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II Série — Suplemento ao número 88

Sexta-feira, 11 de Julho de 1986

DIÁRIO

da Assembleia da República

IV LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

ACTA DA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO DE 10 DE JULHO DE 1986

SUMÁRIO

Comissão de Economia, Finanças e Plano:

Acta da reunião de 10 de Julho de 1986.

O Sr. Presidente (Rui Machete): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 22 e J0. minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como sabem vamos hoje proceder à discussão e votação na especialidade da proposta de lei n.° 31 /IV, que altera a Lei do Orçamento do Estado para 1986, a Lei n.° 9/86, no que diz respeito às despesas. Aliás, de acordo com o artigo 213.° do Regimento, como sabem, são todas as disposições relativas à Lei do Orçamento que não sejam respeitantes à criação de novos impostos ou à alteração da base de incidência, taxa e regime de isenção dos impostos existentes ou disposições relativas a empréstimos e outros meios de financiamento, obviamente, sem prejuízo de ser sempre possível vir o Plenário a avocar as decisões que forem tomadas aqui na Comissão, como também decorre do Regimento.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, o CDS, em consonância com o anúncio que fez no Plenário, durante a discussão na generalidade realizada hoje, vai apresentar, na próxima terça-feira, durante a nova discussão em Plenário da matéria da receita, uma proposta de aditamento ao artigo 41.° da Lei do Orçamento. Dessa proposta decorre, no entender do CDS, uma alteração ao orçamento de despesa. Não queremos, portanto, deixar de apresentar imediatamente essa alteração como proposta de alteração do orçamento de despesa. A proposta consiste em reduzir nas verbas dos vários departamentos, e nós apresentamo-

-la em termnos globais para cada departamento de que dependem forças militares e militarizadas, aquelas importâncias que na proposta do Governo respeitam a combustíveis e lubrificantes. Como na nossa proposta os gastos funcionais de combustíveis e lubrificantes, por parte das forças militares e militarizadas, estarão, se for aprovada, isentos do imposto sobre combustíveis e lubrificantes, naturalmente decorrerá que a despesa que nos é proposta pelo Governo para fazer face a esse pagamento tem de ser reduzida em conformidade. É esta proposta que eu e o meu companheiro de partido, António Vasco de Melo, vamos apresentar neste momento na Mesa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda não conheço a proposta que foi formulada, mas permitir-me-ia solicitar alguns esclarecimentos ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, na sua qualidade de proponente. Em primeiro lugar, colocaria a questão da possibilidade de numa matéria orçamental se operarem iniciativas legislativas independentemente da iniciativa legislativa do Governo, alargando, portanto, o âmbito da proposta que nos foi apresentada. Tratando-se de um campo específico — estamos numa lei de revisão da lei orçamental — em que a competência em matéria de iniciativa legislativa é exclusivamente governamental, pergunto-lhe se o CDS ponderou a possibilidade de a Assembleia da República introduzir alterações na iniciativa legislativa que nos foi presente, independentemente dessa situação, e se, portanto, isso corresponde exactamente aos preceitos constitucionais, quer quanto ao facto da iniciativa legislativa ser exclusivamente governamental, quer quanto ao facto de isto se introduzir, em termos de lei travão, portanto, do artigo 170.°, n.° 2, numa diminuição de receitas estatais num enquadramento que não é ainda

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o da Lei do Orçamento, mas apenas de revisão. A segunda questão que queria pôr ao CDS, e a propósito desta iniciativa, tem como objectivo saber se esta alteração proposta ao artigo 41.° tem, ou não, efeitos retroactivos. Visto que o artigo 41.° entrou em vigor, as Forças Armadas e militarizadas neste momento já pagaram o imposto, de acordo com a interpretação que foi feita pelo Governo do artigo 41.° da Lei do Orçamento. Pergunto, portanto, se esta solução apresentada pelo CDS corresponde a uma solução apenas para o futuro, e durante três meses as Forças Armadas e militarizadas pagaram o imposto que agora termina, ou se, pelo contrário, a solução tem efeitos retroactivos e, portanto, equivale à reposição pelo Estado, às Forças Armadas e militarizadas, do imposto cobrado durante estes meses de vigência do artigo 41.° da Lei do Orçamento. Esta é outra dúvida que se me coloca e, portanto, gostaria de saber qual o alcance exacto deste dispositivo, proposto pelo CDS, em relação à sua vigência temporal.

A terceira e última questão que queria colocar ao Sr. Deputado Nogueira de Brito e ao CDS é a seguinte: gostaria de saber se efectivamente essa posição corresponde a uma correcção do pensamento da Assembleia da República em relação ao artigo 41.°, e também do pensamento do CDS, que na sua proposta não tinha contemplado esta isenção, ou se, pelo contrario, corresponde apenas a uma interpretação que estaria subjacente à sua própria proposta e que não descortinámos na altura oportuna.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Em primeiro lugar queria agradecer ao Sr. Deputado Magalhães Mota a oportunidade de me permitir esclarecer pontos, que reputo importantes, na nossa iniciativa.

Relativamente à primeira questão — se entendemos que estamos limitados nesta iniciativa —, é evidente que a ponderámos e temos a dizer o seguinte: em primeiro lugar, a alteração orçamental que nos é proposta é uma alteração que diz respeito ao aumento da despesa global. Ela tem um regime exactamente idêntico, exactamente igual, ao da própria iniciativa orçamental e, portanto, do próprio processo de aprovação do Orçamento. Nessa matéria entendemos, e connosco a generalidade da doutrina, que a iniciativa é efectivamente do Governo, mas sendo desencadeado o processo pela iniciativa governamental não há quaisquer limitações para a Assembleia da República e para os deputados no que respeita à apresentação de propostas. Portanto, entendemos que não estamos limitados nesta matéria, que é, aliás, uma matéria directamente versada na proposta do Governo. Ela é, no entender do Governo, precisamente provocada por lapsos do regime estabelecido no artigo 41.° E passava imediatamente à terceira questão do Sr. Deputado Magalhães Mota, e depois voltaria à segunda, para lhe dizer que no nosso entendimento, e de acordo com aquilo que hoje afirmámos no Plenário, a redacção que propusemos para um artigo novo, que seria um artigo correspondente àquele que se transformou no artigo 41.° em resultado da aprovação da iniciativa do PCP, PS e PRD, faz--nos acreditar que o regime articulado da nossa proposta permitiria talvez evitar este tipo de questão. É, no entanto, certo que nós não previmos a isenção.

E houve uma outra coisa que não previmos, que foi o cometer ao Governo a regulamentação dos aspectos essenciais deste imposto. Portanto, a nossa iniciativa, e agora passava a responder à sua segunda questão, destina-se também a preencher uma lacuna que também existe na nossa proposta — já hoje assumimos no Plenário essa responsabilidade — e tem dois aspectos distintos. Por um lado, estabelece, num primeiro número, sob a forma de proposta de aditamento, que seria o n.° 14 do artigo 41.°, que compete ao Governo, num entendimento que tem sido pacificamente aceite pela Câmara — que as autorizações legislativas têm de ser pedidas pelo Governo, mas podemos encarregar o Governo de legislar nas matérias que são da nossa competência —, o encargo de estabelecer os regimes de incidência das isenções da garantia dos contribuintes, das penalidades e de cobrança do imposto sobre produtos petrolíferos. Aspectos que o Governo declarou ao longo do debate que se revelaram lacunas importantes na prática e aplicação do imposto. Por outro lado... Faça favor...

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Deputado...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — ... mas talvez fosse melhor no fim porque estou a acabar , Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — É que no fim não terei oportunidade porque estamos num pedido de esclarecimento. Em termos regimentais no fim já não posso fazer nada, portanto, terá de ser agora.

Isso corresponderia a uma autorização legislativa não solicitada cuja constitucionalidade é duvidosa, como sabe.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Mas temos adoptado esta forma em várias oportunidades. Discutimos isto várias vezes no Plenário, e não só, e temos adoptado sob esta forma. Por outro lado, dizia-se no n.° 2, que seria o n.° 15 do artigo 41.°, que entre as isenções referidas no número anterior figurariam necessariamente as estabelecidas de modo que as entidades que adquiriam combustíveis e lubrificantes, no regime anterior, ao preço de custo não fossem sujeitas ao pagamento do imposto e estivessem, portanto, isentas dele. Estabelecer-se-ia essa isenção com efeito retroactivo, precisamente com efeitos a partir da data de entrada em vigor do imposto. Isso significaria que o Fundo ce Abastecimento teria de restituir a estas entidades, porque lhe foi entregue a importância do imposto, a importância do imposto recebida até agora. É este o sentido da nossa proposta.

O Sr. Presidente: — Suponho que a proposta do CDS suscita...

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Dá-me licença, Sr. Presidente? Como estamos com o espaço muito reduzido entre nós, verifico pelas reacções que me é possível surpreender da parte do Sr. Deputado Magalhães Mota que a circunstância de encarregarmos o Governo de delinear o regime da incidência lhe causa alguma preocupação.

Fá-lo-íamos, no entanto, cometendo ao Governo esse encargo sem prejuízo do que se estabelece nos números anteriores do artigo 41.°

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O Sr. Presidente: — Estava, há pouco, a dizer que V. Ex." na proposta que apresentou, no fundo, visa criar uma isenção em resultado da qual uma parte significativa das despesas, cujo aumento é proposto pelo Governo — a parte para combustíveis e lubrificantes do n.° 1 da proposta —, deixava de ter significado. Foram suscitadas duas questões fundamentais. Uma primeira questão foi a de saber se uma vez desenca-dado o processo, por parte do Governo, de revisão do Orçamento a Assembleia reganhava uma inteira liberdade de, no âmbito dessa revisão, fazer quaisquer propostas, mesmo fora do âmbito daquelas que tinham sido apresentadas pelo Governo. Devo dizer que o meu entendimento não é esse, isto é, entendo que as propostas de alteração devem conter-se dentro dos limites da proposta de alteração apresentada pelo Governo. De contrário teríamos a possibilidade de vir a refazer completa e totalmente o Orçamento quando o Governo teria feito apenas uma proposta de alteração de uma proposta de alteração de uma verba em concreto — de resto, aqui, foram poucas as verbas alteradas. Isto, obviamente, não significa que não seja possível apresentar propostas que signifiquem soluções técnicas diversas para as questões que o Governo se propõe resolver, e nesse sentido entendo que a proposta que o Sr. Deputado Nogueira de Brito apresenta tem perfeito cabimento porque é uma outra solução técnica, é uma solução pela via de uma isenção, para aquilo que o Governo propõe. Sé não fosse essa circunstância, quer por estar fora do contexto quer, pela aplicação da lei do travão, como o Sr. Deputado Magalhães Mota explicou, não seria possível discuti-la, mas parece--me que dentro daquilo que foi apresentado pelo Governo existem várias soluções possíveis, desde transferências de verbas das despesas ao esquema que V. Ex.a agora veiculou através da proposta do CDS, havendo eventualmente outras. Portanto, é dentro destes limites, que naturalmente com direito de recurso para a Comissão e depois para o Plenário, a Mesa entende ser aceitável a proposta apresentada pelo CDS.

Quanto à questão dos efeitos retroactivos, penso que essa é uma matéria que conviria ser discutida no Plenário quando da análise e discussão da proposta do CDS em toda a sua plenitude e não se justificaria estarmos aqui, neste momento, a embrenharmo-nos nessa discussão por uma questão de brevidade processual.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, sobre a opinião que o Sr. Presidente nos tramsitiu, com carácter geral, sobre esta questão, que agradeço muito, devo dizer que V. Ex.a não está acompanhado por quem tem tratado este assunto. A iniciativa dos deputados, depois de desencadeada uma iniciativa, não tem limites, Sr. Presidente. Entendo eu, e muita gente comigo, e entende o CDS. Neste momento, essa iniciativa não tem limites. Portanto, nessa matéria não vejo que tenhamos qualquer limitação.

A outra questão que coloco é uma questão processual. O Sr. Deputado Magalhães Mota desencadeou uma discussão e V. Ex.a deu-lhe sequência; agradeço muito estarem a fazê-lo, mas de facto não é esta a sede adequada, Sr. Presidente. Isto terá de ser discutido em Plenário. A alteração que nós propomos ao artigo 41.° terá de ser completamente discutida em Plenário, e sê--lo-á certamente, porque sem dúvida diz respeito ao orçamento das receitas. No entanto, como ela tem uma

implicação na despesa, apresentamos hoje aqui esta proposta — estou a dar algumas explicações sobre ela porque é a causa da proposta que hoje apresentamos aqui em matéria de despesas —, e V. Ex.as terão de decidir se discutem hoje aqui a nossa proposta respeitante à despesa ou, se não a discutirem hoje, quando é que a discutem. Obviamente não prescindimos que ela seja discutida e, é claro, também pode ser votada e recusada ou aceite por VV. Ex.as aqui presentes. Suponho que a questão que se põe é essa e só essa. A questão é saber se a nossa proposta muito concreta, e que fazemos porque temos uma proposta para apresentar em matéria de receita, é aceite pela Mesa e discutida e votada pela Comissão.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Nogueira de Brito tem toda a razão em dizer que obviamente a proposta do CDS, na sua plenitude, será discutida e apreciada no Plenário, mas é evidente que não era indiferente para nós para saber o peso, a importância da sua proposta, nesta sede, saber se a sua proposta era, de acordo com a opinião comum, praticamente inaceitável no Plenário, e portanto não valeria a pena discutir muito essa questão, ou se, pelo contrário, como penso, era uma proposta que teria pleno cabimento. Foi só nessa sede e nessa perspectiva que me permiti fazer as observações que fiz.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — E, aliás, deu uma achega importante.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, não vamos impugnar a admissibilidade desta proposta.

O Sr. Presidente: — Não seria esta a sede.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Gostaria, em todo o caso, de salientar um aspecto que se me afigura importante. Do ponto de vista que foi expresso pelo Sr. Presidente, esta proposta corresponderia a uma solução técnica para um problema. Perguntar-lhe-ia se esse entendimento corresponde à situação de que a vigência desta proposta, eventualmente a ser aprovada, corresponderia à do Orçamento para 1986 ou se, pelo contrário, essa proposta teria efeitos futuros e, nesse caso, se efectivamente não seria uma solução técnica apenas para este ano orçamental.

O Sr. Presidente: — Isso é exacto.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de me pronunciar de forma breve sobre os dois aspectos que foram suscitados. Um refere-se à questão que foi abordada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito e pelo Sr. Presidente, no sentido de saber quais são os limites e o sentido das revisões orçamentais. Creio que dificilmente o Sr. Deputado Nogueira de Brito poderá deixar de estar acompanhado quanto à posição que aqui sustentou, uma vez que qualquer outro entendimento seria uma gravíssima limitação dos poderes orçamentais da Assembleia da República. Na verdade, reconhece que o juízo sobre o encetar do processo de revisão orçamental deve caber ao Governo,

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deve ser formalizado através de uma proposta, nos termos constituicionais. No entanto, uma vez encetado esse processo, abre-se um debate em que a iniciativa legislativa secundária cabe, sem dúvida, aos partidos e aos deputados no caso concreto, e deve e pode ser exercida para o efeito que os deputados e os partidos reputem necessário numa determinada conjuntura orçamental e financeira. Isto significa que se a Assembleia da República ponderar que o âmbito da revisão determinada pelo Governo é insuficiente, inadequado ou incorrecto tem naturalmente o dever — porque a questão das finanças publicas não é uma questão do Governo, é uma questão do Estado, é uma questão da República — de fomentar as alterações que sejam necessárias para corrigir aquilo que deva ser corrigido. No caso vertente, por exemplo, se a panóplia de receitas conduz a resultados preversos ou se o registo das despesas é inadequado ou insuficiente, é óbvio que a Assembleia da República tem o dever de, por um lado, tomar conhecimento oficioso do estado real das finanças públicas, por outro lado, com esse objectivo, solicitar ao Governo os esclarecimentos necessários, e o Governo tem naturalmente o dever de os prestar, e, por outro lado, aferida a veracidade e o rgior das informações prestadas, deve a Assembleia ponderar as medidas legislativas necessárias para sanear as finanças públicas na medida exacta necessária face à sua situação real. A Assembleia não pode estar limitada face a essa panóplia de informações a um âmbito, porventura inadequado, colocado pelo Governo e mantido, como creio que estava a ser sustentado, ou me apercebi que estivesse a ser sustentado, pelo Sr. Presidente com alguma originalidade, tanto quanto sei, na doutrina portuguesa.

Isto é naturalmente um direito, mas teria consequências bastante gravosas para o equilíbrio de poderes entre a Assembleia da República e o Governo. Por outro lado, no caso vertente, até parece que isto tem mais justificação. O Sr. Presidente, nessa matéria foi a única voz que até agora adiantou fundamentos, parece entender que a proposta do CDS não seria, em concreto, inadmissível ou controversa, uma vez que seria, na definição que nos deu, uma outra resposta técnica para uma mesma questão colocada pelo Governo. Todavia, pode suceder que, por um lado, essa resposta nos leve muito para além daquilo que o Governo pretendeu a situar e, por outro lado, pode haver outras questões. Creio que hoje no debate parlamentar foram colocadas interrogações sobre situação de certos departamentos, sobre a situação de certo tipo de funcionários, sobre certas despesas — sei, por exemplo, que as despesas do Ministério da Justiça são largamente excedentes aos montantes inscritos na respectiva receita e que a situação dos cofres é desastrosa —, e não sei se a Assembleia da República pode ser indiferente ou alheia a esta matéria, neste momento. Poderá, porventura, se nenhum partido suscitar iniciativa no sentido adequado, mas deverá? Poderemos ser alheios à situação dos funcionários eventuais? Poderemos, mas não estamos impedidos técnica, jurídica e politicamente de o fazer.

