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8 | II Série A - Número: 116 | 30 de Março de 2011

PROJECTO DE LEI N.º 577/XI (2.ª) CONSAGRA A CATIVAÇÃO PÚBLICA DAS MAIS-VALIAS URBANÍSTICAS, PREVENINDO A CORRUPÇÃO E O ABUSO DO PODER

Exposição de motivos

O presente projecto de lei responde a uma constatação: uma das fontes da corrupção em Portugal tem sido a captação, sobretudo por intermediários e especuladores, das mais-valias urbanísticas resultantes de decisões administrativas com grandes impactos no valor da propriedade imobiliária ou nos direitos de construção.
Por isso, não trata o presente projecto de lei do direito à propriedade mas, sim, do combate preventivo contra a corrupção, o favorecimento e o abuso de poder. Este é o campo onde tem fermentado a tentativa de aliciamento tanto de autarcas como de técnicos para que facilitem a aprovação de loteamentos e planos de pormenor, ou de aliciamento de autarcas para a reclassificação de terrenos, subjugando o interesse público à vantagem de enriquecimento rápido. A realização de mais-valias urbanísticas, que chegam a atingir valores excepcionais, não corresponde a um investimento que lhe confira qualquer legitimidade, uma vez que não têm utilidade pública do ponto de vista da reprodução de desenvolvimento. E o interesse público só muito parcialmente beneficia de um acto que resulta na sua totalidade da acção administrativa e da decisão política.
Sem prejuízo da necessidade de melhorar uma política de solos que clarifique o nível de direitos e deveres dos cidadãos em geral, dos proprietários dos solos em particular, bem como as responsabilidades do Estado nos diferentes níveis da Administração Pública, mostra-se urgente definir a responsabilidade dos proprietários, como uma forma de evitar e combater o abuso de poder e diminuir os riscos de corrupção dos decisores políticos.
O artigo 1305.º do Código Civil, tratando do direito de propriedade, define o seu conteúdo nestes termos: «O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos do uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas.». Compete, portanto, à lei a definição desses limites.
Na sequência deste articulado do Código Civil, a Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, com as alterações da Lei n.º 54/2007, de 31 de Agosto, que estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo, vincula, no seu artigo 16.º, os particulares às determinações dos planos municipais e especiais de ordenamento do território, no que diz respeito às restrições impostas pela classificação e qualificação dos solos. Este tem demonstrado ser um horizonte excessivamente limitado.
Pretende o presente projecto de lei estabelecer que as mais-valias urbanísticas geradas por actos administrativos da exclusiva competência da Administração Pública e da execução de obras públicas que resultem total ou parcialmente de investimento público, consequência de decisões político-administrativas, devem ser cativadas para o património público. Estas mais-valias resultam da intervenção pública, sendo assim de toda a justiça que o seu valor reverta para o Estado.
Nos nossos dias o urbanismo tem vindo a ser relegado para um estatuto de mero potenciador da valorização da propriedade e, consequentemente, determinante de estratégias de enriquecimento, particularmente por parte de promotores imobiliários.
A natureza especulativa de parte deste segmento de actividade económica está na origem do profundo caos urbanístico que impera na maioria dos nossos municípios. Daqui até ao favorecimento inexplicável de projectos de grande impacto negativo para o equilíbrio urbano decorre um passo que tem dado lugar a situações de contornos ilícitos.
Assim a proposta do Bloco de Esquerda tem a virtualidade de prevenir a ocorrência de actos de abuso de poder, de favorecimento e de corrupção dos decisores. Defender o interesse público e proteger os autarcas e técnicos de urbanismo deste tipo de pressões revela-se hoje uma medida de extrema necessidade.
Esta mesma necessidade foi expressa pelas conclusões do 11.º Congresso da Ordem dos Arquitectos, que reconheceu que os casos de corrupção urbanística recorrentemente identificados em Portugal precisam de ser combatidos e que a forma de conduzir este combate passa necessariamente por cativar para o Estado as mais-valias urbanísticas, à luz do que já acontece em outros países europeus.