções de escriturario-dactilógrafo, haveria sempre que lhe assegurar os respectivos direitos, já que essa utilização não reverteu exclusivamente a favor do interessado, mas sim, predominantemente, em proveito da própria Junta.

De contrário, estaríamos em presença de uma autêntica situação de locupletamento com trabalho alheio, que os regimes legal e constitucional vigentes de forma alguma consentem.

4 — Este ponto de vista foi totalmente aceite e, consequentemente, acatada a recomendação de que fossem pagas ao interessado as diferenças de remuneração por ele reclamadas.

5 — Quanto à data a partir da qual a reclassificação para a categoria de escriturario-dactilógrafo de 2." classe, letra S, deveria produzir efeitos, era patente a falta de razão do reclamante, porque a categoria de capataz de 2.° classe não figura na primeira coluna

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do anexo i ao Decreto-Lei n.° 377/79, de 13 de Dezembro, e ele só passara de direito a ser titular da categoria de escriturario-dactilógrafo após a publicação no Diário da República do respectivo despacho reclassificativo, e porque assim se acha determinado expressamente no n.° 3 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, actual redacção.

Processo n.° 80/R-30D-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Retribuição de trabalho nocturno.

Objecto — Não aplicação ao pessoal hospitalar não médico, desde a data da sua entrada em vigor, do n.° 3 do despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna e das Finanças, publicado no Diário da República, 1.a série, n.° 94, de 22 de Abril de 1975, relativo à retribuição de trabalho nocturno.

Decisão — Recomendação atendida.

Síntese:

1 — Um grupo de trabalhadores não médicos do Hospital Geral de Santo António, do Porto, queixou-se ao Provedor pelo facto de o n.° 3 do despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna e das Finanças, publicado no Diário da República, 1." série, n.° 94, de 22 de Abril de 1975, segundo o qual «a retribuição do trabalho nocturno será superior em 5C % à remuneração a que dá direito o trabalho equivalente prestado durante o dia», não lhes ter sido aplicado desde a data da entrada em vigor desse diploma, mas apenas a partir de 22 de Fevereiro de 1979.

De facto, a circular normativa n.° 4/79, jde 22 de Fevereiro, da Direcção-Geral dos Hospitais, tinha reafirmado a aplicação desse regime «ao pessoal hospitalar não médico». Em Junho seguinte, porém, quando o Hospital Geral de Santo António se preparava para proceder ao pagamento dos retroactivos (relativos a anos já em atraso), este fora mandado suspender pela circular nomativa n.° 20/79.

2 — Auscultado o departamento governamental competente, verificou-se que, quer a circular n.° 20/79, quer o Secretário de Estado da Saúde, em despacho de 6 de Março de 1981, tinham entendido que o regime de retribuição de trabalho nocturno constante do n.° 3 do despacho conjunto acima citado só seria de aplicar a partir da publicação da circular n.° 4/79.

E isso com base em que tal diploma, embora interpretativo, não podia aplicar-se retroactivamente, por não ter assumido a mesma forma —despacho conjunto— daquele cujo sentido viera esclarecer.

3 — Não se afigurou aceitável esta posição.

A obrigatoriedade do pagamento em termos especiais do trabalho nocturno fora fixada no despacho conjunto de 16 de Abril de 1975.

. A circular n.° 4/79 apenas pretendera esclarecer internamente os termos em que esse diploma se deveria aplicar ao pessoal não médico dos hospitais.

E do não cumprimento (ilegítimo) de uma norma por certo período não poderia extrair-se a consequência de que ela só deveria aplicar-se a partir do momento em que ficara esclarecido que ela abrangia certo tipo de situações.

4 — O Provedor de Justiça recomendou, por isso, ao Secretário de Estado da Saúde que revogasse, por, ilegal, o seu despacho de 6 de Março de 1981, substituindo-o por outro que determinasse a aplicação do despacho conjunto de 16 de Abril de 1975, tal como, aliás, fora entendido pela circular da Direcção-Geral dos Hospitais n." 4/79, desde a data da sua entrada em vigor.

5 — A entidade visada resolveu auscultar ainda o Secretário de Estado do Orçamento. Este manifestou a sua concordância com a recomendação do Provedor de Justiça e respectiva fundamentação, depois de ter colhido o parecer da Direcção-Geral da Contabilidade Pública e da Auditoria Jurídica do Ministério.

6 — Em face disso, o Secretário de Estado da Saúde determinou que o Departamento de Gestão Financeira dos Serviços de Saúde estudasse a obtenção da cobertura financeira para o pagamento retroactivo das retribuições em questão.

Em consequência, foi arquivado o processo.

Processo n.° 807R-892-A-3

Sumário — Trabalho. Função pública. Saneamento.

Objecto — Reintegração de funcionário por arquivamento de processo de saneamento que lhe foi instaurado.

Decisão — Reclamação procedente. Situação resolvida.

Síntese:

1 — Um trabalhador da Federação dos Grémios da Lavoura da Beira Litoral apresentou queixa ao Provedor de Justiça pelo facto de não ter sido reintegrado no respectivo cargo, nem recebido as remunerações que lhe eram devidas, após arquivamento do processo de saneamento no qual fora visado.

2 — Depois de insistentes diligências efectuadas junto do Ministério da Agricultura, Comércio e Pescas com vista a solucionar a questão, conseguiu-se a transferência do trabalhador, da extinta Federação para a Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral, transferência essa imposta pela extinção dos grémios da lavoura entretanto decretada.

Assim se verificou, pois, a reintegração do interessado num dos serviços públicos para que haviam transitado os elementos dos extintos grémios da lavoura e respectivas federações.

Processo n.° 82/R-234-A-2

Sumário — Trabalho. Função pública. Subsídio de refeição.

Objecto — Pagamento do subsídio de refeição a assalariado eventuat.

Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.

Síntese:

1 — Um sindicato representativo do pessoal da função pública apresentou queixa no interesse de uma sua associada, assalariada eventual do Instituto Nacional de Investigação Agrária, à qual, apesar de admitida em Junho de 1978, só passara a ser pago

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subsídio de refeição a partir do Despacho Normativo n." 392/80. de 51 de Dezembro.

2 — Ouvido o Instituto, este sustentou a sua atitude no argumento de que, sendo a interessada assalariada eventual, não paga por verba de pessoal, só o citado despacho normativo viera estabelecer ter ela direito ao subsídio de refeição.

3 — Analisado o caso, o Provedor considerou que a interessada linha direito ao subsídio de refeição desde a sua admissão.

Recomendou, pois. o respectivo pagamento, com base nas razões seguintes:

a) Não parece correcta a actuação do 1NIA, que consistiu em só proceder ao pagamento de subsídio de refeição a uma agente assalariada eventual a partir da data da publicação do Despacho Normativo n." 592/80, de 31 de Dezembro.

b) O n.u 4.1 do despacho normativo estabelece:

O pessoal assalariado eventual ou jornaleiro, independentemente da verba por que tenha vindo a ser remunerado, tem direito a perceber o subsídio de refeição desde que exerça funções a tempo completo e esteja sujeito à orientação e disciplina da entidade pública contratante, incluindo a sujeição ao horário diário ou semanal legalmente fixado para o respectivo sector de actividade.

Este despacho normativo foi publicado ao abrigo do artigo 8.u do Decreto-Lei n." 505/77. de 29 de lulho, que determina que as dúvidas suscitadas na sua aplicação sejam resolvidas por despacho conjunto dos Secretários de Estado da Administração Pública e do Orçamento.

Por sua natureza, um despacho normativo não tem poderes de inovação. Trata-se de uma norma geral obrigatória, determinando uma interpretação genérica, que explica o significado de uma lei e ordena o entendimento uniforme dos seus preceitos para resolução de todos os casos que se apresentem, como ensina o Prof. Marcelo Caetano tn.°" 49, 54 c 180 do Manual de Direito Administrativo, vol. i).

Nestes termos, tem de entender-se que o comando da lei já existia desde o início da sua vigência e desde então tem de ser executado.

c) O Decreto-Lei n." 305/77 instituiu o subsídio de refeição para todos os funcionários e agentes da Administração (artigo 1.°, n.u 1). Ora. de acordo ainda com a doutrina expressa pelo ilustre professor, agentes são os indivíduos que, por qualquer título, exerçam actividade ao serviço das pessoas colectivas de direito público sob a direcção dos respectivos órgãos (p. 641 do vol. it) c os assalariados eventuais são agentes recrutados por utilização de verbas globais, consoante as necessidades de trabalho, sem qualquer compromisso ou garantia de permanência, quase sempre por mero ajuste verbal (p. 658).

Os jornaleiros são agentes assalariados eventuais mediante remuneração estipulada por cada dia útil de trabalho.

d) Nestes termos, a queixosa tinha direito ao abono de subsídio de refeição desde que detinha a qualidade de agente da Administração. E os

serviços, uma vez que não aplicaram correctamente o Decreto-Lei n." 305/77, deviam ter corrigido a sua actuação, não apenas a partir da data em que lhe foi fixada obrigatoriamente uma interpretação uniforme, mas ainda retroactivamente, uma vez que um despacho normativo não é inovador.

4 — O INIA aceitou a recomendação, lendo, aliás, emitido instruções no sentido de se proceder dc acordo com ela nos demais casos análogos surgidos ou a surgir.

Trabalho — Registo de prática farmacêutica

Processo n.° 80/R-2304-B-Í

Sumário — Trabalho. Registo de prática farmacêutica. Objecto—Irregularidades em registo de prática farmacêutica.

Decisão'— Reclamação procedente. Reparo à Direcção-

-Ceral de Saúde. Síntese:

1 — A reclamante, uma associação sindical, queixava-se de que a Direcção-Geral de Saúde aceitara o registo de prática farmacêutica de um trabalhador a lempo parcial, filho da proprietária de uma farmácia, contrariando o disposto no n.° 2 do artigo 1." da Portaria n." 367/72, de 3 de Julho, com a redacção que lhe foi dada pelo n." n) da Portaria n.fl 485/78, de 24 de Agosto.

2 — Porque a veracidade do afirmado pela reclamante foi confirmada in loco por um agente da Inspecção do Trabalho, solicitaram-se os indispensáveis esclarecimentos à Direcção-Geral de Saúde.

3 — Esta entidade pública respondeu, um ano e meio e 10 ofícios depois, limitando-se a remeter cópia da informação prestada pelo director dc Saúde dc Setúbal, referindo haver sido confirmado que a prática farmacêutica do trabalhador cm causa tinha sido obtida a tempo integral, através da leitura do livro de registos das presenças dos auxiliares, escrito pela própria farmacêutica.

4 — Esta atitude negligente dos serviços da Direcção-Geral de Saúde mereceu reparo do Provedor de Justiça, já que o decurso do tempo se encarregara de inutilizar qualquer outro tipo de intervenção.

De facto, a Direcção-Geral de Saúde limitara-se a reproduzir o teor do registo elaborado pela farmacêutica.

Isto, apesar de, através de várias insistências, o Serviço do Provedor de Justiça ter chamado a atenção para a discrepância entre esses registos e a verificação local feita pela Inspecção do Trabalho.

Trabalho — Segurança social

Processo n.c 81/R-1278-B-1

Sumário — Trabalho. Segurança Social. Concurso. Objecto — Exclusão de um concurso de admissão

por falta de prova de factor dc preferência. Decisão — Reclamação parcialmente procedente.

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Síntese:

1 — A reclamante fora excluída de ura concurso de admissão para monitora efectiva do antigo Instituto de Obras Sociais, por se haver recusado a comprovar a situação econômica do seu agregado familiar.

2 — Auscultado o Centro Regional de Segurança Social de Lisboa, este justificou a aludida exclusão com base no n.° 4 do artigo 20.° da Portaria n.° 193/ 79, de 21 de Abril, que, relativamente aos concursos para pessoal da segurança social, dispõe que «em caso de igualdade de classificação, será considerada a situação económica e familiar de cada um dos candidatos».

Acrescentou, a propósito, que, em seu entender, essa disposição é inconstitucional, embora tivesse de ser aplicada enquanto não declarada a existência desse vício.

3 — O Provedor de Justiça entendeu que a carência económica familiar era um factor que poderia ser levado em conta nas admissões, não parecendo ofender o princípio de igualdade constitucionalmente consagrado.

4 — Mas entendeu também que o seu valor se limita, segundo expressamente dispõe o n.° 4 do artigo 20.° da Portaria n.° 193/79, a factor de desempate entre candidatos igualmente classificados. Assim, a recusa da candidata em comprovar a situação económica do seu agregado familiar não poderia motivar a sua exclusão, mas tão-somente a sua graduação, entre os candidatos em igualdade de circunstâncias, imediatamente atrás daquele que tivesse comprovado a situação económica familiar menos carente.

5 — Esta a posição que exprimiu à entidade visada, muito embora no caso concreto ela já não tenha podido relevar, pois a interessada fora, entretanto, admitida noutro lugar, a que também se candidatara.

CAPITULO VI

Sequência de processos relatados em anos anteriores

1 — Legislação

a) O Provedor de Justiça e as Forças Armadas

Resolvendo divergências a esse propósito surgidas (v. relatórios do Provedor de Justiça do ano de 1979, pp. 205-217, e do ano de 1981, p. 161), a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas (Lei n.° 29/ 82, de 11 de Dezembro) veio, no seu artigo 33.°, reconhecer a competência do Provedor de Justiça para apreciar a actuação dos «poderes públicos responsáveis pelas Forças Armadas». Segundo o n.° 3 desse preceito, o exercício do direito de queixa por parte dos elementos das Forças Armadas e a forma de actuação do Provedor a seu respeito serão regulados por lei da Assembleia da República, ainda não publicada.

b) Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração

Central, Regional e Local — Aplicação no tempo dos eleitos das penas

O Secretário de Estado da Reforma Administrativa comunicou em 9 de Março de 1982 que, tendo sido

ponderada nos trabalhos preparatórios de revisão do Estatuto Disciplinar a recomendação sobre aplicação no tempo dos efeitos das penas publicada no relatório do Provedor de Justiça de 1980, p. 41, fora «entendido como não oportuna a introdução de uma norma com as características decorrentes da recomendação, tendo presente o limitado número de casos que viriam a ser abrangidos, em contraposição com os custos de execução, designadamente burocráticos, que o normativo em questão acarretaria».

c) Transportes púbiioos — Acompanhamento de cegos por

cies

Em 8 de Abril de 1982 foi publicado o Decreto Regulamentar n.° 18/82, que deu satisfação à recomendação que o Provedor fizera acerca da possibilidade de acompanhamento dos cegos por cães em transportes públicos (relatório de 1980, p. 233).

Segundo esse diploma, tal acompanhamento passa a ser permitido desde que os cães —que viajarão gratuitamente, mas não poderão tomar lugar nos bancos — venham atrelados e açaimados, não incomodem por qualquer forma os outros passageiros e não prejudiquem a conservação, asseio e condução dos veículos.

d) Despejo de emigrantes por falta de residência permanente

Em 12 de Dezembro de 1978 (relatório do Provedor de Justiça de 1979, pp. 18-20) o Provedor recomendou ao Ministro da Justiça a revisão do artigo 1093.° do Código Civil, na medida em que vinha sendo interpretado pela maioria dos tribunais no sentido de permitir o despejo dos emigrantes com o fundamento da falta de residência permanente. Apesar da inegável importância da questão, e mau grado as sucessivas insistências do Provedor, essa sugestão não mereceu qualquer seguimento da parte daquele órgão governamental.

Por isso, e tendo em conta o longo tempo já decorrido sobre a formulação daquela recomendação, o Provedor considera necessário suscitar a atenção da Assembleia da República para o problema.

e) Tagamento de impostos com títulos de Indemnização

A Portaria n." 843/82, de 3 de Setembro, veio permitir o pagamento, até 30 de Novembro desse ano, através de títulos de indemnização das empresas nacionalizadas, das obrigações fiscais vencidas antes de 1 de Janeiro de 1977.

O Provedor recomendara (relatório do Provedor de Justiça de 1980, p. 120) que tal processo de pagamento fosse tornado extensivo às dívidas fiscais do ano em que esses títulos fossem distribuídos, ou do ano anterior.

A Portaria n.u 843/82 não acolheu, pois, o teor da recomendação do Provedor. Mas, ao prorrogar o prazo de pagamento das obrigações fiscais anteriores a 1 de Janeiro de 1977, não deixou de ter em conta a situação de injustiça por ele apontada — decorrente do facto de muitos interessados não terem podido pagar essas dívidas no prazo inicialmente estipulado, por a Administração não lhes ter entregue em tempo os títulos de indemnização.

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f) Atestado de bom comportamento moral e civil

O Decreto-Lei n.u 468/82. de 14 de Dezembro, estabeleceu que o atestado de bom comportamento moral e civil deixaria de constituir requisito da atribuição ou exercício de quaisquer direitos ou regalias.

Deu, assim, cumprimento à recomendação que o Provedor sobre o assunto fizera (relatório do Provedor de lustiça de 1978, p. 19).

2 — Administração

Na sequência da visita, referida no relatório de 1980 (p. 239), ao Centro de Apoio Social de Lisboa — Mitra e da resposta obtida da respectiva Comisão Instaladora (relatório de 1981, p. 158), o Provedor recomendara em 18 de Agosto de 1981 ao Secretário de Estado da Segurança Social:

A nomeação de uma comissão instaladora para aquele organismo, que dispusesse de 1 ou 2 elementos em tempo completo:

A criação de incentivos para atracção de pessoal de enfermagem habilitado;

A celebração de acordo com a PSP para fixação dos efectivos necessários à vigilância e segurança do Centro, bem como para definição de remuneração adequada para o pessoal a destacar para esse organismo;

A instituição rva Quinta do Pisão de uma unidade sócio-sanitária, na qual as actividades agro--pecuárias, para ajém do aproveitamento económico, propiciassem um instrumento de ocupação, recuperação e reintegração social dos internados.

A Secretaria de Estado informou em julho de 1982 que concordara com estas sugestões, tendo já dado concretização à maioria delas.

CAPÍTULO Vil

Inspecções a estabelecimentos prisionais e de assistência

Ao longo do ano, tal como nos anos anteriores, realizaram-se visitas de inspecção a vários estabelecimentos prisionais, tendo em vista a observação directa da situação dos detidos e a existência, porventura, dc práticas ou actuações anómalas que possam afectar direitos individuais ou atentar contra a dignidade humana.