A segunda questão que gostaria de abordar diz respeito à metodologia. O CDS, ao propor a introdução de uma outra resposta possível para enquadrar a situação criada pelo Orçamento do estado para 1986, na redacção que lhe foi dada pela Assembleia da República, faz uma opção que diz respeito às receitas cujo debate compete ao Plenário e dessa opção resultará

naturalmente um certo conjunto de consequências na óptica das despesas. Existe uma correlação biunívoca entre a opção de receitas e a opção no tocante às despesas, o que quer dizer que todo o debate tem de transitar, em termos formais, para o Plenário, sendo lá feita a opção sobre as receitas e a opção inerente sobre as despesas, ou então a discussão que aqui se possa travar sobre essas matérias terá um carácter puramente preparatório, mas nunca deliberativo. É óbvio que as discussões de carácter preparatório são inteiramente livres e nada pode impedir a Comissão de as fazer; todavia, não serão eficazes em circunstância alguma, de modo que ou haverá interrupção de trabalhos, transitando tudo para o Plenário sem preparação, ou haverá um debate puramente preparatório, aguardando--se, então, a deliberação em sede de Plenário quanto às questão de receitas e quanto à derivada e consequen-cial questão das despesas.

Eram estas as duas observações que queria fazer, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Penso que quanto à primeira questão não vale a pena prolongar a discussão porque neste momento não tem efeitos práticos. A minha posição decorre de algumas interpretações dos textos constitucionais em matéria de iniciativa do Governo quanto ao Orçamento, mas suponho que não vale a pena estarmos a prolongar o debate, certamente muito interessante — não estamos num debate académico. A segunda questão que coloca é a questão que temos de rapidamente ajuizar e é a seguinte: A proposta de alteração apresentada pelo CDS, se vier a ser aprovada, só pode ser discutida no Plenário porque é uma proposta relativa às receitas, visto que diz respeito a uma isenção. Nestas circunstâncias, teremos de optar por uma de duas soluções: ou consideramos que há toda uma zona das despesas que não se justifica neste momento, pelo menos, votar, porque será sempre votada sujeita à condição do futuro da proposta do CDS no Plenário e é uma das soluções, embora isso não diga respeito às Forças Armadas — há uma parte que subsiste e essa poderá ser votada porque não é prejudicada pela proposta do CDS em matéria de isenção —, ou então admitindo que nada nos garante qual o futuro da proposta do CDS e de quaisquer outras propostas que possam vir a ser apresentadas nestas matérias, visto que o Plenário tem sempre o direito de avocar, poderemos pura e simplesmente considerar que vamos fazer um caminho normal e que das consequências que eventualmente tenha a aprovação da proposta do CDS, ou de outras futuras propostas que venham a ser apresentadas, o Plenário terá de retirar as respectivas conclusões e, portanto, de avocar ou modificar as votações que tenham sido feitas em Comissão.

Gostaria de obter a opinião da Comissão sobre isso, isto é, seguirmos um dos dois caminhos. Há uma parte em matéria de despesas, sobre a qual não há dúvidas, que podemos neste momento votar, visto que não existem propostas conhecidas que venham a incidir sobre elas na discussão em Plenário. Há uma parte, essa sim, que tem imediatamente consequências se a proposta do CDS vier a ser aprovada, e por isso colocam-se as alternativas de votar com a consciência de que pode ser um voto condicional ou, pelo contrário, passar a não votar e deixar para o Plenário. Gostava, por conseguinte, de saber qual o posicionamento dos diversos grupos parlamentares. Há pouco não referi, mas gostava de o

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fazer, visto que estamos a gravar, que há um entendimento, salvo se houver algum senhor deputado representando o seu grupo parlamentar que se manifeste em sentido contrário, em que a votação nesta Comissão, como é tradicional, se fará por grupo parlamentar.

Portanto, gostaria de saber qual a posição dos diversos grupos parlamentares, para não estarmos a perder tempo acerca desta questão, que é a seguinte: as verbas que, a ser votada favoravelmente a proposta do CDS, terão de sofrer uma modificação relativamente àquilo que foi apresentado pelo Governo devem ser aqui votadas ou vamos deixá-las para a votação no Plenário?

Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Deixamo-las para o Plenário, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, entendemos que a votação, dessas verbas deve ficar para o Plenário, e entendemos isso porque ao fim e ao cabo a proposta é só uma. Se a proposta do CDS vier a ser aprovada, automaticamente desaparece o aumento de despesa proposto, é apenas uma proposta. O CDS apresentou duas propostas, ou apresentou uma agora e apresentará outra no Plenário apenas para evitar a votação agora, quando anunciou a proposta para o Plenário. Julgo que seria uma situação muito complicada haver agora uma votação num sentido e no Plenário haver uma votação no sentido inverso. Não me parece que obrigar à avocação seja a melhor solução, na medida em que se sabe que essa proposta existe e que ao fim e ao cabo é apenas uma e única proposta. E isto que nos leva a definir que a votação deva transitar para o Plenário.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.8 Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PS também entende que a votação relativa aos 2,3 milhões de contos deve ser feita em Plenário.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD também entende que, uma vez apresentada a proposta do CDS, não faria sentido que esta Comissão fizesse votações condicionais ou sujeitas a avocação pelo Plenário. Daí pensarmos que a melhor solução será transferir esta discussão para o Plenário. Obviamente que o CDS também tomou isto em consideração, e ao apresentar a proposta sabia que a solução normal seria transferir esta discussão para o Plenário.

O Sr. Presidente: — Suponho ter sido esse o objectivo com que a fez. Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradecendo a revelação das nossas intenções, que está a ser feita um pouco por todos os outros partidos, o certo é que apresentámos hoje a proposta das despesas como medida cautelar para evitar que a proposta perdesse uma boa parte do seu sentido na apresentação no Plenário.

Entendemos que se trata, sem dúvida, de uma proposta subordinada e que, portanto, deve aguardar a votação da proposta sobre a receita.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD entende que deveriam ser aqui votadas as despesas, pois, caso contrário, afigura-se--nos que essa dilação contraria a configuração do voto que hoje se manifestou, no Plenário, na discussão na generalidade.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso haver um entendimento maioritário no sentido de que, na proposta do Governo, só tem sentido fazer a discussão na Comissão a partir da rubrica das despesas «02 — Ministério da Defesa Nacional — Estado-Maior-General das Forças Armadas — 77 993 contos», visto que não faz sentido discutir agora a primeira verba para combustíveis e lubrificantes.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, há pouco fez uma intervenção na qual dava a entender, e bem, que a proposta do CDS tem apenas a ver, em termos de despesa, com as verbas destinadas a combustíveis e lubrificantes. Haveria, portanto, uma solução nesta matéria que era esta: não deixar de votar em globo, tal como estão indicadas no mapa resumo da despesa, as verbas respeitantes à compensação da redução de receita em orçamentos privativos das Forças Armadas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, foi isso que sugeri.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Muito bem.

O Sr. Presidente: — Quer dizer, a verba para combustíveis e lubrificantes que li pelo índice corresponde exactamente às verbas que o Sr. Deputado aqui apresentou.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — É um pouco difícil votar verba por verba porque, em alguns dos casos, têm classificações orgânicas que são as mesmas, estando, portanto, incluídas na mesma classificação.

O Sr. Presidente: — Efectivamente estão incluídas na mesma classificação orgânica, mas analisando verba por verba é fácil verificar que é toda a parte para compensação de redução de receita em orçamentos privativos das Forças Armadas que podemos votar.

Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Deputado Nogueira de Brito, antes de procedermos à reprodução e distribuição desta proposta, a Mesa gostaria que confirmasse

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0 valor de «Ministério da Defesa Nacional —Marinha— 28 648 110 contos», pois parece haver uma gralha. Como todas as outras verbas estão certas, gostaria que confirmasse esta antes de proceder à distribuição.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Deputado Ivo Pinho, tem muita razão. Devo dizer-lhe que procedi a essa correcção depois de ter obtido a informação de que a verba global que se encontra como compensação para combustíveis e lubrificantes em «Ministério da Defesa Nacional — Marinha» não se destinava, na totalidade, à compensação de combustíveis e lubrificantes, mas incluía também as verbas dos serviços sociais ou as que estão no n.° 2 do mapa resumo da despesa.

As verbas destinadas realmente a esta compensação de receitas, que era perdida por força da perda do diferencial, correspondia precisamente a 520 000 contos. Dai que eu tenha deduzido 520 000 contos a

1 095 880 contos e o resultado tenha sido apurado em conformidade com isso.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Deputado, então isso significaria que o excedente entre a verba que está prevista na proposta do Governo e os 520 000 contos deveria ser junta às verbas que vamos votar seguidamente.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Deputado, essa matéria ficaria para votar em Plenário. Isso seria realmente uma diminuição do aumento proposto, equivalente a 575 880 contos.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Exactamente, Sr. Deputado.

Pausa.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, utilizando os critérios cautelares que o Sr. Deputado Nogueira de Brito tem usado no Plenário, gostaria que, antes de mais, esta informação por ele prestada à Comissão fosse confirmada ou reafirmada pelo Governo, designadamente pelos membros aqui presentes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, queria exactamente sugerir aquilo que o Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu, ou seja, que ouvíssemos a posição do Governo sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Dfesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional (Silveira Godinho): — Sr. Presidente, em relação aos pontos privativos do Ministério da Defesa Nacional — Marinha e mecanismo orçamental é diferente dos do Estado-Maior do Exército e da Força Aérea. Vão directamente ao Orçamento do Estado.

Portanto, da verba de 1 095 880 contos, 520 000 contos referem-se à compensação da diminuição de receitas do fundo privativo da Marinha.

Os restantes 565 880 contos é que seriam para fazer face ao aumento do preço dos combustíveis utilizados nos consumos funcionais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Secretário de Estado, isso significa que esse remanescente deve ser acrescido a estas verbas que vamos ter agora, ou seja, à compensação em receita dos orçamentos? Não está cá essa indicação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Está na classificação 03.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Na classificação 03. De qualquer maneira, o remanescente terá de ser votado aqui e agora.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Exacto, Sr. Deputado, mas não juntamente com as da alínea b). Na rubrica «03» há uma parte que deve ser discutida agora, que são os tais 520 000 contos. A outra parte ficaria para ser discutida juntamente com a da Força Aérea, Exército e Estado--Maior-General das Forças Armadas.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, isso significa, na prática, que, a aceitar a metodologia de remetermos para o Plenário aquilo que pode vir a ser alterado pela aprovação eventual da proposta do Centro Democrático Social, de qualquer forma, deveríamos na verba «03» aprovar a verba de 520 000 contos?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Sr. Presidente, na rubrica «b)» aparecem apenas os fundos privativos do Estado-Maior--General das Forças Armadas, do Exército e da Força Aérea e não aparece a Marinha, já que essa está englobada na verba de 1 095 880 contos.

O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, seria, portanto, isso, ou seja, 520 000 contos na verba «03».

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Exacto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Segundo a metodologia — que é de uma clareza meridiana —, vamos começar per votar a verba «03 — Ministério da Defesa Nacional — Marinha», com a sua proposta de alteração para 520 000 contos, na predisposição de, caso a proposta do CDS não faça vencimento, a restante verba de 1 955 880 contos ser votada no Plenário. Se a proposta do CDS fizer vencimento, então ela não será votada.

Tem a palavra o Sr. Deputado Ivo Pinho.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Presidente, creio que não é bem assim. Penso que o que vamos votar é a verba de 575 880 contos.

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O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Sr. Deputado, a verba de 575 880 contos é o reforço para o aumento do preço dos combustíveis.

O Sr. Ivo Pinho (PRD): — Sr. Secretário de Estado, tinha então, entendido mal. O que vamos votar é a averba de 520 000 contos?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — É, sim, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, peço imensa desculpa, mas ainda não consegui compreender.

Os 520 000 contos são para os fundos privativos.

O Sr. Secretário de Estado disse que a verba de 575 880 contos era para os funcionários. Para os funcionários, para quê?

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — É para os consumos funcionais. É o equivalente a 550 000 contos para o Exército, que vêm a seguir.

A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Exacto, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de formular dois pedidos de esclarecimento aos dois Secretários de Estado aqui presentes.

Compreendi já a questão da verba. Pergunto: esta situação dos orçamentos privativos da Marinha é uma situação regular? É que esta situação é completamente diferente de todas as outras. Se isto é uma situação regular, de facto, há uma centralização de todos os orçamentos privativos no Ministério da Marinha.

Por aquilo que o Sr. Secretário de Estado referiu, parece-me que há uma centralização a nível do Ministério da Marinha, que depois é distribuída. Julgo que esta é a única hipótese de não haver orçamentos privativos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Não, Sr. Deputado. O que acontece no Ministério da Marinha é o seguinte: as receitas provenientes do diferencial para os consumos particulares são repostas na Fazenda Nacional e, portanto, entram na rubrica correspondente do orçamento do Ministério da Marinha e não nos fundos privativos. No Estado-Maior-General das Forças Armadas, no Exército e na Força Aérea esse diferencial é receita directa do fundo privativo. É apenas um mecanismo diferente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, a receita que, até esse momento, as unidades da Marinha tinham pela venda de combustível a pessoas individuais...

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — O diferencial que tinham os consumos particulares.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —... não era das unidades, mas sim do Ministério.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Era receita da Fazenda Nacional. Portanto, entrava na rubrica «Fazenda Nacional — Marinha», ou seja, no «orçamento pai» do Ministério da Marinha e não no orçamento dos serviços privativos. Assim, essa receita deixou de existir —já que também deixou de existir o diferencial— e tem agora de ser compensada pelo aumento do «orçamento pai» do Ministério da Marinha.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, penso que o esclarecimento já está, de alguma forma, dado, mas, em todo o caso, convém sublinhar a sua diferença. É que o funcionamento orçamental da Marinha, do Exército e da Força Aérea era, e é diferente. Enquanto o Exército e a Força Aérea faziam reverter para as unidades, portanto, unidade a unidade operacional, as receitas provenientes da venda de combustíveis ao pessoal quer militar quer civil ao serviço das Forças Armadas — e era o caso específico do Exército —, a Marinha utilizava outra técnica e transferia para o orçamento do Estado-Maior da Armada, em geral, as verbas provenientes dessas vendas de combustíveis. É daí que resulta a diferença na apreciação.

O Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Defesa Nacional: — Tínhamos o Exército, a Força Aérea e o Estado-Maior-General das Forças Armadas, mas só a Marinha é que funcionava assim.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Exacto!

O Sr. Presidente: — Suponho que já está esclarecida a forma como funcionam, nesse capítulo, os orçamentos das Forças Armadas. Iríamos, portanto, proceder às votações. Há que determinar o que é que vamos votar na parte das despesas. Como já tivemos oportunidade de analisar esta matéria na Comissão e no Plenário, quando da discussão da generalidade, talvez, e se não houver pedidos de intervenção, pudéssemos passar à votação imediata.

As verbas do Ministério da Defesa Nacional — Estado-Maior-General das Forças Armadas seriam de 77 993 contos.

No Ministério da Defesa Nacional — Marinha a verba seria de 520 000 contos. De acordo com o entendimento que há pouco foi referido, esta seria uma verba nova.

No Ministério da Defesa Nacional — Exército a verba seria de 1 046 000 contos.

No Ministério da Defesa Nacional — Força Aérea a verba seria de 323 200 contos.

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No Ministério das Finanças a verba seria de 72 000 contos.

No Ministério da Administração Interna a verba seria de 295 700 contos.

O total seria, pois, de 2 334 893 contos.

A seguir, iríamos proceder a outras votações. Podemos votar na globalidade esta proposta?

Pausa.

Como não há objecções, vamos então proceder à sua votação global.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos agora proceder ao segundo bloco de votações, que dizem respeito aos subsídios ao Montepio dos Servidores do Estado e à Caixa Geral de Aposentações para cobertura dos encargos com bonificações a aposentados — Ministério das Finanças.

A proposta inicial do Governo situava-se em 3 milhões de contos. Na nota que foi fornecida pelo Gabinete do Sr. Ministro das Finanças a verba seria de 2 936 000 contos.

A pergunta que gostaria de fazer ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento é se a verba que o Governo pretende que seja posta à votação é a de 3 milhões ou a de 2 936 000 contos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Rui Carp): — Sr. Presidente, os elementos que foram dados posteriormente são de cálculo, mas é evidente que o Governo mantém os 3 milhões de contos, até por uma razão de simplicidade contabilística.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de colocar uma questão, que, aliás, já foi levantada ao longo deste processo. Não vamos novamente discutir os números, pois não é isso que está em causa. Fizemos a discussão que devíamos fazer, mostrámos a aleatoriedade de que se revestem esses números e a estranheza pelo facto de o Governo nos ter dado as informações em poucos dias.

A questão que gostaria de levantar é a seguinte: a alínea c) do artigo 17.° da Lei do Orçamento do Estado para 1986 autoriza o Governo a fazer transferências de verbas destinadas a pessoal, autoriza que o Governo recorra ao mecanismo da aposentação antecipada, previsto no próprio Orçamento do Estado para 1986. É evidente que ninguém esperará que 100% dos aderentes às reformas antecipadas deixem as vagas da função pública por preencher. No entanto, julgo que será lógico, e até prudente, admitir que uma certa percentagem, na ordem de um terço, por hipótese —o que se poderá prever face às afirmações que o Governo tem feito sobre a intenção de redução do número de funcionários públicos—, venha a optar pela aposentação antecipada e, portanto, deixem vagas não preenchidas. Nessa perspectiva, pedia ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento que desse a sua opinião sobre este assunto. Contudo, adiantaria desde já que o PCP vai propor que esta verba seja reduzida para 2 milhões de contos, na medida em que nos parece que para cerca de um terço a verba estará já disponível no Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, o Grupo Parlamentar do PCP vai, portanto, entregar uma proposta de redução?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Exacto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ávila.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — Sr. Presidente, gostaríamos de questionar o Sr. Secretário de Estado do Orçamento sobre o problema do âmbito de aplicação desta aposentação antecipada e bonificada. Do nosso ponto de vista, existem dúvidas se se aplica ou não aos funcionários e agentes da administração local. Há quem entenda que sim. Nesse sentido, gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento se esta verba foi calculada tendo em conta esses mesmos funcionários e agentes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Octávio Teixeira, é evidente que a norma da aposentação bonificada, que consta do Orçamento do Estado —que tem a ver com o orçamento dos serviços da administração central—, é uma norma de gestão de recursos e, portanto, neste caso abrange os recursos humanos da administração central. A não ser que houvesse expressamente o alargamento desta norma aos funcionários da administração local e a outro tipo de subscritores da Caixa Nacional de Previdência, esta norma, naturalmente, só abrange os funcionários da administração central. Houve, de facto, um equívoco relativamente aos funcionários autárquicos, mas este foi pacificamente aceite pelos próprios serviços da Caixa Nacional de Previdência. Portanto, os cálculos que o Governo fez abrangem apenas os funcionários da administração central.

