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II SÉRIE-A — NÚMERO 121

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Vários médicos e psicólogos têm admitido publicamente possíveis diagnósticos errados e prescrições

indevidas. O neuropediatra Nuno Lobo Antunes admite receber muitas crianças «medicadas de forma errada

para o problema errado». A pedopsiquiatra Ana Vasconcelos refere estar «preocupadíssima com essa

tendência, que já é muito expressiva em Portugal. Qualquer dia as crianças são como robôs medicados». Álvaro

Carvalho, ex-diretor do programa nacional para a saúde mental da Direção-Geral da Saúde, reconheceu também

«há a presunção de que há um tratamento excessivo de crianças com medicamentos como a ritalina».2

Adicionalmente, é importante acrescentar que, em audições, realizadas em grupo de trabalho na Assembleia da

República para discussão deste tema, onde foram ouvidos o Colégio de Especialidade de Pediatria, o Colégio

de Especialidade de Psiquiatria da Infância e da Adolescência e o Colégio de Sub Especialidade de

Neuropediatria, todos da Ordem dos Médicos, foi manifestada a preocupação da utilização de estimulantes em

crianças, tendo sido admitida também a possibilidade de existência de sobrediagnóstico de PHDA.3

A perceção atual da sociedade sobre este tema é a de que existe excessiva medicalização das crianças,

tendo sido já mencionado por especialistas, nomeadamente nas audições acima mencionadas, que

aparentemente esta é provocada pela pressão exercida pela escola e pelos pais sobre os médicos. Existindo

uma preocupação crescente dos alunos e dos pais na obtenção de melhores resultados escolares, tal tem como

consequência o facto de, nos casos em que estes não conseguem ter um bom desempenho, pressionam os

médicos para o alcançar, levando estes a prescrever metilfenidato, mesmo quando não possuem a

especialidade adequada para efetuar um diagnóstico inequívoco.

O Programa Nacional para a Saúde Mental 2017, da Direção-Geral da Saúde (DGS), refere que «O Sistema

Nervoso Central tem um amadurecimento lento e complexo que estará concluído pelos 18 anos, o que justifica

a recomendação de evitar a utilização de substâncias psicoativas até então», alertando para que «tendo em

conta os riscos associados ao consumo das substâncias psicotrópicas, medicamentos ou não, sobretudo

durante a infância e adolescência, mantem-se a recomendação internacional quanto às limitações ao seu uso

comum, quer em menores de idade quer em grávidas e mulheres a amamentar». Após identificar os dados

relativos ao consumo, que demonstram que em 2016 foram consumidas 7 570 163 doses, este relatório

menciona que «Quando se verificam os resultados abaixo e que em todos os grupos etários a maioria acedeu

a psicofármacos através de prescrição médica, é inevitável questionar sobre a racionalidade da prescrição

destes fármacos.»

Ora, este relatório expressa as nossas preocupações. Sabemos que o diagnóstico de Perturbação de

Hiperatividade com Défice de Atenção é complexo. Este é realizado frequentemente com recurso às escalas de

avaliação de Conners, que apresenta itens como «Desatento, distrai-se facilmente», «Está sempre a

movimentar-se ou age como ‘tendo as pilhas carregadas’ ou como se ‘estivesse ligado(a) a um motor’»; «Mexe

muito os pés e as mãos e mexe-se ainda que sentado(a) no lugar»; «Só presta atenção quando é uma coisa

que lhe interessa»; «Irrequieto(a), ‘tem bichos carpinteiros’ (mexe o corpo sem sair do lugar)». Os itens referidos

anteriormente demonstram a subjetividade na avaliação das crianças e jovens, visto que assentam nas

perceções que os pais e professores têm em relação ao comportamento dos mesmos, e não numa avaliação

real destes comportamentos. Contudo, não podemos esquecer que estão em causa medicamentos

estupefacientes ou psicotrópicos prescritos a crianças, sendo por isso essencial garantir, tendo por base os

alertas constantes do relatório acima mencionado, que o diagnóstico é inequívoco e realizado por médico

especialista na área.

Tal necessidade justifica uma intervenção Estadual nesta matéria. Recorde-se que esta situação não é

inédita, tendo já existido situações em que o Governo restringiu a possibilidade de prescrever medicamentos a

determinados especialistas, para efeitos de comparticipação do mesmo. A título de exemplo, o Despacho n.º

13020/2011, de 20 de setembro, que consolida a disciplina que rege o regime especial de comparticipação dos

medicamentos prescritos a doentes com doença de Alzheimer ou demência de Alzheimer, estabelece que os

medicamentos destinados ao tratamento da doença de Alzheimer são comparticipados pelo escalão C, apenas

quando prescritos por médicos neurologistas ou psiquiatras, devendo o médico prescritor fazer na receita

menção expressa do referido despacho.

É inegável a importância de medicamentos que contêm metilfenidato e atomextina para crianças

diagnosticadas com Perturbação de Hiperatividade com Défice de Atenção, contribuindo significativamente para

a melhoria da vida destas crianças. Contudo, tendo em conta o facto de estarmos a falar da prescrição de

2 Cfr https://www.dn.pt/portugal/interior/criancas-tomam-antipsicoticos-a-mais-e-podem-tornarse-robos-medicados-4928000.html. 3 Cfr. http://www.canal.parlamento.pt/?cid=3700&title=audicao-conjunta.

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