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II SÉRIE-A — NÚMERO 60 32

Todo este processo do Novo Banco deve convocar-nos para um debate que se desdobra em vários pontos.

Em primeiro lugar, é legítimo e necessário questionar o comportamento das instituições que conduziram a

resolução do BES, nomeadamente do Banco de Portugal. É incompreensível que, dois anos depois da

resolução, ainda existam perdas desta dimensão por reconhecer no balanço do Novo Banco.

Em segundo lugar, o caso do Novo Banco, bem como o do Banif depois dele, é exemplificativo da completa

desadequação da legislação existente para lidar com crises bancárias. Na prática, as novas regras,

determinadas a nível europeu, retiram poderes de decisão aos órgãos de soberania nacionais, entregando-os a

instituições europeias, alheias a todos os requisitos mínimos de escrutínio e transparência. Acresce a isto que,

apesar das decisões serem tomadas na esfera do BCE ou da Comissão Europeia, as suas consequências –

quer para as contas públicas como para a estabilidade do sistema financeiro – são sempre assumidas a nível

nacional.

A realidade já provou que as instituições europeias se movem mais por dogma ideológico em torno de uma

ideia artificial de concorrência que redunda, na prática, em processos de concentração bancária, do que em

defesa do interesse nacional. É precisamente essa a razão que deve motivar o Governo português a não ceder

a qualquer tipo de pressão ou chantagem na condução do processo do Novo Banco. A solução encontrada deve

responder ao interesse do país, aos seus objetivos de estabilidade económica e financeira, independentemente

da intransigência das instituições Europeias a este respeito.

Duas outras questões devem ser analisadas no contexto do debate sobre o Novo Banco. A primeira diz

respeito à nacionalidade do sistema bancário português e a segunda à natureza da sua propriedade.

Em 2015, os cinco maiores bancos do país detinham 84% de todos os ativos bancários. Nesse grupo há dois

bancos portugueses – a Caixa Geral de Depósitos e o Novo Banco – e três bancos estrangeiros, repartidos entre

capitais angolanos, chineses e espanhóis. Se o Novo Banco for vendido, praticamente 70% da banca portuguesa

relevante ficará em mãos estrangeiras.

A nacionalidade dos bancos que compõem o sistema bancário português não é indiferente. Entre várias

razões porque, em momentos de instabilidade financeira, os bancos estrangeiros são os primeiros a reduzir a

sua atividade, ou mesmo abandonar o país. A fragilidade do vínculo destas instituições ao território onde se

inserem acarreta ainda outras consequências, como a dificuldade do seu escrutínio, como bem pudemos

comprovar nas várias Comissões de Inquérito a falências bancárias.

Esta não é a primeira vez que o país discute a importância dos centros de decisão nacionais, e se há coisa

que a história provou é que só a propriedade pública garante o controlo dos setores estratégicos a partir de

Portugal.

Neste contexto, a pior opção possível seria, não apenas a venda do Novo Banco a capitais estrangeiros, mas

a fundos de investimento abutres, como é o caso da Apollo, da Lone Star ou da Fosun. O país já conhece o

modus operandi destes compradores. O que pretendem é desmembrar o Novo Banco, executar as empresas

devedoras, e apropriar-se das avultadas garantias estatais concedidas. Isto sem mencionar as consequências

para os trabalhadores do Novo Banco, já tão castigados com este processo.

Se duvidas houvesse, temos bem presente o caso da privatização da Fidelidade, lucrativa seguradora do

Grupo Caixa Geral de Depósitos, vendida pelo Governo de Passos Coelho à Fosun. Depois de se endividar para

fazer a operação de compra, a Fosun usou os recursos da própria Fidelidade para se pagar a si mesma.

Mas regressemos ao caso do Novo Banco. A possibilidade que está em cima da mesa não é apenas a da

venda a um fundo abutre, mas a venda com prejuízo para o Estado como, aliás, aconteceu no caso Banif.

Esta opção é inaceitável. O Estado não pode pagar para vender o terceiro maior banco do sistema bancário

português. Uma vez que os fundos utilizados para injetar no Novo Banco são, de facto, públicos, também a sua

propriedade o deve ser.

É assim, com base nos argumentos acima apresentados, que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda

defende a formalização da nacionalização do Novo Banco, SA. Esta opção é a única que permite, não apenas

a nacionalidade portuguesa do capital desta importante instituição, mas também o seu controlo público e

democrático. Só este controlo pode garantir (embora não seja condição suficiente) que o sistema bancário

português é direcionado para o apoio à economia, e não para atividades especulativas ou de mera obtenção de

lucros no curto prazo.

O nosso passado recente prova-nos que a banca é demasiado importante para estar nas mãos de banqueiros

privados. Uma vez invocado o caráter de excecionalidade do setor bancário para justificar as sucessivas