Ó Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos aguardar que seja formalizada a proposta do PCP. Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, a interpretação que caba de ser exposta coloca-nos, naturalmente, algumas questões. Obviamente que a questão da ponderação da diminuição da verba orçamentada tem a ver com o âmbito da situação. Se a proposta contemplar os funcionários da administração local, nos seus termos quantitativos, ela terá uma grande relevância. Terá outra se for reduzida aos funcionários da administração central, como é evidente.

Assim sendo, pediria um intervalo regimental de dez minutos para que possamos ponderar as soluções agora consignadas por esta interpretação.

O Sr. Presidente: — O Sr. Secretário de Estado do Orçamento tinha pedido a palavra para dar esclarecimento complementar em relação àquilo que referiu.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, penso que seria útil ouvir o esclarecimento antes do intervalo.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr. Presidente, queria agradecer ao Sr. Deputado Magalhães Mota a sua última reflexão.

Se a assembleia, porventura, tivesse alargado o âmbito desta norma aos funcionários de outros sectores que sejam subscritores da Caixa Nacional de Previdência — caso de algumas empresas públicas, como seja a RDP, a Imprensa Nacional-Casa da Moeda, etc, além da administração autárquica —, isso abrangeria mais 8375 funcionários. Na hipótese teórica de todos aderirem, isto envolveria um acréscimo de 5 milhões de contos, não necessariamente para 1986, mas para todo o período de vigência.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, sobre esta questão gostaria ainda de colocar uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado. Só para a administração local, qual o número de funcionários que seriam abrangidos por esta norma? O Sr. Secretário de Estado tem esses elementos? Quais os encargos que se teria de suportar este ano?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não tenho esses dados, porque como essa norma não abrangia os outros sectores não foram feitos esses cálculos, ou seja, era perfeitamente redundante estarmos a fazê--los. Tenho um número global, mas não o tenho desagregado por subsectores. Não há, nem haveria, interesse em efectuar esses cálculos.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Mas gostaria de saber se tem, relativamente ao número global dos 8375 funcionários e dos 5 milhões de contos para todo o período, alguns dados respeitantes somente a este ano.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Também não tenho, pois não tinha interesse fazer-se um estudo que não estivesse relacionado com esta norma.

Fez-se o primeiro levantamento, mas parou-se por aí, porque esse estudo envolveria cálculos muito mais complicados. E, portanto, por uma questão de economia de meios, esses estudos não foram realizados.

O Sr. Presidente: — Julgo que não há mais pedidos sobre este ponto que estávamos a seguir e que teria interesse de elucidar antes de deferir o pedido do Sr. Deputado Magalhães Mota.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, admito uma solução que pode ser mais conveniente para os interesses dos nossos trabalhos e que é adiarmos a votação do ponto em questão, possivelmente para o final do debate, e, entretanto, avançarmos já para outro ponto. Poderíamos talvez ganhar tempo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Magalhães Mota, o ponto seguinte é uma interrogação e não sei se adiantaremos muito com a sua sugestão.

Gostaria de consultar a Comissão sobre a seguinte questão: foi apresentada na Mesa da Assembleia — embora não haja um despacho formal, mas isso não me parece necessário — uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado, assinada por vários deputados, entre os quais os Srs. Deputados Helena Torres Marques, Carlos Carvalhas e Vítor Ávila, no sentido de propor o reforço da dotação provisional em 1 500 000 contos, para que o Governo não possa dizer que não pode imediatamente baixar o preço do leite por falta de meios financeiros para o efeito. Trata-se de uma proposta que envolve um aumento de despesa e que, a prevalecer a interpretação que foi já aqui manifestada, nós, Comissão de Economia, Finanças e Plano, poderemos debater. A menos que VV. Ex.as prefiram que esta matéria seja discutida no Plenário. Mas, se não houver nenhuma manifestação maioritária no sentido de ela ser discutida no Plenário, discuti-la-emos aqui.

O Sr. Deputado Magalhães Mota prefere, para que os trabalhos tenham a maior brevidade, que não se interrompa a reunião e que se vá discutindo esta matéria ou prefere fazer a interrupção de dez minutos que há pouco tinha solicitado?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, com dez minutos penso que talvez adiantemos algo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, obviamente que não intervenho para deduzir qualquer objecção à suspensão dos trabalhos.

Em todo o caso, como o Sr. Secretário de Estado do Orçamento forneceu alguns esclarecimentos, e eles são úteis para a ponderação que vamos ter de fazer com vista a apresentar propostas concretas, gostava de não deixar de fazer uma pergunta que foi suscitada numa reunião que hoje tivemos na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Foi transmitida a essa Comissão uma interrogação que gostaria de vos deixar e que é a seguinte: o mecanismo da alínea c) do n.° 1 do artigo 17.° (reforma antecipada), segundo me informaram alguns magistrados, estará a ser aplicado pelo Governo a magistrados judiciais, ou seja, o Governo terá enviado a magistrados do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo, etc, um convite à antecipação da sua aposentação.

Não sei se isso foi um lapso informático, um acto mecânico, um esquecimento, ou se é uma intenção deliberada de proceder à antecipação da aposentação dos nossos magistrados e funcionários superiores. Também não sei quantos milhares de contos é que isso envolve na verba que o Governo aqui nos propôs originariamente. Creio que como está fora de questão que os funcionários superiores abandonem, por seu pé, os tribunais — onde aliás são necessários —, talvez pudéssemos abater pelo menos essa verba fazendo um cálculo sensato.

Por outro lado, em matéria de sensatez, também gostávamos de saber qual é a sensatez governamental na projecção desta expectativa de antecipação de aposen-

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tação, designadamente tendo em conta que a Administração Pública tem uma certa carência de funcionários qualificados e que, portanto, não pode ser subitamente abandonada, sem uma certa programação, por funcionários dotados da experiência necessária.

Sendo certo que o Governo seguramente não quererá o dilúvio, nem vai certamente ser tão mefistofélico que obrigue a Assembleia da República a provocá--lo, deve ter feito meia dúzia de contas. Eram essas contas que seria útil que tivéssemos para podermos fazer as contas necessárias ao abatimento da verba na proporção correcta, e não noutra qualquer fantasiosa.

Era esta a pergunta que lhe deixava, Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Esta informação do Sr. Deputado José Magalhães é extremamente importante. E é pena que, estando agora a Assembleia na votação na especialidade, ela já esteja ultrapassada.

De qualquer maneira, e porque não quero tirar tempo aos Srs. Deputados, devo dizer que fico espantado com esta posição crítica — peço desculpa se interpretei mal — do Sr. Deputado José Magalhães relativamente ao alargamento desta medida aos magistrados judiciais.

De facto, o Governo, como fez essa proposta incluindo-a na proposta de lei do Orçamento para 1986, teve o cuidado de não alargar estas medidas ao pessoal técnico e técnico superior, evidentemente englobando neste os magistrados, os professores, etc.

É claro que, a partir do momento em que a norma estava estabelecida, por uma questão de equidade de direitos de quaisquer funcionários, o Governo não destrinçou se se tratava de um magistrado judicial, de um professor catedrático ou da secretária do Secretário de Estado do Orçamento. Todas essas pessoas receberam a respectiva carta do Sr. Ministro das Finanças, porque essa carta não é mais do que um aviso aos senhores funcionários da administração central a informá--los de que podem usufruir daquele regime bonificado e, portanto, no sentido de eles não ficarem desprevenidos relativamente à posição dos dirigentes ou da própria hierarquia, que, pela qualidade desses mesmos funcionários, não pretenderiam vê-los sair.

A intervenção do Sr. Deputado José Magalhães não é mais do que a clara e espontânea contradição da oposição parlamentar que votou a referida norma nos termos em que a conhecemos.

O Sr. Alberto Monteiro Araújo (PSD): — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, estou muito surpreendido que o Governo tenha aguardado até este momento para fazer este desabafo quase freudiano!

O que perguntei ao Sr. Secretário de Estado foi muito simples: foi se o Governo estava a incluir nos 8375 funcionários, para um montante de 5 milhões de contos que aqui anunciou, todos os juízes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo, etc. Se o Executivo incluiu esses funcionários nesse montante, ele está a brincar con-

nosco, porque não parte do princípio que haja um movimento automático de exercício do referido direito por parte de toda a função pública, que está em condições abstractas.

A Assembleia da República, que eu saiba, não impôs nada nesta matéria, criou apenas uma mera faculdade, e daí não se segue um êxodo automático e total. Portanto, a conta do Governo é apocalíptica, parte de um cenário maximalista e envolve um juízo de probidade que me parece relativamente grave.

Assim, se a resposta do Governo é a de que inclui na citada verba toda essa gente, ele faz um cálculo de expectativa que é da sua exclusiva responsabilidade. Quer dizer, é da exclusiva responsabilidade do Executivo que ele tenha mandado em meia linha a «boa nova» a todos e a cada um e fica isso em débito exclusivo na sua conta corrente e na sua forma de actuação política.

Era esta questão que gostaria de deixar, e de qualquer maneira agradeço o seu esclarecimento, que deve ser muito interessante.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado José Magalhães, é pena que essa vossa posição não tivesse sido ponderada, não obstante os pedidos de colaboração do Governo, na altura em que foi votada esta norma, pois como ela está redigida não identifica nem isenta qualquer funcionário da administração central. Portanto, a partir do momento em que o funcionário tem direito a usufruir dessa norma, o Governo mais não fez do que um mero acto de justiça ao avisar todos os funcionários, com um ou oucro lapso, que decorre naturalmente da própria actualização dos ficheiros informáticos, da faculdade que eles têm. Assim, não há aqui nenhum juízo apocalíptico, mas sim um mero cumprimento da regra do cabimento orçamental.

Foi prevista apenas uma percentagem, e não a totalidade dos funcionários, pois não prevemos que saiam os referidos 100% dos funcionários que vão adquirir ou já adquiriram o direito a beneficiar do regime em causa. Portanto, a partir do momento em que eles têm esse direito, não há senão que os alertar para o facto. E, posteriormente, o Governo, caso a caso, considerará imprescindível ou não o preenchimetno da vaga aberta pela passagem à aposentação.

Daí decorre a outra justificação básica para o Executivo manter este valor de 3 milhões de contos, no sentido de que ele deve prever, à partida, cobertura necessária para este normativo inovador. É evidente que todos nós, dentro de um claro bom senso, sabemos que é possível que a verba não seja necessária na sua totalidade. Mas isso não invalidada que o Governo — volto a repetir que dentro da norma constitucional e da lei de enquadramento não deve haver despesas que não tenham cabimento orçamental — tivesse de calcular uma verba considerada suficiente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Gostava de fazer ainda um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, que é o seguinte: face

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à alínea c) do n.° 1 do artigo 17.° da Lei n.° 9/86, que diz que é possível transferir as verbas respeitantes aos vencimentos dos funcionários que se aposentam aproveitando a antecipação prevista, penso que, afinal, os referidos 3 milhões de contos estão todos aqui contemplados. Porque todas estas pessoas são funcionários que, por sua livre vontade, aceitam esta proposta e como o seu vencimento é sempre pela verba máxima, ou seja, até os 20% estão aqui incluídos, pergunto o que é que falta. Faltarão, eventualmente, as pessoas que vão ser substituídas.

Mas, como o respectivo decreto orçamental diz que não serão substituídas senão um parte diminuta dessas pessoas, dá-me a sensação que nem mesmo esses 3 milhões de contos, face ao que está referido no artigo 17.° — embora eles possam dizer respeito a todos e não apenas à parte imputável à Assembleia da República —, são necessários. Ou, se o forem, será uma parte mínima.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A minha intervenção visava obter um esclarecimento, seja do Sr. Secretário de Estado do Orçamento ou de alguma das pessoas que levantou agora o problema da possibilidade de afectação ou de transferência das verbas da deslocação de pessoal, deslocado ou aposentado, para os outros serviços.

De facto, a forma como a norma está feita não é clara para mim. Face àquilo a que já assisti durante os vários debates sobre o Orçamento do Estado e havendo, na execução deste orçamento para 1985, uma norma relativamente idêntica à proposta pelo Governo e aprovada na Assembleia, que implicava transferências de verbas entre capítulos diferentes, gostaria de saber se esta norma não poderá estar ferida de inconstitucionalidade ao permitir a transferência entre capítulos diferentes.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Próspero Luís, não me parece que essa norma esteja ferida de inconstitucionalidade. O problema é outro, já o expliquei, e vou apenas explicá-lo mais uma vez para que fique registado.

Essa norma, que está prevista na proposta de lei do Orçamento, designa-se geralmente de «mochila» orçamental. Quer dizer, o funcionário que seja transferido de um serviço para o outro, ou do regime activo para o de pensão — que, portanto, transite para a aposentação—, leva consigo a respectiva verba.

Já expliquei, mas agora vou dar um exemplo: imagine-se que há um juiz, um magistrado, que resolve usufruir desta norma. Infelizmente considero que, no final —e por isso é que tive o cuidado de dizer ao Sr. Deputado José Magalhães que não se preocupasse com a fuga de juízes e magistrados, a qual não orçamentámos na totalidade—, o cálculo da pensão não pode ultrapassar o vencimento do funcionário acrescido das diuturnidades. Como todos nós sabemos, os magistrados têm vencimentos muito superiores ao vencimento base mais a diuturnidade. Embora a diuturnidade dos magistrados seja muito superior às dos restantes fun-

cionários, e até por imperfeição técnica do próprio artigo que foi aprovado pela Assembleia, estou convencido de que eles não estão muito interessados em usufruir deste regime. A não ser os juízes que tenham 20 ou 22 anos de serviço, mais do que isso não tem interesse.

Mas o que se passa é o seguinte: vejamos o caso de um funcionário, por exemplo, um assessor da letra C, ou um outro investigador, que pretenda usufruir desta norma. É evidente que o decreto orçamental que respeita à extinção das vagas não está redigido como a Sr.8 Deputada Helena Torres Marques se lhe referiu

— e atribuo isso apenas a qualquer lapso de memória —, mas diz «excepto quando seja considerado imprescindível». Isto significa que o dirigente do serviço tem o direito e o dever de alertar o ministro da respectiva tutela e o ministro que gere a função pública

— neste caso o Ministro das Finanças — que a vaga é imprescindível.

No caso, por exemplo, do investigador, há um acréscimo de encargos: há o encargo da pensão de aposentação e o encargo do funcionário que vai preencher o lugar do funcionário que saiu. Daí que tenhamos de prever a verba para a pensão do funcionário e de manter a outra verba para dar cabimento ao que o substitui na sua actividade.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Mas esses não vão ser extintos.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Pois não, mas como o Governo não adiantou —nem podia— qual a percentagem dos lugares que vão ser extintos, porque isso depende da qualificação de funções, dos serviços, da carreira desses mesmos funcionários, ele não pode estar a dizer se vai ser meio milhão, 1 milhão ou qualquer outro montante.

O Executivo apenas apresentou à Assembleia uma-proposta que serve, digamos assim, para confortar

— palavra que já ouvi hoje à tarde, e que repito, pois parece-me que é clara — quaisquer encargos que se mantenham com o exercício da actividade nos lugares dos funcionários que passaram à aposentação. Lamento, Sr. Presidente, mas já não voltarei a explicar este assunto.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, julgo que estamos, neste momento, chegados à altura de suspender os trabalhos por dez minutos, que foi o pedido formulado há meia hora pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, há já pelo menos vinte mninutos que estamos a discutir a matéria sobre a qual o Sr. Deputado Magalhães Mota pediu um intervalo.

O Sr. Presidente: — Lamento, Sr. Deputado, mas o argumento que o Sr. Deputado Magalhães Mota invocou não foi por causa da discussão mas sim da votação. Portanto, suponho que ele até pode ter beneficiado com as explicações dadas pelos vários intervenientes.

Sr. Deputado magalhães Mota, V. Ex.a desiste do pedido de suspensão?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Não, Sr. Presidente, mantenho o pedido de suspensão. Mas penso

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que estes esclarecimentos todos foram úteis e nos ajudam na nossa reflexão e de tal modo que me atrevia a pedir mais um.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento disse há pouco — e bem — que tinha de calcular duas despesas. Quer dizer, não apenas as dos funcionários que optavam pela reforma voluntária como também as dos funcionários que ficavam a regular essa situação. Mas isso são duas rubricas, e não é na matéria das pensões que temos que contemplar essa despesa. Os funcionários no activo são pagos por outra rubrica orçamental.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Ele não diminuiu nada!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Magalhães Mota, são, de facto, duas rubricas. E o que eu estava precisamente a justificar é que a rubrica «01», que é a rubrica de pessoal, não pode ser dada, neste momento, em contrapartida para reforçar a rubrica das pensões. Portanto, a «mochila» orçamental — no sentido de levar a verba atrás — nuns casos funcionará e noutros não.

