0009 | II Série A - Número 076S | 18 de Julho de 2001
como foi dito, o alargamento do quadro das pretensões que podem ser accionadas e das providências que podem ser outorgadas no âmbito do contencioso administrativo conduza a uma multiplicação das formas de processo.
Neste quadro de ideias se compreendem as opções em que assenta a estrutura do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Na verdade, elas partem do entendimento de que, sem prejuízo de excepções de âmbito circunscrito ou da introdução de uma ou outra particularidade em certos domínios, os processos do contencioso administrativo devem seguir uma de duas tramitações principais:
1 - A tramitação que se optou por qualificar como "comum" e que, remetendo para o modelo do processo civil de declaração, corresponde basicamente à que é tradicionalmente seguida no clássico contencioso das acções. Embora a tradição do nosso contencioso administrativo seja a de remeter, no contencioso das acções sobre contratos e responsabilidade, para o processo civil de declaração na forma ordinária, a remissão passa, contudo, a ser feita também para a forma sumária e para a forma sumaríssima, em função do valor da causa.
2 - A tramitação que se entendeu qualificar como "especial", por contraposição à primeira, por obedecer a um modelo específico, próprio do contencioso administrativo, e que, embora com diversas adaptações que o aproximam da forma de processo "comum", resulta da fusão das duas formas de tramitação do recurso contencioso de anulação.
Nesta perspectiva se desenvolve o Código ao longo de um Título II, que se refere à "acção administrativa comum", sem reger a respectiva tramitação, que remete para o Código de Processo Civil, e de um Título III, que regula a "acção administrativa especial", disciplinando a respectiva tramitação no seu Capítulo III; ao que se segue, ainda quanto aos processos principais, o regime dos processos urgentes, estabelecido no Título IV.
Adoptado, pois, o critério das formas de processo como parâmetro estrutural, é a propósito de cada forma de processo que se faz referência aos tipos de pretensões que podem ser accionadas no contencioso administrativo, regulando os aspectos específicos que a respeito de cada um deles cumpre definir. Nesta perspectiva se deve entender a referência que às pretensões accionáveis é feita, sobretudo no Capítulo II do Título III do Código (artigo 50.º e seguintes). Como claramente resulta do disposto nos artigos 46.º e 47.º, não se trata aí de instituir pretensos meios processuais, autónomos e entre si separados de modo estanque, mas apenas de estabelecer um conjunto de regras particulares, próprias à accionabilidade de cada um dos tipos de pretensões aí previstos - no óbvio pressuposto de que todas elas são accionadas pela forma da acção administrativa especial e que, quando tal seja possível e se justifique, elas podem mesmo ser cumuladas entre si, tal como podem ser cumuladas com outras pretensões, às quais, se isoladamente formuladas, corresponderia a forma da acção administrativa comum.
8 - Na delimitação do âmbito de aplicação de cada uma das duas referidas formas de processo, o Código subscreveu a proposta formulada no estudo da Accenture, SA, de acordo com a qual deveria ser adoptada uma matriz dualista que tivesse como pilares uma acção administrativa comum e um recurso contencioso de âmbito alargado. Independentemente dos reparos que a expressão recurso contencioso vinha merecendo na doutrina, o abandono dessa designação foi, entretanto, determinado pelo facto de a forma de processo que sucede à do recurso contencioso não se destinar apenas a regular a tramitação de processos impugnatórios (de actos administrativos e de normas), mas também a tramitação de processos dirigidos à prática de actos administrativos ou à emissão de normas devidas - para além de que, em qualquer destes processos, passam a poder ser cumuladas pretensões de outro tipo, designadamente indemnizatórias.
Dentro dessa matriz dualista, a acção administrativa comum caracteriza-se por admitir a dedução genérica de pedidos de condenação, de mera apreciação e constitutivos, sempre que não tenha sido emitido nem se pretenda a emissão de um acto administrativo ou de uma norma.
Tal como já sucedia com o regime das acções sobre contratos administrativos e responsabilidade, também o regime proposto a este respeito não contém muitas particularidades a propósito de cada um dos tipos de pretensões que podem ser deduzidas pela via da acção administrativa comum. Dá-se, em todo o caso, resposta à necessidade, de há muito sentida, de alargar o âmbito da legitimidade activa nas acções sobre contratos, para além das partes na relação contratual. Como os contratos em causa se inserem, designadamente no que diz respeito ao procedimento pré-contratual, num contexto regido por disposições e princípios de direito administrativo, impostos no interesse público e de terceiros, e o respeito por tais normas é sindicável pelo Ministério Público e pelos eventuais interessados, justifica-se que estes possam fazer valer as invalidades de que o contrato possa enfermar por força da violação de tais normas. Por outro lado, também a execução dos contratos pode ser do interesse público ou de terceiros. O alargamento da legitimidade parece aconselhar, entretanto, a imposição de um prazo para a dedução do pedido de anulação dos contratos.
9 - A acção administrativa especial caracteriza-se pelo facto de se reportar à prática ou omissão de actos administrativos ou de normas.
É da tradição do contencioso administrativo o especial cuidado colocado na regulação dos pressupostos respeitantes à impugnação de actos administrativos, pretensão cujo regime exige, na verdade, maior número de precisões. Mas também as outras pretensões cuja tramitação segue os termos da acção administrativa especial, precisamente por envolverem o exercício de poderes de autoridade, apresentam particularidades que justificam alguma atenção do legislador. Daí a extensão do Capítulo II do Título III, respeitante às disposições particulares a cada uma das pretensões que podem ser deduzidas pela via da acção administrativa especial. Daí também, em parte, a explicação para o facto de, sem prejuízo de uma disposição genérica sobre o tema, contida na Parte Geral, nesta sede se incluirem novas disposições em matéria de legitimidade: justifica-o o amplo número de particularidades e precisões que, a serem todas incluídas num único preceito da Parte Geral sobre legitimidade, tornariam esse preceito demasiado pesado.
Não se quis, por outro lado, ignorar o facto de, tradicionalmente, os diferentes aspectos respeitantes a cada tipo de pretensão accionável no contencioso administrativo (objecto da pretensão, legitimidade, prazos e, até, competência territorial do tribunal) serem regulados em separado - nessa linha ainda se filiavam, aliás, os anteprojectos que foram submetidos a discussão pública durante o ano 2000. Também por este motivo se considerou aconselhável congregar em diferentes secções, respeitantes a cada um dos tipos de