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II SÉRIE — NÚMERO 49

Por seu turno, o director exonerado do Instituto Nacional de Sangue declarou que a sua nomeação fora «um facto nunca desejado» e que nunca tivera condições mínimas para o exercício do cargo.

Benvindo Justiça disse que desde Setembro de 1987 mantinha contacto, primeiro semanal e depois quinzenalmente, com o Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Saúde, Joaquim Faria e Almeida, ao qual apresentou documentos sobre «a grave situação» do INS, que não tem financiamento para melhorar as suas instalações.

Declarou, ainda, que apresentara proposta de despachos normativos para o Instituto e propostas de reestruturação de todos os serviços. Por outro lado, sublinhou que propusera a criação de um serviço nacional de sangue, aprovado pelo Secretário de Estado, mas que nunca teve financiamento.

Benvindo Justiça disse também que no dia 2 de Fevereiro tinha pedido a exoneração, por falta de financiamento para o INS, e observou que quase tudo o que disse na entrevista desta semana era já do conhecimento geral, pois que o sector do sangue, em Portugal, desde há anos que está em crise.

Entretanto, a Ministra da Saúde mandou instaurar um inquérito ao Instituto Nacional de Sangue «para, com a maior rapidez e com o maior rigor, apurar do cumprimento da legislação em vigor» nas análises, segundo uma nota oficiosa do Gabinete do Primeiro--Ministro.

A nota surge como resposta a «declarações alarmistas» do ex-director do INS «a propósito de supostas irregularidades no controle de sangues», eventualmente que — escreve-se no texto — anteriormente o ex--responsável do Instituto «nunca fizera chegar ao conhecimento do Governo».

De acordo com a nota, a legislação em vigor «obriga à análise por métodos adequados de todos os sangues utilizados em transfusões nas instituições de saúde públicas e privadas».

(A Capital, de 11 de Fevereiro de 1988.)

Benvindo Justiça acaba de ser exonerado do cargo de director do Serviço Nacional de Sangue. A decisão tomada pela Ministra da Saúde tem a ver com as declarações deste médico ao Jornal de Noticias sobre a inoperância da instituição e de que ressaltam afirmações como estas: «Em Portugal morrem diariamente doentes por receberem sangue não estudado» e «o Instituto não tem órgãos de controle nem quaisquer meios humanos e materiais para o fazer».

Contactado pelo Diário Popular na sequência do afastamento, Benvindo Justiça afirmou já ter pedido no dia 2 deste mês a demissão do lugar devido à insuficiência da verba de 90 000 contos atribuída à instituição que dirigia e da qual 80 000 contos era gasta em ordenados. E referiu também ter entregue, por várias vezes, relatórios ao Secretário de Estado sobre a gravidade da situação.

O ex-director do Serviço Nacional de Sangue disse igualmente não ter provas de haver óbitos devido a transfusões de sangue, mas deixou implícita a ideia de que tal possa ter acontecido devido a denúncias da Associação de Dadores Benévolos e a textos publicados no Diário Popular. Benvindo Justiça, por último, não confirmou nem desmentiu as outras declarações

que lhe foram atribuídas no Jornal de Notícias e declarou terem sido as mesmas «tratadas sob o ponto de vista jornalístico».

Mas as acusações do Dr. Benvindo Justiça foram mais longe. Ele referiu igualmente a possibilidade de algumas doenças, como a sida, poderem atingir os doentes transfundidos, por apenas metade do sangue colhido ser testado pelos organismos oficiais, o que põe em causa toda a estrutura montada para combater a terrível enfermidade que tem custado centenas de milhares de contos ao erário público.

Contactado o Prof. Machado Caetano, responsável pela cátedra da Imunologia da Faculdade de Medicina de Lisboa e membro do grupo de trabalho da sida, fomos informados de que o Ministério da Saúde promoveu, em devido tempo, todos os meios legais, de apoio técnico e financeiro para garantir que todo o sangue recolhido nos hospitais fosse testado em termos de risco de sida e de outros vírus, como a sífilis e a hepatite B.

O catedrático lamentou a demissão do Dr. Benvindo Justiça, a quem reconhece elevada competência técnica, mas salientou o dever de aquele colega interditar a acção dos serviços de sangue suspeitos (e até referenciados pelo Jornal de Notícias), proceder aos inquéritos necessários, como entidade responsável pela fiscalização, e estabelecer contactos com o Ministério da Saúde para serem instaurados processos disciplinares. E salientou:

Isto no caso de haver conhecimento dos factos, o que, infelizmente, parece não ter acontecido.

Machado Caetano disse também não haver qualquer justificação para o Instituto Nacional de Sangue não fazer todos os testes. E acentuou:

O Instituto foi dotado de dezenas de milhares de contos o ano passado para fazer testes de sida. Este ano, o Dr. Benvindo Justiça pediu mais 30 000 contos para estudo de anticorpos nas amostras de sangue. Não é verdade haver falta de verbas para que tudo isso não seja feito.

Machado Caetano afirmou, depois, ter seguido toda a actuação do Ministério da Saúde no combate à sida e poder testemunhar, publicamente, o empenhamento pessoal da titular daquela pasta para que tudo corresse bem, sem olhar a verbas despendidas com técnicos e equipamento. E sublinhou:

Eu não digo que não haja médicos em falta no cumprimento da lei. E considero até que esses casos pontuais devem ser denunciados para esses indivíduos serem severamente punidos pela sua acção criminosa.

Machado Caetano manifestou-se convencido de que em todas as instituições hospitalares está a ser feito o teste da sida desde que começou a ser comercializado em Portugal. E vai mais longe ao afirmar:

O Hospital de São José, que abastece a rede dos hospitais civis, já testou, desde 1985, 40 000 dadores e todos os positivos foram rejeitados. A percentagem eliminada foi de 5 para 10 000 (igual à média europeia). No Hospital de Santa Maria atingiu-se já os 30 000 testes, com uma positividade de 6 para 10 000 pesquisados.