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Quarta-feira, 23 de outubro de 2024 II Série-A — Número 119

XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)

2.º SUPLEMENTO

S U M Á R I O

Relatórios do Provedor de Justiça e do Mecanismo Nacional de Prevenção — 2023: — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

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RELATÓRIOS DO PROVEDOR DE JUSTIÇA E DO MECANISMO NACIONAL DE PREVENÇÃO — 2023

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

PARTE I – Considerandos

I a) Nota introdutória

Em cumprimento do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 23.º, n.º 1, do Estatuto do Provedor de Justiça1, a Sr.ª

Provedora de Justiça entregou na Assembleia da República, em 12 de julho de 2024, o Relatório anual de

atividades relativo ao ano de 2023, acompanhado do anexo autónomo com o Relatório da Provedora de Justiça

enquanto Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura2.

O Relatório Anual do Provedor de Justiça foi, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 238.º do Regimento

da Assembleia da República, distribuído à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e

Garantias, para emissão do respetivo parecer.

No dia 10 de outubro de 2024 a Sr.ª Provedora de Justiça compareceu na Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para apresentar, em audição, o referido relatório anual.

I b) Do Relatório Anual do Provedor de Justiça relativo a 2023

O Relatório à Assembleia da República 2023, apresentado pela Sr.ª Provedora de Justiça, reflete a atividade

desenvolvida por este órgão constitucional durante o ano de 2023, bem como a atividade exercida enquanto

Mecanismo Nacional de Prevenção, a qual consta de relatório próprio, em anexo autónomo.

O Relatório Anual de Atividades, composto por 177 páginas, encontra-se estruturado da seguinte forma:

Introdução

I. Apreciação de queixas

Problemas gerais

1. Falhas na execução da lei – o problema

2. Falhas na execução da lei – exemplos selecionados

3. Alertas à transição digital

Análise por temas

1. Ambiente e Ordenamento do Território

2. Cidadania

3. Cidadãos estrangeiros em Portugal

4. Economia e Consumo

5. Educação e Cultura

6. Fiscalidade

7. Habitação e urbanismo

8. Justiça e Segurança Interna

9. Liberdade de associação e acesso a profissão

10. Saúde

11. Segurança Social

12. Sistema Prisional e de Reinserção Social

13. Trabalho

1 Lei n.º 9/91, de 9 de abril, alterada pela Lei n.º 30/96, de 14 de agosto, Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro, e Lei n.º 17/2013, de 18 de fevereiro. 2 Este respeita à atividade autonomamente desenvolvida pela Provedora de Justiça enquanto Mecanismo Nacional de Prevenção, no âmbito do Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, descrevendo o trabalho realizado durante o ano de 2023, com especial referência às visitas a locais de detenção.

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O Provedor de Justiça e o Tribunal Constitucional

1. O sistema português de controlo de constitucionalidade de normas – arquitetura geral

2. O ano de 2023

3. Jurisprudência recente do Tribunal Constitucional e arquitetura geral do sistema

II. Instituição Nacional de Direitos Humanos e demais atividade

1. Introdução

2. Sistema Internacional de Direitos Humanos

3. Associações e redes internacionais de INDH

4. Sistema Regional de Direitos Humanos

5. Atividades de âmbito nacional

III. Informação estatística

A Provedoria em 2023 – alguns números

1. Solicitações ao Provedor de Justiça

2. Tratamento das queixas

3. Temas analisados

IV. Principais siglas e abreviaturas.

Na introdução, a Provedora de Justiça, Professora Dr.ª Maria Lúcia Amaral, salienta que «[d]urante o ano

de 2023, a Provedoria de Justiça recebeu 10 641 queixas, no total de 15 711 solicitações que lhe foram

dirigidas», para explicar que, «[p]erante estes dados, é natural que o relatório da atividade anual da instituição…

não pretenda ser a descrição exata de tudo quanto se foi fazendo ao longo dos últimos doze meses», tendo

procurado que «a organização do relatório obedecesse apenas a duas ideias fundamentais»:

• A primeira ideia «tem a ver com a amplitude do mandato que é hoje conferido ao Provedor de Justiça»,

porquanto «o Ombudsman de Portugal é hoje», não só «órgão ao qual cabe apreciar, “sem poder

decisório”, as queixas que lhe sejam apresentadas por cidadãos quanto a “ações e omissões dos poderes

púbicos” (artigo 23.º da Constituição)», mas também «sede do Mecanismo Nacional de Prevenção contra

a Tortura e Instituição Nacional de Direitos Humanos», este com a ação descrita no Relatório Anual de

Atividades e aquele, em relatório «a parte»; e

• A segunda ideia tem a ver com o facto de o «centro do seu mandato» se situar, «ainda e sempre, no

cumprimento da função primacial que em 1976 lhe foi confiada», o que «explica, em larguíssima medida,

as matérias que nele são tratadas digam respeito à “atividade” de apreciação de queixas, atribuída pela

Constituição ao Provedor para que, por essa via, se possam “prevenir e reparar injustiça”», salientando a

Provedora que «[u]ma parte apreciável destas queixas diz respeito ao modo de funcionamento do nosso

sistema de justiça constitucional», que tem «um capítulo próprio» com um «resumo da ação do Provedor

junto do Tribunal Constitucional», a que acrescem os capítulos dos «Problemas Gerais» e da «Análise

por Temas», que «resumem a “atividade” da instituição quanto à apreciação das queixas apresentadas

contra ações ou omissões da Administração».

Seguindo a metodologia já seguida no «relatório do ano passado», o Relatório de Atividades relativo a 2023

identifica «dois “problemas gerais”: as falhas na execução da lei, por um lado, e os problemas decorrentes da

chamada transição digital, por outro», sendo que «primeiro sumaria-se, em abstrato, a questão; depois, ilustra-

se o que se sumariou pela referência aos casos concretos que nos chegaram», método igualmente seguido no

«capítulo relativo à “Análise por Temas”».

A introdução termina com «uma curta informação quanto à “atividade” da Provedoria relativa ao ano de

2023», referindo a Provedora de Justiça que a preocupação, «de ordenar a “matéria-prima” trazida pelas queixas

dos cidadãos de modo a, com ela, se identificarem problemas relevantes da administração estadual, levou a

que nos últimos doze meses se tivessem publicado vários relatórios sectoriais, que resultaram de estudos sobre

aquelas áreas específicas do agir administrativo que se iam mostrando, pelas mais diferentes razões,

problemáticas», salientando que, «em maio, foi divulgado o relatório sobre medidas de mitigação da inflação»,

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bem como «o relatório temático sobre a Polícia de Segurança Pública», e «em julho, o estudo intitulado

monitorização da atividade e do processo de extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras».

Enquanto que o primeiro e o terceiro relatórios foram os «dois motivados pelo elevado número de queixas

que os respetivos temas geravam: num caso, as dificuldades de execução prática que rodearam as diferentes

medidas à altura adotadas pelo Governo para mitigar os efeitos da inflação; no outro, as muitas conspícuas

queixas apresentadas por estrangeiros quanto à demora dos procedimentos administrativos de regularização

da sua entrada em território nacional»; o segundo relatório foi elaborado «pelo Mecanismo Nacional de

Prevenção com base em informações recolhidas pelas visitas efetuadas».

A Provedora de Justiça refere ainda, por último, que, «por causa do número e do teor das queixas recebidas,

foram ainda em 2023 efetuadas as visitas inspetivas a serviços públicos em território nacional que redundariam

no relatório sobre o atendimento ao cidadão nos serviços públicos, publicado e divulgado já em fevereiro de

2024».

No capítulo relativo aos problemas gerais, é referido que, «em sede de problemas transversais a várias

áreas da Administração e que se identificam com caráter de reiteração», «a escolha recaiu sobre as falhas na

execução da lei, por um lado, e, por outro, sobre a necessidade de emitir alertas gerais à transição digital»,

embora a «morosidade, deficiente articulação e fraca comunicação», problemas selecionados no relatório de

atividades de 2022,«mantiveram relevo no contexto das queixas recebidas, continuando naturalmente a ser

acompanhadas pela Provedoria de Justiça», sendo salientado que em 21 % do total de queixas recebidas em

2023 estava em causa a morosidade do serviço público e dados alguns exemplos, entre os quais «o pagamento

do valor correspondente à atualização extraordinária das pensões de sobrevivência pela Caixa Geral de

Aposentações (CGA), previsto desde 2017, permanece por cumprir até à presente data».

No que se refere às falhas na execução da lei – o problema, o relatório refere que «o problema que se

pretende ilustrar apresenta contornos de uma anomalia sistémica, sendo observável num plano descritivo

resultante do confronto entre o mundo do legislador e o mundo das práticas administrativas, como se de duas

realidades paralelas, conquanto coexistentes, se tratasse», atribuindo-se «este estado de coisas» ao resultado

de «uma cultura legiferante desprovida da necessária atenção às condições (materiais, organizacionais,

regulamentares e/ou procedimentais) de execução da lei».