De qualquer modo, agradeço-lhe, Sr. Deputado Magalhães Mota, pois esta sua dúvida levanta outra questão que é importante nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, era só um comentário que gostaria que ficasse registado sobre as explicações que nos deu o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e que é neste sentido: a previsão que o Governo assenta na perspectiva de que os 100% dos funcionários que aderiram ao referido processo podem vir a ser substituídos. Portanto, a previsão governamental foi feita, acauteladamente, nessa perspectiva.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, suponho que as questões foram formuladas, as respostas foram dadas e, posteriormente, a leitura da acta permitirá elucidar o sentido exacto deles.

O Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.a deseja protelar um pouco mais a decisão da suspensão da reunião?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, de facto já tinha pedido a palavra há bastante tempo.

O Sr. Presidente: — Então, Sr. Deputado, penitencio-me por não ter visto.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Certamente, Sr. Presidente. Gostaria de fazer uma pequena referência antes da suspensão dos trabalhos e, fundamentalmente, para dizer o seguinte: por um lado, ninguém está a pedir explicações ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento ou a qualquer outro Sr. Membro do Governo. Quando muito, pedem-se esclarecimentos e os membros do Governo dão-nos ou não.

Em segundo lugar, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento diz que o Executivo não pode fazer previsões. É evidente que o Governo não pode prever quantas vagas não serão prrenchidas, tal como não pode prever quantos funcionários ou agentes da função pública recorrerão à aposentação antecipada. O Governo apontou para um número hipotético, ou seja, admitiu que 50% dos potenciais aderentes aderiram a essa medida.

Por outro lado, e seguindo o mesmo raciocício, o Executivo também poderia fazer uma outra admissão: é que 10%, ou 20%, ou 50% ou 100% dos referidos 50% de funcionários não terão os seus lugares preenchidos; as vagas restarão. Como o Governo não o fez, a Assembleia faz. Tal como o Executivo fez essa previsão de 50% de funcionários aderentes, nós prevemos que 30% destes 50% não terão os seus lugares preenchidos. Ora, isso equivale a 1 milhão de contos. E, pela nossa parte, está dado o nosso esclarecimento, que não é explicação.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, dado que neste momento não há mais pedidos de intervenção, vamos suspender a reunião e retomar os trabalhos às 0 horas e 5 minutos.

Está suspensa a reunião.

Eram 23 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, declaro reaberta a reunião.

Eram 0 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deu entrada na Mesa uma proposta de alteração, subscrita por deputados do PCP, que no que respeita a uma verba prevista na rubrica «06-Ministério das Finanças», se traduz na alteração de um aumento de 3 milhões para apenas 2 milhões de contos.

É a seguinte:

Proposta de lei n.° 31/IV Proposta de alteração

Nos termos do artigo 17.°, n.° 1, alínea c), da Lei n.° 9/86, de 30 de Abril, na execução do Orçamento do Estado para 1986, o Governo está autorizado a «efectuar a transferência [...] de verbas de pessoal justificadas [...] pela antecipação da aposentação».

Nestes termos parece-nos não ser necessária a totalidade do reforço de 3 milhões de contos solicitada para os encargos com aposentação antecipada, já que parte desses encargos poderão ser suportados com as transferências das verbas para pessoal pelo facto do não preenchimento das respectivas vagas.

Assim, os deputados abaixo assinados propõem a seguinte alteração:

06-Ministério das Finanças: 10 — Pensões e reformas — 42 785 976.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos proceder à votação desta proposta e depois, consoante o resultado, votaremos ou não a proposta do Governo.

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Srs. Deputados, não havendo inscrições, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada com votos a favor do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE e votos contra do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, nestes termos fica prejudicada a proposta do Governo. Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, depois de ter ouvido a fundamentação apresentada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira relativamente à proposta subscrita pelo PCP gostaria de saber se o PCP não tem outras alterações a propor, porque, na realidade, a descida de 3 milhões de contos para 2 milhões é feita mediante o pressuposto de que há uma economia de verba de pessoal.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Lá iremos.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Ah! Lá irá V. Ex.a Muito bem.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, em matéria da proposta de lei do Governo e no que diz respeito à competência desta Comissão estou de acordo com as decisões que tomámos.

Portanto, agora falta-nos analisar a proposta, subscrita por deputados do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE, no sentido de propor na rubrica «06-Ministério das Finanças» um aumento das despesas excepcionais no valor de 1 milhão e 500 mil contos.

Portanto, a proposta deu entrada na Mesa da Assembleia da República e por consequência, como tive ocasião de explicar há pouco, passou, por força das normas regimentais, a ser analisada e subscrita por esta Comissão.

Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, era apenas para sugerir que ouvíssemos a opinião do Governo sobre esta proposta, pois talvez isso fosse útil à prossecução dos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Com certeza. Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com todo o respeito que temos à Assembleia da República, entendo que devo expressar a opinião, que procura ser técnica, do Governo.

Efectivamente, esta proposta agora apresentada não tem nada que ver com a alteração que o Governo propôs à Assembleia da República e que foi votada na generalidade no Plenário. Ou seja, a proposta que acabou de ser aprovada, uma proposta que venceu relativamente à proposta do Governo e que fará com que haja, no que toca às pensões, um reforço de 2 milhões e não de 3 milhões, não vai naturalmente ser agora discutida pelo Governo, visto que já foi votada. No entanto, essa proposta tinha que ver, como alternativa, com a proposta de alteração do Governo.

A presente proposta não tem nada que ver com a alteração ao Orçamento do Estado que foi votada na

Assembleia da República, pelo que o Governo entende que ela está deslocada e que não deve sequer ser discutida. Além disso, trata-se do reforço de uma verba que caracterizadamente é de gestão orçamental e a gestão orçamental é da competência exclusiva do Governo.

A dotação provisional é um instrumento que a lei confere ao Governo para cobrir despesas imprevistas ou imprevisíveis. Daí que o Governo poderia ter solicitado à Assembleia o reforço ou a eliminação desta dotação provisional. Como o Governo não pediu o reforço desta dotação provisional, considero, com todo o respeito pelos deputados proponentes, deslocada esta proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, gostaria de saber se está aberta a discussão desta proposta, visto que o Sr. Secretário de Estado já usou da palavra.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento já usou da palavra no domínio da discussão desta proposta.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Muito bem. No entanto, suponho que seria útil, para nós que vamos votá-la, ouvir em primeiro lugar a justificação dos proponentes.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, os proponentes tecem consideraçõs na proposta. Se, para além disso, quiserem acrescentar alguma exposição oral de motivos, com certeza que o poderão fazer, mas não são obrigados a isso.

Tem a palavra a Sr.a Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.» Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Talvez até tivesse valido a pena ler a exposição de motivos, uma vez que a sessão está a ser gravada.

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada, se assim o entender, V. Ex.a fará o favor de a ler.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Então, Sr. Presidente, passarei a lê-la e depois farei algumas observações. A presente proposta é do seguinte teor:

Atendendo a que, no decurso da apreciação da proposta de lei do Orçamento para 1986, o Governo mostrou interesse na baixa do preço do leite e afirmou que não lhe seria possível a implementação de tal medida em consequência de ter tido que baixar o preço da gasolina, facto comprovadamente inverídico, como hoje é notório e público;

Considerando que, apesar de a maioria dos grupos parlamentares ter demonstrado que o facto da descida do preço da gasolina em nada obsta à descida do preço do leite, dado o Governo ter os meios financeiros mais do que suficientes para este fim;

Verificando que apesar do excedente de meios financeiros, no valor de pelo menos 26 milhões de

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contos, que o Governo desde já nos afirma existirem, não ter sido proposta a baixa do preço do leite;

Os Deputados abaixo assinados propõem o reforço da dotação provisional em 1,5 milhões de contos para que o Governo não possa dizer que não pode imediatamente baixar o preço do leite por falta de meios financeiros para o efeito.

Assim, propõe-se a seguinte alteração ao Orçamento do Estado para 1986:

06 — Ministério das Finanças: Despesas excepcionais — + 1 500 000 contos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estamos todos recordados de que o Sr. Primeiro-Ministro afirmou aqui, na Assembleia da República, que considerava possível e útil baixar o preço do leite em 4$ por litro.

Estamos todos também recordados de que, após a votação do Orçamento, o Primeiro-Ministro, em comunicação televisiva, disse que afinal já não podia baixar o preço do leite porque a Assembleia da República tinha decidido criar um imposto sobre os produtos petrolíferos e, consequentemente, teria de haver uma baixa no preço da gasolina.

Ora bem, é intenção, portanto, deste governo baixar o preço do leite e ficou no espírito dos Portugueses que foi pelo facto de esta Assembleia não ter tomado as cautelas necessárias que não se procedeu à baixa do preço do leite.

O que nós estamos a fazer neste momento é a dar ao Sr. Primeiro-Ministro e ao Governo os meios financeiros necessários para que ele venha a baixar o preço do leite, como considerou útil e como nós todos consideramos útil e desejável. Nós sempre dissemos que o Governo tinha mais do que os meios financeiros necessários e que a baixa do preço da gasolina não era razão para o Sr. Primeiro-Ministro não baixar o preço do leite. Com esta medida ficará perfeitamente claro se o Governo quer ou não baixar o preço do leite. A Assembleia diz, desde já, que quer que se adopte essa medida e dá ao Governo os meios financeiros indispensáveis. Assim o Governo os queira utilizar!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta quase que se justifica só por si, mas julgo que é útil neste momento reflectir sobre algumas questões. Uma delas tem a ver com o baixo consumo de leite que existe no nosso país. Trata--se de uma realidade que recentemente os próprios jornais têm divulgado e, portanto, são conhecidas as carências alimentares da nossa população e a importância que o leite tem na alimentação, nomeadamente das crianças e dos jovens.

A Assembleia da República, quando da discussão do Orçamento do Estado para 1986, teve em conta este problema e, nomeadamente, através de um reforço de verba da ordem dos 500 mil contos para a Acção Social Escolar, pretendeu ter em conta também este problema do leite, sobretudo no que toca às crianças das escolas mais carenciadas.

De acordo com informações que tenho do que se está a passar hoje, por exemplo, nas escolas primárias, nem isso está a ser devidamente cumprido. Há milhares de

crianças das nossas escolas que são mal alimentadas, cujas famílias ou estão desempregadas ou não recebem salários, que vivem em situação de pobreza, situação essa que, infelizmente, se verifica em relação a largas centenas de milhares de famílias. De facto, nem o suplemento alimentar, por exemplo, da Acção Social Escolar está a ser devidamente cumprido, nomeadamente no que toca ao leite que deve ser distribuído às crianças nas escolas.

Ora, apesar de toda a demagogia que na altura foi feita pelo Sr. Primeiro-Ministro e até do tipo de chantagem que utilizou, é pena que até hoje, embora havendo um excedente de, pelo menos, 26 milhões de contos, não tenha sido ainda tida em conta esta grave carência da nossa população.

Portanto, creio que qualquer deputado é sensível a esta situação e julgo que é uma proposta que certamente vai merecer a aprovação dos Srs. Deputados, pois creio que todos serão sensíveis quer à situação de carência das crianças relativamente ao leite, quer à situação da pobreza em que se encontra hoje uma vasta camada da população portuguesa.

O Sr. Presidente: — Para formular um protesto, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Sr.a Deputada Ilda Figueiredo, tenho que fazer um protesto, para que fique registado em acta, em relação aos termos em que a Sr.a Deputada se referiu ao Sr. Primeiro--Ministro.

De facto, para uma Assembleia tão cuidadosa e tão ciosa por princípios de respeito mútuo entre órgãos de soberania — que tantas vezes salienta, mas de que agora a Sr.0 Deputada parece estar esquecida — não fica bem que um membro de um órgão de soberania chame chantagista a outro membro de outro órgão de soberania.

Neste caso, a Sr." Deputada Ilda Figueiredo apresentou a sua exposição em termos que desprestigiam a Assembleia da República. Embora me honre muito ser, neste momento, membro do Governo, também muito me honra ser deputada embora com o mandato suspenso. Portanto, lamento que haja este tipo de intervenções.

O Sr. Presidente: — Para formular um contrapro-testo, tem a palavra a Sr.3 Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, julgo que isto resulta do adiantado da hora. Apesar deste protesto do Sr. Secretário de Estado, ou do Sr. Deputado, ou ex-deputado, porque não se entendeu bem em que qualidade fez o protesto, talvez o tenha feito na qualidade de deputado com o manàaio suspenso, a verdade é que o que fiz foi classificar uma atitude e não, naturalmente, uma pessoa.

Por outro lado, a atitude do Sr. Primeiro-Ministro merece a classificação que lhe dei porque o facto de se pôr o dilema gasolina ou leite tem de ter naturalmente uma classificação política idêntica àquela que eu lhe dei.

O Sr. Presidente: — Srs Deputados, penso que me cumpre fazer uma apelo a todos para que possamos concluir os nossos trabalhos o mais rapidamente possível e, portanto, peço a todos os intervenientes o favor

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de, apesar do adiantado da hora, terem a contenção necessária e alguma tolerância para que os trabalhos possam prosseguir rapidamente.

Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, gostava de fazer um esclarecimento. A Mesa admitiu por maioria discutir esta proposta, embora o entendimento do seu presidente seja o de que ela viola o princípio da lei travão. Mas, uma vez que foi outro o entendimento da maioria, esta proposta está a ser discutida.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, começaria por perguntar se a Mesa é constituída apenas por duas pessoas.

O Sr. Presidente: — Não, não. De facto, tanto o Sr. Deputado Octávio Teixeira como o Grupo Parlamentar do PCP, como também o Sr. Deputado Ivo de Pinho, manifestaram-se há pouco nesse sentido, mas devo informar que neste momento a Mesa é constituída por três pessoas.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, também está aqui o Sr. Deputado António Vasco de Mello.

O Sr. Presidente: — Peço imensa desculpa.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, em relação a esta proposta, gostaria de fazer algumas observações.

Em primeiro lugar, parece-me na realidade digno de registo que alguns dos Srs. Deputados signatários desta proposta se tenham esforçado durante toda a discussão de hoje por demonstrar que havia verbas disponíveis no Fundo de Abastecimento, que eram as indicadas em primeiro lugar para permitir a descida do preço do leite, e agora sintam necessidade de realmente vir propor um reforço da dotação provisional para esse efeito!

Para além disto, é espantoso que esses mesmos Srs. Deputados se tenham preocupado em salientar o poder de fiscalização e a necessidade de salvaguardar o exercício do poder de fiscalização da Assembleia e estejam agora a contribuir, inocentemente talvez, para reforçar a única rubrica que permite ao Governo actuar nesta matéria sem a fiscalização da Assembleia.

Com certeza que os senhores estão conscientes de que o Governo poderá apanhar 1 milhão e 500 mil contos e depois poderá ou não baixar o preço do leite e fazer coisas muito diferentes. É evidente que estão conscientes disso, mas no entanto fizeram-no.

Em relação à questão da baixa do preço do leite, é óbvio, Sr.* Deputada Ilda Figueiredo, que estamos todos de acordo nessa matéria. O que realmente poderá seT objecto de discussão serão os caminhos utilizados para conseguir baixar o preço do leite.

Por outro lado gostaria de perguntar aos Srs. Deputados se acham que esta proposta, que indica claramente que o reforço se destina a uma finalidade prevista que é a baixa do preço do leite, ou melhor permitir ao Governo baixar o preço do leite, é compatível com o que se dispõe na Lei do Enquadramento Orçamental, onde se define a dotação provisional precisamente em termos que a permitem afectar apenas à cobertura de despesas imprevistas e urgentes.

Concordo que é urgente baixar o preço do leite. Agora, como os senhores anunciam na vossa proposta que o reforço se destina a baixar o preço do leite, a despesa não é imprevista, visto que deixou de o ser. Aliás, até deixou de o ser depois do discurso do Sr. Primeiro-Ministro!

Portanto, embora mantendo a minha opinião no que respeita à liberdade dos deputados em matéria de iniciativa neste domínio — isto para descanso do Sr. Deputado Magalhães Mota, que, pelos vistos, está de acordo comigo —, acho que esta proposta está pelo menos afectada de inconstitucionalidade indirecta porque viola o disposto no artigo 20.° da Lei do Enquadramento Orçamental. Aliás, também na opinião dos companheiros do partido do Sr. Deputado José Magalhães, que está a manifestar um grande espanto, a violação destas disposições constitui uma forma de inconstitucionalidade indirecta.

Assim, embora os senhores tenham admitido a proposta — e fizeram-no por maioria — e não possa fazer nada nessa matéria, entendo que ela sofre deste vício e que tem, do ponto de vista político, os inconvenientes graves que apontei. Por isso, votaremos contra esta proposta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: parte das observações que queria fazer, e que se prendiam com os aspectos das rubricas da dotação provisional destinadas a despesas imprevisíveis e inadiáveis, já foram feitas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito.

Embora a Mesa tenha aceite a proposta, gostaria de pedir que a Assembleia ou a Comissão se pronunciasse sobre o entendimento do Sr. Deputado Magalhães Mota, bem como o de V. Ex.a, Sr. Presidente, a respeito do âmbito que pode ter a discussão e a alteração deste documento, na medida em que o PSD votou a proposta inicial do CDS no sentido de que ela representava uma outra alternativa técnica para dar cumprimento à norma que o Governo tinha proposto sobre as despesas sobre os combustíveis.

Portanto, gostaria de saber se esta Comissão, pelo menos, tem ou não entendimento maioritário no sentido de que o âmbito das alterações que estamos a discutir abrangem despesas que podem vir a deturpar substancialmente a proposta apresentada pelo Governo.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Próspero Luís, desculpe, mas não percebi bem qual é a sua pretensão. O Sr. Deputado faz uma intervenção em que suscita o problema ou pretende que a Comissão se pronuncie?