Como vem sendo prática habitual, de cada uma dessas visitas foram elaborados relatórios, que foram remetidos à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, com as recomendações que foram consideradas mais significativas.

I) Visita ao Estabelecimento Prisional de Monsanto Relatório

Processos n.OÍ 81/R-1740-B-1 e 81/R-1741-B-1

1 — Motivo da visita. — Por iniciativa do Provedor de lustiça. com base em reclamações existentes no Ser-

viço, que focavam aspectos relacionados com más condições das instalações destinadas aos reclusos (camaratas com cerca de 50 reclusos), propiciadoras da ocorrência frequente de furtos e agressões entre reclusos, vendas furtivas e utilização das funções de «delegado de sector» das várias camaratas para o exercício de coacção sobre os restantes reclusos.

2 —Data da visita. —25 de funho de 1982. de manhã.

> — Equipa da visita:

Provedor de Justiça;

I coordenador do Serviço do Provedor dc Justiça; 1 assessor do Serviço do Provedor de lustiça.

4 — Pessoas contactadas:

Dr. Palma Vaz (director do Estabelecimento);

Mariano (chefe dos guardas);

Andrade (chefe de repartição);

José loão Pires (chefe do Economato);

Alberto Carlos Monteiro (chefe da Repartição de

Contabilidade); Diversos assistentes sociais e educadores.

O Provedor de Justiça e acompanhantes contactaram pessoalmente diversos reclusos em todas as celas visitadas.

Não foram contactados os reclusos com processos pendentes neste Serviço, por já terem sido libertados.

5 — Lotação e pessoal. — O estabelecimento está preparado para receber 300 reclusos, tendo à data 294, na maioria preventivos.

Existem também cerca dc 70 reclusos já condenados, alguns dos quais à espera de destino, e outros provenientes de outros estabelecimentos, para comparência em julgamentos ou para tratamento médico.

O Estabelecimento está dotado de pessoal administrativo, de contabilidade, educadores, assistentes sociais e pessoal de vigilância, este último apoiado por um destacamento da Guarda Nacional Republicana.

A população prisional, dada a natureza do Estabelecimento, está em constante mutação, sendo o período médio de permanência cerca de ano e meio.

b — Instalações e equipamentos. — Cadeia de tipo não convencional, dado ter resultado de adaptação de um antigo forte militar. A natureza originária do Estabelecimento condiciona a qualidade das instalações e a distribuição adequada dos reclusos pelos vários espaços. Nalguns destes espaços detectaram-se infiltrações de humidade e ausência de luz natural.

A maioria dos reclusos está distribuída por camaratas colectivas, com cerca de 40/50 reclusos. Foram visitadas as camaratas correspondentes aos sectores F e H, com mais de 40 reclusos cada uma. Visitou-se também uma camarata com cerca de 20 reclusos, onde se encontra alojado pessoal que trabalha fora. Nos sectores laterais existem alojamentos com menor número de reclusos (1/2), em que todo o pessoal trabalha.

Fora do edifício principal estão instaladas oficinas de cerâmica, serralharia, carpintaria e mecânica, que não foram visitadas por falta de tempo. Parte do terreno anexo ao Estabelecimento tem aproveitamento agrícola.

As instalações sanitárias são satisfatórias e os balneários dotados de chuveiros.

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Existe também 1 enfermaria, adequadamente instalada, com farmácia, que tem adjacente um espaço destinado a instalação hospitalar, com 12 camas, na altura ocupadas por reclusos portadores de doenças mentais e cardiológicas.

As instalações da cozinha e o refeitório pareceram satisfatórios c obedecendo a requisitos de higiene mínimos. As instalações de lavandaria estão dotadas de equipamento apropriado.

Existe I parlatório, com instalação simples, mas agradável, e com acessos diferentes para os reclusos c as visitas. Há também I sala própria para os reclusos receberem os seus advogados.

O estabelecimento está dotado de 1 padaria priva-t.va, de forno de lenha, com uma produção diária de cerca de 1200 pães para consumo próprio e fornecimento a terceiros (Penitenciária, Mónicas e zona prisional da Polícia ludiciária).

A sala de convívio dos reclusos encontrava-se na altura em obras de restauração.

As celas disciplinares são deficientíssimas, sem luz natural, com uma base de cimento e com cheiro nauseabundo, podendo considerar-se verdadeiras enxovias.

7 — Apoio aos reclusos. — Existem serviços próprios de assistência social e educadores, que prestam aos reclusos apoio em questões administrativas e outros assuntos de seu interesse, de carácter pessoal, encaminhamento de questões jurídicas e apoio a familiares.

8 — Alojamento, vestuário e alimentação. — O equipamento e estado geral de manutenção das celas sofre oscilações significativas, notando-se um arranjo, mais cuidadoso nas celas com menor número de reclusos, e maior descuido nas camaratas. Nestas últimas, o sistema é o de beliche. Em todas as camaratas ou nas salas adjacentes às celas com menor número de ocupantes existem televisões e pequenas instalações utilizáveis para a preparação de café e aquecimento de alimentos já cozinhados.

ü ambiente humano entre os reclusos pareceu desanuviado e menos carregado que noutros estabelecimentos visitados. São de questionar, no entanto, as desvantagens resultantes da retenção de grande número de reclusos (mais de 40) em espaços reduzidos, quase todos inactivos, com diferentes antecedentes criminais, de variadas origens c de diversos escalões etários (embora predomine a camada jovem). A apresentação e vestuário dos reclusos é variável.

O banho quente é duas vezes por semana. A mudança de lençóis faz-se semanalmente.

A ementa do dia pareceu bastante satisfatória e de melhor qualidade que a detectada em estabelecimentos similares:

Almoço— sopa de feijão encarnado com hortaliça.

sardinhas, ovos cozidos e batatas; (antar — sopa de couve lombarda com cenouras

e batatas e carne estufada com batatas fritas e

arroz.

Há dietas. As refeições são confeccionadas por um cozinheiro e um guarda; auxiliados por reclusos.

9 — Trabalho. — Em regra, só os condenados trabalham. Dos reclusos preventivos, que constituem a maioria, poucos trabalham, por as instalações oficinais estarem fora do estabelecimento prisional e haver insuficiência de guardas.

As remunerações pagas aos reclusos são variáveis:

Padaria — 50$/dia; Lavandaria e cozinha — 50$/dia: Balneários— 15$/dia; Enfermaria — 35$/dia.

Existe 1 oficina de artesanato para a confecção de obras, de acordo com contrato celebrado com particular, em que trabalham cerca de 50 reclusos, cujo salário diário é superior a 100$. Variados reclusos trabalham nas oficinas de cerâmica, serralharia e carpintaria, fora das instalações principais.

10—Ensino. — Apenas existem cursos de francês e inglês.

11—Tempos livres. — Os reclusos dispõem de 2 horas de recreio diárias.

Há instalações internas dispondo de mesas para jogo de pingue-pongue e I campo (pequeno) ao ar livre para futebol.

Existem I biblioteca e diversos jegos de salão ao dispor dos reclusos.

Não há associação de reclusos.

12 — Assistência moral e espiritual. — O Estabelecimento tem capela e está dotado de capelão. Celebra-se missa dominical.

15 — Visitas e correspondência. — São permitidas visitas de familiares mais próximos (pais, filhos e cônjuges) três vezes por semana, durante o período de I hora. O horário das visitas decorre entre as 14 horas e 50 minutos e as 15 horas e 30 minutos e entre as 16 e as 17 horas.

Nada de significativo há a assinalar quanto à correspondência, que se processa nos termos legais.

14 — Assistência medico-sanitária. — O estabelecimento dispõe de 2 enfermeiros, um do quadro e um recluso detentor daquela profissão.

I médico de clínica geral visita o estabelecimento iodos os dias e I psiquiatra três vezes por semana.

O apoio médico complementar ou especializado é dado pelos hospitais oficiais.

15 — Problemas especiais. — Tal como sucede nou-iros estabelecimentos, existem casos de consumo de droga, cuja proliferação é estimulada pela coabitação de grande número de reclusos no mesmo espaço (cama-iaias colectivas).

Assinala-se também que a coabitação colectiva suscita desentendimentos (que foram confirmados) entre reclusos, algumas vezes resultantes de pequenos furtos.

Foi averiguada a natureza e função dos delegados de sector, tendo em atenção queixas existentes sobre o eventual abuso da parte de reclusos investidos no exercício dessas funções e o disposto no artigo 110", n." 2, do Decreto-Lei n.ü 256/79, de I de Agosto. Apurou-se e conlirmou-se a existência destes delegados, cuja necessidade foi justificada com base no número excessivo de reclusos por sector, tendo funções de porta-vozes ou intermediários entre os reclusos e os funcionários. Confirmou-se ter havido no passado situações de aproveitamento dessas funções para outros objectivos, que estariam ultrapassadas no presente. O atraso na publicação da lei dâ amnistia, que se sabe ter sido já votada e promulgada, provoca alguma lensão enire os reclusos que da mesma beneficiarão.

16 — Assistência a reunião do.conselho técnico.— A realização desla visila coincidiu com a ocorrência

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de reunião do conseiho técnico, rendo o Provedor de Justiça e seus acompanhantes sido convidados pelo juiz de execução de penas. Dr. Sá Nogueira, a assistir àquela reunião, que teve lugar antes do inicio da visita. Nela participaram, alem do referido juiz, o director do Estabelecimento, assistentes sociais e educadores, instrutores dos processos submetidos a parecer, chefe dos guardas e chefe dos Serviços Administrativos. Foram apreciadas diversas pretensões de saídas precarias e de liberdade condicional, tendo sido de grande utilidade assistir ao funcionamento concreto deste órgão (cf. artigos 24." a 27." do Decreto-Lei n." 785/76. de 29 de Outubro, e artigos 186." e 187.' do Decreto-Lei n." 265/79. de I de Agosto). Sobre todos os pedidos e personalidades dos beneficiários foram carreadas para a reunião informações detalhadas, que denotaram da parte do pessoal competente um conhecimento humano perfeito dos reclusos visados. Como aspecto particular, na mesma reunião referiram-se alguns problemas que resultam da situação cie reclusos que perderam a nacionalidade portuguesa em virtude do regime legal publicado na sequência cio processo de descolonização e que encontram problemas de acolhimento nos países da nacionalidade que lhes foi destinada.

17 — Conclusões.— Da observação pessoal e deste relato resulta que:

1) Os problemas mais agudos do Estabelecimento

estão relacionados com a coabitação dc grande número de reclusos em espaços limitados, o que sugere que a solução seja repensada, tendo em conta os condicionalismos materiais e financeiros existentes:

2) Ê notório o estado de degradação das celas

disciplinares, que necessitam de readaptação, dc modo a obedecerem a condições mais satisfatórias: '■>) |ustifica-se uma fiscalização permanente do exercício das funções de delegado de sector, em ordem a evitar abusos já verifi-dos;

4) )ulga-se conveniente pôr em funcionamento os

instrumentos necessários a uma maior percentagem de ocupação e trabalho dos reclusos:

5) Seria de encarar a possibilidade de auméntal-

as áreas ao ar livre destinadas ao ivcreic dos reclusos.

18—Proposta.— Propõe-se que do teor deste relatório seja dado conhecimento a S. Ex.a o Ministro da Justiça, à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e ao director do Estabelecimento visado.

II) Visita ao Estabelecimento Prisional de Alcoentre Relatório

Processos r>r 82/IP-131-B-1 e 82/IP-l32-8-1

1 — Motivo da visita. — Por iniciativa do Provedor de justiça, dentro do plano de visitas a todos os estabelecimentos prisionais do País.

2 — Data da visita. — 25 de Novembro de 1982. de manhã.

5 — Equipa da visita: Provedor de lustiça:

I coordenador do Serviço do Provedor Je Justiça:

I assessora do Serviço do Provedor de lustiça.

4 — Pessoas contactadas:

Franklim Barros Ferreira (chefe de secretaria); Joaquim Arsénio Cartaxeiro (contabilidade e economato):

Maria Romana Dumas Diniz (assistente social): Francisco Alberto dos Santos lerónimo (educador):

Artur Coelho Ventura (chefe de guardas): Manuel Marques de Oliveira (enfermeiro): Diversos reclusos, em audiência colectiva: alguns, em audiência individual.

No altura da visita o director do Estabelecimento Prisional encontrava-se ausente em diligência oficial.

5 — Lotação e pessoal.—O Estabelecimento está preparado para receber cerca de 513 reclusos, tendo h data cerca de 340. De entre estes últimos há ">0 reclusos em situação de confiança, que irão ser abrangidos pelo regime aberto e dedicando-se a serviços agro-pecuários.

O Estabelecimento dispõe de pessoal administrativo, de assistência social, de segurança e educadores, notando-se insuficiência do pessoal necessário nas áreas de assistência social (apenas 1 unidade ao serviço, quando há 6 dotadas), educação (3 unidades ao serviço e 8 dotadas) e segurança (78 unidades ao serviço e 133 dotadas), tendo em atenção o número de reclusos a assistir e a vigiar.

6—Instalações e equipamentos. — O Estabelecimento está instalado numa propriedade com cerca de 680 ha. As instalações prisionais propriamente ditas distribuem-se por um bloco central e por um anexo destinado a reclusos em vias de reinserção social.

O bloco central dispõe de 7 andares. Algumas das celas são individuais e outras abrigam 5 reclusos.

Existem intalações para trabalho oficinal (cerâmica, serração mecânica, carpintaria, estofaria, oficina mecânica, de bate-chapas e pintura, estatuária, etc).

Foram também visitadas as instalações sanitárias e os balneários dos reclusos, cozinha, refeitório c lavandaria.

Todas as instalações visitadas (incluindo celas de variados reclusos) se apresentavam impecavelmente limpas e conservadas. A impressão geral colhida quanto a este aspecto é de eficiente organização, apuro e até humanização, denotada em pormenores de decoração.

Não foram visitadas as instalações agro-pecuárias. lagar de azeite, adega e celeiro, por falta de tempo.

7 — Apoio aos reclusos.— Existem serviços próprios de assistência social e educadores, que prestam aos reclusos não só apoio em questões administrativas, como também em assuntos do seu interesse, dc carácter pessoal, encaminhamento de questões jurídicas e apoio a familiares.

Diversos reclusos referiram a existência de substanciais atrasos no tratamento de assuntos do seu interesse, o que parece justificar-se pela notória insuficiência de pessoal de apoio (especialmente nas áreas de assistência social e educação).

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8 — Alojamento, vestuário e alimentação. — Todas as celas visitadas dispunham do equipamento básico.

Os reclusos usam farda.

O banho quente é duas ou mais vezes por semana, sem restrição.

Na confecção dos alimentos ocupam-se 1 cozinheiro do quadro, 1 guarda e 12 reclusos, que auferem entre 50$ e 65$ diários. A ementa, cuja confecção estava a realizar-se, pareceu bastante satisfatória (canja, feijoada, pão e fruta). .

Há dietas (a do dia era esparguete cozido e frango assado).

9 — Trabalho. — Todos os reclusos trabalham nas diversificadas actividades do Estabelecimento, havendo variações salariais, consoante o tipo de trabalho.

As remunerações pagas pelo trabalho subordinado estão de acordo com as tabelas de salários aprovadas, existindo um sistema de estímulos à produtividade, partindo de uma tabela de trabalho normal, com bonificações para o trabalho acima da média e penalizações para o que se situe abaixo dela.

10 — Ensino. — Funcionam aulas de ensino primário, frequentadas por cerca de 30/35 reclusos, sendo o tempo de aulas (meio dia) pago como trabalho efectivo.

Alguns alunos seguem cursos por correspondência.

11 — Tempos livres. — Existe associação de reclusos.

Os reclusos jogam futebol de 5 e 11, aos fins-de--semana.

A televisão funciona todos os dias. Há 2 sessões mensais de cinema. Existe 1 biblioteca.

Está em construção 1 sala de convívio.

12 — Assistência moral e espiritual. — Existe 1 capelão.

13 — Visitas e correspondência. — Nada de significativo há a apontar nestas áreas.

As visitas são aos sábados, à tarde, entre as 14 e as 16 horas, e nos domingos e feriados, entre as 10 e as 12 e as 14 e as 16 horas.

No pavilhão central e anexo há parlatorios.

Os telefonemas só são admitidos em casos excepcionais.

14 — Assistência médico-sanitária. — Não há médico privativo. A assistência médica é prestada por um único médico, que se desloca de Lisboa três vezes por semana, o que é manifestamente insuficiente.

O Estabelecimento está dotado de um único enfermeiro do quadro apoiado por um recluso, o que também se revela insuficiente em função da população a assistir.

O apoio médico complementar ou especializado é dado pelo Hospital de Vila Franca de Xira e pela Prisão-Hospital de Caxias. Não existe dentista, função que tem sido desempenhada, nalguns casos, a título supletivo, pelo enfermeiro.

Os reclusos doentes são distribuídos por 2 enfermarias, com 4 camas cada uma, existindo também 3 quartos para isolamento.

Há 1 farmácia, adequadamente apetrechada, e 1 bloco operatório.

15 — Aspectos especiais. — Não se detectaram tensões entre o pessoal de apoio e os reclusos, incidindo as queixas apresentadas por estes últimos apenas em aspectos relacionados com a morosidade no tratamento das questões do seu interesse.

A impressão geral recolhida das instalações e da organização que preside ao Estabelecimento é bastante favorável.

Há que realçar a existência, nos átrios de cada bloco de celas, de quadros, donde constam várias situações em que podem encontrar-se os reclusos, e os direitos, regalias e deveres inerentes a cada uma delas, o que se nos afigura de bastante interesse, já que parte das queixas apresentadas neste Serviço se reportam a situações de desconhecimento pelos reclusos do exacto conteúdo dos seus deveres e direitos prisionais.

16 — Conclusões. — Da observação pessoal e deste relato resulta que:

1) Se justifica um aumento do número de efecti-

vos nas áreas de assistência social e de educação, por as unidades actuais serem manifestamente insuficientes, atendendo .ao número de reclusos a apoiar;

2) O sistema de apoio médico-sanitário não é su-

ficiente, aconselhando-se a admissão de 1 médico a título permanente, de mais I enfermeiro e de 1 dentista (mesmo em tempo parcial).

