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Quinta-feira, 28 de outubro de 2021 II Série-A — Número 27

XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)

S U M Á R I O

Decreto da Assembleia da República n.º 188/XIV: (a) Permite o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida através da inseminação com sémen após a morte do dador, nos casos de projetos parentais expressamente consentidos, alterando a Lei n.º 32/2006, de 26 de julho (procriação medicamente assistida). Resoluções: (a) — Deslocação do Presidente da República a Cabo Verde. — Deslocação do Presidente da República a Madrid. — Deslocação do Presidente da República a Málaga. Projetos de Lei (n.os 559 e 767/XIV/2.ª): N.º 559/XIV/2.ª — Garante o direito ao luto por falecimento de animal de companhia: — Alteração do título inicial e segunda alteração do texto

inicial do projeto de lei. N.º 767/XIV/2.ª — Altera o regime do luto parental e reconhece o direito ao luto em caso de perda gestacional: — Alteração do título e do texto iniciais do projeto de lei. Projeto de Resolução n.º 1495/XIV/3.ª (PAN): Pela proteção, dignidade e garantia dos direitos fundamentais de todas as pessoas que praticam a prostituição. Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª (Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. (a) Publicados em Suplemento.

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PROJETO DE LEI N.º 559/XIV/2.ª (*)

GARANTE O DIREITO AO LUTO POR FALECIMENTO DE ANIMAL DE COMPANHIA

Exposição de motivos

A legislação portuguesa não reconhece ao proprietário de animal de companhia registado no Sistema de

Informação de Animais de Companhia (SIAC) o direito a faltar ao trabalho por motivo de falecimento deste.

No entanto, sabemos que a perceção da sociedade em relação aos animais é hoje bastante diferente daquela

que era no passado. Os animais de companhia estão cada vez mais próximos, muitos deles passando a viver

nas nossas casas juntamente com as nossas famílias.

Segundo o estudo da GfK Track.2Pets, existiam em 2015, 6,3 milhões de animais de companhia nos lares

portugueses, o que significa que mais de metade das famílias portuguesas têm um animal.

Esta consultora, que entre 2011 e 2018 analisou a evolução dos comportamentos dos portugueses nesta

área, defende que o aumento dos lares com animais de companhia se deve à alteração dos núcleos familiares

e à noção, cada vez maior, de que estes contribuem para o bem-estar físico e psicológico dos detentores.

O estudo revela mesmo que, em 2016, mais de metade das famílias com cães consideravam o animal «um

membro da família» e quase um terço olhavam para o cão como «um amigo».

Importa, ainda, mencionar a Dissertação de Mestrado em Sociologia e Dinâmicas Sociais, sobre o tema «O

Fenómeno dos Animais de Estimação na Realidade Lisboeta», de Vanessa Martins1, na qual 12 dos 13

entrevistados mencionaram o animal enquanto elemento da família, verificando-se situações em que os

entrevistados identificaram o animal com um amigo e companheiro e, inclusive, como um filho.

Como bem refere o Acórdão da Relação do Porto, de 19/02/20152, «Constitui um dado civilizacional adquirido

nas sociedades europeias modernas o respeito pelos direitos dos animais. A aceitação de que os animais são

seres vivos carecidos de atenção, cuidados e protecção do homem, e não coisas de que o homem possa dispor

a seu bel-prazer, designadamente sujeitando-os a maus tratos ou a actos cruéis, tem implícito o reconhecimento

das vantagens da relação do homem com os animais de companhia, tanto para o homem como para os animais,

e subjacente a necessidade de um mínimo de tutela jurídica dessa relação, de que são exemplo a punição

criminal dos maus tratos a animais e o controle administrativo das condições em que esses animais são detidos.

Por conseguinte, a relação do homem com os seus animais de companhia possui hoje já um relevo à face

da ordem jurídica que não pode ser desprezado.»

Considerou ainda este Acórdão que devem ser incluídos «nos danos não patrimoniais sofridos por uma

pessoa o sofrimento e o desgosto que lhe causa a perda de um animal de companhia ao qual ganhou afeição,

que consigo partilha o dia-a-dia, que alimenta e cuida, que leva ao veterinário quando está doente ou precisa

de cuidados de saúde.»

