O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

(22)

Desde que Lock, o creador da Idealogia, e Condillac, desenvolveram a marcha dos conhecimentos humanos, é sabido hoje, que nós devemos partir sempre do conhecido para o desconhecido. Se assim não fizermos, transtornaremos todos os nossos systemas. É esta a marcha da Natureza. E o homem que é arbitro della, por seus meios tambem segue o mesmo trilho. - O homem nasce, cresce, vigora-se, está por algum tempo estacionario, e depois decresce, definha-se, e morre. Tudo no Mundo assim vai. As leis que nós agora aqui fizermos, tambem hão de morrer um dia. Esta é a moda geral da Europa; mas quem póde volvidos tempos affiançar-lhes a sua duração? E por isso um Sabio methafisico Inglez sómente se abalançava a fazer um Codigo de leis, que apenas durasse um seculo. Mas quereremos nós que as nossas instituições morram antes da sua decrepitude? Antes mesmo de amadurecerem, ou de chegarem á puberdade?.... Não precisarão ellas de um apoio, que lhes guie a planta debil, e ainda incerta na estrada da civilisação? E a segunda Camara não lhe dará este apoio nas circumstancias, em que nos achamos?....

Se o elemento primitivo de uma só Camara é a reflexão, como ha de essa reflexão ser modificado por um corpo estranho, pergunta o mesmo illustre Orador? Pois bem, e não sendo modificada não volverá um dia essa reflexão sobre a consciencia da sua força? E se a ambição se misturar a isto? Se essa Camara se adiar hoje, se ámanhã se tornar inamovivel, e depois de amanhã tyrana? Queremos a lei dos Tyrannos?

O segundo Orador, o meu nobre amigo Deputado por Aveiro, tambem pergunto em que seculo viviamos nós, ou se estando no seculo 19.° quereriamos retrogradar para a idade media? Sr. Presidente, ou eu não entendo a questão, ou por isso mesmo que estamos no seculo 19.° devemos ter duas Camaras: se isso é o que se vê em todas as Monarchias Representativas; se esse é o uso geralmente estabelecido nos Povos melhor constituidos, para que havemos de colocar-nos em uma posição excepcionali? Temos nós mais força, mais illustração, mais exuberancia de meios? Não o concebo assim.

Argumentou-se com a rivalidade dos Corpos colegisladores, como a causal da servidão dos Povos; e eu persuado-me de que, quanto mais rivaes forem esses Corpos, mais liberdade resultará para aquelles; e que assim como em um Collegio a emulação produz os bons alumnos, assim tambem a rivalidade nos poderes politicos ha de produzir a perfeição governativa.

O mesmo nobre Orador julgou chimerica e romantica a idéa d'equilibrio entre os poderes politicos. Será chimerica, Sr. Presidente, será um romance; mas é uma chimera, e romance sanccionado pelos factos da experiencia, e pelas lições da historia. É um romance adoptado por todos os Publicistas apoz de Montesquieu seu chefe; é um romance consagrado nas paginas de todos os Escriptores celebres, que se dedicaram ao estudo destas materias. Se não houver um correctivo aos excessos de uma só Camara, desapparecerão as prerogativas do Throno, dizia aquelle sabio Presidente. - E Mirabeau, Sr. Presidente, Mirabeau o idolo da Revolução Franceza, cuja authoridade não póde aqui ser suspeita, e cujas cinzas, apar das de Voltaire, em um accesso de vertigem foram colocadas nas aras do Deos dos Christãos; - Mirabeau não temeu affirmar, que sem esse equilibrio, sem essa linha divisoria, sem esse correctivo, elle preferiria viver antes em Constantinopla....em Constantinopla, Sr. Presidente, do que em França.

Fallou-se em sumidade de jerarchias: ora eu entendo que essa sumidade consiste na preponderancia, riqueza e fortunas de certos Cidadãos; e porque não havemos de interessar na nossa Causa essa preponderancia, essas fortunas? Segundo eu creio, é mais um penhor da futura estabilidade.

O Ilustre Deputado, para comprovar a sua doutrina, tirou o exemplo de nós mesmos, e disse, que este Congresso ainda não pertendêra ser déspota. É verdade, Sr. Presidente; mas o argumento não colhe; porque este Congresso tem lido uma excepção da regra geral. Direi aqui as idéas, que em seu abono expende um jornalista Francez. - Diz elle = que o Congresso de Portugal tem sido o unico na historia parlamentar - que sem ser faccioso, tem curado unicamente da salvação do seu paiz. - Que se viram Deputados nas Linhas; Deputados no Ministerio; Deputados dirigindo a opinião publica; Deputados mantendo a ordem nas Cidades; Deputados no campo brandindo a espada, e nos Concelhos manejando a pena. = Sr. Presidente, com tal Congresso, e tão nobres membros, era impossivel que triunfasse a revolta ; e o sucesso o verificou já.

Continuou finalmente o illustre Deputado, dizendo que cada um dos individuos, que aqui se assentam, o Desembargador por exemplo, que só cuida de Autos; o Parocho, que só serve para levar o Viatico, etc., etc., não tinham os recursos para formar um partido anarchico. Ora quer o illustre Deputado um exemplo, em que eu lhe mostre como esses individuos, essas humildes creaturas reunidas em um Corpo deliberante, causaram a destruição do seu paiz? Esse exemplo - ei-lo - é a Convenção Nacional Franceza. Lá estavam esses pobres Conductores dos Rebanhos de Jesus Christo, advogando atrocidades inauditas, e subscrevendo os decretos de exterminio, e de morte. Lá estava Danthon, e Robespierre, deshonrando a Magistratura, e a Toga. Lá estavam muitos pais de famílias, noutr'ora pacificos educadores de seus filhos, forcejando por extinguirem a geração então existente.. .. de lá partio o raio da morte a mais de dous milhões de victimas. que pereceram nas cadêas, nos cadafalsos, por meio da fome, do assassinato, e do suicidio. De lá partio o exterminio, a cento e tantos mil Cidadãos; de lá partio o incendio, que devorou mais de vinte e sete mil edificios. Centenares de conspirações, d'insurreições poseram o ultimo remate a esse systema devastador; e do paiz das delicias, fizeram, segundo o Abbade Dellile, uma patria d'amargura, e de dores. N'uma palavra poseram a França num transtorno tal, que na frase de Chatheanbriand, viam-se os tumulos, onde tinham existido os palacios, e os palacios, onde eram os tumulos.

Eis o que eu receio que aconteça na minha Patria. Doe-me as suas feridas; quero um Governo estavel, e permanente; e por isso voto por uma segunda Camara; porque só assim auguro a consolidação do nosso systema.

O Sr. Almeida Garrett: - Entramos na questão, sem duvida a mais transcendente, e que se póde agitar; mas com ser tal e tão importante, está já tão trilhada por 50 annos de discussão perpetua a que tem sido sujeita no mundo civilisado, - foi, demais, a mais, tão completamente tractada nos debates geraes do Projecto de Constituição, que firmemente estava resoluto a não tomar parte nella agora. Suppunha-a esgotada, cuidei-a madura e decidida; mas com grande espanto meu, por tal modo a vi hontem recrudescer; ouvi sustentar opiniões e doutrinas; propugnar em nome do povo cousas, que eu entendo que são damnosas ao povo; defender como a pró da liberdade, o que eu entendo ser destruidor da liberdade, que julgo de minha obrigação, como forçado e jurado defensor do povo de quem sou representante, e da liberdade, que tenho no coração desde que nasci, dizer alguma cousa sobre a questão; não tanto por esperar que de meu fraco pelejar, venha o triumpho da causa, que defendo; que esse couto eu decidido; mas porque me não soffre o animo vêr dar a batalha sem romper alguma lança pela sua causa.

Segundo o que tenho observado, na discussão pelos dois lados, em que se sustenta, parece-me que os oradores que mantem um delles pertendem com o compasso das theorias abstractas na mão descrever o circulo constitucional so-