Pergunto-lhe isto porque o que aconteceu foi que eu explicitei que a decisão da Mesa tinha sido no sentido de a admitir e não houve recurso. Mas se V. Ex." pretender que haja uma nova consulta similar àquela que já foi feita, não me custará fazê-lo, embora preveja que os seus resultados não serão diferentes daqueles que foram obtidos anteriormente.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, mesmo assim, gostaria que fosse feita nova consulta.

O Sr. Presidente: — Sendo assim, e para ganharmos tempo, peço aos Srs. Deputados que à medida que se

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forem pronunciando refiram, em representação dos respectivos grupos parlamentares, se têm alguma objecção a que esta proposta seja discutida. Aliás, no fundo, trata-se do mesmo problema que foi posto pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, embora noutra sede e com outros fundamentos.

Tem a palavra a Sr.a Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação à intervenção do Sr. Deputado Nogueira de Brito, quero dizer que partilho com ele da perspectiva de que uma vez iniciado um processo de alteração ao Orçamento do Estado todas as alterações que forem apresentadas deverão ser acolhidas desde que sejam votadas maioritariamente, e não só aquelas que aparecem por iniciativa do Governo.

Em segundo lugar, gostaria de me referir a alguns aspectos que aqui foram abordados. O Sr. Deputado Nogueira de Brito disse que por esta via que propomos não há garantias de que o leite vai baixar. Pois não há, Sr. Deputado! Mas todos os portugueses vão passar a saber que está lá a verba para este fim e as acções ficam com quem as pratica! Se o Governo depois de ter lá o dinheiro o não quiser aplicar na baixa do leite, isso será da sua estrita responsabilidade; o problema é exclusivamente do Governo e depois cá estaremos para julgar a sua acção.

Podemos também discutir o caminho a seguir para resolver este problema e a esse propósito o Sr. Deputado pergunta ainda se as despesas não vão baixar. Esteja descansado, Sr. Deputado, pois vai surgir uma proposta em que as despesas serão reduzidas e, portanto, por virtude desta nossa proposta, não haverá aumento de despesa global no final da votação de hoje.

Disse ainda o Sr. Deputado que esta rubrica só deve incluir verbas destinadas a despesas imprevistas e urgentes. Recordo-me de que esta rubrica tem tradicionalmente — e até este ano ainda teve — uma parte que é sempre destinada ao aumento do funcionalismo público, que é uma despesa previsível conhecida, que não está exactamente determinada, mas que se sabe que vai ser realizada.

De facto, o montante desta despesa não está exactamente determinado, sabe-se que vai ter que se realizar, sabe-se que é urgente, mas não se sabe exactamente qual é o montante. Por isso, esta é a solução que nos pareceu realmente possível.

Agora, se realmente algum grupo parlamentar quer impugnar esta proposta no sentido de não permitir ao Governo baixar o preço do leite, que o faça. Quero ver qual é o primeiro grupo parlamentar que impugna a possibilidade que é dada ao Governo de baixar o preço do leite!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente a esta proposta apresentada por vários deputados há duas ordens de considerações a fazer. A primeira delas é a de que é pacífico que todos nós desejamos que o preço do leite, como do pão e de outros produtos essenciais, baixe. Este governo, como nenhum outro depois do 25 de Abril, tem baixado os preços e a inflação está a um nível que não era atingível desde 1974.

Em segundo lugar, gostaria de salientar que tanto o preço do leite, como o da manteiga, como o da carne, têm que ver com a política de preços, que é da competência própria do Governo. Portanto, o preço do leite, tal como os outros preços, tem que ver com a política de preços do Governo.

Assim, tendo em conta o respeito da limitação e da independência de poderes de órgãos de soberania, a Assembleia da República não deveria avançar com propostas isoladas, avulsas, descoordenadas e incoerentes como se — por absurdo, como é evidente, pois não estou à espera de uma proposta dessas — metêssemos amanhã uma outra proposta do género: «Vamos dar mais 3 milhões de contos para a dotação provisional para baixar o preço do vinho. Vamos tirar 4,5 ou 10 milhões de contos na dívida externa e assim essa dívida externa baixará para 500 milhões de contos.» Ora bem, em tudo isto há casos em que há razão e outros em que a não há, mas tem de haver uma justificação e coerência.

A política de preços compete ao Governo, bem como a política de gestão da balança de pagamentos. O Governo está interessado, está a actuar, e parece que — de acordo com os resultados obtidos em matéria de inflação — com mais resultado do que outros governos, no âmbito do aumento do poder de compra dos trabalhadores e, naturalmente, daqueles que, nesse campo, têm situações mais difíceis. Esta é a primeira abordagem que penso responder à quetão, pois já sabemos que poderá ser dito amanhã que o Governo não quis baixar o preço do leite porque não quis também a verba de 1 milhão de contos para a dotação provisional.

Para já, não é com medidas avulsas que se baixam os preços seja do que for, e como exemplo temos os célebres cabazes de compras, de que se viram já os resultados na evolução dos preços em Portugal nos últimos dez anos. Em segundo lugar, o Governo, ao abrigo do n.° 2 do artigo 170.° da Constituição, rejeita, para já, politicamente a proposta de reforço da dotação provisional em 1 milhão de contos. Em terceiro lugar, queria dizer que, por uma questão de colaboração — pois o Governo tem a administração e deve dar também a assistência técnica sempre que for caso disso—, esta proposta, na forma como está formulada e nos pressupostos que a fundamentam, está tecnicamente incorrecta.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Secretário de Estado. Evidentemente que não se põe em dúvida que a política de preços pertença ao Governo. Eu, por outro lado, tendo a partilhar da opinião que o Sr. Secretário de Estado manifestou de que esta proposta tem alguma debilidade técnica, mas perguntaria o seguinte: se o Governo quiser baixar o preço do leite, que verbas é que utiliza? Uma vez que anteriormente utilizava o Fundo de Abastecimento, gostaria de saber onde poderá ir buscar, neste momento, as verbas para esse efeito. Suponho que é ao Instituto Nacional de Garantia Agrícola (INGA). Ou seja, sabia-se que anteriormente era utilizado o Fundo de Abastecimento, mas como agora esse Fundo morreu e voltou a aparecer sobre outro nome, gostaria de saber onde é que, neste momento, se pagam subsídios aos bens de consumo.

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O Sr. Presidente: — Suponho que V. Ex.a está a fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Exactamente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O

Sr. Deputado Silva Lopes sabe tão bem ou melhor do que eu que o preço do leite pode ser baixado através da formação dos custos e não através da subsidiação. O Governo, neste momento, tem actuado através da utilização da Inspecção-Geral de Finanças de forma a revelar a curto prazo, que nalguns pontos a formação dos custos no chamado circuito do leite tem estado sobreavaliada.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Sr. Secretário de Estado, peço desculpa, mas a pergunta que fiz era a seguinte: Se o Governo quiser subsidiar um preço — e é evidente que há essa maneira de actuar através dos custos—, de que fundos é que se socorre para esse efeito? •

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — O

Sr. Deputado Silva Lopes falou no Instituto Nacional de Garantia Agrícola, que é uma hipótese que o Governo pode utilizar, mas todos nós sabemos que o circuito dos leites, bem como a formação dos preços agrícolas, depende também daquilo que é definido em termos da política agrícola comum e neste domínio estão-se a trabalhar os chamados organismos pagadores das intervenções da CEE e o INGA vai ser um desses organismos. Evidentemente que poderão existir mais organismos e inclusivamente, o próprio Orçamento do Estado pode ser um deles.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Sr. Secretário de Estado, volto a dizer que isto é uma pergunta puramente técnica: anteriormente, como já disse, o Fundo de Abastecimento dava subsídios à produção e ao consumidor. Neste momento, o INGA — em princípio — dá subsídios à produção e gostaria de saber se dá também subsídios ao consumidor ou quem é que os dá. Ou seja, os subsídios ao consumidor que o Governo eventualmente queira dar sairão de onde?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — É evidente que essa questão do Sr. Deputado Silva Lopes tem que ver com os instrumentos de actuação, que tanto podem ser serviços do Estado —serviços que, digamos, estão no Orçamento do Estado — como serviços da administração central, e é evidente, também, que isso tem que ver com a reestruturação que está a ser feita no âmbito do Ministério da Agricultura. Tenho dificuldade em lhe dar uma resposta concreta e final, mas, de facto, o INGA é um organismo que também poderá actuar nessa matéria.

Efectivamente, o Sr. Ministro da Agricultura está a preparar — e está já na parte final — diversos instrumentos de intervenção no mercado dos produtos alimentares e posso acrescentar que, de facto, se está a procurar simplificar o circuito do leite, que era um circuito, poderemos dizer, cheio de interrupções e que estava, digamos assim, a desvirtuar o princípio fundamental que é o de assegurar um preço de garantia junto dos produtores, assegurando também preços compatíveis para os consumidores. Mas, de facto, este é um ponto mais delicado e o Sr. Deputado Silva Lopes conhece, tão bem ou melhor do que eu, esse circuito.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Sr. Presidente, poderei ainda continuar?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Silva Lopes, pode inscrever-se para uma intervenção. Tenho muito prazer em o ouvir, a si e ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, mas na verdade não poderemos prolongar excessivamente o diálogo.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, creio que em termos regimentais não o poderemos fazer, mas se o Sr. Deputado Silva Lopes, ou qualquer outro Sr. Deputado, quiser formular uma cadeia de interrogações no quadro de uma intervenção é inteiramente livre para o fazer e o Governo que aí estiver sentado responderá ou não, conforme quiser. Isto foi apenas um ponto de ordem que o Sr. Presidente dispensaria certamente.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Magalhães, muito obrigado pelo esclarecimento. O Sr. Deputado Silva Lopes inscreveu-se e, consequentemente, o problema ficou resolvido.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Colocarei, porventura, menos interrogações do que algumas afirmações. Creio que aquilo que se passou até agora é concludente quanto ao facto de o Governo estar desorientado numa matéria em que não percebo a desorientação. O Sr. Primeiro-Ministro chega-nos aqui, há uns tempos, e coloca-nos o terrível dilema: «Leite ou gasolina, a escolha é vossa. Acabais de escolher a gasolina e, portanto, não haverá leite!» Diz-nos isto com um ar perfeitamente tétrico, apavora o País, lança sobre nós a suspeição de não querermos dar leite às criancinhas e de estas não terem leite por nossa causa porque há gasolina e gasolineiros a mais, havendo, consequentemente, fome. Nós não aceitamos a colocação deste dilema. É tão simples como isso. Dissemos, na altura, que não nos parece que seja forma de colocar a questão vir pôr o dilema: «gasolina ou leite». Não é sério — a palavra «sério» tem aqui a sua acepção rigorosa e espero que o Sr. Secretário de Estado não proteste — técnico-juridicamente e não é sério também politicamente, porque sabíamos que o Governo, se quisesse, tinha condições para recorrer aos fundos autónomos para subsidiar a baixa de preço do leite ou de recorrer ao mecanismo da formação dos custos, da formação dos preços e da simplificação dos circuitos.

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Ou seja, o Governo não queria baixar o preço do leite, mas queria colocar a Assembleia da República perante a situação embaraçosa de ser a culpada da não baixa desse preço. O Governo desejaria ardentemente baixar o preço do leite e a péssima Assembleia da República tinha estado a favor dos passeantes de domingo! Este dilema é, repito, inteiramente inaceitável.

Extraindo lições disto tudo, alguns Srs. Deputados colocaram a todos os outros, incluindo o PSD e o Governo, a questão de trincharmos, de uma vez para sempre, o famoso dilema do Primeiro-Ministro Cavaco Silva e o Sr. Secretário de Estado, surpreendentemente, lança uma aposta violentíssima, dizendo que não pode ser, que não é nada disso, que a Assembleia da República não tem esse poder e, o que me surpreende particularmente, invoca argumentos contraditórios.

Há uma questão técnica a resolver, que foi colocada pelo Sr. Deputado Silva Lopes, pois creio que ela não está ainda resolvida, e sobre isso reflectiria depois, mas a questão política é claríssima. A Assembleia da República quer, e quer claramente, que baixe o preço do leite, mas não o pode determinar através de um artigo único que diga: «baixará o preço do leite para x». Não o podemos fazer porque isso está na esfera preservada do Governo. É evidente que isso não é contestado, mas podemos manifestar a nossa vontade política nesse sentido e o Governo não tem nada a ver com isso, literalmente nada, e tomará apenas conhecimento, batendo palmas ou manifestando-se com um protesto, o que é politicamente bastante inábil e ficará averbado em acta para os devidos efeitos.

Tendo, portanto, esta vontade política, como é que a Assembleia da República a poderá exprimir juridicamente dentro dos limites dos seus poderes e tendo em conta que o Governo tem competência exclusiva em matéria de formação de preços? Creio, Srs. Deputados, que não o pode fazer senão da maneira que vem proposta porque não podemos intervir, ao contrário do Governo, em todos os circuitos que levariam a um abaixamento, por essa via, dos preços do leite. Podemos, naturalmente, fazer um reforço e aí vem a panóplia argumentativa do Sr. Secretário de Estado, dando a resposta: «Não podem.» E não podem porque o Governo não quer. Citou o Sr. Secretário de Estado o âmbito da revisão orçamental, que vai de um a dez, dizendo que não podíamos ir de um a quinze pois estávamos a meter matéria extravagante. E um raciocínio que não tem nada a ver com os poderes da Assembleia da República.

A Assembleia da República não está, como uma galinha, dentro de um circuito travado pelo Governo. Não aceitamos essa limitação, pois não a podemos aceitar constitucionalmente. A Assembleia da República tem de ponderar — e não vale a pena insistir nesse aspecto — o âmbito que entende dever ser dado aos reforços orçamentais a imprimir à luz do interesse nacional tal qual o entenda, e é livre de o entender. Neste caso, entendemos que é exigível essa baixa e para isso teremos de adoptar medidas.

O Governo diz, como segundo argumento, que a Assembleia da República poderá fazer o que quiser, mas que isso, além de estar deslocado, invade a competência do mesmo Governo porque, disse textualmente o Sr. Secretário de Estado, a gestão orçamental é da competência exclusiva do Governo e nos planos dessa gestão não está, disse também o Sr. Secretário de

Estado, um reforço da verba para este efeito. Não está, logo o Governo não a quer! Sr. Secretário de Estado, queremos nós — essa é que é a questão —, exprimindo um gesto político que o Governo condenará ou acatará.

O Governo tem, todavia, razão num ponto que creio ser importante registar: esta Assembleia não tem, virtualmente, nenhum poder para coagir o Governo a baixar o preço do leite reforçando esta verba. Nenhum! Portanto, se o Governo amanhã aparecer diante do País com um ar choroso, dizendo: «a Assembleia da República reforçou-nos a verba, mas nós não queremos!», que apareça, por sua conta e risco. Agora dizer que nos ameaça com a ida ao Tribunal Constitucional, como fez em relação aos salários em atraso, dizendo também que violámos a lei travão, por favor não brinquem connosco! Se a Assembleia da República está em sede de debate orçamental, não há obstáculo da lei travão que possa ser invocado para este acto que estamos a praticar. Não há, a título nenhum. Praticamo-lo livremente e isso é incontestável. Aliás, se querem ir ao Tribunal Constitucional, que o façam, pois são perfeitamente livres de o fazer, embora isso seja inútil e seja apenas uma perda de tempo esse tribunal.

Coloca-se então agora a questão técnica, ou seja, qual a via a adoptar para proceder a este reforço de verbas, sabendo nós que, se o Governo lhe opuser o veto executivo, é improfícuo. A Assembleia quis, o Governo não quis, e, naturalmente, nenhuma criança nascerá se o Governo não o quiser!

Qual é a via técnico-jurídica para a Assembleia da República consagrar este reforço? Aqui creio que as dúvidas são pertinentes e o Sr. Deputado Nogueira de Brito levantou uma que me parece bastante fundamentada. A Assembleia da República tinha três formas de procurar consignar este reforço e a primeira seria inventar uma rubrica ad hoc chamada «leite» ou «despesa excepcional» para baixa do preço do leite. Podíamos até inventar uma sigla, mas creio que seria um mau caminho, pois poderia bulir com alguns princípios orçamentais a que estamos sujeitos e, naturalmente, reforçar a dotação provisional.

O Sr. Deputado Nogueira de Brito suscitou também a seguinte questão, muito pertinente, que creio será um conselho, embora vindo da bancada do CDS: «Se os senhores reforçam a dotação provisional, criam uma situação problemática, pois sendo a dotação provisional por definição e não estando dentro dela especificadas as verbas para além de determinado grau, poderá bem acontecer que o Governo utilize essa verba para um fim que não seja aquele que os senhores lhe destinaram e, nesse caso, estareis reforçando não o benefício do leite mas o benefício de outros líquidos ou até de outras realidades totalmente diferentes em relação às quais nós não temos nenhuma preocupação!» Creio que realmente não queremos isso. Resta saber, então, qual é a forma de querermos juridicamente aquilo que queremos politicamente. Creio que a hipótese que foi aventada, da transferência para fundos públicos, será, de todas as possíveis, a mais razoável, porque, embora seja uma via que não é aquela que está ao alcance do Governo — que pode agir sobre os mecanismos administrativos —, está ao nosso alcance. Neste caso, esta verba seria incluída da seguinte foram: «despesas excepcionais, transferências, sector público, fundos autónomos, INGA,» que assegura, segundo creio, transitória e legalmente, todas as competências do Fundo de Abastecimento nos termos do diploma que extinguiu o dito Fundo.