De facto, o artigo 493.º-A do Código Civil estabelece que no caso da lesão de animal de companhia de que

tenha provindo a morte, a privação de importante órgão ou membro ou a afetação grave e permanente da sua

capacidade de locomoção, o seu proprietário tem direito a indemnização adequada pelo desgosto ou sofrimento

moral em que tenha incorrido, que deve ter em conta danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496.º do

Código Civil.

Tal constitui o reconhecimento de que a perda de animal de companhia comporta para o seu detentor um

enorme sofrimento.

Como bem refere Verónica Policarpo, socióloga e investigadora do Instituto de Ciências Sociais da

Universidade de Lisboa, a grande mudança está, sobretudo, na demonstração pública da afeição do detentor

pelo amigo de quatro patas. Para a socióloga – que faz parte de um centro de estudos multidisciplinares que

analisam as várias vertentes da relação entre os humanos e os animais, o Human-Animal Studies3 – há, «hoje

em dia, uma legitimidade social para recorrer aos animais como fonte de afectos». Ou seja, se a busca por este

1 Cfr. Martins, Vanessa, «O Fenómeno dos Animais de Estimação na Realidade Lisboeta», Dissertação de Mestrado em Sociologia e Dinâmicas Sociais, abril de 2018. 2 Disponível em: http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/3c0d5d98d088fab880257dfc00556bd1?OpenDocument&Highlight=0 3 Cfr. http://humananimalstudies.net/pt/

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afeto nos animais sempre existiu, atualmente «podemos dizê-lo sem vergonha».

E, acrescenta, «apesar de o luto por um animal ainda ser vivido de forma silenciosa», em termos de afetos

entre a perda de um animal e a perda de uma pessoa «as coisas estão muito mais niveladas do que parecem»,

considerando que «as pessoas sofrem mais com a morte de um cão do que com a morte de um parente que já

não viam há muitos anos, por exemplo».4

Para além disso, como bem refere Walsh5, a perda de um animal de companhia pode ser profunda e, tal

como acontece com outras perdas significativas, o luto pode ser intenso e o processo de luto pode levar tempo.

Mais de 85% das pessoas relatam sintomas de luto na morte de um animal de estimação e mais de um terço

têm um luto contínuo aos seis meses (Wrobel & Dye, 2003). Alguns experimentam o luto de forma tão dolorosa

como se se tratasse da perda de um membro da sua família (Toray, 2004).

Acrescenta, ainda, que muito frequentemente, o luto pela perda de um animal de estimação não é

reconhecido e é trivializado, o que complica o luto (Meyers, 2002; Werner-Lin & Moro, 2004) e que como a

sociedade tem subestimado o significado dos laços com animais de estimação e o impacto da perda de animais,

muitos sofrem silenciosamente e sozinhos, sentindo que os outros não compreendem ou mesmo menosprezam

a sua dor.

Não podemos esquecer, também, que os animais de estimação representam uma forma de combater o

isolamento, em particular na população mais idosa. De facto, o artigo de Walsh refere que mulheres viúvas no

período logo após a morte do marido sentiam-se melhor sozinhas com os seus cães do que na presença de

amigos e família. As viúvas justificavam este facto por terem partilhado o cão com o seu marido e principalmente

porque perante os seus cães não seria necessário esconder o que sentiam de verdade.

Estes estudos comprovam a existência de fortes laços de afeto que existem entre o animal e o seu detentor,

o qual não pode ser desconsiderado.

Sabemos que tem sido feito um importante caminho para conferir maior proteção aos animais de companhia.

De facto, o ordenamento jurídico português, atualmente, reconhece a senciência dos animais; prevê normas

especificas de proteção destes, regulando, inclusive, o direito de propriedade e obrigando o detentor a assegurar

o bem-estar do animal e criminaliza os maus-tratos contra animais. No entanto, apesar de reconhecer a dor

associada à perda do animal de companhia, ao determinar que em caso de morte de animal o seu detentor tem

direito a uma indemnização que inclui danos não patrimoniais, a verdade é que não se retiram daqui outras

consequências que seriam importantes, nomeadamente o direito ao luto pela sua perda.

Consideramos assim que apesar das recentes alterações que visam conferir maior proteção aos animais de

companhia e que demonstram uma mudança na forma como estes eram vistos pelo nosso ordenamento, a

verdade é que a legislação laboral não sofreu ainda, na nossa opinião, as modificações que seriam necessárias

para acompanhar a evolução do pensamento jurídico nesta matéria, nomeadamente a criação de um estatuto

jurídico próprio para os animais não humanos.

