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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 319

acabar com as pequenas municipalidades; mas eu entendo tambem que aos concelhos será custoso largar a sua autonomia; e n'esse caso, o governo ou tem de transigir, e não executa a lei, ou tem de empregar a força, e ahi está, por conseguinte, a revolução, que eu desejaria que se evitasse.

Parece-me que o governo procedia mais avisadamente se em logar de querer fazer uma reforma completa, ignorando se o paiz está preparado para ella, ou se a quer acceitar, fosse modificando pouco a pouco esse codigo que temos em vigor, e deslocando para os districtos tambem pouco a pouco os encargos que pesam sobre o governo.

Sendo assim, não se produziria abalo no paiz e chegariamos ao que se pretende; mas, de outra fórma, nada conseguiremos. Seremos simplesmente reformadores theoricos; porque,- esteja v. exa. certo (e a prophecia sou eu que a faço) - este codigo não ha de ser executado e o governo não tem força para o levar á pratica.

Concluindo, repito, os poderes publicos mostram que andam mal avisadamente, fazendo votar uma lei, com a certeza de que não será cumprida. Este proceder desprestigia muito o governo e o parlamento.

Mando, pois, para a mesa as minhas duas propostas.

(Leu.)

Leram-se na mesa, são do teor seguinte.

Proposta

Proponho, em substituição ao projecto do codigo que se discute, o projecto do codigo administrativo do sr. Mártens Ferrão apresentado em 1867. = Vaz Preto.

Proponho que se insira no codigo que se discute a seguinte doutrina: Os maiores de vinte e um annos são eleitores, sobre as excepções que a legislação anterior estabelece.

Estes eleitores elegem as juntas de parochia, estas elegem as camaras e as camaras elegem as juntas geraes. = Vaz Preto.

Foram admittidas, e ficaram em discussão conjuntamente com a materia.

O sr. Ministro do Reino. (Rodrigues Sampaio): - Muito poucas palavras direi.

Pergunta-me o digno par se eu julgo realisavel este projecto de reforma administrativa. De certo que sim; de outra fórma, seria uma loucura tel-o apresentado ao parlamento. Enganar-me-hei, talvez. Poderá não acontecer o que penso a respeito d'ella, mas effectivamente julgo-a muito realisavel, e se, o que não espera, caisse n'esta tentativa, repetiria como Longino:

"Em nobre empreza, a mesma quéda é nobre."

O sr. Vaz Preto: - Em quanto avalia v. exa. as despezas dos encargos que são passados para as juntas geraes e camaras? O que eu desejo saber, é se não exacta, pelo menos approximadamente em quanto calcula as despezas dos encargos deslocados?

O Orador: - Eu creio que o digno par já fez a conta.

O sr. Vaz Preto: - V. exa. sabe perfeitamente que por este codigo varias despezas que estavam o cargo do thesouro passam para os districtos. Ora o que eu desejo saber é emquanto avalia v. exa. as despezas d'esses encargos. Esta é a primeira pergunta.

A segunda pergunta é saber se o governo tenciona ceder em favor dos districtos a verba que se gasta com os encargos de que vae ficar alliviado, e que em virtude d'esta lei vão pesar sobre os districtos, ou se os districtos têem de os pagar duas vezes.

O Orador: - Eu não posso tratar aqui das tenções que temos; trato unicamente d'este projecto, e das suas disposições. Tenções, nunca se discutiram nos projectos.

Ás perguntas do digno par não posso responder agora, porque não estava prevenido para isso, e s. exa. quer uma resposta peremptoria.

A quanto montam essas despezas, não posso dizer, porque não sei os melhoramentos que as juntas terão necessidade de fazer. Elias é que o hão de decidir, porque de contrario seria marcar-lhes já o que teriam de fazer. Ora, isso era o parlamento não lhes dar liberdade; era tirar-lh'a. Se as juntas quizerem fundar qualquer estabelecimento, hão de necessariamente pagar as despezas que tiverem de fazer.

Portanto, já vê o digno par que é impossivel dizer a cifra d'esses encargos, porque não sei a quanto essas despezas podem montar, desde que se não sabe os melhoramentos que se hão de fazer.

Se se pretende que essas despezas sáiam do thesouro, então é necessario descentralisar. A descentralisação é boa, mas sem ser a medo. Eu não quero a anarchia, e por isso n'este projecto estão os meios de a reprimir. Entendo a descentralisação como o digno par a entende, e por isso não quero a concentração. Tenho meditado muitas vezes no meio mais proprio de se fazer uma boa descentralisação; mas esse meio depende, como o digno par sabe, da revogação do acto addicional, e eu não me posso comprometter a isso, porque não se póde admittir na lei qualquer doutrina que seja contraria a ella. Isto é claro e evidente.

(Interrupção do sr. Vaz Preto que não se ouviu.)

A eleição de que trata o projecto creio que não é contraria ao acto addicional, porque só com respeito a elle é que ali se falla em eleições directas.

Ha pessoas que querem que a reforma seja radical; o digno par prefere que ella se faça pouco a pouco, e eu entendo que com este projecto não ficâmos já muito mal, podemos ir tapando alguns barrancos (Riso.) e chegaremos a final ao termo desejado.

irada ao povo a ingerencia na administração local, atacamos o principio da igualdade e estabelecemos a oligarchia.

Mas eu não sei se d'essa fórma se evitam as revoluções, porque a privação dos direitos, ainda que sejam menos bem exercidos, é pena que póde produzir funestos resultados. O povo erra, e ha de errar; deixem-n'o errar. Nós não temos a presumpção de acertarmos sempre; ás vezes, nos mais altos corpos do estado tambem póde haver erros lamentaveis; por consequencia, toleremo-n'os uns aos outros, deixemos que o povo eleja, ainda que eleja mal. No exercicio d'esse direito ha de ir elle aperfeiçoando-se; não lh'o supprimamos, á espera de um seculo de larga illustração, que nunca ha de chegar ao ponto que desejâmos e que todos queriamos que viesse. Se tal esperarmos, póde acontecer-nos como áquelle homem que andava com a peça de panno debaixo do braço para fazer uma casaca da ultima moda.

Não póde ser; convem irmos praticando; nos nossos proprios erros acharemos uma lição que nos fará entrar no verdadeiro caminho; mas não dar um passo, para não errarmos, parece-me uma politica desastrosa.

Isto não é allusão a nenhum dos dignos pares; mas lembrarei que se o governo pedisse muito dinheiro, como é preciso, para diffundir largamente a instrucção, talvez os que actualmente tanto fallam n'ella, julgassem que o povo podia estar ainda mais algum tempo á espera de que usufruissemos todos os direitos e não reconhecessemos n'elle senão obrigações.

Eu creio que, para evitarmos a anarchia e a revolução é preciso acompanhar o espirito do seculo e a tendencia da sociedade, porque se os cidadãos não têem uma intelligencia bastante illustrada, têem um braço bem rijo, e forçoso ás vezes, para contrariar a nossa tutela.

Eu desejo, sr. presidente, que todos os dignos pares apresentem as suas propostas, para que se possa fazer o que for de melhor, o que possa ser mais conducente ao bem do paiz, e sem provocar difficuldades ou embaraços, porque o fim de todos nós é acertar. (Apoiados.)

Eu já tenho muitas vezes meditado sobre os principios que foram expostos pelo digno par, mas o meu convencimento leva-me exactamente para um terreno contrario.