17 — Proposta.— Propõe-se que do teor deste relatório seja dado conhecimento a S. Ex." o Ministro da Justiça, à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais c ao director do Estabelecimento visitado.

Ill) Visita ao Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus Relatório Processo n.° 82/IP-132-B-1

1 — Motivo da visita. — Por iniciativa do Provedor de Justiça, dentro do plano de visitas a todos os estabelecimentos prisionais do País.

2 — Data da visita. — 25 de Novembro, de tarde.

3 — Equipa da visita:

Provedor de justiça;

1 cordenador do Serviço do Provedor de Justiça; 1 assessora do Serviço do Provedor de Justiça.

4 — Pessoas contactadas:

Dr. Moura Ramos (director do Estabelecimento); Bento Vieira (adjunto da direcção); Manuel Magalhães Borges (chefe dos guardas); Diversos reclusos, em audiência individual e colectiva.

5 — Lotação e pessoal. — O Estabelecimento está preparado para receber 504 reclusos, tendo à data 288 reclusos, na maioria condenados e só 2 preventivos.

O Estabelecimento está dotado de pessoal administrativo, de contabilidade, educadores, assistentes sociais e pessoal de vigilância.

6—Instalações e equipamentos. — Por falta de tempo, não foram visitadas todas as instalações do Estabelecimento.

Visitaram-se o bloco administrativo (na entrada), os estabelecimentos oficinais laterais, 2 dos blocos prisionais e funcionar, a capela e a sala de cinema/ ginásio, com lotação para 550 pessoas e apetrechada

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com máquinas de projectar de 16 mm e 35 mm. Visitou-se também o sistema produtor de rádio e o sistema de segurança por circuitos dc televisão.

As instalações do estabelecimento são modernas e limpas, os equipamentos individuais suficientes e alguns dos equipamentos colectivos sofisticados e super-dimensionados (embora parte deles não funcione).

7 — Apoio aos reclusos. — Nota-se certa insuficiência numérica do pessoal de apoio: apenas 2 assistentes sociais e 1 educador, pessoal administrativo a 50 % das necessidades e pessoal de vigilância a 30 % das necessidades. Alguns reclusos referiram alguma falta de comunicação cem o pessoal de apoio e atrasos no tratamento de assuntos de seu interesse, o que parece estar relacionado com a insuficiência de efectivos.

8 — Alojamento, vestuário e alimentação.—Todas as celas se apresentavam impecavelmente limpas e bem apetrechadas.

Os reclusos dispõem de farda (de Inverno e Verão). Os banhos quentes são duas vezes por semana (chuveiro).

As refeições são preparadas por I cozinheiro do quadro, auxiliado por 10 reclusos.

A ementa pareceu satisfatória (puré de grão com hortaliça e goraz cozido com todos). Há dietas.

Existe I padaria própria para a confecção de pão para os reclusos e funcionários, dirigida por l padeiro profissional.

9 — Trabalho. — Todos os reclusos trabalham. Os que não têm ocupação especial trabalham em faxina.

Há instalações tipográficas, com equipamentos que representam investimentos de vulto, não totalmente aproveitados. Foi referido haver falta de mestres. Há também oficinas de carpintaria, marcenaria e serralharia. Os salários auferidos na tipografia oscilam entre os 50$ e 100$ fliários.

10 — Tempos livres. — Os reclusos jogam futebol, basquetebol, voleibol e andebol.

Existe 1 ginásio.

Cada pavilhão tem a sua sala de convívio e cada bloco 1 aparelho de televisão, que funciona depois do jantar, até às 21-22 horas.

A máquina de projectar do cinema está de momento avariada, realizando-se normalmente uma sessão semanal de cinema.

11 — Assistência moral e religiosa. — Existe 1 ca- . pelão.

12 — Visitas e correspondência. — Nada de significativo há a apontar nestas áreas. Há parlatório.

13 — Ensino. — Há salas de aulas, que não funcionam por falta de professores.

14 — Assistência médico-sanitária. — Existem boas instalações de enfermaria e salas de apoio médico dotadas da aparelhagem necessária, nomeadamente radioscopia.

A assistência médica permanente é prestada por um único médico, que se desloca ao Estabelecimento 3 vezes por semana.

O Estabelecimento está dotado de um único enfermeiro.

15 — Problemas especiais. — A impressão geral recolhida da vista é que se trata de um estabelecimento com óptimas estruturas materiais e avultados investimentos em equipamento, que não estão a ser devidamente utilizados, pois que não só o número de albergados não acompanha a capacidade e potencialidades

disponíveis, como também o sofisticado equipamento instalado ou não funciona ou está subaproveitado.

Notaram-se também insuficiências nos quantitativos disponíveis do pessoal de vigilância, tendo sido referido implicar tal situação uma sobrecarga de trabalho extraordinário não remunerado àquele pessoal (médias semanais de horários de trabalho de 72/76 horas).

16 — Conclusões. — Da observação pessoal e deste relato resulta que:

1) Parte dos problemas do Estabelecimento está

relacionada com a solução originariamente adoptada da instalação de equipamentos (de segurança e oficinal), de manuseamento complexo e exigindo pessoal devidamente habilitado e de difícil recrutamento;

2) Haverá que optar entre a utilização do Esta-

belecimento nos precisos termos em que foi equipado ou entre a adopção de métodos mais convencionais de vigilância (estes últimos a título provisório ou definitivo), de modo a afastar a sobrecarga de trabalho extraordinário do respectivo pessoal, cujo trabalho extraordinário realizado deverá ser devidamente remunerado;

3) Justifica-se igualmente um aumento do nú-

mero de efectivos nas áreas de assistência social e de educação;

4) O sistema de apoio médico-sanitário não é

suficiente, aconselhando-se a admissão de 1 médico a título permanente e de mais 1 enfermeiro;

5) Ultrapassadas as questões prévias relativas à

insuficiência do pessoal de apoio, deverá encarar-se a utilização do Estabelecimento na sua plena capacidade para um racional aproveitamento dos investimentos realizados e para uma redistribuição de reclusos afectos a outros estabelecimentos localizados na área de Lisboa, com instalações de pior qualidade.

17 — Proposta. — Propõe-se que do teor deste relatório seja dado conhecimento a S. Ex." o Ministro da Justiça, à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e ao director do Estabelecimento visitado.

Relativamente a este relatório, foram recebidos os ofícios n.os 159, processo GA-20-1, de 6 de Abril de 1983, e 167, processo GA-20-1, de 19 de Abril de 1983, do Sr. Director-Geral dos Serviços Prisionais, que se transcrevem:

Em referência ao ofício em epígrafe de V. Ex.a, tenho a honra de acusar a recepção do relatório da visita do Sr. Provedor de Justiça ao Estabelecimento Prisional de Alcoentre, cutos considerandos mereceram a melhor atenção desta Direcção-Geral.

Embora nos fosse grato ver reconhecido o correcto funcionamento daquele Estabelecimento em relação às deficiências de pessoal referidas no relatório — e que esta Direcção-Geral é a maior interessada em remediar—, informamos que até este momento não foi possível superar os constrangimentos que obstam à cobertura dos concursos necessários para preenchimento das vagas existentes. Efectivamente, com a publicação da nova lei orgânica dos serviços (Decreto-Lei

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n." 208/81, de 16 de Setembro) tornou-se indispensável diploma regulador dos novos concursos, que só agora obteve a concordância da Secretaria de Estado da Função Pública, aguardando-se a sua breve publicação no Diário da República. Independentemente, porém, desde constrangimento de base, em breve resolvido, verificam-se, porém, outras dificuldades de recrutamento de determinadas categorias de pessoal, que, a man-icrem-se, não permitirão uma melhoria rápida da situação constatada. Assim sucede no caso dos enfermeiros, não tendo aparecido qualquer candidato para a vaga de Alcoentre, incluída no concurso publicado no Diário da República. 2.n série, n." 74, de 50 de Março de 1982. e ainda realizado com base cm legislação anterior ã actual lei orgânica. A vaga do lugar de médico, que não se antevê de fácil preenchimento, veriíicou-se em 1 de Maio de 1982, sendo, portanto, posterior ao concurso para recrutamento de médicos, também publicado no Diário da República, de 50 de Março de 1982.

Quanto ao pessoal do serviço social, um despacho de 23 de Dezembro de 1982 de S. E\.J o Ministro da Justiça está a permitir aos serviços prisionais atenuarem provisoriamente as carências desse sector enquanto o Instituto de Reinserção Social se encontrar cm instalação.

Em referência ao ofício em epígrafe de V. Ex.J, cumpre-me acusar a recepção do relatório da visita do Sr. Provedor de lustiça ao Estabelecimento Prisional do Vale de ludeus que agradecemos.

Embora do referido relatório ressaltem as potencialidades do Estabelecimento, cujo funcionamento não mereceu reparos dignos de relevo, interessa acentuar que a reactivação e dinamização deste serviço estão a ser feitas de forma gradual, para prevenir os sobressaltos do passado, e ao ritmo permitido pelas disponibilidades materiais existentes.

Quanto às carências de pessoal, elas serão superadas, na medida em que os constrangimentos legais o consentirem.

CAPITULO VIU Visitas a outros centros urbanos

O contacto mais directo com as populações e com os seus problemas mais específicos e mais sensíveis levou o Provedor de Justiça, desde que assumiu funções, a deslocar-se a outros distritos, a fim de proporcionar um mais fácil acesso dos cidadãos ao seu serviço quando queiram dirigir-se-lhe a expor, pessoalmente, o seu caso.

Assim, no prosseguimento desse objectivo, deslocou-se às cidades de Leiria. Santarém e Setúbal.

Leiria

Relatório da visita

No prosseguimento do seu objectivo de contacto pessoal com pessoas e instituições, dcslocou-se o Provedor de lustiça. acompanhado de 1 coordenador e de

I assessor, em 5 de Dezembro de 1982. à cidade de Leiria.

Para além das visitas realizadas ao Estabelecimento Prisional de Leiria e ao Posto Clínico dos Serviços Médico-Sociais, recebeu e atendeu os diversos cidadãos que pretenderam apresentar-lhe as suas reclamações.

Esteve ainda no Governo Civil do Distrito e na Câmara Municipal.

I) Visita ao Estabelecimento Prisional de Leiria

Esta visita pode roiular-se como um complemento actualizado de uma outra já realizada anteriormente àquele Estabelecimento no ano de 1980.

O Estabelecimento Prisional de Leiria (comummente conhecido como Prisão-Escola de Leiria) acha-se localizado na periferia da cidade, numa quinta denominada de «Lagar de EL-Rei», que ocupa uma área de 110 ha.

O Estabelecimento tem capacidade para 274 detidos, mas não se encontra de momento totalmente lotado.

Na verdade, constatou-se a existência de 43 vagas.

Trata-se de um estabelecimento prisional que — o que confirma anteriores conclusões — preenche satisfatoriamente a sua finalidade, embora com as deficiências decorrentes da sua relativa antiguidade, da carência de disponibilidades económicas para uma mais ampla acção e da falta de mais pessoal qualificado.

Na visita foi o Provedor de lustiça acompanhado pelo respectivo director do Estabelecimento, que, à medida que ela se foi desenvolvendo, prestou os esclarecimentos adequados.

Como dados de mais particular interesse podem anotar-se os seguintes:

Assistência medica e social

Os detidos do Estabelecimento Prisional de Leiria são assistidos por I médico de clínica geral permanente.

Para os casos que exigem observação e tratamento especiais, os reclusos tem sido observados por clínicos ;das respectivas especialidades, deslocando-se. se e quando necessário, ao Hospiial Distrital.

Os educadores são em número de 4.

Existem 5 assistentes sociais.

Asüisiência religiosa

Para os que dela desejem usufruir é esta garantida por sacerdote católico.

Regime do estabelecimento

0 regime c o de «prisão aberta».

1 — Actividade laboral. — Os detidos, rodos de idade compreendida entre os 16 e os 18 anos (aquilo a que no novo Código Penal corresponderá à designação de «jovens adultos»), dedicam-sc. na generalidade, a trabalhos agrícolas e oficinais.

Quanto a estes últimos, cumpre anotar que o Esta-, belecimenio dispõe de oficinas dc sapataria, serralharia civil, serralharia mecânica, tipografia, carpintaria, marcenaria e cerâmica.

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Conjuntamente com a oficina de tipografia funciona 1 de encadernação.

O Provedor de lustiça esteve presente, com elas em plena laboração, na oficina de sapataria, na tipografia e na encadernação.

A impressão foi favorável, sendo de realçar o labor dos artífices na oficina de sapataria, cujo ex líbris, lembrado por velha máxima do século xni, colocado na parede da oficina, é um incentivo à desejada recuperação psicológica dos detidos através deste tipo de trabalho: «Mestre honesto e quieto».

A tipografia e a encadernação desenvolvem actividade exclusivamente destinada a serviços oficiais, designadamente para o Ministério da lustiça (tribunais e Direcção-Geral dos Serviços Prisionais).

O trabalho é de boa qualidade.

2 — Actividade escolar. — No Estabelecimento funcionam aulas do ciclo preparatório, sendo o ensino ministrado por professores da Escola Preparatória de Leiria, segundo acordo estabelecido entre o Ministério da Educação e o Ministério da lustiça.

3 — Actividades culturais e recreativas. — Constatou-se a existência de terrenos destinados à prática do desporto: 1 campo de futebol em excelentes condições e I outro para a prática de futebol de 5 e de andebol de 7.

Não será muito, mas já alguma coisa c.

Está em curso um torneio de futebol de 11 entre detidos dos diversos pavilhões, cujos jogos se realizam aos sábados e aos domingos.

Os detidos usufruem igualmente da possibilidade de assistirem a programas de televisão.

Está para sair um jornal de inteira responsabilidade dos detidos e cujo título se pode ter como positivamente expressivo: Ressurgir.

Conclusões

A impressão final resultou positiva.

Pareceu que o respectivo Director — aliás antige magistrado do Ministério Público— é pessoa interessada, humana e aberta, qualidades especificamente requeridas para um estabelecimento prisional deste lipo.

Pareceu igualmente que os funcionários prisionais eram zelosos e humanos e de preparação profissional razoável, com destaque especial para os mestres ofi-cinais.

Não suscitou qualquer reparo o estado de higiene c de limpeza do Estabelecimento, e não ocorre razão para duvidar de que a situação nos diversos pavilhões difira — tanto mais que a visita foi realizada sem aviso prévio— daquele que, efectivamente, se visitou.

O rancho é que. embora abundante, pareceu pouco apurado, o que se deve à circunstância de não haver cozinheiro profissional (os serviços de cozinha são assegurados por 1 guarda prisional). O óbice não parece fácil de superar, dado que o vencimento que seria conferido por um profissional (cerca dc I3 000S) está longe de ser aliciante.

Pode também apontar-sc na alimentação (pelo menos, na que foi dado constar) a ausência de fruta, o que para detidos com a idade dos que se encontram no Estabelecimento Prisional de Leiria não c coisa sem importância.

Não se registaram queixas relativas à administração prisional propriamente dita.

Os delidos, isso sim, manifestaram a sua preocupação pela morosidade do andamento dos respectivos processos.

Salienta-se que terá já acontecido que em vésperas da data do regresso à liberdade seja o detido surpreendido com a notícia de que essa libertação já não ocorre ... por, entretanto, haver surgido um outro processo.

Facilmente se percebem os reflexos negativos deste condicionalismo no estado psicológico dos detidos, o que. aliás, foi veementemente salientado pelo próprio director do Estabelecimento.

Um outro aspecto focado e que eventualmente justificará até. para sua abordagem, a abertura dc um processo de iniciativa do Provedor, c o de não beneficiarem de liberdade condicional nem do regime de saída precária os detidos que. embora estivessem, de facto, em condições de beneficiarem daqueles regimes, têm ainda os respectivos processos pendentes de recurso.

Noia final

Permaneceu a ideia de que o Estabelecimento Prisional de Leiria — e releve-se que a designação tradicional de «Prisão-Escola» pareceria mais adequada ao seu escopo e às suas características — pode vir a melhorar gradualmente com um adequado apoio económico.

Por coincidência, aquando da visita, ocorria uma reunião do respectivo conselho administrativo para estudo das perspectivas resultantes da execução do PIDAC, com incidência especial no plano da melhoria do equipamento e no da preparação profissional dos detidos.

Um e outro aspecto parecem de grande interesse, pois do progressivo aumento das possibilidades do Estabelecimento não deixará de resultar, a curto prazo, a desejada recuperação da sua população prisional, aliás de algum modo circunscrita a indivíduos de perigosidade menos acentuada e condenados a penas de relativamente curta duração.

II) Visita ao posto clínico dos Serviços Médico-Sociais

Não se logrou, infelizmente — por falta de disponibilidade de tempo—, realizar esta visita na hora de atendimento do público, o que teria possibilitado não só a verificação directa do movimento do posto, como também a qualidade daquele atendimento.

De todo o modo. e com a colaboração da funcionária que se encontrava presente, pôde o Provedor dc lustiça aperceber-se do elevado movimento do posto clínico e da impossibilidade de se evitarem as habituais morosidades na marcação das consultas.

O posto tem a colaboração clínica de médicos especialistas (v. g.. pediatria, obstetrícia e ginecologia) e de médicos de clínica geral, em número global de 40. número esse que, contudo, se tem revelado insuficiente.

Bastará relevar o facto de nos dias de atendimento, em especial às segundas-feiras, terças-feiras e quinias--íeiras, se chegarem a passar 400 senhas por dia.

A situação deste posto e dos congéneres, a manter-se o óbice em causa, terá de merecer toda a directa atenção da Secretaria de Estado dc Saúde e, indirectamente, a do próprio Ministério dos Assuntos Sociais.

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sem esquecer a iniciativa do próprio Provedor de Justiça, no sentido de se obter uma solução satisfatória e que poderá passar, primacialmente, pelo desdobramento de postos e horários.

Ill) Visitas ao Governo Civil e à Câmara Municipal

Para além do carácter protocolar que possa apontar-se a estas visitas, a verdade é que o Provedor de Justiça as aproveitou para salientar junto daquelas entidades a finalidade da sua função e a colaboração que é lícito esperar para resolução dos problemas que ocorrem no campo da administração local e que constituem mesmo um sector qualitativa e quantitativamente muito importante na actividade normal do Serviço do Provedor de Justiça.

IV) Atendimento de cidadãos e apresentação de reclamações

Era este o objectivo fundamental da visita.

Tal carácter decorre da extrema importância de uma relação pessoal e directa entre o Provedor de Justiça, na sua qualidade de zelador dos interesses dos administrados e cidadãos em geral, e as pessoas que através dele pretendem buscar as soluções céleres ou adequadas.

Para recepção desses cidadãos, seu atendimento e recolha das suas queixas teve o Provedor de Justiça à sua disposição um gabinete próprio no Palácio dc Justiça de Leiria, graças a penhorante amabilidade do seu juiz presidente.

O número de cidadãos que se apresentaram e, consequentemente, das reclamações recebidas não foi muito elevado: cerca de 20. Entretanto, e atendendo ao desiderato traçado, não foi por isso menos significativo.

Entidades que colaboraram e se contactaram na visita à cidade de Leiria:

No Tribunal |udicial da Comarca de Leiria:

Juiz presidente, Dr. Jose Magalhães, luízes:

Dr. Joaquim José de Sousa Diniz. Dr. António Bernardino. Dr. Armindo Monteiro. Dr. João Coroeiro.

Procurador da República, Dr. Adelino Lopes. Delegados do procurador da República:

Dr. José Nunes Gonçalves de Carvalho. Dr.3 Maria Hortênsia Pereira Marques. Dr.3 Maria Olímpia Pimentel.

Secretário judicial, Escarameia Calha.

No Governo Civil:

Governador civil, Dr. Garcia da Fonseca. Secretário, Dr. Almeida Trindade.

Na Câmara Municipal:

Presidente da Câmara, Dr. Carlos dos Sanlos Pimenta.

No Estabelecimento Prisional de Leiria: Director. Dr. Castro.

No posto clínico dos Serviços Médico-Sociais: Funcionária Ana Marques Bernardo.

Santarém -

Relatório da deslocação

1—No dia 7 de Dezembro de 1982 deslocou-se a Santarém o Provedor de Justiça, acompanhado de um coordenador e de uma assessora do seu Serviço.

2 — Após troca de impressões com o juiz presidente do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, que amavelmente cooperara na preparação da visita, e o procurador da República, foram atendidos 10 reclamantes, que previamente se tinham inscrito para audiência.

Das reclamações apresentadas, duas diziam respeito a processos já a correr termos no Serviço do Provedor de Justiça.

3 — Ao fim da manhã foram apresentados cumprimentos ao Sr. Governador Civil do Distrito de Santarém, com quem se debateram diversos problemas da administração local, sobretudo das instituições de segurança social existentes na cidade de Santarém.

4 — A tarde foi feita uma visita ao Lar dc S. Domingos.

E o antigo albergue distrital da Polícia de Segurança Pública e está agora na dependência da Secretaria de Estado da Segurança Social. Destina-se ao acolhimento de pessoas carenciadas da chamada «terceira idade».

Neste momento tem 100 internados, sendo 21 mulheres e 79 homens. A maior parte dos internados tem mais de 60 anos e sofre de anomalias mentais.

O Lar está instalado na Quinta das Fontainhas, que tem 23 ha.

As instalações apresentavam-se em razoável estado de limpeza, o que não acontecia com alguns dos homens internados, cujo vestuário estava pouco cuidado.

A alimentação afigurou-se ser adequada, tendo em conta o que foi observado, a opinião de alguns residentes e as ementas que nos foram mostradas e que são aprovadas pelo médico e dois delegados dos utentes. Parte da fruta e dos vegetais c fornecida pela própria Quinta.

A cozinha e o refeitório têm aspecto agradável e acham-se bem equipados.

O Lar dispõe de um médico, que faz assistência permanente, e de um enfermeiro.

Os funcionários ao serviço do Lar são considerados em número insuficiente, ainda que recentemente as condições tenham melhorado com a admissão de nove contratados a prazo.

Detectaram-se alguns problemas de descontentamento do pessoal por o quadro da instituição ainda não ter sido aprovado e haver funcionários subquali-licados relativamente às funções que desempenham.

A visita foi guiada por um funcionário administrativo, que, na ausência da pessoa que actualmente dirige o Lar, prestou com solicitude todos os esclarecimentos que lhe foram pedidos.

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5 — Houve uma deslocação à Câmara Municipal de Santarém para contactar com o seu presidente, mas este não estava presente, devido a compromissos inerentes às suas funções.

6 — A visita à cidade de Santarém terminou coro nova troca de impressões no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, então com todos os magistrados que naquele exercem funções, aos quais foi oferecido o último relatório deste Serviço.

Entidades contactadas durante a visita:

No Tribunal Judicial da Comarca de Santarém:

Inspector judicial, desembargador Dr. Pedro Marçal Mendes;

Juiz do I." Juízo, Dr. Pereira Baptista;

Juiz do 2." Juízo, Dr. Eduardo Gomes Marques;

Juiz do 3." Juízo. Dr. Sérgio Poças; Juiz estagiário Dr. António Geraldes; Juiz estagiário Dr. Alberto Alvoeiro; Delegado do procurador da República no

1.° Juízo, Dr. Francisco Martins Guerra; Delegado do procurador da República no

2." luízo, Dr.3 Maria Clara Rodrigues; Delegado do procurador da República no

3." Juízo, Dr. Firmino Falcão; Secretário judicial. José Videira;

No Governo Civil:

Governador civil, Dr. Pena Monteiro;

No Lar de S. Domingos:

Funcionário Altamirando do Rosário: Fiel de armazém; Irmã assistente: Cozinheira;

Terapeuta ocupacional; Fisioterapeuta; Diversos internados.

Setúbal

Relatório da visita

Na sequência de outras visitas já efectuadas a algumas capitais de distrito com vista a um mais estreito contacto com os cidadãos e a um conhecimento pessoal das entidades que dirigem os departamentos em que a sua actividade com mais frequência interfere, e no pressuposto de que isso facilita inegavelmente a colaboração que é necessária, sem descurar igualmente os organismos que localmente se dedicam a prestações de segurança social, o Provedor de Justiça, acompanhado de um coordenador e de um assessor, efectuou no dia 10 de Dezembro de 1982 uma visita à cidade de Setúbal.

Oesdobrou-se esta visita em três partes: atendimento de reclamações, audiências com o presidente da Câmara Municipal e o governador civil e, por fim, visita a algumas instituições de fins sociais.

<| Atendimento de reclamações

Em resultado do anúncio na imprensa da visita do Provedor de Justiça a Setúbal, encontravam-se inscritos para apresentarem pessoalmente os seus casos

13 reclamantes, dos quais apenas 11 estiveram presentes, tendo sido recebidos numa sala cedida para o efeito pelo respectivo Tribunal Judicial.

Desses 11 reclamantes, alguns já tinham processos no Serviço do Provedor de Justiça, pretendendo uns que os mesmos fossem revistos e outros conhecer o respectivo andamento; 2 apresentaram casos pendentes em juízo e apenas os restantes colocaram questões novas levantadas no âmbito da Administração Pública.

II) Audiência com o presidente da Câmara Municipal

Procurou-se nesta audiência sobretudo colher informações, ainda que sumárias, sobre eventuais carências verificadas a nível social e identificar os organismos que, virados para a cobertura dessas carências, fossem considerados mais significativos.

O presidente da Câmara fez uma breve descrição das instituições dc natureza social e educativa, e sublinhou que, embora tenha vindo a aumentar o número de organismos de apoio à infância, ainda apenas 50 % das crianças se encontram abrangidas por esse apoio.

Salientou também que se faz sentir ainda a falta de duzentas salas de aula para o ensino primário.

Foi sublinhado igualmente que existem 4 ou 5 instituições de apoio à terceira idade ligadas à Misericórdia, como o Asilo de Paula Borba, que se encontram superlotadas.

A par dessas, foram indicadas outras instituições criadas por iniciativa de comissões de moradores, com a colaboração da Câmara, designadamente através da cedência de terrenos, as quais se encontram a ser subsidiadas pela segurança social.

No aspecto da saúde, foi vincado o problema de deficiência em matéria de exames radiológicos, cujas estruturas são de âmbito distrital.

Por fim, o presidente da Câmara acentuou que, de uma maneira geral, se tem vindo a constatar uma melhoria qualitativa nas estruturas que se dedicam a objectivos de carácter social.

III) Audiência com o governador civil

Nesta audiência, o governador civil fez um relato sumário das condições económicas e sociais do distrito, realçando que ele não é daqueles em que mais se faz sentir a carência de instituições de apoio social.

Foi aproveitada a ocasião para ventilar alguns casos que pendem no Serviço do Provedor de Justiça, em que houve intervenção do Governo Civil.

IV) Visita a algumas instituições de apoio social

a) Liga de Apoio à Terceira Idade

Trata-se de uma instituição inaugurada em 1982, criada por iniciativa de uma comissão de moradores, sob a forma de associação, cujas instalações foram erguidas em terreno cedido pela Câmara Municipal, com equipamento adquirido mediante financiamento dos associados e junta de freguesia, além de outros subsídios.

As suas despesas de funcionamento são subsidiadas pelo Centro Regional de Segurança Social de Setúbal.

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Funciona apenas como centro de dia, se bem que disponha de instalações para internamento. Só que aquele Centro Regional não subsidia o internamento c a Liga não dispõe de meios financeiros para o efeito.

O pessoal da Liga é o seguinte:

Presidente;

Vice-presidente;

Tesoureiro:

Directora técnica — psicóloga:

5 ajudantes;

Cozinheira;

Auxiliar terapêutica (a tempo parcial): Funcionário de secretaria.

As estruturas desta instituição, como centro de dia. comportam 45 idosos, dispondo ainda de condições para outras 45 pessoas cm internamento, conquanto este não funcione por falta de verbas.

Concede ainda 10 apoios domiciliários.

No que se reporta à ocupação de tempos livres, duas notas se jdga de acentuar: por um lado. a existência de uma pequena oficina de carpintaria, que, embora rudimentar, ocupa alguns idosos: por outro, a actividade de outros idosos a introduzir em embalagens determinados artigos destinados ao mercado, mediante o pagamento de certa quantia despendida pela empresa interessada. 50 % da qual reverte para o idoso e os restantes 50 % para a Liga.

A Liga possui também um centro de infância, que comporta 65 crianças dos 5 aos 14 anos de idade, sob a modalidade de ocupação de tempos livres.

b) Asilo dc Paula Borba

Este Asilo, que pertence à Misericórdia, contém, actualmente, 86 internados, tendo, no entanto, dimensão para 94 idosos.

Ê financiado pelo Centro Regional de Segurança Social.

O seu pessoal c o seguinte: Directora;

5 ajudantes de internato: 2 cozinheiras;

2 ajudantes de cozinha: 4 auxiliares de cozinha;

6 auxiliares de limpeza;

I enfermeira (part-tiine);

1 medica (5 dias por semana):

4 empregadas de costura.

VerilicoLi-sc a existência de camaratas de dimensões regulares, lace às 4 ou 5 camas que. no máximo, cada uma continha.

Os idosos têm banho diário.

As suas refeições principais compõem-se. ao pe-qucno-almoço, de café ou chá. leite e pão com manteiga: ao almoço, de sopa e um prato, e ao jantar, de um prato. Há fruta em dias alternados e doce às quintas-feiras e domingos.

A única nota negativa que foi dado apreciar consiste na urgente necessidade de obras na sala de refeições e tempos livres, de maneira a conferir-lhe um ambiente acolhedor.

Sucede, porém, que a Misericórdia não dispõe de verbas para o efeito.

Entidades contactadas pelo Provedor de lustiça:

Governador civil, Quintão Caldeira:

Presidente da Câmara Municipal. Francisco Rodrigues Lobo; Direcção da IA Tl:

Presidente. Sertório Henera. Vice-presidente, Júlio Costa: Tesoureiro. Alvaro Cardoso; Directora psicóloga. Maria Odete;

Director do Asilo de Paula Borba. Beatriz Mestre; luízes:

Dr. Luís António Reininho: Dr. Ernesto António Garcia Calejo: Dr. |osé Damião Mariano Pereira: Dr. |osé Azadinha Loureiro;

Chefe de secretaria judicial, losé Fernando Correia.

Em conclusão, posso afirmar que através das deslocações do Provedor de lustiça a outros centros urbanos se tem conseguido uma maior divulgação não só da instituição, como do campo da sua actuação.

Aliás, tal insere-se no âmbito das atribuições estabelecidas por lei. na medida em que compete ao Provedor promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais, bem como da finalidade do Serviço do Provedor de justiça, dos meios da sua acção e de como se pode recorrer ao seu serviço [cf. alínea d) do artigo 18." da Lei n." 81/77. de 22 de Novembrol.

CAPÍTULO IX

Outros aspectos da actividade do Provedor de Justiça

Ao longo do ano outros aspectos da actividade do Provedor de lustiça merecem registo. Assim:

A) Conselho de Estado

Em consequência da revisão da Constituição da República de 1976 pela Lei Constitucional n." 1/82. promulgada em 24 de Setembro e publicada em 50 do mesmo mês. foi criado o Conselho de Estado, que é o órgão político dc consulta do Presidente da República (Constituição da República, artigo 144."). que substituiu o Conselho da Revolução.

Desse órgão passou a fazer parte como membro, por inerência de funções, o Provedor de lustiça tcf. artigo 145.").

A primeira reunião do referido Conselho teve lugar em 29 de Dezembro de 1982 e destinou-se a preparar a elaboração do respectivo regimento.

B) Assembleia da República e Provedor de Justiça

A solicitação do Presidente da Assembleia da República, foi elaborada pelo adjunto do Provedor de

lustiça a seguinte síntese concernente às relações entre as duas instituições.

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I) Situação anterior à Constituição de 1976

Criada a instituição do Provedor de lustiça pelo Decreto-Lei n." 212/75. dc 21 de Abril, a designação do seu titular cabia, no âmbito desse diploma (artigo 2.", n." I). ao Presidente da República, isto porque a assembleia de deputados do povo então em Junções tinha apenas poderes constituintes.

II) Regime jurídico actual

Sendo embora o Provedor de lustiça um órgão público independente, entre ele c a Assembleia da República existe — de acordo, aliás, com a configuração originária c mais difundida da instituição dos ombudsmen — uma relação muito especial, cujas principais facetas a seguir se sintetizam.

1 — Designação

A Constituição de 1976 consagrou a instituição do Provedor de lustiça. determinando que a sua designação se passaria a fazer por eleição da Assembleia da República [artigos 24.", n." 3, c 166.", alínea d)].

Este sistema veio a ser confirmado pelo Estatuto do Provedor de lustiça (Lei n." 81/77. de 22 dc Novembro, artigo 4.". n." I).

O segundo c o terceiro titulares deste cargo foram já designados por esta forma.

A eleição do Provedor deve recair em pessoa que preencha os requisitos dc elegibilidade para a Assembleia da República (Estatuto do Provedor de lustiça. artigo 4.". n." 2).

As candidaturas para esse cargo são apresentadas por um mínimo de 10 e um máximo de 30 deputados (Regimento da Assembleia da República, artigo 241."). É eleito, em primeiro escrutínio, o candidato que obtiver mais dc metade dos votos validamente expressos: se nenhum conseguir (al resultado, procede-sc a segundo escrutínio entre os dois candidatos mais votados (idem. artigo 242.°).

Uma vez eleito, o Provedor toma posse perante o Presidente da Assembleia da República (Estatuto do Provedor de lustiça, artigo 4.". n." I).

Nos trabalhos da revisão constitucional em curso foram feitas propostas no sentido de o Provedor passar a ter de ser eleito por uma maioria qualificada de dois terços.

2 — Mandato

u) Duração

Embora o mandato do Provedor não coincida necessariamente com o dos deputados, a sua duração corresponde à do destes — 4 anos, renovável por uma vez (Estatuto do Provedor dc lustiça, artigo 5°. n." 1).

Ter-se-á. deste modo. procurado proporcionar uma correspondência tendencial entre a pessoa do Provedor c as correntes de opinião majoritárias entre os representantes do povo.

Essa correspondência não c. porém, automática nem absoluta, pois o início e o termo do mandato

do Provedor não se conjugam com os dos deputados, nem a dissolução da Assembleia da República, por exemplo, releva a respeito da subsistência daquele.

b) Cessação

O artigo 12." do Estatuto do Provedor dc lustiça |n." I, alínea d), e 5| prevê que o Provedor possa ser destituído pela Assembleia da República, nos (ermos definidos no Regimento desta.

Este último diploma não contem, todavia, qualquer norma regulamentar acerca dessa faculdade de des-lituição. o que parece retirar viabilidade prática ao referido instituto. Trata-se, aliás, de regra de muito duvidosa constitucionalidade, na medida em que é susceptível de afectar a independência reconhecida ao Provedor pelo artigo 24." da Constituição.

A sua eliminação será provavelmente proposta no projecto de alterações do Estatuto do Provedor dc lustiça em estudo.

Nas outras formas previstas dc cessação antecipada do mandato do Provedor intervém a Assembleia da República, quer aceitando a sua renúncia | Estatuto do Provedor de lustiça. artigo 12.", n."s I. alínea e). e 2|, quer verificando a sua morte ou impossibilidade física permanente, a perda dos requisitos de elegibilidade para a Assembleia da República ou a incompatibilidade superveniente [Estatuto do Provedor de lustiça. artigo 12.". n."" I. alíneas a), b) e c). e 4|.

3 — Independência

O Provedor é. nos lermos da Constituição (artigo 24.") e do seu Estatuto (artigo 6."). um órgão público independente.

Não está, assim, subordinado a qualquer outra entidade pública, incluindo a Assembleia da República, nem, por isso. sujeito a obedecer a ordens ou instruções de outros órgãos públicos.

Nisto se distingue dos ombiidsmen dc alguns países, relativamente aos quais o parlamento pode emitir instruções genéricas de actuação, lí esse o caso, por exemplo, da Suécia e da Finlândia, muito embora tal procedimento venha caindo progressivamente em desuso.

