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II SÉRIE-A — NÚMERO 11

DECRETO N.s 184/VI

ALTERA A LEI N.» 30/84, DE 5 DE SETEMBRO - LEI QUADRO DO SISTEMA DE INFORMAÇÕES DA REPÚBLICA PORTUGUESA

Mensagem do Presidente da República

Sr/Presidente da Assembleia da República: ■■ Excelência:

No exercício das competências que me são atribuídas pelo artigo 139.°, n.° 1, da Constituição da República, venho devolver, para nova apreciação da Assembleia da República, o Decreto n.° 184/VI, que «altera a Lei n.° 30/ 84, de 5 de Setembro (Lei Quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa)», aprovado no contexto da reapreciação do anterior Decreto n.° 178/VI, que vetei, pelas razões então expressas, em mensagem fundamentada, dirigida a essa Assembleia.

A Assembleia da República poderia ter confirmado o decreto vetado, por maioria absoluta dos Deputados em efectividade de funções, superando o veto pela afirmação de uma vontade inequívoca e obrigatória para o Presidente da República. Não o fez. Optou por reabrir o processo legislativo com a apresentação de propostas de alteração.

Contudo, da reapreciação do decreto inicial resultou apenas a aprovação de alterações nas competências do conselho de fiscalização dos serviços de informações. Considero, assim, que as alterações introduzidas ficaram muito aquém do que seria aconselhável e mesmo exigível no quadro de um Estado de direito democrático.

Por esse motivo, em consciência e no uso dos meus poderes constitucionais, entendo ser meu dever apelar de novo à atenção da Assembleia da República, invocando as razões da minha discordância, dadas a importância e delicadeza para a vida democrática que atribuo a este assunto, que, com efeito, julgo merecer da Assembleia da República uma cuidadosa reapreciação que ora solicito.

O estado de direito democrático postula uma ordem jurídico-política caracterizada por um conjunto de regras e princípios concretizadores dos fundamentos, legitimação e actuação do poder político, em que sobressai a ideia da sujeição do poder ao direito e ao respeito pela vontade popular, apelando à participação dos cidadãos, como um direito e um dever de cidadania.

Assim, no quadro de um Estado de direito democrático — comum a todos os países da União Europeia — os serviços de informações encontram a sua legitimidade no ponto de equilíbrio, que reconheço ser difícil de alcançar, mas que é possível, entre a salvaguarda dos valores colectivos da segurança interna e externa e o respeito mais absoluto pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Daí que, para além da definição concreta da natureza dos serviços de informações e das suas atribuições e estrutura orgânica, devam ser claros os objectivos, os métodos e as missões dos serviços, sempre subordinados a um rigoroso e efectivo controlo democrático, quer do

ponto de vista da natureza e qualidade das informações, quer dos métodos utilizados para as obter, quer ainda dos resultados operacionais conseguidos, factor permanente de legitimação da sua actividade face à Constituição e à lei. Controlo esse que, sem prejuízo da eficácia dos serviços, assegure permanentemente:

A sua subordinação exclusiva à prossecução do interesse público de salvaguarda da independência nacional e de garantia da segurança interna;

O respeito mais absoluto pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, consignados na Constituição e na lei, que, aliás, constitui um limite estrito às actividades dos referidos serviços de informações.

É no contexto destes parâmetros reflexivos que considero ser manifestamente insuficiente o complexo de competências atribuídas ao conselho de fiscalização, que, a meu ver, não assegura a indispensável autonomia na gestão e utilização dos meios imprescindíveis à sua actividade fiscalizadora nem a independência de acção, num quadro legal preestabelecido, face aos órgãos do poder político.

Acompanhei com atenção e muito interesse o debate sobre o sistema de informações em democracia que teve recentemente lugar na Assembleia da República.

Partilho a opinião, bem expressa nesse debate, de que as mudanças ocorridas no mundo nos últimos anos provocaram, nos Estados de direito, a redefinição das suas políticas de informação, com o consequente reexame do papel dos respectivos serviços e dos meios necessários à correcta fiscalização destes para que da sua acção não resultem abusos.

Creio que em Portugal — 10 anos passados sobre a entrada em vigor da Lei n.° 10/84 — esta necessidade foi apreendida e interiorizada pelos cidadãos, que exigem que os seus direitos sejam respeitados pelos poderes políticos. Apercebi-me desta preocupação através das variadas queixas, petições e preocupações que regularmente me têm chegado, muito particularmente após a demissão dos membros eleitos para o conselho de fiscalização. Devo transmiti-la, com clareza, à Assembleia da República para que os Srs. Deputados a ponderem, se entenderem em consciência dever fazê-lo.

Partilho também a opinião, que julgo ser a da maioria dos Deputados, sobre a oportunidade e a importância deste debate, no plano dos princípios, que não está esgotado, que preocupa vastos sectores da opinião púbJica e que é muito importante para o futuro da nossa democracia. Daí a razão de ser desta mensagem, que representa uma manifestação de esperança no labor ponderado dos Srs. Deputados, que julgo poderão encontrar soluções legislativas aperfeiçoadas que compatibilizem, tranquilizem e dêem satisfação aos dois objectivos acima enunciados: salvaguarda da independência nacional e da segurança interna, e o respeito mais absoluto pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, tais como estão consignados na Constituição da República.

Lisboa, 26 de Dezembro de 1994. — Mário Soares.