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46 | II Série A - Número: 071 | 21 de Fevereiro de 2014

escrita que foram entretanto desconsideradas, por posterior desvinculação, por parte do Brasil. A política da Língua não pode estar sujeita a um balanço entre as dimensões das comunidades falantes, nem a uma comparação da importância dos mercados livreiros de cada país. Pelo contrário, deve partir do princípio da igualdade entre os países, na partilha desse valiosíssimo património comum que é a Língua Portuguesa. Tal concertação implica uma ponderação democrática, caso persista o objetivo de uniformizar as “regras da escrita” ou mesmo a “forma das palavras”.
É indiscutível que a aplicação do AO90 tem originado um conjunto de reações muito vincadas, em diferentes sectores da sociedade, com diferentes expressões. O Grupo de Trabalho para o Acompanhamento da Aplicação do Acordo Ortográfico, criado na Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura por proposta do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, tem constatado precisamente isso.
Independentemente do balanço entre as opiniões “contra” ou “a favor” do AO90, é inegável a insuficiência da maturidade e da democraticidade de todos os processos que conduziram ao atual AO90 e à forma como tem vindo a ser aplicado.
O período de transição que estabelece uma aplicação faseada da norma do AO90 tem vindo a cumprir o papel que um verdadeiro período de transição deve cumprir: tem permitido uma avaliação dos reais impactos, das insuficiências, das vantagens e desvantagens políticas, mas também da recetividade pública da nova norma. A participação da comunidade académica, muito além da Linguística, a participação da comunidade artística literária e de todos quantos fazem da Língua Portuguesa a sua ferramenta de trabalho e de criação, e a estabilização de um Vocabulário Ortográfico Comum devem acompanhar a elaboração de um Acordo Ortográfico.
Ora, tal não sucedeu em Portugal. Na verdade, o AO90 foi preparado em contextos alheios à população, distantes da comunidade académica, sem acolher grande parte dos contributos que eram produzidos por sectores vários da sociedade. Não existe, da parte do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, nenhuma conceção fixista ou conservadora em torno da ortografia, mas existe sim uma valorização da participação política e científica, uma valorização da robustez técnica da norma escrita e, simultaneamente, uma valorização da inteligibilidade e democraticidade, da escrita e da oralidade. Sendo a Língua, incluindo a etimologia, um importante instrumento do raciocínio, do pensamento humano, a sua preservação, promoção e defesa, são objetivos fundamentais da política da Língua, sem prejuízo da sua dimensão internacional.
A própria Academia de Ciências de Lisboa, órgão de consulta do Governo em matéria do AO90, admitiu apenas ter sido ouvida no início do processo, não tendo sequer sido envolvida de qualquer forma na ratificação. Aliás, lê-se na acta da audição concedida pelo Grupo de Trabalho: “O Vice-Presidente da Academia das Ciências realçou que a língua é um organismo vivo. Referiu depois que a Academia tinha concordado com o Acordo há mais de 20 anos, mas havia necessidade de desenvolver trabalhos de aplicação, não tendo havido sequência. Salientou que a Academia entende que o Acordo é científico. Por último, informou que em 20072008 o Ministro da Cultura decidiu pôr o Acordo em vigor sem consultar os académicos, tendo havido uma decisão política e realçou que não tem havido comunicação.” O período de transição permite pois que sejam ponderados todos os aspetos e dimensões do AO90 e das alterações que introduz, bem como da sua razoabilidade. Importa compreender igualmente se a unificação da “regra da escrita” apresenta virtudes que são geralmente associadas ao que o AO90 não faz (unificação da “forma de todas as palavras”). Importa compreender em que medida a convergência ortográfica promove a sintaxe portuguesa ou outra estrangeira, sem nenhuma perspectiva nacionalista, mas com uma perspetiva de mera valorização de uma linguagem que está intimamente ligada à História de cada povo, à sua evolução e à sua arte. A intrusão de formas de construção frásica estranhas a pretexto de uma inexistente ortografia comum poderia representar um retrocesso na afirmação da Língua Portuguesa e não uma consolidação internacional da Língua.
Um eventual Acordo Ortográfico deve ser aceite com empenho por todos os falantes, porque a Língua não pode ser imposta por decreto. Pelo contrário, o decreto deve reflectir a natural evolução da Língua. Por isso mesmo, a redação de um Acordo Ortográfico deve convocar os contributos de todos e avançar apenas na condição de ser plenamente subscrito por todas as comunidades falantes, e de ser amplamente aceite por quem fala e escreve o Português. A construção de uma proposta de Vocabulário Ortográfico Comum, a participação de todos e a concertação diplomática dos interesses dos vários países e povos, sem que se