4 — Estatuto pessoal

O estatuto pessoal do Provedor aproxima-se. cm alguns aspectos, do dos .deputados à Assembleia da República.

Isto conquanto, no que respeita a «honras, direitos, categoria, remunerações c regalias», ele esteja equiparado a ministro.

A referida similitude de regime manifesta-se, sim, sobretudo no que se reporta a imunidades, protecção penal e identificação.

a) Imunidades

Movido procedimento criminal contra o Provedor pela prática> de qualquer crime e indiciado ele por despacho de pronúncia ou equivalente, o processo

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só segue seus termos, salvo se ao facto corresponder pena maior, se a Assembleia da República o suspender do exercício das suas funções (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 7.°, n.° 1).

Além disso, o Provedor não pode, excepto por crime punível com pena maior e em flagrante delito, ser preso ou detido sem autorização da Assembleia da República (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 7.°, n.° 2).

b) Protecção penal

O Provedor de Justiça está equiparado a deputado, para efeitos de tipificação dos crimes previstos nos artigos 164.°, 166.°, 167.°, § único, 168.°, §§ 1.° e 2.°, e 181.° do Código Penal (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 16.°, n.° 2).

c) Identificação

O Provedor tem direito a cartão especial de identificação, assinado pelo Presidente da Assembleia da República (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 13.", n.° 1).

5 — Transmissão de queixas

Em certos países — França e Reino Unido, por exemplo — os ombudsmen só podem receber queixas através dos membros das instituições parlamentares, não as podendo aceitar directamente dos cidadãos, nem actuar por iniciativa própria.

Não é esse, porém, o regime que corresponde à configuração originária e mais generalizada deste tipo de órgãos.

O Provedor de Justiça integra-se nesta corrente dominante, podendo actuar por iniciativa própria (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 22.°) e receber directamente queixas dos cidadãos (idem, artigos 22.° e 23.°).

Mas existe disposição específica (o artigo 24." do Estatuto do Provedor de Justiça) prevendo que a Assembleia da República, as comissões parlamentares e os deputados podem solicitar ao Provedor a apreciação de petições ou queixas que lhes sejam comunicadas. Tanto a Assembleia da República como as suas comissões têm a faculdade de solicitar ao Provedor urgência no tratamento das queixas que lhe transmitam.

6 — Providências típicas da competência do Provedor

O Provedor de Justiça não tem, como, de resto, sucede com a maioria das instituições congéneres, poderes decisórios no tratamento das queixas que lhe são submetidas (Constituição, artigo 24.°, n.° 1, e Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 2.°).

Tem ao seu dispor, todavia, um conjunto de providências de outra natureza, das quais algumas têm necessária conexão com os poderes e funcionamento da Assembleia da República, e outras podem também assumir essa eficácia.

a) Providências necessariamente correlacionadas com a competência da Assembleia da República

a.l) Relatório anual. — O Provedor deve enviar anualmente à Assembleia de República um relatório das suas actividades, a publicar no respectivo Diário, do qual constem «as iniciativas tomadas, as queixas recebidas, as diligências efectuadas e os resultados obtidos» (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 21.°, n.° 1).

A lei não especifica quais as finalidades da apresentação do relatório do Provedor.

Ele não estará, propriamente, tendo em conta a independência do Provedor, sujeito à aprovação da Assembleia da República.

Mas a sua apreciação e discussão na Assembleia da República permitem a esta ajuizar dos resultados obtidos e sobretudo utilizar, com base nele, o seu poder de controle político sobre os actos do Governo e da Administração e acerca da forma como estes cumprem a Constituição e as leis [Constituição, artigo 165.°, alínea a)].

a.2) Relatórios especiais. — Como não tem poderes decisórios, o Provedor não pode emitir ordens a que a Administração deva obedecer nem tem a faculdade de anular, revogar ou modificar os actos desta.

Se, porém, a Administração não acatar as suas recomendações ou, por outra forma, recusar a colaboração que lhe deva prestar, nomeadamente em termos de prestação de informações e envio de processos e outros documentos (Estatuto do Provedor de fustiça, artigos 16.° e 27.°), o Provedor pode, se a urgência ou a importância do caso o justificarem, dirigir à Assembleia da República relatórios especiais em que exponha os motivos das suas tomadas de posição (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 34.°, n.° 3).

a.3 — Participação nos trabalhos das comissões parlamentares. — A fim de tratar de questões da sua . competência, o Provedor pode tomar parte nos trabalhos das comissões parlamentares quando o julgue conveniente e sempre que aquelas solicitem a sua presença (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 21.°, n.° 2).

Não existe, porém — ao contrário do que sucede em alguns outros países, e constava, por exemplo, do projecto de constituição do CDS —, uma comissão parlamentar específica para assegurar as relações entre a Assembleia da República e o Provedor.

a.4) Pareceres à Assembleia da República. — A Assembleia da República pode solicitar ao Provedor a emissão de pareceres sobre quaisquer assuntos relacionados com a sua competência [Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 18.°, n.° 1, alínea c)].

b) Providências eventualmente relacionadas com a competência da Assembleia da República

6.1) Recomendações legislativas. — O Provedor pode formular aos órgãos do poder legislativo — portanto, também à Assembleia da República — recomendações acerca da emanação de novas leis ou de revogação, modificação ou interpretação das vigentes ÍEstatuto do Provedor de Justiça, artigo I8.ü, r.° 1. alínea b)].

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b.2) Apreciação da inconstitucionalidade das leis. — No âmbito da apreciação superveniente da inconstitucionalidade por acção de quaisquer normas —portanto, também de regras contidas em leis da Assembleia da República—, o Provedor é uma das 5 entidades que podem pedir ao Conselho da Revolução que aprece e declare a ex;stência de tal vício (Constituição, artigo 281.", e Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 18.", n,° 2).

Nos trabalhos de revisão da Constituição tem sido alvitrada a concessão ao Provedor de poderes para • ntervir também acerca da inconstitucionalidade por omissão, recomendando a emanação de legislação im-tiosta pela lei fundamental.

6.3) Recomendações ou reparos em matéria administrativa. — O Provedor não tem, por princípio, poderes de controle ou fiscalização em relação aos órgãos de soberania, entre os quais a Assembleia da República (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 20.°, n." 2).

Não lhe é facultado, por isso, intervir a respeito dn actividade política própria desses órgãos, nem emitir apreciações a tal respeito.

Parece não estar excluído, porém, que possa utilizar os seus normais poderes de recomendação ou reparo acerca da actividade meramente administrativa dessas instituições — por exemplo, no tocante ao recrutamento, provimento e outros aspectos do estatuto do respectivo pessoal. Na verdade, aquele citado preceito, ao excluir os órgãos de soberania da competência do Provedor, ressalva a «sua actividade administrativa».

7 — Estruturas administrativas e financeiras

a) Orçamento

Um dos aspectos da independência do Provedor íraduz-se em que o respectivo Serviço goza de autonomia administrativa e financeira (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 38.°, n." 2, e Lei n.° 10/78, de 3 de Março, artigo 2.").

Correlativamente, e para assegurar a sua não dependência do Executivo, o orçamento do Serviço do Provedor de Justiça consta de verba inscrita no orçamento da Assembleia de República (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 41.°, n.° 2, e Lei n.° 10/78, ar-tigo 13.°, n.° 1).

b) Serviços sociais

O pessoal do Serviço do Provedor de Justiça pertence aos Serviços Sociais da Assembleia da República (Estatuto do Provedor de Justiça, artigo 24.°).

Ill) Aplicação prática do regime respeitante às relações entre a Assembleia da República e o Provedor

1—Transmissão de queixas

Tem sido muito reduzido —e isto talvez devido à facilidade de acesso directo à instituição — o número de queixas transmitidas ao Provedor por deputados.

Da Assembleia da República, como tal, ou das suas comissões parlamentares, assinala-se mesmo que jamais foram recebidas quaisquer queixas.

2 —Relatórios anuais

Até à data foram apresentados à Assembleia da República 5 relatórios do Provedor de Justiça, respeitantes aos anos de 1976 a 1980.

O referente a 1981 será muito brevemente apresentado, encontrando-se em fase de conclusão e trabalho dactilográfico.

Tem-se verificado, de ano para ano, um tratamento progressivamente mais desenvolvido, por parte da Assembleia da República, destes relatórios. Assim, se os relatórios de 1976 e 1977 não foram pela Assembleia da República especificamente analisados, o segundo deu já azo a que alguns deputados formulassem perguntas ao Governo, suscitadas por recomendações do Provedor que não haviam tido seguimento por parte da Administração.

Porque se afigurou que seria importante uma apreciação específica mais cabal dos seus relatórios, o Provedor de Justiça, no ofício de apresentação do de 1978, solicitou expressamente que o mesmo fosse es-ludado, discutido e criticado pelos deputados. Assim passou a suceder a partir desse ano, tendo vindo a apreciação dos relatórios do Provedor a ser agendada na ordem do dia do plenário da Assembleia da República e a merecer por parte desta uma discussão gradualmente mais desenvolvida.

3 — Relatórios especiais

Até à data foram apresentados apenas 3 relatórios especiais à Assembleia de República, 2 em 1981 e outro já em 1982.

Um dos de 1981 dizia respeito a uma punição disciplinar aplicada a um agente da PSP e que o MA1 se recusou reiteradamente a revogar, apesar de a mesma se fundamentar em aspectos da vida particular conjugal do arguido, relativamente aos quais, aliás, ele fora ilibado de culpa na sede própria, em tribunal de família.

O outro reportou-se à suspensão, decretada em 1977 pelo Ministério da Agricultura e Pescas, da comissão administrativa de um ex-grémio da lavoura, sem que aquele departamento se haja disposto até 1981 a decidir definitivamente a situação dos membros desse órgão.

O apresentado em 1982 refere-se a actos antidis-ciplinares de um elemento com funções de chefia do Centro de Educação Especial de Lisboa, caso em que só depois de muita insistência do Provedor foi mandado instaurar procedimento disciplinar, e que foi arquivado pelo Secretário de Estado da Segurança Social, por ter considerado a infracção prescrita. O Provedor contestou esta decisão, mas o SESS só veio de novo a pronunciar-se quando, então sim, tal responsabilidade, de facto, já prescrevera.

4 — Participação em trabalhos das comissões parlamentares

A participação do Provedor em trabalhos das comissões parlamentares apenas se efectivou até ao presente a propósito da preparação das Leis n.° 81/77 e 10/78.

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Como sc refere no relatório de 1977 (pp. 7 e 50), a elaboração desses diplomas resultou de projectos apreciados na Comissão dos Assuntos Constitucionais, com a presença do Provedor de lustiça.

5 — Pareceres à Assembleia da República

Esta actividade consultiva não foi ainda exercida.

6 — Recomendações legislativas

O Piovedor fez, desde o início do funcionamento da instituição, cerca de uma vintena de recomendações legislativas à Assembleia da República.

Tais recomendações tiveram os seguintes objectivos:

Regulação de ocupações e despejos de casas de habitação (relatório de 1976. p. 24). — Foi emanada em |ulho de 1977 legislação sobre a matéria, mas da autoria do Governo:

Colocação em lermos de igualdade dos cônjuges separados de lacto em matéria de imposto complementar (relatório de 1977. p. 75). — Situação regulada em lermos mais adequados por diploma governamental, em alteração do Código do Imposto Complementar, e em execução de autorização legislativa conferida pela lei que aprovou o orçamento de 1980:

Estabelecimento de sanções para suspensão ilegal de trabalhadores (relatório de 1978. p. 17).— Remessa às Comissões Parlamentares do Trabalho e de Direitos, Liberdades e Garantias.

Eliminação de discriminações em maléria Je regulamentação do trabalho no âmbito das entidades públicas, designadamente no tocante a remunerações (relatório de 1978, p. 17). —Sequência desconhecida;

Execução do artigo 30." da Lei n." 80/77, de 13 de Abril, permitindo efectivamente o pagamento de dívidas a entidades públicas com lítulos de indemnização de empresas nacionalizadas (relatório de 1978. p. 28). — Satisfeita parcialmente através da Lei n." 28/78, de 9 de )unho, no tocante ao pagamento de impostos direclos;

Publicação de legislação que protegesse os inqui.-linos mais idosos ou antigos contra os despejos consequentes de vendas de prédios em propriedade horizontal (relatório de 1978. p. 157).— Contemplada na Lei n." 55/79. de 15 de Setembro;

Alteração do regime de limites etários máximos para a adopção plena (relatório de 1979 p. 25). — Remessa à Comissão de Direitos. Liberdades e Garantias;

Modificação do regime das taxas da radiodifusão, designadamente a respeito dos não possuidores de receptores de rádio, dos detentores de mais do que um contador de electricidade dos su/dos-mudos (relatório de 1979, p. 26). — Informou a Assembleia da República em 1981 não estar a ocupar-se do assunto:

Reforma do regime dc defesa dos solos com apti dão agrícola (relatório de 1979. p. 28). — Publicada nova legislação, mas de origem governamental. Diploma recente, também de c-rigeir.

governamental, relativo à utilização de terrenos para expansões urbanas (Decrelo-Lei n." 152/ 82) veio. todavia, comprometer parcialmente aqueles objectivos:

Exercício do direito dc voto por parte de presos em regime de prisão preventiva (relatório de 1980, p. 23). — Foi recentemente aprovada na generalidade na Assembleia da República uma proposta de lei sobre eleições autárquicas (n.J 81/11) que contempla esta maléria;

Concessão, a pessoas que perderam a cidadania por força da independência das ex-colónias, da faculdade de optarem pela nacionalidade portuguesa (relatório de 1980, p. 23). — Não consagrada na nova lei da nacionalidade (Lei n." 37/81. de 3 de Outubro);

Garantia da igualdade entre as várias confissões religiosas em maléria de impostos (relatório dc 1980. p. 26). — Remessa à Comissão de Direitos. Liberdades e Garantias:

Salvaguarda do normal funcionamento do Conselho de Informação da RTP (relatório de 1980. p. 39). — Medidas legislativas e de aplicação posteriores vieram proporcionar a retomada do normal funcionamento desse órgão;

Modificação da Lei n." 14/79. artigo 21." (eleições para a Assembleia da República), permitindo expressamente o recurso para o Supremo Tribunal de lustiça das decisões das relações em matéria de contencioso eleitoral (recomendação de 1981). — Desconhecido o seguimento na Assembleia da República desta recomendação (que. todavia, foi publicada no Diário respectivo). Recomendação paralela dirigida ao Governo obteve desle a resposta de que a questão seria apreciada no âmbito da preparação de nova legislação eleitoral:

Revogação da Resolução n." 180/80. de 2 de lunho. que ratificou o Decreio-Lei n." 556/79. de 31 de Agosto, que determinou que a invocação da mera conveniência de serviço seria bastante para fundamentar os actos de exoneração e transferência de elementos do sector público designados no exercício de poderes discricionários (recomendação de 1981). — Sequencia desconhecida;

Alargamento da permissão, contida no artigo 50.' da Lei n." 80/77. do pagamento de impostos com títulos de indemnização de empresas nacionalizadas a tributos relativos aos anos em que sejam efectivamente distribuídos lais lítulos (recomendação de 1981).— Remessa aos grupos parlamentares:

Criação de legislação que permita responsabilizar, civil e criminalmente, os autores de ilegalidades detectadas em inspecções às autarquias locais realizadas através dos serviços tutelares do Ministério da Administração Interna (recomendação de 1981). — Sequência desconhecida;

Consideração em futuras leis de amnistia das dúvidas de interpretação surgidas a propósito da aplicação da Lei n." 5/81, de 13 de Março, quanto a infracções em matéria de tranjpo/tcs (recomendação de 1982).— Indicação de que a recomendação seria tida em conta. Crê-se que o foi. de facio. na recente lei de amnistia ainda não publicada.

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Embora não se tratasse propriamente de recomen-ção legislativa, merece ainda referencia, neste capítulo. a queixa que levou o Provedor a pôr à Assembleia díi República c aos demais órgãos de soberania com competência em matéria legislativa o problema da insegurança por vezes resultante para os cidadãos da frequente publicação de rectificações aos textos dos diplomas legais. Tanto da Assembleia da República como dos demais órgãos contactados se obteve resposta de que procurariam evitar, tanto quanto possível, ¿i verificação de casos desses.

1— Pedidos de declaração de inconstitucionalidade

O Provedor formulou aié agora 3 pedidos de declaração dc inconstitucionalidade relativos a leis.

Apenas dois, porém, se reportaram a leis emanadas pela Assembleia da República instituídas pela Constituição de 1976: um relativo ao n." 3 do artigo 195." da Lei n." 85/77, de 13 de Dezembro (relatório de 1980, p. 82). regulador da antiguidade relativa dos magistrados vindos das ex-colónias, e o outro ao n." 1 do artigo 21." da Lei n." 14/79. de 16 de Maio (idem. p. 76). quanto ao contencioso eleitoral.

A nenhum desses pedidos veio a corresponder declaração de inconstitucionalidade.

Os restantes reportaram-se às seguintes normas legais:

Lei n." 2144. de 29 dc Maio de 1959. base x. n." 3; obrigatoriedade de inscrição de certos associados nas casas do povo (relatório de 1978, p. 60.— Pedido não aceite pelo Conselho da Revolução:

Lei n." 2098. de 29 de Julho de 1959, base xxix: proibição de os que adquirem a nacionalidade por naturalização ou casamento ingressarem na função pública nos primeiros 10 anos posteriores a esses factos (relatório de 1979, p. 65).— Norma declarada inconstitucional pelo Conselho da Revolução:

Lei n." 2135. de 11 de Julho de 1958. artigo 32.": preferência em concursos para a função pública para os que tivessem prestado serviço militar (relatório dc 1980, p. 74). — Preceito declarado inconstitucional pelo Conselho da Revolução.

8 — Recomendações ou reformas em matéria administrativa

Inexistentes até ao presente.

9 — Relações com instituições sob a égide da Assembleia

da República

Embora não expressamente previstas na lei, mas também por ela não vedadas, têm-se processado certas relações recíprocas entre o Provedor c o Conselho de Imprensa (órgão que. embora independente, funciona iunto da Assembleia da República).