Face ao exposto, com o presente projeto, pretendemos garantir o direito ao luto por perda de animal de

companhia registado no Sistema de Informação de Animais de Companhia, atribuindo ao trabalhador um dia de

falta ao trabalho justificada pela sua perda.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua

redação atual, e a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho,

na sua redação atual, garantindo o direito ao luto por falecimento de animal de companhia registado no Sistema

de Informação de Animais de Companhia (SIAC).

4 Cfr. Leitão, Margarida de Menezes «Os animais de companhia e o arrendamento para habitação», 2020. 5 Cfr. Walsh (2009), Human-Animal Bonds II: The Role of Pets in Family Systems and Family Therapy.

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Artigo 2.º

Alteração ao Código do Trabalho

São alterados os artigos 249.º e 251.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro, e alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de

junho, 47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto,

28/2015, de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017,

de 16 de agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e Lei n.º

18/2021, de 8 de abril, os quais passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 249.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) A motivada por falecimento de cônjuge, parente ou afim, bem como de animal de companhia do

agregado familiarregistado no Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC), nos termos do

artigo 251.º;

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […].

3 – […].

Artigo 251.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) Até um dia, por falecimento de animal de companhia do agregado familiar registado no Sistema de

Informação de Animais de Companhia (SIAC).

2 – […].

3 – […].»

Artigo 3.º

Alteração à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas

É alterado o artigo 134.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de

20 de junho, e alterada pelas Leis n.os 82-B/2014, de 31 de dezembro, 84/2015, de 7 de agosto, 18/2016, de 20

de junho, 42/2016, de 28 de dezembro, 25/2017, de 30 de maio, 70/2017, de 14 de agosto, 73/2017, de 16 de

agosto, 49/2018, de 14 de agosto, 71/2018, de 31 de dezembro, Decreto-Lei n.º 6/2019, de 14 de janeiro, e Leis

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n.os 79/2019, de 2 de setembro, 82/2019, de 2 de setembro, e 2/2020, de 31 de março, o qual passa a ter a

seguinte redação:

Artigo 134.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) As motivadas por falecimento do cônjuge, parentes ou afins, bem como de animal de companhia do

agregado familiar registado no Sistema de Informação de Animais de Companhia (SIAC);

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […];

l) […];

m) […];

n) […].

3 – […].

4 – […]:

a) […];

b) […];

c) […].

5 – […].

6 – […].»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 8 de outubro de 2020.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

(*) O texto inicial foi substituído a pedido do autor em 16 de outubro de 2020 [Vide DAR II Série-A n.º 14 (2020.10.08)] e o título e texto

iniciais foram substituídos em 28 de outubro de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 20 (2021.10.16)].

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PROJETO DE LEI N.º 767/XIV/2.ª (**)

ALTERA O REGIME DO LUTO PARENTAL E RECONHECE O DIREITO AO LUTO EM CASO DE

PERDA GESTACIONAL

Exposição de motivos

Sabendo que nem todos reagem da mesma forma em relação à perda, a verdade é que a morte de alguém

em particular nas situações em que é inesperada ou violenta, tem um elevado impacto na vida das pessoas,

mudando-a de forma permanente. A morte inicia uma resposta natural de adaptação, tanto à perda como a uma

nova realidade.

Reconhecendo esta necessidade, o artigo 251.º do Código do Trabalho permite ao trabalhador faltar de forma

justificada, dependendo o número de dias a que tem direito do grau de parentesco, nos seguintes termos:

• Até cinco dias consecutivos, por falecimento de cônjuge não separado de pessoas e bens ou de parente

ou afim no 1.º grau na linha reta. O mesmo se aplica em caso de falecimento de pessoa que viva em

união de facto ou economia comum com o trabalhador;

• Até dois dias consecutivos, por falecimento de outro parente ou afim na linha reta ou no 2.º grau da linha

colateral.

Ora, consideramos que o regime do luto parental em vigor é claramente insuficiente, pois não permite que o

trabalhador recupere do trauma associado à perda e não garante que aquele que sofreu a perda se encontra,

dentro do possível, em adequadas condições de saúde mental para enfrentar a pressão e desgaste associados

ao trabalho.

Por este motivo, a Acreditar – Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro lançou uma petição

que solicita a alteração deste regime, através do aumento do número de dias de faltas justificadas, dos atuais 5

dias consecutivos para 20 dias consecutivos.

De acordo com o texto da petição1, o prazo legalmente previsto «é claramente insuficiente e violador dos

mais elementares princípios que devem nortear o bem-estar físico e emocional dos trabalhadores em casos de

Luto Parental», correspondendo os 5 dias «praticamente ao período necessário para o tratamento de

formalidades atinentes à morte de um ser-humano, não restando sequer um merecido período de pausa laboral

para o exercício efectivo do devastador Luto Parental.».

Considera, ainda, que «o actual regime encontra-se em dissonância com os paradigmas de Políticas de

Emprego e Sociais defendidas pelos Estados democraticamente organizados no Séc. XXI, bem como pelas

organizações internacionais (veja-se o Pilar Europeu dos Direitos Sociais a título meramente exemplificativo)

pugnando por melhores condições de trabalho, conciliação entre vida familiar e laboral, progresso social, apoio

à família, entre outros aspectos em defesa dos legítimos interesses dos trabalhadores.».

Finalmente, destaca que a nível europeu, existem «Estados cujas políticas laborais já acolhem esta linha de

pensamento e, recentemente, tem vindo a assistir-se a um movimento de alterações legislativas com o intuito

de aumentar o período de Luto Parental (em algumas situações, alterações legislativas decorrentes do exercício

do Direito de Petição – veja-se o caso do Reino Unido com a denominada Jack’s Law, na Dinamarca ou nos

Países Baixos).».

Ora, acompanhamos integralmente a pretensão constante desta petição. Por isso, com o presente projeto

de Lei propomos uma alteração ao regime do Luto Parental, aumentando o número de dias de faltas justificadas,

dos atuais 5 dias consecutivos para 20 dias consecutivos.

Para além disto, os dias previstos na lei não contemplam todas as situações de perda como é o caso da

interrupção espontânea da gravidez.

A verdade é que a perda gestacional pode representar uma interrupção repentina de um projeto de vida e,

como tal, traz um forte impacto para aqueles que estão envolvidos emocionalmente na vivência da conceção de

um bebé. Sofrer este tipo de perda, tal como as que já constam no Código do Trabalho, pode dar origem ao luto,

1 Pode ser consultada em https://www.peticaolutoparental.com/a-peti%C3%A7%C3%A3o

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um processo natural e esperado perante a quebra de vínculos que se verifica.

Após a perda gestacional há mulheres que dizem sentir falta de empatia e aceitação social para sentir e viver

a perda, e essa falta de aceitação pode ser um fator de risco para a vivência do luto dessas mulheres.

Atualmente, a mãe trabalhadora tem direito a licença por interrupção da gravidez, conforme o disposto no

artigo 38.º do Código do Trabalho. Ou seja, após a interrupção da gravidez (voluntária ou não) a trabalhadora

terá de contactar o seu médico para efeitos de lhe ser atribuída licença, com duração entre 14 a 30 dias,

conforme as considerações do médico. Para além disso, o pai não tem aqui quaisquer direitos.

Ora, a licença não se confunde com o direito ao luto, que agora propomos, o qual deve ser garantido tanto à

mãe como ao pai, como aos beneficiários da gravidez de substituição. Neste último caso, parece-nos justo que

aqueles que pretendiam ser pais por meio da gestação de substituição tenham direito a falta justificada por luto

no caso de interrupção espontânea da gravidez. Há uma expectativa legítima de que virão a ser pais e de que

virão a acolher aquele bebé, e a frustração dessa expectativa traz muito sofrimento associado.

No que diz respeito aos pais, ao longo dos anos a forma como se perceciona a parentalidade tem sofrido

alterações e temos assistido a uma mudança de uma visão quase exclusivamente centrada na mulher para uma

visão mais paritária, ainda que não tanto como desejável, já que as questões da reprodução e do aborto

continuam em grande parte a ser vistas como um «problema» da mulher. Isto acontece por fatores sociais,

políticos e legais (o facto de o pai não ter qualquer direito em caso de interrupção da gravidez comprova-o). A

verdade é que a interrupção da gravidez também tem impactos para os homens.