Neste particular, são referidas no relatório diversas situações que permite retratar este problema, entre as

quais, as seguintes:

• no que se refere à «reforma dos recursos humanos da Administração Pública, várias medidas

continuam por aplicar ou têm sido concretizadas com lentidão pouco compatível com os seus fins,

designadamente a renovação dos seus quadros e a conclusão de um sistema adequado de carreiras»;

• «o atraso considerável na concretização da reforma dos vínculos, carreiras e remunerações iniciado em

2008: a revisão das múltiplas carreiras anteriormente existentes, ainda não concluída 16 anos depois, tem

vindo a ser feita paulatinamente e de modo que nem sempre conserva a racionalidade do sistema»;

• «a execução absolutamente residual do regime de pré-reforma dos trabalhadores em funções

públicas», consagrado na lei desde 2009, só em 2019 foi aprovada a «regulamentação longamente

aguardada», mas as queixas revelam que, em muitos casos, «as entidades empregadoras públicas

invocam aguardar a definição de orientações sobre a forma de aplicação do instituto em causa»;

• «a demora a que se assiste na efetiva disponibilização de serviços de segurança e saúde no trabalho no

âmbito da Administração Pública»;

• «o objetivo de convergência dos regimes de segurança social, anunciada desde 2007, está por cumprir,

e tem mesmo registado desvios»;

• «o novo regime jurídico do cadastro predial, aprovado em agosto de 2023, por diploma no qual se

estabeleceu o seguinte mês de novembro como data da entrada em vigor» constituiu um «episódio muito

recente de inexecução da lei» – «[o] funcionamento do novo regime dependia do alargamento da

utilização do Balcão Único do Prédio (BUPi) enquanto plataforma nacional de registo e de identificação

cadastral» e não foi «possível garantir atempadamente o funcionamento da plataforma para os fins e com

as faculdades necessárias», «o que paralisou o mercado imobiliário e as transmissões entre particulares

quanto aos concelhos afetados», não tendo havido «outra solução senão, por via legislativa, diferir a

produção de efeitos das normas em causa» do referido regime, assumindo-se, «assim, a impossibilidade

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de efetiva execução de um regime aprovado poucos meses antes».

O Relatório Anual de Atividades de 2023 seleciona vários exemplos de falhas na execução da lei, «quer a

medidas estruturais, quer a medidas conjunturais; a medidas que respeitam a todos os cidadãos e outras que

se dirigem em especial a grupos vulneráveis; a medidas com efeitos na vida económica e empresarial e a

medidas com efeitos na esfera pessoal e familiar».

Com efeito, no que respeita às falhas na execução da lei – exemplos selecionados, são referidos os

seguintes:

• Quanto a grupos especialmente vulneráveis, são referidas as seguintes falhas:

o Falhas no «Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio (SAPA)», que existe «para facultar, de forma

gratuita e universal, produtos de apoio destinados às pessoas com deficiência ou com incapacidade

temporária», cuja regulamentação dos bancos de produtos de apoio estava prevista, segundo a

Estratégia Nacional para a Inclusão de Pessoas com Deficiência 2021-2025, para «2021…, o que não

só não aconteceu, como tal regulamentação permanece por aprovar até à presente data», sendo que,

a «sucessão da emissão, por mais de catorze anos, de atos normativos relativos à reutilização dos

produtos de apoio confronta-se não só com a inexistência de um banco de produtos de apoio como

com o considerável atraso no fornecimento destes produtos e a sua insuficiência, registada anualmente,

problema que a Provedora de Justiça já denunciou várias vezes no passado»;

o Falhas no «domínio da acessibilidade de pessoas com mobilidade condicionada a edifícios e espaços

públicos», que já se prolongam desde a aprovação do Decreto-Lei n.º 123/97, de 22 de maio, sendo

que, não obstante a criação da «Estrutura de Missão para a Promoção das Acessibilidades» com a

missão, nomeadamente, de «executar as ações conducentes à correção das barreiras arquitetónicas»

e «colaborar nas atividades de avaliação e acompanhamento da responsabilidade do Instituto Nacional

de Reabilitação, IP (INR)», «o problema das acessibilidades, objeto de medida legislativa em 1997,

ainda subsiste em larga medida»;

o Falhas na «proteção especial conferida pela Lei do Asilo», a qual «permanece por garantir, por falta

de procedimento de sinalização dessas situações entre os requerentes de proteção internacional», por

reporte aos «requerentes de proteção internacional particularmente vulneráveis – em razão da idade,

sexo, identidade sexual, orientação sexual, deficiência ou doença grave, perturbação mental, por terem

sido vítimas de tortura, violação ou outras formas de violência psicológica, física ou sexual» a quem,

de acordo com a Lei do Asilo, «devem ser atribuídas garantias processuais especiais, bem como

condições materiais de acolhimento e cuidados de saúde adequados à sua situação». Refere o

relatório que a «atribuição da proteção especial legalmente prevista depende da identificação das

situações de particular vulnerabilidade, o que não está a acontecer», sendo «um problema já

conhecido quando era interveniente o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF)» e relativamente ao

qual, em 2019, «o Comité das Nações Unidas contra a Tortura alertou o Estado português para a

necessidade de assegurar o estabelecimento de mecanismos efetivos destinados a identificar

rapidamente essas situações».

• Em matéria de fiscalidade, são destacadas as seguintes falhas:

o «(…) a Provedoria detetou um exemplo de absoluta falta de aplicação de um regime legitimamente

aprovado: durante treze anos, esteve em vigor em Portugal uma lei que determinava a aplicação do

regime fiscal dos unidos de facto às pessoas que vivessem em economia comum. Durante todo

este período, a Autoridade Tributária (AT) recusou sistematicamente a sua aplicação, invocando que o

regime fiscal da economia comum carecia de regulamentação. O que é certo é que, tendo sido no

mesmo dia (11 de maio de 2001) aprovados os regimes de proteção das pessoas que vivem em

economia comum e das que vivem em união de facto, o regime fiscal aplicável a estas últimas – para o

qual remetia o da economia comum – veio a ser (e é até hoje) aplicado sem constrangimentos, e sem

necessidade de regulamentação. A Provedoria pronunciou-se várias vezes no sentido da aplicação

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deste regime as pessoas que vivessem em economia comum, nos termos da lei, sem sucesso. Nos

casos em que os particulares recorreram a tribunal arbitral, a ATfoi condenada a aplicar o regime, bem

como no pagamento de juros indemnizatórios, o que confirma a desnecessidade de regulamentação. A

conduta da AT, de recusa de aplicação do regime dos unidos de facto as pessoas que viviam em

economia comum, foi então qualificada como desconforme a lei vigente, o que não obviou a que, até a

lei ser revogada em 2014, esta nunca tenha sido, salvo condenação por tribunal, aplicada pela AT»;

o «(…) apontam-se duas situações de falha na execução da lei, ambas relativas à tributação de mais-valias

provenientes da venda de imóvel afeto à habitação própria e permanente do sujeito passivo ou

do seu agregado familiar», uma delas relativa «ao regime geral e a outra a uma intervenção legislativa

de carácter conjuntural»:

▪ «Quanto ao regime regra, a Provedora de Justiça constatou em 2012 que a AT não aplicava a exclusão

de tributação nas situações em que o imóvel vendido era propriedade exclusiva de um dos cônjuges

e a mais-valia era reinvestida pelo casal na aquisição em conjunto de outro imóvel. Nesse quadro,

dirigiu-se uma Recomendação a AT, no sentido de ser aplicada a exclusão de tributação a essas

situações, uma vez que a lei não exigia que o imóvel alienado pertencesse a ambos.

A Recomendação foi acatada pela AT, que até publicitou o entendimento correto no Portal das Finanças.

Contudo, onze anos volvidos, a Provedoria de Justiça tomou conhecimento de que há serviços da

AT que continuam a não aplicar a exclusão de tributação nestas situações, perpetuando, sem

fundamento e já após expresso reconhecimento, a parcial inoperância da lei. Este caso suscita a

especial preocupação de revelar a incapacidade de, na esfera de uma mesma entidade, assegurar

uma aplicação uniforme da lei»;

▪ «Em outubro de 2023, no âmbito do pacote “Mais Habitação”, foram excluídas de tributação as mais-

valias provenientes da venda de terrenos para construção e da venda de imóveis habitacionais

secundários, quando o respetivo valor tiver sido utilizado para amortizar a dívida de empréstimos a

habitação própria e permanente (do sujeito passivo, do seu agregado familiar ou dos seus

descendentes).

A medida, que entrou em vigor em 7 de outubro de 2023, abrangeu retroativamente as famílias que

obtiveram mais-valias em 2022, estabelecendo-se que a exclusão de tributação se aplica às

transmissões realizadas entre 1 de janeiro de 2022 e 31 de dezembro de 2024. No entanto, a data

da publicação e entrada em vigor do diploma, os contribuintes que tinham efetuado transmissões

durante o ano de 2022 já tinham sido notificados pela ATpara o pagamento de imposto sobre tais

ganhos. Ora, apesar da entrada em vigor do regime, na falta de normas de salvaguarda quanto a

aplicação da lei no tempo, a ATprosseguiu a tramitação dos processos de execução fiscal

instaurados a quem não procedeu ao pagamento do imposto liquidado, por inexistência de lei que

suspendesse as cobranças em curso. Ou seja, num contexto em que se visava acudir rapidamente

a dificuldades financeiras das famílias, a ATcontinuou a cobrar coercivamente um imposto que, por

determinação expressa do legislador, não era devido.»

• Relativamente a acidentes nas autoestradas, é sinalizada a seguinte falha:

o «A lei que define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como autoestradas

concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares reveste-se, em diversos

planos, do objetivo de introduzir mudanças de natureza estrutural. Foi, designadamente, o que

sucedeu quanto ao regime de responsabilidade civil por acidentes naquelas vias. O legislador

estabeleceu ali expressamente que as concessionárias de autoestradas se presumem culpadas pela

ocorrência de acidentes rodoviários provocados por objetos arremessados para a via ou existentes

nas faixas de rodagem, por atravessamento de animais e por existência de líquidos na via».

«No entanto, o acompanhamento que a Provedoria de Justiça tem feito desta matéria ao longo dos anos

revela que as concessionárias não só mantem meios de prevenção manifestamente deficitários, não

tendo realizado os investimentos expectáveis, como se desresponsabilizam, sistematicamente, pelos

acidentes provocados por objetos, animais ou líquidos nas autoestradas, assim se revelando em larga

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medida ineficaz a presunção de culpa estabelecida na lei.»

• Quanto a questões de segurança social, são apontadas as seguintes falhas:

o «O Instituto da Segurança Social (ISS)recusou atribuir, durante largos anos, subsídio parental

alargado previsto na lei nos casos em que a licença parental complementar não fosse gozada num

único período seguido de três meses logo após o gozo da licença parental»;

o «Em matéria de atualização do valor do abono de família, queixas chegadas à Provedoria

demonstram que os serviços da Segurança Socialnão aplicam a regra que permite, desde 2012, que

a reavaliação do valor atribuído decorra da mera declaração dos interessados quanto a alteração dos

seus rendimentos, sujeita a posterior confirmação.»

«Apesar da regra vigente, os serviços da Segurança Social continuam, na prática, a aguardar uma

confirmação da alteração de rendimentos através das informações disponibilizadas pela AT, não

considerando as declarações dos interessados.»

• Em matéria de seguros obrigatórios, o relatório dá «conta das omissões de regulamentação detetadas»,

salientando-se que:

o «Mais de sessenta seguros obrigatórios criados por lei permanecem, hoje, por regulamentar no nosso

País. Em alguns casos, aguarda-se há décadas pela regulamentação: é o que sucede quanto à

responsabilidade civil das entidades concessionárias da exploração e gestão dos sistemas municipais

de captação, tratamento e abastecimento de água para consumo público e concessionárias dos

sistemas de tratamento de resíduos sólidos urbanos, ambos seguros exigidos pelo legislador há mais

de 29 anos»;

o «Também no ramo dos acidentes pessoais pode destacar-se a omissão de regulamentação verificada

nos casos dos seguros a que tem direito os estagiários de estágios profissionais nos serviços da

Administração Pública, que já ultrapassa os 9 anos, dos seguros dos formandos em cursos de formação

profissional apoiados por fundos públicos, que aguarda regulamentação há mais de 35 anos, ou dos

participantes em programas de férias desportivas, em situação de espera há mais de 27 anos»;

o «A Provedoria teve já, porém, ocasião de observar a especial dificuldade que, na prática, enfrentam

aqueles que precisam de celebrar contratos de seguro obrigatórios não regulamentados. Ora, quando a

lei opta pela criação de um seguro obrigatório, estabelece igualmente a correspondente sanção (por

norma contraordenacional) para o exercício de atividade sem subscrição de seguro, pelo que a falta de

regulamentação pode traduzir-se num entrave ao acesso e exercício de determinada atividade ou

profissão»;

o «Exemplo trazido ao conhecimento da Provedoria foi o da obrigação de contratação de seguro de

responsabilidade civil por parte dos especialistas em física médica para efeitos de exercício da

profissão. Não se encontrando aprovada a portaria que define “o capital mínimo coberto e as condições

do seguro de responsabilidade civil”, as dificuldades encontradas por estes profissionais para subscrever

o seguro a que estão obrigados são exponenciadas as primeiras diligencias efetuadas pela Provedoria

junto do Executivo datam de finais de 2022, sem que tenha sido, ainda, obtida resposta que indicie estar

o assunto em vias de resolução» – neste caso, «as primeiras diligências efetuadas pela Provedoria junto

do Executivo datam de finais de 2022, sem que tenha sido, ainda, obtida resposta que indicie estar o

assunto em vias de resolução»;

No que se refere aos alertas à transição digital, o relatório de atividades refere que, em «sede de

atendimento ao público, observou recentemente a Provedora de Justiça que “a tensão que se desenha entre a

crescente digitalização do atendimento e as dificuldades de utilização das ferramentas digitais coloca

consideráveis desafios, importando evitar que os objetivos de proximidade, rapidez e eficiência na

disponibilização das ferramentas digitais se convolem em obstáculos ao esclarecimento, acesso e atendimento,

afastando os cidadãos ao invés de os aproximar”», salientando, nomeadamente, que «nem sempre a

informatização, tal como concretizada pelas entidades públicas, tem o necessário e adequado cuidado com os

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seus destinatários, nem tem como prioridade a defesa dos interesses dos cidadãos, que, colateralmente,

acabam desrespeitados por mecanismos rígidos e automáticos.»

Identifica o relatório um conjunto de «situações concretas» que «chegaram ao conhecimento da Provedoria

de Justiça e que geraram especial preocupação», nomeadamente «queixas de utilizadores de plataformas

informáticas que ficaram na errada convicção de os seus pedidos, declarações ou candidaturas terem sido

entregues sem que tal tenha acontecido, apenas demasiado tarde se apercebendo deste facto», entre as quais

se destaca o exemplo de «exclusão automática e inesperada de candidatura ao Programa de Arrendamento

Acessível» em que, «depois de sorteada e atribuída uma habitação e da apresentação de todos os elementos

solicitados através da plataforma eletrónica, o sistema informático assumiu uma renúncia ao apoio», verificando-

se posteriormente «que a exclusão da candidatura se devera ao facto de os documentos terem sido carregados

na plataforma, nas não terem sido submetidos, sem que, para uma consequência tão gravosa, tenha havido

emissão de um sistema de confirmação e/ou alerta».

O relatório de atividades realça ainda ser «fonte de muito particular preocupação a existência de serviços ou

funcionalidades cujo acesso de faça exclusivamente online. É o que sucede, por exemplo, em matéria de apoio

à habitação, da segurança social dos trabalhadores do serviço doméstico ou ainda em processos de

desalfandegamento de encomendas», considerando que «o digital como única via» para a «população em

geral» suscita «as maiores reservas», porquanto «Não podendo dar-se como assente que todos têm (ou têm

obrigação de ter) acesso a plataformas online, ou outras vias de acesso digital (desde logo, correio eletrónico),

tal exigência consubstanciar-se-á, então, em verdadeira limitação do acesso aos serviços públicos».

O relatório de atividades realça também que «[a]s soluções informáticas recorrem frequentemente a

mecanismos rígidos e automatismos que levam à impossibilidade de consideração de especificidades do caso

concreto, ou de elementos diversos dos previstos no sistema, tratando de igual modo casos diferentes face à

lei, não cumprindo o dever de fundamentação ou não permitindo a correção de erros», sendo destacado, de

entre os exemplos deste tipo de funcionamento, «o sistema automático do ISS relativo à fixação de dívida de

juros de mora», em que «o sistema informático do Instituto de Segurança Social procede, de forma automática,

ao cálculo dos juros e integra o respetivo valor no montante em dívida», mesmo nos casos em que «o atraso

nas contribuições a pagar é da responsabilidade da Segurança Social e não existe qualquer mora dos

contribuintes», obrigando os interessados a apresentarem reclamação, cujo processo de apreciação é «muitas

vezes moroso», pois só assim poderão ver «anulada uma dívida de juros indevidamente fixada pelo

funcionamento automático do sistema informático».

Outro exemplo da «difícil permeabilidade e ajustamento dos sistemas informático» prende-se com uma

queixa referente à «impossibilidade de concluir o registo do nascimento de uma criança, devido à acentuação

gráfica de um dos seus apelidos, proveniente do nome da família da mãe, de nacionalidade croata», cuja

resolução «impunha a alteração do sistema SIRIC (aplicação informática de suporte à atividade dos serviços de

registo e identificação civil), de modo a serem admitidos caracteres e diacríticos eslavos», referindo o relatório

que «As diligências infrutíferas realizadas pelo Instituto dos Registos e do Notariado, IP (IRN), junto do Instituto

de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP (IGFEJ), revelaram que o sistema informático não estava

pensado de modo a priorizar esta manifestação do direito a identidade pessoal, através do registo civil e a atribuir

o devido relevo a efetivação do direito ao nome. No caso, o registo sem a grafia original, tal como veio a ser

efetuado, implica uma redação e pronúncia incorreta do apelido. A Provedoria de Justiça fez notar ao IGFEJ que

a crescente mobilidade dos cidadãos pode tornar este problema cada vez mais frequente e continua a

acompanhar esta questão; reconhecida a importância da atualização tecnológica, o IGFEJ informou estar a

desenvolver um plano que permita reconhecer outros caracteres para além dos atualmente previstos.»

Salienta o relatório de atividades que «[e]m algumas situações reportadas a Provedoria de Justiça é evidente

a falta de meios necessários para assegurar a transição digital. São, por exemplo, relatadas situações em que,

por insuficiência de recursos humanos, os serviços de back office não conseguem acompanhar a cadencia da

digitalização dos procedimentos ou de uso pela Administração de programas obsoletos, que criam dificuldades

na interação com os particulares e no tratamento dos dados por estes fornecidos».

É, nomeadamente, referida a «situação de morosidade e omissão de resposta a pedidos de registo online

distribuídos a Conservatória do Registo Comercial», em que, «[n]ão dispensando tais soluções a intermediação

humana, o aumento do número de pedidos online gera uma sobrecarga de trabalho que se reflete na capacidade

de resposta dos serviços de registo, dadas as limitações a nível de recursos humanos reconhecidas pelo IRN.

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Do contacto com a Conservatória resultou que a apreciação dos pedidos de registos online segue a ordem

cronológica de entrada, registando-se então em cerca de quatro meses o período médio entre a apresentação

do pedido e a conclusão da respetiva tramitação.»

Do capítulo análise por temas, e por reporte às matérias que se inserem no âmbito de competências da 1.ª

Comissão, importa destacar os seguintes dados e informações constantes do relatório:

• Cidadãos estrangeiros em Portugal:

o Processo de transição SEF-AIMA – é referido que a Provedoria de Justiça «tem acompanhado o processo

de reestruturação do sistema controlo de fronteiras», tendo monitorizado «a atividade do Serviço de

Estrangeiros e Fronteiras (SEF) na perspetiva do processo da sua extinção e transferência de

competências para outras entidades, designadamente para a Agência para a Integração, Migrações e

Asilo, IP (AIMA)» e «tendo, ainda em julho de 2023, publicado um relatório temático especial, com a

formulação de 16 recomendações, incluindo alertas para o período de transição. Com um volume

crescente de queixas3, a Provedoria continua a observar muito de perto esta temática, contanto também

com a auscultação da sociedade civil. Disso mesmo se dará conta num segundo relatório temático.»

o Autorização de residência CPLP – o relatório refere «queixas quanto às dificuldades na utilização da

plataforma CPLP, designadamente no que respeita aos procedimentos relativos ao documento único de

cobrança», mas também a falta de «adequada informação pública – designadamente na plataforma

CPLP – quanto aos efeitos da realização deste pedido sobre os demais pedidos pendentes ao abrigo

de outros regimes legais, gerando situações inesperadas e indesejáveis de arquivamento por inutilidade

superveniente», para além de que, «no momento da submissão do pedido de autorização de residência

CPLP, muitas pessoas ignoravam em absoluto que a sua titularidade não habilita à circulação dentro do

espeço Schengen, tendo um âmbito estritamente nacional.»

o Proteção internacional – o Relatório refere que, em 2023, «continuou a acompanhar-se o programa

especial de proteção a pessoas deslocadas da Ucrânia, impossibilitadas de regressar àquele País

por causa da situação de guerra», salientando terem sido «reportadas dificuldades na obtenção dos

números identificativos perante o Serviço Nacional de Saúde, a Segurança Social e a Autoridade

Tributária», algumas das quais «decorrentes de falhas na interoperabilidade entre os serviços públicos»,

o que contribui «para a demora do processo» de atribuição de autorização de residência ao abrigo

do regime de proteção temporária. «Foram também recebidas queixas por constrangimentos

enfrentados para retificação de dados incorretos (como o nome ou a data de nascimento) introduzidos

nos pedidos de proteção temporária por via digital ou já constantes dos títulos emitidos», atendendo ao

«facto de a própria plataforma não contemplar a possibilidade de correção, além de que a emissão de

novos títulos exigia novas verificações não automatizadas, num contexto agravado pela carência de

recursos». Também no âmbito da proteção internacional «foi acompanhada a situação de grupo de

refugiados reinstalados no nosso País no decurso de 2023».

• Justiça e Segurança Interna:

o Custódia policial prévia ao ingresso no sistema prisional – o relatório refere ter sido estabelecido, em

março de 2023, «entre a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), a Inspeção-Geral dos Serviços

de justiça (IGSJ) e a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), protocolo de

cooperação que define mecanismos expeditos de reporte e articulação entre os serviços prisionais e os

serviços de inspeção das forças de segurança, com vista a acautelar a tomada de declarações em

3 O relatório refere que «desde 29 de outubro de 2023 até final de junho de 2024, foram mais de duas mil as solicitações chegadas à Provedoria em matéria de estrangeiros que estão diretamente relacionadas com as competências da AIMA. As principais questões que motivaram a apresentação de queixa respeitam à demora na tramitação procedimental dos pedidos de concessão de autorização de residência (AR), nos diversos enquadramentos legais, com destaque para os formalizados na sequência de manifestações de interesse – a esmagadora maioria – e, ainda, apresentados por estudantes, para fins de reagrupamento familiar e para concessão de autorização de residência para investimento (ARI).»

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quarenta e oito horas de quem, ao ingressar num estabelecimento prisional, apresente lesões e/ou

alegue ter sido vítima de ofensas à integridade física em sede de custódia policial», reportando ter sido

«detetada a falta de aplicação dos mecanismos estabelecidos no Protocolo, através de queixa em que

foi visada a atuação de agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) na execução de mandado

judicial de detenção (para condução a estabelecimento prisional)» – «[v]erificou-se (…) que, mais de

setenta e duas horas após o ingresso do queixoso no estabelecimento prisional, a situação ainda não

tinha sido comunicada à entidade inspetiva competente – no caso, a IGAI –, permanecendo o queixoso

sem ser ouvido», tendo a Provedoria de Justiça reforçado «junto da direção do estabelecimento prisional

a necessidade de cumprimento da obrigação de comunicação imediata deste tipo de situações» e

apurado, junto da esquadra da PSPonde o queixoso esteve detido, que, «em desconformidade com as

regras aplicáveis, o detido fora transportado até à esquadra pelos mesmos agentes que tinham

procedido a sua detenção».

o Controlo de fronteiras – acompanhamento especializado em casos relativos a crianças – o relatório refere

que, «A partir de situação detetada no aeroporto de Lisboa, a Provedoria de Justiça confirmou em 2023

a inexistência de procedimentos pré-definidos para o acompanhamento de situações em que se torna

necessário impedir uma criança de sair do País (por exemplo, no âmbito do regime do rapto parental

transfronteiriço)», caso em que «a criança fica à guarda das autoridades nacionais até ao esclarecimento

da sua situação, o que pode caber a autoridades estrangeiras», salientado que «o princípio do superior

interesse da criança só será garantido com uma prévia e rigorosa definição dos procedimentos a adotar,

em que cada interveniente sabe perfeitamente qual o papel que lhe cabe, quem contactar e por que

meio» e sinalizando que «a extinção do SEF trouxe também o fim da equipa especial exclusivamente

destinada ao acompanhamento de casos de crianças e de situações de tráfico de seres humanos, sendo

imprescindível que a Polícia Judiciária (…) e a Polícia de Segurança Pública (…) se articulem quanto a

estes fins, sendo de equacionar a criação de uma unidade especializada para o efeito.»

o Cobrança de taxas indevidas pelas forças de segurança – reporta o relatório que se mantiveram «as

queixas reveladoras do desconhecimento, por parte de militares da Guarda Nacional Republicana (GNR)

e agentes da PSP, do direito dos cidadãos à obtenção, livres de quaisquer encargos, de

comprovativos das denúncias que apresentem verbal e presencialmente às forças de

segurança», constatando-se que, «Apesar de a matéria já ter sido objeto de uma Recomendação em

2015, dada por acatada» – a Recomendação n.º 1/A/2015 –, «se mantém a prática de cobrar aos

denunciantes, por esses comprovativos, os valores tabelados para a emissão de certidões, declarações

e reproduções», razão pela qual «a Provedora de Justiça emitiu nova Recomendação» – a

Recomendação n.º 2/A/2023, dirigida ao Ministro da Administração Interna –, «reiterando a necessidade

de ser definitivamente clarificado, junto das forças de segurança, o direito à obtenção, livre de quaisquer

encargos, de um recibo comprovativo da entrega da denúncia» e sinalizando «outras duas questões»:

«o montante manifestamente desproporcionado da taxa a cobrar pela emissão de certidões,

declarações ou fotocópias de participações de acidentes de viação que os cidadãos têm de

apresentar às seguradoras e cujo montante se fixou, em 2023, nos 22 euros por lauda» e o «sentimento

de injustiça manifestado pelo próprio pessoal das forças de segurança relativamente à cobrança de

taxa por declarações funcionais para efeitos de concurso». Embora tenha sido «comunicada a

intenção de acatar a Recomendação» por parte do «Ministro da Administração Interna», em reunião que

«teve lugar em julho de 2023», foram invocados «constrangimentos de ordem financeira que teriam de

ser avaliados em conjunto com o Ministério das Finanças», mantendo-se a situação «inalterada».

o Segurança e prevenção rodoviária – refere o relatório, em relação a acidentes nas autoestradas, que

«desde 2007 que a lei faz recair sobre as concessionárias o ónus de demonstrar o cumprimento das

obrigações de segurança, para efeitos de afastarem a sua responsabilidade quanto a acidentes

provocados por objeto arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem, por

atravessamento de animais e por existência de líquidos na via» o que antevia que «as concessionárias

reforçariam os meios de prevenção daquele tipo de acidentes. No entanto, a realidade observada pela

Provedora de Justiça através das múltiplas queixas que anualmente lhe chegam sobre esta matéria

revela que o incentivo legislativo se revelou insuficiente para alcançar o fim almejado». Salienta o

relatório que «[a]s concessionárias não só mantêm meios de prevenção manifestamente deficitários,

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não tendo realizado os investimentos expectáveis, como de desresponsabilizam, sistematicamente,

pelos acidentes provocados por objetos, animais ou líquidos nas autoestradas», devendo ser

«equacionadas ouras soluções, suscetíveis de contribuir eficazmente para alcançar o propósito

legislativo de reforçar a prevenção de acidentes provocados por falta de vigilância das autoestradas».

Refere ainda o relatório que «é] desde há muito acompanhado pela Provedoria de Justiça o tema da

responsabilidade pelos danos que o mau estado de conservação da denominada “Estrada da Costa da

Caparica” ou “Estrada da Fonte da Telha” provocou em inúmeros veículos», salientando que, «[v]olvidos oito

anos sobre a Recomendação n.º 6/A/2015, foi em 3 de julho de 2023 publicado diploma que clarificou finalmente

a situação jurídica daquela via: reconhecendo que a estrada integrava o domínio público do Estado, procedeu à

sua transferência para o domínio público rodoviário do Município de Almada». Tendo a Provedora de Justiça

questionado «o Ministério das Finanças sobre a reparação dos prejuízos há muito reclamados», a «ESTAMO,

Participações Imobiliárias, S.A.» «informou que os pedidos indemnizatórios deverão ser apresentados junto da

Secretaria-Geral do Ministério das Finanças, informação transmitida diretamente aos queixosos pela

Provedoria».

• Sistema prisional e reinserção social:

o Condições condignas – o relatório refere que, em 2023, «a Provedoria de Justiça tomou conhecimento de

uma situação que, embora circunscrita a um único estabelecimento prisional, motiva especial

preocupação», reportando-se a «várias queixas relatando que o Estabelecimento Prisional de Vale de

Judeus (EPVJ) não estaria a garantir» o «direito de acesso permanente da população reclusa a água

potável», «em virtude de cortes no fornecimento de água várias vezes ao dia». «Foi referida como

particularmente penosa a falta de água durante todo o período noturno (entre as 19h15 e as 7h00 do

dia seguinte), em que a pessoa reclusa se encontra fechada no seu espaço de alojamento, sobretudo

para quem não tem meios para comprar garrafas de água na cantina. Tal implica que não estão a ser

asseguradas condições de higiene e de habitabilidade». Nas visita que a Provedoria realizou, em

setembro de 2023 e em maio de 2024, foi «possível apurar que, desde o verão de 2022, tanto a Direção-

Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) como o Instituto de Gestão Financeira e

Equipamentos da Justiça, IP (IGFEJ), têm conhecimento dos problemas no abastecimento de água no

EPVJ, sendo que apenas em outubro de 2023 foram lançados os procedimentos concursais tidos por

necessários para a sua resolução», não estando, por isso, «definitivamente solucionadas as restrições

ao fornecimento de água no EPVJ a tempo do início do verão de 2024», embora a «a Provedoria de

Justiça continua a acompanhar de perto esta situação, tenho em junho de 2024 reunido com a Secretária

de Estado Adjunta e da Justiça para avaliar a possibilidade de serem adotadas, no imediato, medidas

de contingência para o verão de 2024.»

O Relatório refere ainda que «A falta de climatização e a consequente exposição da população reclusa

a temperaturas extremadas têm sido objeto de queixa, e requerem maior acompanhamento e outro

tipo de abordagem por parte da DGRSP». Considera a Provedora de Justiça que, «[a]lém de se dever

proceder ao levantamento periódico dos valores da temperatura, deve equacionar-se a elaboração de

planos de contingência», sendo este um tema que «continuará a merecer o acompanhamento da

Provedoria de Justiça».

o Ocupação – acesso ao ensino – o relatório refere que a Provedoria de Justiça acompanhou «em particular

o projeto de educação à distância e e-learning no ensino superior em estabelecimentos prisionais,

nos termos de protocolo com a Universidade Aberta», tendo sido «observadas, no ano letivo 2022/2023,

limitações nas condições de frequência do ensino superior por parte dos estudantes em situação de

reclusão, nomeadamente no que toca aos métodos de avaliação admitidos», pois, diversamente ao

sucedido no ano letivo anterior, «passou apenas a ser possível a avaliação final, sem a opção da

avaliação contínua». Expressada a preocupação da Provedoria de Justiça junto da Universidade Aberta,

«apurou-se que a preocupação de optar entre avaliação contínua e avaliação final, em condições de

igualdade com os demais estudantes do ensino superior, foi retomada, mas apenas em quatro

estabelecimentos prisionais (num total de 21 aderentes ao projeto)», sendo que a «Provedoria mantém

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o acompanhamento do assunto, também quanto às especificidades técnicas necessárias à

implementação do projeto, entre as quais se contam o acesso controlado à internet em meio prisional.»

No Capítulo O Provedor de Justiça e o Tribunal Constitucional, destaque-se que o relatório refere que, «[s]ó

no ano de 2023 foram analisadas na Provedoria 50 queixas apresentadas por cidadãos, que solicitavam que

quanto aos temas nelas referidos se apresentasse requerimento ao Tribunal Constitucional. Nove dessas

queixas foram recebidas durante o ano de 2023, estando por isso algumas delas, ainda, a ser analisadas; as

restantes diziam respeito a processos pendentes recebidos em anos anteriores, e que tiveram o seu desfecho

ao longo de 2023», tendo sido submetidos ao Tribunal Constitucional três pedidos de fiscalização sucessiva da

constitucionalidade:

1) Um pedido «teve como objeto as normas constantes dos artigos 4.º, alínea b), e 21.º da Lei n.º 45/2012,

de 29 de agosto, que aprova o regime jurídico de acesso e exercício da profissão de examinador de condução

e o reconhecimento das entidades formadoras», por violação do «princípio da proibição dos efeitos automáticos

das penas, decorrente do n.º 4 do artigo 30.º da CRP» e por se tratar de uma restrição excessiva «ao exercício

da liberdade fundamental de escolha de profissão (artigo 47.º, n.º 1, da CRP) e ao direito ao trabalho, na sua

vertente negativa (artigo 58.º, n.º 1, da CRP)», «desrespeitando a exigência de proporcionalidade decorrente do

artigo 18.º, n.º 2, da CRP», pedido entrado «a 11 de setembro de 2023» e que ainda aguarda pela pronúncia do

Tribunal Constitucional;

2) Outro pedido «foi realizado na sequência de uma queixa acerca da possível inconstitucionalidade de

várias normas aprovadas no contexto da chamada “Agenda do Trabalho Digno”» e que incidiu sobre as «normas

constantes dos artigos 10.º, n.º 3, e 383.º-A, n.os 1 e 2, aditados ao Código do Trabalho pela Lei n.º 13/2023, de

3 de abril», nomeadamente por «restrição excessiva à liberdade fundamental de iniciativa económica provada

(artigo 61.º, n.º 1, da CRP), assim se desrespeitando o princípio da proporcionalidade decorrente (artigo 18.º,

n.º 2, da CRP)», pedido entrado «a 23 de outubro de 2023» e que aguarda igualmente por pronúncia do Tribunal

Constitucional;

3) O «terceiro pedido de fiscalização da constitucionalidade foi formulado (…) a 24 de novembro de 2023, e

incidiu sobre a norma do artigo 11.º, n.os 1 e 2, do Decreto Legislativo Regional n.º 14/202/M, de 2 de outubro,

e dos artigos 8.º, n.os 1 a 9, e 9.º, n.os 1 a 4, do Decreto Legislativo Regional n.º 1/2021/M, de 25 de janeiro, que

adaptam e regulamentam na Região Autónoma da Madeira a Lei n.º 45/2018, de 10 de agosto, que estabelece

o regime jurídico da atividade de transportes individual e remunerado de passageiros em veículos

descaracterizados a partir de plataforma eletrónica (TVDE)», uma vez que a contingentação aí prevista

«restringia a liberdade de iniciativa económica privada (artigo 61.º, n.º 1, da CRP)» e, «por revestir de natureza

análoga a direitos, liberdades e garantias (artigo 17.º da CRP), tal matéria é da exclusiva competência da

Assembleia da República, pelo que se encontra vedada à Assembleia Legislativa Regional da Madeira (artigos

227.º, n.º 1, alínea a), e 165.º, n.º 1, alínea b), da CRP». Refere o relatório que «O Tribunal Constitucional

declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral das aludidas normas produzidas pela Assembleia

Legislativa da Região Autónoma da Madeira através do Acórdão n.º 68/2024, de 23 de janeiro. Contudo,

nenhuma referência fez neste aresto ao requerimento do Provedor de Justiça, senão tão-somente ao pedido

que havia sido realizado pelo Procurador-Geral da República», sendo que, «Posteriormente, no Acórdão n.º

262/2024, de 2 de abril, o Tribunal Constitucional decidiu não tomar conhecimento do pedido de fiscalização da

constitucionalidade formulado pelo Provedor de Justiça, por ter considerado que sobre essas normas havida já

incidido uma declaração de inconstitucionalidade».

Esta decisão mereceu, no relatório, duras críticas por parte da Provedora de Justiça, que considera que,

«[c]om esta decisão de 2 de abril, o Tribunal violou a sua própria lei (Lei do Tribunal Constitucional, Lei n.º 28/82)

em três aspetos essenciais. No seu artigo 64.º, manda a lei que em situações como aquela que agora

descrevemos se proceda a “incorporação” dos processos. O Tribunal não o fez. Depois, manda a lei (artigo 52.º),

que os pedidos apresentados só não sejam admitidos nos casos expressamente aí previstos. Mas o Tribunal

não admitiu, por extemporâneo, o pedido [apresentado pelo Provedor], sendo que tal fundamento de não

admissão não faz parte do elenco de razões constante do artigo 52.º. E não faz nem pode fazer já que é a

própria lei que diz (artigo 62.º) que, em fiscalização abstrata sucessiva, os pedidos são apresentados a qualquer

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tempo e não dependem de prazo. A tudo isto acresce que o “prazo” que, agora, o Tribunal fixou pode nem

sequer ser do conhecimento dos requerentes, a menos que decorra de factos aos quais tenha sido conferida

pública notoriedade. A questão de saber qual terá sido o primeiro pedido a “entrar” e qual terá sido o segundo é

questão que só diz respeito ao funcionamento interno do próprio Tribunal.»

Considera a Provedora de Justiça que o facto de a questão de fundo ter sido «a final resolvida», pois «as

normas questionadas vieram a ser declaradas inconstitucionais», «não anula a gravidade do que aconteceu. A

violação, por parte do Tribunal Constitucional, da lei processual que o rege tem consequências de maior, por

quatro razões fundamentais», das quais se destaca o seguinte:

✓ Desde logo, porque, «ao dificultar o seu papel de mediador entre cidadãos e a justiça constitucional, a

desconsideração dos pedidos de fiscalização da constitucionalidade realizados pelo Provedor de Justiça acaba

por indiretamente prejudicar os cidadãos»;

✓ Segundo, porque «a criação de entraves ao exercício das competências do Provedor, como a

desconsideração de pedidos de fiscalização da constitucionalidade, prejudica a relação de confiança entre este

órgão constitucional e os seus interlocutores: os cidadãos»;

✓ Terceiro, porque «a desconsideração da obrigação de incorporação de pedidos com objeto idêntico no

primeiro pedido submetido ao Tribunal Constitucional em fiscalização abstrata prejudica também a justa

composição do objeto do respetivo processo»; e

✓ Quarto, porque «num estado de coisas em que é furtada ao Provedor de Justiça a oportunidade de avaliar

a pertinência do uso do seu poder de requerer a fiscalização da constitucionalidade abstrata sucessiva de

normas, é o próprio exercício da competência conferida pelo artigo 281.º da Constituição que fica, no seu todo,

comprometida», considerando mesmo que «é a própria subsistência da instituição Provedor de Justiça, na sua

configuração atual, que é posta em causa pelo Tribunal Constitucional».

O relatório refere que, «[d]as dezenas questões de constitucionalidade analisadas pela Provedoria de Justiça

em 2023 que não deram azo a pedidos de controlo de constitucionalidade, devem destacar-se, a título ilustrativo,

dois casos. Num deles, em vez de se recorrer ao Tribunal, optou-se por uma Recomendação dirigida ao

legislador», reportando-se, por um lado, à Recomendação n.º 4/B/2023, de 12 de setembro, dirigida ao Ministro

das Finanças, sobre o tributo «“Adicional de Solidariedade sobre o Sector Bancário” (ASSB), o qual impende

sobre o setor bancário desde 2020, por força da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho», «alertando-o para a

necessidade de revogação do regime jurídico com efeitos para o futuro e para os riscos [extremamente gravosos

para o erário público, maxime, para o sistema de financiamento da segurança social] decorrentes da existência

de processos em curso, fundados em razões de inconstitucionalidade, e que redundarão em recursos para o

Tribunal Constitucional»4, recomendação esta que «não teve no entanto qualquer resposta», e, por outro lado,

aos pedidos para que a Provedora de Justiça «requeresse o controlo abstrato da constitucionalidade da norma

que impõe a instrução do requerimento de atribuição da nacionalidade a estrangeiros que sejam descendentes

de judeus sefarditas portugueses com documento comprovativo “[d]a titularidade transmitida mortis causa, de

direitos reais sobre imóveis sitos em Portugal, de outros direitos pessoais de gozo ou de participações sociais

em sociedades comerciais ou cooperativas sediadas em Portugal” ou “[d]e deslocações regulares ao longo da

vida do requerente a Portugal; quando tais factos demonstrem uma ligação efetiva e duradoura a Portugal”,

constante da alínea d) do n.º 3 do artigo 24.º-A do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa (RNP)», tendo a

Provedora considerado que «a interpretação mais natural» da referida norma «era a de que estaria apenas a

acrescentar novos factos instanciadores do “requisito objetivo de ligação a Portugal” previsto na lei…, e não

como um requisito adicional, o que afastava a existência de qualquer inconstitucionalidade orgânica».

Quanto à atividade exercida enquanto Instituição Nacional de Direitos Humanos, destaque-se o seguinte:

✓ «Em 2023, foi iniciado um processo de renovação da acreditação, processo que foi concluído, em 2024,

4 A Provedora de Justiça justifica, no relatório, a opção pela Recomendação, em vez da fiscalização sucessiva da constitucionalidade, «apesar de se terem divisado razões para uma eventual violação da Constituição», com duas razões fundamentais: em primeiro lugar, «a forte possibilidade de a declaração de inconstitucionalidade das normas relativas ao ASSB produzir efeitos desde a sua entrada em vigor, com consequências altamente prejudiciais para o erário público: todo o valor das receitas arrecadadas por via da cobrança do ASSB teria de ser devolvido aos respetivos sujeitos passivos»; e, em segundo lugar, por «em várias decisões arbitrais proferidas pelo CAAD se havia decidido desaplicar, com fundamento em inconstitucionalidade, as normas previstas na referida Lei n.º 27-A/2020», pelo que «a questão viria a ser proximamente apreciada pelo Tribunal Constitucional, ainda que através de processos de controlo concreto de normas.»

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com a recomendação emitida pelo Subcomité de Acreditação do GANHRI de que o Provedor de Justiça

mantivesse o “Estatuto A”, isto é, plenamente conforme com os Princípios de Paris»;

✓ «Durante o ano de 2023, o Provedor de Justiça colaborou regularmente com os organismos e mecanismos

das Nações Unidas: com o Conselho dos Direitos Humanos e os seus procedimentos especiais, assim

como com órgãos dos tratados, partilhando a sua visão independente sobre a situação nacional neste

domínio»;

✓ «Cooperou também com o sistema europeu de direitos humanos e com instituições congéneres de outros

países, participando na atividade das redes regionais de instituições nacionais de direitos humanos, bem

como respondendo a solicitações que lhe foram dirigidas diretamente»;

✓ «Em 2023, o Provedor de Justiça participou ativamente em várias iniciativas destinadas a promover a

informação e educação no domínio dos direitos fundamentais e dos direitos humanos, por exemplo,

através de ações de formação, seminários e conferencias, promovendo e fomentando as oportunidades

de manter um diálogo construtivo com outras instituições nacionais e com a sociedade civil».

Destaque, ainda, para a seguinte Informação Estatística constante do Relatório de Atividades de 2023:

✓ Em 2023, foi recebido um total de 15 711 solicitações (menos 2365 do que em 2022), onde se incluem

2438 chamadas recebidas nas linhas telefónicas especializadas (mais 23 do que em 2022), das quais

70 % se referem à linha do cidadão idoso, 20 % à linha do cidadão com deficiência e 10 % à linha da

criança;

✓ De entre as exposições recebidas, 2854 foram qualificadas como queixas, dando origem a novos

procedimentos;

✓ 97 % das situações de queixa foram apresentadas por pessoas singulares e 3 % por pessoas coletivas,

das quais se destacam as empresas (28 %), as associações (10 %) e os sindicatos/associações sindicais

(20 %);

✓ Os assuntos mais versados nos procedimentos foram as questões de segurança social (27 %),

estrangeiros – entrada e permanência (8 %), trânsito (7 %), trabalho (6 %) e fiscalidade (6 %);

✓ A maioria das queixas foi apresentada por meios digitais: através de formulário eletrónico (46 %) ou

através de correio eletrónico (43 %);

✓ Foram arquivadas 4199 queixas, menos 6008 face a 2022, dos quais 54,04 % teve como motivo de

arquivamento a reparação da ilegalidade ou injustiça durante a instrução;

✓ 35 % das queixas foram resolvidas em menos de 90 dias e, de entre estes, 17 % foram terminados nos

primeiros 30 dias após a sua abertura;

✓ Encontravam-se pendentes, à data de 31/12/2022, um total de 1799 queixas, o que corresponde a uma

diminuição da pendência procedimental (menos 1345 procedimentos pendentes), mantendo a inversão

da tendência dos anos anteriores a 2022;

✓ Foram formuladas seis recomendações (+3 do que em 2022), das quais uma foi acatada, duas foram

parcialmente acatadas e quatro permanecem sem resposta5, uma das quais é a Recomendação n.º

2/A/2023, de 27 de junho de 2023, dirigida ao Ministro da Administração Interna, sobre a tabela de taxas

a cobrar pelos atos de secretaria prestados pelas entidades tuteladas pelo Ministério da Administração

Interna, já referida anteriormente;

✓ Foram apresentados três pedidos de fiscalização abstrata da constitucionalidade no Tribunal

Constitucional (+3 do que em 2022).

Atendendo às competências materiais da 1.ª Comissão, permitimo-nos destacar os seguintes dados e

informações estatísticas constantes do relatório:

− Estrangeiros – entrada e permanência: houve 235 queixas (-51 do que em 2022), das quais 101 relativas

a concessão de autorização de residência sem visto, 57 relativas a concessão de autorização de

residência e 15 relativas a asilo:

5 Informação que se encontra disponível no site da Provedoria de Justiça, mas que não consta do Relatório Anual – cfr. https://www.provedor-jus.pt/recomendacoes-e-outras-decisoes/recomendacoes/?ano=2023

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− Justiça: houve 93 queixas (-97 do que em 2022), das quais 49 relativas ao acesso ao Direito, 18 relativas

a registos – outros e cinco relativas a registo civil:

− Sistema prisional: houve 131 queixas (-74 do que 2022), das quais a maioria – 34 queixas – foram relativas

à saúde:

− Outros: houve 24 queixas relativas a nacionalidade, sete relativas a direitos, liberdades e garantias – outras

questões, três relativas a participação política e cívica e duas relativas a segurança interna:

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Cumpre, ainda, fazer referência, no domínio da atividade do Provedor de Justiça na promoção de direitos

humanos, ao trabalho desenvolvido no âmbito do Núcleo da Criança, do Cidadão Idoso e da Pessoa com

Deficiência, Núcleo que assegura o funcionamento das três linhas telefónicas especializadas (Linha da Criança,

Linha do Cidadão Idoso e Linha da Pessoa com Deficiência).

Em 2023, o número de chamadas telefónicas recebidas na Linha da Criança cifrou-se em 240 (+13 do que

em 2022). O principal motivo de contacto está relacionado com o exercício de responsabilidades parentais

(15,0 %), seguido de outras questões (11,7 %) e negligência e maus-tratos físicos e psíquicos (10,0).

A Linha do Cidadão Idoso registou igualmente um aumento no número de chamadas face a 2022, de 1681

para 1712 (+31). A maioria dos pedidos refere-se a respostas sociais (15,0 %), questões de saúde (14,1 %) e

maus-tratos, negligência de cuidados, abuso material e financeiro, violência doméstica e abandono (10,1 %).

Já o número de chamadas recebidas Linha do Cidadão com Deficiência sofreu uma descida em relação

ao ano anterior, situando-se nas 486 chamadas quando em 2022 se registaram 507 (-21). Um dos principais

motivos de contacto prende-se com prestação social para inclusão (9,1 %), atribuição e verificação do grau de

incapacidade (6,8 %) e prestações sociais (5,6 %).

I c) Do Relatório do Mecanismo Nacional de Prevenção de 2023

O «Relatório à Assembleia da República 2023», apresentado pela Sr.ª Provedora de Justiça, vem

acompanhado do relatório relativo à atividade exercida enquanto Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura

(MNP), nos termos do n.º 1 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 32/2013, de 20 de maio6.

O Relatório específico sobre a atividade da Provedoria de Justiça desenvolvida na qualidade Mecanismo

Nacional de Prevenção (MNP), no âmbito da Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis,

Desumanos e Degradantes, retrata e apresenta as visitas efetuadas a locais de detenção7, designadamente a

estabelecimentos prisionais, centros educativos, centros de instalação temporária de estrangeiros e espaços

equiparados, instalações das forças de segurança, bem como, recomendações efetuadas e divulgação

institucional.

O relatório em apreço começa por registar que através do Decreto-Lei n.º 80/2021, de 6 de outubro, foi

aprovada a nova orgânica da Provedoria de Justiça, que instituiu o MNP como um departamento da instituição

(v. artigo 17.º), permitindo, a partir de março de 2022, uma maior autonomia funcional.

Em termos estatísticos, regista-se que em 2023 foram realizadas 44 visitas de monitorização, das quais 17

6 A Resolução do Conselho de Ministros n.º 32/2013, de 20 de maio, designa o Provedor de Justiça como mecanismo nacional para a prevenção da tortura, para efeitos do disposto no Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (PFACT), adotado pela Assembleia das Nações Unidas, em Nova Iorque, em 18 de dezembro de 2002. 7 Locais de detenção, nos termos do artigo 4.º do PFCAT, são todos os locais onde se encontram ou possam encontrar pessoas privadas de liberdade, em virtude de uma ordem emanada de uma autoridade pública ou por instigação sua ou com o seu consentimento expresso ou tácito. Privação de liberdade, ainda de acordo com o artigo 4.º do PFCAT, é qualquer forma de detenção ou prisão ou a colocação de uma pessoa num local de detenção público ou privado do qual essa pessoa não possa sair por vontade própria, por ordem de qualquer autoridade judicial, administrativa ou outra.

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a estabelecimentos prisionais, seis a centros educativos e 17 a instalações das forças de segurança.8

Afirma-se no documento que os locais escolhidos tiveram em conta os fatores de risco sinalizados em visitas

anteriores, as notícias difundidas pela comunicação social, bem como o teor das queixas apresentadas ao

Provedor de Justiça.

Neste âmbito, assinala-se quanto aos centros de instalação temporária (CIT) e espaços equiparados (EECIT)

que «foi prestada especial atenção à transferência das competências em matéria de controlo de fronteiras do

extinto Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) para as forças de segurança».

Para cada uma das áreas visitadas, o relatório apresenta uma análise concreta, destacando-se os seguintes

pontos e conclusões:

1. Estabelecimentos Prisionais (EP)

Sinaliza-se no relatório que em 2023 foi dada prioridade às visitas a EP classificados com um grau elevado

de complexidade de gestão, nos termos do artigo 2.º da Portaria n.º 175/2020, de 24 de julho, e com uma lotação

superior a 500 reclusos, na medida em que é constatável que nos estabelecimentos de maiores dimensões os

fatores de risco para a prática de maus-tratos tendem a ser mais elevados. Foi ainda determinada como

prioritária a monitorização dos EP com população reclusa feminina, no sentido de acompanhar as

vulnerabilidades específicas desta realidade, no seguimento da sua sinalização pelo Comité Europeu para a

Prevenção da Tortura (CPT), em 2022.

Regista-se no relatório que, após cada visita, foi pedido à Direção do EP que se pronunciasse sobre o

respetivo relatório, o que se traduziu num profícuo diálogo institucional, bem como em ações de formação

realizadas em contexto prisional frequentadas por profissionais das diversas áreas.

Os fatores de risco que foram observados em 2023, e que são assinalados no documento, reportam-se às

condições materiais (lotação oficial desatualizada, ocupação e infraestruturas), aos meios de segurança

(sistema de videovigilância, botões de emergência, equipa de vigilância, revistas a reclusos e buscas a

alojamentos), aos procedimentos jurídicos (processos disciplinares e processos de inquérito por uso de meios

coercivos ou por agressão de funcionário a recluso), à existência e tratamento de alegações, indícios ou

evidências de maus-tratos (inclusive no momento do ingresso de reclusos), aos meios de queixa, aos cuidados

de saúde, ao quotidiano prisional (atividades ocupacionais, tempo a céu aberto, visitas e contactos com o

exterior) e ainda a questões referentes a reclusos em situação de especial vulnerabilidade (em razão da

nacionalidade, da idade, da mobilidade, da existência de deficiência ou da orientação sexual).

No âmbito das 17 visitas efetuadas aos EP, destaque-se para os seguintes dados sinalizados no relatório:

✓ Sobrelotação em sete EP (EP Linhó, EP PJ Lisboa, EP Lisboa, EP Alcoentre, EP Pinheiro da Cruz, EP

Coimbra e EP Porto);

✓ Falta de privacidade, sujidade e/ou degradação de balneários em sete EP (EP Linhó, EP Lisboa, EP

Sintra, EP Alcoentre, EP Pinheiro da Cruz, EP Vale de Judeus e EP Porto);

✓ Falta de privacidade na zona sanitária de alojamentos partilhados em quatro EP (EP Lisboa, EP Pinheiro

da Cruz, EP Coimbra e EP Paços de Ferreira);

✓ Estado de degradação de alojamento de reclusos em cinco EP (EP Linhó, EP PJ Lisboa, EP Lisboa, EP

Tires e EP Porto);

✓ Frio acentuado nos alojamentos em seis EP (Zona de detenção da DGRSP junto ao Campus de Justiça,

EP Sintra, EP Alcoentre, EP Pinheiro da Cruz, EP Santa Cruz do Bispo/feminino e EP Paços de Ferreira);

✓ Cobertura insuficiente do sistema de videovigilância em oito EP (EP Linhó, EP da PJ de Lisboa, EP Lisboa,

EP Alcoentre, EP Coimbra, EP Santa Cruz do Bispo/feminino, EP Tires e EP Paços de Ferreira);

✓ Falta ou avaria do sistema de alarme e comunicação nas celas em 11 EP (EP Linhó, EP PJ Lisboa, Zona

de detenção da DGRSP junto ao Campus de Justiça, EP Lisboa, EP Sintra, EP Alcoentre, EP Pinheiro

da Cruz, EP Coimbra, EP Santa Cruz do Bispo/feminino, EP Vale de Judeus e EP Paços de Ferreira);

✓ Escassez de elementos de vigilância em 10 EP (EP da PJ Lisboa, EP de Lisboa, EP Carregueira, EP

Sintra, EP Alcoentre, EP Pinheiro da Cruz, EP de Coimbra, EP Tires, EP do Porto e EP Paços de

Ferreira).

8 Os relatórios destas visitas são consultáveis em: https://www.provedor-jus.pt/mecanismo-nacional-de-prevencao/visitas-realizadas/?ano=2023

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O relatório refere as oito condenações do Estado português no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos

(TEDH), ocorridas entre 2020 e 2023, das quais quatro em 2023, nos processos instaurados por reclusos tiveram

como fundamento as condições inadequadas do parque penitenciário.9

As questões e os casos que assumiram mais relevância e que mereceram maior desenvolvimento são

descritos no presente capítulo com a identificação dos principais fatores de risco e o EP em que foi sinalizado,

bem como as respetivas recomendações exaradas pelo MNP.

Destacam-se sumariamente as seguintes situações identificadas como fatores de risco e prevenção de maus-

tratos que são objeto de desenvolvimento no relatório:

1. Definição de procedimentos

– Falta de averiguação de alegações, indícios ou evidências de maus-tratos: o MNP deparou-se com um

número significativo de situações em que, existindo alegações ou indícios de maus-tratos a recluso,

não houve lugar à instauração de um inquérito para averiguação dos factos subjacentes.

– Dever de reporte hierárquico: refere-se que vários funcionários reconheceram desconhecer se existem,

e quais são, os procedimentos devidos para sinalização ao superior hierárquico das evidências ou

alegações de maus-tratos de que tomem conhecimento no exercício das suas funções.

– Dever de denúncia ao Ministério Público: regista-se o incumprimento e falta de conhecimento de que

sobre os funcionários impende um dever de denúncia obrigatória ao Ministério Público quanto a todos

os crimes de que tomem conhecimento no exercício das suas funções ou por causa delas.

– Revistas pessoais e revistas por desnudamento: uma proporção significativa das alegações de maus-

tratos a reclusos concentra-se em momentos de realização de revistas por desnudamento e de buscas

a alojamentos. Apesar de se tratar de procedimentos necessários à garantia da segurança nos EP,

refere-se que são muitas vezes levados a cabo em desrespeito pelos procedimentos legalmente

estabelecidos para a sua realização, circunstância que comporta um significativo fator de risco para a

prática de maus-tratos.

– Buscas: regista-se que vários autos de realização de buscas a alojamentos revelaram a sua prática sem

ordem ou autorização prévia da Direção, e sem a necessária justificação para o efeito.

2. Videovigilância e tratamento de dados

– Videovigilância: em oito EP foram recebidas alegações da ocorrência de maus-tratos a reclusos em

salas ou corredores sem cobertura CCTV.

– Evidências e indícios de maus-tratos: através do visionamento das imagens captadas pelos sistemas

de videovigilância foram observadas, em vários EP, evidências de prática de maus-tratos a reclusos

por guardas prisionais.

– Tratamento de dados: desconhecimento por parte das direções dos EP da real dimensão de alegações

ou indícios de maus-tratos, para o que contribui a diversidade de meios e formas de queixa possíveis.

Não obstante os fatores de risco para a prática de maus-tratos e as situações que foram identificadas e

descritas no relatório, que evidenciam as fragilidades da realidade prisional, o MNP reforça que tal não significa

que não se observem excelentes práticas e profissionais dedicados a melhorar as condições de detenção das

pessoas privadas de liberdade. (cfr. «Boas práticas observadas» – Quadro 4, pág. 35 a 37)

2. Centros Educativos (CE)

Neste capítulo assinala-se que o ano de 2023 foi marcado pela monitorização da implementação do plano

de contingência de gestão de recursos humanos nos CE acionado pela DGRSP a partir do mês de fevereiro.

Não obstante a prioridade acima determinada, nas visitas efetuadas aos seis CE, o MNP acompanhou

9 Condenações do Estado português no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH), por violação do artigo 3.º da CEDH – v. Tabela 4, págs. 89 a 91 do relatório.

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igualmente as situações relativas ao quotidiano destas instituições, junto dos responsáveis pela sua gestão, dos

funcionários, e dos jovens que estão a cumprir medida de internamento.

No que toca à situação dos recursos humanos, o MNP refere que o crónico défice de técnicos profissionais

de reinserção social (TPRS), matéria que tem sido repetidamente sinalizada nos relatórios antecedentes,

conheceu o seu epílogo em 2023, muito embora tenha motivado o encerramento, ainda que temporário, de

unidades residenciais de vários Centros Educativos. No entanto, é também referenciada a necessária revisão

das carreiras destes profissionais, por forma a garantir a sua fixação.

São ainda sinalizadas as consequências negativas resultantes da carência de recursos humanos que

originam constrangimentos de diversa ordem no âmbito do cumprimento da Lei Tutelar Educativa, ao nível dos

projetos educativos de cada jovem, bem como nas suas deslocações.

No âmbito da saúde mental, problemática que o MNP vem acompanhando de forma recorrente, o relatório

refere que em 2023 deu-se início à adaptação de um edifício no Centro Educativo da Bela Vista, com vista à

instalação de uma unidade terapêutica na área da saúde mental destinada a jovens internados.

Quanto à questão da autonomização e saída dos jovens, referindo o relatório que em Portugal existem

apenas duas casas de autonomia, considera-se que a abertura de novas estruturas, nomeadamente no Norte

do País, mostra-se indispensável para alcançar os objetivos deste regime e alargar a sua aplicação.

Ainda neste campo, o acompanhamento educativo que compreende a elaboração de um projeto educativo

finda a medida de internamento, sublinha-se a importância da criação de equipas multidisciplinares dedicadas

ao acompanhamento educativo destes jovens.

3. Centros de Instalação Temporária (CIT) e Espaços Equiparados (EECIT)

No relatório começa por evidenciar-se o facto do ano de 2023 ter sido marcado pela extinção do Serviço de

Estrangeiros e fronteiras (SEF), em 29 de outubro, e a consequente transferência das competências de controlo

de fronteiras para a PSP e para a GNR.10

Na medida em que o aeroporto de Lisboa é a principal via aérea de entrada de cidadãos estrangeiros não

residentes na União Europeia, onde tem lugar a maioria dos casos de recusa de entrada que originam detenções

superiores a 48 horas, foi dada prioridade à monitorização do EECIT-L, que durante o ano de 2023 foi visitado

por três vezes pelo MNP: em janeiro e em setembro, ainda sob a competência do SEF, e em novembro, já sob

a gestão da PSP.11

O ponto de situação da evolução dos fatores de risco assinalados neste espaço, em anteriores relatórios do

MNP, é sistematizado no documento (pág. 48) no quadro que abaixo se reproduz:

No capítulo em apreço são analisadas as questões relacionadas com a detenção de menores por razões

exclusivas de irregularidade documental, a falta de alternativas ao espaço do aeroporto de Lisboa (EECIT-L) e

10 As competências de controlo das fronteiras aeroportuárias foram atribuídas à PSP, nomeadamente (i) a autorização ou recusa de entrada em território nacional, (ii) a execução dos afastamentos de cidadãos de território nacional e os reembarques na sequência de recusa de entrada e (iii) a gestão dos espaços de detenção (CIT e EECIT). À Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) foi atribuída competência para decidir os pedidos de autorização de residência, incluindo com fundamento na proteção internacional. 11 A detenção de cidadãos estrangeiros por razões de controlo de fronteiras, para além do EECIT do aeroporto de Lisboa, tem lugar no CIT da Unidade Habitacional de Santo António (UHSA), no Porto, ou nos restantes EECIT criados nos aeroportos do Porto (EECIT-P) e Faro (EECIT–F).

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o necessário investimento no aumento da capacidade de detenção, a restrição do âmbito da assistência jurídica,

nomeadamente a aplicação restritiva do protocolo celebrado com a Ordem dos Advogados, em 2020, a falta de

mediadores socioculturais, informação insuficiente dos cidadãos estrangeiros detidos, a falta de avaliação clínica

no ingresso e de cuidados do foro psicológico, a inexistência de procedimento de identificação de situações de

vulnerabilidade, e outros fatores de risco, tais como, pernoitas na zona de entrevistas e na zona de embarque,

detenção automática sem ponderação individual de medidas alternativas e irregularidades na renúncia a

assistência jurídica sem assinatura.

Das questões acima enunciadas permitimo-nos destacar sumariamente as seguintes:

– A aplicação do protocolo entre a Ordem dos Advogados e o Governo português com o objetivo de garantir

assistência jurídica aos cidadãos detidos no EECIT-L, independentemente da sua condição financeira.

O MNP conclui no relatório que o protocolo tem vindo a ser aplicado de forma demasiado restrita,

excluindo do seu âmbito três importantes situações: cidadãos detidos ao abrigo de processo de

afastamento de território nacional; entrevista prévia à decisão de recusa de entrada; processos judiciais

surgidos na sequência da consulta jurídica. Contribui para esta situação o facto de o protocolo referir

que se aplica «a quem tenha sido recusada a entrada em território nacional», o que consequentemente

tem sido interpretado como excluindo (i) os cidadãos detidos ao abrigo de processo de afastamento de

território nacional – porque já ali entraram em território nacional – e (ii) o momento da entrevista prévia

à decisão de recusa de entrada – porque ainda não foi recusada a entrada.

– A inexistência de procedimento de identificação de situações de vulnerabilidade, como sejam o caso dos

menores, das pessoas com problemas de saúde física ou mental, dos idosos, grávidas, vítimas de tráfico

de seres humanos ou pessoas que tenham sido sujeitas a atos de tortura, violação ou outras formas

graves de violência psicológica, física ou sexual.

O relatório assinala que a extinção do SEF trouxe também o fim da equipa especial exclusivamente destinada

ao acompanhamento de casos de menores e de situações de tráfico de seres humanos, razão pela qual o MNP

reiterou a recomendação no sentido da criação de um procedimento tipificado de identificação de

vulnerabilidades e de uma unidade especializada para o efeito.

4. Forças de Segurança

Neste capítulo o relatório começa por destacar que prosseguindo os objetivos de monitorização de locais de

detenção das forças policiais, em 2023, foram visitadas nove esquadras da PSP e oito postos da GNR.

Dá-se ainda nota que o acompanhamento da atuação da Polícia de Segurança Pública (PSP) por parte do

MNP foi objeto de um relatório temático, publicado em maio de algumas situações12, contendo várias

recomendações que ainda não foram objeto de pronúncia por parte da Direção Nacional.

Dado que durante o ano de 2023 não foram observadas alterações nos procedimentos ou práticas por parte

desta força de segurança, os diversos fatores de risco anteriormente assinalados pelo MNP nas visitas a

instalações da PSP, encontram-se descritos na Tabela 3, anexa ao relatório (pág. 85 e ss.).

Assim, o MNP considerou abordar outras questões que pela sua relevância ou novidade mereceram especial

atenção, designadamente:

– Esquadra da Bela Vista (Porto):

Realça-se no relatório que a maioria dos espaços visitados mostrou-se conforme às normas regulamentares

vigentes, com exceção feita à área de detenção temporária da Bela Vista do Comando Metropolitano da

PSP do Porto, que apresenta condições manifestamente insuficientes, tanto para pessoas detidas, como

para os agentes policiais, justificando a adoção de medidas urgentes, destinadas a requalificar, quer o

alojamento de pessoas que ali permaneçam privadas da liberdade, quer as condições de trabalho dos

funcionários.

12 Disponível em https://www.provedor-jus.pt/documentos/Relatorio %20Tematico %20sobre %20a %20PSP.pdf

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– Esquadra de Segurança do Campus de Justiça (Lisboa):

De acordo com informação recolhida, aplica-se a esta esquadra o Regulamento das Condições Materiais

de Detenção em Estabelecimento Policial, sendo que neste regulamento não são mencionadas quaisquer

adaptações devidas e necessárias quanto a locais de detenção situados junto de um tribunal. Atenta a

natureza destes espaços de detenção, de curta duração, foi recomendada pelo MNP a regulamentação

das condições materiais de estabelecimentos policiais situados junto de tribunais.

– Período de detenção no COMETLIS:

Foram identificados vários detidos instalados há mais de 48 horas e que ali permaneciam, por determinação

da autoridade judiciária, para continuação do primeiro interrogatório judicial. Concluiu-se que as

instalações do COMETLIS não têm condições adequadas à permanência de detidos por períodos tão

longos, pelo que foi recomendado pelo MNP a criação de condições adequadas à instalação de pessoas

que, por determinação da autoridade judiciária, permanecessem detidas por períodos superiores a 48

horas.

Por último, o MNP refere que à semelhança do efetuado em 2023 relativamente à PSP, as conclusões

alcançadas pelas visitas preventivas à GNR serão divulgadas num relatório temático sobre esta força de

segurança, a publicar ainda no segundo semestre de 2024.

PARTE II – Opinião do relator

O signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre Relatório

Anual de Atividades do Provedor de Justiça relativo a 2023, incluindo sobre o anexo relativo à sua atividade

enquanto Mecanismo Nacional de Prevenção, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 4

do artigo 139.º do Regimento da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer

que o Relatório Anual de Atividades do Provedor de Justiça relativo a 2023, apresentado à Assembleia da

República, está em condições de ser discutido em Plenário, nos termos e para os efeitos no disposto no artigo

239.º do Regimento da Assembleia da República.

PARTE IV – Anexos

Não há nada a anexar.

Palácio de São Bento, 23 de outubro de 2024.

O Deputado relator, Pedro Neves de Sousa — A Presidente da Comissão, Paula Cardoso.

Nota: O parecer foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS, do PCP e do CDS-PP, votos contra do CH,

tendo-se registado a ausência da IL, do BE, do L e do PAN, na reunião da Comissão do dia 23 de outubro de

2024.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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