292 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS
Acresce mais, e é que o sr. Serpa Pimentel, com respeito ás multas legalmente impostas em virtude d'esta contribuição industrial, tinha uma disposição que dizia:
"As multas legalmente impostas a que o serviço da contribuição industrial der logar em todas ou quaesquer das suas partes, serão lançadas na respectiva matriz e conhecimento, para serem cobradas com a mesma contribuição."
Quer dizer, que as reluctancias e os clamores que se têem levantado com respeito á fórma da cobrança das multas e da contribuição, podiam ser feitas, têem rasão de ser, tem entrar agora, na questão, se é a contravenção do regulamento, se é propriamente a falta do pagamento da contribuição industrial, que envolvo uma certa penalidade, mas o que é certo, é que a disposição apresentada pelo sr. Serpa Pimentel era incontestavelmente mais suave.
O actual governo, no uso da auctorisação, quis pôr em pratica uma idéa que já tinha sido aqui apresentada pelo sr. Serpa Pimentel, mas entendeu que devia aggraval a, não é em relação á verba, mas em relação tambem ao modo da cobrança.
Já se vê que o sr. ministro da fazenda não foi feliz na sua innovação e não sendo feliz, não admira que solevantassem as resistencias, que folgo que fossem exclusivamente legaes, que fossem mantidas e conservadas dentro dos limites das leis; porque é d'esse modo e por essa fórma que as nações podem mais facilmente adiantar as suas instituições livres e mostrar que sabem usar d'ellas para conseguirem tudo o que póde contribuir para o seu bem estar e prosperidade.
Por consequencia, folgo muito com que taes manifestações se mantivessem n'esse terreno, e entendo que o governo fez bem em attendel-as, em inclinar-se diante d'ellas, porque não são os governos constituidos para se oppôrem ás reclamações legitimas da opinião publica.
Elles devem estar ali unicamente para ajustarem os dictames da sua consciencia com os dictames da opinião do paiz.
Se podem conservar-se, conservam-se; se não podem conservar-se, retiram-se. Em qualquer dos casos não deixam de ajustar os dictames da opinião publica com os dictames da sua consciencia.
Evidentemente o sr. ministro da fazenda, na minha opinião, desde o primeiro acto até ao ultimo, não lançou os olhos, apesar do seu esclarecido espirito e do seu grande talento, para este projecto, que é naturalmente obra de accessores que se incumbiram de cuidar d'elle.
As difficuldades e embaraços em que s. exa se tem encontrado provem principalmente d'essa coadjuvação, que, n'este caso, em vez de auxiliar o sr. ministro, o comprometteu.
O sr. ministro tinha considerado primeiro que a modificação era de pouco valor.
Depois, quando se levantaram as reclamações, s. exa. soccorreu-se, para justificar esta nova proposta, a uma argumentação que está inquestionavelmente em situação bem pouco consoante com os recursos do seu talento.
Quando s. exa. se viu forçado a apresentar, não digo lima modificação á lei, porque no fundo isto não e uma modificação, mas um projecto que suavisa os rigores do, regulamento, os rigores provenientes do uso da auctorisação parlamentar, começou por invocar o estado anarchico em que se encontrava o lançamento e a cobrança da contribuição industrial.
Como é que s. exa podia soccorrer se a um unico e simples facto, se o não quiz estudar minuciosamente, para ver o que n'elle havia de verdadeiro e de apparento?
Um ministro da fazenda, de ordinario, para que olha a fim de conhecer se um imposto vae bem ou vae mal?
Olha muito naturalmente para o rendimento d'esse imposto.
Ora, o que é que se observa em relação ao rendimento
d'este imposto, segundo o Annuario estatistico ultimamente publicado?
É que desde 1830-1881 o rendimento da contribuição industrial (o cobrado e não o lançado) tem sucecssivamente crescido.
A contribuição industrial cobrada no continente, tem sido:
1880-1881 l 059:088$451
1881-1882 1.093:994$535
1882-1883 1.126:709$176
1883-1884 1.107:713$714
1884-1835 1.119:701$910
Bastava que o illustre ministro lançasse as suas vistas para os elementos que forçosamente tem á sua disposição, embora nós não os tenhamos senão quando o Annuario estatistico se publica, para immediatamente reconhecer que o imposto industrial, em vez de estar em más condições, ia successivamente crescendo.
E se por ventura, o sr. ministro da fazenda, por voltar as suas attenções para o assumpto, entendesse que deviam fazer-se modificações nos impostos, em que sentido devia ser a modificação? Havia de ir buscar, naturalmente, alguns elementos ou indicações, para que, apesar do imposto crescer, s. exa. justificasse essa alteração. O mal é reformar sem rasão, e mesmo sem criterio.
Poderia tambem o sr. ministro da fazenda ver pelas estatisticas, se a população industrial crescia ou não; o só effectivamente s. exa. visse que a população industrial crescia, e que o importo crescia pouco, podia dizer: ha vicio; se o numero de industriaes cresce tanto e a contribuição não, ha vicio.
Se por acaso s. exa. visse, que o numero de industriaes decrescia e a contribuição crescia, diria: ha vicio, mas é de outra ordem.
Ora, quando nós consultâmos as estatisticas, vemos que o numero dos contribuintes, em 1880, era de 236:682, e em 1881 de 234:019. Quer dizer, que o numero dos contribuintes da contribuição industrial decresceu; quer dizer que, decrescendo o numero de contribuintes, o sr. ministro da fazenda devia observar: se cresce a contribuição e não o numero de contribuintes, parece que ha alguns contribuintes mais lesados.
Mas para quem se voltou principalmente o sr. ministro da fazenda, quando tratou da transformação do imposto industrial em licença? Voltou se evidentemente para as classes menos favorecidas da fortuna; foi para essas que s. exa. se voltou, e porquê? S. exa. já disse n'uma occasião, que lhe parecia que os salarios d'essa população estavam mais elevados, e que por consequencia as condições d'essa população eram melhores. E possivel que s. exa. tenha rasão. Como eu não tenho estatisticas á minha disposição, ouço a uns dizer que os salarios estão altos, e a outros que estão baixos; e sem ter elementos seguros para apreciar, não sou capaz de dizer nem sim nem não.
O que posso é ir aos dados estatisticos seguros, e dizer o que outro dia disse é sr. ministro da fazenda a um dos meus illustres collegas d'aquelle lado da camara. Disse s. exa. que tinha intenção de reduzir os direitos da carne, por isso que a carne, deixando de ser, pelo seu elevado preço, o principal alimento das classes populares, era de grande conveniencia reduzir o imposto, para que effectivamente aquellas classes podessem usar d'esse alimento.
Ora, se o sr. ministro da fazenda olhasse tambem para as estatisticas, veria um facto verdadeiramente lastimoso, e que deve impressionar altamente o espirito de s. exa. Com relação ao imposto da carne, vê-se que desde 1881 até 1884, houve ligeiras alterações; mas de 1884 para 1885 o decrescimento é enorme, pois passou de 20 a 15 milhões, como se vê em seguida, segundo o Annuario estatistico:
Imposto do real de agua no continente.