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Dir-me-ão que transferir uma verba para o Fundo de Abastecimento não é estritamente necessário, pois o Fundo de Abastecimento tem verbas que chegam e sobram para este efeito. Todavia, Srs. Deputados, não será um acto inútil — e só será inútil se o Governo o entender ou se o vetar —, mas, em todo o caso, significará muito claramente a vontade política da Assembleia e será, creio eu, do ponto de vista técnico-jurídico, uma situação aceitável e razoável que não será merecedora de reservas do ponto de vista técnico. Do ponto de vista político é de aplaudir e só lamento que o Sr. Secretário de Estado tenha contrariado, desta forma tão inábil, aquilo que julgaria ter sido a posição inicial tomada pela bancada do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Penso que parte da questão está esclarecida, mas, em todo o caso, foram há pouco suscitados alguns problemas que careceriam de resposta, segundo os interpelantes e, portanto, penso que nos cumpre, de algum modo, dá-la. Eu gostaria de recordar, a propósito da admissibilidade destas propostas, que há pouco, aquando da discussão, ela «transitou em julgado», visto que nós, que tínhamos suscitado essa mesma discussão, não recorremos da decisão da Mesa, que deliberou no sentido da admissibilidade de propostas que alargassem o âmbito da iniciativa governamental. No decurso de uma mesma sessão, como é normal, a Assembleia da República não toma decisões contraditórias. Portanto, o facto de a primeira deliberação ter transitado em julgado, visto que não houve recurso e que foi aceite por todas as bancadas, implica, necessariamente, a admissibilidade de novas propostas. Creio, portanto, que ficou resolvida e foi ultrapassada uma questão processual que agora vinha a ser suscitada, o que foi um dos méritos da discussão que há pouco tivemos ocasião de travar a propósito da admissibilidade da proposta do CDS.

Em segundo lugar, e visto que a questão da admissibilidade aparece resolvida desta forma, gostaria de salientar que, neste momento, resultam com clareza uma série de elementos que importa referir. O primeiro refere-se à posição sempre por nós assumida — e, portanto, estamos apenas a repeti-la — de que a política de preços é da competência do Governo e de que a Assembleia da República não interfere nela. Isto é um sublinhado, pois sempre o dissemos. Assim, põe-se agora o problema de saber se, quando o Governo nos anunciou a vontade política de baixar o preço do leite, essa vontade politica tinha ou não contrapartida numa igual vontade política por parte da Assembleia da República. O conteúdo político da proposta apresentada significa que sim. A Assembleia manifesta a sua concordância com a intenção anunciada de baixar o preço do leite e de outros produtos alimentares e, assim sendo, o problema que se nos coloca é necessariamente o do facto político de o Governo ter anunciado — certamente com seriedade, porque ninguém põe em causa as intenções com que um Governo anuncia os seus propósitos — a sua impossibilidade de resolver, de modo satisfatório, uma intenção que nos anunciou.

Isso, só por si, significa que não podemos aceitar o argumento posto pelo Sr. Secretário de Estado de que a intervenção se faria de modo a reduzir os custos do

circuito e, portanto, a reduzir os custos do leite através desse tipo de intervenção, porque se essa intervenção fosse a considerada, o argumento do Governo de que a votação da Assembleia da República lhe impedia a baixa do preço era um argumento falso, que o Governo certamente não teria usado. Ter-lhe-ia permitido, com certeza, ter já efectuado essa baixa — se fosse mais expedito — e pensamos, portanto, que esse argumento não pode sequer ser invocado, pois nesse caso o Governo, pela sua inércia ou por uma habilidade política, teria provocado um prejuízo sério na bolsa dos nossos concidadãos não fazendo uma baixa de preços que não precisava de nenhum subsídio, mas apenas de uma maior racionalidade nos circuitos e, consequentemente, de melhores cálculos em relação a esses mesmos circuitos.

Assim, resta como problema sério o de permitir ao Governo os meios financeiros indispensáveis para actuar dentro da segunda vertente do problema, ou seja, a da subsidiação. E se assim é, a única coisa que a Assembleia da República precisa de fazer é de dotar o Governo dos meios indispensáveis para que possa actuar. É esse o sentido útil da proposta. Creio que, dentro desse capítulo, nenhuma dificuldade se oferece porque, dentro da mesma seriedade de argumentação, não há certamente obstáculos em termos de política comum, pois se esses obstáculos existissem, o Governo não teria anunciado, nem ao País, nem à Assembleia da República, que o único inconveniente em relação à baixa dos preços do leite resultaria de uma votação da mesma Assembleia da República. O argumento de ordem externa não existe necessariamente porque o Governo não pode ter deixado de o ponderar. Creio, portanto, que, reduzindo o campo das matérias, fica apenas a possibilidade financeira de o Governo actuar de acordo com a sua vontade, que é também a vontade da Assembleia da República.

Assim sendo, restará, portanto, reforçar verbas, e como temos de o fazer para dotar o Governo dos meios indispensáveis para exercer uma vontade que é a sua e que é também a nossa, restará encontrar o meio técnico onde reforçar essa verba. É só aí que reside o problema. O Sr. Deputado Nogueira de Brito há pouco esclareceu que em termos de provisão — como constava da primeira hipótese da proposta — isso poderia, inclusivamente, acarretar o risco de uma inconstitucionalidade indirecta. Pensamos que, além do mais, tem o risco político, que o CDS salientou e bem, de significar um certo cheque em branco à actuação governamental e, de facto, seria contraditório da nossa parte, que não votámos uma moção de confiança ao Governo, dar-lhe agora esta provisão suplementar.

O CDS votou a moção de confiança, mas tem aí mais restrições e maior prudência —com o que nós estamos de acordo —, e aceitamos precisamente essa restrição pensando que esse argumento é válido e que tem interesse. Assim sendo, a discussão que travámos revela que o processo de dotar o Governo e de dotar o Estado Português dos meios indispensáveis para executar esta vontade política será o de reforçar as verbas a cargo do INGA, que se substituiu ao Fundo de Abastecimento nesta matéria.

É evidente que para a Assembleia da República, e dentro do nosso critério, não seria necessário este reforço, mas o Governo explicou-nos que carecia dele e, sendo assim, dentro do espírito de colaboração que nos move e no sentido de conseguirmos a baixa de um

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preço que o Governo considera indispensável e nós também, uma vez que temos possibilidades de dotar o Orçamento do Estado com esta verba, fá-lo-emos. É este o sentido útil da proposta que formulámos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, queria começar por protestar, embora tardiamente, contra o teor da intervenção feita há pouco pela Sr.a Deputada Helena Torres Marques, pois não podemos deixar de protestar contra este tipo de intervenção. Como se falou em chantagem, o estilo deve-se ter pegado — e disse o estilo porque não estou a classificar nem pessoas, nem atitudes —, e isso é grave, uma vez que visa, porventura, retirar liberdade aos deputados de votar. A isto de dizer: «estou para ver qual é o grupo parlamentar que não é contra o aumento do preço do leite», eu direi que o CDS não é contra o aumento do preço do leite. Em relação ao PS, tenho algumas dúvidas — depois da política que esse partido fez, no bloco central, de fomento da miséria — sobre o que será, a favor do que será ou contra o que é que será, mas, no entanto, não queria deixar de dizer o seguinte: quanto a questões processuais, este tipo de intervenção não é, de facto, admissível.

Quanto às questões processuais levantadas pelo Sr. Deputado Magalhães Mota, ou seja, «caso julgado» em relação à admissibilidade da proposta, gostaria de dizer o seguinte: somos indiscutivelmente — e pelos vistos o Sr. Deputado aderiu a essa tese que não surgiu no princípio da sessão, embora já tivesse escrito esta proposta— a favor da posição, que é realmente pacífica, de que os poderes da Assembleia, neste momento, em matéria orçamental acarretam essa consequência. E não percebo mesmo como é que se levantam dúvidas a seu respeito.

Quando é feita uma proposta de orçamento ou de alteração ao abrigo do n.° 1 do artigo 20.°, a iniciativa cabe ao Governo e as propostas, a partir dessa iniciativa, cabem aos deputados. Simplesmente, Sr. Deputado Magalhães Mota, se esse problema se discutir, o CDS será sempre dessa opinião e não vale a pena o Sr. Deputado voltar a dizer que foi o CDS. Se está na expectativa de o CDS mudar de posição nessa matéria, devo dizer-lhe que não muda. O que acontece é que não sei quando é que se fez o caso julgado, porque o Sr. Deputado conhece a proposta que formulámos nesta sessão.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Foi admitida.

O Orador: — Mas a nossa proposta desta sessão é a de alteração dos montantes propostos para as verbas de despesa dos ministérios que têm a seu cargo forças militares e militarizadas. Se foi aí que se fez o caso julgado, não serve para aqui, Sr. Deputado. A discussão pode ter sido esclarecedora, e foi-o com certeza, mas terá de se fazer outro caso julgado, e não esse, porque esse não serve para aqui. Essa é, indiscutivelmente, a nossa opinião.

Quanto a esta proposta, somos claramente contra a sua admissibilidade por causa da tal inconstituciona-liade e VV. Ex.as até já não a mantêm. Pelo que vejo, vão retirá-la, mas vão fazê-lo a benefício de uma coisa curiosíssima, que é a de, depois de terem passado o

dia — e porventura bem — a dizer que havia verbas em quantidade no Fundo de Abastecimento, ou seja, no actual INGA, reforçar a dotação do mesmo INGA. O País vai ter de julgar este tipo de actuação, Sr. Deputado, porque esta questão do preço do leite — e perdoe--me que o diga— tem a sua tinta demagógica.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Deputado Nogueira de Brito, era apenas uma questão extremamente simples. O facto de termos sustentado — e sustentá-mo-lo, de facto, ao longo de toda a tarde — que as receitas existentes eram suficientes é o nosso ponto de vista, mas, visto que a Governo entende que não, não queremos que o mesmo Governo tenha esse motivo de queixa ou essa dúvida em relação à possibilidade de baixar o preço do leite. É apenas isso. É dar--Ihe uma oportunidade a mais. Se isso não for necessário, com certeza que ficaremos todos encantados.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Deputado Magalhães Mota, eu realmente só lhe queria dizer o seguinte: o que acontece é que o Governo nos forneceu poucos elementos sobre essa matéria. O Sr. Deputado Magalhães Mota está a deslocar no tempo um discurso infeliz que o Sr. Primeiro-Ministro fez nesta Assembleia — e eu já o qualifiquei em Plenário de infeliz — mas que foi feito aquando da apresentação da proposta do Orçameto. Aí é que, realmente, foi feito esse tal tipo de pressão sobre a Assembleia. Não foi agora. Agora o que ainda não nos disseram é o que é que estava ou deixava de estar no INGA. Deram-nos uma conta de tesouraria, que não é coincidente com a perspectiva que alguns deputados tinham sobre a evolução das receitas do INGA, mas não nos disseram que no INGA não havia receita.

Portanto, fica claro que esses deputados se enganaram durante todo o dia e que vão agora propor um reforço das receitas do INGA pela via orçamental. Isso vai ficar claro e tem de o ficar, pois das duas uma, ou tinham razão há bocado, ou têm razão agora. Quanto ao mais, Sr. Deputado Magalhães Mota — e era isto que eu queria dizer —, todas estas questões têm o valor de um discurso que se faça na Assembelia da República e esta argumentação das políticas comunitárias serve para explicar como é que as coisas se poderão passar. No caso de a Assembleia da República ser a favor do abaixamento dos preços de todos os bens essenciais, o CDS vota a favor e subscreve essa declaração com os grupos parlamentares que entenderem dever fazê-la. E esse o valor que tem a proposta que VV. Ex.as fizeram. Isto é, o valor da proposta que W. Ex.as vão fazer, contradizendo aquilo que disseram durante todo o dia, não é outro que o de uma declaração fieta na Assembleia da República de que são a favor do abaixamento do preço do leite. Nós também somos e temos até um azar nessa matéria, que é o de não termos grande originalidade, porque, pelos vistos, o Sr. Primeiro-Ministro também é a favor e, embora faça realmente aí algumas misturas com gasolina que não nos agradaram, na realidade é também a favor.

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Portanto, a questão é esta: nós subscrevemos inteiramente essa afirmação de que a Assembleia da República está disposta a fazê-lo. Agora, o que não estamos dispostos a subscrever são medidas contraditórias com o que se disse no Plenário da Assembleia da República e que não conduzem — e os Srs. Deputados acabaram de o dizer — ao abaixamento de nenhuns preços.

Esta é a nossa posição e, por isso, votaremos contra essas propostas.

O Sr. Presidente: — Para um protesto, tem a palavra a Sr." Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Deputado Nogueira de Brito, V. Ex.a disse que eu teria falado em chantagem. Devo referir-lhe que, por acaso, até nem fui eu que falei nisso. Penso, porém, que por solidariedade feminina V. Ex." estendeu tal acusação também à minha pessoa.

Ora, Sr. Deputado Nogueira de Brito, o que aconteceu realmente é que eu formulei uma pergunta nestes termos, ou seja, perguntei se estará algum grupo parlamentar — e torno a dizer — decidido a votar contra uma possibilidade de redução do preço do leite.

Na verdade, Sr. Deputado Nogueira de Brito, não dissemos uma coisa durante toda a tarde no Plenário e agora à noite, na Comissão, outra!... Referimos, sim, que havia receitas a mais no Orçamento do Estado e no INGA. Sabemos, pois, que há receitas em demasia em ambos os lados.

Porém, o problema não é esse: é que sabemos, e por maioria de razão também o Governo, já que tem lá o dinheiro, que o Executivo refere não poder baixar o leite por causa do problema da gasolina.

Assim, o que queremos dizer é que sabemos que o Governo tem dinheiro, pelo que, possuindo tanto capital, o que é que significa 1 milhão e 500 mil contos a menos!?

Contudo, é o suficiente para o Governo não poder dizer mais que não baixa o preço do leite por não ter dinheiro!

Agora, sabe que tem dinheiro e, portanto, se não o baixar é porque não quer e não mais pode invocar que é por não o poder fazer. Deste modo, não diga, por favor, que o PS não está a defender este projecto, porque penso que se alguém lutou fortemente por ele foi precisamente o meu partido.

O Sr. Presidente: — Para um contraprotesto tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito, se o desejar fazer.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, já agora não deixarei de contraprotestar.

Risos.

Sr.a Deputada Helena Torres Marques, não sei na realidade qual o projecto que o PS tem. Se este projecto de baixar o leite já é antigo, penso que só com grande ardor o está a defender agora, pois ainda não o tinha visto fazer. Com certeza que a Sr.a Deputada me dará elementos que serão esclarecedores nesse sentido.

Aproveitaria, porém, para no contraprotesto colocar uma questão: o Governo afirma na Comissão que não

baixa o preço do leite porque não tem possibilidades financeiras para o fazer. Será que essa afirmação está actualizada?

A Sr." Helena Torres Marques (PS): — Posso responder, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Não pode, Sr." Deputada.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr.a Deputada Helena Torres Marques, V. Ex.a já não está no Governo!

O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Deputado Nogueira de Brito, provavelmente terei resposta para a pergunta que V. Ex.a formulou daqui a uns minutos, quando procedermos à votação.

Em todo o caso, gostava que não votássemos antes de ver clarificados os pressupostos políticos em que a acção do CDS se centra. Isto por uma questão de lisura de procedimentos!

Na verdade, vi o Sr. Secretário de Estado do Orçamento crispadíssimo quando colocámos a questão do leite; vi explicar-nos que esta medida era totalmente redundante, indesejável e não aconselhável à gestão orçamental do Governo.

Sendo assim, pergunto se não está nos projectos dele baixar o preço do leite.

Ora, isto para mim não ficou claro!...

Disse igualmente que, em todo o caso, é possível através do mecanismo da simplificação obter uma baixa do preço do leite, se for desejada politicamente.

Ora, não temos os balancetes de tesouraria do INGA, uma vez que o Sr. Secretário de Estado em causa não nos facilita o acesso a eles. Logo, não podemos responder à interrogação brilhante formulada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito.

Agora, Sr. Deputado Nogueira de Brito, o que lhe pergunto é o seguinte: o CDS é a favor da baixa do preço do leite? Jura-nos que se fizermos uma declaração o CDS dirá «sim»?

Qual é, então, a dúvida do CDS? Estará fascinado pela famosa dificuldade técnica de encontrar uma rubrica adequada em que se insira este reforço desejado e este gasto político? Será que é isto que lhe tolhe o raciocínio?

Esta solução não é a ideal no sentido exacto de estar isenta de arestas. O Sr. Deputado Nogueira de Brito expôs algumas soluções e, pela nossa parte, podíamos ter apresentado outras tantas.

Agora, certamente que esta solução não está sujeita à crítica pelo ângulo que o Sr. Deputado colocou — que é o da incongruência, da contradição. Na verdade, VV. Ex.as passaram o dia todo a dizer que o INGA está cheio de dinheiro e, neste momento, querem reforçá-lo! ...

Sr. Deputado Nogueira de Brito, se o Governo não nos diz qual é a situação do INGA, então vamos mesmo reforçá-lo e quando analisarmos o balancete veremos qual foi rigorosamente o impacte directo deste reforço.

Porém, esta solução é clara quanto a um ponto: é que queremos o reforço com vista à baixa do preço do

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leite e a responsabilidade do que acontecerá a partir daqui é do Governo, apenas deste e não mais da Assembleia da República.

Ora aquele famoso equívoco do tipo gerado pelo Sr. Primeiro-Ministro acaba esta noite mesmo! Isso para nós é, pois, uma questão fundamental.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Magalhães Mota pediu há pouco a palavra para um pedido de esclarecimento. Fê-lo em relação ao contraprotesto ou à intervenção, ambas do Sr. Deputado Nogueira de Brito?

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Presidente, confesso que no contraprotesto houve matéria de intervenção e era sobre ela que queria pedir somente um esclarecimento ao Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Magalhães Mota, sendo assim, V. Ex.a terá de se inscrever ulteriormente.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem então a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Deputado José Magalhães, para nós a questão é esta e é muito simples: não sei a que verba VV. Ex.as irão parar!... Vão parar ao Fundo de Abastecimento — sobre isso não temos dúvidas nenhumas! Não sei realmente a verba concreta, porque VV. Ex.as variam de verba ao longo da noite! É pena que não tenham beneficiado de mais algum esclarecimento quando formularam a proposta.