Assim, já têm sido recebidas várias queixas transmitidas por essa instituição em matérias de liberdade de informação.

E o Provedor tem remetido ao Conselho Je Imprensa alguns casos suscitados por queixas que lhe haviam sido apresentadas, nomeadamente respeitantes à violação por órgãos de comunicação social do direito ao bom nome e reputação e da presunção de inocência dos arguidos em processo penal ainda não condenados (relatórios de 1979. p. 80, e dc 1980. pp. 127 e 128).

IV) Perspectivas futuras

Para tomar mais eficaz a actuação do- Provedor c mais profícua a sua relação com a Assembleia da República, afigura-se que haveria vantagem, designadamente, em:

I) Na ausência de uma comissão especial criada com esse fim, se institucionalizar a participação do Provedor nos trabalhos da Comissão dc Direitos. Liberdades e Garantias, em particular para efeitos de apreciação e discussão dos seus relatórios anuais e especiais.

Esle procedimento é adoptado em vários países cm que o ombudsman desempenha já um papel relevante no controle da Administração. E tem a vantagem de poder proporcionar uma discussão tripartida, cm comissão parlamentar, com a presença dos membros desta, do Provedor e, ou seus representantes e de responsáveis da Administração, dos casos mais relevantes em que esta se mostre avessa a seguir as recomendações daquele: 2> Se organizar um esquema específico dc apreciação na Assembleia da República das recomendações legislativas do Provedor.

Estas têm. na generalidade, sido remetidas às comissões parlamentares competentes.

Mas não tem sido posível ao Provedor acompanhar a sua abordagem na Assembleia da República, nomeadamente para efeilos de esclarecimento de eventuais dúvidas e desenvolvimento da correspondente fundamentação;

>> Sc determinar, expressa e genericamente, que as recomendações e relatórios especiais do Provedor à Assembleia da República serão publicados no Diário da Assembleia da República, a exemplo, aliás, do que em alguns casos isolados já tem sucedido.

C) Conselho Superior da Magistratura

Não obstante ter sido definida em novos moldes, de harmonia com a revisão constitucional, a composição do Conselho Superior da Magistratura, e ter deixado de fazer parte do mesmo Conselho o Provedor de Justiça, a realidade é que, por não ter sido publicada ate à presente data a legislação a que se reporta o artigo 240." da Lei n." 1/82. continuou o referido Conselho a funcionar com a composição definida pelo artigo 140." do Decreto-Lei n." 269/78, de 1 de Setembro.' que nela inclui o Provedor de Justiça.

Por tal. e mensalmente, tem continuado a tomar parle nas reuniões daquele órgão superior de gestão c disciplina da magistratura, judicial.

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D) Centro de Estudos Judiciários

Durante o ano de 1982, designadamente em 5 de ¡Vlaio e 12 de Novembro, o Provedor de lustiça. acompanhado de elementos do Serviço, proferiu no Centre de Estudos judiciários palestras sobre o Serviço do Provedor de justiça, suas atribuições e funcionamento, integradas nos cursos especiais de formação de magistrados judiciais e do Ministério Público.

E) Encontros com órgãos de comunicação social e entrevistas

Em 17 de Fevereiro e em 20 de julho, realizaram-se encontros com órgãos da comunicação social — imprensa, rádio e televisão — através dos quais foi dado conhecimento público da actividade desenvolvida pelo Serviço do Provedor de justiça nos semestres imediatamente anteriores.

Em 24 de Fevereiro participou no programa da Antena 1 ¡9/20, onde foi entrevistado sobre problemas relacionados com a instituição do ombuclsman.

F) Diligências pessoais

Realizadas pelo Provedor de Justiça —5; adjunto do Provedor, coordenadores e assessores — 4.

G) Estatuto do Provedor de Justiça — Revisão

De harmonia com o plano constante do relatório anterior (cf. conclusões), foi elaborado um estudo, sob a forma de projecto de lei, com o objectivo de consubstanciar num único diploma as leis dispersas sobre o Provedor de justiça e orgânica do seu serviço, no qual se introduziram as alterações que se tiveram por adequadas às realidades, aos condicionalismos e necessidades actuais, cm resultado da experiência adquirida depois da criação em Portugal do Serviço do Provedor de justiça pelo Decreto-Lei n." 212/75, de 25 de Abril.

0 referido projecto foi apresentado à Assembleia da República, acompanhado do ofício n." 14 499. de 18 de Novembro de 1982.

Entretanto, e por haver sido dissolvido aquele órgão, não chegou a haver oportunidade para a sua apreciação

H) Reapreciação de actos pelo Tribunal de Contas

Em 26 de Maio de 1982 foi publicada a Lei n." 8/82. sobre a reapreciação de actos pelo Tribunal de Contas, no caso de recusa de visto.

Não se prevendo nesse diploma a possibilidade da intervenção do Provedor de justiça, este dirigiu ao Presidente da Assembleia da República a seguinte sugestão:

1 — Foi publicada em 26 de Maio de 1982 a Lei n." 8/82, sobre a reapreciação dos actos pelo Tribunal de Contas, no caso de recusa de visto.

11 — Não se prevê nesse diploma a sua aplicação à instituição do Provedor de justiça.

E da análise dos respectivos trabalhos preparatórios — designadamente a proposta de lei n.° 69/11 [Diário da Assembleia da República, 2? série, n." 7 (3." supl.). de 30 de Outubro de. 1981], relatório da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias (Diário da Assembleia

da República. 2." série, n." 18. de 21 de Novembro dc 1981), proposta de aditamento ao artigo 2." (Diário dii Assembleia da República. 2:' série, n." 52, de i I de Fevereiro de 1982), discussão na generalidade (Diário da Assembleia da República. 1." série, n.u 50, de 11 de Fevereiro de 1982). novas propostas de aditamento e relatório sobre as mesmas (Diário da Assembleia da República. 1.a série, n.u 70, de 24 de Março de 1982) e votação final (Diário da Assembleia da República. 1.a série, n.ü 64, de 24 de Março de 1982) — pode deduzir-se que no âmbito dos mesmos não foi objecto de tratamento, nem mesmo aventada, a eventualidade dessa aplicação.

Ill — Afigura-se, contudo, que teria justificação o haver-sc prescrito igualmente a possibilidade de intervenção do Provedor de justiça na economia da Lei n." 8/82, e isto sob três perspectivas, a saber:

a) Enquanto entidade competente para praticar actos sujeitos

e visto

No artigo 1." da Lei n." 8/82 prevê-se que as entidades com competência para praticar actos sujeitos a visto do Tribunal de Contas possam solicitar a este a reapreciação dos mesmos, se ele lhes houver sido recusado.

Afigura-se claro que se pretendeu —ao referir a Administração (n." 1), o Presidente da Assembleia da República, os Ministros da República para os Açores e para a Madeira e o vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura (n." 2) — fazer uma enumeração completa das entidades com tais poderes.

Só que o Provedor de lustiça também tem a faculdade de realizar actos dessa natureza.

Na verdade, o n.ü I do artigo 18." da Lei n." 10/78. de 2 de Março, estabelece que «compete ao Provedor de lustiça praticar todos os actos relativos ao provimento e à situação funcional do pessoal do Serviço do Provedor dc lustiça e exercer sobre ele o poder disciplinar».

Estes actos são sujeitos a visto do Tribunal de Contas e deles cabe recurso para o Supremo Tribunal Administrativo. Parece, pois, que no n." 2 do artigo 1." da Lei n." 8/82 se deveria ter incluído o Provedor entre as entidades a quem aí também se atribui a faculdade de pedir ao Tribunal de Contas a reapreciação dos actos por elas praticados a que tenha sido recusado o visto.

b) Reclamação para reapreciação de actos da Administração

a que tenha sido recusado o visto

Entendo ainda que teria mesmo sido útil prever, em geral, no artigo 2." da Lei n." 8/82, que o Provedor de lustiça tivesse legitimidade para apresentar ao Tribunal de Contas reclamação com vista à reapreciação de actos da Administração a que este houvesse recusado o visto.

Ê certo que o n." 3 desse preceito já admite de algum modo a consideração dos interesses dos funcionários afectados pela recusa do visto, ao facultar-lhes que defendam a sua posição em exposição à entidade que praticara o acto sobre o qual aquela recusa incidiu.

A eficácia desta medida estará, todavia, sempre condicionada, não só por eventual inércia da Administração em formular reclamação para reapreciação de tais actos, como ainda pela própria relevância dos argumentos que esta, ao reclamar, invoque (não estando sequer vinculada a fazer seus os que o funcionário haja expendido).

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A possibilidade de o Provedor formular em casos destes reclamação perante o Tribunal de Contas traria, pois, a vantagem de assim se proporcionar a apresentação directa a este órgão judicial de razões por ele consideradas válidas em favor do interesse do cidadão afectado pela recusa do visto.

E nem parece que o Provedor, deste modo, se estivesse a substituir indevidamente à Administração.

Por um lado, o propósito desta no sentido da eficácia do acto já ficou suficientemente consubstanciado na sua própria prática e posterior sujeição a visto do Tribunal de Contas.

Por outro, nem está excluído que, por vezes, a entidade autora do acto apenas deixe de reclamar da recusa do visto, não por já não pretender que este produza efeitos, mas apenas por não encontrar razões para contrapor às feitas valer pelo Tribunal de Contas.

c) Requerimento de fixação de jurisprudência através de assento

O artigo 6.° da Lei n.° 8/82 estipula que, se o Tribunal de Contas proferir, no domínio da mesma legislação, duas decisões opostas relativamente à mesma questão de direito, «a Administração, pelo membro do Governo competente, ou o ministério público» possam requerer que aquele órgão judicial fixe jurisprudência através de assento.

Parece-me que teria havido fundamento bastante para reconhecer igualmente ao Provedor de Justiça a susceptibilidade de solicitar ao Tribunal de Contas a emanação de assentos em situações deste tipo.

É que as entidades a que o citado artigo 6.° se refere têm a seu cargo a representação do interesse público ou a defesa da legalidade democrática em geral.

O Provedor, por seu turno, actua sob uma perspectiva que com aquelas se não confunde inteiramente, mas antes as complementa: a da defesa dos interesses dos cidadãos.

Ora, quando o Tribunal de Contas emite duas decisões opostas sobre a mesma questão jurídica, resulta afectado um dos direitos fundamentais reconhecidos aos cidadãos pela Constituição — o da igualdade de tratamento à face da lei, expressamente consagrado no respectivo artigo 13.°

Acresce que — até porque a jurisprudência do Tribunal de Contas tem sido publicada com considerável atraso — nem sempre a Administração terá facilidade em tomar conhecimento da existência de decisões nestas condições, sobretudo se elas respeitarem a departamentos ministeriais diferentes.

Em pelo menos algumas destas hipóteses poderia o Provedor, em face de queixas apresentadas pelos interessados, estar em boa situação para se aperceber da desigualdade de tratamento em causa e para contra ela reagir em tempo útil.

Já têm, aliás, sido por diversas vezes formuladas queixas ao Provedor respeitantes a decisões discrepantes do Tribunal de Contas, relativamente às quais, todavia, se tem entendido não poder esta instituição intervir, no actual estado da legislação, por lhe estar vedado o controle das decisões judiciais (artigo 20.°, n.° 2, da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, conjugado com os artigos 205.°, 206.°, 212.° e 219.° da Constituição).

IV — Estas, pois, as considerações que, com vista a eventual completamento do regime da Lei n.° 8/82,

me permito apresentar à ponderação da Assembleia, a que V. Ex.a ilustremente preside, acompanhadas de um projecto de lei para alteração daquele diploma, nos termos preconizados:

Projecto de alteração à Lei n.* 8/82, de 26 de Mato

ARTIGO 1."

2 — Da mesma faculdade pode usar o Presidente da Assembleiai da República, o Provedor de Justiça, os Ministros da República para os Açores e para a Madeira e o vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura, quanto a actos administrativos de serviços na sua dependência.

ARTIGO 2."

3 — Os funcionários abrangidos no acto de que foi recusado visto poderão expor o que tiverem por conveniente em defesa da sua posição, por requerimento apresentado junto dos membros do Governo ou da entidade que submeteu o acto a visto do Tribunal de Contas, ou ainda mediante queixa dirigida ao Provedor de Justiça, que poderá formular pedido de reapreciação nos termos previstos no n.° 1 deste preceito.

ARTIGO 6."

Se, no domínio da mesma legislação, o Tribunal de Contas proferir duas decisões que, relativamente à mesma questão fundamental de direito, sejam opostas, pode a Administração, pelo membro do Governo competente, o Provedor de Justiça ou o Ministério Público requerer que o Tribunal fixe jurisprudência por meio de assento.

I) Participação no Comité de Peritos de Direito Administrativo do Conselho da Europa

A participação portuguesa no Comité de Peritos de Direito Administrativo do Conselho da Europa continuou a ser assegurada pelo adjunto do Provedor de Justiça, Dr. Luís Silveira.

Ficou concluído o projecto de recomendação sobre a responsabilidade civil da Administiação por prejuízos causados a particulares, tendo-se . ealizado 2 reuniões do plenário do Comité.

CAPITULO X

Comunicados públicos

Nos termos do artigo 33.°, n.° 2, do Estatuto do Provedor de Justiça, foram publicados os seguintes comunicados de maior interesse:

a) Acesso ao ensino superior. Pré-candidatura (em 18 de Junho de 19B2)

Tendo a imprensa dado notícia de dificuldades materiais de acesso de estudantes à pré-candidatura para

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o ingresso no ensino superior no ano lectivo de 1982-1983, e tendo verificado pessoalmente a aglomeração de candidatos junto às instalações dó Ministério da Educação e das Universidades na Rua de Pinheiro Chagas, desta cidade, determinei a abertura de processo de minha iniciativa para exame do que se passava. '

Desloquei-me ontem à Delegação Distrital de Lisboa do Gabinete Coordenador do Ingresso no Ensino Superior, que visitei e onde troquei impressões com o respectivo dirigente.

" Mais tarde tive uma entrevista com o director daquele Gabinete. :

Fui informado de que foi prorrogado até 9 de Julho próximo o prazo de apresentação de certificados de habilitações e de que foram tomadas providências para reduzir ao mínimo os incómodos dos estudantes que pretendam manifestar o seu desejo de ingresso no ensino superior. Continuarei a acompanhar a evolução deste assunto.

b) Situação do Shopping Brasília, no Porto (em 22 da Outubro de 1982)

• 1 — Em 27 de Janeiro de" 1982 dirigi ao Sr. Presidente da Câmara Municipal do Porto um ofício relativo à situação. nos centros comerciais da cidade do Porto, em especial no Shopping Brasília.

. 2 -— Na mesma altura consultei outras 8 entidades públicas da mesma cidade e solicitei elementos ao Jornal de Notícias,' que, por mais de uma vez, havia dedicado as suas colunas ao problema.

3 — Em finais de Setembro; todas as entidades ouvidas, com excepção do Sr. Presidente da Câmara, haviam respondido, remetendo a este Serviço importante acervo de documentos e revelando bom espírito de colaboração.

4 — Da análise da documentação recebida concluía--se pela gravidade da situação do Shopping Brasília, onde foi possível detectar a violação de diversas normas jurídicas, desde a falta de licença, de utilização até à precariedade das instalações eléctricas, desde as alterações ilícitas ao projecto inicial à falta ou deficiente localização das saídas de emergência, da insuficiência da ventilação às irregularidades na rede de água potável, da ofensa das normas fiscais à anarquia em matéria de períodos de funcionamento e de horários de trabalho.

5 — Não só porque a atitude do Sr. Presidente da Câmara Municipal do Porto tem sido a de inexplicável silêncio; apesar das insistências feitas em 9 de Março e 30 de Junho, mas também porque a documentação recebida indiciava, no mínimo, condenável passividade da Câmara perante uma situação que, no essencial, se situa no seu âmbito, em 1 de Outubro de 1982 insisti pela remessa dos esclarecimentos em falta, salientando a gravidade da situação e advertindo que, se não recebesse resposta no prazo de 20 dias, seria denunciada a situação, publicamente, através dos órgãos de comunicação social.

6 — É o que lamento ter agora de fazer, pois não dispondo de outros meios injuntivos do cumprimento do dever legal estabelecido "no artigo 27.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, resta a utilização

dos meios de comunicação social estatizados para dar

público conhecimento da situação existente, que vem entravar a acção dó Provedor de Justiça.

CAPITULO XI

Participação em actividades de outras instituições

I) Seminário organizado pelo Conselho de Imprensa sobre o tema «0 direito de informar»

Organizado pelo Conselho de Imprensa, decorreu em Lisboa, nos dias 26 e 27 de Fevereiro de 1982, um seminário sobre o direito de informar, no qual participou o Provedor de Justiça e a assessora Dr.a Maria Helena Valez Carvalho Fernandes, que apresentou a seguinte comunicação:

DIREITOS E LIMITAÇÕES Â ACTIVIDADE DOS JORNALISTAS QUANDO EM EXERCÍCIO PROFISSIONAL

Sumário

1 — Amostragem de casos submetidos ao Provedor de Justiça

que determinaram a ponderação do tema em estudo.

2 — Ligeira referência teórica a alguns aspectos da problemá-

• rica da informação.

a) Noção de informação;

b) Papel dá informação na sociedade contemporânea;

c) Liberdade de informação e suas- limitações em

defesa do interesse público;

d) Liberdade de imprensa e suas limitações em defesa

do interesse dos particulares.

3 — O direito positivo português e a problemática da infor-

mação nos aspectos de privacidade das pessoas individuais e entidades colectivas.

4 — Conclusão.

1 — Amostragem de casos submetidos ao Provedor de Justiça que determinaram a ponderação do tema em estudo

Processo n.° 77/IP-29-B-1

Alguns jornais de 12 de Abril de 1977 apodaram de «falsificador e burlão» um indivíduo arguido em processo-penal ainda pendente.

Face a este caso, bem como a outros idênticos entretanto surgidos, o Provedor entendeu dever colocar, por sua iniciativa, ao Conselho de Imprensa a questão da ilegitimidade, por parte dos órgãos de comunicação social, dá qualificação e tratamento como criminosos de indivíduos arguidos em processos criminais ainda não julgados definitivamente e, por isso, beneficiando da presunção de inocência consagrada no artigo 32.°, n.° 2, da Constituição.

A consideração deste caso levou o Conselho de Imprensa a fazer publicar na imprensa, aliás de acordo com a posição que o Provedor reputou adequada, a sua deliberação de recomendar ao Sindicato dos Jornalistas e, através dele, a todos os profissionais da informação, a preservação do direito ao bom nome dos cidadãos, dirigindo-se, essencialmente, à consciência e responsabilidade dos jornalistas para que em títulos e notícias não dessem antecipadamente como culpadas as pessoas suspeitas de qualquer acto passível de punição criminal, atendendo a que toda a notícia nesse sentido, ainda que venha a ser rectificada, dificilmente poderá ser reparada quanto aos danos morais que provoca no visado pelo que se refere à sua fama e ao bom nome. .

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Processo n.° 78/IP-3-B-1 .....

De Abril a Junho de 1978 surgiram em diversos jornais, e também em cartazes afixados na via pública, anúncios de uma peça teatral em que figurava uma fotografia de mulher nua, de joelhos, cujo corpo estava delimitado em várias zonas, com as designações de «costeletas», «pá», «lombo», «bife» e «acém redondo».

Pareceu que esses anúncios violaram o disposto na Lei de Imprensa [Decreto-Lei n.° 85-C/75, de 26 de Fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.° 181/76, de 9 de Março, artigo 66.°, n.° 1, com referência ao artigo 420.° (') do Código Penal].

A infracção de eventual ultrage à moral pública indiciada não diria respeito a quaisquer aspectos pornográficos, pois pareceu que não se verificava, sob .esse prisma, incompatibilidade com as concepções socialmente vigentes. '

Ele diria respeito, sim, ao tratamento da imagem de' um ser humano em analogia com um animal, cuja carne se destina a abate e consumo. ' Partiu-se, pois, da ideia de que constitui ofensa à moral pública uma acção que viole direitos pessoalís-simos dos cidadãos, neste caso o direito à integridade física e moral consagrado no artigo 26.° da Constituição.

Participada a situação à Procuradoria-Geral da República, esta informou que sobre ela fora mandado instaurar procedimento criminal.

Processo n.° 80/R-1722-B-1

Um recluso do Estabelecimento Prisional de Lisboa insurgiu-se contra a forma escrita e gráfica por que em 3 reportagens sucessivas o jornal A Capital descrevia a sua detenção, os factos que a esta levaram, os seus antecedentes criminais e a sua vida marital e familiar.

• O reclamante era apelidado de «assassino» c «criminoso», enquanto a companheira era qualificada de «prostituta», e a identidade das filhas de ambos era claramente indicada.

Estudado o caso, o Provedor entendeu, reiterando, aliás, posição anterior, que antes da respectiva condenação judicial, e dada a presunção de inocência legalmente existente, até ela não é legítimo chamar criminoso a um cidadão;

Por outro lado, foi incorrecto o tratamento da história e da imagem da mãe das filhas do queixoso.

A referência à sua actividade no âmbito da prostituição e a publicação da sua fotografia, por duas vezes, sem qualquer elemento a dificultar a identificação e sem o seu consentimento prévio, afectou o seu direito ao bom nome e reputação, designadamente no aspecto, do direito à imagem.

As menções e identificação das filhas do reclamante lesaram também o seu direito ao bom nome e reputação.

• Sendo estas as suas conclusões, e tendo em conta o disposto no n.° 3, alínea h), da Lei n.° 31/78,

(') «O ultraje à moral pública cometido publicamente por palavras será punido com prisão até três meses e multa até um mês.

§ único. Se for cometido este crime por escrito ou desenho publicado-ou por outro qualquer meio de publicação, a pena será a de prisão até seis meses,e; multa até úm.ioês». 1. ' -

de;2J0 de Junho, o Provedor transmitiu o caso ao Conselho de Imprensa para que, no âmbito das suas atribuições, fossem tomadas as medidas convenientes.

Processo n.° 80/IP-73-B-1

Pedindo as devidas providências ao Provedor, de Justiça, a Comissão da - Condição Feminina protestou por o jornal O Dia e a Polícia Judiciária haverem divulgado, contra a vontade da interessada, a identidade da vítima de um crime de violação.

O conhecimento público desse facto delituoso teve nociva repercussão no meio social e de trabalho da ofendida, receando-se ainda que a vida desta pudesse ser posta em perigo pelos violadores (que não contariam com a participação policial do facto por eles perpetrado).

.•Embora a reclamação, porque-provinda de-entidade pública, não pudesse ser recebida como tal, o Provedor decidiu que o respectivo assunto fosse averiguado por iniciativa-própria.

Güvido sobre o caso dos autos, o director-geral da Polícia Judiciária informou que, quanto ao caso particular, fora apurado que nenhum funcionário da Polícia Judiciária desrespeitara as normas em vigor (2), designadamente a Ordem de Serviço n.° 59, de 25 de Maio de 1977, e o despacho de 11 de Julho de 1980.

O jornal autor de tal notícia terá colhido informações noutra fonte, porquanto, para além de reportar o crime a data diversa da referida no relatório do piquete, contém detalhes que dele não constam. ]. Porque o dito jornal é entidade privada (situando-se, por.isso, fora o controle do Provedor de Justiça), e porque se não detectara conduta irregular da Administração, o presente processo foi arquivado.

Mas, entendendo que notícias jornalísticas do tipo da denunciada põem em causa e infringem o direito dos cidadãos ao bom nome e reputação/o Provedor de Justiça participou o caso concreto examinado ao Conselho .de Imprensa para que, no âmbito da sua competência específica, fossem adoptadas as providências adequadas.

2 — Ligeira referência teórica a alguns aspectos da problemática da informação

Integrando-se o tema em causa na rubrica «Direitos e limitações à actividade dos jornalistas quando era

' O Eis alguns preceitos:

. Nenhum funcionário da Polícia Judiciária poderá divulgarmos meios de comunicação social ou a terceiro quais-quer factos relacionados com processos pendentes a seu -.. cargo ou de outro colega. [Ordem de Serviço n.° 59.) ^ O relato de ocorrências do piquete não conterá a indi-~. .cação de nomes de suspeitos ou arguidos nem menções que sejam susceptíveis de prejudicarem a investigação. [Ordem de Serviço n.° 59.] Aos sábados, domingos e feriados deverá o relato das ' ocorrências externas ser facultado aos representantes dos órgãos de comunicação social logo que o relatório se encontre visado pelo Sr. Inspector de serviço, devendo este assegurar-se de que não serão divulgados quaisquer detalhes cuja reserva importe salvaguardar.

Estão nestas circunstâncias, em particular, as alusões à identidade de eventuais suspeitos ou arguidos, bem como à das vítimas de crimes contra a honestidade, e ainda, de..uraa_ maneira geral, todas .as referências cuja divulgação possa vir a prejudicar o bom êxito das •investigações.. [Despacho de 11 de Julho de 1980.] .'

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exercício profissional» e assumindo-se esta actividade como uma das técnicas da informação, impõe-se, em ordem a um mais exacto enquadramento do assunto, que se comece por fazer uma breve referência à noção de informação e ao lugar que ela ocupa na sociedade contemporânea, à liberdade de imprensa e às limitações que lhe são impostas, quer em defesa do interesse público, quer em defesa do interesse dos particulares.

a) Noção de informação

Pode definir-se a informação como a acção que consiste em levar ao conhecimento de um público certos factos ou opiniões, sob a forma de determinadas técnicas (visuais ou auditivas), que comportam mensagens inteligíveis para esse público; a informação é igualmente o resultado dessa acção sobre os destinatários (3).

Verifica-se, assim, que a informação reveste dois aspectos: o da emissão da mensagem e o da recepção dessa mesma mensagem, que provoca no respectivo sujeito uma modificação dos seus conhecimentos, reflexos, juízos e até reacções, que podem produzir, por seu turno, determinados comportamentos.

b) Papel da informação na sociedade contemporânea

A informação constitui, actualmente, um complexo fenómeno social de inegáveis repercussões benéficas em vários campos. Pois, para além das suas universalmente reconhecidas interferências na vida económica, cultural, política e recreativa das sociedades, a informação tem efeitos incontestáveis na própria evolução sociológica global.

Assim, já Auguste Comte, Dükheim e Ferdinand Tõnnies, entre outros, fizeram sobressair este último aspecto (4).

Segundo estes autores, a divisão do trabalho e a hiperespecialização que se vem verificando, especialmente no sector industrial, ainda que tornem os homens cada vez mais dependentes uns dos outros, contribuem para o seu isolamento, tornando-os progressivamente menos receptivos às preocupações uns dos outros.

Ê precisamente neste ponto que se evidencia o papel agregador dos meios de comunicação social, que funcionam então como instrumento de coesão das sociedades, pelo que a doutrina tem atribuído à informação a feliz qualificação de verdadeiro «cimento social».

Todavia, a par dos aspectos positivos referidos, os meios de difusão são também acusados de efeitos negativos, pelas incidências psicológicas, não consentâneas com a realidade que, por vezes, produzem nos seus destinatários. Isto, essencialmente, devido à maneira empírica por que a notícia é muitas vezes tratada.

Assim, as estatísticas oficiais sobre a criminalidade mostram que o número de infracções penais graves cometidas contra as pessoas e contra os bens é bastante pouco elevado, pois a maioria dos membros de

(!) Jean Marie Auby e Robert Ducos-Ader, Précis du droit

de l'information, p. 1. O Ob. Cit., p. 118.

uma população não comete tais infracções, constituindo estas a excepção. Todavia, a ideia que se infere dos meios de comunicação social é a de um quadro bem diferente.

Deve-se isso a vários factores. Um deles é o facto de a informação se referir geralmente a acontecimentos espectaculares e esporádicos, e não a situações habituais. Conta também para esse efeito a circunstância de, por vezes, até, à pessoa do informador (limitações de espaço, de tempo, etc.) se não revelar todo o contexto em que o acto punível foi cometido.

Sobre esta matéria é interessante o que a certo passo se refere numa exposição introdutiva sobre o tema «L'opinion publique relative à la criminalité et à la justice générale», feita no âmbito do Conselho da Europa, em 21 de lulho de 1978, pelo austríaco M. K. Pawlik.

Considera esse autor:

La réaction de l'opinion publique vis-à-vis de la criminalité et de la justice pénal, e dépend en grande partie des informations communiquées au public par les media. Le profil de ces informations détermine à son tour la structure de l'attitude et de l'opinion publique vis-à-vis de la criminalité. Le degré d'influence des media sur la formation de l'opinion publique est inversement proportionnel aux possibilités qu'a l'individu d'obtenir des informations directes en cette matière. Par conséquent, les effets des moyens de communication de masse sur la formation de l'opinion publique seront plus particulièrement déterminants pour les infractions pénales graves (moins fréquentes) que pour les infractions mineures (plus fréquentes).

Il va sans dire que la même analyse s'applique aussi à des données autres que celles que fournissent les moyens de communication de masse consacrés aux informations, par exemple, données relatives aux loisirs, romans et autres productions qui, d'une façon ou d'une autre, impliquent ou communiquent des informations sur les infractions pénales, les délinquants et le traitement de la délinquance. Il est d'autre part évident que le mode de réaction de l'opinion publique vis-à-vis de la criminalité peut à son tour influencer le public sur la fixation des objectifs de la politique pénale et les prises de décision en matière de criminalité. Les incidences sociales et ethniques et la portée de cette analyse sont manifestes et se passent des commentaires. La liberté de la presse considérée comme pierre angulaire de la démocratie, la production et la diffusion par les media d'informations sur la criminalité et la justice pénale, doivent elles aussi-être évaluées au regard du critère de responsabilité sociale.

Sobre um tema idêntico convém também atentar no relatório sobre a epígrafe «L'étendue de l'information du public et la nature de l'opinion publique en ce qui concerne la criminalité», apresentado igualmente no âmbito do Conselho da Europa era 24 de Agosto de 1978 por M. Jan S. M. van Dijk.

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É elucidativo sobre a questão o ponto que adiante se transcreve:

5.5 — Impact de la presse écrite sur l'opinion publique à l'égard de la criminalité

Les jounaux accordent une attention disproportionnée aux crimes de violence graves. On peut donc, à la lecture de la presse, s'exagérer l'ampleur et la montée de la violence, tout en sous-estimant la gravité d'autres types de délinquance. La relation des crimes violents pourrait très bien faire croire que chacun risque d'être la prochaine victime, car le journaliste tend à isoler l'incident terrifiant en le présentant hors de son contexte social et psychologique (Lenke, 1973). Quels ont été jusqu'ici les résultats de la recherche empirique sur l'influence de la presse dans ce domaine? Selon Noelle-Neumann (1977), les mass-media produisent leur impact le plus fort lorsque certains clichés sont répétés avec régularité à la fois par la presse et la télévision. Placés dans cette situation, les lecteurs/spectateurs ne sont plus en mesure de prendre du recul par rapport au message en opérant une réception sélective. Parallèlement, tout point de vue différent en vient à être considéré comme celui d'une minorité déviante. Or, comme pour des raisons psychologiques la plupart des gens hésitent à admettre un point de vue minoritaire, ils se rallient après un certain laps de temps à «l'opinion publique», autrement dit à une opinion qui puisse être exprimée en public sans crainte de représailles: les avis opposés tombent alors dans «la spirale du silence».

Por fim, é de sublinhar a conclusão tirada sobre esta questão no relatório de Hans Joachim Schneider sobre «L'influence des moyens de communication de masse sur l'opinion publique en matière de criminalité et de justice criminelle»:

Si l'on veut que les media remplissent leur fonction sociale d'intégration, on doit les convaincre de renoncer le plus tôt possible à donner de la délinquance et de la justice criminelle des portraits faux parce qu'établis de manière empirique. Naturellement, il ne faudra pas que la liberté de parole, de presse et d'information en souffre le moins du monde.

c) Liberdade de informação e suas limitações em defesa do interesse público

A expressão «liberdade de informação» congrega duas facetas distintas: a liberdade de difundir a mensagem informativa, liberdade que, por seu lado, é extensiva ao conteúdo da mensagem, e a liberdade de receber sem qualquer entrave essa mesma mensagem.

A liberdade de informação, nas suas duas facetas, goza de uma protecção jurídica que lhe confere o revestimento de um direito: o direito de informação, que engloba, assim, o direito de informar e o direito de ser informado.

O direito de informar revela-se, pelo que respeita a quem informa, não só na liberdade de informar, mas na possibilidade de criar as suas fontes de informação ou utilizar as já existentes.

O direito de ser informado permite aos seus titulares exigir objectividade na informação, e bem assim modalidades de informação que os possam beneficiar.

Constata-se, pois, que os Estados asseguram, mediante legislação apropriada, a liberdade de informação.

Isso não significa, porém, que não haja limitações a essa liberdade de informação, ditadas por interesses, quer de natureza pública, quer de índole privada.

São de vária ordem as limitações inspiradas no interesse público, algumas das quais passamos a abordar esquematicamente:

Regras internacionais. — Entre estas destacamos, pelo seu alto significado tanto pelo que respeita ao interesse público como ao interesse privado, o artigo 10.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, assinada em 4 de Novembro de 1950 no quadro do Conselho da Europa (s);

Regulamentação administrativa, como, por exemplo, a que regula a profissão de jornalista;

Regimes de certas categorias de publicações, como as destinadas à juventude, publicações estrangeiras, etc;

Regime de imprensa em certos períodos excepcionais, como no caso de guerra, em que o Estado pode tomar medidas para defesa da segurança das operações de mobilização;

Repressão das ofensas cometidas contra autoridades públicas;

Repressão de ultrajes à actividade judiciária.

d) Liberdade de imprensa e suas limitações em defesa do interesse dos particulares

Os direitos de personalidade, em virtude do impreciso campo em que se desenrola a vida privada, levantam problemas delicados quando relacionados com o direito de informação, este baseado essencialmente no interesse público, mas desenvolvendo-se também dentro de metas vagas e abstractas, como sejam as noções de democracia e liberdade (6).

Todavia, como tudo aquilo que é interesse individual é indirectamente do interesse da sociedade, e uma vez que o humanismo não é uma palavra vã, há limitação à liberdade de imprensa que são, de uma maneira geral, aceites.

É significativo neste campo o artigo 12° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, segundo o qual:

Ninguém poderá ser objecto de ingerências arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no

(s) «1.° Toda a pessoa tem direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber ou de comunicar informações ou ideias sem ingerência de autoridade pública e sem consideração de fronteiras. O presente artigo não impede os Estados de submeterem as empresas de radiodifusão, de cinema ou de televisão a um regime de autorização.

2.° O exercício destas liberdades, comportando deveres ou responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas na lei, que constituam medidas necessárias, numa sociedade democrática para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do delito, a protecção da saúde ou da moral, a protecção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais ou para garantir a autoridade e imparcialidade do poder judicial.» ,

(4) Cesar Molinero, La Información y los Derechos Personales.

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seu domicílio ou na sua correspondência, nem de ataques à sua honra ou à sua reputação. Toda a pessoa tem o direito à protecção da lei contra tais ingerências ou ataques.

Neste particular, tem também interesse salientar a reprodução do entendimento do juiz suíço Schnetzler feita por Cesar Molinero na obra já citada, p. 45.

Assim, sustenta esse jurista que informar o público sobre os actos criminosos que perturbam momentaneamente a ordem social e dar conta dos debates e juízos que estão a decorrer no plano judicial está de acordo com a missão normal e necessária da imprensa. O relato dos acidentes, debates judiciais e sentenças emitidas pelos tribunais e os comentários que os cronistas considerem relevantes devem servir de base às suas informações.

Todavia, é inegável que a revelação pública do nome das pessoas que são ou que parece irão ser objecto de instrução penal constitui uma intromissão na vida privada e na liberdade individual dessas pessoas que lhes pode causar um prejuízo moral e material considerável (').

Há, pois, que ter em atenção que até ao momento em que um indivíduo é condenado a sua honra e a sua reputação devem ser protegidas, em aplicação do princípio da presunção de inocência, que é inerente a todas as legislações democráticas (8).