O ato de abortar, seja ele induzido ou não, pode desencadear múltiplas consequências psicológicas nos pais,

que não estão relacionadas de forma linear com o tempo de gestação. Muitos especialistas afirmam que estas

dependem da própria motivação e desejo da gravidez, do investimento emocional que se gerou em torno da

mesma e na ligação com o bebé. No entanto, de um modo geral, as perdas com maior impacto ocorrem no

último trimestre da gravidez.

As perdas experienciadas pela mãe e pai, durante a gravidez ou puerpério, geram respostas emocionais

específicas, que se podem manifestar de diversas formas como tristeza, solidão, culpa, raiva, ansiedade, apatia,

choque, desamparo, choro, isolamento, baixa autoestima, insónia, perda de apetite, entre outros.

O período de dor e sofrimento correspondente ao luto por uma perda é normal e deve ser encarado como

saudável e necessário.

Segundo o relatório denominado Retrato da Saúde 20182, do Ministério da Saúde, o número de interrupções

da gravidez (incluindo a interrupção voluntária e a espontânea) tem vindo a diminuir desde 2011. No entanto, a

média de interrupções entre 2011 e 2016 é de 17 886, embora a maioria diga respeito a interrupções voluntárias.

Ainda assim, esta não é uma situação ocasional, é algo que acontece todos os dias, com todo o sofrimento que

isso implica para as mães e pais.

A aprovação deste projeto de lei mostrará que, mais uma vez, Portugal está num caminho para a defesa dos

direitos das mulheres e para a construção de uma sociedade mais igualitária. Para além de acompanhar a

aprovação recente de lei idêntica que despertou o interesse internacional sobre esta temática, tendo sido a Nova

Zelândia o precursor.

A lei aprovada na Nova Zelândia3 é um exemplo de legislação que reconhece explicitamente o luto que vem

com a interrupção da gravidez.

Para além disso, este reconhecimento pode contribuir para permitir que as mulheres se sintam mais

confortáveis ao falarem sobre a interrupção da gravidez e em pedir ajuda no que é uma enorme perda física e

emocional, sem a pressão financeira, insegurança ou licença insuficiente para dedicar o tempo necessário ao

luto.

Por sua vez, os pais terão pela primeira vez direito ao sofrimento, sem perda de remuneração, assim como

terão direito a apoiar-se mutuamente.

Por este motivo, propomos que os progenitores passem a ter direito a três dias de luto em caso de interrupção

espontânea da gravidez, incluindo-se aqui também os beneficiários da gestação de substituição.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues

apresenta o seguinte projeto de lei:

2 https://www.sns.gov.pt/wp-content/uploads/2018/04/RETRATO-DA-SAUDE_2018_compressed.pdf 3 https://www.legislation.govt.nz/bill/member/2019/0159/latest/whole.html#LMS220706

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,

na sua redação atual, alterando o regime do luto parental e reconhecendo o direito ao luto em caso de perda

gestacional.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro

São alterados os artigos 249.º e 251.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de

fevereiro, alterado pela Retificação n.º 21/2009, de 18 de março, Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, Lei n.º

53/2011, de 14 de outubro, Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, Retificação n.º 38/2012, de 23 de julho, Lei n.º

47/2012, de 29 de agosto, Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, Lei n.º 55/2014, de

25 de agosto, Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, Lei n.º 8/2016, de 1 de abril,

Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, Retificação n.º 28/2017, de 2 de outubro, Lei

n.º 14/2018, de 19 de março, Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro, Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, e Lei n.º

18/2021, de 8 de abril, os quais passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 249.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) A motivada por interrupção espontânea da gravidez, falecimento de cônjuge, parente ou afim, nos

termos do artigo 251.º;

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) […];

k) […];

3 – […].

Artigo 251.º

[…]

1 – […]:

a) Até cinco dias consecutivos, por falecimento de cônjuge não separado de pessoas e bens ou de parente

ou afim ascendente no 1.º grau na linha reta;

b) Até 20 dias consecutivos, por falecimento de descendente de 1.º grau na linha reta ou equiparado;

c) Até três dias consecutivos, por interrupção espontânea da gravidez;

d) [Anterior alínea b)].

2 – […].

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3 – O disposto na alínea c) do número 1 é aplicável a ambos os progenitores, à gestante e aos

beneficiários em caso de gestação de substituição.

4 – [Anterior n.º 3.]»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 28 de outubro de 2021.

A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.

(**) O título e o texto iniciais foram substituídos a pedido do autor em 28 de outubro de 2021 [Vide DAR II Série-A n.º 161 (2021.07.01)]

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1495/XIV/3.ª

PELA PROTEÇÃO, DIGNIDADE E GARANTIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE TODAS AS

PESSOAS QUE PRATICAM A PROSTITUIÇÃO

Exposição de motivos

A prostituição é uma prática social complexa e multifatorial, assente em dimensões económicas, culturais e

sociais, com múltiplas motivações, que exige modelos de leitura abrangentes.

Em Portugal, esta prática foi despenalizada em 1983, existindo um vazio legislativo que não confere direitos

a quem exerce esta atividade, contribuindo para a exclusão, o estigma e a reprovação social.

A legislação deve garantir a realização pessoal das pessoas, a sua dignidade, o direito a decidir sobre a sua

vida, pressupondo o direito de autodeterminação, desde que não interfira com terceiros.

As políticas sociais, legais e económicas devem assegurar que estas pessoas recebem a proteção, o respeito

e a oportunidade de exercício dos seus direitos humanos fundamentais. Tem de ser uma preocupação de

qualquer estado de direito garantir a melhoria das condições de acesso das pessoas que praticam a prostituição

à saúde, à segurança, à formação, ao emprego e à integração na comunidade, construindo um modelo de

sociedade justo, que garanta o respeito pelos direitos destes/as cidadãos/ãs e dos/as seus/suas filhos/as, que

muitas vezes são esquecidos/as na definição destas políticas.

A Rede sobre Trabalho Sexual, fundada em 2011, surgiu com o intuito de promover a dignificação das

condições de vida e a defesa dos direitos dos/as Trabalhadores/as Sexuais, integrando representantes

destes/as trabalhadores/as, investigadores/as e entidades que atuam junto destas pessoas. Através do trabalho

desta Rede, tem sido possível a apresentação de propostas de melhoria nas políticas públicas que afetam

diretamente estas pessoas, bem como informar os decisores políticos sobre as medidas necessárias à garantia

dos direitos fundamentais desta população.

Uma dessas medidas é o combate ao estigma que afeta estas pessoas e que as coloca em situação de maior

fragilidade. Esta Rede recomenda também que se evitem políticas que juntam num mesmo fenómeno situações

diferentes, como o trabalho sexual, o tráfico de seres humanos ou outras formas de exploração sexual.

Consideram que a criminalização ou ausência de regularização impulsiona estes fenómenos para a

marginalidade, aumentando o risco de violência e de outros fenómenos, como o tráfico de seres humanos para

fins de exploração sexual ou a prostituição de menores.

A pressão para práticas não seguras associada à reduzida procura do Serviço Nacional de Saúde (SNS),

aumentam o risco de infeções e ausência de tratamentos destas populações, pelo que é essencial garantir

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mecanismos que aproximem as pessoas que praticam a prostituição e/ou Trabalhadores/as Sexuais das

respostas de saúde.

Cabe ao Estado garantir a continuidade do trabalho de proximidade que é realizado pelas associações não

governamentais, que é essencial para os processos de acompanhamento e transição destas pessoas para

outras opções de vida, quando estas assim o desejam.

A sensibilização e consciencialização da sociedade civil, bem como o debate público acerca destas matérias,

é essencial para combater a desinformação, a discriminação e o preconceito.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PAN propõe que

a Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Desenvolva e implemente programas de saída do sistema da prostituição, em conjunto com entidades

governamentais, autarquias locais, ONG e associações, com as seguintes componentes: Acompanhamento na

saúde, designadamente cuidados médicos, saúde sexual e reprodutiva, acompanhamento psicológico,

tratamento de adições, saúde mental, entre outros;

2 – Tome as diligências necessárias para a promoção do alojamento de urgência, a médio-prazo, individual

ou coletivo, e disponibilização de apoio a alojamento de continuidade, como habitação social ou apoio ao

arrendamento;

3 – Proceda à criação de uma rede de apoio médico, social, económico e jurídico às pessoas que se

prostituem, assente num levantamento de necessidades objetivo, com a colaboração das necessárias entidades;

