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II SÉRIE-A — NÚMERO 191

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experiência do luto, que estimula os pais e mães a seguirem em frente, subvertendo na maioria das vezes os sentimentos de dor.

O atual ditame legal é, sem dúvida, insuficiente e violador dos mais elementares princípios que devem nortear o bem-estar físico e emocional dos/das trabalhadores/as em casos de luto parental. O atual regime não acompanha as políticas sociais e de emprego defendidas pelos estados democráticos, nem as recomendações das organizações internacionais em matéria de direitos sociais como o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que pugnam por melhores condições de trabalho, conciliação entre vida familiar e laboral, apoio à família, em defesa dos legítimos interesses das pessoas e do próprio direito fundamental à saúde, nomeadamente a saúde mental e emocional.

O setor empresarial já demonstrou sensibilidade neste domínio e tem tido flexibilidade para acolher iniciativas que visem o bem-estar dos seus trabalhadores.

Por outro lado, tem-se vindo a assistir a alterações legislativas com o intuito de aumentar o período de luto parental. São diversos os países europeus que já estabelecem um regime mais adequado à posição do/da trabalhador/a nestas situações.

A Irlanda consagra 20 dias para estes progenitores, a Dinamarca até 26 dias, o Reino Unido, duas semanas. Também países como a Áustria, a Bélgica, a Croácia, a Eslovénia, a França, os Países Baixos e a Suécia entendem que o alargamento do período de luto parental é uma medida mais justa e adequada para o/a trabalhador/a em casos de luto parental.

Mudar a lei nesta matéria é uma questão de humanismo, respeito, solidariedade e dignidade. A 1 de setembro de 2021, a Associação Acreditar (Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro)

lançou uma petição para alargar o período de luto parental para 20 dias, alertando para a difícil situação dos pais e mães que perdem as suas crianças depois de um processo de luta contra a doença pediátrica. A proposta para o alargamento do período do luto dos pais para 20 dias foi definida com a ajuda de profissionais e com a experiência junto dos pais e mães.

Esta campanha surge para assinalar o mês internacional de sensibilização para o cancro pediátrico. Além da petição pública existe um vídeo sob o mote «O luto de uma vida não cabe em 5 dias», alertando para o «duplo abandono» dos pais e mães em luto por parte da sociedade e do Estado.

Não podemos também negligenciar situações como a perda gestacional e neonatal, fenômenos bastante mais comuns do que se possa pensar.

Estima-se que a prevalência da perda gestacional seja de 15 a 20% das gestações clinicamente diagnosticadas, sendo a sua maior ocorrência, antes da 12.º semana gestacional.

A perda de um bebé durante a gestação ou logo após o seu nascimento representa um marco muito impactante na vida de um casal. Os pais têm de lidar com a perda real e simbólica do filho/a, mas também com o sentimento de fracasso com relação à proteção e ao cuidado em relação ao bebé. O vínculo entre uma mãe e um bebé inicia assim que esta toma conhecimento da gravidez, sendo fortalecido através de sensações, imaginação, planos e expectativas.

De acordo com alguns estudos efetuados neste âmbito, a mulher pode manifestar maior sentimento de culpa em relação à perda, por trazer o bebê no seu ventre. Por outro lado, o progenitor é muitas vezes sujeito a uma pressão social muito forte para esconder a sua dor, apoiar a mãe, não sendo reconhecido e validado socialmente o seu sofrimento emocional e direito ao luto.

O luto por essas perdas vem acompanhado da falta de espaço e tempo social para expressar a dor, sendo sentido como um «luto não reconhecido», apesar da sua enorme complexidade. Apesar de nem sempre ser devidamente reconhecido pela sociedade, é fundamental o reconhecimento e a validação social dessa perda, que não termina na urgência do hospital, mas se vai refletir na vida e futuro do casal e da família.

Por outro lado, os relatos de muitos progenitores revelam a existência de uma maior desvalorização das equipas de saúde e da própria sociedade quando estas perdas ocorrem antes das 12 semanas de gestação. Independentemente da condição de desenvolvimento gestacional, a violência emocional desta perda parental não pode ser subvalorizada nem ignorada.

A 24 de março de 2021, a Nova Zelândia aprovou uma licença remunerada de três dias para casais que sofreram de perda gestacional, demonstrando uma política de vanguarda nesta matéria. Esta licença foi concebida tanto para situações de aborto espontâneo, como para situações de gravidez de substituição e adoção.