Contudo, o que o CDS não aceita, e nesta matéria já deixou isso claro quando discutimos a proposta de lei do Orçamento, são conflitos institucionais, nem ingerências nas competências de outros órgãos. É por isso que não aceita a vossa medida, porque sabe que ela, em última análise, é ineficaz.

Sr. Deputado José Magalhães, meu caro amigo, poderá também ser ineficaz politicamente. Já lhe foi dada a volta uma vez e com certeza que lhe vai ser dada outra!

Agora a Assembleia não pode arriscar-se a trilhar o caminho do conflito das competências, como está a fazer novamente, para tomar medidas que não são eficazes.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao orador seguinte gostava de lembrar à Comissão que estamos a discutir uma proposta, mas que temos ainda uma outra que deu entrada na Mesa, relativa a uma redução dos juros da dívida externa no valor de 4 milhões de contos, e que foi distribuída.

É, neste momento, 1 hora e 20 minutos, pelo que queria colocar à vossa consideração o seguinte: se continuarmos com este ritmo, o que é perfeitamente legítimo, penso que teremos de suspender os trabalhos por volta das 2 horas e 30 minutos.

Portanto, o que direi baseia-se nisto: se conseguirmos até essa hora resolver os nossos problemas na Comissão em termos de votação, está tudo solucionado; se não o pudermos fazer, uma vez que obviamente não vamos coarctar a liberdade de expressão dos Srs. Depu-

tados e a viveza do debate, mesmo a esta hora já relativamente tardia, naturalmente que teremos de prosseguir amanhã o debate. Na verdade, a partir das 2 horas e 30 minutos tenciono interromper a sessão.

Penso que é útil dar-vos conhecimento disto porque, como é evidente, tornar-se-á praticamente muito difícil gerir a partir dessa hora o debate, isto é, quando as pessoas, a começar pelo Presidente, revelam já algumas dificuldades de se manterem inteiramente despertas.

Por consequência, queria pedir-vos que, na medida das vossas possibilidades, ponderassem estas alternativas nas vossas intervenções.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Desejo interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.a Deputada.

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, a minha interpelação vem na sequência da sua proposta, ou seja, creio que acelerava os trabalhos se V. Ex.a fizesse uma proposta de alteração à que está em discussão, em relação à qual penso que colhe muito da discussão que foi já travada em Comissão.

Assim, o objectivo fundamental é proporcionar os meios financeiros necessários ao Governo —e penso que isto não é confronto institucional, mas sim colaboração entre estes dois órgãos — para este poder baixar o preço do leite, bem como encontrar a solução que tecnicamente seja mais correcta.

Ora, se há outra solução, que não a proposta inicial, que seja mais correcta, não vemos nenhuma objecção em adoptá-la. Era, pois, isso que eu faria.

Se o Sr. Presidente não se importasse, passaria a ditar, até porque assim ficava em acta e todos teriam acesso à cópia dela, o seguinte, omitindo-se no último período desta proposta de alteração as palavras «reforço» e «provisional»: «Os Deputados abaixo assinados propõem uma dotação de 1,5 milhões de contos para que o Governo não possa dizer que não pode imediatamente baixar o preço do leite por falta de meios financeiros para o efeito.»

Na rubrica, imediatamente a seguir a este último período, onde se refere «06 — Ministério das Finanças: Despesas excepcionais— + 15 000 000 contos», acrescentar-se-iam as expressões «transferências correntes — sector público — Instituto Nacional de Garantia Agrícola (sector leite e lacticínios — subsídios ao consumo de leite)».

O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada Helena Torres Marques, V. Ex.a far-me-ia depois o favor de fazer chegar à Mesa, devidamente rubricada, uma proposta, utilizando mesmo o texto anterior.

Tem a palavra o Sr. Deputado Próspero Luís.

O Sr. Próspero Luís (PSD): — Sr. Presidente, aquilo que queria dizer já foi, efectivamente, referido na primeira parte desta reunião pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito.

Na verdade, a proposta do CDS, de que tenho conhecimento e que foi distribuída, é a que refere uma redução das verbas em relação à proposta do Governo.

Quanto à outra proposta que o CDS anuncia que vai apresentar, será a Mesa do Plenário da Assembleia da República que, segundo penso, decidirá se é ou não admissível.

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A segunda parte da minha intervenção destinava-se a fazer como que um ponto de ordem ou uma interpelação à Mesa.

Assim, penso que nos termos regimentais os debates na especialidade da rubrica «Despesa» obedecem a normas que são sensivelmente idênticas as que vigoram para o Plenário. Portanto, colocaria a questão de saber se, nesses termos, não se deverá também colocar na Comissão o problema na perspectiva dos tempos disponíveis por grupos parlamentares, na medida em que temos assistido a intervenções daqueles que têm mais facilidade de expressão, que conseguem efectivamente empatar o tempo.

Na verdade, poderá acontecer que algumas das pessoas que têm maior facilidade de expressão e resistência física estejam eventualmente a utilizar esse sistema, que já não é desconhecido, por forma a cansar todos os outros que não tenham essa facilidade.

O Sr. Presidente: — Gostava de esclarecer o Sr. Deputado Próspero Luís de que tem toda a razão quando diz que obviamente as disposições regimentais da Assembleia da República são aplicáveis a este debate.

Como V. Ex.a notou, a Mesa desta Comissão tem vindo a seguir um regime relativamente tolerante, na medida em que somos menos do que no Plenário, pedindo a contenção dos Srs. Deputados, mas a ninguém tem sido recusado o direito de falar o tempo necessário.

Porém, fiz um apelo no sentido de pouparmos tempo nesta ponta final, pelo que espero que isso seja atendido.

Julgo que seria mau neste momento estarmos a introduzir uma limitação para a qual nos faltam de resto alguns instrumentos técnicos, como sejam aqueles relógios magníficos que marcam o verde e o vermelho no muro da Sala do Hemiciclo, onde decorre o Plenário.

Entretanto, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, queria dar um esclarecimento sobre as afirmações que o Sr. Deputado Magalhães Mota proferiu há pouco e que, de certa maneira, foram sustentadas também pela Sr.8 Deputada Helena Torres Marques, mas em especial ao primeiro pelo respeito que me merece como jurista. Devo dizer que a Sr." Deputada também me merece toda a consideração, embora por outras razões.

Assim, o Sr. Deputado Magalhães Mota colocou a questão desta maneira, ou seja, que o Sr. Primeiro--Ministro tinha dito que, aquando do debate da proposta de lei do Orçamento do Estado, baixaria o preço do leite se... Depois proferiu determinadas considerações sobre o assunto.

V. Ex.a argumentou que a oposição lhe ia dar os meios financeiros para que o leite possa baixar e não haja desculpas quanto a isso. Ora, com o devido respeito, parece-me que o Sr. Deputado Magalhães Mota está a fazer confusão entre uma questão contabilística e orçamental e uma outra de natureza económica e de preços. Que é que quero dizer com isto? O Sr. Primeiro-Ministro quando afirmou, no final do debate na generalidade da proposta de lei do Orçamento para 1986, que se a Assembleia da República não tomasse medidas legislativas que conduzissem à

baixa do preço dos combustíveis líquidos e gasosos (fundamentalmente referia-se à gasolina super), o Governo estava em condições de posteriormente baixar o preço do leite. E porquê?

Na verdade, nesse caso a referida baixa entrava em jogo com o mecanismo do consumo, dos preços da procura de bens alimentares, da capacidade de os consumidores desviarem a atenção de um produto para outro. Ora, isto tinha que ver com a política de preços; o outro problema prende-se com o facto de haver ou não cobertura orçamental.

O Sr. Deputado Magalhães Mota, salvo erro, perguntou, a uma dada altura da sua intervenção, se o Governo tem ou não meios financeiros para fazer baixar o preço do leite. Acontece, pois, que o problema que se coloca não é de cabimento orçamental ou não, porque o Governo não coloca a questão nesses termos, mas sim noutros. Isto é, se as condições de procura de determinados bens evoluíssem num determinado sentido, então estava em condições de arrecadar receitas para o INGA — na altura para o Fundo de Abastecimento — que permitissem depois compensar em sub-sidiação, neste caso, o preço do leite.

Este é, pois, um problema de natureza económica, ou seja, aquilo que a Assembleia da República pretende agora resolver acaba por não resolver nada. Na verdade, o problema não é saber se temos ou não verba orçamental, mas sim verificar se a evolução dos preços e das receitas do Estado conduzirá à possibilidade de baixar o preço do leite.

Não basta, pois, que incluamos na rubrica «Despesas» uma determinada verba para cobrir uma descida do preço do leite e depois, em compensação — estou no campo das hipóteses, já que não posso imiscuir-me no pensamento dos Srs. Deputados —, aumentar con-tabilisticamente determinada receita do Orçamento do Estado ou de outro organismo estatal. Neste último caso, a compensação processa-se com o reforço, por transferência, das receitas de um fundo autónomo ou de um instituto com autonomia financeira.

Ora, Srs. Deputados, o problema não está aí, mas sim em se conhecer se, de facto, a evolução das receitas efectivas desses organismos do Estado e dos preços permite ou não intervir no preço do leite. Logo, não é suficiente incluir no Orçamento do Estado uma determinada verba, isto é, pode ser ou pode não ser!... Creio que o problema não está aí! Trata-se, sim, de um problema de preços e de economia, e não contabilístico.

Aliás, o Sr. Deputado Magalhães Mota foi Ministro do Comércio Interno e sabe perfeitamente que as portarias de intervenção nos preços de determinados produtos, produtos esses em que o Governo entende dever agir, não chegam para baixar os preços. A baixa dos preços depende posteriormente da forma do comportamento do mercado e do comportamento dos preços na produção.

Portanto, penso que, logicamente — e era este o esclarecimento que queria dar —, não basta dizer que já há verba e que depois se vai compensar! Não é, pois, um problema contabilístico, mas sim de formação de preços e de intervenção no mercado do leite e dos combustíveis. É, assim, um problema de receita, isto é, não basta incluir...

Na verdade, se fosse só um problema contabilístico tínhamos já resolvido o problema da inflação neste país.

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O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, penso que o seu esclarecimento teve vários méritos, e um deles foi de sublinhar o interesse desta proposta de alteração ao Orçamento do Estado, que coloca a questão de se saber se o que está em causa é uma ausência... orçamental, problema que fica resolvido, ou se é uma política de preços, problema que sempre defendemos ser da competência do Governo e, portanto, esta gerirá como entender.

Contudo, o que o Governo não tem é o argumento da falta de capacidade financeira.

Perante isto, o esclarecimento que pretendia pedir--lhe, e que ajuda o argumento de que a falta de capacidade financeira não existe nem existiu, era o de saber se, concretamente e desde a votação da proposta de lei do Orçamento do Estado, os preços internacionais do petróleo não baixaram em relação à previsão constante do diploma orçamental apresentado pelo Governo e se as receitas arrecadadas não aumentaram também desde a votação do referido diploma.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Magalhães Mota, talvez não prestasse os esclarecimentos na minha exposição com a devida clareza, mas devo dizer que o problema que se colocou na altura foi o seguinte: o Sr. Primeiro-Ministro pediu, numa altura de economia de combustível à Assembleia da República que não provocasse, de uma forma directa ou indirecta, a baixa dos preços de venda nas bombas de abastecimento ao público.

A Assembleia da República interveio, mas não quero fazer comentários acerca da bondade dessa intervenção.

Porém, o que é certo é que com a sua intervenção houve uma redução na previsão das receitas que o Governo considerava serem as necessárias para dar como contrapartida na subsidiação dos leites em termos de economia real.

Ora, como a Assembleia da República provocou, por via indirecta, uma baixa dos preços dos combustíveis, essa descida retirou receita ao Fundo de Abastecimento para intervir no circuito dos leites. Portanto, neste caso uma equação fiscal ou uma equação de receita do Estado tem a ver com a base, com o preço para dar a receita. Ora, os Srs. Deputados vão, neste momento, mexer na receita, mas não mexem na taxa do imposto e, naturalmente, não mexem no mercado.

Ora, se pudéssemos dizer que a receita do ISP, que, por exemplo, reverte para o INGA, é um T, que a taxa do imposto é t e as transacções de combustível que são feitas são um q, indo os Srs. Deputados mexer no Tsem mexerem na taxa do imposto, nem na continuidade, então a proposta de lei do Orçamento do Estado era diferente.

Portanto, o comportamento da economia pode levar a um aumento da receita do INGA, mas isso não é por intervenção contabilística.

Naturalmente, se o comportamento do mercado evoluir em termos favoráveis, o Governo poderá, porque o deseja, baixar o preço dos leites. Se não evoluir favoravelmente não interessa estarmos a empolar a receita em termos contabilísticos, porque na prática essa receita não surge.

Volto a repetir, Srs. Deputados, que uma questão é o problema contabilístico, que é o que VV. Ex.as querem, no fundo, ou em que estão a insistir, outra questão é a da economia real — o Governo joga na economia real. Neste caso, os Srs. Deputados do PCP e outros, que apresentam a proposta de alteração ac Orçamento do Estado, estão a avançar na mera contabilidade.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (PRD): — Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Lopes.

O Sr. Silva Lopes (PRD): — Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Não tenho mais inscrições e penso que estamos em condições de proceder à votação. Portanto, poria à votação a proposta com a alteração apresentada pela Sr." Deputada Helena Torres Marques, que passo a ler:

Os deputados abaixo assinados propõem uma dotação de 1,5 milhões de contos para que o Governo não possa dizer que não pode imediatamente baixar o preço do leite por falta de meios financeiros para o efeito.

Assim, propõe-se a seguinte alteração ao Orçamento do Estado para 1986:

06 — Ministério das Finanças: Despesas excepcionais — + 1 500 000 contos; transferências correntes, sector público, fundos autónomos, INGA, leite e lacticínios, subsídios ao consumo do leite.

Está claro?

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Leite e lacticínios não vamos votar, pois não, Sr. Presidente? Na realidade, digamos que não é da competência da Assembleia descer a esse pormenor. O capítulo é INGA.

O Sr. Presidente: — Isso está entre parêntesis.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Não, não. Isso está na exposição de motivos, não está entre parêntesis. Atenção, isso não.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — A

Assembleia vota até ao capítulo. Neste caso já está a votar numa subdivisão. Só quero esclarecer isso para evitar algum mal-entendido.

O Sr. Presidente: — Posso riscar o leite e lacticínios, Sr." Deputada Helena Torres Marques?

A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Ele vota contra de qualquer maneira.

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O Sr. Presidente: — Nesse sentido VV. Ex.as pronunciar-se-ão como entenderem.

Vozes.

O Sr. Presidente: — Gostaria que os proponentes concluíssem a decisão de tirar ou manter a frase. Qual é a vossa última posição, Srs. Deputados?

Sr.8 Deputada Helena Torres Marques, qual é a sua última posição?

A Sr.a Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, se facilitar, faça o favor de tirar o leite.

O Sr. Presidente: — Então, nestes termos, coloco à votação a proposta apresentada.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP e do MDP/CDE e votos contra do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se para declarações de voto os Srs. Deputados Carlos Carvalhas, Guido Rodrigues, Helena Torres Marques, Nogueira de Brito e Vítor Ávila.

Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Contrariamente ao que afirmou o CDS, e mesmo o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, a votação desta proposta tem efectivamente eficácia. O Governo vai ser obrigado a baixar o preço do leite ou por via desta dotação ou pela redução de custos. Não tem mais fugas. Seja qual for a via não temos dúvidas de que iremos ter a baixo do preço do leite. O Governo vai ser obrigado a fazê--lo e certamente já em Agosto. Não é uma questão contabilística. Fica o desafio feito ao Governo e ao CDS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — O PSD votou contra a proposta porque é contrária à política de rendimentos que o Governo coerentemente vem executando e conduzirá naturalmente à diminuição dos preços, entre os quais o preço do leite. A proposta do PSD, do PCP e PRD só irá dificultar a baixa do preço do leite.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.8 Helena Torres Marques (PS): — O PS votou naturalmente a favor desta proposta, tomou a iniciativa, conjuntamente com outros partidos, de a apresentar porque entende que o preço do leite tem de baixar. Agora o Governo não tem a desculpa de não o fazer por escassez de meios financeiros. Nada obriga o Governo a baixar o preço que não seja utilizando o processo técnico, o método que considerar mais conveniente. Baixe o preço do leite como quiser, não invoque mais a escassez de meios financeiros para o fazer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — O CDS votou contra a proposta de forma coerente com a posição que

sempre sustentou relativamente a propostas do mesmo tipo na discussão do Orçamento. A proposta não implica, apesar de todas as declarações que o Sr. Deputado Carlos Carvalhas e os deputados do PCP e do PS possam querer fazer, a baixa de nenhum preço.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Veremos!

O Orador: — Veremos, Sr. Deputado Carlos Carvalhas.

A proposta significa que esta Assembleia reconheceu a necessidade de reforçar as dotações do antigo Fundo de Abastecimento, actual INGA, o que certamente não deixará de ter outro tipo de consequências.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ávila.

O Sr. Vítor Ávila (PRD): — O PRD votou a favor desta proposta porque considera que desta forma o saldo do Fundo de Abastecimento poderá ser afectado ao mesmo tipo de aplicação que tinha sido previsto aquando da votação do Orçamento do Estado. Esta forma é, portanto, um modo de se conseguir que esse saldo não possa ser desviado para outros fins, conforme estava previsto no Orçamento do Estado quando foi votado em Abril.

O Sr. Presidente: — Podemos passar à outra proposta de alteração, que é do seguinte teor:

Dadas as informações prestadas pelo Governo sobre a prevista redução dos encargos líquidos com juros, os deputados abaixo assinados propõem a seguinte alteração:

06 — Ministério das Finanças: 2 — Secretaria de Estado do Tesouro: 25 — Encargos de dívida pública, dívida externa a cargo do Tesouro, DGT — 4 000 000 de contos.