4 – Tome as diligências necessárias à prevenção do recurso à prostituição por razões económicas,

familiares e sociais;

5 – Implemente programas especiais para os grupos com comportamentos de risco, como as pessoas que

se prostituem, disponibilizando unidades móveis de apoio, em todo o país, que prestem cuidados básicos de

saúde, tratamento de adições, de psicologia, de assistência social, de apoio jurídico, em zonas de prática de

prostituição;

6 – Tome as diligências necessárias ao acompanhamento na parentalidade, designadamente o apoio no

que respeita às escolas e creches, apoio às crianças e famílias e apoio na gravidez;

7 – Promova o acompanhamento de pessoas estrangeiras, designadamente, e consoante os casos, através

do apoio ao regresso ao país de origem, à regularização, ou em termos do processo de asilo;

8 – Diligencie a promoção dos direitos sociais e da proteção social, designadamente em situação de

desemprego, de discriminação, entre outras;

9 – Promova a capacitação das associações e organizações não governamentais que trabalham

diretamente com pessoas que se encontrem as pessoas que praticam a prostituição e/ou Trabalhadores/as

Sexuais e que com eles/as criaram laços de confiança ao longo do tempo, o que permitirá o encaminhamento e

aconselhamento para as diversas alternativas, quando estes/estas assim o desejam;

10 – Promova campanhas de sensibilização e consciencialização da sociedade civil para a não

discriminação, através de uma Educação para os Direitos Humanos a realizar em espaços como escolas e

universidades, bem como junto de entidades, autoridades e grupos envolvidos no atendimento e proteção de

pessoas que se prostituem.

Palácio de São Bento, 27 de outubro de 2021.

As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.

———

Página 11

28 DE OUTUBRO DE 2021

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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 29/XIV/3.ª

(APROVA O ACORDO SOBRE A MOBILIDADE ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS DA COMUNIDADE

DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA)

Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião da Deputada autora do parecer

Parte III – Conclusões

PARTE I – Considerandos

1 – Nota Introdutória

Ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do

artigo 198.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 1 de

outubro de 2021, a Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª, que «Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os

Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa».

Por despacho de sua Excelência, o Presidente da Assembleia da República, de 4 de outubro de 2021, a

iniciativa em apreço baixou à Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, tendo sido

designado como relatora a Deputada autora deste parecer.

2 – Âmbito, contexto e objetivos da iniciativa

A proposta de resolução em análise aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da

Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), assinado em Luanda, em 17 de julho de 2021.

O referido Acordo foi assinado pela República Portuguesa, a República de Angola, República Federativa do

Brasil, a República de Cabo Verde, a República da Guiné-Bissau, a República da Guiné Equatorial, a República

de Moçambique, a República Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de Timor-Leste.

De acordo com a iniciativa do Governo, o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da CPLP

vem permitir o estabelecimento de um quadro de cooperação em matéria de mobilidade dos cidadãos dos

Estados-Membros e entre esses mesmos Estados, através de um sistema flexível e variável que atende às

particularidades relativas a cada Estado, representando, na perspetiva dos autores da iniciativa, um contributo

para o reforço das relações de amizade e de cooperação entre os Estados-Membros da CPLP.

Em anexo à Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª, é publicado na íntegra o texto do Acordo em análise, para

o qual se remete.

PARTE II – Opinião da Deputada autora do parecer

Sendo a emissão de opinião de caráter facultativo, a Deputada autora deste parecer exime-se de manifestar

a sua opinião nesta sede.

PARTE III – Conclusões

1 – O Governo tomou a iniciativa de apresentar, em 1 de outubro de 2021, a Proposta de Resolução n.º

29/XIV/3.ª – «Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de

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Língua Portuguesa»;

2 – A proposta de resolução em análise tem por finalidade aprovar o Acordo sobre a Mobilidade entre os

Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), assinado em Luanda, em 17 de

julho de 2021, cujo texto é publicado em anexo à proposta de lei;

3 – Nestes termos, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas é de parecer que a

Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª – «Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da

Comunidade dos Países de Língua Portuguesa» está em condições de ser votada no Plenário da Assembleia

da República.

Palácio de São Bento, 28 de outubro de 2021.

A Deputada autora do parecer, Romualda Fernandes — O Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, na reunião da Comissão do dia 28 de outubro de 2021.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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