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II SÉRIE-A — NÚMERO 167

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igualmente, que «estão a surgir cada vez mais relatos da violência a que as mulheres são sujeitas em instalações

e em atos médicos de prestação de cuidados antes, durante e depois do parto, bem como casos generalizados

de violência ginecológica e obstétrica, que têm de ser combatidos», pelo que «exorta os Estados‑Membros a

envidarem todos os esforços possíveis para garantir o respeito dos direitos das mulheres e da sua dignidade no

parto, a condenarem veementemente e a combaterem a violência física e os abusos verbais, incluindo a

violência ginecológica e obstétrica, e qualquer tipo de violência com base no género associada aos cuidados

pré‑natais, parto e pós‑natais, fatores que violam os direitos humanos das mulheres e podem constituir formas

de violência com base no género».

A pronúncia de diversas organizações internacionais sobre esta matéria demonstra a existência de uma

preocupação crescente, motivada pelo aumento de denúncias, mas também que existe um compromisso global

no combate a esta forma de violência.

Sabemos que há países que, há vários anos, debatem este tema, nomeadamente os países da América

Latina, mas também existem países que iniciaram este debate recentemente, que é o caso de Portugal.

A título de exemplo, a Venezuela criminalizou a violência obstétrica, com a Lei n.º 38 668, de 23 de abril de

2007, denominada «Ley Orgánica sobre ele derecho de las mujeres a una vida libre de violência». 14

Na Argentina, a Lei 26 485, de março de 2009, denominada «Ley de protección integral para prevenir,

sancionar y erradicar la violencia contra las mujeres en los ámbitos en que desarrollen sus relaciones

interpersonales»15, reconhece a violência obstétrica no seu artigo 6.º

Na Colômbia foi também já apresentado um projeto de lei que visa prevenir e sancionar a violência

obstétrica.16

No que diz respeito à Europa, onde esta discussão começou mais recentemente, importa mencionar que em

Itália foi já apresentado um projeto de lei que visa a criminalização da violência obstétrica denominado «Norme

per la tutela dei diritti della partoriente e del neonato e per la promozione del parto fisiologico».17 Sabemos,

também, que Espanha e França já iniciaram o debate para incluir a violência obstétrica na legislação.

Em Portugal, a violência obstétrica, por si só, não é considerada crime. No entanto, a verdade é que alguns

dos atos considerados como violência obstétrica podem enquadrar-se noutros tipos de crime já previstos como

por exemplo ofensas à integridade física, intervenções médico-cirúrgicas arbitrárias (sem consentimento livre e

esclarecido), mutilação genital feminina, recusa de médico (não há assistência ou há assistência tardia), devassa

da intimidade/vida privada, violação do segredo médico, injúria, ameaça e coação.

Em consequência, o que acontece na prática é que, em situações de violência obstétrica, as mulheres têm

apresentado queixa com fundamento noutros crimes já previstos. Contudo, consideramos que o facto de não

existir uma previsão legal expressa, pode levar as mulheres a não denunciarem estes casos por pensarem que

as condutas de que foram vítimas não são suscetíveis de configurar um crime e, por outro lado, não se verifica

o juízo de censurabilidade necessário para esta prática em específico. A violência obstétrica tem particularidades

que justificam a sua autonomização enquanto crime, não se confundindo com outras previsões legais.

Ora, apesar de não existir esta previsão, a verdade é que o legislador deu já um sinal no sentido da

erradicação da violência obstétrica em Portugal, com a aprovação da Lei n.º 110/2019, de 9 de setembro.

Depois, é importante ter em conta que estão em causa situações de enorme gravidade e censurabilidade.

Em entrevista aos órgãos de Comunicação Social18, Isabel Valente, em representação da Associação

Portuguesa dos Direitos da Mulher na Gravidez e Parto, revela alguns exemplos destes abusos que ocorrem no

nosso país, os quais consideramos importante mencionar.

Estão em causa situações em que «a mulher é obrigada, pela força, a assumir uma determinada posição

durante o parto, e lhe é restringido o movimento contra a sua vontade»; de «humilhações verbais, insultos,

culpabilização por o decurso do parto estar a ser 'longo' ou a mulher 'estar a gritar', ou supostamente 'não estar

a colaborar'»; «coerção ou manipulação emocional para que por exemplo a mulher aceite determinadas

intervenções alegando coisas como 'veja lá se quer matar o seu bebé'» ou «gritos, insultos, ignorar as

expressões de dor ou os pedidos para anestesia».

14 https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/BDL/2008/6604.pdf 15 http://servicios.infoleg.gob.ar/infolegInternet/anexos/150000-154999/152155/norma.htm 16http://190.26.211.102/proyectos/images/documentos/Textos%20Radicados/proyectos%20de%20ley/2017%20-%202018/PL%20147-17%20Violencia%20Obstetrica.pdf 17 https://www.camera.it/leg17/126?tab=2&leg=17&idDocumento=3670&sede=&tipo= 18 https://activa.sapo.pt/saude/2021-05-11-a-violencia-obstetrica-desconstruida-por-tres-especialistas/