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1818

Propostas do sr. ministro e secretario d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, apresentadas á camara dos srs. deputados na legislatura passada, e de que renovou a iniciativa em 14 de julho ultimo.

Senhores. — A dotação do clero e do culto é uma das nossas mais urgentes necessidades; n'isso estão empenhados a religião, a moral, e o bem da sociedade.

Por decreto de 30 de julho de 1832 foram extinctos os dizimos no continente do reino, e n'aquelle se declarou que seria fixada a divisão ecclesiastica, e definido o numero dos prelados, conegos, e parochos, e mais pessoas ecclesiasticas, necessarias ao culto divino; e que a todos se estabeleceriam congruas sustentações para viverem independentes, e com decencia, congruas essas que pelo thesouro publico seriam pagas na fórma da regra geral.

Em quanto por lei definitiva se não estabeleciam as congruas, ordenou-se no decreto de 20 de dezembro de 1834 que se consignasse provisoriamente pelo thesouro publico, a todos os parochos em exercicio, uma prestação mensal até á quantia de 50$000 réis, sendo regulada pelo governo com attenção á localidade, extensão e população das parochias.

A despeito d'estas providencias, os parochos viviam na indigencia e abandono, e para obviar o mal o decreto de 19 de setembro de 1836 determinou, que as juntas, de parochia lhes arbitrassem congruas decentes e rasoaveis, conforme o trabalho das freguezias, e posses dos freguezes, procedendo para esse fim á competente derrama, e estabelecendo os recursos contra o arbitramento ou distribuição.

Estas determinações foram ampliadas e desenvolvidas nas cartas de lei de 5 de março de 1838, de 20 de julho de 1839, e 8 de novembro de 1841, nas quaes se mandaram crear as juntas para o lançamento das congruas, deliberando com recurso para o conselho de districto, e na ultima d'estas leis se ordenou que os arbitramentos, já feitos pelas respectivas juntas, durariam em quanto por lei geral não fosse regulada a dotação do clero.

Taes disposições que os poderes do estado sanccionaram, considerando-as como util remedio provisorio para a decente sustentação dos parochos, estão condemnadas pela experiencia, e de todas as partes se tem levantado vozes contra esse systema, que veiu lançar nas freguezias a fatal semente dos odios entre os parochos e os povos, odios que não poucas vezes se têem traduzido em vias de facto.

Arbitradas as congruas talvez com inexactos esclarecimentos, e certo com grande irregularidade, esse mal ficou permanente pelo principio da fixidade, estatuido na dita lei de 8 de novembro de 1841, e o longo espaço de annos decorridos desde então sem que tenha apparecido a lei geral de dotação do clero, tem aggravado a condição dos parochos.

Se grave tem sido este inconveniente, todavia avulta outro de maiores consequencias, e que compromette a moral e a religião, essas augustas bases do bem estar social.

Se a religião de Christo fosse entre nós apenas permittida, os sectarios d'ella que quizessem ter o seu respectivo parocho, eram os que deviam prover á sua sustentação, mas felizmente essa religião, unica verdadeira, é a religião do reino; e portanto é ao estado a quem incumbe prover á sustentação dos seus ministros e do seu culto.

O parocho que, segundo a expressão do Evangelho, deve ser a luz do mundo, e o sal da terra; o parocho que, pela sublimidade de sua missão, é o pastor incumbido de apascentar o rebanho confiado aos seus cuidados, e chamar ao redil as ovelhas extraviadas; o parocho que deve ser o exemplo da virtude, seguir a mansidão do divino mestre, conciliar as discordias e desavenças entre os seus freguezes; o parocho que deve ser o prototypo da honra, da abnegação, do desinteresse; o parocho emfim, que deve enxugar as lagrimas da viuva, do orphão, do enfermo, do invalido, e distribuir a esmola ao miseravel, está collocado na dura alternativa, ou de morrer á mingua por falta de meios, ou de viver em continua luta com os seus freguezes, perdendo o prestigio, o respeito e a consideração, que devem ser inseparaveis do exercicio de tão nobres e elevadas funcções.

Cumpre pois fazer inaugurar uma nova epocha que assegure aos parochos a sua justa independencia, e á igreja o seu esplendor: este objecto, que tanto tem prendido a attenção do parlamento e da imprensa, e já tem suscitado a iniciativa de varios illustres homens do estado, não póde ser adiado, e releva resolve-lo com presteza, e convenientemente.

De todas as providencias porém a mais necessaria, a mais urgente, a mais instante, é a da emancipação do parocho, tornando-o independente dos freguezes; e para esse fim compre estabelecer, que o importe das congruas, tanto actuaes como futuras, e já addicionado ás contribuições predial, industrial, e pessoal, deduzidas as rendas dos passaes, fóros, pensões, pé de altar, e mais rendimentos parochiaes: nem obsta a diversidade de rendimentos provenientes dessas fontes, de parochia para parochia: o onus de sustentar os parochos é da nação, não é da freguezia; e a lei fundamental do estado determina, que todos devem contribuir para as despezas publicas em proporção dos seus haveres; não ha pois rasão para conservar um systema, que contraria os principios, que complica ou multiplica os lançamentos das imposições, com incommodo dos povos, e que na designação especial deixa sobresair o pretexto dos odios entre o pastor e as ovelhas.

