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Também tinha alguma curiosidade em relação à apresentação desta proposta de aditamento, até porque a inclusão de um artigo que tenha a ver com os direitos fundamentais, à primeira vista, poderia parecer uma proposta perfeitamente válida e consonante, de resto, com um conjunto variado de propostas que são apresentadas pela maioria no seu projecto - hoje, já temos falado aqui desse aspecto e, mais à frente, falaremos a propósito de outros dispositivos constitucionais -, quanto à necessidade de permanentemente acentuar, por um princípio de responsabilidade que a comunidade nacional deve ter relativamente à institucionalização do seu Estado de direito, a ideia da consagração deste verso e reverso da medalha, dos direitos e dos deveres.
No entanto, o que uma leitura mais cuidada permite rapidamente perceber (e a apresentação agora feita pelo Sr. Deputado António Filipe deixou perfeitamente claro) é que a perspectiva não é rigorosamente essa. Ou seja, o PCP, com este aditamento, mais não visa do que propor uma irresponsabilidade, em termos genéricos e abstractos, da comunidade nacional relativamente à observância e ao respeito de deveres, enquanto verso necessário dos direitos. Isto é, se para os direitos, liberdades e garantias existe uma lógica profundamente generosa (e ainda bem que assim é) por parte da Constituição da República, o que o PCP pretenderia com esta norma era dizer: "isso é só quanto aos direitos, porque, quanto aos deveres, atenção que isso é só travões, tem de haver muito poucos deveres para a sociedade e a lei que ouse criar deveres tem de passar por uma porta muito estreita, porque isto de impor deveres não tem a ver com a nossa lógica de sociedade".
Assim, quero deixar a nossa oposição clara a este princípio, que só para incautos é que pode parecer, atendendo à epígrafe deste artigo, uma proposta consonante com aquele princípio genérico que enforma muitas das propostas apresentadas no projecto da maioria, de tornar mais claro para todos os portugueses, para todo o nosso modelo de sociedade, que a vastidão dos direitos de que queremos legitimamente usufruir neste Estado de Direito democrático que construímos em conjunto tem sempre de ter, como reverso da medalha, um conjunto de deveres e obrigações que permitam que responsavelmente saibamos conviver todos uns com os outros. Ora, não é esta a proposta que o PCP agora aqui apresenta.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, passamos à discussão da proposta de alteração do artigo 20.º, apresentada pelo PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o que propomos relativamente ao artigo 20.º, que diz respeito ao "acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva", é que se consagre que o acesso ao direito e aos tribunais não pode ser denegado pela sua onerosidade. A denegação por insuficiência de meios económicos já está prevista na Constituição e o que pretendemos é que seja dado um sinal claro relativamente a um outro problema que é o da onerosidade da justiça.
Já sei o que a maioria vai dizer. Os Srs. Deputados da maioria vão dizer que a justiça não é onerosa e que, mesmo que seja, quem tenha dinheiro, tem de a pagar e que, aliás, este Governo tem uma política de justiça excelente, que deixa todos os operadores judiciários de sorriso rasgado, não se justificando, portanto, a mínima alteração constitucional que seja, no sentido de dar um sinal aos cidadãos de que a justiça não deve ser onerosa. E os Srs. Deputados vão acrescentar que lá está o PCP, mais uma vez, a querer que o Estado intervenha em áreas onde não tem nada de intervir.
Se os Srs. Deputados tiverem algo de mais criativo a acrescentar, ouvi-los-ei com toda atenção; se quiserem limitar-se a repetir os chavões que têm repetido desde o início deste processo, então, peço que nos poupem ou que sejam breves.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, devo comunicar ao Sr. Deputado António Filipe que ele supunha saber o que a maioria ia dizer. Supunha, mas enganou-se. E vou explicar-lhe porquê.
A proposta do PCP assenta em acrescentar um novo requisito para que a justiça não possa ser denegada - além do requisito da carência económica, digamos, o PCP pretende que haja mais um requisito, a onerosidade da própria justiça.
Diz o Sr. Deputado que já sabia que íamos dizer que a justiça não é onerosa. Mas é, Sr. Deputado, a justiça é onerosa! O nosso sistema não contempla o caso de justiça gratuita - é onerosa, é sempre onerosa! O que equivale a dizer, Sr. Deputado, que, nos termos em que a proposta é apresentada, todo e qualquer cidadão, a partir de hoje, toda e qualquer empresa, a partir de hoje, que queira litigar em juízo, diz: "a justiça é onerosa e, portanto, quero o apoio judiciário".
Ora, não é nada disso que está em causa. A justiça, se bem reparar, não é mais onerosa para uns do que para outros; a justiça é igual, nem é muito nem pouco onerosa, é onerosa para todos.
O critério é outro, é o de quem quer aceder à justiça. A pessoa que quer aceder à justiça é que pode não ter os meios necessários para suportar os custos normais da justiça. Esse é que é o critério que deve orientar-nos para conceder ou não a tutela jurídica e o apoio judiciário, a consulta jurídica gratuita e tudo o mais que a norma visa contemplar.
Aqui é que está a diferença e não na onerosidade da justiça. Ora, para resolver essa questão é que compete ao Estado, como compete, atribuir o apoio judiciário àqueles que demonstrem a insuficiência económica e assim é que se consegue (e, hoje, já se falou aqui disso várias vezes) a verdadeira igualdade dos cidadãos perante a lei. É disso que estamos a falar e não da onerosidade da justiça. E esta manifestação prevista neste artigo é uma verdadeira decorrência desse princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei. Não é o critério da onerosidade da justiça.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas dizer que o Sr. Deputado Montalvão Machado contra-argumentou de uma forma que eu não estava à espera, mas creio que não percebeu a proposta.
O que está aqui em causa não é apenas a onerosidade; é a denegação da justiça por via da onerosidade, isto é, o Estado poder estabelecer critérios dissuasores do acesso de determinados cidadãos à justiça. E não estamos a falar