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SEPARATA — NÚMERO 57

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aspetos básicos da regulação do trabalho por turnos, como o intervalo de pelo menos 11 horas nas mudanças

entre os turnos, como recomendado na Diretiva 93/104/CE, não são, de facto, respeitados.

No dia 1 de maio de 2023, entrará em vigor a «Agenda do Trabalho Digno» que, apesar ter sido apresentada

pelo Governo como uma importante reforma laboral, manteve inalteradas matérias essenciais, como é o caso

do trabalho por turnos e noturno. O Partido Socialista uniu-se à direita para rejeitar propostas apresentadas pela

esquerda que incidiam exatamente sobre estas matérias. O Partido Socialista optou por manter o quadro de

desequilíbrio nas relações de trabalho que vem do Código do Trabalho de 2003, da versão do Código de 2009

e das alterações feitas na sequência da intervenção da troika em 2012 e 2013.

A negociação e a contratação coletiva são um espaço privilegiado para regular estas matérias. Mais uma

vez, as sucessivas revisões do Código do Trabalho em matéria de negociação e contratação coletiva tiveram

como efeito desequilibrar, a favor do patronato, a legislação laboral, diminuir a capacidade de negociação dos

sindicatos, reduzir a abrangência das convenções e individualizar as relações laborais. No campo da

organização do trabalho por turnos, noturno e em folgas rotativas, este processo de individualização e

precarização tem feito da entidade empregadora o único determinante na relação laboral, proliferando situações

de desfavorecimento do trabalhador. Por isso mesmo, sem prejuízo da regulação de aspetos específicos que

deve ser feita em cada setor e atendendo às suas particularidades por instrumentos de regulação coletiva de

trabalho, a lei geral tem o dever de definir patamares mínimos para todos os trabalhadores.

O Bloco de Esquerda tem sistematicamente apresentado iniciativas legislativas sobre o tema e foi criado na

anterior legislatura um grupo de trabalho junto da Comissão de Trabalho e Segurança Social, para apreciar

essas iniciativas. Foram realizadas, nesse âmbito, dezenas de audições a diversas entidades, das quais

resultaram o reconhecimento geral da necessidade de melhorar o enquadramento normativo desta forma de

organização do trabalho. Contudo, contrariamente aos sinais dados publicamente pelo PS, às necessidades

reconhecidas em várias das audições, nem a chamada Agenda do Trabalho Digno, nem as propostas de

alteração apresentadas posteriormente pelo Partido Socialista incluíram estas matérias e as propostas da

Esquerda foram reprovadas.

O contexto mundial, e particularmente o europeu, alterou-se substancialmente com a invasão da Ucrânia

pela Rússia e com consequências imediatas que são já preocupantes: os preços aumentam (entre 23 de

fevereiro de 2022, véspera do início da guerra na Ucrânia, e 12 de abril de 2023, o preço do cabaz alimentar

aumentou 42,79 euros (mais 23,30 %), mas os salários não, ou muito menos. Desde o início da invasão da

Ucrânia, o custo de vida aumentou três vezes mais do que os salários. Quem trabalha está, de novo, a

empobrecer. É urgente conferir dignidade ao trabalho desenvolvido pelos trabalhadores por turnos e em regime

noturno, combatendo a sua utilização indevida e conferindo proteção acrescida em virtude do reconhecimento

da penosidade do trabalho desenvolvido.

O presente projeto de lei visa dotar a lei de instrumentos que, assegurando os serviços e produções normais

das diferentes organizações, diminuam as consequências nefastas deste tipo de trabalho, nomeadamente na

saúde dos trabalhadores e trabalhadoras. Este projeto pretende, ainda, abrir espaço à negociação e à

contratação coletiva, em particular nos aspetos de complementaridade e adequação concreta às empresas. Os

seus aspetos essenciais são os seguintes:

1 – Clarificar os conceitos de trabalho por turnos, trabalho noturno e trabalhador noturno, e introduzir o

conceito de trabalhador por turnos, garantindo um enquadramento mais protetor dos trabalhadores;

2 – Definir regras sobre a organização por turnos que possibilitem uma menor perturbação dos ritmos

circadianos, uma acumulação de sono diminuída e uma maior sincronização com a vida social;

3 – Valorizar a participação dos trabalhadores e das suas estruturas representativas na definição dos turnos

e definir prazos mínimos para mudança de horário programado;

4 – Garantir um período mínimo de 24 horas de descanso na mudança de horário de turno e pelo menos dois

fins de semana de descanso em cada seis semanas de trabalho por turnos, tendo em conta que o trabalho por

turnos afeta negativamente a vida familiar e empobrece as relações sociais e de amizade (75 % dos

trabalhadores e trabalhadoras por turnos têm alterações na vida familiar e no relacionamento com os filhos e

lamentam a perda de amigos);

5 – Definir um máximo de 35 horas semanais de trabalho para quem trabalha por turnos ou é trabalhador

noturno;