Na proposta que temos a honra de vos apresentar, as congruas são taxadas conforme a classificação das parochias, e esta regulada com attenção á sua localidade e população, sem que deixe de se attender á sua extensão; devendo a circumscripção dellas ser feita progressivamente, e com a brevidade possivel, pareceu-nos conveniente que á proporção que ella se verificasse se fizesse a applicação do novo arbitramento, pois que, se fosse tambem applicado á divisão actual, não deixaria de trazer graves embaraços e injustiças, e talvez suscitar difficuldades, que cumpre remover.

Seria para desejar que o pé de altar, direitos de estola, e mais benesses parochiaes fossem extinctos desde já, mas tendo em consideração que os povos os continuarão a pagar de melhor vontade do que soffrerão o augmento de muitos contos de réis sabre as contribuições directas; a prudencia aconselha que se defira aquella extincção para epocha que não póde vir longe, attentas as outras providencias que a proposta encerra.

A desamortisação dos bens das communidades religiosas, e o emprego do producto delles em titulos de divida fundada, deve elevar prodigiosamente o seu rendimento; e a reducção e suppressão dos conventos de freiras, que breve deve effectuar-se, ha de deixar livres valiosos recursos, que não devem ser desviados para usos profanos, e sim exclusivamente applicados a favor da dotação dos conventos que ficarem subsistindo, do clero, do culto e estabelecimentos de piedade ou caridade; a connexão da materia fez consignar na proposta as disposições respectivas que lá se encontram.

A legislação existente concedia soccorros provisorios aos parochos que por idade ou molestia não podessem desempenhar as funcções do seu ministerio: era de necessidade providenciar definitivamente sobre este objecto, e por isso a proposta estabelece as disposições respeitantes á aposentação dos mesmos parochos, não deixando precaria a sua sorte.

Sobre estas bases foi elaborada a seguinte proposta, que tenho a honra de vos apresentar:

proposta de lei

Artigo 1.° As parochias do continente do reino e das ilhas adjacentes, serão classificadas com attenção á sua localidade e população do modo seguinte:

1.ª Classe. — As parochias situadas nas cidades e que tiverem pelo menos 1:000 fogos.

2.ª Classe. — As parochias situadas nas cidades e que tiverem menos de 1:000 fogos, e bem assim todas as existentes nas cabeças de comarca, que não forem cidades, e que tiverem pelo menos 600 fogos.

3.ª Classe. — As parochias situadas nas cabeças de comarca, que não forem cidades, e que tiverem menos de 600 fogos, e bem assim as existentes nas cabeças de concelho, que tiverem pelo menos 400 fogos.

4.ª Classe. — As parochias situadas nas cabeças de concelho, que tiverem menos de 400 fogos, e bem assim todas as outras alem das mencionadas, que tiverem pelo menos 200 fogos.

5.ª Classe. — As parochias não comprehendidas nas classes anteriores.

§ unico. As parochias da 5.ª classe poderão ser providas como simplices curatos amoviveis, se assim parecer convenientes.

Art.. 2.º Concluida a divisão parochial de qualquer concelho ou comarca, por virtude da auctorisação concedida pela carta de lei de 4 de junho de 1859, e feita a classificação das parochias respectivas, nos termos do artigo antecedente, não será ella prejudicada por qualquer futura alteração na divisão administrativa.

Art.. 3.° A congrua dos parochos será regulada, segundo a classe das parochias, e vencerão, os da

1.ª Classe........................ 500$000 réis

2.ª »............................ 400$000 »

3.ª »............................ 320$000 »

4.ª »............................ 260$000 »

5.ª »............................ 200$000 »

§ 1.º Nas cidades de Lisboa e Porto os parochos perceberão alem das suas respectivas congruas, na fórma indicada, mais a quantia de 100$000 réis cada um.

§ 2.° Quando as parochias comprehenderem fogos espalhados, e a distancia de mais de 5 kilometros da residencia dos parochos, e estes não tiverem coadjuctor, poderá o governo decretar um augmento de congrua que não exceda a 20 por cento.

Art.. 4.° A proporção que se for realisando o arredondamento e classificação das freguezias, o governo mandará proceder á avaliação dos bens e rendimentos dos passaes das respectivas igrejas, e de quaesquer outros que lhes fiquem pertencendo, destinados para a sustentação dos parochos, e ao arbitramento de pé de altar, e mais rendimentos parochiaes.

Art.. 5.° Nas congruas reguladas conforme o artigo 3.º, serão levados em conta, em relação a cada parochia, todos os rendimentos parochiaes avaliados e arbitrados nos termos do artigo antecedente.

Art.. 6.° Nas parochias onde a renda dos bens proprios, e mais rendimentos parochiaes arbitrados conforme o artigo 4.°, exceder a congrua correspondente á respectiva classe, o excedente será applicado á congrua do coadjutor, e, se ainda sobrar, ou não houver coadjuctor, pertencerá á fabrica.