Um dos aspectos que nesta matéria.— liberdade de imprensa e protecção dos particulares — sobreleva é precisamente o da defesa dos indivíduos contra a difamação e a injúria (').

Tanto a difamação como a injúria são infracções que a doutrina configura como delitos de imprensa e que se caracterizam por dois elementos comuns:

1.° Um modo de expressão (escrito, desenho, gravura, pintura ou mesmo fotografia) que põe em causa uma pessoa e a que é dada publicidade;

2.° Intenção.

A difamação apresenta, porém, relativamente à injúria, elementos específicos:

1.° A alegação ou imputação de um facto, ainda que subtilmente, sob a forma interrogativa, negativa, dubitativa ou condicional;

2.° Atentado à honra ou à consideração de uma pessoa.

Convém acentuar que o atentado à honra, isto é, a imputação de um facto contrário à moral ou à probidade, é uma noção mais restrita do que a de atentado à consideração de uma pessoa, visto que nesta última expressão cabem, além daquele, designadamente, os factos susceptíveis de denegrirem o conceito em que é tida uma determinada pessoa por aqueles que a conhecem, tratando-se, portanto, de uma apreciação subjectiva, que pode referir-se à reputação na vida familiar, profissional, política, etc.

(') «Libertad de Prensa y respecto del individuo». Journal de Genève, Genebra, 24 de Agosto de 1965.

(8) Albert Brunois, La liberté judiciaire, honneur des hommes, pp. 71 e segs.

(') Jean Marie Auby e Robert Ducos-Ader, ob. cit.

•::.A injúria tem como elemento característico tratar-se de uma expressão que, sem se traduzir na imputação da prática de um facto concreto, ofende a honra de uma pessoa.

Tanto a difamação como a injúria só são reputadas como infracções quando visam uma entidade ou uma pessoa determinada.

Assim, injúrias proferidas contra colectividades não dotadas de personalidade jurídica não são susceptíveis de procedimento judicial.

Pelo que se reporta à má fé, elemento inerente a estes dois tipos de delitos de imprensa, ela geralmente assume a natureza de uma presunção legal. Significa isto que se presume sempre que o autor de tais infracções age intencionalmente.

Todavia, atendendo a que a profissão do jornalista apresenta a grande dificuldade que consiste em conjugar o exercício do direito de informar o público com o dever de evitar aplicações difamatórias ou injuriosas, tudo com uma grande rapidez e mediante o auxílio de fontes de informação por vezes complexas, obscuras e distantes, a doutrina e a jurisprudência, em diversos países, admitem situações que podem justificar que o jornalista, não obstante ter concretizado os elementos de difamação, seja subtraído à respectiva condenação — aquelas situações em que se detecta um motivo de interesse público na origem da actuação do jornalista. Com efeito, tem-se entendido, como princípio comummente aceite, que não é considerado dé vida privada dos cidadãos tudo o que se relaciona com um problema de ordem geral. Por outras palavras, considera-se, actualmente, adentro do campo que nos ocupa, que não respeita à vida privada todo o facto que interfere com interesses materiais ou morais do público.

Deste modo, têm-se reputado como factos da vida privada aqueles cuja publicação não interessa ao público, conceito este que leva a concluir que a noção de vida privada é muito mais estreita para os homens célebres, políticos, vedetas, etc, do que o é para o comum dos cidadãos.

Contudo, dada a interpenetração do interesse público e do interesse privado, com a consequente impossibilidade de demarcação exacta de fronteiras, tem de se aceitar que o assunto é de grande complexidade e delicadeza, com intensa acuidade, aliás, em diversos países (10).

3 — O direito positivo português e a problemática da Informação nos aspectos da privacidade das pessoas Individuais e entidades colectivas.

Assinalam-se de seguida os preceitos que no nosso direito têm relação com a problemática em epígrafe:

Da Constituição da República Portuguesa:

ARTIGO 33.° (Direito à identidade, ao bom nome e à intimidade)

1 — A todos é reconhecido o direito à identidade pessoal, ao bom nome e reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar,

O Revue internationale de droit comparé, n.° 4 de 1980, pp. 701 a 756.

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2 — A lei estabelecerá garantias efectivas contra a utilização abusiva ou contrária à dignidade humana de informações relativas às pessoas e famílias.

ARTIGO 32.° (Garantias de processo criminal)

2 — Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação.

Da Lei de Imprensa (Decreto-Lei n.° 85-C/ 75, de 26 de Fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.° 181/76, de 9 de Março):

ARTIGO 4." (Uberdade de imprensa)

2 — Os limites à liberdade de imprensa decorrerão unicamente dos preceitos da presente lei e daqueles que a lei geral e a lei militar impõem,

- em ordem a salvaguardar a integridade moral dos cidadãos,' a garantir a objectividade e a verdade da informação, a defender o interesse público e

; a. ordem democrática.

ARTIGO 16.° (Direito de resposta)

1 — Os periódicos são obrigados a inserir dentro de 2 números, a contar do recebimento em carta registada com aviso de recepção e assinatura reconhecida, a resposta de qualquer pessoa, singular ou colectiva, ou organismo público que se considerem prejudicados pela publicação no mesmo periódico de ofensas directas ou de referências de facto inverídico ou erróneo que possam afectar a sua reputação e boa fama ou o desmentido ou rectificação oficial de qualquer notícia neles publicada ou reproduzida.

ARTIGO 17.' (Conselho de Imprensa)

6 — Qualquer cidadão poderá apresentar ao Conselho de Imprensa queixa sobre a conduta da imprensa periódica ou de pessoas ou de entidades

.....que actuem em sentido contrário ao previsto na

presente lei.

ARTIGO 24."

(Responsabilidade civil)

1 —Na determinação das formas de efectivação da responsabilidade civil emergente de factos cometidos por meio da imprensa observar-se-ão os princípio gerais.

ARTIGO 25.° (Crimes de abuso de liberdade de imprensa)

1 — Consideram-se crimes de abuso de liberdade de imprensa os actos ou comportamentos lesivos de interesse jurídico penalmente protegido

que se consumam pela publicação de textos ou imagens através da imprensa.

2 — Aos referidos crimes é aplicável a legislação penal comum, com as seguintes especialidades:

a) Se o agente do crime não houver sofrido

anteriormente condenação alguma por crime de imprensa, a pena de prisão poderá ser, em qualquer caso, substituída por multa não inferior a 50 000$;

b) O tribunal aplicará a penalidade prevista

na disposição incriminadora, agravada em medida não inferior a um terço do seu limite máximo, quando se trate de pena variável, ou simplesmente agravada, nos outros casos.

ARTIGO 26." (Responsabilidade criminal)

1 — Pelos crimes de abuso de liberdade de imprensa nas publicações unitárias são criminalmente responsáveis, sucessivamente:

a) O autor do escrito ou imagem, se for susceptível de responsabilidade e residir em Portugal, salvo nos casos de reprodução não consentida, nos quais responderá quem a tiver promovido.

ARTIGO 27."

(Consumação e agravação de crimes de imprensa)

1 — Os crimes previstos nos artigos 159.°, 160.°. 166.°,. 181.°, 182.° e 411.° do Código Penal consumam-se cora a publicação do escrito ou imagem em que haja injúria, difamação ou ameaça contra as pessoas aí indicadas (").

ARTIGO 28.» (Difamação, injúria. e prova da verdade dos factos)

1 — No caso de difamação, é admitida a prova da verdade dos factos imputados, salvo quando, tratando-se de particulares, a imputação haja sido feita sem que o interesse público ou o do ofensor legitimasse a divulgação dos factos imputados ou ainda quando estes respeitem à vida privada ou familiar do difamado.

2 — No caso de injúria, a prova a fazer, de harmonia com o disposto no número anterior, só será admitida depois de o autor do texto ou imagem, a requerimento do ofendido, ter concretizado os factos em que a ofensa se baseia.

3 — Se o autor da ofensa fizer a prova dos factos imputados, quando admitida, será punido,

(") Código Penal, artigos 159.° (ofensas contra diplomatas estrangeiros), 160." (ofensas a chefe de Estado estrangeiro), 166.° (injúria ou ofensa ao Chefe de Estado, Assembleia da República, Governo, Conselho da Revolução ou tribunais), 181." (injúrias contra autoridades públicas), 182." (injúrias contra agentes da autoridade ou força pública, perito ou testemunha) e 411.".(difamação e injúria contra corporação com autoridade pública).

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como caluniador, com pena de prisão até 2 anos, mas nunca inferior a 3 meses, não remível, e multa correspondente, além de indemnização por danos, que o juiz fixará em 50 000$, sem dependência de qualquer prova, ou na quantia que o tribunal d^etenninar, nunca inferior àquela, se o caluniado tiver reclamado maior quantia.

Do Estatuto do Jornalista:

ARTIGO 11." (Deveres)

1 — São deveres fundamentais do jornalista profissional:

c) Respeitar os limites ao exercício da liberdade de imprensa, nos termos da Constituição e da lei.

Do código deontológico (aprovado pela assembleia geral do Sindicato dos Jornalistas):

CAPÍTULO I O jornalista deve:

h) Rejeitar a mentira, a acusação sem provas, a difamação, a injúria, a viciação de documentos e o plágio;

m) Não interferir na vida privada de qualquer cidadão, salvo quando ela tiver repercussão pública ou quando essa prática se impuser por motivos relevantes de interesse público;

r) Só mencionar um facto ou circunstância cuja exactidão não possa imediatamente comprovar se o interesse público iniludivelmente o impuser, fazendo menção expressa da sua natureza dubitativa.

4 — Conclusão

As considerações atrás expostas tiveram como único objectivo alertar as instâncias competentes para a necessidade de compatibilizar o direito e liberdade da informação, suporte das sociedades livres e democráticas, com o respeito pela privacidade das pessoas, pela sua honra e reputação e pela presunção de inocência de que as mesmas gozam até serem objecto de uma condenação judicial, isto não deixando simultaneamente de atentar na influência que a própria informação tem na psicologia das massas sociais.

Em ordem a reforçar tal objectivo, fez-se uma rápida referência à doutrina estrangeira, que revela como esta matéria tem tido verdadeira acuidade e tratamento exaustivo no âmbito de países que se regem por aqueles valores sociais e das próprias organizações internacionais.

Reconhecendo-se, por fim, que o nosso direito positivo não ignora o tema em estudo, apontaram-se os preceitos normativos que traduzem a consagração legal dos aspectos gerais da problemática em causa, não podendo deixar de se sublinhar que a aplicação des-

ses preceitos, que se pretende congregue a defesa do interesse público e dos direitos de personalidade, se reveste de grande dificuldade.

O que se nos afigura é que a aplicação de todo o referido normativo tem de assentar num critério de autêntico equilíbrio e profunda responsabilidade social.

Cl) Seminário organizado pela Comissão das Comunidades Europeias e pela Comissão da Condição Feminina sobre o tema «A Comunidade Europeia e a igualdade de oportunidades no trabalhon.

Neste seminário, em que tomaram parte o Provedor de Justiça e o assessor Dr. João Pedro Barrosa Caupers, esteve a apresentação dos trabalhos a cargo da presidente da Comissão da Condição Feminina, Dr.a Joana de Barros Batista.

Foram analisados e debatidos os seguintes pontos:

a) «A política comunitária para a igualdade de

oportunidades», por Ivor Richard, membro da Comissão das Comunidades Europeias, encarregado dos assuntos sociais;

b) «Presença e realidades da Comunidade Euro-

peia», montagem audiovisual de Pierre Ser-voz (Direcção-Geral de Informação da Comissão das Comunidades Europeias);

c) «Directivas comunitárias para a igualdade de

oportunidades e sua aplicação»;

d) «O papel da informação para a participação

das mulheres», por Fausta Deshormes, responsável pela informação das associações e da imprensa feminina (Direcção-Geral de Informação da Comissão das Comunidades Europeias);

é) «Influência da Comunidade Europeia sobre a política da igualdade de oportunidade nos países membros», mesa-redonda dirigida pela Prof.a Doutora Isabel Maria de Magalhães Colaço, com a participação de peritos da Bélgica, Dinamarca, França, Irlanda, Itália e Reino Unido;

/) «O Parlamento Europeu e a igualdade de. oportunidades»;

g) «O emprego das mulheres em Portugal», pelo Dr. José Manuel Rocha Pimentel, presidente da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (Ministério do Trabalho).

MH) Smlmfm sqEmb ss í^eios não Judiciários de Protecção s <ís Pramçêo ias Direitos do Homem, organizado psEo Secretsriado-Geral do Conselho da Europa, em atcparsçâo cem a Universidade de Siena.

O referido Seminário teve lugar de 28 a 30 de Outubro de 1982, em Siena (Itália), e nele participou o Provedor de Justiça e o seu adjunto, Dr. Luís Silveira.

A participação de Portugal foi ainda assegurada pelos Drs. José N. Cunha Rodrigues, procurador-geral--adjunto, e Miguel Veiga, advogado no Porto.

No quadro do Seminário realizou-se uma reunião de ombudsmen, comissários parlamentares, mediado-

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res ou personalidades com funções similares dos países membros do Conselho da Europa, nomeadamente:

1) CU. V. Lundvik, president of the Internatio-

nal Ombudsmen Institute;

2) Per Erik Nilsson, chief parlamentary ombuds-

man, Estocolmo;

3) C. Clothier, parlamentary commissioner for

Administration and health service commissioner for the United Kingdom, Londres;

4) Niels Eilschou Holm, parliamentary ombuds-

man, Copenhaga;

5) R. C. V. Fabre, médiateur de la Republique

Française, Paris;

6) H. Os, parliamentary ombudsman, Oslo;

7) Dr. J. F. Rand, national ombudsman, Haia;

8) Dr. Franz Bauer, Volksanwalt, Viena;

9) T. E. Sverne, ombudsman, Estocolmo;

10) Italo de Vito, difensore civico della Regione

Toscana, Florença;

11) Adolf Wirth, ombudsman du Canton de Zu-

rich, Suíça;

12) M. L. F. Martinez, juiz do Tribunal Nacional

de Justicia, Madrid;

13) D. C. Yardley, chairman of the Commission

for Local Administration in England, Londres;

14) E. Pamplona Côrte-Real, Provedor de Justiça

(Portugal);

15) S. Hobstadt, ombudsman, Estocolmo.

Depois das alocuções do Prof. Adalberto Crossi, reitor da Universidade de Siena, do professor de Direito Claudio Zanghi, conselheiro jurídico do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Itália, e de P. Leuprecht, director dos Direitos do Homem no Conselho da Europa, seguiu-se a discussão sobre o tema do Seminário com base nos relatórios apresentados, respectivamente, por Michel Lesage, professor de Direito Comparado na Universidade de Paris (França), N. Eilschou Holm, ombudsman parlamentar da Dinamarca, Walter S. Tarnopolsky, director do Instituto Canadiano dos Direitos do Homem, Jean-Bernard Marie, encarregado de pesquisas do Instituto Internacional dos Direitos do Homem, e, finalmente, Martin Ennals, Head of the Palice Comittee Support Unit of the Greater London Council.

O Seminário permitiu o estabelecimento de proveitoso contacto e troca de impressões, bem como a descrição das práticas adoptadas no âmbito da competência dos ombudsmen dos diferentes países participantes, tendo constituído aspecto relevante dos debates, e dentro do espírito do Seminário, o de se promover a adopção de meios de protecção dos direitos do homem, em toda a dimensão da sua actividade social e económica, bem como no sentido de facilitar o acesso efectivo à justiça.

Nomeadamente, a questão do estabelecimento de um ombudsman europeu foi aflorada e, reconhecen-do-se embora a necessidade do seu exame prévio mais amplo e profundo, dessa ideia se fez eco o ilustre Ministro dos Negócios Estrangeiros da Áustria, Willibald Pahr, na sua brilhante alocução de encerramento do Seminário.

Índice:

CAPITUO 1

Introdução .................................................. 1892-(l)

CAPÍTULO II

Dados estatísticos e sua análise ........................ 1892-(3)

CAPÍTULO 111

Processos relativos a questões de inconstitucionalidade ...................................................... 1892-02)

CAPITULO IV

Principais recomendações ............................... 1892-(66)

CAPÍTULO V

Apreciação na especialidade de alguns processos

concluídos em 1982 .................................... 1892-(90)

Administração da justiça .......................... 1892-(90)

Administração local................................. 1892—(91 >

Administração Pública ............................. 1892-(92)

Agricultura ............................................ l892-(92)

Comércio externo.................................... 1892—(93)

Comércio interno .................................... 1892-(95)

Contrato de prestação de serviços .............. I892-(95)

Contribuições e impostos ......................... 1892-(98)

Cooperantes ........................................... 1892-002)

Descolonização ....................................... 1892-O03)

Direitos fundamentais.............................. 1892-005)

Empresas ............................................... 1892-009)

Empréstimo ........................................... 1892-(110)

Ensino .................................................. 1892-011)

Expropriação ......................................... 1892-012)

Fornecimento de água e energia ................ 1892—(113)

Habitação .............................................. 1892-015)

Obras ................................................... 1892-017)

Obras públicas ....................................... 1892-018)

Polícia .................................................. 1892-0 18)

Regime prisional .................................... 1892-O20)

Registos e notariado .............................. 1892-021)

Responsabilidade contratual ...................... 1892—(124)

Segurança social ..................................... 1892-0 25)

Seguros ................................................. 1892-032)

Trabalho — Administração local ................ 1892-0 33)

Trabalho — Comissões de trabalhadores ...... 1892-039)

Trabalho — Empresas públicas .................. 1892-0 40)

Trabalho—Função pública ...................... 1892-041)

Trabalho — Registo de prática farmacêutica 1892—(175)

Trabalho — Segurança social ..................... 1892-075)

CAPITULO VI

Sequencia de processos relatados em anos anteriores ...................................................... 1892-076)

CAPÍTULO Vil

Inspecções a estabelecimentos prisionais c de

assistência ................................................ 1892-0 77)

CAPÍTULO VIII

Visitas a outros centros urbanos ..................... 1892-082)

CAPITULO IX

Outros aspectos da actividade do Provedor de Justiça ......................................................... 1892-086)

CAPÍTULO X

Comunicados públicos ................................... 1892—(193)

CAPÍTULO XI Participação em actividades de outras instituições 1892-094)

Página 202

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