Os Deputados: Vítor Ávila — Octávio Teixeira — Domingues Azevedo — João Corregedor da Fonseca f...]

Está em discussão, Srs. Deputados. . Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Para que não se levantem mais problemas formais como aquele a que assistimos há pouco, solicitaria ao Sr. Presidente que se fizesse a seguinte alteração:

Dadas as informações prestadas pelo Governo sobre a prevista redução dos encargos com juros da divida externa a cargo do Tesouro (DGT), os deputados abaixo assinados propõem a seguinte alteração:

06 — Ministério das Finanças: 2 — Secretaria de Estado do Tesouro: 25 — Encargos da dívida pública — 517 923 279 contos.

Seguem-se as assinaturas.

O Sr. Presidente: — Isso significa, portanto, que são menos 4 milhões de contos, para sabermos do que estamos a tratar.

Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

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II SÉRIE — NÚMERO 88

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, para que fique registado, de acordo com a verba que vem no Orçamento publicado no Diário da República, 1.» série, n.° 99, de 30 de Abril de 1986, a p. 1024(79). Pode ter sido uma das verbas que tivesse sido necessário alterar, alteração essa que não tenho porque, segundo creio, ainda não saiu.

O Sr. Presidente: — Percebemos perfeitamente o sentido da sua precisão.

Há algum pedido de intervenção sobre esta matéria e neste momento?

Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Era para saber se o Sr. Deputado Octávio Teixeira quer limitar-se apenas a alterar e a corrigir a redacção da proposta, não tencionando dizer nada sobre ela.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, quer fundamentar a sua proposta para além daquilo que já diz no preâmbulo?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — A proposta, que não é minha, mas de vários Srs. Deputados, está justificada por si. Há uma previsão, dada pelo Governo, de quebra acentuada dos juros nesta rubrica e nós propomos reduzir 4 milhões de contos à verba orçamentada.

O Sr. Presidente: — Podemos passar à votação? Srs. Deputados, vamos, por conseguinte, proceder à votação desta proposta.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PRD, do PCP, do CDS e do MDP/CDE e votos contra do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nogueira de Brito, para que efeito pede a palavra?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Presidente, é para fazer uma curtíssima declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Votámos a favor desta proposta de forma coerente com o que hoje à tarde dissemos no Plenário e não posso deixar de voltar um pouco atrás e sublinhar, para que fique na acta, que os partidos que agora fizeram esta proposta fizeram-na com uma coerência diferente, e tão diferente como isto: propuseram agora um reforço de 1 milhão e 500 mil contos nas transferências para o Fundo de Abastecimento, quando tinham precisamente proposto na discussão do Orçamento o reforço do contrário, das transferências do Fundo de Abastecimento para o Orçamento do Estado, de 27 para 40 milhões de contos! Esqueceram-se agora de reduzir essa verba em 1 milhão e 500 mil contos!

O Sr. Presidente: — Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — A proposta agora votada pelos Srs. Deputados do PCP, do PS, do PRD

e do CDS revela bem o grave desconhecimento do que são poupanças nas despesas. Os juros da dívida externa, se tiverem de ser pagos, serão pagos. Se houver juros a pagar de um montante inferior eles não serão pagos. De qualquer modo, os que recebem os juros são estrangeiros e tal não implica a redução no consumo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de pedir dois esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, porque isto ainda poderá ter implicação com esta reunião. O primeiro esclarecimento, Sr. Secretário de Estado, é o seguinte: Quando da discussão do Orçamento para 1986 a Assembleia da República reforçou a dotação para a ANOP em, salvo erro, 64 mil contos. Logicamente, o reforço dessa verba para a ANOP foi inscrito onde vinha a verba que o Governo lhe destinava, na rubrica da Presidência do Conselho de Ministros «Aquisição de serviços»; na altura foi aí incluída porque era para reforço da verba para a ANOP e esta estava incluída nessa rubrica. Surge-nos hoje a informação de que o Governo, julgo que através do Sr. Secretário de Estado da Comunicação Social, se escusa a fazer essa transferência dizendo que ela está em «Aquisição de serviços» e, por conseguinte, pode ser para a ANOP ou para que o Sr. Secretário de Estado desejar. O primeiro pedido de esclarecimento é para saber se isto se passa, na medida em que a própria proposta que foi aprovada define claramente que a verba era para a ANOP — já referi que as razões que levaram à inclusão dessa verba têm a ver com o facto de a restante verba para a ANOP também lá estar.

O outro problema que esta tarde tivemos a oportunidade de levantar no Plenário e que ficou sem resposta — julgo que o Sr. Secretário de Estado, na altura, não teria ouvido ou percebido — preocupa-nos e parece-nos extremamente grave. É o problema dos tarefeiros e eventuais, é o problema de estarem em causa os vencimentos para estes trabalhadores da função pública que vêm prestando, muitos deles há longos anos, trabalho em continuidade. Peço-lhe este esclarecimento porque a questão foi levantada por várias instâncias e inclusivamente tenho à minha frente um despacho conjunto dos Srs. Ministros das Finanças e da Agricultura, Pescas e Alimentação em que se assegura o vencimento até 31 de Julho de 1986.

Sr. Presidente, do nosso ponto de vista o esclarecimento pode implicar a apresentação de mais propostas.

Eram estes os dois pedidos de esclarecimento que faria ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Presidente: — A justificação é a de que os esclarecimentos podem ser premonitórios de novas propostas.

O Sr. Octávio Teixeria (PCP): — Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Quero intervir, mas não significa que queira responder. Com todo o respeito que naturalmente tenha pelos Srs. Depu-

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tados, se respondesse a essa questão neste momento, em plenário de Comissão, estaria a contradizer as afirmações que anteriormente proferi sobre a competência da Comissão em votar ou intervir em despesas que não constavam da rectificação ao Orçamento. Não posso, portanto, porque interpreto ser legalmente deslocado, estar a fazer análises de despesas que não têm nada a ver com a alteração do Orçamento do Estado de 1986. Tudo isto tendo em conta o respeito que me merecem, mas, segundo a interpretação que tenho das competências da Assembleia e do âmbito da discussão, não posso dar resposta a esse pedido.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, gostaria de fazer uma interpelação a V. Ex.a Julgo que esta noite já foi discutido várias vezes o problema do tipo de propostas que podem ser aceites. Julgo que esse problema está resolvido. Levantou-se o problema logo de início no sentido de saber se poderiam ser apresentadas, votadas e discutidas as propostas que não tivessem a ver com as propostas do Governo e julgo que isso está esclarecido. Para que não haja dúvidas, pergunto ao Sr. Presidente se assim é.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, em primeiro lugar é óbvio que foi apenas no âmbito da Comissão e a propósito das questões que em concreto foram suscitadas que se tomaram deliberações. Essas deliberações foram tomadas, em primeiro lugar, a propósito de uma proposta apresentada pelo CDS e, depois, das propostas seguintes e, portanto, o problema está resolvido apenas na justa medida em que foi decidido pela Mesa admiti-lo, como sabe, não tendo depois a Comissão impugnado essa decisão. Portanto, esse sentido está decidido e foi feita essa discussão e suponho que ninguém tem dúvidas nesse capítulo. Suponho, no entanto, que o Sr. Deputado pretende dizer que o Sr. Secretário de Estado tem uma interpretação diferente e pauta as suas respostas por essa sua interpretação. Penso que isso não tem nada a ver com o problema do «caso julgado». Isso é uma questão que veremos na continuação dos trabalhos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, isso significa, é evidente que não poderia significar outra coisa, que, por um lado, quem define aquilo que aceita para discussão é quem preside à reunião, no caso concreto da Comissão de Economia é V. Ex.a, e, por conseguinte, está tudo esclarecido em lermos de Assembleia da República. Por outro lado, o Sr. Secretário de Estado recusa-se pura e simplesmente a responder a estas questões. Essa é a questão; porque o Sr. Secretário de Estado certamente não terá a intenção de tentar que a Assembleia, e no caso concreto esta Comissão, apenas discuta aquilo que o Sr. Secretário de Estado quer. Certamente que não terá essa intenção e, por conseguinte, a única conclusão possível, para além dessa, é a de que o Sr. Secretário de Estado se recusa a prestar as informações solicitadas!

O Sr. Presidente: — Ó Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.a ouviu como eu aquilo que o Sr. Secretário de Estado disse; portanto, penso que estará tão esclarecido como eu e não vai interpelar a Mesa sobre isso, não é verdade?

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: — Tem V. Ex.a a palavra.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Secretário de Estado do Orçamento, eu posso conceber, na sequência das explicações que foram dadas a pedido do meu camarada Octávio Teixeira, que o Governo entenda dizer à Assembleia que não tem informações sobre determinada matéria.

O Governo pode naturalmente dizer que não dispõe desta ou daquela informação, o que não pode é fazer truncagem de informação ou mesmo sonegação qualificada de informação. Quer dizer, um membro do Governo não pode — e não sei o que é que se passa na cabeça do Sr. Secretário de Estado — chegar à Assembleia da República e dizer: «eu entendo que a Assembleia não tem poder para alterar o Orçamento, os senhores, pelos vistos têm a intenção pérfida de alterar o Orçamento, mas como para alterarem o Orçamento precisam de uma informação e eu não dou a informação, os senhores não alteram o Orçamento». O Sr. Secretário de Estado não pode fazer isso.

Há bocado apareceram-nos lá em cima os dirigentes da Associação dos Magistrados Portugueses e disseram--nos que o Orçamento e os cofres do Ministério estavam secos, que queriam cessar os contratos dos eventuais do Ministério e que isso gerava uma situação perfeitamente catastrófica nos serviços de justiça. E a minha vontade e a das pessoas que estavam na Comissão foi ir ao Plenário e perguntar ao Sr. Secretário de Estado se isto é verdade. O Governo assume a responsabilidade de paralisar os serviços de justiça, da agricultura, da saúde, etc? É isso que o Governo vai fazer?

Depois, fui informado de que o Governo, interpelado sobre esta matéria, não disse nada. Quando me disseram que o Governo não disse nada, imaginei várias coisas como, por exemplo, que não tinha os dados quantificados, que o Sr. Secretário de Estado se tinha esquecido do papel, etc. Agora, o que não me passou pela cabeça foi que o Sr. Secretário de Estado não só se tivesse esquecido do papel como tivesse a intenção política deliberada — e agora confessada — de obstruir o exercício livre da actividade da Assembleia da República.

O Governo tem todo o direito de estar calado, não tem é o direito de estar calado acintosamente e fazendo negaças, porque isso é perfeitamente acintoso e é uma atitude de guerra institucional. Sr. Presidente, não podemos aceitar isso e nesse sentido lavro este protesto.

Se o Governo entende por essa via fazer o cattenac-cio e a liquidação dos poderes de alteração da Assembleia da República está enganadíssimo porque num regime democrático há sem dúvida meios para saber esses dados, de forma livre e aberta. Parece-me, todavia, que se trata de uma visão administrativa, ferro-lhista e até agora sem precedentes, peio menos com este despudor, nesta Casa.

O Sr. Presidente: — Para formular um contrapro-testo, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado José Magalhães, o que se passa é o seguinte: a Assembleia reuniu a sua Comissão Parla-

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mentar de Economia, Finanças e Plano para votar na especialidade as despesas de alteração ao Orçamento de 1986, que foi votado na generalidade na quinta-feira.

Portanto, a Comissão votou as propostas do Governo, para além de outras contrapropostas, e o Governo, num espírito de colaboração e de cooperação com a Comissão, fez deslocar aqui dois secretários de Estado.

O Sr. José Magalhães (PCP): — Calados!

O Orador: — Se estão calados depois se há-de ver nas actas desta reunião.

Neste campo, o Governo teve a frontalidade e a lealdade de depor a sua posição sobre aquilo que interpretava como alteração às votações na generalidade e como votações que competiam à Comissão no âmbito da votação da especialidade do conteúdo das alterações ao Orçamento para 1986.

Alguns dos Srs. Deputados desta Comissão entenderam, como é de seu pleno direito, que deveriam discutir e votar outras matérias, mas o Governo entende que a votação na especialidade não pode extravasar o conteúdo da votação na generalidade.

Assim, houve várias propostas de alteração que não tinham directamente nada que ver com o pedido de alteração ao Orçamento que o Governo apresentou, no domínio da sua iniciativa exclusiva, em matéria do Orçamento do Estado. O Governo revelou a sua posição e, neste momento, o Sr. Deputado Octávio Teixeira colocou questões de natureza administrativa, de gestão corrente de ministérios, com o pressuposto de que haveria necessidade de apresentar novas alterações orçamentais consoante as informações que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento concedesse.

Qualquer deputado tem o direito de apresentar requerimentos ao Governo sobre medidas que o Governo tenha tomado sobre os assuntos que entender, pois a figura do requerimento constitui um direito do deputado. Neste caso, o Sr. Deputado Octávio Teixeira tem todo o direito de apresentar ao Governo um requerimento pedindo informações sobre essa matéria; simplesmente — e aqui respondo directamente ao Sr. Deputado José Magalhães —, não é isto o que se está a passar neste momento nesta Comissão. Esta Comissão reúne para discutir e votar na especialidade as alterações hoje votadas na generalidade no Plenário.

Neste momento, pretende-se discutir outras matérias de competência própria do Governo e logicamente o Governo não se sente no dever, até porque já, lealmente, comunicou qual era a sua posição nesta matéria, de estar, digamos assim, a abrir outro debate em sede de um debate na especialidade de uma alteração do Orçamento.

Portanto, não há aqui qualquer obstrução, bem pelo contrário, não há qualquer acinte, bem pelo contrário, e a prova disso é que o Governo tem estado aqui a apresentar as suas posições, as suas informações, enfim, a visão técnico-jurídica que tem sobre estas matérias e, portanto, tem estado aqui como esteve no Plenário e como tem estado sempre que é solicitado pela Assembleia.

Assim, entendemos que o Governo deverá dar toda a informação, mas não em sede de discussão e votação na especialidade, de uma alteração ao Orçamento. Os Srs. Deputados têm todo o direito de ter a sua in-

terpretação, mas no domínio do respeito mútuo entre órgãos de soberania também têm que ter o dever de respeitar as interpretações dos outros órgãos de soberania.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Julgo que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não entendeu minimamente aquilo que tentei explicar sobre o objectivo das questões que lhe coloquei. Só agora coloquei estas questões porque só esta tarde tivemos conhecimento destes assuntos.

Não vou discutir o problema do âmbito das propostas que podem ser aqui apresentadas porque isso está esclarecido. No entanto, coloquei certas questões porque se, de facto, está a suceder esse problema em relação à verba dotada pela Assembleia da República no Orçamento para 1986 e destinada à ANOP, eu posso sentir a necessidade de apresentar uma proposta de alteração ao Orçamento — e estou dentro da matéria que estamos a discutir — para que fique bem claro que a verba dotada pela Assembleia da República em Abril é para a ANOP.

Em relação aos tarefeiros e eventuais, devo dizer que o pedido de esclarecimento foi feito com o mesmo objectivo. É que se é um problema de falta de dotação, a Comissão terá de se debruçar sobre esse assunto, porque estamos em sede de alteração do Orçamento.

Foram estes os objectivos e as razões que me levaram a colocar a questão. Por isso, estamos absolutamente dentro da matéria que nos trouxe aqui, que é a alteração ao Orçamento de 1986.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — [Por deficiência técnica não foi possível registar as palavras do orador./

O Sr. Presidente: — Ó Sr. Deputado Carlos Carvalhas, para mim foi muito clara a maneira como as questões foram postas, mas se os Srs. Deputados se quiserem manifestar, é evidente que o podem fazer.

A questão é muito simples: o Sr. Deputado Octávio Teixeira explicou com toda a clareza qual era a sua posição e o Sr. Secretário de Estado também explicou com toda a clareza a dele. Para ele isso significava, neste momento e nesta sede, conceder algo que ele entendia que não deveria ser concedido em termos de linguagem jurídico-processual. Portanto, as duas posições são muito claras, não vejo que isso seja fundamentalmente alterado pela circunstância de haver uma maioria num ou noutro sentido. Mas naturalmente que os Srs. Deputados terão como sempre toda a liberdade para se manifestarem, caso o queiram fazer.

Se não for esse o caso, pergunto se o Srs. Deputados têm mais alguma proposta para apresentar. Se não houver mais nenhuma proposta, peço-lhes um voto de confiança para que a Mesa elabore o relatório, que deve ser apresentado ao Plenário na terça-feira, pois, não sendo assim, ter-se-ia que fazer uma reunião para votar esse relatório.

Visto que não há objecções a esta metodologia, a Mesa elaborará o relatório, que será apresentado em Plenário.

Srs. Deputados, declaro encerrada a reunião. Eram 2 horas e ¡5 minutos.

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11 DE JULHO DE 1986

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Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:

Rui Manuel Chancerelle de Machete (PSD). Ivo Jorge de Almeida dos S. Pinho (PRD). Octávio Augusto Teixeira (PCP). António Vasco de Mello (CDS). Belarmino Henriques Correia (PSD). Alberto Monteiro Araújo (PSD). Fernando Próspero Luís (PSD). Carlos Alberto Pinto (PSD).

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD).

Helena de Melo Torres Marques (PS).

João Cardona Gomes Cravinho (PS).

António Domingos de Azevedo (PS).

José da Silva Lopes (PRD).

José Carlos Pereira Lilaia (PRD).

Vítor Manuel Ávila da Silva (PRD).

Carlos Alberto do Vale Carvalhas (PCP).

Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP).

José Luís Nunes Nogueira de Brito (CDS).

João Cerveira Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

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PREÇO DESTE NÚMERO: 105$00

Depósito legal n.º 8819/85

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