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29 DE MAIO DE 1991

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do português. Quem prestar alguma atenção ao que ouve à sua volta observará, vindas de pessoas 'cultas', pronúncias de acto, acta, directiva, adoptar, optimizar, etc, em que a c e p correspondem efectivos fonemas. E daqui decorre que, dentro de Portugal, quem pronunciar ''atu\, \a'tivu\, etc, escreverá ato, ativo, etc, tão legítima e legalmente como escreverá acto, activo, etc., quem pronunciar 'aktu\, \ak'tivu, etc.

É que acontece também com a facultatividade do uso de acento agudo na terminação -amos do pretérito perfeito do indicativo para a distinguir da terminação -amos do presente (andámos — andamos) e do uso do acento circunflexo no presente do conjuntivo dêmos para o distinguir da correspondente forma do pretérito perfeito do indicativo demos, bem como a especiosi-dade de se poder usar o acento circunflexo para distinguir o substantivo fôrma ('formato') do substantivo forma ('modo') e das formas verbais de formar.

Em todos estes casos, a facultatividade será fonte de equívocos, porque não se saberá, por exemplo, se o acento não foi usado porque quem escreveu sem acento -amos quis usar a liberdade de o não usar no perfeito ou não o usou com a finalidade explícita de distinguir o presente do perfeito; mutatis mutandis, idêntico é o caso das outras formas citadas.

A especiosidade do caso de fôrma é deveras surpreendente, se se pensar na existência de inúmeros pares como adorno, substantivo, com [o], e adorno, verbo com [ç>], pregar [d], 'pôr prego', e pregar [e], 'dar sermão', sede [e], 'vontade de beber', e sede [e], 'sé', que proporcionaram longas considerações a todos os orto-grafistas portugueses e o Acordo Ortográfico não manda distinguir graficamente. O argumento, aliás válido, de que o contexto elimina possíveis ambiguidades, não vale mais para estes casos do que para o de forma.

É ainda o caso de várias outras grafias alternativas, como buganvília ou buganvüea ou bougainvillea (base I, n.° 3.°), Jacob ou Job ou Jó, David ou Davi (base i, n.° 5.°), do uso ou não uso do apóstrofo em casos como Nun'Átvares ou Nuno Álvares [base xvin, n.° 1.°, alínea c)], do uso de maiúsculas ou minúsculas iniciais nos hagiónimos [base xtx, n.° 1.°, alínea f): Santa Filomena ou santa Filomena) e categorizações de logadouros [base xtx, n.° 2.°, alínea f): Rua da Liberdade ou rua da Liberdade].»

Em suma, o princípio da facultatividade, tal como se encontra formulado e exemplificado em diversas bases do Acordo Ortogográfico, introduz na ortografia da língua portugesa um factor de variabilidade individual que tem se considerar como pernicioso e contraproducente, sobretudo no domínio pedagógico-didáctico (um aluno do 1.° ciclo do ensino básico, por exemplo, que está a fazer a aprendizagem da escrita, pode ter um professor que escreve fator e outro que escreve factor). Se é correcta a opção de rejeitar o princípio da «unificação forte», que inspirou as Bases Analíticas da Ortografia Simplificada da Língua Portuguesa de 1945, renegociadas em 1975 e consolidadas em 1986, adoptando-se em contrapartida o princípio da «unificação fraca», que contempla as diferenças linguísticas existentes entre o português de Portugal e o do Brasil e que admite que essas diferenças se manifestem na norma ortográfica dos dois países, é indispensável, como se lê no parecer que o Centro de Linguística da Universidade de Lisboa elaborou, em Maio de 1989 so-

bre o Anteprojecto de Bases da Ortografia Unificada da Língua Portuguesa (1988), «que em cada país seja clara, e normativa, a opção por apenas uma variante ortográfica [...] Se nos parece aceitável grafar 'facto' em Portugal e 'fato'no Brasil, já não consideramos admissível, por colidir com o próprio conceito de 'ortografia', aceitar grafias duplas no mesmo espaço nacional sempre que há oscilações na 'pronúncia culta'. Tal facultatividade deve ser eliminada, indicando o texto explicitamente as grafias admitidas para cada espaço nacional».

Ora em relação às sequências consonanticas com variações de pronúncia (dactilografia/'datilografia, apocalíptico /apocalítico, dicção/dição, factor/fator, etc), não havendo possibilidade de formular uma regra quanto à sua realização fonética, a única solução coerente consiste em manter a grafia actualmente em vigor.

Sobre a eliminação das chamadas consoantes não articuladas (base iv, n.° 1.°), devem ser registadas neste relatório as seguintes reflexões, que o Prof. Doutor Óscar Lopes formulou num parecer que enviou ao coordenador da CNALP, correspondendo a um pedido que este lhe endereçara:

Outra forma de divergência [entre o vocalismo do português europeu e do português brasileiro] resulta do 'fechamento' (por vezes até emudeci-mento) normal de vogais átonas pretónicas no português europeu, o que torna funcional a manutenção de grafemas de consoantes que etimologicamente obstaram a tal fenómeno: acção, baptizar, colectivo, adopção, etc Não é seguro que a eliminação grafemas de origem consonantica impeça a manutenção de vogais átonas abertas. Regista-se mesmo o fenómeno de manutenção de certas vogais abertas por motivação etimológica já inconsciente, em casos como pregar (are. preegar, de predicare), corar (are. coorar, de colorare), padeiro (are. paadeiro, de panatariu); e há casos de «fechamento» não impedido pela manutenção do grafema de origem consonantica, como em exactidão, actual ou actualidade, pelo menos em pronúncias correntes: mas há também casos, talvez de ultracorrecção, que revelam a importância, mesmo analógica, desse factor etimológico: inflação, retórica (talvez por confusão entre o étimo grego do termo, rhetor, ou orador, e o latino rector).

Um dado analógico a ponderar quanto à hipótese (agora proposta do projecto) no sentido de se eliminarem os grafemas de origem consonantica que indiciam o carácter «aberto» da vogal átona anterior é a de que tais grafemas são abolidos quando se não pronunciam a seguir a vogais fechadas do tipo / e u: aflição, rotura (divergente de ruptura), ou quando se seguem a vogais cuja abertura se não manteve (cativo). Outro dado a ponderar é o de qual será a evolução em curso nos lusofalantes africanos: segundo informação do fo-neticista Ernesto Pardal, nem esses grafemas nem a consoante / (velar a fechar sílaba) impedem que em Cabo Verde se feche já a vogal pretónica grafada a de acalmar, Almeida e activo.

O principal inconveniente quanto à omissão do grafema de origem consonantica e que no português europeu ainda assinala vogal anterior aberta consiste na discrepância que isso vem criar em relação a uma larga área de línguas com léxico ro-