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II SÉRIE-C — NÚMERO 3

Despacho n.9 119/VII

(Relativo ao requerimento do Sr. Engenheiro António José Baptista Cardoso e Cunha)

0 engenheiro António José Baptista Cardoso e Cunha fundamenta a sua pretensão — ver reconhecido o seu direito à subvenção mensal vitalícia prevista no n.° 1 do ar-ügo 24.° da Lei n.° 4/85, de 9 de Abril — nos seguintes argumentos:

1) De acordo com o Decreto-Lei n.° 239/93, de 8 de Julho, o tempo de funções de comissário europeu conta, para todos os efeitos, como tempo de serviço no cargo de origem;

2) O Decreto-Lei n.° 239/93 visa estabelecer garantias, «designadamente (que não exclusivamente) no campo profissional»;

3) O Decreto-Lei n.° 239/93 não consente «restrições que dele não constam», ao «equiparar o cargo de comissário designado pelo Estado Português ao cargo de membro do Governo»;

4) Foi membro do Governo durante dois anos e sete meses, Deputado à Assembleia da República durante um ano e três meses e membro da Comissão das Comunidades Europeias durante sete anos, o que perfaz o tempo exigido pelo artigo 24.° da Lei n.° 4/85, para se adquirir o direito que invoca;

5) O lugar de origem a ter em conta, no momento da nomeação para o cargo de membro da Comissão das Comunidades Europeias, é o de Deputado à Assembleia da República, o qual lhe assegurava, pelo decurso do tempo, o direito à subvenção mensal vitalícia que deseja ver-lhe reconhecido;

6) E verdade que, no fim do mandato então em curso, não teria ainda perfeito o tempo mínimo necessário. Mas, «com todas as probabilidades», «teria continuado a exercer o mandato de Deputado»;

7) O não ter sido o cargo de comissário europeu incluído na lista do n.° 1 do artigo 24.° da Lei n.° 4/85 só tem uma explicação: a de que o cargo não existia à data da publicação da lei.

Cumpre analisar estes fundamentos, o que passo a fazer.

1 — Do Decreto-Lei n.° 239/93 não decorre directamente que o tempo de funções de comissário europeu conta para todos os efeitos como tempo de serviço no cargo de origem.

O que nele se diz é que «é aplicável ao comissário designado pelo Estado Português para a Comunidade Europeia o disposto no Decreto-Lei n.° 467/79, de 7 de Dezembro».

Assim sendo, só do disposto neste diploma legal pode decorrer o reconhecimento do direito invocado.

2 — É meu entendimento que não decorre. E não decorre porque, se é certo que estabelece que «o desempenho das funções como membro do Governo [leia-se agora, para facilitar o raciocínio, «como comissário europeu»] conta como tempo de serviço no cargo ou actividade de origem para todos os efeitos», tudo depende de saber qual o cargo de origem a que o dispositivo se reporta. O de Deputado à Assembleia da República, como defende o engenheiro Cardoso e Cunha? Ou o lugar profissional de origem antes do exercício do cargo político que dá acesso a subvenção mensal vitalícia?

Afigura-se-me — quanto a mim sem margem para dúvidas — que é a este cargo, e não àquele, que a disposição legal em apreço se reporta. Isto porque do n.° 1 da mesma disposição se retira que o que o decreto-lei visa é garantir o não prejuízo na colocação ou emprego permanente, bem como nos benefícios sociais anteriormente auferidos, enquanto exercerem as funções políticas a que são chamados (membro do Governo ou comissário europeu).

Ora nem era preciso que no preâmbulo se reconhecesse que «nas sociedades democráticas é, por natureza, temporário o desempenho de funções governativas» para que esta asserção se tivesse por óbvia.

Daí que tenha de se concluir que «o cargo ou actividade de origem» a ter em conta não é o de Deputado à Assembleia da República —esse também temporário—, mas o cargo público ou privado, mas não como titular de cargo político para os efeitos do artigo 24.° da Lei n.° 4/85, que o Sr. Engenheiro Cardoso e Cunha exercia à data em que passou a exercer os cargos políticos que, aliás, brilhantemente exerceu.

Reveste-se de todo o realce o facto de a expressão «para todos os efeitos» constar do Decreto-Lei n.° 467/79, e não do Decreto-Lei n.° 239/93, como parece pressupor a douta argumentação do requerente.

3 — Não é, assim, exacto que o Decreto-Lei n.° 239/93 vise estabelecer garantias para lá do campo profissional. O advérbio «designadamente», que o ilustre requerente nele lê, dele não consta. Pelo contrario, é mesmo «exclusivamente» ao campo profissional que o diploma se reporta.

4 — A argumentação que se perfilha não é, assim, restritiva do disposto no Decreto-Lei n.° 239/93. A restrição decorre do próprio texto.

5 — Não é, assim, susceptível de ser somado ao tempo de membro do Governo e de Deputado o tempo de exercício do cargo de comissário europeu.

O argumento de que o cargo de Deputado que exercia à data da nomeação para Deputado europeu lhe assegurava, pelo decurso do tempo, o direito à subvenção mensal vitalícia parece desconhecer que o tempo relevante é o efectivamente decorrido, não o virtualmente decorrendo.

6 — Também o juízo de probabilidade feito decorrer da possibilidade da sua reeleição —uma vez que no fim do mandato em curso ainda não teria atingido o tempo mínimo necessário à aquisição do direito à referida subvenção — não desposa a certeza do direito, ou seja, a certeza do

decurso efectivo do tempo exigido.

7 — Por último, também não posso aceitar pelo valor facial o argumento de que, se à data da aprovação do n.° 1 do artigo 24.° da Lei n.° 4/85, Portugal já tivesse direito a designar um comissário europeu, este cargo não teria deixado de ser incluído no elenco dos cargos políticos para efeito do disposto no artigo 24.° da Lei n.° 4/85.

Isto porque o n.° 1 do mesmo artigo foi alterado já depois de existir aquele direito, e nem por isso o legislador entendeu dever incluir o comissário europeu. Talvez por ter entendido que cumpria aos órgãos da União Europeia, e não ao Estado Português, regular a matéria.

Concluo, assim, com ressalva de melhor entendimento, que não assiste ao Sr. Engenheiro António José Baptista Cardoso e Cunha o direito que invoca. Em vista do que, em consciência, indefiro o seu douto requerimento.

Registe-se, notifique-se e publique-se.

Palácio de São Bento, 29 de Outubro de 1997.— O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.