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20 DE SETEMBRO DE 2014

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PROJETO DE LEI N.º 648/XII (4.ª)

COMBATE O TRABALHO FORÇADO E OUTRAS FORMAS DE EXPLORAÇÃO LABORAL

Exposição de motivos

Todos os anos durante as campanhas agrícolas há cenários que se repetem. Na manhã de 13 de

novembro do ano passado, 24 trabalhadores foram resgatados pelas autoridades numa herdade no Alentejo.

Pertenciam a um grupo angariado na Roménia com promessas de trabalho pago a três euros e meio por hora.

Chegados à apanha da azeitona na região de Beja retiraram-lhes os documentos de identificação, instalaram-

nos numa casa sobrelotada sem condições de habitabilidade e obrigaram-nos a trabalhar 12 horas por dia. O

salário, muito abaixo do prometido, nem sempre existia ou era apenas o suficiente para pagar o alojamento, a

alimentação e o transporte para Portugal. Quando os angariadores foram presos e acusados pelo crime de

tráfico de seres humanos para exploração laboral, cada um dos trabalhadores não tinha recebido mais do que

25 euros.

Este caso representa um exemplo extremo das situações de abuso e exploração laboral que têm vindo a

tornar-se cada vez mais comuns em Portugal nos últimos anos, sobretudo nas regiões agrícolas como o

Alentejo. Na maioria das situações trata-se de escravidão por dívida mas apesar da sua gravidade, nem

sempre é possível provar que estes abusos configuram crimes de escravatura e de tráfico de seres humanos.

Nos últimos anos tem-se intensificado o recurso a trabalhadores imigrantes nas campanhas agrícolas

sazonais que utilizam mão-de-obra intensiva, como a apanha da azeitona, do melão, as vindimas, as podas e

tratamentos de diversas espécies hortofrutícolas.A concentração das áreas de produção, a especialização e a

intensificação da agricultura requerem o uso de muitos trabalhadores sazonais, gerando grandes fluxos

migratórios sem que exista legislação adequada para proteger estes trabalhadores.

Só durante a campanha da azeitona passam pelas herdades mais de 10 000 trabalhadores imigrantes. Em

particular no perímetro rega de Alqueva, nas áreas de olival intensivo, estão em plena expansão os

contingentes de trabalhadores sazonais oriundos de países da União Europeia, como a Roménia, a Bulgária e

outros. Em muitos casos, a livre circulação no espaço da UE, um bem que urge preservar, tem sido deturpada

e utilizada para encobrir a livre exploração: sem necessidade de registo de permanência em território nacional

até aos três meses, tempo mais do que suficiente para uma campanha; sem contrato de trabalho e/ou sem

garantias do seu efetivo cumprimento; sem descontos para a segurança social; ou até sem salário, depois de

os engajadores terem escapado com os pagamentos recebidos dos proprietários agrícolas, onde se inclui o

IVA que, embora recebido, não é pago às finanças.

Como é público, muitos destes trabalhadores têm sido alvo de exploração laboral, não recebendo o

pagamento devido e contratualizado (quando foi celebrado contrato) pelo trabalho prestado e/ou não tendo as

prestações sociais em dia por incumprimento das respetivas entidades patronais, por vezes difíceis de

identificar.

Em casos extremos, têm-se registado fenómenos de trabalho forçado,com retenção de documentos de

identificação dos trabalhadores, o que os coloca numa situação de total dependência, sem meios de

subsistência, confrontados com dívidas abusivas de alojamento e transporte, num país cuja língua não

dominam. Este conjunto de fenómenos traduz-se em grosseiras violações dos direitos humanos e configura o

crime de tráfico humano, ou seja, a escravatura em pleno século XXI.

Será útil recordar que Portugal é signatário da Convenção 29 da OIT sobre “Trabalho forçado ou

obrigatório” desde 1956. Este é um tema que tem vindo a concentrar as preocupações da OIT desde os anos

30. Em 2011 foi publicado o primeiro Relatório Global sobre o Trabalho Forçado que levou à criação, em 2012,

do Programa de Ação Especial de Combate ao Trabalho Forçado da OIT.

O Índice Global de Escravatura 2013 publicado pela Walk Free Foundation estima que existam 29 milhões

de escravos no mundo e cerca de 1300 a 1400 em Portugal. Um relatório sobre Portugal publicado pelo Grupo

de Peritos em Ação contra o Tráfico de Seres humanos (GRETA), organização do Conselho da Europa,

alertava para um crescimento de 46% de casos de tráfico para exploração laboral entre 2008 e 2011, situação

agravada pelo aprofundar da crise económica.