O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

0439 | II Série A - Número 020 | 05 de Fevereiro de 2000

 

novo - e excepcional - quadro legal para permitir o acesso de não juizes à função de julgar em tribunais de 1.ª instância.
Assim, o Governo pretende que, através de concurso público, e nos termos de Regulamento a aprovar por decreto-lei, a nomeação de licenciados em direito de comprovada idoneidade, competência e experiência profissionais, seja precedida de selecção através de avaliação curricular e prestação de provas públicas. Estas nomeações, de acordo ainda com a proposta de lei, são feitas a termo certo, por um período de tempo não superior a três anos.
As nomeações em causa são ainda feitas, preferencialmente, para o exercício de funções de juiz auxiliar ou em regime de substituição.

III - Análise da proposta de lei

É por demais conhecida a situação existente em muitos dos tribunais portugueses.
O progressivo aumento do recurso à via judicial para resolução de conflitos com aumentos exponenciais que se acentuaram sobretudo na última década - a carência de funcionários judiciais, os atrasos registados na completa informatização do sistema, a excessiva formalização dos processos, a reconhecida falta de condições em que funcionam muitos dos tribunais (sem prejuízo do reconhecimento do esforço que tem vindo a ser feito na última década para superar estas insuficiências) e a proliferação de conflitos de competência são algumas das razões que explicam a situação actual.
Para além destas razões, alguns acrescentam as consequências decorrentes do regime de notificações, dos atrasos registados nos exames periciais, as ainda incipientes possibilidades de recurso ao sistema de arbitragem, mediação e conciliação, os bloqueios nas execuções e a carência de magistrados.
Seja qual for o peso específico que se queira atribuir a todas e cada uma destas razões, é certo que todas elas concorrem - a par de outras não enumeradas - para agravar as dúvidas e desconfianças de muitos cidadãos em relação ao sistema de justiça.
As medidas agora propostas pelo Governo pretendem abrir novas possibilidades de resolução do problema da carência de juizes tendo sobretudo em atenção a necessidade de fazer reduzir as pendências existentes e "normalizar" no mais curto espaço de tempo todo o sistema.
Não pondo em causa a bondade dos propósitos, importa avaliar se estas propostas - com justificação de circunstância, pontual - são verdadeiras soluções e se estão ajustadas aos normativos constitucionais.
Recorde-se que, nos termos dos artigos 215.º e seguintes da Constituição da República Portuguesa, "os juizes dos tribunais judiciais formam um corpo único e regem-se por um só estatuto" e que, nos termos do disposto no artigo 216.º "os juizes são inamovíveis, não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei"
Ora, com esta proposta do Governo parece claro que, a ser aprovada, passaria a vigorar entre nós um sistema dual para os juizes; os que são "juizes de carreira" e os que, com o sistema proposto, podem aceder à função jurisdicional, ainda que a termo certo.
Por outro lado, julgo carecer de atenta ponderação avaliar que garantias de independência oferece o sistema proposto para recrutamento de juristas de mérito; desconhecendo-se o regulamento do concurso público e os critérios que determinarão a selecção, sempre restará a questão de saber se juizes nomeados a prazo têm todas as condições para julgar com independência e imparcialidade.
Importa reflectir para que da eventual aprovação das medidas propostas não venha a resultar para a magistratura efeitos de precarização de funções e vínculos, sabendo-se que a relevância social de que se reveste a função de julgar encontra fundamento na isenção, na independência, na imparcialidade e inamovibilidade dos juizes.
Estas e outras questões merecem atenta ponderação. A verdade é que as soluções propostas são pontuais, motivadas pelas circunstâncias, são soluções de recurso para um problema cuja gravidade não queremos ignorar.
Outras são as questões relativamente às restantes duas medidas propostas.
No que diz respeito à possibilidade de magistrados jubilados poderem ser recrutados para reforçar a capacidade do sistema eliminar as pendências, poderá ter um alcance muito limitado.
Já a possibilidade de encurtar o período de estágio aos magistrados nomeados para esta fase da sua formação suscita problemas melindrosos de administração - não devendo lesar parâmetros essenciais de competência - e exige prudente administração. Recorde-se que, no ano transacto, foram aprovadas novas regras para o ingresso no Centro de Estudos Judiciários, impondo um intervalo de dois anos entre o fim da licenciatura e o início da formação para magistrado, dando indicação prospectiva de sinal diverso.
Com esta medida, pretendia-se combater aquilo que muitos designam como a excessiva juventude de muitos dos magistrados que concluem a sua formação no Centro de Estudos Judiciários.
Todas estas questões, pela sua importância, devem estar bem presentes no momento da decisão do legislador e a justa ponderação que delas se fizer - não esquecendo as dificuldades actuais do sistema - podem minimizar riscos e consequências que importa prevenir.

Parecer

A proposta de lei n.º 13/VIII reúne as condições constitucionais e regimentais para discussão na generalidade em Plenário.

Assembleia da República, 2 de Fevereiro de 2000. - O Deputado Relator, Miguel Macedo - O Presidente da Comissão, Jorge Lacão.

Nota. - O relatório e o parecer foram aprovados por unanimidade (PS, PSD, PCP e BE).

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual