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21 DE JANEIRO DE 1995

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Como não criou condições para um debate franco e aberto, a nível nacional, com a inerente consulta popular,

Limitando-se a fazer a entrega de Moçambique à Frelimo;

Sem sequer ter em consideração as prescrições previstas na Carta das Nações Unidas, que sujeita o destino dos povos à sua vontade expressa.

Não pretendem os peticionários questionar as razões determinantes da conduta dos novas forças de poder que passaram a governar o País, mas apenas apontar os factos que causaram a destruição da vida e bem-estar dos portugueses residentes no ultramar e a espoliação dos seus bens.

Competia, minimamente, aos representantes de Portugal criar condições de defesa dos interesses de todos aqueles que labutavam em paragens longínquas da Pátria-Mãe, à sombra da bandeira das quinas.

Todavia, o Acordo de Lusaka, assinado em 7 de Setembro de 1974, não contém uma única palavra em defesa da sua vida, liberdade, respeito, dignidade humana e bens para depois da independência.

Pelo contrário, logo no dia 2 de Maio de 1974, a Junta de Salvação Nacional, assumindo poderes legislativos, promulgou o Decreto-Lei n.° 181/74, que punia com penas de prisão maior, de dois a oito anos, todos os cidadãos que promovessem, ou executassem, qualquer operação no sentido de acautelar alguns valores em mercadorias, moeda, divisas, metais ou pedras preciosas e títulos, transferindo-os para fora da província, mesmo que fosse para o território de Portugal continental.

Quer dizer que os governantes implantados pela revolução abrilista impediram, efectiva e drasticamente, que qualquer residente no ultramar tentasse salvar parte dos seus bens e direitos, transportando-os para lugar mais seguro, e recusaram qualquer autorização de transferência cambial que não resultasse do exercício normal do comércio.

Nem constitui atenuante o facto de se tratar de lei geral aplicável a todo o País, pois que a situação dos cidadãos residentes em territórios que iam ser entregues a forças inimigas, a curto prazo, teriam de merecer uma atenção especial, mormente quanto à transferência de bens e valores que se destinasse a outra parcela do território nacional.

A forma como foi levada a cabo a descolonização constituiu uma grave ofensa contra os cidadãos, por não respeitar o direito natural, os direitos individuais, civis e constitucionais então em vigor, «que não foram revogados», a Carta das Nações Unidas, nem as próprias normas constitucionais criadas com a revolução pelas Leis n." 3/74 e 7/74.

O Estado não consultou o povo sobre o destino que pretendia para o ultramar, omitiu-se em acautelar os direitos dos seus cidadãos ali residentes e, pelo contrário, penalizou criminalmente o exercício da liberdade de actuação para defesa dos seus direitos e bens, e entregou populações pacíficas que confiavam no patriotismo e na honra nacionais a um partido único e minoritário, de ideologia sobejamente conhecida e hostil aos interesses dos cidadãos portugueses.

O desprezo e a incúria dos responsáveis da governação pelos legítimos direitos e liberdades daqueles cidadãos não pode deixar de constituir o Estado Português em responsabilidade civil.

Todavia, os sucessivos governos têm olvidado a situação das vítimas, que foram obrigadas a abandonar, tragicamente, os territórios onde viviam, e muitas delas já nasceram, e que hoje sobrevivem em extrema penúria, despojadas dos seus bens, que eram a garantia de uma velhice decente e digna.

Constituindo a descolonização, ou pelo menos a forma e o timing adoptados, um erro histórico, o que há a fazer agora é assumir frontalmente as consequências, indemnizando as

vítimas e melhorando a sua existência, o que seria um simples acto de justiça.

Foi esta a atitude tomada pelos outros países descolonizadores, alguns dos quais actuaram com tal eficiência que nem chegaram a ter verdadeiros espoliados.

Portugal, ao invés, fez publicar, em 1977, uma lei de indemnizações aos ex-titulares de direitos sobre bens nacionalizados e expropriados (Lei n.° 80/77, de 26 de Outubro), na qual se inclui um artigo relativo às ex-colónias — o artigo 40.° — de constitucionalidade mais que duvidosa, e cujo conteúdo se afigura mesmo metodologicamente fora do contexto do diploma, porque dispõe sobre espoliações de bens feitos por países estrangeiros (as ex-colónias).

A verdade é que a responsabilidade do Estado Português não deriva directamente da expropriação feita pelos novos governantes das nossas ex-províncias ultramarinas, mas, sim, da sua omissão em tomar medidas concretas e eficazes que defendessem os direitos dos cidadãos nacionais, que se viram forçados a abandonar apressadamente aqueles territórios, e da entrega incondicional do solo pátrio a forças inimigas e de abandono das populações à sua sorte, sem as consultar por via democrática.

O citado artigo 40.° mais não é do que uma tentativa de desviar as atenções do cerne do problema e de fugir a responsabilidades, não tendo qualquer consistência no sistema jurídico nacional por violar os direitos universais do cidadão, os direitos do homem e os direitos constitucionais e civis da lei portuguesa, antes e depois da revolução.

Aliás, já em resolução do Conselho de Ministros (n.° 13/92, de 16 de Abril) o Governo reconheceu que a situação dos espoliados é resultante da descolonização, ao declarar que «o complexo processo de descolonização, iniciado nas circunstâncias políticas e sociais de todos conhecidas, ocasionou graves repercussões na vida pessoal e profissional de muitos cidadãos que, àquela data, viviam nas ex-colónias portuguesas».

Infelizmente o Governo não tirou as ilações inerentes à situação que reconheceu.

Por todo o exposto, pretendem os peticionários que a Assembleia da República legisle no sentido de Portugal reconhecer os legítimos interesses aos ex-residentes do ultramar português que foram espoliados dos seus direitos e bens, para que lhes seja feita justiça.

Para tanto, considerando o disposto no artigo 52.° da Constituição da República Portuguesa e mais legislação pertinente, solicitam os signatários da presente petição que seja:

Revogado o artigo 40.° da Lei n.° 80/77, de 26 de Outubro, e substituído por outro no qual se reconheça o direito dos ex-residentes do ultramar a uma justa indemnização;

Enviada recomendação ao Governo no sentido de criar estruturas adequadas a uma rápida análise do problema e subsequente pagamento das indemnizações que forem estabelecidas, inscrevendo no Orçamento do Estado as verbas necessárias para o efeito.

Sr. Presidente da Assembleia da República estamos certos de que só assim Portugal poderá considerar-se um verdadeiro Estado de direito, pois não podemos aceitar como tal quem não actua em conformidade com os princípios universais da justiça e da moral.

Lisboa, 20 de Dezembro de 1994. — O Primeiro Signatário, Joaquim José da Costa e Castro.

Nota. — Desta petição foram subscritores 5550 cidadãos.