Art.. 7.° A somma que for necessaria para complemento das congruas dos parochos, e para pagamento das congruas dos coadjutores, e das pensões dos aposentados nos termos do artigo 16.º, será accumulada proporcionalmente ás contribuições predial, industrial, e pessoal, e cobrada conjuntamente com ellas, entrando nos cofres publicos como receita geral da fazenda.

§ unico. Esta accumulação será feita com relação a cada freguezia, ao passo que se for circumscrevendo no primeiro lançamento immediato.

Art.. 8.º As congruas dos coadjutores serão reguladas em conformidade com a lei de 20 de julho de 1839, mas com relação ás congruas estabelecidas no artigo 3.° d'esta lei.

Art.. 9.° O governo, depois de verificada a accumulação decretada no artigo 7.°, fará pagar aos parochos e coadjutores as congruas e pensões nas cabeças dos concelhos, por prestações mensaes.

Art.. 10.° As congruas dos parochos e coadjutores são isentas de todo e qualquer imposto; e bem assim de penhora, arresto ou qualquer embargo.

Art.. 11.° Logo que se verifique a desamortisação dos bens das communidades religiosas, e se regule a conservação de uns conventos de freiras, a reducção e suppressão de outros, os juros das inscripções havidas com o preço ou subrogação d'esses bens será applicado gradual e successivamente da maneira seguinte:

1.° Para sustentação dos conventos de religiosas que ficarem subsistindo, ou seja para educação da mocidade, ou seja simplesmente para os fins religiosos;

2.° Para as congruas dos parochos diocesanos, conegos e beneficiados dos cabidos;

3.° Para Os ordenados do pessoal do magisterio dos seminarios, quando não chegarem os rendimentos dos bens proprios, os que para isso são applicados na lei de 16 de junho de 1848, e os da bulla da cruzada;

4.º Para as congruas dos parochos e coadjutores, e pensões de aposentação, na fórma prescripta n'esta lei;

5.° Para auxiliar as despezas do culto, e reparar os templos, quando não sejam sufficientes os recursos das respectivas fabricas;

6.° Para auxiliar estabelecimentos de piedade, caridade e educação.

§ unico. O governo, ouvidos os prelados diocesanos, regulará as congruas de que trata o n.° 2.°, e d'esse trabalho dará conta ás côrtes.

Art.. 12.° As inscripções que constituirem o capital necessario para produzir o rendimento que for designado a cada convento de religiosas dos que ficarem subsistindo, serão averbadas em nome d'elle.

Art.. 13.° Apenas haja rendimento de juros das mencionadas inscripções de sobra para satisfazer ás indicações dos n.º 1.°, 2.°, 3.° e 4.° do artigo 11.°, as congruas dos parochos e coajutores serão augmentadas com 20 por cento.

Art.. 14.° Satisfeitas as applicações constantes do artigo antecedente, e sobrando rendimentos equivalentes á importancia calculada do pé de altar e mais benesses, serão aquelles applicados a preenche-la.

Art.. 15.º Preenchidas assim as congruas, os parochos nada mais poderão receber alem d'ellas, e dos emolumentos de cartorio, e de parte dos actos de pompa, conforme o n.° 2.° do artigo 18.º: e são declarados abolidos desde então os direitos de estola ou pé de altar, e quaesquer outros proventos usados, seja qual for a sua denominação, com a unica excepção estabelecida no mencionado artigo.

§ unico. Os emolumentos de cartorio serão regulados por novas tabellas ordenadas pelo governo, de accordo com os prelados diocesanos.

Art.. 16.º Os parochos que pela sua avançada idade, ou por suas molestias, se impossibilitarem de desempenhar as funcções do seu ministerio, poderão ser aposentados, devendo desistir formalmente do beneficio parochial, para que outro possa n'elle ser instituido canonicamente, e terão direito a uma pensão regulada segundo o tempo de serviço da maneira seguinte:

1.° O que tiver trinta, ou mais annos do serviço tem direito a ser aposentado com a pensão igual á sua congrua;

2.º O que tiver vinte, ou mais annos de serviço tem direito á pensão igual a dois terços da congrua;

3.° O que tiver dez, ou mais annos de serviço tem direito á pensão igual á terça parte da congrua;

4.º O que tiver menos de dez annos de serviço tem direito á pensão igual á terça parte da congrua arbitrada para as freguezias da 5.ª classe.

§ 1.° Para a aposentação só será contado o tempo de serviço effectivo como parocho collado.

§ 2.º Para calcular a pensão não se attenderá aos augmentos constantes dos §§ 1.º e 2.° do artigo 3.°

Art.. 17.° Sommando-se as congruas que o parocho recebeu ou tinha direito a receber nos annos necessarios para poder ser aposentado, e dividindo-se a somma pelo mesmo numero de annos, o quociente indicará o valor da congrua, que ha de regular a pensão na aposentação.

Art.. 18.° As fabricas das igrejas, além de outros rendimentos que lhes pertençam, perceberão: