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declarou que deviamos attender á qual é preciso fazer face; e ainda que possa dizer que é dentro de dois annos que ha a fazer esta despeza, como nós temos um orçamento calculado para dezesete mezes, o deficit apresentado pelo sr. ministro da fazenda, que ha a fazer face, é de 2.400:000$000 réis, e o que se vê é que elle excede a 3.000:000$000 réis, só com esta medida, sobre os quaes se tem de providenciar em janeiro futuro. E digo á camara e ao sr. ministro da fazenda, que differentes nações têem tido deficit, muitas nações têem atravessado epochas difficeis tendo de fazer face a um deficit, mas devo dizer tambem, que nações muito adiantadas e muito ricas têem recuando diante de deficits que não têem a magestosa proporção que tem o nosso. Posso asseverar a camara que o deficit da terça parte da receita de um paiz é um deficit muito importante. Tenho visto na França uma opposição horrorisada, e o governo, reflectindo diante de um deficit de 60.000:000 a 100.000:000 francos, e isto em um paiz em que a receita chega a francos 2.000:000:000. Entendo pois que as nossas circumstancias reclamam toda a attenção dos poderes publicos.

O sr. Ministro da Fazenda: — Peço a palavra.

O Orador: — Digo pois, que a situação de uma nação que tem um deficit da terça parte da sua receita, e que paga de juros quasi metade d'essa receita, é uma situação que nos deve impor grandes obrigações, e que os nossos deveres são rigorosos n'este caso, portanto ainda que não possa votar o projecto tal qual se acha, não quero dizer com isto que a situação da companhia do caminho de ferro não seja digna de se attender dentro dos limites do justo! e equitativo, por isso que se trata de uma companhia que, durante o ultimo anno, creio eu, não deu dividendo, ou eu estou muito enganado, eu li n'um documento publico, que a companhia não deu no anno passado dividendo.

Eu digo que é séria esta circumstancia, e que o estado, que aproveita da exploração feita por essa companhia em circumstancias difficeis, principalmente parte do caminho de leste, poderá conceder a sobrestação no assentamento dos taboleiros, mas não creio que possa chegar até ás expropriações.

Em todo este projecto falla-se em compensações, e a este respeito peço venia aos illustres deputados, que dizem que a compensação dada pela companhia pelas expropriações, é o estabelecimento de um ramal em relação á linha do sul.

Ora eu declaro que o estabelecimento d'este ramal podia ter logar sem dependencia d'este contrato, considerando-o como um ramal de serviço, que a companhia póde e deve fazer, Bem que o estado seja obrigado a dar-lhe subsidio; isto é expresso no contrato. E direi mais — se este ramal é indispensavel, creio que o ramal correspondente ao norte do rio é tambem indispensavel; se estas facilidades de embarque são indispensaveis na parte sui do Douro, são igualmente indispensaveis na parte norte do mesmo rio. E tanto mais, que a commissão por um principio de utilidade de uma ou outra natureza, quer que o governo não ceda nem um millimetro do cota do nivel em que se estabelece a estação do lado do norte. Logo está claro que este nivel, que é bastante consideravel em relação ao nivel do rio, torna mais necessario o estabelecimento de um ramal correspondente ao norte.

Portanto, nós, com o estabelecimento d'este ramal, não conseguimos senão metade, se metade, das vantagens que devemos d'elle tirar; logo é preciso outro ramal e outra compensação. E direi mais: este systema de compensações aparta-se da letra e do espirito do contrato primitivo, que suppõe que a companhia tem interesse no estabelecimento d'estes ramaes, e que não tem direito a receber por isso mais subvenção do estado.

E eu n'este ponto, apreciando muito as indicações feitas por um dos srs. ministros, não o posso acompanhar até onde elle vae. Eu creio que s. ex.ª não exprime tanto a opinião de ministro, como uma opinião, que ahi anda. Diz-se que nós temos horror ás communicações aquaticas; eu não sei porque. O sr. ministro até suppõe que em tres mezes do anno ha de haver completa impossibilidade na saída da barra do Douro; e que portanto, quando o vinho do Douro não poder saír aquella barra, ha de tomar caminho de Lisboa, para saír pela barra de Lisboa. Não posso acompanhar s. ex.ª n'esta opinião.

E ainda mais: diz-se geralmente que no nosso paiz, todos os generos, em tendo diante de si 300 ou 400 kilometros de caminho de ferro, pelo seu muito amor ao mesmo caminho de ferro, tomam esta direcção, deixando a via aquatica, que têem ao pé da porta, e isto só para acompanharem o desenvolvimento d'este grande instrumento de progresso e de civilisação.

Eu li ha muito tempo um relatorio de um distincto engenheiro inglez, em que recommendava umas minas que ha na margem do Douro. Entre outras considerações achei uma que, pelo menos ao limitado alcance da minha intelligencia, pareceu-me uma consideração de muito bom censo. Quer v. ex.ª saber o motivo por que esse engenheiro chamava áquellas minas excellentes? E porque não têem de dar um unico passo em caminhos por terra. Com estações á borda de um rio, diria ainda aquelle engenheiro que supponho tinha idéas antigas, ha a vantagem de se não dar passo em caminho de ferro, embarca-se logo o minerio e fica baratissimo.

Este ramal de Valladares ao sitio chamado de S. Paio proporciona ao vinho do Porto em vez de embarcar na barra e depois de chegar a ella, o retroceder 300 kilometros de caminho de ferro vindo até Lisboa. Não posso concordar com esta vantagem e votava contra o ramal, por este inconveniente, se obrigasse o vinho a vir a Lisboa.

Pois nós, que ainda ha pouco votámos a liberdade da barra do Porto, poderiamos, racionalmente, apresentar um tal principio, quando ha lá um outro vinho que quer passar por vinho do Porto!!... Se esse principio fosse admissivel para com o vinho, que não tivesse saído pela barra do Porto, havia de haver a desconfiança que não era do Porto; era vinho do Porto, que vinha de Lisboa (riso). E parece-me que todo o vinho quereria atravessar o caminho de ferro; porque, ainda que tivesse a circumstancia aggravante do preço do transporte, tinha comtudo tambem a circumstancia attenuante, que seria indubitavelmente attendivel.

Por esta occasião tambem direi, que me parecia que o governo, n'esta mesma occasião, deveria ir tão longe, que propozesse alguma diminuição nas tarifas em relação a alguns dos generos de primeira necessidade; é o que fazem outros paizes. Ainda ha pouco em França, tratando-se da construcção de caminhos de ferro, se reduziu a tarifa em certos e determinados pontos.

Hoje sr. presidente, é preciso que nos desenganemos, não se vive em materias de governo da metaphysica politica; a obrigação dos governos, salvo o respeito aos principios, é procurar a commodidade das classes desvalidas, que não são pouco importantes, e que têem direito a dizer: Os nossos interesses têem tanto direito a serem attendidos como os das outras classes.

E parece-me que tratando nós d'estas modificações, era esta tambem a occasião competente para se tratar de fazer uma reducção importante em relação ao transporte de cereaes, gado e combustivel; por essa reducção dizia mais propriamente respeito, repito, ás classes menos consideradas, que são dignas da sociedade, que ella por isso mesmo tem direito a considerar e mesmo porque são as mais numerosas e que mais soffrem (apoiados).

Desde que o trabalho se rehabilitou, em nome dos principios beneficos da religião e dos da humanidade, é dever dos governos attender ás classes que vivem exclusivamente do seu trabalho (apoiados).

Disse-se aqui: «Que a concessão feita a esta companhia era indispensavel, porque era indispensavel que houvesse uma estação de caminho de ferro no Porto.» Estou de accordo com o estabelecimento da estação.

Mas diz-se: «A companhia tinha adquirido direitos de fazer a estação fóra do Porto, porque tinha havido declaração do ministro n'esse sentido».

Se estas duas declarações existissem, a do contrato e a do ministro, a do contrato, que tem o cunho de permanencia, e a do ministro, que não tem a existencia n'aquellas cadeiras, qual d'ellas devia permanecer: a que impõe obrigações á companhia ou aquelle que não era senão a ampliação da conclusão do contrato? Parece-me que era a do contrato; mas não é só isto. Se por acaso se toma como uma decisão definitiva a das portarias que permittiram o estabelecimento da estação em Campanhã, qual é a rasão por que se não estabeleceu a estação n'aquelle ponto durante o grande periodo que mediou depois da expedição d'aquellas portarias, a ultima das quaes data de 1862? Houve por força uma rasão para isso.

Pois se o governo concedeu que a estação se estabelecesse em Campanhã, se isso era conveniente para a companhia, se a companhia estava disposta a executar essas portarias, qual é a rasão porque houve uma demora tão consideravel?

Para isso houve uma rasão, e parece-me que essa rasão foi que as condições impostas por essas portarias não eram inteiramente aceitas pela companhia, segundo me quer parecer; posso estar enganado, mas creio que não; não estou.

Direi mais. Quer-me parecer que os individuos que mandaram estabelecer a estação em Campanhã, dos quaes um já morreu, e por consequencia devemos justiça á memoria dos mortos, não estabeleceram uma cousa tão extravagante, tão extraordinaria que se não possa defender, em relação ás condições impostas e não cumpridas.

E quer v. ex.ª saber qual é a defeza d'essas portarias? A defeza d'essas portarias são as condições que impunham á companhia, porque a estação estabelecida n'aquelle ponto com aquellas condições trazia uma despeza tal á companhia, que houve da parte de alguns diplomatas da engenheria a opinião de que o verdadeiro modo de trazer forçosamente a companhia a estabelecer a estação no campo do Cirne ou no Prado do Repouso era obriga-la ao cumprimento d'aquellas condições, por isso que gastava mais cumprindo-as, do que effectivamente gastava estabelecendo a estação no Porto.

Já se vê pois que esta defeza das compensações á companhia, dizendo-se que se lhe dão expressamente por ella ter de gastar finais dinheiro, conduzindo o caminho de ferro até dentro do Porto, não prova tanto como parece á primeira vista.

Ainda ha mais. Não ha documentos officiaes pelos quaes se possa provar que o governo estava compromettido por aquellas condições.

Pois ha alguem que desconheça o merecimento do sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa, que foi ministro das obras publicas anteriormente ao sr. conde de Castro? Pois esse ministro era de opinião que o governo tinha obrigação de conceder por força á companhia o estabelecimento da estação em Campanhã, porque em 1862 tinha expedido uma portaria em que se fallava a esse respeito, estabelecendo condições que não tinham sido cumpridas? Creio que não.

Creio que posso assegurar á camara que em 24 de novembro de 1864, o sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa estava na idéa de que o governo tinha todo o direito de impor á companhia o estabelecimento da estação dentro do Porto pela interpretação, que não é muito cerebrina, do que se estabelecêra no contrato que se tinha celebrado com aquella companhia.

É claro portanto que não é uma compensação o que se faz á companhia com a concessão d'estas expropriações, por isso que a companhia, depois de não ter feito a menor despeza para a estação no ponto de Campanhã, podia ser levada a muda-la para dentro do Porto.

Creio que tenho abusado muito da paciencia da camara e da insufficiencia das minhas forças; e tambem que tenho abusado não fazendo toda a justiça que devo aos cavalheiros de cujas opiniões posso discordar, mas confesso que estou prompto para fazer penitencia publica, se assim é preciso, por alguma das minhas palavras que atraiçoam as minhas intenções.

Protesto que não deixo de ter respeito pelos meus contendores n'esta questão, e por todos n'esta casa, mas estou convencido do que disse, porque quando fallo, sempre estou convencido do que digo. Posso enganar-me, e tenho-me enganado muitas vezes, mas tambem tenho visto que os outros se enganam; e creio que posso assegurar a v. ex.ª que isto não me succede só a mim, que succede a toda a gente. O que é verdade é que eu, quando estou convencido de uma cousa, não posso deixar de perseverar no meu proposito.

Isto tem inconvenientes, porque n'uma sociedade pequena como a nossa, em que todos nos conhecemos, em que todos nos encontrâmos, quando a gente combate qualquer interesse, ordinariamente todos suppõem um ataque pessoal n'estas manifestações, o que é desagradavel, mas tomára eu estar convencido de que todos os negocios são os melhores possiveis, porque isso poupa-me o trabalho de argumentar e firma mais solidamente as minhas relações pessoaes, o que n'um paiz pequeno não é indifferente.

Eu não entrei n'esta questão por ser inimigo de novações de contratos; já fui ministro e tambem propuz novação de contrato, mas eu fui infeliz; as camaras votaram em peso contra essa novação, e a imprensa atacou-me de uma maneira desabrida. E não fui só eu a victima, até o emprezario que veiu a este paiz, que não recebeu um real e que bastante gastou, esse mesmo foi accusado de tal modo que os tribunaes estrangeiros foram quasi advertidos para tomarem posse d'esse emprezario. Porém as nações estrangeiras foram mais prudentes, em logar de chamarem aquelle emprezario aos tribunaes, levaram-o ao parlamento, e nós continuâmos a fazer novações.

Sabe v. ex.ª o que succedeu na epocha a que alludo? N'aquella occasião podia-se receiar que, se não approvassem aquella novação, adeus caminhos de ferro em Portugal! Pois as camaras votaram contra essa novação, e a prova de que nós temos caminhos de ferro, é que estamos discutindo uma novação de contrato de um caminho de ferro já quasi terminado.

Tenho concluido.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

(O orador foi comprimentado por grande numero de srs. deputados.)

Foi lida e admittida a seguinte

PROPOSTA

Proponho que seja convidado o governo a declarar se está na intenção de modificar, em relação á companhia dos caminhos de ferro do norte e leste, a base da concessão da subvenção, substituindo-a por aquella da garantia do producto bruto kilometrico. = Carlos Bento da Silva.

O sr. Ministro da Fazenda (Fontes Pereira de Mello): — Permitta-me v. ex.ª e a camara que eu aproveite o conselho dado pelo illustre deputado quasi ao terminar o seu elegante discurso. E sempre com prazer que eu me vejo em circumstancias de poder seguir m conselhos de pessoa tão auctorisada e tão distincta como s. ex.ª

Disse o illustre deputado que todos nós errâmos, e que todos nos podemos enganar; mas que quando estamos convencidos de que procedemos com justiça e no interesse publico, devemos teimar e perseverar no nosso proposito. Seguirei pois o conselho do nobre deputado. Nós estamos convencidos de que fazemos um bom serviço publico; estamos convencidos de que o contrato é util ao paiz; portanto n'esta parte aceitâmos o conselho dado por s. ex.ª; perseverâmos no nosso proposito e insistimos perante a camara pela approvação do documento que lhe está sujeito.

Se eu podesse seguir o talentoso deputado rias variadissimas considerações que a proposito d'este assumpto que é importante sem duvida, mas que ma parece não póde ser guindado tão alto que tome o logar de questão magna, d'estas que se costumam tratar no parlamento; se podesse seguir todas as suas considerações, é provavel que roubasse muito tempo á camara, e alem d'isso ía tratar antecipadamente de muitos assumptos que hão de ser opportunamente discutidos. Reservo-me portanto para então occupar-me com o maior desenvolvimento de muitas questões em que fallou o illustre deputado.

Não quero com isto dizer que deixarei sem resposta algumas das observações de s. ex.ª sobre o orçamento do estado; mas a camara me relevará se eu n'essa resposta não for tão extenso como espero ser n'outra occasião, pois me parece que nada aproveita á causa publica, nem aos debates parlamentares, o repetirmos em diversas occasiões e por diverso motivo, discussões que cabem naturalmente em differentes logares (apoiados).

Eu creio que o governo fez um bom serviço assignando o contrato de 27 de novembro de 1865, e trazendo-o á approvação do parlamento, porque d'este contrato resulta incontestavelmente um grande melhoramento nas communicações entre as duas cidades principaes do reino, pois é o complemento indispensavel da via ferrea do norte, que mais tarde, e oxalá que não seja muito tarde, se ha de ramificar com as diversas provincias do norte do reino (apoiados).

Ninguem póde desconhecer que todas as nações do mundo têem feito n'estes ultimos annos despezas importantissimas, despezas incalculaveis para approximar as testadas dos seus